Você está na página 1de 47

DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 3

HIPOCALCEMIA a manifestação mais grave da hiperex-


citabilidade neuromuscular. A figura 1
mostra um exemplo de tetania na mão,
1. INTRODUÇÃO chamada de espasmo carpopédico. Em
geral a tetania acontece quando os ní-
A hipocalcemia é definida como a veis de cálcio chegam a ser < 7mg/dL.
concentração sérica de cálcio total
<8,5 mg/dL (2,2mol/L) ou de cálcio
iônico <4,6 mg/dL (1,12 mmol/L). É
uma condição encontrada frequente-
mente. Em valores extremos, os pa-
cientes podem apresentar-se com
quadro de hiperexcitabilidade neu-
romuscular grave e tetania.

Hipocalcemia Cálcio total <8,5 mg/


dl ou 2,2 mmol/L Cálcio iônico <4,6 Figura 1. Tetania hopocalcêmica na mão, denominada
mg/dL ou 1,12 mmol/L espasmo carpopédico ou carpopedal. Fonte: Guyton.
Tratado de Fisiologia médica, 2011.

SE LIGA! O controle do cálcio é feito


de forma muito precisa, pois pequenas 2. FISIOLOGIA DO
variações em sua normalidade podem
atingir diversos sistemas, entre eles o
METABOLISMO DO CÁLCIO
sistema nervoso, que tende a ficar mais A concentração de cálcio extracelular
excitável com a queda do cálcio. As cé-
lulas excitáveis, como os neurônios, são
envolve vários mecanismos e hormô-
sensíveis às alterações do cálcio iônico, nios, entre eles a absorção intesti-
quando há diminuição do nível do cálcio, nal, excreção renal e a captação ou
essas células ficam mais excitáveis le- liberação óssea, e são mediados por
vando a um aumento da permeabilida-
de aos íons sódio que são responsáveis hormônios como PTH, Vitamina D e
por desencadear potenciais de ação, calcitonina. O objetivo desses hor-
levando a um quadro de hiperexcitabi- mônios é manter a calcemia em tor-
lidade neuromuscular com quadros de
parestesias, hiperreflexia, câimbras e
no de 8,5-10,5mg/dL. A maior parte
espasmos musculares. Em concentra- do cálcio se encontra no osso na for-
ções muito baixas, as fibras nervosas ma de hidroxiapatita (90%), e 1% no
podem desencadear descargas espon- compartimento extracelular e tecidos
tâneas que levam a uma série de im-
pulsos nervosos incontroláveis, que ao moles. No sangue, o cálcio se encon-
chegar aos músculos provocam contra- tra sob 3 formas diferentes, ligado a
ção muscular tetânica ou tetania, sendo proteínas plasmáticas (41%) como a
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 4

albumina e, portanto, não é possível ionizadas, e existe a parcela ioniza-


sua difusão através das membranas da (50%) que consegue se difundir
capilares, pode estar ligado a subs- pelos capilares e é a parcela meta-
tâncias aniônicas (9%) como citrato bolicamente ativa e que exerce suas
e fosfato, que conseguem se difundir funções no coração, sistema nervoso
pelas membranas, porém não estão e formação óssea (gráfico 1).

Gráfico 1. Distribuição do cálcio no plasma sanguíneo. Fonte: Guyton. Tratado de fisiologia médica, 2011.

A ingestão diária de cálcio é em torno parte (90%) reabsorvida nos túbulos


de 1000mg. O cálcio é mal absorvido proximais, alça de Henle e túbulos
pelo intestino, sendo necessário a aju- distais iniciais e o restante pelos tú-
da da Vitamina D que estimula a ab- bulos distais finais e ductos coletores
sorção de cerca de 300mg do cálcio iniciais (10%), sendo uma reabsorção
ingerido, sendo o restante eliminado seletiva e dependente da concentra-
nas fezes (700mg). Mais 150mg de ção sanguínea de cálcio e paratormô-
cálcio são eliminados pelo intestino nio (PTH). Se há diminuição do cálcio
através das células descamadas da sanguíneo há aumento da secreção
mucosa intestinal, resultando numa do PTH e consequente aumento da
eliminação final de 850mg de cálcio. reabsorção de cálcio; se há aumento
A excreção de cálcio é feita pelos rins, do cálcio, o PTH fica suprimido, e há
que faz a reabsorção de cerca de 98% diminuição da reabsorção pelos rins.
do cálcio nos túbulos, sendo a maior
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 5

FLUXOGRAMA 1 - FISIOLOGIA

Ingestão de cálcio
diária 1000mg/dia

Absorção intestinal com


ajuda da Vit. D 300mg/dia

Excretado nas fezes: 700 mg da dieta +


150 mg através das células
descamadas da mucosa

EXCREÇÃO RENAL
REABSORÇÃO DE 98%

Fluxograma 1. A ingestão diária de cálcio é cerca de 1000mg. Desses, apenas 300mg é absorvido pelas
células intestinais com a ação da vitamina D. 700mg é eliminado nas fezes juntamente com 150mg que
são secretados de volta na luz intestinal. A excreção renal de cálcio é realizada pelo rins, sendo que 98% é
reabsorvido nos túbulos renais. Fonte: Emergências clínicas USP, 2019.

O controle dos níveis plasmáticos diminuição de cálcio, o CaPHO4 é li-


normais de cálcio é feito por 2 linhas berado para corrente sanguínea, para
de defesa. A primeira é realizada pe- manter os níveis de cálcio normais.
los sais de cálcio intercambiável pre- Esse equilíbrio é atingido em cerca
sente nos ossos e que são compostos de 1 hora. A segunda linha de defesa
por fosfato de cálcio amorfo na for- age simultaneamente ao tampona-
ma CaPHO4. Esse cálcio é facilmen- mento executado pelos ossos, e é re-
te absorvido pelo osso, assim como alizada através do controle hormonal
também é facilmente liberado para a do cálcio iônico mediado pelo para-
corrente sanguínea. Quando há um tormônio (PTH) e calcitonina.
aumento de cálcio, por mecanismos O PTH é um hormônio produzido
diversos, esse cálcio é absorvido pelo pelas glândulas paratireoides e sua
osso e transformado em CaPHO4, secreção é controlada pelo nível
de modo contrário, quando há uma de cálcio no sangue. Na diminuição
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 6

aguda de cálcio, as paratireoides au-


mentam a secreção de PTH, que vai
atuar estimulando a reabsorção ós-
sea, levando a liberação de cálcio
para o sangue. Ele também aumen-
ta a reabsorção de cálcio nos túbulos
renais e consequentemente diminui
a excreção renal de cálcio, em con-
trapartida, diminui a reabsorção de
fosfato, e estimula a produção de Vi-
tamina D pelos rins que vão atuar no
intestino aumentando a absorção de
cálcio e fosfato (figura 2). Quando há
um aumento de cálcio, este estimula
o receptor sensível a cálcio presente
nas glândulas paratireoides e inibem
a secreção do PTH.

Figura 2. Resumo dos efeitos do PTH no osso, nos rins e no intestino, em resposta
à diminuição da concentração de íons cálcio no meio extracelular. CaSR, receptor
sensível a cálcio presente nas glândulas paratireoides. PTH, paratormônio. Ca, cálcio.
PO4, fosfato. Fonte: Guyton. Tratado de fisiologia médica, 2011

Como foi dito acima, o aumento agudo calcitonina é um hormônio produzido


de cálcio leva à diminuição da secre- pelas células “C” da glândula tireoide,
ção de PTH, porém, ao mesmo tem- e tem efeitos opostos ao PTH, po-
po, leva ao aumento da calcitonina. A rém sua ação é mais fraca que a do
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 7

PTH. O principal estímulo para li- da exposição aos raios ultraviole-


beração da calcitonina é a elevação tas. Essa substância é transformada
da concentração de cálcio iônico. em 25-hidroxicolecalciferol (calcidiol)
A calcitonina atua tanto diminuindo no fígado pela ação da 25 hidroxila-
a atividade dos osteoclastos quanto se. Nos túbulos proximais dos rins, a
reduzindo a formação de novos os- 25-hidroxicolecalciferol é transforma-
teoclastos e, como consequência, ha- da em 1,25-di-hidroxicolecalciferol
verá diminuição da liberação de cálcio (calcitriol) pela ação da 1-alfa-hidro-
ósseo para o sangue e o seu desvio xilase, a forma ativa da Vitamina D.
para o osso, com consequente dimi- Essa transformação sofre importante
nuição do cálcio sanguíneo. A calci- influência do PTH, na ausência desse
tonina também tem efeitos contrários hormônio, quase não há produção de
ao PTH no intestino e rins, porém não Vit. D. A vitamina D vai atuar princi-
são levados em consideração por se- palmente no intestino promovendo o
rem de pouca importância. O efeito aumento da absorção de cálcio atra-
da calcitonina sobre a concentração vés do aumento da calbindina, prote-
plasmática de cálcio é temporário, du- ína ligante de ferro, ATPase estimu-
rando apenas algumas horas ou dias, lada pelo cálcio na borda em escova
não sendo efetiva nos casos de hiper- das células epiteliais e fosfatase al-
calcemia prolongada. O PTH sozinho calina nas células epiteliais, que por
é capaz de fazer o controle da con- mecanismos pouco conhecidos atu-
centração plasmática de cálcio, isso am aumentando a absorção de cálcio
é demonstrado nos casos em que o (figura 3). Além disso, a vitamina D
paciente remove a glândula tireoide, e possui outras ações, porém de menor
as concentrações de cálcio são man- importância pelo fraco efeito, tal como
tidas normalizadas apenas pelo PTH. a diminuição da excreção renal de
A vitamina D (Vit. D) também é um cálcio. Nos ossos, a vitamina D pro-
hormônio que participa nas concen- voca a absorção óssea com liberação
trações do cálcio sanguíneo. A for- de cálcio para corrente sanguínea. As
mação da vitamina D é iniciada na funções dos hormônios reguladores
pele, que é responsável por formar o da concentração de cálcio estão re-
colecalciferol (Vitamina D3) através sumidas na Tabela 1.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 8

Figura 3. Ativação da vitamina D3 para a formação da 1,25 hidroxicolecalciferol, e o papel do PTH na formação da
Vitamina D. PTH, Paratormônio. Fonte: Guyton. Tratado de Fisiologia médica, 2011.

HORMÔNIOS FUNÇÕES
• Estimula a reabsorção óssea através da ativação e proliferação dos osteoclastos, le-
vando a liberação de cálcio para o líquido extracelular.
Paratormônio • Aumenta a reabsorção de cálcio e diminui a reabsorção de fosfato pelo túbulos renais,
(PTH) levando a diminuição da excreção de cálcio e aumento da excreção de fosfato.
• Estimula a produção da vitamina D ativa (1,25 hidroxicolecalciferol) pelos rins, que por
sua vez aumenta a absorção intestinal de cálcio.
• Diminuição da reabsorção óssea através da redução da atividade e da formação dos
osteoclastos, levando o balanço para deposição de cálcio nos ossos, e consequente
Calcitonina redução plasmática.
• Diminui a reabsorção renal de cálcio e a absorção de cálcio pelos intestinos, porém
esses efeitos são fracos e de pouca importância no metabolismo do cálcio.
• Aumenta a absorção intestinal de cálcio e fosfato
• Aumenta a absorção renal de cálcio e fosfato pelas células epiteliais dos túbulos renais
e desta forma, diminui a excreção renal de cálcio e fosfato (efeito fraco).
Vitamina D
• Estimula mineralização óssea através da regulação dos osteoblastos. Em quantidades
extremas, pode provocar a absorção óssea, juntamente com o PTH.
• Supressão da secreção de PTH pelas paratireoides.
Tabela 1. Principais funções dos hormônios envolvidos na fisiologia do cálcio. Adaptado de: Guyton. Tratado de Fisio-
logia médica, 2011.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 9

3. ETIOLOGIA O hipoparatireoidismo cirúrgi-


co pode acontecer após cirurgia da
A etiologia da hipocalcemia pode ser
glândula tireoide (tireoidectomia) por
dividida em 2 grandes grupos: as que
retirada cirúrgica acidental. Em al-
possuem nível de PTH baixo, ca-
guns casos pode acontecer hipopara
racterizando quadros de hipopara-
transitório (20%) após tireoidecto-
tireoidismo e os que possuem PTH
mias devido edema ou hemorragia na
elevado, caracterizando o hiperpa-
paratireoide causadas durante o pro-
ratireoidismo secundário.
cedimento. O hipopara permanente
O hipoparatireoidismo (hipopara) é após tireoidectomia total acontece na
uma doença caracterizada pela insu- minoria dos casos (0,8 a 3%).
ficiência das glândulas paratireoi-
A destruição auto-imune pode
des em produzir níveis adequados
acontecer por auto-anticorpo con-
de PTH para controle do metabo-
tra os receptores sensíveis de cálcio
lismo do cálcio. O hipopara pode
presentes na glândula, mas também
ser causado por diversos fatores, tais
pode vir associada a outras doenças
como, alteração no desenvolvimen-
como na doença poliglandular au-
to da glândula como agenesia da
toimune tipo I, um distúrbio familiar
paratireoide, destruição da glândula
bastante raro que está associada a
por retirada cirúrgica, sendo essa a
outras alterações como insuficiência
causa mais comum, mas essa des-
adrenal e candidíase mucocutânea
truição pode acontecer também por
crônica.
metástases, radiação e doenças
infiltrativas como hemocromatose e Existem casos em que o paciente
doença de Wilson ou pode ser uma apresenta exames laboratoriais de
destruição autoimune que pode hipoparatireoidismo tais como cálcio
ocorrer isoladamente ou associada diminuído, fosfato aumentado (pois
a outras doenças como no caso da o PTH diminui a excreção renal de
doença poliglandular auto-imune do cálcio e aumenta a excreção renal de
tipo 1. Além disso, temos ainda a di- fósforo), porém a dosagem do PTH
minuição da função da paratireoide está elevada, demostrando que há
que podem acontecer por alterações resistência ao PTH nos tecidos-al-
genéticas do PTH, alteração dos re- vo. Essa situação pode ser chamada
ceptores sensores do cálcio presen- de pseudo-hipoparatireoidismo ou
tes nas glândulas, hipomagnesemia síndrome de resistência ao PTH.
por causar resposta alterada ao PTH Essa seria uma causa de hipocalcemia
em tecidos-alvo e síndrome do osso com elevação de PTH, onde os baixos
faminto. níveis de cálcio levam ao aumento
da secreção de PTH na tentativa de
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 10

normalizar a calcemia. Outras cau- osteoblásticas e cursar com hipocal-


sas de hipocalcemia com PTH ele- cemia. A causa presumida é a depo-
vado são: deficiência ou resistência sição de cálcio no osso neoformado
a vitamina D, doença renal crônica ao redor do tumor. Na pancreatite
(DRC), Insuficiência Renal Agu- aguda pode ocorrer hipocalcemia
da (IRA), medicações, pancreatite pois há formação e precipitação de
aguda, metástases osteoblásticas, complexos de ácido graxo com cál-
rabdomiólise, lise tumoral, sepse cio, sendo esses casos de pior prog-
ou doença grave. nóstico. Na sepse e doença grave é
As causas de deficiência de vitami- comum a apresentação de hipocal-
na D podem incluir baixa ingestão, má cemia (80-90% dos casos). A causa
absorção, baixa exposição à luz solar parece ser a combinação de vários
ou até mesmo falha em alguma parte fatores como secreção prejudicada
do processo da produção endógena de PTH associada a produção re-
de Vitamina D. Como consequência duzida de vitamina D e resistência
teremos uma diminuição da absor- dos órgãos-alvo à ação do PTH,
ção intestinal de cálcio levando a além disso podem estar associados
um quadro de hipocalcemia. mecanismos como hipomagnesemia
e ações das citocinas inflamatórias
A hipocalcemia na DRC é caracteri- nas glândulas paratireoides, rins e os-
zada tanto pela diminuição da produ- sos. Na síndrome do choque tóxico,
ção de Vitamina D ativa que é reali- além dos mecanismos citados aci-
zada predominantemente pelos rins, ma, há também alta concentração
como também é justificada pela difi- de calcitonina em alguns pacientes,
culdade de excreção renal de fosfa- o que leva a inibição da reabsorção
to, levando a hiperfosfatemia. Esse óssea.
fosfato se liga ao cálcio, formando
o complexo fosfato de cálcio que Outras causam de hipocalcemia são
pode se precipitar nos tecidos moles, importantes de serem lembradas
e o resultado final é a hipocalcemia. como a hipoalbuminemia e o uso de
Na rabdomiólise e lise tumoral há algumas medicações. Na verdade, a
também um quadro de hiperfosfa- hipoalbuminemia pode levar a uma
temia devido uma destruição celular pseudo- hipocalemia. Como par-
exacerbada com liberação de fosfato te importante do cálcio está ligado a
para corrente sanguínea. albumina, sua diminuição pode levar
a mensuração do cálcio total diminu-
Pacientes com câncer de mama ou ído, por conta disso, a concentração
próstata, em quadros de doença mais de cálcio total deve ser corrigida pela
avançadas, podem ter metástases albumina a partir da fórmula abaixo,
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 11

ou deve-se solicitar a dosagem do como mecanismo de ação a redução


cálcio iônico para fazer o diagnós- da reabsorção óssea pelos osteoclas-
tico de hipocalcemia nos casos de tos, por isso são chamadas de drogas
hipoalbuminemia. antirreabsortivas. Quadros de hipo-
calcemia podem acontecer sob doses
altas de bifosfonados em pacientes
Fórmula de correção do cálcio pela que tem associado deficiência de vi-
albumina tamina D, hipoparatireoidismo não
Ca corrigido= Ca medido + [(4,0 – reconhecido ou função renal compro-
albumina) x 0,8] metida. Outros medicamentos que
podem ser citados são anticonvul-
sivantes, medicações antineoplási-
Medicações são importantes causas
cas e medicações associadas a hipo-
de hipocalcemia. Os bifosfonados
magnesemia, como a furosemida.
são as medicações com associação
mais importante. Essa medicação é
usada para tratar hipercalcemia e tem
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 12

MAPA MENTAL - ETIOLOGIA DA HIPOCALCEMIA (POSSÍVEIS ETIOLOGIAS DA HIPOCALCEMIA)

DRC ou IRA

Alterações no
Agenesia da paratireoide desenvolvimento da Hiperfosfatemia Rabdomiólise
glândula

Cirurgia Lise tumoral

Baixa ingesta, má absorção


Radiação ou pouca exposição solar
Deficiência ou
Destruição da glândula PTH diminuído ↓ resistência a Vit. D
Metástase Raquitismo e osteomalácia

Doenças infiltrativas Bifosfonatos

Hipocalcemia
Isolada Anticonvulsivante
ETIOLOGIA
Autoimunidade Medicações
Associada a doença Drogas antineoplásicas
poliglandular tipo I

Alterações genéticas do PTH Furosemida


PTH elevado ↑
Alteração dos receptores Pancreatite aguda
sensores do cálcio Diminuição da
função da paratireoide
Hipomagnesemia Doença grave

Síndrome do osso faminto Outras: Metástase osteoblástica

Pseudo-hipoparatireoidismo

Hiperventilação
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 13

4. CLÍNICA
SE LIGA! Os sinais de Trosseau e Ch-
As manifestações clínicas da hipocal- vostek são sinais de hiperexcitabilidade
cemia podem variar desde pacientes neuromuscular que podem ser encon-
assintomáticos até pacientes com trados em pacientes com hipocalcemia.
O sinal de Chvostek é testado com a
risco iminente de morte. Os princi-
percussão no nervo facial, quando este
pais sintomas são decorrentes da ir- passa logo em frente a orelha, a resposta
ritabilidade neuromuscular causada encontrada é a contração dos músculos
pelo baixo nível de cálcio. faciais ipsilaterais ao nervo testado que
podem variar desde espasmos labiais a
espasmos de todos os músculos faciais,
a depender da gravidade da hipocalce-
Irritabilidade neuromuscular e mia. Esse sinal acontece em cerca de
tetania 10% dos pacientes com hipocalcemia
(figura 4). O sinal de Trosseau é testado
A marca registrada da hipocal- quando um esfigmomanômetro é insu-
cemia aguda é a tetania. Ela pode flado acima da pressão arterial sistólica
começar se apresentando de forma do paciente, por 3 minutos, a resposta
será o espasmo do carpo, caracterizado
discreta com parestesias peri-orais por adução do polegar, flexão das arti-
e de extremidades, câimbras, po- culações metacarpofalangianas, exten-
dendo evoluir para espasmos mus- são das articulações interfalangeanas
culares e laringoespasmo levando a e flexão do punho (figura 5). O sinal de
Trosseau é mais específico que o sinal de
dificuldade respiratória e cianose. Os Chvostek, porém ambos podem ser ne-
sintomas tendem a acontecer quan- gativos em pacientes com hipocalcemia.
do o cálcio ionizado está abaixo de
4,0mg/dL ou cálcio total< 7,0 mg/
dL. Nos quadros iniciais com pares-
tesias, o paciente pode apresentar
ansiedade e hiperventilar, devido ao
aumento da frequência respiratória.
Essa hiperventilação pode levar ao
surgimento de alcalose respiratória
que agrava ainda mais o quadro de
parestesia. Os achados físicos clássi-
cos em pacientes com tetania são o
sinal de Trosseau e sinal de Chvos-
tek, que são melhores detalhados no
BOX SE LIGA, logo abaixo.
Figura 4. Sinal de Chvostek. Contração dos músculos
faciais ipsilaterais ao percutir o nervo facial anterior-
mente a orelha. Fonte: uptodate, 2019.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 14

HORA DA REVISÃO:
As crises epilépticas são exacerbações
paroxística de uma determinada função
cortical, que pode ser motora, sensitiva,
psíquica ou comportamental. As convul-
sões são exacerbações paroxísticas mo-
toras. Podemos classificar as crises epi-
lépticas em parciais (focais), quando há
descarga elétrica focal em área específi-
ca do córtex cerebral e generalizadas,
quando a descarga elétrica é difusa em
ambos os hemisférios. As crises parciais
podem ser simples ou complexas. Na
crise parcial simples podemos ter sin-
tomas sensitivos (parestesias, sintomas
Figura 5. O sinal de Trosseau. Espasmo do carpo indu- auditivo e olfatório), motores (abalos clô-
zido ao inflar o esfigmomanômetro acima da pressão nicos e crise tônica focal), autonômicos
sistólica por 3 minutos. Fonte: uptodate, 2019 ou psíquicos, sem perda da consciência.
Na parcial complexa há alteração do ní-
vel de consciência seguida de automa-
Convulsões tismo oroalimentar (mastigar, engolir) e
perseveração (movimentos repetitivos).
Convulsões também podem acon- As crises generalizadas podem ser de
vários tipos: ausência, tônico, clônico,
tecer nos quadros de hipocalcemia
tônico-clônico, mioclônicas e atôni-
e algumas vezes pode ser o único cas. Na crise de ausência, também cha-
sintoma apresentado pelo pacien- mada de pequeno mal, há lapsos curtos
te. Podem se apresentar tanto na for- e sucessivos de consciência, que podem
ocorrer várias vezes no dia. Na crise tô-
ma de crise de ausência, focais ou nico-clônica generalizada, chamada de
tônico-clônica generalizadas. Isso grande mal, há perda de consciência
acontece, pois, baixas concentrações desde o início. Na fase tônica há rigidez
de cálcio iônico no líquido cefalorra- do corpo, respiração prejudicada, acú-
mulo de secreções orais e elevação da
quidiano podem ter efeito convulsivo. Pressão arterial e frequência cardíaca.
Alguns distúrbios do movimento se- Na fase clônica há abalos musculares
melhante ao parkinsonismo também intercalados por períodos de relaxamen-
to com cessação gradual. São comuns a
podem acontecer como distonias, he-
salivação e a liberação do esfíncter uri-
mibalismo e coreoatetose que é uma nário. Na crise mioclônica há abalos clô-
sobreposição da atestose à coreia. nicos bilaterais sem perda de consciên-
cia. Na crise atônica há atonia súbita de
todo o corpo, levando a queda imediata,
ou só da cabeça, mantendo a consciên-
cia. Algumas crises podem iniciar de for-
ma parcial e depois generalizar.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 15

SE LIGA! A coreia consiste em movi-


mento involuntário, breves, rápido e não
suprimível, principalmente nos múscu-
los distais e da face (Figura 6). A ate-
tose, também chamada de coreia lenta,
é o movimento não-rítmico, lento, de
contorção em músculos distais (Figura
7). Quando eles ocorrem em conjunto
(coreoatetose), a atetose é uma distonia
sobreposta na coreia. A coreoatetose é
diagnosticada quando a coreia é acom-
panhada por movimentos lentos e con-
torcidos da extremidade afetada. Coreia
e atetose resultam da inibição preju-
dicada dos neurônios tálamocorticais
pelos gânglios basais, sendo o excesso
de atividade dopaminérgica o possível
mecanismo. O hemibalismo é um mo-
vimento unilateral rápido e violento com
arremesso descontrolável do braço ou Figura 7. Movimentos de atetose. Fon-
te: https://www.sciencedirect.com/topics/
perna, utilizando principalmente mus-
nursing-and-health-professions/hemiballism
culatura proximal (Figura 8). Pode ser
considerado uma forma grave de coreia.
As distonias são contrações muscula-
res involuntárias sustentadas de grupos
musculares antagônicos na mesma par-
te do corpo, levando à postura anormal
ou irregular.

Figura 6. Movimentos de coreia. Fonte: https://


www.memorangapp.com/flashcards/91827/
Movement+Disorders/ Figura 8. Hemibalismo. Fonte: https://www.scien-
cedirect.com/topics/nursing-and-health-professions/
hemiballism
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 16

Alterações cardiovasculares em casos raros e prolongamento do


intervalo QT no eletrocardiograma
Alterações cardiovasculares podem
(ECG) (Figura 9). O prolongamento do
estar presentes nos pacientes com
QT está associado a pós-despolari-
hipocalcemia, tais como hipotensão,
zações e arritmias. A disfunção mio-
prejuízo da função miocárdica po-
cárdica é reversível após a reposição
dendo levar a insuficiência cardíaca
de cálcio.

Figura 9. Hipocalcemia no ECG. Aumento do intervalo QT às custas do aumento do segmento ST. Fonte: YellowBook,
2019.

Alterações psiquiátricas e
papiledema
Nos casos de hipocalcemia grave, in-
dependente da origem, os pacientes
podem apresentar papiledema, que
é reversível com a correção do cálcio
(Figura 10). Associado ao papilede-
ma, embora raro, pode surgir neurite
óptica, ou seja, inflamação do nervo
óptico que cursa com diminuição da
acuidade visual. Manifestações psi-
quiátricas como ansiedade, depres-
são, confusão, alucinações e psicose
podem ocorrer nesses pacientes, mas
todos são reversíveis com tratamento.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 17

Figura 10. Na imagem da esquerda temos uma fundoscopia normal. Nervo óptico (seta azul), vasos sanguíneos (seta
verde) e mácula (seta vermelha). Na imagem à direita temos o inchaço do nervo óptico ao centro, denotando um Pa-
piledema .Fonte: https://repositorio.hff.min-saude.pt/bitstream/10400.10/855/1/PAPILEDEMA%20final%20Jan%20
2012.pdf

É importante salientar que os sinto- principais manifestações da hipocal-


mas da hipocalcemia dependem do cemia nos casos agudos e crônicos.
tempo de duração do distúrbio. Os
sintomas citados até agora, são carac-
AGUDA CRÔNICA
terísticos de hipocalcemia de instala-
Parestesias peri-orais e Calcificações ectópica
ção aguda. Porém, em pacientes que extremidades (gânglios da base)
possuem uma instalação insidiosa e Espasmos musculares Sinais extrapiramidais
mais crônica da hipocalcemia, podem Sinal de Chvostek Parkinsonismo
apresentar sintomas como alterações Sinal de Trosseau Demência
cutâneas como pele seca, hiperpig- Convulsões Catarata subcapsular
mentação, dermatites e eczemas, ca- Laringoespasmo Dentição anormal
taratas podem acontecer, tendo sua Broncoespasmo Pele seca
progressão diminuída após a corre- Intervalo QT prolongado
ção do cálcio, alterações dentárias, Arritmias
como defeitos de mineralização ós- Insuficiência cardíaca
sea e hipoplasia dentária, calcificação (raro)
ectópicas mais comum nos gânglios Papiledema
da base. Os sintomas de hipocalce- Tabela 2. Manifestações clínicas da hipocalcemia.
Adaptado de: uptodate, 2019
mia crônica são mais comuns em
pacientes com hipoparatireoidismo.
Na tabela abaixo, você encontrará as
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 18

MAPA MENTAL - CLÍNICA DE HIPOCALCEMIA (ACHADOS CLÍNICOS DA HIPOCALCEMIA)

Parestesias peri-orais
e extremidades
Alucinações
Papiledema e
neurite óptica Câimbras

Psicose

Sinal de Chvostek
Achados
Alterações Irritabilidade
Ansiedade clínicos
psiquiátricas Neuromuscular/tetania
Hipocalcemia
Sinal de Trosseau

Confusões

Alterações Laringoespasmo
Convulsões
cardiovasculares
Depressão

Espasmos musculares
Crises focais Arritmias

Crise tônico-clônico
Prolongamento de QT
generalizada

Crise de ausência Insuficiência cardíaca


DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 19

5. EXAMES Dosagem de fosfato


COMPLEMENTARES A hipofosfatemia num paciente com
O primeiro passo na avaliação diag- hipocalcemia direciona para um ex-
nóstica da hipocalcemia, é se certi- cesso de PTH, já que esse hormônio
ficar que o paciente realmente está é responsável pelo aumento da ex-
com níveis de cálcio baixo. O essen- creção renal de fósforo, sugerindo um
cial é a dosagem do cálcio ionizável, hiperparatireoidismo secundário ou
responsável pelos sintomas da hipo- dieta muito pobre em fósforo (raro).
calcemia, porém nem todos os ser- A hiperfosfatemia é a marca regis-
viços podem realizar tal exame, lan- trada nos casos de doença renal crô-
çando mão de utilizar a dosagem de nica e situação de destruição celular
cálcio total. A dosagem de cálcio total (rabdomiólise e lise tumoral), quando
possui limitações nos pacientes que não há nenhuma dessas situações, a
cursam com hipoalbuminemia, pois hiperfosfatemia pode indicar hipopa-
estes podem apresentar hipocalce- ratireoidismo (deficiência de PTH) ou
mia laboratorial sem cursar, de fato, pseudo-hipoparatireoidismo (resis-
com a hipoalbuminemia. Por isso, tência ao PTH). Em ambas as situa-
nesses casos é necessário a correção ções, haverá deficiência na excreção
do cálcio pela albumina, pela fórmula renal do fosfato, já que esta é uma
citada anteriormente. função do PTH.
O segundo passo na avaliação diag-
nóstica é a determinar a etiologia da Dosagem de PTH
hipocalcemia, para que se possa tra-
tar a causa base. Para ajudar na de- A dosagem do PTH é importante na
terminação da etiologia é necessá- definição etiológica do hipocalcemia.
rio a solicitação de outros eletrólitos Mas é importante lembrar que ele
como magnésio e fósforo, dosagem deve ser dosado no mesmo momento
do PTH, metabólitos da vitamina D do cálcio, pois em momentos diferen-
(calcidiol e calcitriol), creatinina sé- tes pode ser interpretado incorreta-
rica, fosfatase alcalina e amilase. A mente. A hipocalcemia é o estímu-
hipomagnesemia pode induzir resis- lo mais potente para o aumento do
tência ou deficiência de PTH, levando PTH, portanto, se há diminuição do
a hipocalcemia que pode ser corrigida PTH diante de um quadro de hipocal-
em minutos ou horas após a reposi- cemia, devemos pensar em hipopara-
ção de magnésio. tireodismo primário. Em contrapartida
o PTH se encontra elevado nos qua-
dros de DRC, deficiência de Vitamina
D e pseudo-hipoparatireoidismo.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 20

Dosagem de Vitamina D e seus pacientes haverá deficiência de cal-


metabólitos citriol, pois o rim é o responsável por
sua produção, enquanto que os níveis
Em relação a vitamina D, pode ser fei-
de calcidiol estão normais. A defici-
to a dosagem do calcidiol (25 hidro-
ência de Vitamina D leva a hipocal-
xi- vitamina D) e do calcitriol (1,25
cemia e hipofosfatemia, já que ela é
hidroxi-vitamina D). A deficiência do
a responsável pela absorção desses
calcidiol, em pacientes com hipocalce-
dois íons, consequentemente haverá
mia, indica baixa absorção ou ingesta
aumento do PTH na tentativa de cor-
de Vitamina D. Já a deficiência de cal-
rigir a calcemia, além disso os níveis
citriol, com calcidiol normal, indica pre-
de fosfatase alcalina estão bastante
sença de doença renal crônica.
elevados e a função renal normal.
Além dos exames citados, existem ou-
Fosfatase alcalina e Amilase tros que podem apresentar alterações.
Uma fosfatase alcalina elevada é co- Como já vimos, no ECG pode ser en-
mum nos quadros de osteomalácia, contrado prolongamento do intervalo
como resultado de grave deficiência QT, além de prolongamento de QRS e
de vitamina D, e pode ocorrer com me- alterações de segmento ST com me-
tástases ósseas osteoblásticas, que nor frequência. A tomografia de crânio
podem causar hipocalcemia devido a pode mostrar calcificação nos gânglios
rápida deposição de cálcio nas metás- da base, nos pacientes como hipocal-
tases ósseas. A amilase estará eleva- cemia crônica (figura 10).
da nos casos de pancreatite aguda.
Diante disso, nos pacientes com hipo-
paratireoidismo, o cálcio encontrado é
baixo, o PTH é baixo ou indetectável,
o fósforo está elevado, e as concen-
trações de calcidiol ou calcitriol em
geral estão normais. Em contraste,
nos pacientes com pseudo-hipopara-
tireoidismo apesar de ter um quadro
laboratorial semelhante, possui níveis
de PTH elevado, devido à resistên-
cia de sua ação nos tecidos-alvo. Os
pacientes com DRC terão o fósforo
Figura 10. Tomografia de crânio mostrando área de
elevado, pela baixa depuração renal hiper densidade (seta vermelha), devido calcificação
nos núcleos da base. Fonte: http://revistaneurociencias.
desse íon, além de apresentar PTH e com.br/edicoes/1999/RN%2007%2001/Pages%20
creatinina também elevados. Nesses from%20RN%2007%2001-5.pdf
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 21

MAPA MENTAL - DIAGNÓSTICO HIPOCALCEMIA (INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA NA HIPOCALCEMIA)

DOSAR P E MG

↓P ↑P Alteração no Mg

Resistência ao PTH
Dieta muito deficiente Hipoparatireoidismo Verificar função renal e diminuição de sua
em fósforo secundário secreção

Dosar vitamina D e
Alterada Normal
metabólitos

Calcidiol normal IRC PTH


Calcidiol
trocar ↓ trocar
Calcitriol ↓

Dieta deficiente em ↑
IRC e osteomalácia N ou ↓
Vitamina D

Pseudo-
Hipoparatireoidismo
hipoparatireoidismo

Tratar conforme a causa, se sintomas graves, iniciar reposição de cálcio EV


DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 22

6. DIAGNÓSTICO 8-8,5mg/dL e o cálcio iônico > 3,2


DIFERENCIAL mg/dL, na maioria dos casos o pa-
ciente é assintomático ou apresen-
A hipocalcemia pode ter uma gama
te sintomas leve como parestesias
de diagnósticos diferenciais, por seu
peri-orais. Nesses quadros a repo-
quadro clínico envolver múltiplos sis-
sição de cálcio pode ser feita pela
temas. Em relação a hiperexcitabi-
dieta associada a apresentações de
lidade neuromuscular, alguns diag-
via oral, com uma dose de 1500mg
nósticos possíveis seriam tétano,
a 2000mg de cálcio elementar, que
miotomias e a hipertermia malignas.
pode ser oferecido através do carbo-
No tétano seria esperado uma histó-
nato de cálcio (possui 40% de cálcio
ria compatível com algum ferimento
elementar) ou citrato de cálcio (pos-
provocado por objetos contaminados;
sui 21% de cálcio elementar). O car-
a miotomia pode ser diagnosticada
bonato de Ca de 1250 mg possui
através de uma eletromiografia; e a
500mg de cálcio elementar, podendo
hipertermia maligna como o próprio
ser usado de 3 vezes no dia. O citra-
nome diz é acompanhada de hiper-
to de cálcio de 2370mg, equivale a
termia e pode acontecer em pacientes
500mg de cálcio elementar, e não há
após uso concomitante de relaxante
superioridade entre um ou outro.
muscular e anestésico geral inalan-
te. A hipocalcemia também entra no
diagnóstico diferencial de distúrbios Hipocalcemia sintomática
extrapiramidais, convulsões e qua-
Na hipocalcemia sintomática aguda
dros agudos de insuficiência cardíaca.
grave, deve-se fazer uso de cálcio
intravenoso. Os pacientes elegíveis
7. TRATAMENTO para cálcio IV são: pacientes sinto-
máticos, com alteração no ECG (por
O tratamento da hipocalcemia vai de-
exemplo prolongamento de QT) ou
pender do nível do cálcio e da gravi-
pacientes com diminuição aguda de
dade dos sintomas.
cálcio para ≤7,5mg/dL, pois esses
pacientes podem evoluir gravemente
Hipocalcemia leve e se não forem tratados. A droga mais
assintomáticos comumente usada é o gluconato de
cálcio 10%, na dose de 1 a 2g diluído
Dizemos que a hipocalcemia é leve em 50mL de solução de glicose 5%
quando temos um cálcio total entre (SG5%) e infundido em 20 minutos.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 23

É importante q seja feita a diluição do transicionado para cálcio oral e trata-


gluconato, pois as soluções concen- mento conforme a etiologia da hipo-
tradas de cálcio são irritativas para as calcemia. É importante lembrar que
veias. a infusão de cálcio não deve ser rea-
O gluconato possui meia vida curta, lizada de forma rápida, pelo risco de
portanto, após a infusão em bolus, se arritmias e até mesmo de parada car-
a hipocalcemia se mantiver persisten- díaca. Se for necessário utilizar subs-
te, deve-se manter uma infusão con- tâncias como bicarbonato e fosfato,
tínua e lenta de cálcio, com 110mL de estas devem ser administradas por
gluconato de cálcio 10% (correspon- outro acesso venoso, pois em conta-
dente a 11g de gluconato que possui to com o cálcio podem precipitar sais
1000mg de ferro elementar) diluído insolúveis.
em 890mL de SG 5% ou SF 0,9% Uma outra opção que pode ser usada
(totalizando 1000 mL), a solução fi- é o cloreto de cálcio, onde a cada 1g
nal terá concentração de 1mg/mL temos 270mg de cálcio. O gluconato
de cálcio elementar. Deve-se iniciar é preferido na maioria das vezes pois
infusão com 50 mL/h, e ajustar para tem menor chance de provocar ne-
manter a calcemia no limite inferior crose tecidual, caso seja extravasado.
da normalidade. Os pacientes geral- Devemos ficar atentos aos pacien-
mente requerem 0,5-1,5mg/kg/h de tes em uso de digoxina, pois há uma
cálcio elementar. A infusão contínua maior probabilidade de intoxicação
deve ser progressivamente diminuída digitálica nesses pacientes após a in-
com a normalização do cálcio, sendo fusão de cálcio.

CÁLCIO DURAÇÃO DO
FORMULAÇÃO DILUIÇÃO INFUSÃO
ELEMENTAR EFEITO
Gluconato de Ca 1-2g (10-20ml) +
90mg/10mL 10-20min (infusões
10% SG5% 100ml Transitório (2 a 3
mais rápidas  de-
1-2g (10-20ml) + horas)
Cloreto de Ca 10% 270mg/10mL pressão miocárdica)
SG5% 100ml
Obs: Gluconato é preferível ao cloreto de cálcio pelo de necrose tecidual se houver extravasamento.
Se houver hipocalcemia persistente, manter infusão lenta de cálcio; diluir gluconato 10% 110mL em 890mL
de SF 0.9% ou SG 5% (1mg/ml de cálcio elementar); iniciar a 50 mL/h; ajustar para manter calcemia no limite
inferior da normalidade. Geralmente os pacientes precisam de 0,5-1,5mg/kg/h de cálcio elementar.
Tabela 3. Reposição endovenosa de Cálcio. Fonte: Medicina de emergência USP, 2019.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 24

Nos pacientes sintomáticos também


é recomendado a reposição de vita-
mina D em dose de 0,25 a 0,5 mi-
crogramas ao dia do calcitriol, pois o
início de sua ação é rápido. Os pa-
cientes com hipomagnesemia devem
ter esse eletrolítico corrigido, pois ele
é responsável pela indução da resis-
tência e diminuição de PTH. A reposi-
ção é realizada na dose de 2g de sul-
fato de magnésio (2 ampolas a 10%,
de 10mL) em 100mL de salina fisio-
lógica em 10 minutos.
Nos pacientes com doença renal
crônica, raramente a hipocalcemia é
sintomática. A maior preocupação
na DRC não é a hipocalcemia e sim
os distúrbios do metabolismo ósseo.
Inicialmente pode ser utilizado que-
lantes de fósforo como carbonato de
cálcio, via oral, em paciente com hipo-
calcemia. Além disso, esses pacientes
devem fazer reposição de vitamina D
com calcitriol.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 25

MAPA MENTAL – TRATAMENTO HIPOCALCEMIA

Sulfato de Mg :
TRATAMENTO DA Se hipomagnesemia
2g em 100ml de
HIPOCALCEMIA associada
SF0,9% em 10 min

Sintomáticos, alteração
Assintomático DRC
no ECG ou Ca<7,5

Opção: Cloreto de cálcio Gluconato de Ca 10%, O carbonato de Ca de 1250mg O carbonato de Ca de 1250mg


10%, 10-20Ll (1-2g) em 10-20ml (1-2g), IV em (500mg de CE), VO 3x ao dia. (500mg de CE), VO 3x ao dia
50Ll de SG 5% em 20 min 50ml de SG5% em 20min

Infusão contínua 110mL Opção: Citrato de cálcio


de gluconato (11g) + 890 mL de 2370mg (500mg de CE), Calcitriol 0,25-0,5 mcg/dia
de SG 5%: infusão 50mL/h 3x ao dia.

Calcitriol 0,25-0,5 mcg/dia


DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 26

8. COMPLICAÇÕES
Pacientes com hipocalcemia prolon-
gada pode ter como complicações
a calcificação dos gânglios da base,
que podem levar a sintomas extra-
piramidais, como distúrbios do movi-
mento. Convulsões e quadros de in-
suficiência cardíaca podem acontecer
em quadros de hipocalcemia grave,
e em casos eventuais podem ocorrer
parada cardiorrespiratória.

9. INDICAÇÕES DE
INTERNAÇÃO, ADMISSÃO
NA UTI E SEGUIMENTO
Os pacientes com hipocalcemia sin-
tomática grave têm critérios de in-
ternação para que possa ser feita a
reposição de cálcio endovenoso. Ra-
ramente esses pacientes necessitam
de UTI, a não ser com os casos que
cursam com laringoespasmo, arrit-
mias graves e convulsões reentran-
tes. Em relação ao seguimento ambu-
latorial, ele deve ser decidido a partir
da etiologia da hipocalcemia.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 27

MAPA MENTAL – GERAL DA HIPOCALCEMIA

PTH elevado Corrigir pela albumina Irritabilidade Neuromuscular /tetania


em hipoalbuminemia
DRC ou IRA Lise tumoral Sinal de Chvostek Espasmos musculares

Pseudo- Cálcio total Cai < 4,6mg/dL Sinal de Trosseau Câimbras


hipoparatireoidismo Hiperventilação
<8,5mg/dL
Laringoespasmo Parestesias peri-orais e
Deficiência ou Metástase extremidades
resistência a Vit. D osteoblástica
Alterações cardiovasculares
Medicações Doença grave Definição
Insuficiência Prolongamento
Arritmias
cardíaca de QT
Rabdomiólise Pancreatite aguda
Convulsões

PTH diminuído Etiologia Etiologia Crise de ausência

Crise tônico-clônico
Hipoparatireoidismo generalizada
Exames
Tratamento Crises focais
Radiação complementares

Destruição Fosfatase alcalina Alterações psiquiátricas


Cirurgia Sintomáticos, alteração
Amilase no ECG ou Ca<7,5 Ansiedade
Doenças Assintomático DRC
infiltativas
Cálcio ionizado Gluconato de Ca 10%, 10- Depressão
Metástase 20mL (1-2g), IV em 50mL O carbonato de O carbonato de
ECG de SG 5% em 20min Ca de 1250mg Ca de 1250mg Psicose
Destruição Vitamina D (500mg de CE), (500mg de CE),
Infusão contínua na dose
autoimune VO 3x ao dia. VO 3x ao dia Confusões
de 0,5-1,5mg/kg/h de
Fósforo ferro elementar
Diminuição da função da Opção: Citrato de
paratireoide Opção: Cloreto de cálcio cálcio de 2370mg Calcitriol Alucinações
PTH 0,25-0,5
10%, 10-20ml (1-2g) em (500mg de CE),
50mL de SG 5% em 20 min mcg/dia Papiledema e neurite óptica
Magnésio 3x ao dia
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 28

HIPERCALCEMIA Nos casos de hipoalbuminemia, o cál-


cio pode estar falsamente baixo de-
vido a redução da albumina, sendo
1. INTRODUÇÃO necessária a correção pela fórmula do
cálcio pela albumina. Quando há hi-
A hipercalcemia é definida como uma peralbuminemia, como nos casos de
concentração sérica de cálcio total > desidratação grave, pode haver um
10,5 mg/dL (2,5 mmol/L) ou de cálcio aumento do cálcio total, com cálcio
iônico > 5,3 mg/dL (1,32mmol/L). Ela ionizado normal, levado ao que cha-
pode ser classificada em leve, mode- mamos de pseudo-hipercalcemia. O
rada e grave. cálcio iônico não sofre influência da
• Leve: Cálcio total >12mg/dL; Cál- hipoalbuminemia. Distúrbios ácido-
cio iônico até 6mg/dL (1,5mmol/L) -base também interferem nos valores
de cálcio, pois a ligação do cálcio às
• Moderada: Cálcio total 12-14mg/
proteínas é pH-dependente. Na al-
dL; Cálcio iônico de 6 a 7 mg/dL
calose há um aumento da ligação do
(1,5 a 1,75 mmol/L)
cálcio às proteínas, causando uma di-
• Grave: Cálcio total > 14md/dL; minuição aguda do cálcio iônico.
Cálcio iônico >7mg/dL (3,5mmol/L)
SE LIGA! O cálcio no soro está ligado
a proteínas, principalmente a albumina,
A hipercalcemia resulta de distúr- como resultado, os casos com hipoal-
bios na homeostase que levam a buminemia ou hiperalbuminemia pode
maior influxo de cálcio para corren- não refletir com precisão a fração fisio-
te sanguínea, seja pelo aumento na logicamente importante do cálcio (cál-
cio iônico). Portanto, em tais condições,
reabsorção óssea, aumento na ab- faz-se necessário fazer a correção do
sorção intestinal ou diminuição na cálcio total pela albumina através da fór-
excreção renal de cálcio. mula abaixo. Cada redução de 1g/dL na
concentração sérica de albumina reduz
O diagnóstico é feito preferencial- aproximadamente 0,8 mg/dL do cálcio
mente a partir da dosagem do cálcio total. Para facilitar, basta aplicar a fór-
iônico, pois alguns fatores interferem mula abaixo:

no valor do cálcio total, tais como, FÓRMULA  Cálcio corrigido: Cálcio


medido + [(4,0-albumina em g/dL) x
proteínas séricas, gamopatias mono- 0,8.
clonais (exemplo: mieloma múltiplo),
desidratação, distúrbios ácido-base e
modo de coleta. Parte do cálcio san-
guíneo está ligado a proteínas séricas,
sendo a albumina a mais importante.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 29

2. ETIOLOGIA atrás apenas de diabetes mellitus e


hipotireoidismo. É mais comum em
As causas de hipercalcemia são va-
mulheres, cerca de 2 a 3 vezes, e em
riadas e podem ser dividas em 6
idosos (>65 anos), e a maioria se en-
grandes grupos:
contra assintomático na ocasião do
• Hipercalcemia com PTH elevado diagnóstico. Em 80% dos casos, o
hiperpara1º é causado por adeno-
• Hipercalcemia da malignidade
mas solitários (somente uma glân-
• Doenças granulomatosas dula é atingida), em 15% é devido a
hiperplasia das paratireoides, 5% dos
• Doenças endocrinológicas
casos é por adenoma múltiplos, em
• Medicamentos mais de uma glândula, e muito rara-
• Outras causas mente (0,5%) pode ser causado por
carcinoma de paratireoides. Pacien-
tes com hiperpara1º têm secreção
Na hipercalcemia, 90% dos casos aumentada de PTH, que é responsá-
resultam de hiperparatireoidismo vel pela ativação dos osteoclastos e
primário (aumento do PTH), mais consequente reabsorção óssea, com
comuns em paciente ambulatoriais e aumento da calcemia.
neoplasias, principalmente pulmão, O hiperparatireoidismo terciário surge
mama, mieloma e linfomas, mais em pacientes com doença renal crô-
comum em pacientes internados. A nica de longa data, nos quais há hi-
maioria das causas de hipercalce- perplasia das paratireoides que pode
mia são decorrentes de reabsorção progredir gradualmente para a pro-
óssea, devido a maior ativação de dução autônoma de PTH que não é
osteoclastos. suprimível por concentrações séricas
elevadas de cálcio. O PTH, a partir de
Hipercalcemia com PTH elevado suas ações nos ossos, rins e intestino
indiretamente, leva a hipercalcemia.
Dentro desse grupo temos o hiper-
paratireoidismo primário (principal), A hipercalcemia hipocalciúria familiar
hiperparatireoidismo terciário, hiper- (HHF) é um distúrbio genético raro,
calcemia hipocalciúrica familiar e uso que resulta na mutação do sensor de
de lítio. cálcio nas paratireoides que se torna
menos sensível ao cálcio sanguíneo,
O hiperparatireoidismo primário (hi- sendo necessário altos níveis de cál-
perpara1º) é uma endocrinopatia re- cio para supressão da liberação do
lativamente comum, há cerca de 1 a PTH. Esses pacientes também pos-
7 casos por 1.000 adultos, ficando suem dificuldade em excreção do
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 30

cálcio pelos rins, por isso chamada hi- • Metástases ósseas osteolíticas:
pocalciúrica. Assim como no hiperpa- as metástases ósseas liberam ci-
ra 1º, a HHF cursa com hipercalcemia tocinas e outros fatores que levam
e hipofosfatemia, e o que diferencia à ativação dos osteoclastos e au-
as duas, é a calciúria, que no hiperpa- mento da reabsorção óssea, com
ra 1º costuma ser >200mg em 24h, e hipercalcemia. É o segundo meca-
na HHF <100mg em 24h. nismo mais comum.
Pacientes usuários crônicos de lítio, • Produção de 1,25-hidroxi vita-
podem desenvolver hipercalcemia mina D pelas células neoplási-
leve, pelo aumento do PTH provoca- cas: esse mecanismo é comum em
do pelo aumento do ponto de ajuste linfomas, que podem levar à pro-
no qual o cálcio suprime a liberação dução de vitamina D pelas células
do PTH. Na maioria dos casos, a hi- linfoides e, consequentemente,
percalcemia melhora com a desconti- levar ao aumento da absorção in-
nuação do uso do medicamento. testinal de cálcio. Representa <1%
dos casos.
Hipercalcemia da malignidade • Produção paraneoplásica de
PTH semelhante ao natural (PTH
A presença de hipercalcemia em pa-
símile): é quando há produção de
cientes com neoplasias, indicam pior
PTH semelhante ao endógeno pe-
prognóstico. São vários os motivos
las células neoplásicas, porém é
que podem causar hipercalcemia nes-
um evento extremamente raro.
ses pacientes, veremos um por um.
• Produção de peptídeo relaciona-
do ao PTH (PTH-rp): esse peptí- Doenças Granulomatosas
deo mimetiza os efeitos do PTH, Doenças granulomatosas, infeccio-
e, portanto, leva a hipercalcemia sas ou não, podem levar ao aumen-
por aumento da reabsorção ós- to da hipercalcemia pela maior pro-
sea, aumento da reabsorção re- dução de 1,25-hidroxi- Vitamina D
nal e produção de vitamina D que e aumento da absorção intestinal de
irá aumenta a absorção intestinal, cálcio. São exemplos de doenças in-
e causa também hipofosfatemia fecciosas tuberculose, hanseníase,
pelo aumento da excreção renal de histoplasmose e outras doenças fún-
fosfato. Esse é o mecanismo mais gicas, e de não infecciosas, sarcoi-
comum nas neoplasias, e acaba le- dose, granulomatose de Wegener e
vando a diminuição do PTH natu- granuloma eosinofílico.
ral endógeno.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 31

Doenças endocrinológicas como o bicarbonato de sódio. Essa


síndrome é caracterizada por hiper-
No hipertireoidismo, devido ao au-
calcemia, alcalose metabólica e in-
mento geral do metabolismo, temos
suficiência renal. A alcalose piora a
também aumento do turnover ósseo.
hipercalcemia, ao atuar diretamente
A triiodotironina (T3) é um hormônio
na reabsorção de cálcio pelos túbulos
que aumenta a atividade osteoclás-
renais. O cálcio se torna tóxico para
tica, e, portanto, o hipertireoidismo
os rins, devido a indução de vaso-
pode ser uma causa de hipercalcemia
constrição renal, levando a declínio
sem aumento do PTH. O feocromoci-
da função renal. A função renal ten-
toma é um tumor secretor de cateco-
de voltar à normalidade após a inter-
laminas, localizado na glândula adre-
rupção do uso de tais medicamentos,
nal. Nesses pacientes pode haver a
porém, lesões irreversíveis podem ser
produção de peptídeo relacionado ao
causadas aos rins, se hipercalcemia
PTH pelas células neoplásicas, levan-
prolongada. O uso exagerado de vita-
do a um quadro de hipercalcemia. A
mina D, pode levar a Hipervitaminose
insuficiência adrenal, seja ela primária
D com aumento da calcemia devido
ou secundária, pode levar a hipercal-
maior absorção intestinal de cálcio.
cemia pelo aumento da reabsorção
Outros medicamentos que também
óssea. O que justifica o aumento da
estão associados a hipercalcemia
reabsorção óssea é a maior atividade
são: teofilina, ganciclovir, antiestrogê-
dos hormônios tireoidianos, que não
nicos (tamoxifeno), hormônio de cres-
são suprimidos pelos glicocorticoides
cimento e intoxicação por vitamina A.
que não estão sendo produzidos pela
adrenal.
Outras causas
Medicações Outras causas menos comuns de
hipercalcemia, que acontecem pelo
Algumas medicações também po-
mecanismo de reabsorção óssea são
dem causar hipercalcemia. O diuréti-
a imobilização, doença de Paget, uma
co tiazídico pode levar ao aumento da
doença osteometabólica focal com
reabsorção renal de cálcio, levando
forte componente genético caracte-
a um quadro de hipercalcemia com
rizada por aumento da remodelação
hipocalciúria. A síndrome leite-alcali
óssea que afeta um ou mais sítios do
pode ser desencadeada pela ingesta
esqueleto e doença de Jansen, uma
exagerada de cálcio (através de leite
condrodisplasia metafisária que se
ou de carbonato de cálcio por exem-
manifesta por nanismo com membros
plo, muito utilizado no tratamento da
curtos, hipercalcemia e hipercalciúria.
osteoporose) e álcalis absorvíveis,
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 32

MAPA MENTAL – ETIOLOGIA HIPERCALCEMIA (POSSÍVEIS ETIOLOGIAS DA HIPERCALCEMIA)

Outros fungos

Produção de Metástases
1,25hidroxi-vit D ósseas líticas Histoplasmose
Tiazídico Infecciosa
Hanseníase
Produção de Produção de
Ganciclovir PTH símile PTH-rp
Tuberculose

Malignidade Granuloma
Não-infecciosa
Teofilina eosinofílico
Granulomatose de
Wegener
Antiestrogênicos Doenças
Medicamentos
GH granulomatosas Sarcoidose
ETIOLOGIAS
Hipercalcemia
Uso excessivo de Causas dependente
Vit D e Vit A Outras causas
de PTH
Adenomas

Síndrome leite-alcali Imobilização Hiperpara 1º Hiperplasia


Doenças
endocrinológicas
Carcinoma
Doença de Jansen
Ingestão de Lítio
Cálcio + alcalis Feocromocitoma

Doença de Paget
Hiperpara 3º DRC associada
Insuficiência adrenal

HHF Calciúria <100mg


Legenda: Hiperpara: hiperparatireoidismo. HHF: em 24h
Hipercalcemia, hipocalciúrica familiar. DRC: Hipertireoidismo
doença renal crônica; vit. D: vitamina D; PTH-rp:
peptídeo relacionado ao PTH.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 33

3. CLÍNICA tônus muscular liso que levam ao re-


laxamento da musculatura lisa, sendo
A maioria dos pacientes com hipercal-
a constipação o achado mais comum,
cemia são assintomáticos, e acabam
podendo, porém, estar associado a
tendo o diagnóstico devido ao achado
náuseas, vômitos e anorexia. Podem
laboratorial. Na grande maioria dos ca-
ocorrer quadros de dor abdominal
sos esses pacientes possuem hiper-
possivelmente causados pela própria
paratireoidismo primário. Os sintomas
constipação, neoplasia de base ou até
e sinais decorrentes da hipercalcemia
mesmo por complicações como úlcera
dependem da velocidade do aumen-
péptica e pancreatite. Os mecanismos
to do cálcio e da causa subjacente. Em
propostos para ocorrência de pancre-
pacientes com câncer, o paciente pode
atite nesses pacientes, se deve à de-
apresentar sintomas da neoplasia que
posição do cálcio nos ductos pancre-
possui, porém podem existir casos em
áticos e ativação do tripsinogênio pelo
que a síndrome paraneoplásica de hi-
cálcio no parênquima pancreático. Já
percalcemia é a primeira manifestação
em relação a doença ulcerosa péptica,
da doença. De uma forma geral, os
o mecanismo parece ser o aumento na
pacientes com hipercalcemia podem
secreção de gastrina e consequente
apresentar sintomas inespecíficos
aumento de ácido clorídrico.
como letargia, fraqueza muscular (co-
mum e presente em 50% dos casos),
confusão mental, anorexia, náuseas, SE LIGA! A hipercalcemia crônica pos-
sui relação com a doença ulcerosa pép-
vômitos, constipação, poliúria e poli- tica, principalmente nos casos de hiper-
dipsia. A hipercalcemia atinge alguns paratireoidismo primário. Sabe-se que
sistemas de forma importante, e ve- pacientes com hiperparatireoidismo têm
remos cada um separadamente, mas incidência de 15-20% de doença ulce-
rosa péptica; portanto, muito maior que
antes, é importante salientar que du- a população normal. Não se sabe se
rante o quadro de hipercalcemia, prin- outras situações de hipercalcemia são
cipalmente crônico, o paciente pode associadas com aumento de doença
ulcerosa. A doença ulcerosa péptica se
desenvolver complicações tais como
desenvolve nesses pacientes pelo fato
desidratação, nefrolitíase, nefrocalci- de o cálcio induzir aumento na secre-
nose, insuficiência renal, hipertensão, ção de gastrina, hormônio que estimula
arritmias cardíacas, úlceras pépticas, a secreção de ácido clorídrico. Obser-
vou-se que em pacientes com neoplasia
pancreatite e até coma. endócrina múltipla tipo 1 (MEN1) com
síndrome de Zollinger-Ellison coexis-
tente e hiperparatireoidismo, apenas a
Manifestações gastrointestinais paratireoidectomia levou a uma redução
significativa nas concentrações séricas
As manifestações gastrointestinais de gastrina e secreção ácida.
são decorrentes da diminuição do
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 34

Manifestações neuropsiquiátricas
SE LIGA! Quando o nível de cálcio nos
Distúrbios neuropsiquiátricos leves
líquidos corporais se eleva acima do nor-
podem ser encontrados nos pacien- mal, o sistema nervoso fica deprimido e
tes com hipercalcemia, sendo os mais as atividades reflexas do sistema nervo-
comuns: ansiedade, depressão, dis- so central são lentificadas. Além disso,
o aumento da concentração do cálcio
funções cognitivas e alterações de iônico diminui o potencial de ação do
concentração e memória. Quadros miocárdio levado a um intervalo QT di-
mais graves tais como letargia, confu- minuído (figura 12).
são, estupor e coma podem acontecer
em pacientes com hipercalcemia gra-
ve (cálcio >14mg/dL) e com aumento
rápido das concentrações de cálcio.

Figura 12: Hipercalcemia no ECG. Diminuição


do intervalo QT às custas de diminuição do seg-
Manifestações cardiovasculares mento ST. Fonte: YellowBook, 2019.

A hipercalcemia aguda diminui dire-


tamente o potencial de ação do mio-
Manifestações Renais
cárdio, refletindo na diminuição do
intervalo QT. Arritmias são relatadas As manifestações renais mais impor-
em casos de hipercalcemia grave, tantes são poliúria, nefrolitíase e in-
sendo as mais comuns a bradicardia suficiência renal aguda e crônica. A
sinusal e bloqueio atrioventricular de hipercalcemia crônica pode levar a
primeiro grau. A hipercalcemia crôni- dificuldade de concentração da urina,
ca, como ocorre nos casos de hiper- pela regulação negativa dos canais de
paratireoidismo primário, pode levar a aquaporina-2 e depósito de cálcio na
deposição de cálcio nas válvulas car- medula renal com lesão tubulointers-
díacas, artérias coronárias e fibras do ticial secundária. Tal mecanismo leva
miocárdio, podendo levar a quadros ao quadro de poliúria e polidipsia em
de hipertensão e cardiomiopatia. 20% dos casos, caracterizando um
quadro de diabetes insipidus nefro-
gênico. Raramente, a acidose tubular
renal do tipo 1 também pode ocorrer.
A nefrolitíase também é resultante de
uma hipercalcemia mais prolongada
tanto nos casos de hiperparatireoidis-
mo primário, como em sarcoidose, por
ocasionarem uma hipecalciúria crô-
nica, levando a formação de cálculos.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 35

Quanto mais grave a hipercalcemia e


mais duradora, maior a probabilidade SE LIGA! A Osteíte fibrosa cística é a
de o paciente desenvolver insuficiên- manifestação clássica da doença óssea
do hiperparatireoidismo primário. É ca-
cia renal. Elevadas concentrações de
racterizada alta rotatividade óssea, de-
cálcio podem levar a uma queda da vido aumento do PTH. Clinicamente se
taxa de filtração glomerular media- apresenta com dor óssea e radiografi-
da por vasoconstrição renal direta ou camente por reabsorção óssea subpe-
riosteal que pode se apresentar sob
contração de volume induzido por na- várias formas como, aspecto radial das
triurese (aumento da excreção urinária falanges médias (figura 13A), afuni-
de sódio). A hipercalcemia e hipercal- lando as clavículas distais (figura 13B),
ciúria crônicas podem levar a calcifica- uma aparência de “sal e pimenta” do
crânio (figura 14), cistos ósseos e tu-
ção, degeneração e necrose das célu- mores marrons dos ossos longos (fi-
las tubulares e eventual atrofia tubular gura 15). Os tumores marrons resultam
e fibrose intersticial e calcificação (ne- da atividade excessiva dos osteoclastos
e consistem em coleções de osteoclas-
frocalcinose), sendo essa última mais
tos misturados com tecido fibroso e teci-
comum nos casos de sarcoidose do do ósseo mal mineralizado. A coloração
que hiperparatireoidismo primário. marrom é devida à deposição de he-
mossiderina. Essa apresentação não é
muito comum e ocorre mais tipicamente
Manifestações Osteomusculares em pacientes com doença grave, prin-
cipalmente naqueles com carcinoma da
Nos quadros clínicos de hiperparati- paratireoide.
reoidismo primário pode surgir pro-
funda fraqueza muscular e miopatias,
mas a maioria dos pacientes apre-
sentam-se apenas com leve fraqueza
muscular ou sem sintomas muscula-
res. Pacientes com hiperparatireoidis-
mo primário crônico são associados
Figura 13: Achados da osteíte fibrosa cística na
com uma doença esquelética conhe- tomografia de falanges (A) e clavícula (B). (A) A
cida como osteíte fibrosa cística. Ela é vista em detalhes das mãos mostra reabsorção
subperiosteal nas falanges (setas). (B) Vista
caracterizada pela reabsorção subpe- detalhadas das duas clavículas distais mostram
riosteal das falanges distais, atinge reabsorção subcondral bilateralmente (setas).
Fonte: uptodate, 2018.
as regiões distais da clavícula e no
crânio tem a aparência classicamen-
te descrita como “sal e pimenta’; em
ossos longos forma cistos ósseos, os
chamados tumores marrons.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 36

Crise hipercalcêmica
A crise hipercalcêmica é a apresenta-
ção clínica de maior gravidade, sen-
do a desidratação intensa o achado
mais comum. Quando associados a
Figura 14: A radiografia do crânio mostra a
anorexia, náuseas e vômitos e con-
aparência típica de “sal e pimenta” causada pela fusão mental ou sonolência, indicam
osteíte fibrose cística (A). Radiografia de crânio
do mesmo paciente seis meses após a remo- maior gravidade. A medida da pres-
ção do adenoma da paratireoide (B). Os ossos são arterial não é um bom sinal de
voltaram ao normal.
desidratação nesses casos, ela pode
estar normal, pois o cálcio aumento
do tônus vascular, mascarando uma
possível hipotensão arterial. Deve-se
atentar para a presença de bradiarrit-
mias, bloqueios atrioventriculares ou
de ramos e parada cardiorrespiratória.

Figura 15: Tomografia computadorizada da


pelve: múltiplas lesões líticas na pelve (setas
brancas) consistentes com tumores marrons.
Fonte: Uptodate, 2018.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 37

MAPA MENTAL – CLÍNICA HIPERCALCEMIA (ACHADOS CLÍNICOS NA HIPERCALCEMIA)

• Poliúria e polidipsia
• Diabetes insipidus nefrogênico
• Fraqueza muscular
• Nefrolitíase
• Osteíte fibrosa cística
• Nefrocalcinose
• Osteoporose
• Insuficiência Renal Aguda
• Miopatia grave (rara, ocorre
• Insuficiência Renal Crônica
no hiperparatireoidismo 1º)
• Acidose Tubular Renal
distal (raro)

• Constipação
• Encurtamento de QT
• Anorexia
• Arritmias • Ansiedade • Náuseas
• Bradicardia • Depressão • Vômitos
• Desidratação • Déficit cognitivo • Úlcera péptica
• Hipertensão (raro) • Alteração de concentração • Pancreatite
e memória
• Confusão
• Sonolência
• Estupor e coma
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 38

4. EXAMES nível sérico baixo ou baixo de PTH in-


COMPLEMENTARES E tacto (abaixo de 20 mg / mL) é mais
DIAGNÓSTICO consistente com hipercalcemia não
mediada por PTH tais como hipercal-
Antes de evoluir na conduta diagnós-
cemia maligna, doenças granuloma-
tica, é necessário verificar através de
tosas e intoxicação por vitamina D.
uma segunda dosagem, se o pacien-
te possui mesmo hipercalcemia. Após
sua confirmação é importante a busca Verificar PTHrp
por sua etiologia que pode ser inicia-
Esse exame é importante na inves-
da pela anamnese e exame físico. Al-
tigação de hipercalcemia por malig-
guns exames são importantes nessa
nidade, onde se encontra com níveis
investigação, tais como PTH, PTHrp,
elevado. Apesar de não ser um exa-
vitamina D e seus metabólitos, ECG,
me amplamente acessível, o diag-
exame oftalmológico e níveis de fós-
nóstico da doença maligna é clinica-
foro. Veremos a utilizada de cada um.
mente aparente. A hipercalcemia na
malignidade é de início relativamente
Verificar PTH recente, pacientes com hipercalcemia
de longa data com PTH sérico baixo,
O PTH é um importante exame na
outros distúrbios devem ser conside-
investigação etiológica da hipercalce-
rados, que não malignidade.
mia, pois existem etiologias que estão
associadas ao PTH elevado, sendo
hiperparatireoidismo primário a mais Analisar os níveis de vitamina D e
importante. Porém, o paciente tam- seus metabólitos
bém pode ter um hiperparatireoidis-
Os metabólitos dosados são calcidiol
mo terciário, quando o paciente pos-
(25-hidroxi-vitamina D) e calcitriol
sui associado uma insuficiência renal
(1,25 hidroxi-vitamina D). Nos casos
crônica avançada. As outras possí-
de ingestão excessiva de vitamina D,
veis etiologias seriam o uso de lítio,
teremos o aumento de calcidiol, já o
que poderia ser descartado durante a
calcitriol aumentado pode indicar in-
anamnese e a hipercalcemia hipocal-
gesta direta desse metabólito, produ-
ciúrica familiar, que evolui com fração
ção por doenças granulomatosas ou
de excreção renal de cálcio menor que
linfoma ou produção renal aumentada
1%. Uma concentração de PTH fran-
secundária ao hiperparatireoidismo.
camente elevada no cenário de hiper-
calcemia provavelmente é o resultado Quando não há alterações dos exa-
do hiperparatireoidismo primário. Um mes acima, outros diagnósticos
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 39

devem ser investigados tais como hi- subendotelial de fosfato de cálcio na


pertireoidismo, insuficiência adrenal, córnea.
doença de Paget, entre outros. Níveis de fósforo: podem estar ele-
vados, normais ou diminuídos em
Alguns achados de exames pacientes com hipercalcemia. Nos
complementares aparecem na casos de hiperparatireoidismo primá-
hipercalcemia. rio e terciário o fósforo se encontra
diminuído, quando há excesso de vi-
ECG: a alteração mais comum é inter- tamina D e aumento do turnover ós-
valo QT diminuído (figura 16) poden- seo há também aumento do fósforo,
do o paciente apresentar arritmias. nos casos de malignidade o fósforo é
Exame oftalmológico: pacien- variável.
tes podem apresentar ceratopatia
em banda, que representa depósito

Figura 16. ECG de hipercalcemia. Segmento ST curto e intervalo QT curto. Fonte: https://pt.my-ekg.com/metabolicas-
-drogas/hipercalcemia-ecg.html
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 40

MAPA MENTAL – DIAGNÓSTICO HIPERCALCEMIA (INVESTIGAÇÃO DIAGNÓSTICA DA HIPOCALCEMIA)

CÁLCIO
Hipercalcemia
SÉRICO Confirmar o diagnóstico
confirmada
ELEVADO

Anamnese + exame físico


Excluir uso excessivo de cálcio, vit D,
Exames inicias
Tiazídicos ou imobilização prolongada
Guiar exames pelas hipóteses

PTH aumentado PTH baixo

Hipercalcemia da
Hiperparatireoidismo PTH-rp elevado? SIM
malignidade

NÃO
Função renal normal Função renal alterada

Possibilidade de Dosar Vitamina


Hiperparatireoidismo
hiperparatireoidismo D e metabólitos
primário terciário

Normal Calcidiol Calcitriol

Hipertireoidismo Linfoma
Mieloma Sarcoidose
Ingestão excessiva
Doença de Paget Doenças granulomatosas
de vitamina D
Intoxicação por Ingestão exagerada
vitamina A de calcitriol
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 41

5. DIAGNÓSTICO grave pode levar ao coma, a depen-


DIFERENCIAL der da velocidade de instalação e ní-
vel sérico de cálcio.
A hipercalcemia é um distúrbio que
atinge múltiplos sistemas, sendo,
portanto, importante no diagnóstico Hipercalcemia Leve
diferencial de várias condições. A ne-
Os pacientes com hipercalcemia leve
frolitíase é uma apresentação clinica
podem ser assintomáticos ou leve-
nos casos de hipercalcemia crônica
mente sintomáticos. Apesar de não
e outras doenças que predispõem a
necessitarem de tratamento imedia-
calculose devem entrar no diagnos-
to, é necessário orientá-los em rela-
tico diferencial, assim como as ma-
ção a fatores que podem acentuar a
nifestações intestinal de constipação
hipercalcemia tais como uso de diu-
entre outras.
rético tiazídico e carbonato de lítio,
depleção de volume, repouso prolon-
6. TRATAMENTO gado ou inatividade e uma dieta rica
em cálcio (> 1000 mg / dia). Uma hi-
O tratamento da hipercalcemia leva
dratação adequada (pelo menos seis
em consideração sua gravidade, que
a oito copos de água por dia) deve ser
irá depender dos níveis séricos de
recomendada com o objetivo de mini-
cálcio. Em pode ser leve, moderada
mizar o risco de nefrolitíase. A terapia
ou grave.
adicional deve ser direcionada para
• Leve: cálcio iônico de até 6 mg/dL causa da hipercalcemia. O acompa-
(1,5 mmol/L). Cálcio total > 12 mg/ nhamento desses pacientes deve ser
dL. a nível ambulatorial.
• Moderada: cálcio iônico de 6 a 7
mg/dL (l,5 a 1,75 mmol/L). Cálcio Hipercalcemia Moderada
total: 12 a 14 mg/dL.
Os pacientes com hipercalcemia mo-
• Grave: cálcio iônico > 7 mg/d.L (3,5 derada podem se inclinar para os dois
mmol/L).Cálcio total: acima de 14 lados, pode evoluir assintomática ou
mg/ dL. levemente sintomática como nos ca-
sos de hipercalcemia leve, ainda mais
se a instalação for crônica, ou pode
A hipercalcemia leve e moderada,
evoluir com alterações do sensório e
pode ser assintomática ou apresen-
outros sintomas se for um aumento
tar sintomas leves como constipa-
agudo, sendo necessário a introdu-
ção, e, portanto, não necessitam de
ção de terapêutica como nos casos de
tratamento imediato, a hipercalcemia
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 42

hipercalcemia grave. Nos casos mais diuréticos calciúricos como furose-


brandos deve-se orientar as mesmas mida para evitar hiper-hidratação.
recomendações dadas aos pacien- Nos demais pacientes sua eficácia é
tes de hipercalcemia leve, e nos ca- questionável, não sendo recomen-
sos mais graves pode ser instituída a dado. A dose recomendada é de 20-
terapêutica com hidratação salina e 40mg de furosemida por dia.
bifosfonados.
Bifosfonados
Hipercalcemia Grave
A terapia antirreabsortiva é um pilar
Na hipercalcemia aguda, as indica- importante no tratamento da hipercal-
ções de tratamento são hipercalcemia cemia, sendo os bifosfonados, a dro-
grave (cálcio total >14) independente ga de escolha. Eles atuam induzindo
dos sintomas ou cálcio total >12 com a apoptose de osteoclastos e a dimi-
sintomas. nuição da atividade dos osteoblastos.
O tempo médio de ação é de 1 a 3
dias. O pamidronato e o ácido zole-
Hidratação e uso de diuréticos drônico são as drogas de escolha.
O primeiro passo na conduta terapêu- O pamidronato tem tempo médio de
tica é a hidratação vigorosa. Um dos ação de 1-3 dias, enquanto que o áci-
graves problemas da hipercalcemia é do zoledrônico possui efeito imediato,
a desidratação, portanto a reposição porém esse último, não pode ser usa-
venosa com soro fisiológico 0,9% do em pacientes com clearance de
(SF 0,9%) está recomenda nesses creatinina < 30mL/minuto.
pacientes, em cerca de 4-6 litros em
24h, a depender do grau de desidra-
O pamidronato tem tempo de du-
tação e das comorbidades associa-
ração da ação prolongado, manten-
das, como por exemplo, insuficiência
do seu efeito de 2 a 4 semanas, com
cardíaca e insuficiência renal. O reco-
média de 15 dias, não sendo reco-
mendado é uma taxa inicial de 200-
mendado, portanto, a repetição do
300 mL/h de salina fisiológica, procu-
medicamento em menos de 7 dias. A
rando manter débito urinário entre
normalização da calcemia ocorre em
100 -150 mL/h. Num estudo foi de-
70% dos casos.
mostrado que a reposição de 4 L/dia
com SF 0,9% diminuiu cerca de 2,4% • Dose do pamidronato: 60-90 mg
da calcemia. Nos casos dos pacien- via endovenosa (EV) infundidos
tes com insuficiência renal e cardí- em 2 a 4 horas. Alguns autores
aca, pode ser usado em associação,
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 43

usam a dose de 90 mg/dL apenas Como tem tempo de ação em horas,


se o cálcio total > 14 mg/dL. pode ser usada nos primeiros dias
até o início de ação dos bifosfona-
• Se clearance de creatinina < 30
dos. Ela não pode ser usada como te-
mL/minuto: dose de 30 a 60 mg
rapia isolada, pois tem maior chance
EV em 4 a 6 horas.
de induzir taquifilaxia, termo dado ao
fenômeno de rápida diminuição do
O ácido zoledrônico é um bifosfona- efeito de um fármaco em doses con-
do potente, de uso intravenoso e com secutivas. A dose da calcitonina é 4
início de ação imediato. Consegue UI/Kg. O cálcio sérico deve ser ava-
normalizar a calcemia em 80-100% liado após algumas horas, se for ob-
dos pacientes. Não podem ser usa- servada uma resposta hipocalcêmica,
dos em pacientes com insuficiência o paciente é sensível à calcitonina e
renal. esta pode ser repetida a cada 6 a 12
horas (4 a 8 unidades internacionais
• Dose: 4 mg, via endovenosa, in-
/ kg).
fundidos em 15 minutos, pode ser
repetida outras vezes, até a nor-
malização do cálcio. Denosumab
O denosumab é uma opção para os
Embora os bisfosfonatos EV sejam pacientes que são refratários à bi-
geralmente bem tolerados, os efei- fosfonados ou que possuem con-
tos colaterais podem incluir sinto- traindicação como nos casos de do-
mas semelhantes aos da gripe (febre, ença renal grave. O denosumab,
artralgias, mialgia, fadiga, dor óssea), diferentemente dos bifosfonados, não
inflamação ocular (uveíte), hipocal- é eliminado pelo rim e, como conse-
cemia, hipofosfatemia, função renal quência, não há restrição de seu uso
comprometida, síndrome nefrótica, em pacientes com doença renal crô-
osteonecrose da mandíbula e fraturas nica, para os quais os bifosfonados
atípicas do fêmur (em pacientes que são usados com cautela ou contrain-
necessitam de terapia prolongada). dicação. A dose usual é 60-120 mg
subcutâneo e dose única, podendo
ser repetida em l semana, caso o pa-
Calcitonina ciente ainda esteja hipercalcêmico. É
A calcitonina é uma droga que pode necessária uma monitorização cuida-
ser usada no tratamento da hiper- dosa dos níveis séricos de cálcio nes-
calcemia, associada a outras drogas, ses pacientes, pois existe um risco
como por exemplo os bifosfonados.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 44

maior de hipocalcemia com denosu- lenta), deve ser considerada em pa-


mab do que com bifosfonados. cientes refratários a outros tratamen-
tos, em pacientes com concentrações
séricas de cálcio na faixa de 18 a 20
Corticosteroides mg / dL (4,5 a 5 mmol / L) e sintomas
O uso de corticoides é indicado no neurológicos, mas com circulação es-
tratamento da hipercalcemia quando tável e naqueles com hipercalcemia
a etiologia são doenças granuloma- grave complicada por insuficiência
tosas, linfomas ou sarcoidose. Nes- renal. São considerados tratamentos
ses pacientes, os glicocorticoides (por de último recurso.
exemplo, prednisona em uma dose
de 20 a 40 mg /dia) geralmente re-
Tratamento cirúrgico
duzem as concentrações séricas de
cálcio em dois a cinco dias, diminuin- O tratamento pode ser indicado nos
do a produção de calcitriol pelas cé- casos selecionados de hiperparati-
lulas mononucleares ativadas no pul- reoidismo primário. Porém, na maioria
mão e nos linfonodos dos casos, os pacientes assintomáti-
cos ou com sintomas leves podem ser
manejados clinicamente e permanece
Calcimiméticos com densidade óssea e parâmetros
Os calcimiméticos, como o cinacal- bioquímicos por vezes estáveis por
cete, reduzem a concentração sérica muitos anos. A cirurgia está indicada
de cálcio em pacientes com hipercal- para os seguintes casos:
cemia grave devido a carcinoma da • Valores de cálcio sérico maiores
paratireoide e em pacientes em he- que 1 mg/dL acima do limite supe-
modiálise com um produto com cál- rior da normalidade.
cio fosforoso elevado e hiperparati-
reoidismo secundário. A dose usada • Calciúria maior que 400 mg nas
inicialmente é de 30 mg/dia, e pode 24 horas.
ser aumentada a cada 2-4 semanas • Queda de 30% ou mais no clea-
com o objetivo de manter o PTH entre rance de creatinina.
150-300 pg/mL.
• Presença de osteoporose em qual-
quer sítio.
Hemodiálise
• Pacientes com menos de 50 anos
A hemodiálise, com pouco ou ne- de idade.
nhum cálcio no líquido de diálise e a
diálise peritoneal (embora seja mais
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 45

TRATAMENTO DOSE INICIO DE EFEITO OBSERVAÇÕES


4-6L/dia (200-300mL/
Natriurese: aumento da excreção
SF 0,9% h; débito urinário Horas
renal de cálcio
100-150mL/h)
Horas: diurético calciúri-
Não prescrever antes de garan-
co, porém com impacto
Furosemida Dose individualizada tir a reidratação e restaurar a
questionável. Priorizar
diurese
manejo volêmico.
Não repetir em menos de 7
90 mg+ SF 0,9% 250ml; 1-3 dias; inibe a reabsor-
Pamidronato dias. Duração de efeito: 2 a 4
infundir em 2-4 h ção óssea (cifosfonato)
semanas
4 mg; infundir IV em 15
Imediato; inibe a reabsor- Normalização do cálcio em 3
Ácido zoledrônico min; pode ser repetida, se
ção óssea (bifosfonato) dias em 80-100% dos casos
necessário
Indicado nos casos de linfoma,
Corticosteroides Prednisona 1mg/kg Dias mieloma, doença granulomatosa
e intoxicação por vitamina D.
Utilizar somente se Cálcio total>
4-8UI/Kg IM ou SC de 14mg/dL; não utilizar como
Calcitonina Horas
12/12h por 48h. tratamento isolado (risco de
taquifilaxia)
Tabela 4. Tratamento resumido da hipercalcemia. Fonte: Medicina de emergência USP, 2019
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 46

MAPA MENTAL – TRATAMENTO DE HIPERCALCEMIA

TRATAMENTO DA
HIPERCALCEMIA

Casos Leve Casos Moderados Casos graves


(CaT<12mg/dL) ou (CaT entre (CaT>14mg/dL) ou
assintomáticos 12-14 mg/dL) Sintomáticos

Orientações Gerais • Hidratação com


• Evitar diurético cristaloide (SF0,9%
tiazídico ou RL): Iniciar
Nos casos 200-300mL/h de
• Evitar carbonato Assintomáticos
sintomáticos, cristaloide, visando
de lítio ou sintomas leves:
com alterações do débito urinário de
• Evitar desidratação orientar mesmas
nível de consciência 100-200mL/h
(ingerir 6-9 copos condutas dos
e do ECG, tratar
de água/dia) casos leves • Em casos de
como caso grave
hipervolemia, associar
• Dieta com o máximo
furosemida 40mg IV
de 1g/dia de cálcio

Bifosfonatos (opções):
• Pamidronato 60-90
mg, IV em 2h
• Ácido zolendrônico
4mg IV em 15min

OPCIONAL: Associar
a calcitonina 4UI/kg
IM ou SC (dosar cálcio
após algumas horas,
se responsivo, pode-
se repetir 4-8UI/kg de
6/6h ou de 12/12h.

Casos refratários:
• Denosumanb 60mg SC
• Hemodiálise

Investigação Investigação Internamento Internamento


laboratorial laboratorial Hospitalar Hospitalar ou UTI
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 47

Indicações de internação, admissão


na UTI e seguimento
A indicação de internação hospitalar
é reservada para pacientes com ní-
veis de cálcio total >12 mg/dL e sin-
tomas da hipercalcemia. Pacientes
com hipercalcemia grave, principal-
mente se os valores de cálcio forem
maiores que 16 mg/ dL, têm indica-
ção de internação em UTI. Para todos
os pacientes com hipercalcemia é im-
portante salientar a necessidade de
seguimento ambulatorial.
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 48

MAPA MENTAL – GERAL HIPERCALCEMIA

Hiperparatireoidismo
Leve: cálcio
total <12 mg/L
Neoplasias
Concentração total
de cálcio > 10,2 mg/ Moderada: cálcio
dL ou de cálcio iônico total 12-14 mg/L Hipercalcemia hipocalciúrica familiar
plasmático >1,3 mmol/L
Dosagem de PTH-rp Grave: cálcio Hipervitaminose D
total >14 mg/L
Dosagem do cálcio iônico Definição Hipertireoidismo

Dosagem de PTH Medicamentos

Função Renal Diagnóstico etiológico Etiologia Insuficiência adrenal

Dosagem de vitamina Insuficiência renal crônica


D e seus metabólitos
Tratamento Quadro Clínico

Hidratação Denosumanb Nefrolitíase Confusão mental

Diuréticos Hemodiálise Arritmias Fraqueza muscular

Intervalo QT encurtado
Bifosfonados Corticoide Náuseas

Calcitonina Insuficiência renal Vômitos

Ansiedade/depressão Poliúria

Constipação
DISTÚRBIOS DO CÁLCIO 49

MAPA MENTAL – RESUMO DO TEMA

Hiperpara 1º e 3º

Outros...
Clínica Neoplasias
Arritmias
Pseudo-
hipoparatireoidismo Medicamentos
Parestesias peri-
Convulsões
orais e extremidades
Hipoparatireoidismo Cálcio iônico
Alterações Espasmos Outros
psiquiátricas musculares
DRC ou IRA Doenças PTH
Sinal de Trosseau e granulomatosas
Papiledema
sinal de Chvostek
Deficiência de VI. D PTH-rp
Doenças endócrinas
Vit. D e seus
Medicações Etiologia HIPOCALCEMIA ↓
metabólitos
Etiologia
Função renal
Cálcio iônico Diagnóstico
Diagnóstico ECG: QT curto
PTH
Tratamento
Vitamina D e seus Hidratação, associada
HIPERCALCEMIA ↑ Tratamento ou não a diuréticos
metabólitos
Sintomático:
Fosfato e Magnésio Gluconato de cálcio Bifosfonados
Opção: Constipação Náuseas e vômitos
ECG: QT alongado Cloreto de cálcio Calcitonina
Crônico: Fraqueza muscular Confusão mental
Carbonato de cálcio Denosumanb
Poliúria e polidipsia Arritmias
Calcitriol
Corticoide
Assintomático: Nefrolitíase
Clínica
Carbonato de cálcio Hemodiálise
Opção:
Citrato de cálcio

Você também pode gostar