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1. Introdução
Está cada vez mais difícil alcançar a almejada vantagem competitiva, num cenário tão acirrado
de disputa por espaço no mercado, para as empresas do setor metalúrgico (MORAES JR et al.,
2020).
A redução de custos e a otimização de processos ao longo da cadeia produtiva resultam em
produtos mais baratos, com qualidade e maior disponibilidade, gerando valor ao ativo mais
importante que rege qualquer empresa: o cliente (MORAES JR et al., 2020).
O Lean Manufacturing direciona o caminho a ser trilhado para alcançar estes objetivos. Ohno
(1997) conceitua que o Sistema Toyota de produção – base para a estruturação do Lean
Manufacturing – é desenvolvido a partir de dois pilares, o just-in-time e o jidoka (automação
com um toque humano). O just-in-time sustenta-se pelo entendimento em disponibilizar o
produto que o cliente quer, na quantidade exata e no momento certo. Já o jidoka é a filosofia
cuja objetivo é oferecer inteligência humana às máquinas e, concomitantemente, fazer com que
os movimentos humanos sejam o mais simples possível ao operar tais máquinas.
O estudo é desenvolvido a partir de fundamentação teórica e estudo de caso, a fim de relacionar
todo o conteúdo técnico com o que acontece na prática. As principais ferramentas e conceitos
utilizados para a realização da pesquisa são o VSM (Value Stream Mapping), o fluxo contínuo
e o sistema Kanban. Outras ferramentas e conceitos importantes também serão evidenciados
no estudo.
Por fim, objetiva-se mostrar o tamanho do impacto após a implementação da filosofia STP e,
em especial, de algumas ferramentas específicas, como exemplificado acima.
2. Referencial Teórico
2.1. Sistema Toyota de Produção (STP)
Womack et al., (2004) afirmam que após a primeira guerra mundial, Alfred Sloan, da General
Motors, e Henry Ford comandaram por muito tempo a produção mundial em massa, conduzida
até então, principalmente pelas indústrias montadoras. Este fato fez com que os Estado Unidos
dominassem a economia mundial rapidamente.
Logo após a segunda guerra, Eiji Toyoda e Taiichi Ohno, da Toyota Motors, foram os
precursores da metodologia enxuta. Repentinamente, a superioridade econômica japonesa se
destacou no mercado à medida que outras empresas do país copiavam o sistema de tanto êxito
(WOMACK et al., 2004).
Monden (2015) destaca que o Sistema Toyota de Produção é um método extremamente útil
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para fabricação de produtos, já que se trata de uma ferramenta eficiente para a produção do
objetivo final: o lucro.
Para alcançar este propósito, os principais focos do STP são a redução de custos e aumento da
produtividade. Segundo Ohno (1997), eles são obtidos através do desenvolvimento da
habilidade humana até a mais plena capacidade, com o propósito de elevar a criatividade e
operacionalidade, para usar da melhor forma as instalações e máquinas, a fim de eliminar todo
o desperdício.
Fluxo contínuo: significa que os itens são produzidos e movimentados para o processo
seguinte uma peça de cada vez, caracterizando um processo constante que ocorre de forma
suave e ininterrupta (DENNIS, 2008). A metodologia de produção da Toyota tem como
objetivo final chegar em um sistema ideal onde tudo está conectado em um fluxo de peças
unitárias coerente (SHINGO, 2007).
Takt time: é a velocidade, ritmo ou compasso no qual os clientes solicitam os produtos
acabados. É determinado pela divisão do tempo total disponível para produção por turno pela
demanda diária do cliente (ROTHER; HARRIS, 2002);
Sistema Kanban (produção puxada): este sistema foi elaborado na década de 60 pelos
engenheiros da Toyota Motors com o objetivo de tornar simples e rápida as atividades de
programação, controle e acompanhamento de sistemas de produção em lotes (TUBINO, 1999).
Conforme Shingo (2007) e Ohno (1997), essa ideia foi espelhada a partir do modo em que os
supermercados americanos administravam seus estoques.
O kanban é um cartão, normalmente de material reforçado para ser durável, habitualmente
usado dentro de um envelope de vinil. Os cartões possuem informações muito importantes do
processo e são divididos em dois tipos: kanban de retirada e kanban de produção (MONDEN,
2015). Conforme apresentado na Figura 2.
Figura 2 - Empurrar e puxar a produção
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O jidoka é definido como a humanização da interface entre máquina e operador. A Toyota tem
como preceito que a máquina é sempre para servir as necessidades do operador, seja qualquer
a circunstância. O operador é sempre estimulado a compartilhar suas ideias a respeito de
melhorias que possam ser implementadas em seu ambiente de trabalho ou máquina (SLACK et
al., 2015).
Poka yoke: Dennis (2008) e Liker (2007) caracterizam que o poka yoke, mais conhecido
como sistema a prova de erros, tem a função de implementar dispositivos simples, criativos e
de baixo custo para detectar possíveis anormalidades (defeitos) no processo antes que eles
ocorram. Caso venham a acontecer, deve-se parar a linha produtiva para evitar que o defeito
encontrado se acumule para os processos seguintes e para que as correções necessárias sejam
efetuadas.
Separação homem/máquina: Monden (2015) e Shingo (2007) afirmam que o STP
sempre busca separar homem e máquina tanto quanto possível, com o objetivo de aproveitar ao
máximo a eficiência produtiva das máquinas, assim como, o uso efetivo dos recursos humanos.
O alicerce que suporta toda a estrutura do STP é formado por: heijunka, operações
padronizadas e Kaizen.
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Informações Definição
Tempo necessário para fazer uma
Tempo de ciclo (T/C)
peça
Tempo necessário para fazer um
Tempo de troca (TR)
setup na máquina
Para o desenho do estado atual é importante seguir as recomendações de Rother e Shook (2003)
coletar as informações do estado atual pessoalmente enquanto caminha-se pelos fluxos reais de
informação e materiais; Começar sempre pelo processo final – será a expedição – e voltar aos
processos anteriores até o início;
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3. Metodologia
As pesquisas exploratórias têm como objetivo construir, esclarecer e modificar ideias.
Comumente pode envolver revisão bibliográfica e estudo de caso (GIL, 2019).
O estudo é embasado em fundamentação teórica a partir de uma revisão bibliográfica e, em um
segundo momento, é apresentando um estudo de caso de natureza quantitativa.
Segundo Gil (2019), é impossível estabelecer um plano exato de como a pesquisa deverá ser
efetuada pois, o estudo de caso, é uma pesquisa que pode ser usada em diversas áreas de
conhecimento.
A proposta de Miguel (2012) é uma estrutura para realização do estudo de caso contendo fases
de definição estrutural de conceito teórico, planejamento do estudo de caso, condução do teste
piloto, coleta e análise de dados, seguido por um relatório. O estudo é embasado nesses
conceitos.
4. Estudo de caso
4.1. A Empresa
A empresa estudada está situada no interior do estado de São Paulo, sendo caracterizada como
uma metalúrgica. Seus principais produtos são buchas, mancais e placas auto lubrificantes. A
planta conta com aproximadamente 40 funcionários.
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uma área dedicada ao armazenamento de matéria prima. Assim, é gerada uma fila no local da
primeira operação (Furação I), respeitando o FIFO (first in, first out ou primeiro que entra,
primeiro que sai).
A manufatura do produto é realizada em quatro etapas: Furação I, Lubrificação, Acabamento e
Furação II. Cada etapa do processo conta com um operador dedicado. A programação destes
processos é realizada pelo PCP e direcionada individualmente para cada processo mensalmente.
Entre os estágios de processamento há estoques intermediários com o objetivo de não haver
paradas por atrasos do processo anterior. Geram-se, assim, aproximadamente 6,5 dias de peças
estocadas dentro da manufatura.
Todos os tempos de ciclos, troca e setup, foram mensurados com cronômetros. Hoje o processo
tem 80% de eficiência geral medida através das folhas de apontamento que são preenchidas
pelo operador e analisadas pela gerência fabril.
A expedição conta com um estoque de aproximadamente 7 dias, um local específico para peças
acabadas e dois colaboradores que embalam os produtos e despacham ao cliente semanalmente.
Como é mostrado abaixo, na Tabela 2, o lead time do processo é de 43,5 dias, sendo que as
atividades, que agregam valor, correspondem a somente 220 segundos. Todo o resto é composto
de atividades que não agregam valor.
Tabela 2 - Focos para o Kaizen
redução de estoques. Para atender com maior eficácia o cliente, aplicam-se melhorias no fluxo
e redução do lead time do processo.
As principais oportunidades de mudança observadas, e que são o foco da aplicação de
melhorias, são referentes a: redução de estoques, potencialização da mão de obra, diminuição
do lead time de recebimento de matéria prima, otimização na expedição do produto acabado e
nivelamento no fluxo produtivo de toda a cadeia.
A construção do mapa do estado futuro, como mostrada Figura 5, ilustra o cenário após
aplicação do Kaizen para cada ponto que foi observado como possível melhoria.
Figura 5 - Mapa do estado futuro
possível eventualidade.
O pitch calculado no VSM atual (tempo takt de 79 segundos, multiplicado por 50 peças, que
era o padrão de embalagem) foi de 66 minutos, ultrapassando o limite desejado que está entre
5 e 60 minutos. Quando o pitch ultrapassa a meta, os lotes se tornam muito grandes para se
controlar, dificultando análises rápidas para tomada de decisões.
Então, o pitch é redimensionado no VSM futuro, definindo pacotes de trabalho de,
aproximadamente, 26 minutos e lotes de 20 peças por embalagem. Assim, ocorre o nivelamento
da produção em lotes menores, facilitando o controle do fluxo produtivo e a liberação de
produtos mais rapidamente para os clientes.
A implantação de um fluxo contínuo e transformação dos processos segregados em uma única
célula de trabalho são passos importantes para alcançar os objetivos relacionados à otimização
de processos. Estas mudanças promovem ganhos consideráveis ao ritmo de produção, sincronia
de atividades, manutenção, setup e inventário, já que, todos estes fatores devem estar em
extrema sintonia para que célula seja realmente efetiva.
O cálculo para o redimensionamento de trabalhadores vem da relação entre tempo total de
trabalho efetivo, no caso de 220 segundos, pelo tempo takt de 79 segundos. Com base nessa
relação, tem-se que 3 pessoas seriam a quantidade ideal para executar a demanda de trabalho
dentro da célula.
O layout do VSM do estado atual da empresa é o principal gerador de excesso de
movimentações dentro do fluxo, pois cada processo se encontra em um local dentro da planta,
sendo necessário grandes deslocamentos.
Ligada a célula de produção estão os outros dois supermercados Kanban, que são
correspondentes aos dois fornecedores deste processo. Também considerando o pitch
calculado, todas as solicitações de peças são feitas levando em conta o padrão de embalagem.
São feitos kits de suprimentos para atender à demanda de peças solicitadas pelo processo
seguinte (célula).
Por fim, outro Kaizen proposto foi a negociação com os fornecedores para diminuição dos lead
times de entrega de matéria prima. A proposta foi aceita pelos dois fornecedores, diminuindo
pela metade o tempo de recebimento de suprimentos.
5. Resultados e discussão
Com a elaboração do VSM atual, foi possível analisar vários pontos a serem melhorados como
o lead time de compra da matéria prima, o método de planejamento fabril, o processo produtivo,
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o estoque e a expedição. O cenário encontrado se mostrou falho pois não havia garantias de
satisfação do cliente, uma vez que a previsão de demanda variava e muitas vezes acumulavam-
se estoques ou faltavam peças para o cliente.
Na coleta de dados para o desenho do mapa atual, constatou-se que, para não haver paradas
durante o processo produtivo, a empresa mantinha grande quantidade de materiais estocados,
tanto matéria-prima, quanto itens em processo. O fluxo produtivo se apresentou complexo para
ser controlado e as decisões custosas para serem tomadas. Havia um alto nível de
desorganização em vários pontos do fluxo produtivo, incluindo informações.
Gráfico 1 - Comparativo Estado Atual x Futuro
Por fim, aumenta-se a frequência de entrega de produtos ao cliente, de 4 vezes por mês para 20
vezes por mês, demonstrando o grande poder em flexibilidade e, principalmente, atendimento
ao cliente.
6. Conclusão
A implementação do VSM permite uma visão holística do processo, podendo enxergar todos
os pontos de dificuldade no fluxo de informações e materiais da cadeia produtiva. Com essa
função, é possível aplicar praticamente todas as melhorias necessárias para elevar o nível de
produtividade de uma empresa, gerando potencial competitivo e podendo ganhar vantagem em
relação aos concorrentes.
Um dos pontos mais interessantes desta ferramenta é que, além de muito prática, ela pode ser
feita somente com um lápis e um pedaço de papel. Vale salientar a extrema importância dos
gerentes estarem presentes dentro da fábrica para o desenvolvimento do mapeamento, sentindo
na pele, o real cenário do processo.
Todo o impacto alcançado com a aplicação das ferramentas e implementação da filosofia
Toyota de produção comprovam o quanto é importante o estudo presente, que valoriza
principalmente o Value Stream Mapping e também inúmeras ferramentas que compõem o Lean
Manufacturing.
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