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Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Código de processo civil [livro eletrônico] / Organização: Edson Roberto Reis, Nelson
Finotti Silva. -- São Paulo: Escola Superior de Advocacia da OAB SP, 2021. Mobi
Bibliografia.

ISBN 978-65-87351-51-3

1. Processo civil - Brasil

2. Processo civil - Leis e legislação Brasil

I Reis, Edson Roberto.

II Silva, Nelson Finotti.

Índices para catálogo sistemático:


1.Brasil : Código de processo civil 347.9(81)(094.4)

Cibele Maria Dias - Bibliotecária - CRB-8/9427


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CAPÍTULO III - DAS AÇÕES POSSESSÓRIAS
Seção I Disposições Gerais

Augusto Jorge Cury246


Arts. 554 - 568

Art. 554. A propositura de uma ação possessória em vez de outra não obstará a que o juiz
conheça do pedido e outorgue a proteção legal correspondente àquela cujos pressupostos
estejam provados.
§ 1º No caso de ação possessória em que figure no polo passivo grande número de pessoas,
serão feitas a citação pessoal dos ocupantes que forem encontrados no local e a citação por
edital dos demais, determinando-se, ainda, a intimação do Ministério Público e, se envolver
pessoas em situação de hipossuficiência econômica, da Defensoria Pública.
§ 2º Para fim da citação pessoal prevista no § 1º, o oficial de justiça procurará os ocupantes
no local por uma vez, citando-se por edital os que não forem encontrados.
§ 3º O juiz deverá determinar que se dê ampla publicidade da existência da ação prevista no
§ 1º e dos respectivos prazos processuais, podendo, para tanto, valer-se de anúncios em
jornal ou rádio locais, da publicação de cartazes na região do conflito e de outros meios.

1. Referência na legislação anterior: artigo 920 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Noção conceitual de posse para o Direito brasileiro: para o nosso ordenamento


jurídico, consoante preceitua o artigo 1.196 do Código Civil, em combinação com o artigo
1.228, caput, do mesmo Código, a posse é o exercício de fato, ainda que parcial, de um ou
mais dos poderes relativos ao domínio, quais sejam, o jus utendi (direito de uso), o jus
fruendi (direito de gozo), o jus abutendi (direito de dispor da coisa) e a rei vindicatio (direito
de persecução da coisa).
Ao relacionar a posse com os direitos e faculdades inerentes à propriedade, a
legislação pátria culmina por adotar a teoria objetiva a respeito da posse, segundo a qual a
posse é o poder fático exercido sobre uma coisa e que se apresenta como uma exteriorização
ou visibilidade do domínio.

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Advogado e Professor universitário. Mestre em Direito Processual Civil pela Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo (PUC/SP). Autor da obra "Ônus da Prova e suaInversão no Novo Direito Processual
Civil" (Juruá/PR). Coautor das obras "DoutrinasEssenciais - Novo Processo Civil" (Revista dos Tribunais/SP),
"Estudos em Homenagem à
Professora Thereza Alvim - Controvérsias do Direito Processual Civil: 5 Anos do CPC/2015" (Revista dos
Tribunais/SP), "Alienação Fiduciária de Bem Imóvel e Outras Garantias" (Foco/SP), "Novo Código de
Processo Civil - Análises e Reflexos nos Demais Ramos do Direito" (Boreal/SP), "Ensaios sobre Políticas
Públicas" (Boreal/SP), "Segurança Jurídica e Estado Democrático de Direito" (Instituto Memória/PR) e
"Direito Público Contemporâneo" (Instituto Memória/PR). Autor e coautor de diversos artigos jurídicos
publicados em revistas científicas de relevância nacional e internacional (v.g. Revista dos Tribunais, Revista
de Processo-RT, Revista de Direito Privado-RT, Revista Forense), notadamente nas áreas de Direito Civil e
Direito Processual Civil..
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Pelo prisma da teoria objetiva, a posse não depende que o sujeito possuidor tenha
animus domini, ou seja, uma efetiva intenção de ser o proprietário da coisa. Para a
caracterização da posse, basta, pois, o corpus, assim entendido o poder fático sobre a coisa,
exercido mediante conduta que, externamente, confira à relação entre o sujeito e a coisa a
aparência de domínio.
Em suma: para a teoria objetiva, chancelada pelo ordenamento jurídico brasileiro, a
posse é o poder fático mas não necessariamente físico, sendo mais importante, na
realidade, o aspecto moral desse poder de fato , que alguém exerce sobre uma coisa, agindo
como normalmente age um proprietário (não como agiria, por exemplo, o mero detentor da
coisa) e conferindo, assim, à relação fática uma aparência externa de domínio.
Justamente essa correta concepção de poder fático baseada, pois, em seu aspecto
moral e não no mero poder físico é que permite que o ordenamento jurídico desta Terra
de Santa Cruz contemple, verbi gratia, as figuras da posse indireta (artigo 1.197 do Código
Civil) e do constituto possessório (artigo 1.267, parágrafo único, do Código Civil).

3. Natureza jurídica da posse: a posse não é, em si, um direito, mas uma relação
fática, embora juridicamente relevante, entre um sujeito (possuidor) e um bem (coisa
possuída), situação essa que gera, ao sujeito possuidor, o direito de exercer pacificamente
as prerrogativas que caracterizam esse poder fático. A posse, portanto, possui natureza
jurídica de situação de fato, não se qualificando como direito e, muito menos, como um
direito real, de modo que sua violação ou ameaça de violação não enseja ação real, senão
apenas confere, ao possuidor legítimo, interesse para o ajuizamento de ação judicial de
natureza pessoal.

4. Autonomia entre posse e propriedade ou outros direitos reais: a relação


conceitual entre a posse e a aparência de propriedade não significa que exista relação de
dependência entre a posse e qualquer direito real. Na realidade, a posse é autônoma em
relação à propriedade ou a qualquer outro direito real. Nessa esteira, tanto se pode verificar
que o sujeito exerça posse sem ter qualquer direito real sobre a coisa, como pode o sujeito
ser o proprietário da coisa nunca tendo exercido posse, direta ou indireta, sobre ela.
Cabe, nesse ponto, distinguir a efetiva posse como situação fática (então chamada
de ius possessionis) do direito à posse que deriva da propriedade, de outros direitos reais ou,
ainda, de relações jurídicas pessoais (o denominado ius possidendi): o primeiro existe
independentemente da verificação de qualquer relação jurídica ou direito real sobre a coisa,
enquanto o segundo existe em virtude da titularidade de direito real ou pessoal, mas
independentemente do efetivo exercício da posse.
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Ilustra-se o explicado com dois exemplos: (i) imagine-se um sujeito que, sendo
proprietário de uma coisa, nunca haja exercido poder fático sobre ela, embora tenha, pela
simples circunstância de ser proprietário, o direito de exercer a posse. O referido sujeito é
titular do direito à posse (ius possidendi), mas nunca exerceu realmente a posse (ius
possessionis) ou seja, nunca foi possuidor, embora tenha o direito de sê-lo, em virtude da
titularidade do domínio ; (ii) imagine-se, por outro lado, o sujeito que ocupou um terreno,
passando a exercer poder fático sobre ele sem qualquer oposição do respectivo proprietário.
Mencionado sujeito não é titular do direito à posse (ius possidendi), mas é, de fato, possuidor
da coisa (ius possessionis).

5. Posse legítima e posse ilegítima: a posse pode ser legítima ou ilegítima. A posse
legítima (ou justa) é, nos termos do que preceitua o artigo 1.200 do Código Civil, aquela
não violenta, clandestina ou precária, ou seja, adquirida e exercida legitimamente, sem vício
jurídico externo. A contrario sensu, a posse ilegítima (ou injusta) é aquela viciada, isto é,
adquirida ou mantida de modo violento (por força física, como ocorre no caso de roubo),
clandestino (oculto, como se dá, verbi gratia, no furto e na receptação) ou precário (quando
há abuso de confiança, a exemplo do estelionato e da apropriação indébita).

6. A falta de cumprimento da função social da propriedade não torna ilegítima


a posse do possuidor-proprietário e nem pode impedir o deferimento da tutela judicial
possessória em seu favor: parcela da doutrina brasileira, mediante compreensão
equivocada do princípio da função social da propriedade então previsto nos artigos 5º,
XXIII, 170, III, 182 e 184 a 186 da Constituição Federal, bem como no artigo 1.228, § 1º,
do Código Civil , milita em favor da ideia de que o possuidor ameaçado ou violado na
posse de coisa de sua propriedade apenas pode defendê-la judicialmente pelas ações
possessórias se estiver exercendo sua posse em conformidade à função social da propriedade
(fala-
ausência de cumprimento da função social da propriedade resultaria, como uma espécie de
sanção, na perda do amparo jurídico em relação à posse exercida pelo titular do domínio.
Esse pensamento, entretanto, é teratológico!
Isso porque as possíveis sanções pela não observância da função social da
propriedade estão taxativamente previstas nos artigos 182, § 4º, e 184 da Constituição
Federal, não se encontrando, dentre elas, a perda da tutela possessória, razão por que foge
completamente da constitucionalidade a ideia de que o desrespeito à função social da
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propriedade tornaria ilegítima ou juridicamente desamparada a posse exercida pelo seu
proprietário, ou, ainda, que autorizaria ou tornaria legítima eventual ameaça ou violação
possessória feita por terceiros.
Ademais, qualquer raciocínio diverso contrariaria, igualmente, a garantia
fundamental do devido processo legal, prevista no artigo 5º, LIV, da Constituição Federal,
ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo
legal
Por essas razões, a ameaça ou violação possessória permanece sendo ilícita mesmo
quando pretensamente motivada pela falta de cumprimento da função social da propriedade
pelo possuidor titular do domínio, sendo absolutamente inconstitucional a exigência de
cumprimento da função social da propriedade como requisito a que o proprietário-possuidor
possa buscar e obter judicialmente a proteção de sua posse contra quem a ameaçar ou violar.
Nesse sentido, posiciona-se o Supremo Tribunal Federal, v.g.: STF, ADI-MC nº
2.213/DF, Rel. Min. Celso de Mello, Tribunal Pleno, julgamento em 04/04/2002, publicação
no DJ de 23/04/2004; e STF, AgR em MS nº 28.704, Rel. Min. Gilmar Mendes, Tribunal
Pleno, julgamento em 12/05/2017, publicação em 08/06/2017).

7. Posse ilegítima de boa-fé e posse ilegítima de má-fé: nos termos dos artigos
1.201 e 1.202 do Código Civil, compreende-se que a posse ilegítima é de boa-fé quando o
possuidor desconhece a existência de obstáculos à regularidade de sua posse, ou seja,
quando ignora a ilegitimidade de sua posse, enquanto a má-fé caracteriza-se quando o
possuidor ilegítimo conhece a ilegitimidade de seu exercício de posse.
A posse de boa-fé, desse modo, pode converter-se em posse de má-fé, desde que o
possuidor ilegítimo, antes inconsciente da ilegitimidade da posse por ele exercida, passe a
ter ciência dessa ilegitimidade. Torna-se de má-fé a posse, então, no exato momento em que
o possuidor é feito ciente dos obstáculos à legitimidade de sua posse por exemplo, quando
citado para compor o polo passivo de ação possessória.

8. A tutela processual da posse (ius possessionis) e do direito à posse (ius


possidendi) ações possessórias típicas e atípicas: a doutrina jurídica reconhece dois
gêneros de ações possessórias, a saber: as ações possessórias típicas (ou nominadas) e as
ações possessórias atípicas (ou inominadas).
São ações possessórias típicas (ou nominadas) aquelas demandas judiciais que se
destinam, especificamente, à tutela imediata da posse, com fundamento também na situação
fática de posse (ius possessionis
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Como se observa, nas ações possessórias típicas não apenas o pedido volta-se à
proteção da posse, como a causa de pedir da demanda firma-se, igualmente, na posse do
autor. As ações possessórias típicas possuem caráter pessoal, não real (vide decisão
proferida pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 331.779/SP, Rel. Ministro Sálvio De
Figueiredo Teixeira, Quarta Turma, julgado em 09/10/2001, DJ 04/02/2002). No Direito
brasileiro, assumem a feição de demandas possessórias típicas as ações de reintegração de
posse, de manutenção de posse e o interdito proibitório.
Por sua vez, denominam-se ações possessórias atípicas (ou inominadas) as ações
judiciais que, por se destinarem à defesa do domínio ou a de algum outro direito real ou,
ainda, por terem tais direitos reais como causa petendi, tutelam, mesmo que indiretamente,
o direito à posse (não a situação fática de posse). Na realidade, as chamadas ações
possessórias atípicas são, na realidade, ações petitórias (reivindicatórias), voltadas, como
indicado, à proteção do ius possidendi. São exemplos: a ação de embargos de terceiro, a
ação de imissão na posse, a ação de dano infecto e a ação de nunciação de obra nova.
Seguindo esse rigor teórico e mantendo a opção do Diploma Processual de 1973, o
Código de Processo Civil de 2015 trata como ações possessórias apenas as que se qualificam
como típicas ou seja, as demandas que objetivam proteger o ius possessionis, assim as
ações de reintegração de posse, de manutenção de posse e o interdito proibitório ,
conferindo-lhes regramento próprio, como procedimento especial, em seus artigos 554 a
568.
Às outras espécies de demandas pretensamente protetivas da posse, mas que tutelam,
na realidade, o direito à posse (ius possidendi) como os embargos de terceiro, a ação de
imissão na posse, a ação de nunciação de obra nova e a ação de dano infecto , a legislação
pátria nega o caráter possessório stricto sensu, não as incluindo no regramento possessório
típico.

9. O escopo das ações possessórias típicas a relação abstratamente simples


entre os graus de ameaça ou ofensa possessória e as respectivas demandas: consoante
o que dispõem os artigos 560 e 567 do Código de Processo Civil de 2015, aliados ao artigo
1.210, caput, do Código Civil, (i) a ação de reintegração de posse tem como finalidade
tutelar a posse contra o esbulho, que consiste na violação total da posse, causando, ao
possuidor legítimo, a perda do poder fático da coisa possuída. O objetivo da ação de
reintegração de posse é restituir ao possuidor legítimo a posse da coisa esbulhada; (ii) a ação
de manutenção de posse visa tutelar a posse contra a turbação, essa entendida como a
violação parcial do direito de posse, caracterizada pela perturbação no exercício da posse
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do possuidor legítimo. A ação de manutenção da posse, portanto, tem por fim fazer com que
cessem os atos de perturbação do pleno exercício de posse do possuidor legítimo; e, por fim,
(iii) o interdito proibitório objetiva tutelar preventivamente a posse na hipótese de ameaça
de violação, ou seja, de iminência de esbulho ou de turbação. Por conseguinte, o escopo do
interdito proibitório é impedir a violência à posse, com expedição de mandado proibitório e
fixação de multa por descumprimento.

10. Tutela de remoção do ilícito e tutela inibitória: as ações possessórias típicas


têm como escopo principal a obtenção de uma tutela contra o ilícito. Nas ações de
reintegração de posse e de manutenção de posse objetiva-se uma tutela de remoção do
ilícito, na medida em que a pretensão principal nessas demandas é cessar a ofensa já
perpetrada, e que permanece, contra a posse do autor. Por outro lado, o interdito proibitório
tem por precípua finalidade a obtenção de tutela inibitória, porquanto visa proteger a posse
do autor contra ameaça de esbulho ou de turbação violação que, apesar de iminente, ainda
não se perfez , de modo a inibir a prática efetiva do ato ilícito possessório.

11. As ações possessórias típicas têm natureza pessoal: visto que a posse é uma
situação fática e não um direito, menos ainda um direito real , as ações possessórias
típicas, então voltadas à sua proteção, não são ações judiciais de natureza real, mas
autênticas demandas de natureza pessoal.

12. As ações possessórias típicas voltam-se apenas à tutela da posse de bens


corpóreos: as ações possessórias típicas apenas têm cabimento para a proteção da posse
exercida em relação a bens corpóreos, não se destinando, sequer em caráter preventivo, à
proteção de bens incorpóreos (a exemplo dos direitos autorais e industriais) ou a dos
chamados bens semi-incorpóreos (assim a energia elétrica, a linha telefônica, o espaço
aéreo, dentre outros que, embora não tendo forma corpórea definida, são dominados pelo
ser humano e, além disso, nos são sensíveis, ou seja, perceptíveis por ao menos um dos
sentidos humanos).
Nesse sentido, ainda no ano de 1999, o Superior Tribunal de Justiça editou o
Enunciado de Súmula nº 228, revisando seu posicionamento sobre o assunto e cristalizando
é inadmissível o interdito proibitório para a proteção do direito
autoral
Cabe mencionar, nesse ponto, que as servidões têm natureza corpórea, razão pela
qual, notadamente quando não são tituladas, podem ser protegidas de ameaça ou de violação
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mediante ações possessórias. Seguindo essa linha de entendimento, o Supremo Tribunal
servidão de
trânsito não titulada, mas tornada permanente, sobretudo pela natureza das obras
realizadas, considera-se aparente, conferindo direito à proteção possessória

13. Legitimidade ativa para as ações possessórias: para as ações possessórias, tem
legitimidade ativa o possuidor legítimo (ou possuidores, no caso de composse) que alega ter
sido ofendido ou ameaçado em sua posse (artigo 1.210 do Código Civil e artigo 560 do
Código de Processo Civil de 2015), seja ele possuidor direto ou indireto (nos casos de
fracionamento da posse, como ocorre, verbi gratia, nas alienações fiduciárias, consoante
artigo 23, parágrafo único, da Lei nº 9.514/1997 e artigo 1.361, § 2º, do Código Civil), sendo
legitimados ativos também os herdeiros do possuidor falecido, visto que, pelo princípio da
saisine, a posse se transmite ex lege aos sucessores, conforme artigos 1.206, 1.207 e 1.784
do Código Civil (vide REsp nº 1.244.118/SC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira
Turma, julgado em 22/10/2013, DJE 28/10/2013 e REsp nº 537.363/RS, Rel. Ministro
Vasco Della Giustina, Terceira Turma, julgado em 20/04/2010, DJe 07/05/2010).
Também o Poder Público é parte legítima para a propositura de ações possessórias,
ainda que existente concessão de serviço público a terceiros que envolva o bem público cuja
posse se busca proteger. É, aliás, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (vide REsp
nº 1.766.791/RS, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 06/11/2018,
DJe 19/11/2018). Desse modo, por exemplo, em havendo violação ou ofensa de violação a
posse de trecho de rodovia sob concessão, o Poder Público concedente tem legitimidade
para propor a pertinente ação possessória.

14. Legitimidade passiva para as ações possessórias: nos termos do que preceitua
o artigo 1.212 do Código Civil, possui legitimidade passiva para a demanda possessória, de
início, todo aquele sujeito ou grupo de pessoas a quem se imputa a prática do esbulho, da
turbação ou da ameaça de violação da posse. Segundo estipula o mesmo dispositivo legal,
também é legitimado passivo para a ação possessória aquele que, mesmo não sendo o
esbulhador, receber de má-fé ou seja, tendo conhecimento da origem ilícita a coisa
esbulhada.
Quanto a essa última situação, perceba-se que, para ter legitimidade passiva para a
ação possessória, é imperioso que o terceiro seja, realmente, receptador, tendo recebido a
coisa ciente de se tratar de objeto de esbulho. Desta feita, não é legitimado passivo para a
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ação possessória o terceiro que receber a coisa de boa-fé, contra esse cabendo tão somente
ação de natureza reivindicatória.
É o que preceitua o Enunciado nº 80 da I Jornada de Direito Civil do Conselho da
Just é inadmissível o direcionamento de demanda possessória
ou ressarcitória contra terceiro possuidor de boa-fé, por ser parte passiva ilegítima diante
do disposto no art. 1.212 do novo Código Civil. Contra o terceiro de boa-fé, cabe tão-
somente a propositura de demanda de natureza real

15. Substituição processual na hipótese de composse por condôminos e a


eficácia subjetiva da coisa julgada material: o Código Civil, em seu artigo 1.314, tratando
dos proprietários de coisa comum cada condômino pode
usar da coisa conforme sua destinação, sobre ela exercer todos os direitos compatíveis com
a indivisão, reivindicá-la de terceiro, defender a sua posse e alhear a respectiva parte ideal,
ou gravá-la
Mencionado dispositivo confere a cada condômino o poder e a legitimação para,
dentre outras atividades, ingressar em juízo, sozinho, para proteger a posse da coisa comum
contra violações iminentes ou efetivadas por terceiros, caso em que estará agindo no
processo em nome próprio, mas defendendo, além do próprio interesse, também o interesse
dos demais condôminos que forem igualmente possuidores da coisa.
Portanto, há aí, indiscutivelmente, a incidência de legitimação extraordinária
substituição processual , assim entendida a aptidão, conferida exclusivamente pela ordem
jurídica, a que um determinado indivíduo atue em juízo, em nome próprio, defendendo
direito ou interesse alheio, consoante preceitua o artigo 18 do Código de Processo Civil de
2015.
Aliás, sequer se pode dizer que o substituído processual seja terceiro, senão em mero
sentido formal, já que, sendo o próprio interessado, titular da situação jurídica material,
figura com as mesmas características de parte processual, assumindo, verdadeiramente, a
posição de parte em sentido substancial.
Isso significa que a autoridade da coisa julgada material, a revestir a decisão final
proferida na demanda possessória movida por apenas um dos condôminos possuidores, via
de regra atingirá a todos os demais compossuidores, nos termos do artigo 506 do Código de
Processo Civil de 2015, já que esses substituídos processuais constituem-se também como
parte em sentido material não sendo, pois, meros terceiros e seus interesses são
legitimamente debatidos e defendidos em juízo pelo compossuidor que atuou como
substituto processual.
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16. Inocorrência, via de regra, de litisconsórcio passivo necessário com o
cônjuge ou com o companheiro: por se tratarem de ações de natureza pessoal, e não real,
as ações possessórias típicas não atraem a aplicação da regra de litisconsórcio passivo
necessário entre os cônjuges ou companheiros e nem da regra de indispensabilidade de
consentimento para a propositura da ação, salvo se entre os cônjuges ou companheiros
houver composse ou se ambos tiverem dado causa à violação ou à ameaça de violação da
posse (vide artigo 73, §§ 2º e 3º, do Código de Processo Civil de 2015).

17. Intervenção de terceiros nas ações possessórias: o procedimento das ações


possessórias comporta todas as modalidades de intervenção de terceiros, não havendo
qualquer óbice procedimental, visto que, nos termos do disposto no artigo 566 do Código
de Processo Civil de 2015, após a contestação, as demandas possessórias aproveitam o rito
comum.
A admissibilidade de intervenção de terceiros se intensifica diante da possibilidade
de cumulação de pedido indenizatório pelo autor ou pelo réu da ação possessória, que pode,
por exemplo, gerar o interesse jurídico para: (i) a denunciação da lide, especialmente em
conflitos envolvendo posse que decorra de negócio jurídico em que convencionado seguro
por descumprimento; (ii) o chamamento ao processo, sobretudo quando a posse se origina
de negócio jurídico garantido por fiança; e (iii) a desconsideração da personalidade jurídica,
eventualmente necessária para viabilizar a satisfação da obrigação ressarcitória, quando
houver condenação.
Igualmente, mostra-se possível a intervenção de assistente simples ou litisconsorcial,
valendo constar que, tanto nas ações possessórias individuais como nas ações possessórias
coletivas, sempre que houver substituição processual, o substituído pode intervir como
assistente litisconsorcial, caso em que assumirá a posição de parte em sentido formal (visto
já ser parte em sentido material), configurando-se como litisconsorte facultativo unitário
ulterior.
Por fim, também não há óbice à admissão de amicus curiae, a que o Código de
Processo Civil de 2015, em seu artigo 138, confere regulamentação geral e abrangente. A
propósito, a intervenção dos órgãos públicos responsáveis pela política agrária e pela
política urbana, então especificamente possibilitada pelo artigo 565, § 4º, do Código de
Processo Civil de 2015, pode assumir a forma de uma intervenção de amicus curiae
(conforme verificado nos comentários ao referido artigo 565).

18. Competência para as ações possessórias: em se tratando de ação possessória


relativa a bem móvel, aplica-se a regra geral do artigo 46 do Código de Processo Civil de
2015, sendo competente o foro do domicílio do réu, ou de qualquer de seus domicílios,
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quando o réu tiver mais de um, sendo que apenas será competente o foro do domicílio do
autor quando o réu morar no exterior ou tiver domicílio desconhecido ou incerto. Por refletir
competência ratione loci pura, trata-se de hipótese de mera competência relativa, sujeita
tanto a alteração por cláusula de eleição de foro, como a prorrogação (artigos 63 e 65 do
Código de Processo Civil de 2015).
Por outro lado, em se tratando de ação possessória que verse sobre bem imóvel, será
competente o foro de situação da coisa (artigo 47, § 2º, do Código de Processo Civil de
2015). Todavia, nessa hipótese, o próprio dispositivo legal transforma essa competência
territorial em competência funcional, estabelecendo tratar-se, então, de regra de
competência absoluta e, assim, de questão de ordem pública apreciável ex officio pelo Poder
Judiciário a qualquer momento e em qualquer grau de jurisdição (artigo 64, § 1º, do Código
de Processo Civil de 2015), de modo a não admitir modificação pela livre vontade das partes
(artigo 62 do Código de Processo Civil de 2015) e nem prorrogação diante da ausência de
impugnação pelo réu em preliminar de contestação.
Tanto em relação a bens móveis quanto a bens imóveis, sempre que o valor da causa
na demanda possessória não ultrapassar 40 (quarenta) salários mínimos, o Juizado Especial
Cível será competente para seu processamento. Deveras, a competência dos Juizados
Especiais Cíveis para o processamento de ações possessórias sobre bens imóveis é
determinada explicitamente pelo inciso IV do artigo 3º da Lei nº 9.099/1995, ao passo que
a competência para o processamento das demandas possessórias sobre bens móveis insere-
se, sem óbice, na regra ampla do inciso I do mesmo artigo.
Todavia, em ocorrendo a violação da posse motivada por greve de trabalhadores
regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho, o conflito de natureza possessória, além
de se apresentar como uma clara decorrência da própria relação de emprego, vincula-se
diretamente ao próprio exercício do direito de greve, estando, assim, inserto no comando do
artigo 114, II, da Constituição Federal, razão por que a competência material para o seu
processamento é da Justiça do Trabalho. É esse, vale constar, o entendimento cristalizado
pelo Supremo Tribunal Federal no Enunciado de Súmula Vinculante nº 23, segundo o qual
a Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar ação possessória ajuizada em
decorrência do exercício do direito de greve pelos trabalhadores da iniciativa privada

19. Fungibilidade das ações possessórias e sua finalidade: o caput do artigo 554
do Código de Processo Civil de 2015, à semelhança do que dispunha o artigo 920 do Código
de 1973, estabelece verdadeira fungibilidade com relação às ações possessórias típicas,
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normando que a propositura equivocada de uma ação possessória, ou mesmo a
superveniência de fato que altere a configuração jurídica da lesão possessória sofrida, não
impede o juiz de conceder a medida adequada à proteção da posse do demandante,
consoante o material probatório acostado aos autos. Em qualquer caso, o juiz deverá sempre
deferir a proteção possessória mais adequada à situação de fato que restar provada nos autos.
A fungibilidade conferida às ações possessórias visa atender justamente a duas
peculiaridades das lides materiais possessórias: (i) o caráter dinâmico das relações
possessórias, notadamente a facilidade e a rapidez com que se pode alterar (especialmente
pelo agravamento) a situação fática que embasa a demanda; e (ii) a circunstância de que,
nos casos concretos, nem sempre é translúcida a distinção entre os graus de ofensa à posse,
sendo possível que o autor, no momento da propositura da demanda, tenha dúvida objetiva
acerca da categorização jurídica da ofensa concreta à posse e, portanto, também sobre a
espécie de ação possessória cabível.
Assim, se o autor, que inicialmente tem sua posse ameaçada de esbulho, ajuíza um
interdito proibitório, sobrevindo, após a propositura da demanda, a efetivação do esbulho
até então iminente, deve o juiz receber e julgar a demanda como ação de reintegração de
posse, nada impedindo, ainda, que novamente ajuste o objeto do julgamento, caso, em
momento posterior do processo, seja comprovada nos autos nova alteração do arcabouço
fático, a modificar o grau da lesão possessória sofrida e, por conseguinte, a espécie de
medida judicial adequada.
A fungibilidade das ações possessórias típicas funciona como um mecanismo
voltado a conferir uma prestação jurisdicional mais efetiva ao possuidor, em atenção ao
princípio da efetividade insculpido no artigo 37, caput, da Constituição Federal e no artigo
8º do Código de Processo Civil de 2015, evitando-se indevidas violações ao princípio da
economia processual e prestigiando-se, com tudo isso, o direito do jurisdicionado de acesso
a uma ordem jurídica justa.

20. O caráter restrito da fungibilidade das ações possessórias: a regra de


fungibilidade, no âmbito do Direito Processual Civil brasileiro, constitui-se em disciplina
de exceção, já que a regra geral vigente em Terrae Brasilis, oriunda do princípio dispositivo
(artigo 2º do Código de Processo Civil de 2015), é a da adequação e da congruência da
prestação jurisdicional à demanda ajuizada pelo respectivo autor, nos limites do pedido
(conforme artigos 141 e 492 do Código de Processo Civil de 2015). E, sendo a fungibilidade
processual uma regra de exceção, como tal deve ser interpretada restritivamente.Ora, é de
se perceber que a regra de fungibilidade trazida pelo texto do artigo 554, caput, do Código
729
de Processo Civil de 2015 encontra-se prevista especificamente no capítulo próprio das
ações possessórias típicas, circunstância essa que, diante do caráter excepcional de tal
mecanismo, a ensejar interpretação restritiva, significa que a mencionada regra de
fungibilidade aplica-se apenas quando o equívoco do autor ou a readequação da
configuração jurídica se limita às demandas possessórias típicas (reintegração e manutenção
de posse, bem como interdito proibitório), nunca podendo essa regra excepcional ser
aplicada quando envolver outra modalidade de ação que não seja possessória típica.
Impossível, pois, que se aplique referida regra para garantir a fungibilidade entre
uma ação possessória e uma ação petitória, ainda que essa se apresente como uma das
denominadas ações possessórias atípicas (como é o caso da ação de imissão na posse, dos
embargos de terceiro, da nunciação de obra nova e da ação de dano infecto).
Ademais, a regra de fungibilidade das ações possessórias tem sua aplicação restrita
não apenas às ações possessórias típicas, mas também, no bojo dessas, às tutelas
possessórias de natureza inibitória ou de remoção do ilícito, não englobando a tutela
ressarcitória (indenizatória) cujo pleito em cumulação é permitido pelos artigos 555 e 556
do Código de Processo Civil de 2015.
Deveras, os artigos 555 e 556 do Código Processual, ao permitirem a cumulação de
pedido indenizatório na petição inicial ou na contestação da ação possessória, estão a exigir,
por certo, a formulação expressa desse pedido ressarcitório, notadamente porque o pedido
indenizatório não se trata propriamente de pedido possessório, ainda que decorrente de
ilícito contra a posse.
Disso resulta que, por força do princípio dispositivo e do princípio da congruência
aplicáveis plenamente à situação, em virtude do caráter excepcional e limitado da regra de
fungibilidade possessória , não é permitido que o órgão jurisdicional aprecie eventual
direito indenizatório das partes quando acerca dele não houver pedido formulado na exordial
ou na contestação da ação possessória, sob pena de configurar julgamento extra petita e,
pois, de culminar na nulidade da decisão. É, aliás, como entende o Superior Tribunal de
Justiça: REsp nº 1.060.748/MG, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado
em 09/04/2013, DJe 18/04/2013.
Desse modo, se a situação vivenciada pelas partes quando da propositura da
demanda possessória ou da apresentação da contestação se agravar durante a tramitação da
referida ação, surgindo dano indenizável, deve o autor ou o réu, para buscar a tutela
ressarcitória que entender cabível, aditar o pedido inicial ou o pedido formulado na
contestação (nos termos do artigo 329 do Código de Processo Civil de 2015) ou, então,
propor ação indenizatória autônoma.
730
21. As ações possessórias coletivas: o artigo 554, §§ 1º a 3º, do Código de Processo
Civil de 2015 trata de particular hipótese de ação possessória em que figura no polo passivo
grande número de pessoas, em litisconsórcio multitudinário. Na situação a que se refere o
dispositivo, está-se diante, na realidade, de uma ação possessória que envolve litígio
coletivo e, em tal medida, de uma ação coletiva.
Aliás, os comentados §§ 1º a 3º do artigo 554 que, vale pontuar, não guardam
qualquer relação com o respectivo caput devem ser compreendidos conjuntamente ao
artigo 565 do mesmo Código Processual, uma vez que esse último também é dedicado a
tratar das demandas possessórias coletivas. A propósito, o caput do artigo 565 emprega
a conclusão de que as

artigo 554 são, em maior ou menor medida, demandas coletivas.


Ora, na hipótese em comento, não há dúvidas de que o interesse, legítimo ou não, do

apresenta-se como interesse coletivo lato sensu, enquadrando-se na situação do artigo 81,
parágrafo único, III, do Código de Defesa do Consumidor, visto tratar-se de interesse que,
embora individual e divisível, possui natureza homogênea, em vista da origem fática comum
a todos os pretensos violadores ou ameaçadores da posse.
Todavia, contrariamente às ações coletivas até então consagradas pelo Direito desta
Terra de Santa Cruz em que o grupo de pessoas substituído processualmente tem seus
interesses defendidos no polo ativo da demanda (como ocorre, verbi gratia, na ação civil
pública, na ação popular e no mandado de segurança coletivo) , nas ações possessórias
coletivas o interesse homogêneo encontra-se no polo passivo, o que significa que a ação
possessória coletiva regulamentada pelos artigos 554, §§ 1º a 3º, e 565 do Código de
Processo Civil de 2015 constitui-se em uma modalidade, se bem que bastante peculiar, de
ação coletiva passiva (defendant class action).

22. Inaplicabilidade da regra de limitação de litisconsórcio às ações possessórias


coletivas: como verificado, a hipótese do artigo 554, §§ 1º a 3º, do Código de Processo Civil
de 2015 é de uma ação possessória coletiva passiva, havendo, na situação nela descrita,
interesses legítimos ou ilegítimos que, embora individuais e divisíveis entre os litigantes
passivos do litisconsórcio multitudinário, apresentam-se homogêneos, pois de origem fática
comum.
Não se trata, portanto, de um simples litisconsórcio facultativo, que pudesse, pois,
ensejar a aplicação da regra de limitação de litisconsortes prevista no artigo 113, § 1º, do
731
Código de Processo Civil de 2015, mas da autêntica manifestação de um interesse
homogêneo, coletivo lato sensu e que eleva o litisconsórcio passivo à qualidade de
necessário, sendo, nessa medida, incompatível com a referida regra de limitação de
litisconsórcio.

23. Atuação do Ministério Público nas ações possessórias coletivas: o Direito


brasileiro confere ao Ministério Público a atribuição para atuar, judicial e
extrajudicialmente, no âmbito de conflitos que envolvam interesses coletivos lato sensu,
legitimando-o para a propositura de ações coletivas e tornando obrigatória sua intimação
para a atuação, como custos legis, nas ações coletivas em que não figurar como parte
processual (vide artigo 129, III, da Constituição Federal, artigo 5º, I e § 1º, da Lei nº
7.347/1985, artigos 82, I, 91 e 92 do Código de Defesa do Consumidor e artigo 25, IV, da
Lei nº 8.625/1993).
Bem atendendo às referidas atribuições do Ministério Público, o § 1º do artigo 554
do Código de Processo Civil de 2015, em clara conformidade com o artigo 178, III, do
mesmo Diploma Processual, prescreve a obrigatoriedade de intimação do Ministério
Público para intervir nas ações possessórias coletivas, caso em que sua atuação, via de regra,
se limitará à atividade de custos legis, sendo sujeito imparcial no processo e, nessa medida,
podendo manifestar-se favoravelmente a qualquer das partes cujo interesse se mostre
legítimo.
Entretanto, se, eventualmente, o grupo litigante réu estiver desassistido e não se
enquadrar na condição de hipossuficiência financeira, o Ministério Público, uma vez
intimado a intervir na demanda, poderá, se reputar legítimo o interesse do conjunto passivo
(por exemplo, em havendo indícios de que o autor da ação possessória não seja, realmente,
possuidor), excepcionalmente atuar em seu favor, na qualidade de substituto processual.
Vale rememorar, nesse ponto, conforme explicitado com maior vagar nos
comentários constantes do item nº 6 supra, que o possível desrespeito à função social da
propriedade não torna ilegítima ou juridicamente desamparada a posse exercida pelo seu
proprietário, nem autoriza ou converte em legítima a eventual ameaça ou violação
possessória feita por terceiros. Em outras palavras, a ameaça ou violação possessória não
deixa de ser ilícita por ser pretensamente motivada pela falta de cumprimento da função
social da propriedade pelo possuidor titular do domínio, o que significa, em última análise,
que, em casos como esse, não se pode considerar legítimo, sequer para fins de substituição
processual pelo Ministério Público, o interesse do grupo litigante réu.
732
24. Atuação da Defensoria Pública nas ações possessórias coletivas: o Direito
brasileiro confere à Defensoria Pública a atribuição para atuar, judicial e extrajudicialmente,
em defesa dos interesses coletivos lato sensu dos financeiramente hipossuficientes,
inclusive legitimando-a para a propositura de ações coletivas (vide artigo 134 da
Constituição Federal, artigo 5º, II, da Lei nº 7.347/1985, artigos 1º e 4º, I, VII, VIII, X e XI,
da Lei Complementar nº 80/1994 e artigo 185 do Código de Processo Civil de 2015).
Também a fim de atender à referida atribuição constitucional e infraconstitucional,
o § 1º do artigo 554 do Código de Processo Civil de 2015 prescreve a obrigatoriedade de
intimação da Defensoria Pública para intervir nas ações possessórias coletivas, sempre que
o conjunto de sujeitos figurantes do polo passivo se apresentar em situação de
hipossuficiência financeira, caso em que a Defensoria Pública atuará, em favor desse grupo,
como substituto processual, defendendo, em nome próprio, o alegado interesse coletivo.
Ressalve-se, ainda, em já estando o grupo litigante réu representado em juízo por
advogado próprio (visto que, comumente, esses grupos são movimentos organizados já
dotados de assessoria jurídica), a possibilidade de a Defensoria Pública atuar como
representante de um ou mais indivíduos financeiramente hipossuficientes desse grupo réu
que desejem intervir no processo como assistentes litisconsorciais, assumindo a posição de
litisconsortes facultativos unitários ulteriores.

25. Qualificação das partes da ação possessória regra geral: o artigo 319, II, do
Código de Processo Civil de 2015, exige, para a propositura de qualquer demanda judicial,
como requisito da petição inicial, que o autor da ação indique a qualificação completa sua e
do réu (com seus nomes, prenomes, estado civil, existência de união estável, profissão,
domicílio, CPF ou CNPJ e endereço de e-mail), sendo que o cumprimento dessa exigência
é, via de regra, indispensável, a fim de que se possibilite a adequada citação do réu correto
para ação e a ciência desse réu acerca de quem é, exatamente, o autor da demanda. E referida
exigência de qualificação dos sujeitos da demanda vale como regra geral também para as
ações possessórias, devendo a parte autora da ação, via de regra, qualificar adequadamente
a si própria e à parte ré.

26. Qualificação das partes da ação possessória a excepcional permissão de


propositura da ação possessória sem individualização, na petição inicial, do polo
passivo: a despeito da regra geral prevista no artigo 319, II, do Código de Processo Civil de
2015, casos há em que a qualificação da parte ré se mostra extremamente difícil ou, mesmo,
perigosa, acarretando, no mais das vezes, verdadeira impossibilidade prática de qualificação
733
do réu na peça inicial, ficando o autor impedido de inserir, na exordial, os dados da parte ré
exigidos pela legislação processual.
Não é razoável, em situações como essas, que se exija invariavelmente a plena
indicação da qualificação da parte ré, pelo autor, para que a ação possessória cabível possa
ser proposta e tramitar adequadamente. Deveras, a exigência, nesses casos, inviabilizaria a
citação de todos os réus ou, então, colocaria em risco a vida do demandante e, justamente
por isso, obstaria a busca, por ele, da tutela jurisdicional de sua posse legítima, em clara
afronta ao princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional previsto no artigo 5º, inciso
XXXV, da Constituição Federal.
O próprio artigo 319 do Código de Processo Civil de 2015, em seu § 2º, estabelece
que a incompletude da qualificação do réu não impede o recebimento da ação judicial, desde
que sejam informados dados mínimos que possibilitem a operacionalização de sua citação.
E estabelece ainda o mesmo artigo, em seu § 3º, que a ausência até mesmo de dados mínimos
de identificação da parte ré não gera o indeferimento da inicial, quando for impossível ou
extremamente difícil (inclusive em termos financeiros) ao autor obter essas informações.
Assim, por exemplo, no caso de demanda possessória individual que tenha por
objeto a tutela da posse sobre bem imóvel, sendo perigoso à vida ou à integridade física do
autor tentar identificar o réu então desconhecido, basta-lhe indicar a localização do imóvel,
requerendo que a citação lá seja feita, oportunidade em que o próprio oficial de justiça
deverá colher, pessoalmente, os dados necessários à qualificação do réu, inclusive com o
auxílio de força policial, se necessário.
Ainda, para a situação específica das ações possessórias coletivas, e reforçando a
previsão de seu artigo 319, §§ 2º e 3º, o Código de Processo Civil de 2015 incorpora a seu
texto a tendência jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça (vide, verbi gratia: REsp
nº 154.906/MG, Rel. Ministro Barros Monteiro, Quarta Turma, julgado em 04/05/2004, DJ
02/08/2004, p. 395; REsp nº 362.365/SP, Rel. Ministro Barros Monteiro, Quarta Turma,
julgado em 03/02/2005, DJ 28/03/2005; REsp nº 837.108/MG, Rel. Ministro Luiz Fux,
Primeira Turma, julgado em 05/06/2008, DJe 18/06/2008), estabelecendo, nos §§ 1º a 3º do
artigo 554 sob comento, a possibilidade de a parte autora propor a demanda possessória sem
a individualização de todos os supostos violadores ou ameaçadores da posse, podendo
identificar apenas um, alguns ou, mesmo, nenhum dos réus, desde que indique o local em
que situado o bem cuja posse está sob violação ou ameaça, sendo que, em qualquer dessas
situações, o próprio oficial de justiça deverá, direcionando-se uma só vez ao local indicado,
proceder à citação pessoal de todos os que ali se encontrarem, enquanto os demais deverão
ser citados por edital, com a mais ampla publicidade.
734
Deveras, por meio de tais mecanismos, além de se possibilitar, em termos práticos,
o manejo da ação possessória individual ou coletiva pelo possuidor legítimo, viabiliza-se a
pronta concessão da tutela de evidência possessória liminar. Ademais, uma vez integrado o
polo passivo pela citação da parte ré inclusive pessoalmente e por edital e, se o caso,
pela intimação da Defensoria Pública ou do Ministério Público, mostra-se possível o
imediato cumprimento provisório da decisão liminar.

27. A citação nas ações possessórias coletivas: nos termos do que estabelece o
artigo 554, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil, em se tratando de ação possessória
coletiva, a citação da parte ré deve realizar-se em duas etapas: (i) de início, uma vez proposta
a possessória coletiva, o oficial de justiça deve deslocar-se, por apenas uma oportunidade
(não se aplica, portanto, a regra do artigo 252 do Código de Processo Civil de 2015), até o
local em que situado o imóvel, conforme indicação constante da petição inicial, para, então,
proceder à citação de todos os supostos violadores ou ameaçadores da posse que ali se
encontrarem; após isso, (ii) todos os demais réus, então incertos, deverão ser citados por
edital.
A citação por edital, nessas circunstâncias, liga-se profundamente às disposições dos
artigos 256, I, e 259, III, ambos do Código de Processo Civil de 2015, e se efetivará, nos
mediante a publicação do
edital na rede mundial de computadores, no sítio do respectivo tribunal e na plataforma de
editais do Conselho Nacional de Justiça, que deve ser certificada nos autos

28. Indispensabilidade da citação por edital dos réus incertos, na hipótese de


ação possessória coletiva: nas ações possessórias coletivas, a citação por edital dos réus
incertos é providência indispensável. Diante dessa obrigatoriedade, o Superior Tribunal de
Justiça entende que a ausência de citação por edital dos réus desconhecidos da possessória
coletiva gera nulidade processual absoluta (REsp nº 1.314.615/SP, Rel. Ministro Luis Felipe
Salomão, Quarta Turma, julgado em 09/05/2017, DJe 12/06/2017), entendimento esse que,
aliás, bem se conforma ao prescrito nos artigos 115, I, e 239 do Código de Processo Civil
de 2015.
Há, todavia, certa ressalva de ordem técnica a ser feita, tanto em relação à opção
redacional dos artigos 115, I, e 239 do Código de Processo Civil de 2015, quanto ao
mencionado entendimento do Superior Tribunal de Justiça. Ocorre que, por se tratar a
citação de ato pelo qual se integra a relação processual com a inserção da parte ré, e tendo-
se em vista que as partes consistem em pressuposto de existência da relação jurídica
735
processual (e não de sua mera validade), a ausência de citação por edital dos réus incertos
resulta em autêntica inexistência jurídica do processo, não em simples vício de nulidade
absoluta.

29. A ampla publicidade das ações possessórias coletivas: com o fito de melhor
assegurar a oportunização do contraditório no âmbito das ações possessórias coletivas,
estabelece o § 3º do artigo 554 do Código de Processo Civil de 2015 que é dever do órgão
jurisdicional em que tramita a demanda possessória coletiva conferir ampla publicidade a
respeito da existência da referida demanda e, ainda, dos prazos a ela relacionados (verbi
gratia, os prazos para contestação, para a interposição de recursos, para eventuais atos
probatórios, dentre outros).
Para tanto, o mencionado dispositivo legal indica a possibilidade de o órgão
jurisdicional utilizar-se de anúncios em jornal ou rádio locais e da publicação de cartazes na
região em que se desenvolve o conflito possessório (medidas de publicidade nominadas),
tudo sem prejuízo do emprego de outros meios (medidas de publicidade inominadas).
O dispositivo sob comento apresenta um rol meramente exemplificativo, indicando
que a definição in concreto
inominadas) deve ter como parâmetro a aptidão dos meios escolhidos para proporcionar a
amplitude necessária à mencionada publicidade, consideradas, por certo, as peculiaridades
da lide e das partes, bem como as características próprias da região em que se desencadeia
o conflito possessório. Atende-se, com isso, ao princípio da eficiência processual, inscrito
no artigo 8º do Código de Processo Civil de 2015.
Nessa toada, é também importante notar que a regra legal não estabelece qualquer
hierarquia ou ordem de preferência entre os meios a serem utilizados para dar ampla
publicidade à demanda nem entre os meios nominados, nem entre os nominados e os
inominados .
Não há, portanto, necessidade de utilizarem-se primeiramente anúncios em jornal ou
rádio para que, então, se possam expor cartazes na região do conflito e, enfim, empregarem-
se os meios inominados. Vale frisar: a tônica para a escolha dos meios para a conferência
de ampla publicidade à demanda possessória coletiva é a sua aptidão in concreto, diante da
realidade local e das circunstâncias da lide, para conferir à referida publicidade a amplitude
desejada, podendo o órgão jurisdicional, se assim lhe parecer mais eficaz, deixar de
empregar as duas medidas nominadas e fazer uso, já de proêmio, de alguma medida de
publicidade inominada que se apresente eficaz.
736
Art. 555. É lícito ao autor cumular ao pedido possessório o de:
I - condenação em perdas e danos;
II - indenização dos frutos.
Parágrafo único. Pode o autor requerer, ainda, imposição de medida necessária e adequada
para:
I - evitar nova turbação ou esbulho;
II - cumprir-se a tutela provisória ou final.

1. Referência na legislação anterior: artigo 921 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Cúmulo objetivo cumulação sucessiva de pedido de tutela ressarcitória


diretamente relacionada à lide possessória: o caput do artigo 555 do Código de Processo
Civil de 2015, com seus incisos, consagra expressamente a possibilidade de cumulação
sucessiva, à pretensão possessória (de natureza inibitória ou de remoção do ilícito), de
pretensão indenizatória, ou seja, de pedido de tutela de natureza ressarcitória, consistente
em pleito de condenação em perdas e danos inclusive quanto aos frutos indevidamente
percebidos , sendo necessário, contanto, que tal direito indenizatório tenha conexão com o
pedido possessório, referindo-se a dano originado diretamente da situação fática de ameaça
ou de ofensa à posse.
De início, perceba-se que o dispositivo legal em comento permite que o autor cumule
à pretensão possessória apenas pedido indenizatório que tenha conexão com o pedido
possessório, ou seja, que se refira a dano diretamente decorrente do conflito possessório,
qualquer seja a natureza desse dano material (dano emergente ou lucros cessantes), moral
ou estético.
É também necessário esclarecer que, em virtude do princípio da especialidade (cuja
base constitucional é o princípio da igualdade substancial), a cumulação sucessiva de ações
prevista especificamente nesses dois incisos do caput do artigo 555, embora relativa a
pedidos de natureza distinta do pedido possessório, não se sujeita aos requisitos gerais para
o cúmulo objetivo elencados no artigo 327 do Código de Processo Civil de 2015, visto que
a própria legislação reconhece haver a compatibilidade necessária para a formulação dos
dois pedidos no bojo da ação possessória, seguindo o mesmo procedimento especial, o que
se facilita pela circunstância de as ações possessórias aproveitarem, após o momento da
contestação, o procedimento comum, conforme determina o artigo 566 do Código de
Processo Civil de 2015.
737
Essa permissão de cumulação de pedidos atende bem ao caractere instrumental do
processo e ao princípio da economia processual, visto ser comum que os conflitos
possessórios gerem dano indenizável, seja de natureza aquiliana, seja de natureza contratual
(quando a posse decorre de contrato e o violador da posse, ao assim agir, descumpre
obrigação contratual), e, ainda, porque essa responsabilidade civil, que abrange a disciplina
quanto à indenização pelos frutos, é intrinsecamente ligada à matéria possessória, tanto que
a legislação civil brasileira confere tratamento detalhado sobre aquelas no bojo da
regulamentação acerca dessa última (vide artigos 1.214 a 1.218 do Código Civil).
A propósito, mostra-se bastante inconveniente a distinção feita pelo artigo 555 do
Código de Processo Civil de 2015, ao mencionar separadamente (em incisos distintos) os
pedidos de indenização por perdas e danos e de indenização pelos frutos, uma vez que ambos
refletem pretensões indenizatórias, sendo que o primeiro, mais amplo, já abrange em seu
conteúdo o segundo, razão por que bastaria ao Código prever a possibilidade de cúmulo, à
pretensão possessória, da pretensão de condenação do réu ao pagamento de indenização por
perdas e danos.

3. Autênticos pedidos: as hipóteses relacionadas nos incisos I e II do caput do artigo


555 do Código de Processo Civil de 2015, visto expressarem autênticas pretensões,
configuram-se, verdadeiramente, como pedidos, não simples requerimentos. Por essa razão,
a petição inicial possessória é o momento adequado para a cumulação desses pedidos, que
não poderão ser posteriormente formulados, exceto mediante aditamento da inicial, possível
apenas até o saneamento processual e para o que será necessário o consentimento do réu
caso requerido após a citação, nos termos do artigo 329 do Código de Processo Civil de
2015.
Outrossim, uma vez que a regra de fungibilidade das ações possessórias não se aplica
para quaisquer das tutelas ressarcitórias cujo pleito em cumulação é permitido pelo
dispositivo ora comentado, não é permitido que o órgão jurisdicional aprecie eventual
direito indenizatório do autor quando acerca dele não houver pedido formulado na petição
inicial da ação possessória, sob pena de configurar julgamento extra petita. É esse o
entendimento do Superior Tribunal de Justiça (vide REsp nº 1.060.748/MG, Rel. Ministro
Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 09/04/2013, DJe 18/04/2013).

4. A condenação ao pagamento de indenização não é mera decorrência da


procedência do pedido possessório: uma vez que a pretensão indenizatória é verdadeiro
738
pedido e, assim, autêntica ação cumulada à demanda possessória , tendo inclusive causa
de pedir própria (que deve ser narrada pelo autor na peça exordial), sua procedência, com a
condenação na indenização pretendida, não é consequência automática da procedência do
pedido possessório, mas depende de os fatos constitutivos do direito indenizatório do autor
serem suficientemente demonstrados nos autos, tal como ocorreria caso escolhesse propor
autonomamente a demanda indenizatória.

5. Cumulação de outros pedidos: a previsão específica de cúmulo objetivo, à ação


possessória, de ações de natureza indenizatória conexas à lide possessória não constitui
impedimento à cumulação de outros pedidos que não se enquadrem nessa disposição do
artigo 555 do Código de Processo Civil de 2015. Entretanto, o cúmulo objetivo que
extrapolar os limites do artigo 555 do Código de Processo Civil de 2015 não se dará com
aproveitamento do procedimento especial das ações possessórias, senão mediante a regra
geral dos artigos 326 e 327 do mesmo Diploma Processual, sendo necessário o
preenchimento de seus respectivos requisitos.

6. Requerimento de medidas indutivas, coercitivas, mandamentais e sub-


rogatórias: prevêem os incisos do parágrafo único do artigo 555 que o autor da ação
possessória pode requerer a imposição de medida que entenda necessária e adequada para
inibir nova ameaça ou violação à sua posse, bem como para o cumprimento de decisão
judicial provisória (sumária) ou final proferida na ação possessória. E como indica a própria
redação do dispositivo legal, as medidas nele indicadas são meros requerimentos, não
pedidos.
A propósito, o dispositivo, ao não prever rol taxativo de quais medidas são passíveis
de requerimento, consolida intrínseca relação com os artigos 139, IV, e 497 do Código de
Processo Civil de 2015 e confirma no rito possessório a atipicidade dos meios executórios
(como há tempos já declarava o Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 1.423.898/MS, Rel.
Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, Terceira Turma, julgado em 02/09/2014, DJe
01/10/2014), estabelecendo, pois, a possibilidade de requerimento, pela parte autora da ação
possessória, para os fins ali indicados, de quaisquer medidas indutivas, coercitivas,
mandamentais ou sub-rogatórias, a exemplo das prescritas nos artigos 536 a 538 do Código
de Processo Civil de 2015.

7. Inocorrência de preclusão quanto aos requerimentos do parágrafo único: a


falta da formulação, na petição inicial, de quaisquer dos requerimentos indicados nos incisos
739
I e II do parágrafo único do artigo 555 do Código de Processo Civil não gera preclusão e
nem traz prejuízo algum à parte autora, que pode requerer tais medidas em momento
posterior, independentemente de aditamento à inicial ou de consentimento do réu. Isso
porque, como já esclarecido, tais medidas não se tratam de pedidos, mas de simples
requerimentos, não atraindo a incidência do disposto nos artigos 329 e 330, I, § 1º, I, do
Código de Processo Civil de 2015.

8. Desfazimento de construção ou plantação: o similar artigo 921 do Código de


Processo Civil de 1973 previa, em seu inciso III, a possibilidade de cumulação pelo autor,
já na inicial possessória, de pedido de desfazimento de construção ou plantação feita em
detrimento de sua posse, fórmula então não repetida pelo artigo 555 do Código de Processo
Civil de 2015.
Entretanto, tal ausência textual nada significa, visto que o desfazimento de
construções ou plantações apresenta-se como parcela integrante da própria tutela
possessória, sendo medida com aplicação lógica em consequência do acolhimento do pedido
de reintegração ou manutenção da posse sob pena, inclusive, de o provimento jurisdicional
não se mostrar efetivamente apto a restituir ou a manter plenamente a posse do autor e,
enfim, a restabelecer o status quo ante.
Por essa razão, o desfazimento de construções ou plantações insere-se no âmbito das
medidas a que se refere o inciso II do parágrafo único do artigo 555, sendo, aliás, medida

à efetivação de tutela específica de remoção do ilícito),


podendo ser requerido pelo autor na petição inicial ou, se assim preferir, em momento
posterior da demanda possessória.
O Código de Processo Civil de 2015, na realidade, conferiu tratamento adequado à
medida de desfazimento de construções ou plantações, deixando de categorizá-la como
pedido cujo acolhimento dependeria de decisão condenatória (tal como fazia o Código de
1973), para corretamente reconhecer sua natureza de mero requerimento, deferível tal como
qualquer medida de apoio voltada à efetivação da tutela possessória.

Art. 556. É lícito ao réu, na contestação, alegando que foi o ofendido em sua posse,
demandar a proteção possessória e a indenização pelos prejuízos resultantes da turbação ou
do esbulho cometido pelo autor.

1. Referência na legislação anterior: artigo 922 do Código de Processo Civil de


1973.
740
2. Caráter dúplice das ações possessórias típicas, quanto às pretensões
possessórias: as ações possessórias típicas possuem caráter dúplice, ou seja, não há nelas
definição rígida de autor e de réu, uma vez que, enquanto a procedência da ação possessória
reconhece a legitimidade da posse ao autor e garante sua proteção, a simples improcedência
da ação possessória reconhece a legitimidade da posse do réu, tutelando-a também,
independentemente do manejo de reconvenção pelo réu.
Referida duplicidade das ações possessórias, nesses exatos termos, é expressamente
reconhecida pelo Superior Tribunal de Justiça (como se observa, verbi gratia, do julgamento
proferido no REsp nº 1.483.155/BA, Rel. Ministro João Otávio de Noronha, Terceira
Turma, julgado em 24/02/2015, DJe 16/03/2015).
E, exatamente sob o fundamento dessa duplicidade, o artigo 556 do Código de
Processo Civil de 2015 estabelece que, nas ações possessórias típicas, o réu pode, na própria
contestação, por simples pedido, alegar que ele é o verdadeiro ofendido ou ameaçado em
sua posse pelo autor e, assim, pleitear para si, contra o autor, a proteção possessória, seja
ela de caráter inibitório (interdito proibitório), seja de remoção do ilícito (reintegração ou
manutenção de posse).
Entretanto, o artigo 556 do Código de Processo Civil de 2015 merece crítica no
sentido de que se mostra desnecessária e, mesmo, em certa medida, imprópria a
permissão legal para que o réu formule pedido possessório na contestação, uma vez que,
justamente em vista da duplicidade própria das ações possessórias típicas, a simples
improcedência do pedido possessório do autor já resultaria no reconhecimento e na proteção
da posse do réu, independentemente da formulação de qualquer pedido.

3. Viabilidade de pedido contraposto, quanto a eventual pretensão


ressarcitória: o mesmo artigo 556 do Código de Processo Civil de 2015 permite ao réu
que, igualmente por simples pedido na contestação, pleiteie indenização por danos
decorrentes da violação possessória praticada pelo autor, o que engloba, por certo, a
possibilidade de pleitear eventual indenização por benfeitorias, sendo a contestação também
a oportunidade do réu para o exercício do direito de retenção derivado daquele direito à
indenização pelas benfeitorias (conforme artigo 538, §§ 1º e 2º, do Código de Processo Civil
de 2015).
Nesse ponto, todavia, é importante o esclarecimento de que a duplicidade das
demandas possessórias típicas é restrita à tutela possessória (inibitória ou de remoção do
ilícito), não abrangendo eventual pretensão ressarcitória, visto que a improcedência do
pedido possessório do autor gera, automaticamente, o reconhecimento da posse do réu, mas
741
a improcedência do pedido possessório ou indenizatório do autor não resulta, de per si, no
reconhecimento de qualquer direito ressarcitório ao réu.
Por essa razão, a possibilidade de formulação de pedido indenizatório pelo réu na
contestação não se trata de decorrência da natureza dúplice das ações possessórias, mas de
mera permissão legal para a veiculação de verdadeiro pedido contraposto, o que significa
que a ausência de formulação de pedido indenizatório pelo réu na contestação resulta, por
força dos princípios dispositivo e da congruência (artigos 2º, 141 e 492 do Código de
Processo Civil de 2015), na impossibilidade de o órgão jurisdicional, na decisão de mérito
da ação possessória, condenar o autor a lhe indenizar por quaisquer danos, sob pena de
incorrer em julgamento extra petita e, assim, nulo.

4. A maior cautela exigida do autor da ação possessória: tanto a duplicidade das


ações possessórias quanto a viabilização de formulação de pedido contraposto pelo réu na
contestação exigem do autor da demanda possessória um cuidado especial quando de sua
propositura, em vista do risco de ser ele próprio, pela decisão final de mérito, submetido a
medida possessória ou, ainda, condenado ao pagamento de indenização em favor do réu.

5. Não cabimento de reconvenção para formulação de pedido possessório ou


indenizatório: a duplicidade da ação possessória quanto ao pedido possessório e a
viabilidade de formulação de pedido contraposto para as pretensões indenizatórias tornam
incabível o manejo de reconvenção no procedimento possessório quanto aos pedidos de
tutela da posse e de indenização.
Deveras, a circunstância de que o réu pode, já na própria contestação, formular
pedido possessório ou indenizatório contra o autor torna não apenas desnecessária a
reconvenção, mas inadmissível para tal finalidade, uma vez que, podendo o réu obter a
medida desejada mediante simples pedido na contestação, sequer possui interesse de agir
para o manejo da reconvenção, que, sendo autêntica demanda judicial, resta vinculada às
condições da ação.

6. Cabimento de reconvenção para a formulação de outros pedidos não


abrangidos pelo artigo 556 do Código de Processo Civil de 2015: será cabível a
propositura de reconvenção pelo réu no âmbito da ação possessória, observados os
requisitos do artigo 343 do Código de Processo Civil de 2015, se a pretensão do réu contra
o autor for outra que não as de proteção da posse e de indenização (que são abrangidas pela
duplicidade e pela viabilidade de simples pedido contraposto).
742
Deveras, a não previsão no artigo 556 do Código de Processo Civil de 2015 de uma
determinada pretensão não significa que não possa o réu formulá-la, senão apenas indica
que não o poderá fazer na própria contestação e, pois, que tal pleito deverá, se o caso, ser
formulado pelo réu em sede de reconvenção, nos termos do artigo 343 do Código de
Processo Civil de 2015.
Exemplo é o manejo de reconvenção para a veiculação de pedido de rescisão do
contrato, quando tal contrato basear a posse debatida na demanda possessória. Isso porque
no pleito de rescisão contratual não há discussão sobre a propriedade do bem, senão apenas
da relação contratual existente (não se subsumindo, pois, à limitação constante do artigo
557 do Código de Processo Civil de 2015), relação essa que deverá ter ligação direta com a
posse cuja tutela é objeto da demanda possessória.

Art. 557. Na pendência de ação possessória é vedado, tanto ao autor quanto ao réu, propor
ação de reconhecimento do domínio, exceto se a pretensão for deduzida em face de terceira
pessoa.
Parágrafo único. Não obsta à manutenção ou à reintegração de posse a alegação de
propriedade ou de outro direito sobre a coisa.

1. Referência na legislação anterior: artigo 923 do Código de Processo Civil de


1973.

2. A regra legal da separação do juízo petitório e do juízo possessório e a


imunidade da ação possessória a questões relativas ao domínio: o artigo sob comento,
em seu parágrafo único, corroborando o que estabelecia o já vigente artigo 1.210, § 2º, do
Código Civil (de semelhante redação), explicita que a alegação de propriedade ou de
qualquer outro direito real sobre a coisa não influencia, por si só, quanto à solução a ser
conferida à lide possessória, não impedindo a reintegração, a manutenção ou a proteção
preventiva da posse em favor daquele que demonstrar ser o legítimo possuidor.
Na realidade, esse dispositivo legal consagra uma implícita vedação a que se discuta,
seja como pedido, seja como exclusiva causa de pedir da pretensão, a propriedade ou a
titularidade de outros direitos reais no âmbito das ações possessórias típicas.
Desse modo, a figura da exceptio proprietatis (exceção de domínio), permitida no
passado em virtude do teor do artigo 505 do Código Civil de 1916 e do Enunciado de
Súmula nº 487 do Supremo Tribunal Federal, não é mais admitida pela legislação desta
Terra de Santa Cruz no âmbito das ações possessórias, separando-se, com isso, o juízo
petitório do juízo possessório, objetivando-se que as questões relativas ao domínio não
743
interfiram na esfera das questões relativas à proteção da posse, garantindo-se, então, uma
pureza do juízo com relação à tutela possessória. A propósito, o Enunciado de Súmula nº
487 do Supremo Tribunal Federal tem sua aplicação, atualmente, restrita às ações
reivindicatórias.
Nesse sentido, em interpretação ao artigo 1.210, § 2º, do Código Civil, preceitua o
Enunciado nº 79 da I a
exceptio proprietatis, como defesa oponível às ações possessórias típicas, foi abolida pelo
Código Civil de 2002, que estabeleceu a absoluta separação entre os juízos possessório e
petitório
Isso porque a eventual possibilidade de discussão do domínio, como pedido ou como
exclusiva causa de pedir, na seara das ações possessórias esvaziaria, quase que por
completo, a tutela baseada na posse, já que poderia ocorrer de a proteção jurisdicional ser
conferida favoravelmente ao titular do domínio, não ao legítimo possuidor, em clara ofensa
à autonomia entre domínio e posse o que prejudicaria, por exemplo, a ação possessória
movida pelo possuidor direto não proprietário (v.g. o locatário) que tivesse sua posse violada
ou ameaçada pelo proprietário possuidor indireto (v.g. o locador).
Referida separação entre os juízos possessório e petitório, bem como a abolição da
exceptio proprietatis, com a definição legal de que a alegação de propriedade ou da
titularidade de qualquer outro direito real não interfere, por si só, na solução a ser conferida
à demanda possessória, resulta que a ausência de elementos probatórios suficientes a
demonstrar a existência da relação fática de posse pelo autor da demanda deve levar à
prolação de sentença de improcedência, ainda que tenha o autor demonstrado ser o
proprietário ou o titular de algum outro direito real sobre a coisa.
É o que restou cristalizado no Enunciado nº 78 da I Jornada de Direito Civil do
Conselho da Ju tendo em vista a não-recepção pelo novo
Código Civil da exceptio proprietatis (art. 1.210, § 2º) em caso de ausência de prova
suficiente para embasar decisão liminar ou sentença final ancorada exclusivamente no ius
possessionis, deverá o pedido ser indeferido e julgado improcedente, não obstante eventual
alegação e demonstração de direito real sobre o bem litigioso

3. A possibilidade de alegação e de comprovação da propriedade ou de outro


direito real quando tal servir como elemento de prova da própria posse: a imunidade
do juízo possessório às questões relativas ao domínio não obsta, todavia, que a propriedade
ou a titularidade de direito real sobre a coisa seja alegada e demonstrada pelo autor ou pelo
réu da ação possessória quando, eventualmente, servir como um dos elementos de prova da
744
posse (ou, ainda, da melhor posse).
Cumpre perceber que não se trata, nesse caso, de se pedir a proteção possessória com
fundamento no domínio ou em outro direito real (o que seria, então, próprio de uma ação
reivindicatória e, por isso, vedado no âmbito das ações possessórias), mas de se pleitear a
tutela possessória com base na própria posse (a única causa de pedir, portanto, é a posse),
utilizando-se a comprovação da propriedade ou da titularidade de outro direito real como
um dos elementos probatórios voltados exclusivamente à demonstração dessa relação fática
de posse. Trata-se de se demonstrar o ius possidendi como um elemento de prova do ius
possessionis.
É o que ocorre, verbi gratia, quanto à titularidade do direito real de penhor sobre a
coisa, uma vez que esse direito real de garantia tem como característica essencial a
transmissão da posse direta do bem móvel empenhado ao titular do penhor (artigo 1.431 do
Código Civil), servindo, assim, a própria comprovação da titularidade do penhor como um
elemento de prova da posse.
O mesmo se observa nas situações em que o adquirente de um imóvel recebe
automaticamente, no ato de aquisição do domínio sobre o referido bem, a sua posse,
mediante constituto possessório, sendo ele, então, legitimado para propor ação possessória
típica e não mera ação de imissão na posse contra eventual violador ou ameaçador de
sua posse (conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça: AgRg no AREsp nº
10.216/PE, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 05/03/2013, DJe
11/03/2013; REsp nº 1.158.992/MG, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma,
julgado em 07/04/2011, DJe 14/04/2011), caso em que, por lógico, sua posse indireta pode
ser provada pelo próprio instrumento de aquisição da propriedade do imóvel e de que conste
a cláusula constituti.

4. A relativização jurisprudencial da vedação à discussão de domínio, em


relação à fazenda pública: a atual jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça
reconhece não haver óbice a que, no bojo de demanda possessória em que se discuta a posse
de bem público, a fazenda pública alegue o domínio como fundamento para o
reconhecimento de sua posse legítima. A propósito, o Superior Tribunal de Justiça estende
esse entendimento também em benefício da fazenda pública quando intervém, mediante
ação de oposição, em demanda possessória de particulares.
É o que restou firmado no Enunciado de Súmula nº 637 do Superior Tribunal de
Justiça, assim redigid o ente público detém legitimidade e interesse para intervir,
incidentalmente, na ação possessória entre particulares, podendo deduzir qualquer matéria
defensiva, inclusive, se for o caso, o domínio
745
Isso porque, conforme entende o Superior Tribunal de Justiça, a posse do Estado
sobre bens públicos, mormente em se tratando de bens dominicais, merece tratamento um
tanto diverso daquele voltado à posse exercida pelos particulares em relação a bens
particulares, verificando-se, pois, tão somente como decorrência do próprio domínio do ente
público em relação ao bem público, independentemente da demonstração de qualquer poder
fático.
Cabe, entretanto, severa crítica ao mencionado entendimento jurisprudencial.
Isso porque nem sempre é difícil aos entes públicos a prova do poder fático em
relação aos bens públicos de seu domínio, notadamente em se tratando de bens afetados (ou
seja, dos bens públicos de uso comum do povo ou daqueles de uso especial). Basta provar,
nesse caso, o uso que se tem feito do bem público.
Ora, em sendo essa a situação, e diante da possibilidade de prova da posse, não se
pode admitir que o Poder Público, no âmbito de ação possessória, se valha de mera prova
do domínio para fazer cessar a ameaça ou a violência possessória, sob pena de violação ao
princípio constitucional da igualdade, uma vez que inexistente critério de discrímen que se
correlacione logicamente ao tratamento diferenciado.
Ademais, nas hipóteses em que a prova do poder fático sobre o bem público for
impossível ou extremamente difícil o que se verifica, notadamente, quanto aos bens
públicos dominicais , cabe já ao Poder Público, como a qualquer particular, o manejo de
ação reivindicatória para, com base em sua propriedade, requerer a proteção de seu direito
à posse (ius possidendi). E tendo-se em vista que a ação reivindicatória é a ação adequada
para que se busque a proteção possessória com fundamento no domínio, falta ao Poder
Público o interesse de agir processual (por ausência de adequação) para o manejo de ação
possessória voltada à referida finalidade.

5. A vedação à discussão do domínio da coisa, pelos mesmos sujeitos, em ação


reivindicatória durante a tramitação da ação possessória, ainda que em processo
distinto: o mesmo artigo 557 do Código de Processo Civil, em seu caput, estabelece a
vedação a que, durante a pendência da ação possessória, qualquer das partes proponha,
contra a outra (contra terceiros inexiste a vedação, por se tratar de relação material distinta),
ação autônoma de natureza reivindicatória, ou seja, em que se discuta a propriedade a
respeito da coisa cuja posse também é discutida. A tramitação da ação possessória, como se
observa, funciona como condição suspensiva do direito de ação para se debater
judicialmente, e entre as mesmas partes da ação possessória, o domínio sobre a coisa.
746
O objetivo dessa vedação é evitar que, proposta a ação reivindicatória durante o
transcurso da ação possessória, ocorra o fenômeno da conexão, resultando na reunião de
ambos os processos para decisão única pelo mesmo juízo, caso em que, por vias oblíquas,
conseguiria a parte deduzir, com efeitos diretos na demanda possessória, questão relativa ao
domínio.
A rígida disposição legal de vedação de coexistência dos juízos possessório e
reivindicatório foi, há muito, ratificada como constitucional pelo Supremo Tribunal Federal
(vide RE nº 87.344, Relator(a): Min. Moreira Alves, Tribunal Pleno, julgado em
14/09/1978, DJ 16-10-1978).
Por conseguinte, em não podendo ser proposta pelo réu, sequer autonomamente,
ação reivindicatória durante a pendência da demanda possessória, com ainda mais razão fica
o réu obstado de intentar ação reivindicatória no bojo do mesmo processo da demanda
possessória, em sede de reconvenção.

6. A vedação à discussão do domínio da coisa em ação reivindicatória é restrita


aos sujeitos da demanda possessória, não impedindo ações contra terceiros: por fim, é
imperioso destacar que o parágrafo único do artigo 557 do Código de Processo Civil de
2015 insere, quanto à vedação à discussão do domínio da coisa em ação reivindicatória, um
pressuposto subjetivo, qual seja, o de que a referida vedação limita-se aos conflitos
reivindicatórios cujos sujeitos sejam as mesmas partes da ação possessória.
Como se observa, a mencionada regra proibitória não se aplica a eventuais conflitos
de natureza dominial entre alguma das partes da ação possessória e um terceiro alheio a
essa, não obstando, destarte, que qualquer das partes da ação possessória proponha contra
terceiro ou por terceiro seja demandada ação reivindicatória contemporânea à ação
possessória.

Art. 558. Regem o procedimento de manutenção e de reintegração de posse as normas da


Seção II deste Capítulo quando a ação for proposta dentro de ano e dia da turbação ou do
esbulho afirmado na petição inicial.
Parágrafo único. Passado o prazo referido no caput, será comum o procedimento, não
perdendo, contudo, o caráter possessório.

1. Referência na legislação anterior: artigo 924 do Código de Processo Civil de


1973.
2. Amplitude do procedimento especial das ações possessórias: o rito especial
possessório previsto nos artigos 560 a 568 do Código de Processo Civil de 2015 se aplica,
747
integralmente, tão somente às ações possessórias de força nova, assim entendidas aquelas
aforadas dentro de ano e dia da violação à posse. Em se tratando de ação possessória de
força velha ou seja, intentada após o prazo de ano e dia da violação da posse , aplica-se
o rito comum, sem, contudo, perder-se a natureza possessória dessa ação, ou seja, sem que
fique privada das características próprias das ações possessórias, previstas nos artigos 554
a 559 do Código de Processo Civil de 2015, assim a fungibilidade, o caráter dúplice e a
imunidade a questões relativas ao domínio.

3. Força velha e força nova modo de contagem: como se depreende do disposto


no caput do artigo 558 do Código de Processo Civil de 2015, a contagem do prazo de ano e
dia que diferencia as ações de força velha das ações de força nova tem como termo inicial a
data em que ocorrido o esbulho ou em que iniciada a turbação da posse, sendo imperioso
ressaltar que esse prazo não tem natureza processual, mas, sim, material, razão por que sua
contagem se dá de modo corrido, não respeitando as regras processuais quanto à contagem
de prazos.
Detalhe importante a se observar é que, conforme preceitua o artigo 1.224 do Código
Civil, na hipótese de esbulho não presenciado pelo possuidor legítimo, a posse considera-se
perdida apenas quando o referido possuidor, tomando conhecimento do esbulho, mantém-
se inerte ou, tentando recuperá-la do esbulhador, é repelido com violência. Em tal situação,
a data do esbulho, para fins de contagem do prazo de ano e dia e, em consequência, para a
verificação do procedimento a ser respeitado para a ação possessória, é: (i) a data em que o
possuidor tomou conhecimento do esbulho, caso opte pela inércia; ou (ii) a data em que se
deu a tentativa frustrada de recuperação da coisa pelo possuidor esbulhado, em caso de
repelência violenta por parte do esbulhador.

4. O interdito proibitório é sempre ação de força nova: o artigo 558 do Código


de Processo Civil, ao tratar do cabimento do rito especial possessório às ações de força nova,
menciona apenas as ações de reintegração de posse e de manutenção de posse, não
abrangendo o interdito proibitório. A opção legislativa é bastante lógica.
Deveras, o termo inicial do prazo de ano e dia que caracteriza as ações possessórias
de força velha é o ato de violação da posse. Ora, na hipótese de interdito proibitório, por se
tratar de ação preventiva, não há ainda efetiva violação da posse, senão mera ameaça de
violação, não havendo, por isso, a contagem do prazo de ano e dia que caracteriza as ações
possessórias de força velha.
Conclui-se, assim, que o interdito proibitório é espécie de demanda possessória que
se apresenta invariavelmente como ação de força nova, devendo, pois, sempre ser
748
processado conforme o rito especial próprio das ações de força nova (artigos 560 a 566 do
Código de Processo Civil de 2015), como, a propósito, corretamente prescreve o artigo 568
do Código de Processo Civil de 2015.

5. Diferenças práticas entre o rito especial aplicável às ações de força nova e o


rito comum aplicável às ações de força velha: na prática, há apenas duas distinções
relevantes entre o rito especial possessório (destinado às ações possessórias de força nova)
e o rito comum (empregado para as ações possessórias de força velha), quais sejam: (i) a
tutela sumária própria do procedimento especial das ações possessórias (artigos 562 e 563
do Código de 2015), aplicável apenas às demandas possessórias de força nova; e (ii) a
audiência inicial obrigatória de mediação e conciliação (artigo 334 do Código de 2015),
aplicável no procedimento comum e, desse modo, apenas às ações possessórias de força
velha.

6. As tutelas sumárias nas ações possessórias de força velha: quanto às ações


possessórias de força velha, por aplicar-se inteiramente o procedimento comum, sem
incidência do procedimento especial, a parte autora, muito embora não mais tenha a
faculdade de pleitear a liminar possessória do artigo 562 do Código de Processo Civil de
2015, permanece, naturalmente, tendo a possibilidade de requerer as modalidades gerais de
tutela antecipatória de urgência ou de evidência, desde que preenchidos os respectivos
requisitos dos artigos 300 e 311 do mesmo Código Processual.
É o que já estabelecia o Enunciado nº 328 da III Jornada de Direito Civil do Conselho
da Justiça Federal, fazendo referência aos dispositivos legais do Código de Processo Civil
ainda que a
esbulho, e, em razão disso, tenha seu trâmite regido pelo procedimento ordinário (CPC,
art. 924), nada impede que o juiz conceda a tutela possessória liminarmente, mediante
antecipação de tutela, desde que presentes os requisitos autorizadores do art. 273, I ou II,
bem como aqueles previstos no art. 461-A e parágrafos, todos do Código de Processo
Civil
Assim também o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, vide, verbi gratia:
AgInt no REsp nº 1.752.612/CE, Rel. Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma,
julgado em 11/02/2019, DJe 13/02/2019; AgInt no AREsp nº 1.089.677/AM, Rel. Ministro
Lázaro Guimarães, Quarta Turma, julgado em 08/02/2018, DJe 16/02/2018; e AgRg no Ag
nº 1.232.023/PR, Rel. Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 27/11/2012, DJe
17/12/2012.
749
Art. 559. Se o réu provar, em qualquer tempo, que o autor provisoriamente mantido ou
reintegrado na posse carece de idoneidade financeira para, no caso de sucumbência,
responder por perdas e danos, o juiz designar-lhe-á o prazo de 5 (cinco) dias para requerer
caução, real ou fidejussória, sob pena de ser depositada a coisa litigiosa, ressalvada a
impossibilidade da parte economicamente hipossuficiente.

1. Referência na legislação anterior: artigo 925 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Prestação de caução: o artigo 559 do Código de Processo Civil de 2015


estabelece que, em havendo elemento de prova nos autos que demonstre que o litigante
favorecido pela liminar possessória não possui idoneidade financeira para responder pelas
perdas e danos eventualmente decorrentes da revogação dessa medida (seja na sentença,
seja, mesmo, no bojo de decisão interlocutória anterior à sentença), será oportunizado à
parte contrária o prazo de 05 (cinco) dias para requerer que aquele apresente caução real ou
fidejussória apta a garantir, minimamente, o pagamento de possível indenização por perdas
e danos, nos termos do previsto no artigo 302 do Código de Processo Civil de 2015.
Trata-se, aliás, de disposição legal que dialoga diretamente com a regra geral de
contracautela do § 1º do artigo 300 do Código de Processo Civil de 2015, especializando o
seu conteúdo ao procedimento das ações possessórias de força nova. Isso porque, como
verificado nos comentários ao artigo 562 infra, a liminar possessória é verdadeira
modalidade especial de tutela antecipada de evidência, ao lado das modalidades genéricas
previstas no artigo 311 do Código de 2015.

3. Interpretação extensiva da regra do artigo 559 do Código de Processo Civil


de 2015: vale notar que o texto do artigo 559 do Código de Processo Civil de 2015
menciona, literalmente, apenas a hipótese de o réu requerer a determinação judicial de
prestação de caução pelo autor, então beneficiado pela liminar possessória.
Todavia, é indubitável que o dispositivo disse menos do que queria, devendo ser
interpretado extensivamente, uma vez que, em vista do caráter dúplice das ações
possessórias (artigo 556 do Código de 2015), pode ocorrer de a tutela liminar possessória
ser deferida em favor do réu, caso em que é do autor o direito de requerer ao órgão
jurisdicional a determinação de prestação de caução pelo réu, caso comprovada a
inidoneidade financeira desse.

4. Ônus da parte e observância do contraditório: como se depreende do artigo


559 do Código de Processo Civil de 2015, é da parte contrária ao beneficiário da tutela
750
liminar o ônus subjetivo de provar que esse último possui inidoneidade financeira para arcar
com futura e eventual indenização por perdas e danos. Isso significa que a ausência de
juntada de tal prova pela parte contrária ao favorecido pela tutela liminar resulta, em tese,
na impossibilidade de formulação de requerimento voltado à determinação judicial de
prestação da caução.
Todavia, em vista dos princípios da aquisição processual e da comunhão das provas
segundo os quais as provas, uma vez constantes dos autos, deixam de pertencer aos
litigantes que as produziram e passam a pertencer ao processo, podendo, assim, beneficiar
qualquer das partes , nada impede que o órgão jurisdicional oportunize ao litigante
interessado o prazo para requerimento da prestação de caução pela parte contrária em
decorrência exclusiva de elemento de prova de inidoneidade financeira juntado aos autos
pela própria parte favorecida pela liminar possessória ou por terceiro interveniente,
independentemente, portanto, do cumprimento do ônus subjetivo a que se refere o artigo
599 do Código de 2015.
De todo modo, em respeito à ampla dimensão conferida ao princípio do contraditório
pelos artigos 7º, 9º e 10 do Código de Processo Civil de 2015, o órgão jurisdicional apenas
poderá decidir acerca do requerimento de prestação de caução formulado por uma das partes
após oportunizar o contraditório pela parte adversária, intimando-a a se manifestar sobre o
requerimento formulado, momento em que essa poderá argumentar e demonstrar não ser
cabível ou possível a prestação da caução requerida.

5. Garantia real ou fidejussória: o artigo 925 do Código de Processo Civil de 1973,


que anteriormente regulava a prestação de caução no procedimento especial possessório,
era omisso sobre a espécie de caução admissível. Muito embora essa omissão da legislação
anterior significasse já a abertura à apresentação tanto de garantia real como de garantia
fidejussória, o artigo 559 do Código de Processo Civil de 2015, buscando eliminar qualquer
dúvida sobre o assunto, prevê expressamente que a caução a ser oferecida pela parte pode,
a critério dessa, ser fidejussória ou real.
O Direito desta Terra de Santa Cruz admite, como modalidades de garantia
fidejussória, a fiança e o aval (vide artigos 818 a 839 e 897 a 900, todos do Código Civil),
ao passo que contempla, como espécies de garantia real, o penhor, a hipoteca e a anticrese
(vide artigos 1.225 e 1.419 a 1.510, todos do Código Civil), bem como a propriedade
fiduciária (vide artigos 1.361 a 1368-B do Código Civil, artigo 66-B da Lei nº 4.728/1965,
Decreto-Lei nº 911/1969 e disposições da Lei nº 9.514/1997).
751
6. Requerimento por simples petição: o requerimento de prestação de caução deve
ser formulado pela parte interessada por petição simples nos próprios autos da ação
possessória, autos esses em que também se oportunizará o contraditório à outra parte e onde,
igualmente, se decidirá a respeito desse requerimento. É, pois, desnecessária a instauração
de incidente processual para tanto.

7. O prazo de 05 (cinco) dias, a pertinência de sua fixação e a possibilidade de


sua dilação judicial: o artigo 559 do Código de Processo Civil de 2015 prevê que, diante
de prova da inidoneidade financeira do favorecido pela tutela possessória liminar, o órgão
jurisdicional deve conceder à parte contrária o prazo de 05 (cinco) dias para que essa
formule nos autos requerimento de apresentação de caução por aquele litigante
financeiramente idôneo.
Ora, é certo que essa concessão de 05 (cinco) dias de prazo apenas é pertinente na
hipótese em que, a despeito de constar dos autos a prova da falta de idoneidade financeira,
não tenha ainda a parte interessada veiculado o respectivo requerimento de prestação de
caução. Afinal, em já havendo sido apresentado, autonomamente pelo litigante interessado,
o requerimento de determinação de prestação de caução, caberá ao órgão jurisdicional tão
somente oportunizar à outra parte o contraditório e, enfim, decidir o requerimento.
De todo modo, o prazo de 05 (cinco) dias para o requerimento da caução prevista no
artigo 559 do Código de Processo Civil de 2015 não possui natureza de prazo preclusivo,
podendo, assim, em sendo cabível sua fixação, ser dilatado pelo órgão jurisdicional, desde
que essa dilação seja requerida pela parte interessada antes de seu termo final, nos termos
do disposto no artigo 139, inciso VI e parágrafo único, do Código de Processo Civil de 2015.

8. Caução e depósito judicial: o texto do artigo 559 do Código de Processo Civil


de 2015 estabelece que, em sendo exigida a caução no procedimento possessório, sua não
prestação resultará na obrigação de que a coisa litigiosa, objeto da liminar possessória, seja
depositada judicialmente.
Vale notar que, embora o texto legal nada mencione a esse respeito, a determinação
de depósito da coisa pode decorrer também da falta de substituição ou de complementação
de caução, caso qualquer delas se mostre necessária. Igualmente, nada impede que a própria
parte litigante que prestou a caução ou que a deve prestar requeira, sozinha ou em acordo
com a parte contrária, a substituição da caução pelo depósito judicial da coisa (nesse sentido,
o entendimento do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 475.156/SC, Rel. Ministro Ruy
Rosado de Aguiar, Quarta Turma, julgado em 19/12/2002, DJ 24/02/2003).
752
9. Liberação do hipossuficiente e paradoxo normativo: a parte final do artigo 559
do Código de Processo Civil de 2015, trazendo exceção então inexistente no anterior artigo
925 do Código de Processo Civil de 1973, estabelece a dispensa da prestação de caução pela
parte beneficiada pela liminar possessória na
-se de disposição que dialoga com a regra do artigo 300,
§ 1º, do mesmo Código de 2015, que também consagra essa possibilidade de dispensa de
prestação de caução.
Entretanto, é necessário pontuar que essa exceção final do artigo 559 do Código de
2015 cria um verdadeiro paradoxo normativo. Isso porque a falta de idoneidade financeira
da parte, que então justifica a exigência da caução, conforma-se, em termos práticos, à noção
de hipossuficiência econômica, que, por sua vez, enseja a dispensa da prestação da caução.
Desse modo, tanto a exigência de caução como a sua dispensa têm como pressuposto, na
prática, o mesmo fato.
Ademais, mostra-se despropositada a ressalva final do artigo 559 do Código de 2015
quanto à dispensa de caução em sendo a parte economicamente hipossuficiente, uma vez
que a caução a ser prestada pode ser fidejussória e, assim, envolver exclusivamente o
patrimônio de terceiro dotado de idoneidade financeira.

Seção II - Da Manutenção e da Reintegração de Posse

Augusto Jorge Cury

Art. 560. O possuidor tem direito a ser mantido na posse em caso de turbação e reintegrado
em caso de esbulho.

1. Referência na legislação anterior: artigo 926 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Relação entre os graus de ofensa possessória e as respectivas demandas:


consoante o que dispõem os artigos 560 do Código de Processo Civil de 2015 e 1.210, caput,
do Código Civil, (i) a ação de reintegração de posse tem como finalidade tutelar a posse
contra o esbulho, que consiste na violação total da posse, causando, ao possuidor legítimo,
a perda do poder fático da coisa possuída. O objetivo da ação de reintegração de posse é
restituir ao possuidor legítimo a posse da coisa esbulhada; de outro lado, (ii) a ação de
753
manutenção de posse visa tutelar a posse contra a turbação, essa entendida como a violação
parcial do direito de posse, caracterizada pela perturbação no exercício da posse do
possuidor legítimo. A ação de manutenção da posse, portanto, tem por fim fazer com que
cessem os atos de perturbação do pleno exercício de posse do possuidor legítimo.

Art. 561. Incumbe ao autor provar:


I - a sua posse;
II - a turbação ou o esbulho praticado pelo réu;
III - a data da turbação ou do esbulho;
IV - a continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse,
na ação de reintegração.

1. Referência na legislação anterior: artigo 927 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Ônus da alegação e ônus da prova: o artigo 561 do Código de Processo Civil de


2015 tem por claro objetivo regulamentar o ônus da alegação e o ônus da prova do autor da
ação possessória e, em vista do caráter dúplice das demandas possessórias típicas, também
do réu, quando esse arguir ser o possuidor legítimo, então alegadamente ameaçado ou
violado em sua posse pelo autor.
Pois bem: o dispositivo em comento, observado esse escopo, estabelece que o autor
e, a depender do caso, também o réu, em vista de a demanda possessória ser actio duplex
em relação à pretensão possessória tem o ônus de alegar e de provar: (i) a sua posse; (ii) a
turbação ou o esbulho praticado pelo réu; (iii) a data da turbação ou do esbulho; e (iv) a
continuação da posse, embora turbada, na ação de manutenção, ou a perda da posse, na ação
de reintegração.

3. A alegação e a prova da posse e de sua violação: de início, é imprescindível a


alegação e a prova da própria situação fática de posse ou seja, do exercício fático, total ou
parcial, de algum dos poderes inerentes à propriedade, nos termos dos artigos 1.196 e 1.228,
caput, do Código Civil , assim como a alegação e a comprovação da violação (esbulho ou
turbação) ou ameaça possessória causada pela parte contrária, visto que são justamente esses
os fatos constitutivos do direito à proteção possessória, como se depreende do artigo 1.210,
caput, do Código Civil e dos artigos 560 e 567 do Código de Processo Civil de 2015. Os
ônus de alegação e de prova da posse envolvem, por lógico, também a adequada
individuação da coisa móvel ou imóvel cuja posse é objeto do litígio.
754
4. Indicação e demonstração da data da violação possessória: a seu turno, a
indicação e a comprovação da data em que ocorreu ou em que se iniciou a turbação ou o
esbulho não se relaciona com o mérito da demanda possessória, mas revela-se importante
para a determinação do rito processual a ser seguido. Deveras, a indicação e a prova da data
da violação da posse têm por objetivo permitir ao órgão jurisdicional verificar se a violação
possessória ocorreu a mais de ano e dia e, nessa medida, se a ação possessória é de força
velha ou de força nova.
Note-se, nesse ponto, que os ônus da alegação e da prova a respeito da data em que
ocorreu a violação possessória não se aplicam no âmbito do interdito proibitório, visto que,
por ser essa uma ação de natureza preventiva, que tem vez enquanto não há ainda efetiva
violação da posse, mas mera ameaça, não há, igualmente, a contagem do prazo de ano e dia
que caracteriza as ações possessórias de força velha, sendo o interdito proibitório, portanto,
sempre ação possessória de força nova.
Em eventualmente sendo aforado interdito proibitório e sobrevindo, no curso da
demanda, o agravamento da situação fática, com a efetiva ocorrência de turbação ou de
esbulho possessório, na própria informação juntada aos autos a respeito da concretização da
violação à posse estará a parte interessada onerada a indicar a data da ocorrência do esbulho
ou da turbação, podendo comprová-la, se viável, já no mesmo ato ou, caso necessite de
maior dilação probatória, em momento posterior.

5. Alegação e demonstração da continuação da posse, embora turbada, na ação


de manutenção, ou da perda da posse, na ação de reintegração: o inciso IV do artigo
561 que repete o equívoco redacional do artigo 927, IV, do Código de Processo Civil de
1973 é absolutamente irrelevante e desnecessário, visto que nada diz de novo em relação
aos anteriores incisos I e II do mesmo dispositivo legal. Ora, a turbação, sendo violação
parcial da posse, pressupõe sempre a continuidade da posse pelo possuidor legítimo, razão
por que esse busca ser mantido na posse. A seu turno, o esbulho, por ser a ofensa possessória
máxima, resulta sempre, em relação ao possuidor legítimo, na perda do poder fático sobre a
coisa, motivo por que esse busca, pela ação possessória, a reintegração na posse perdida.
Desse modo, apresenta-se lógico que a alegação e a prova da posse e da respectiva
ameaça, turbação ou esbulho, nos termos dos ônus previstos nos incisos I e II do artigo 561
do Código de Processo Civil de 2015, já abrangem, em si, a enunciação e a comprovação
da continuação da posse turbada e da perda da posse esbulhada. Infelizmente, o legislador,
que deveria ter extirpado do Código atual a disposição estéril ora constante do inciso IV do
artigo 561, não o fez.
755
6. Desnecessidade de comprovação de prévia notificação do réu: como se denota
da redação do artigo 561 do Código de Processo Civil de 2015, a parte autora da ação
possessória não tem qualquer ônus de alegar ou de comprovar prévia notificação
extrajudicial ou judicial da pessoa que compõe (ou das pessoas que compõem) o polo
passivo da demanda. Isso porque a existência e, assim, a alegação e a comprovação de
notificação prévia não tem, em si própria, qualquer relevância para a ação possessória,
podendo, quando muito, ser útil como elemento de prova da data do esbulho ou da turbação.
Nesse sentido, precedente do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 1.263.164/DF, Rel.
Ministro Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 22/11/2016, DJe 29/11/2016.

7. O ônus da alegação e o ônus da prova quanto a eventual pretensão


indenizatória: o artigo 561 do Código de Processo Civil de 2015, ao regulamentar os ônus
da alegação e da prova nas ações possessórias, limita-se a tratar do tema em relação à
pretensão possessória (inibitória ou de remoção do ilícito). Entretanto, embora o dispositivo
legal não especifique, em tendo a parte litigante da ação possessória formulado pedido
ressarcitório (nos termos dos artigos 555 e 556 do Código de 2015), deverá cumprir os ônus
de alegação e de prova relativos aos fatos constitutivos de sua pretensão indenizatória,
notadamente: (i) o ato ilícito; (ii) o dano; (iii) o nexo de causalidade entre o ato ilícito e o
dano; e, caso se trate de responsabilidade civil subjetiva, também (iv) a culpa lato sensu do
causador do dano.

Art. 562. Estando a petição inicial devidamente instruída, o juiz deferirá, sem ouvir o réu,
a expedição do mandado liminar de manutenção ou de reintegração, caso contrário,
determinará que o autor justifique previamente o alegado, citando-se o réu para comparecer
à audiência que for designada.
Parágrafo único. Contra as pessoas jurídicas de direito público não será deferida a
manutenção ou a reintegração liminar sem prévia audiência dos respectivos representantes
judiciais.

1. Referência na legislação anterior: artigo 928 do Código de Processo Civil de


1973.

2. A liminar possessória inaudita altera parte e seus requisitos: o artigo 562 do


Código de Processo Civil de 2015 estabelece, para o rito especial possessório relativo às
ações possessórias de força nova (e para as ações possessórias coletivas de força velha,
como indica o artigo 565 do mesmo Código), a possibilidade de concessão de tutela liminar,
756
prevendo único requisito para tanto: a juntada, pelo autor, já na petição inicial, de elementos
que evidenciem os fatos constitutivos de seu direito (conforme elenco constante do artigo
561 do Código Processual, complementado pela disposição do artigo 567 do mesmo
Código, quando em relação ao interdito proibitório).
Em outros termos, para o deferimento da liminar possessória, basta que o autor tenha
instruído a exordial com documentos que indiquem (i) a sua posse; (ii) o esbulho, a turbação
ou a ameaça iminente de violação possessória, de autoria do réu; e, nos casos específicos de
ação de reintegração ou de manutenção de posse, (iii) a data do esbulho ou do início da
turbação.
Vale notar que essa liminar possessória constitui-se em tutela judicial que decorre
do exercício de mera cognição judicial sumária, fruto de uma análise superficial da lide e,
nessa medida, baseada na verificação da probabilidade (verossimilhança) das alegações
veiculadas pelo autor. Por essa razão, para a concessão da tutela liminar possessória, não se
exige do autor a comprovação cabal dos fatos constitutivos de seu direito, senão a mera
instrução de sua petição inicial com elementos de prova documental (ou de prova
documentada, a exemplo de depoimentos das partes ou de testemunhas reduzidos a termo)
que convençam o órgão jurisdicional a respeito da verossimilhança de suas alegações acerca
daqueles fatos.
Por fim, é mister consignar que, via de regra, a tutela liminar possessória prevista no
artigo 562 do Código de Processo Civil de 2015 será concedida sem a prévia oitiva do réu
(inaudita altera parte), o que indica que o referido dispositivo legal contempla mais uma
hipótese de contraditório diferido, em complemento àquelas já elencadas no artigo 9º do
mesmo Código de 2015.

3. Modalidade especial de tutela sumária antecipatória de evidência: a tutela


possessória liminar prevista no artigo 562 do Código de Processo Civil de 2015 é, sem
sombra de dúvidas, espécie de tutela provisória, sumária, de natureza antecipatória, já que
visa adiantar, em favor da parte autora, efeitos de uma futura e eventual decisão final de
procedência de seu pedido (ou seja, a reintegração na posse, manutenção na posse ou
emissão de mandato proibitório de esbulho ou de turbação).
E mais: em vista dos requisitos exigidos para sua concessão, requisitos esses que
dispensam o risco de dano grave ou de difícil reparação (periculum in mora), exigindo tão
somente a demonstração de verossimilhança do alegado (fumus boni iuris, consistente, em
resumo, na demonstração sumária da posse, de sua violação ou iminente ameaça e da força
757
nova da ação possessória), conclui-se tratar-se a medida em questão de modalidade especial
de tutela de evidência, a par das já consagradas pelo artigo 311 do Código de Processo Civil
de 2015.

4. A liminar possessória mediante justificação em audiência, a finalidade da


audiência de justificação e da cientificação do réu para dela participar: em sendo
insuficientes os elementos probatórios juntados pelo autor à petição inicial, não pode o juiz
indeferir, de plano, a tutela liminar, devendo, pois, designar audiência de justificação prévia,
destinada à produção, pela parte autora, de prova oral, notadamente a testemunhal, que, se
convincente ao juiz no sentido da probabilidade do direito do autor, dará azo ao deferimento
da tutela sumária de evidência.
A propósito, a realização de audiência de justificação no rito possessório independe
de requerimento expresso da parte autora, devendo o órgão jurisdicional designá-la ex
officio caso entenda ser o material probatório acostado à inicial insuficiente à concessão da
liminar possessória (vide entendimento do Superior Tribunal de Justiça: AgInt no AREsp
nº 986.891/SC, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 28/03/2017, DJe
31/03/2017; AgRg no AREsp nº 785.261/MT, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze,
Terceira Turma, julgado em 24/11/2015, DJe 09/12/2015; REsp nº 900.534/RS, Rel.
Ministro João Otávio De Noronha, Quarta Turma, julgado em 01/12/2009, DJe 14/12/2009).
A audiência de justificação é um ato processual voltado precipuamente a beneficiar
o autor da demanda, tendo por exclusiva finalidade que esse possa produzir prova
testemunhal apta a formar o convencimento judicial acerca da presença dos requisitos para
o deferimento da tutela liminar possessória. Por essa razão, não pode o réu, na audiência de
justificação, discutir o mérito da ação possessória, apresentar defesa à petição inicial ou
produzir provas próprias, senão somente inquirir as testemunhas levadas a depor pelo autor
(vide, verbi gratia, o decidido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp nº 890.598/RJ,
Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 23/11/2010, DJe
26/11/2010).
Tanto é assim que, nos termos do que dispõe o artigo 564 do Código de Processo
Civil de 2015, a citação do réu para apresentação de defesa na demanda possessória ocorrerá
apenas após a prolação da decisão que deferir ou indeferir a tutela liminar possessória, tendo
o réu, então, o prazo de 15 (quinze) dias para apresentar sua contestação à petição inicial do
autor.
758
5. A facultatividade da participação do réu na audiência de justificação e a
inexistência de nulidade processual na hipótese de sua ausência: visto que a audiência
de justificação não se presta ao exercício do direito de defesa, é meramente facultativa a
participação do réu em tal audiência, razão por que sua ausência, ainda que por falta de
intimação, não gera qualquer nulidade processual. Nesse sentido, vale constar, já decidiu o
Superior Tribunal de Justiça (REsp nº 1.232.904/SP, Rel. Ministra Nancy Andrighi, Terceira
Turma, julgado em 14/05/2013, DJe 23/05/2013).

6. A liminar possessória contra as pessoas jurídicas de direito público a


exceção abstrata ao contraditório diferido e a inconstitucionalidade do parágrafo
único do artigo 562: o artigo 562 do Código de Processo Civil de 2015, em seu parágrafo
único, estabelece que, nas ações possessórias movida contra pessoa jurídica de direito
público, o deferimento judicial da tutela de evidência possessória, com a expedição de
mandado liminar de manutenção ou de reintegração da posse ou, ainda, de proibição de
turbação ou esbulho, depende de prévia manifestação do representante judicial do ente
público réu.
A manifestação prévia do representante judicial da pessoa jurídica de direito público
exigida pelo dispositivo legal não se trata de contestação visto que a oportunização de
apresentação de resposta à pretensão inicial ocorrerá apenas após a decisão acerca da liminar
possessória , mas de mera defesa prévia da entidade pública especificamente a respeito do
possível direito do autor à tutela antecipatória de evidência possessória, não podendo o
representante judicial da entidade pública ré, portanto, extrapolar o referido limite.
Como se observa, a mencionada disposição legal cria, em benefício das pessoas
jurídicas de direito público, especial exceção à regra de contraditório diferido a que se
submetem os réus possessórios em geral, impedindo que, contra as entidades públicas, a
tutela de evidência possessória seja concedida inaudita altera parte pelo órgão jurisdicional.
Todavia, é mister explicitar que a regra do parágrafo único do artigo 562 do Código
de Processo Civil de 2015 é eivada de inconstitucionalidade, visto que proporciona aos entes
públicos tratamento diferenciado que não se justifica diante de qualquer peculiaridade do
direito material.
Aliás, o próprio ordenamento jurídico desta Terra de Santa Cruz, partindo já do
artigo 37, caput, da Constituição Federal de 1988, exige do Poder Público deveres de
legalidade e de moralidade bastante mais rígidos que os exigidos dos particulares, o que
significa que eventual violação possessória levada a efeito por uma pessoa jurídica de direito
público apresenta maior gravidade que uma violação de mesma natureza praticada por um
759
particular, razão porque, no âmbito das ações possessórias, o tratamento direcionado a um
réu estatal deveria ser mais rígido que o tratamento conferido ao réu particular.
Portanto, o tratamento mais brando previsto no parágrafo único do artigo 562 do
Código de Processo Civil de 2015 torna inconstitucional o referido dispositivo, por violação,
ao mesmo tempo, do princípio da igualdade encampado pelo artigo 5º, caput, da
Constituição Federal de 1988 e dos princípios da legalidade estrita e da moralidade previstos
no artigo 37, caput, da mesma Constituição.

7. Aplicam-se ao procedimento possessório também as demais espécies de


tutelas sumárias: a liminar possessória prevista no procedimento das demandas de posse,
como visto, é modalidade especial de tutela antecipatória de evidência, colocando-se ao lado
das modalidades de tutela antecipatória de urgência e de evidência já existentes na parte
geral do Código de 2015.
Ora, há diferença entre os próprios requisitos dessas tutelas, de modo que, embora
não preenchidos os requisitos para a concessão da liminar possessória com base na
evidência, nada impede que a parte pleiteie a antecipação dos efeitos da tutela a título de
urgência, com demonstração do periculum in mora e do fumus boni juris, este demonstrável
de modo menos elaborado que a prévia comprovação efetiva da posse e de sua violação.
Ademais, a liminar possessória, como concebida pelo Código de Processo Civil, tem
vez apenas anteriormente à apresentação de contestação pelo réu, não sendo possível após
tal momento. Entretanto, pode ocorrer de, após a contestação, surgirem elementos para a
concessão de tutela antecipatória de urgência ou de evidência, caso em que, sob pena de
injusto dano processual, não se pode proibir a parte autora de pleitear a tutela antecipatória
com base no regramento geral dos artigos 294 a 311 do Código de 2015.
Por fim, é de se perceber que a tutela liminar de evidência prevista para o
procedimento possessório tem como objeto tão somente o adiantamento dos efeitos de uma
tutela possessória favorável, não abrangendo a antecipação de outras medidas não
possessórias buscadas pelo autor na ação, hipótese em que se deve possibilitar a utilização
das tutelas antecipatórias genéricas, nos termos da Parte Geral do Código de Processo Civil
de 2015.
Assim, pode-se concluir que nas ações possessórias de força nova ou seja, naquelas
demandas de reintegração de posse e de manutenção de posse propostas dentro do prazo de
ano e dia da violação possessória, bem como em qualquer interdito proibitório , além da
liminar possessória são cabíveis outros pedidos de natureza provisória, de urgência ou de
evidência, desde que respeitados os requisitos dos artigos 300 e 311 do Código de Processo
Civil.
760
Art. 563. Considerada suficiente a justificação, o juiz fará logo expedir mandado de
manutenção ou de reintegração.

1. Referência na legislação anterior: artigo 929 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Concessão da liminar possessória após audiência de justificação: uma vez


realizada a audiência de justificação, quando esta se fizer necessária, o órgão jurisdicional
deverá decidir, com base no material probatório então complementado, a respeito da
existência ou não do direito à concessão, ao autor, da tutela liminar possessória de evidência.
É desejável que tal decisão seja proferida já na própria audiência de justificação,
como forma de efetivação do princípio da celeridade processual, notadamente para que não
se retarde a concessão da tutela liminar, em estando presentes os pressupostos para o seu
deferimento, invertendo-se logo, então, o ônus da demora do processo.
Todavia, o texto do artigo 563 do Código de Processo Civil de 2015, embora
exigindo do órgão jurisdicional a observância de uma mínima celeridade determinando
, não
contém determinação inflexível de que a decisão sobre o deferimento ou indeferimento da
tutela liminar possessória de evidência deva ser proferida já na própria audiência de
justificação, abrindo, assim, espaço para que o juiz, em necessitando analisar com maior
cautela o material probatório, chame os autos à conclusão para proferir em cartório a decisão
sobre a tutela liminar.

3. A expedição do mandado de reintegração, de manutenção ou de proibição e


a determinação de medidas de apoio: dispõe o artigo 563 do Código de Processo Civil de
2015 que, uma vez convencido o juízo acerca do preenchimento dos requisitos para a
concessão da tutela liminar possessória de evidência, deverá, ao deferir a tutela, determinar
a expedição do pertinente mandado de reintegração de posse, no caso de esbulho, ou de
manutenção de posse, no caso de turbação, ou, ainda, mandato proibitório, em se tratando
de ameaça de violação à posse.
No referido mandado liminar, aliás, o juiz poderá (rectius, deverá) incluir a
determinação das medidas de apoio relevantes a se fazer cumprir satisfatoriamente o
mandado e a se restituir o status quo ante, sejam elas as medidas típicas elencadas nos
761
artigos 536 a 538 do Código de Processo Civil de 2015, sejam medidas atípicas, segundo a
liberdade que é conferida pelo artigo 139, IV, desse Código de 2015. Apreciam-se aqui,
portanto, e também sumariamente, os requerimentos eventualmente formulados pelo autor
da ação possessória nos termos do artigo 555, parágrafo único, do mesmo Código de 2015.

Art. 564. Concedido ou não o mandado liminar de manutenção ou de reintegração, o autor


promoverá, nos 5 (cinco) dias subsequentes, a citação do réu para, querendo, contestar a
ação no prazo de 15 (quinze) dias.
Parágrafo único. Quando for ordenada a justificação prévia, o prazo para contestar será
contado da intimação da decisão que deferir ou não a medida liminar.

1. Referência na legislação anterior: artigo 930 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Apresentação de respostas pelo réu: o artigo 564 do Código de Processo Civil


de 2015 preceitua que o réu será citado para, no prazo de 15 (quinze) dias, contestar a ação
possessória. O dispositivo, como se percebe, ao invés de corrigir a equivocada fórmula
anteriormente empregada no artigo 930 do Código de Processo Civil de 1973, apenas a
repete, dizendo, pois, menos do que deveria dizer.
Isso porque o procedimento cognitivo possessório admite, para além da contestação,
outras respostas do réu, que igualmente poderão ser apresentadas no mencionado prazo de
15 (quinze) dias. São elas: a exceção de impedimento ou de suspeição (artigo 146 do Código
de 2015), o reconhecimento jurídico do pedido (artigo 487, III, do Código de 2015) e a
reconvenção (artigo 343 do Código de 2015) sendo admissível essa última apenas quando
versar sobre pedidos diversos daqueles já incluídos na duplicidade das ações possessórias e
na viabilidade de pedido contraposto, ou seja, quando a pretensão do réu não for possessória
ou indenizatória (conforme indicado supra, nos comentários ao artigo 556 do Código de
Processo Civil de 2015).

3. Prazo para resposta do réu e modo de contagem: no rito possessório, o prazo


para que o réu apresente sua resposta é de 15 (quinze) dias, tal como ocorre no procedimento
comum, observando-se as regras sobre contagem de prazos processuais previstas na Parte
Geral do Código de Processo Civil de 2015. O prazo para resposta deve, portanto, ser
contado em dias úteis, excluindo-se o dia do início e incluindo-se o dia do término do prazo,
respeitadas as hipóteses de suspensão de prazos a exemplo da suspensão que se estende
do dia 20 (vinte) de dezembro ao dia 20 (vinte) de janeiro.
762
Sobre o termo inicial do prazo para resposta do réu nos procedimentos possessórios,
o artigo 564 do Código de Processo Civil de 2015 estabelece duas regras diversas: (i) em
sendo deferida a tutela de evidência possessória liminar sem a necessidade de audiência de
justificação, o réu deverá ser citado no prazo de 05 (cinco) dias contados da intimação da
parte autora acerca do deferimento da liminar, caso em que a definição do dies a quo do
prazo para a apresentação de sua resposta seguirá o regramento do artigo 231 do Código de
2015 e, assim, dependerá da modalidade citatória empregada; todavia, (ii) em sendo deferida
ou indeferida a tutela de evidência possessória liminar por meio de decisão proferida em
sede de audiência de justificação, o prazo de 15 (quinze) dias para que o réu apresente
resposta será contado a partir de sua intimação a respeito da referida decisão judicial de
cognição sumária.
Quando há audiência de justificação, pode ocorrer, eventualmente, de o juiz não
decidir imediatamente na própria audiência a respeito do deferimento ou indeferimento
da tutela possessória liminar de evidência, chamando conclusos os autos e proferindo sua
decisão liminar em momento posterior à referida audiência. Sendo essa a hipótese, uma vez
proferida a decisão, o réu deverá dela ser intimado, iniciando-se seu prazo de 15 (quinze)
dias para resposta a partir da juntada aos autos do mandado cumprido ou, em já tendo o réu
constituído advogado nos autos, o prazo para contestar fluirá a partir da intimação do
advogado. É como entende o Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 890.598/RJ, Rel.
Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 23/11/2010, DJe 26/11/2010;
AgRg no Ag nº 826.509/MT, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, julgado em
26/08/2008, DJe 11/09/2008).

4. Exceção à regra de citação do réu para comparecimento em audiência de


mediação ou conciliação e o descabimento da designação obrigatória de audiência de
mediação ou conciliação no rito possessório: o artigo 334 do Código de Processo Civil de
2015 dispõe que, uma vez superado positivamente o juízo de admissibilidade da petição
inicial, o réu deve ser citado para comparecer em audiência inicial de conciliação ou de
mediação, que se faz obrigatória no procedimento comum e nos ritos especiais em que
compatível, inclusive com previsão legal de multa em virtude do não comparecimento
injustificado de qualquer das partes.
Entretanto, essa obrigatoriedade da audiência inicial de mediação e conciliação,
prevista no artigo 334 do Código de Processo Civil de 2015, não incide quanto às ações
possessórias de força nova, uma vez que o próprio rito possessório estabelece a audiência
de justificação como única audiência eventualmente necessária anteriormente à
apresentação contestação.
763
Deveras, após a propositura da ação possessória pelo respectivo autor, o órgão
judicial poderá, desde logo e contanto que presentes os requisitos, deferir a tutela
possessória liminar de evidência ou, caso o material probatório acostado à inicial seja ainda
insuficiente à concessão da liminar possessória, deverá designar audiência de justificação
para fins de produção de prova oral e de nova verificação acerca da presença dos requisitos
para o deferimento da liminar possessória, oportunidade em que decidirá sobre se o autor
faz jus à concessão da referida tutela liminar.
E, conforme bem explicita o artigo 564 do Código de Processo Civil de 2015, uma
vez sendo deferida ou indeferida a tutela antecipatória de evidência possessória, o réu da
demanda possessória deve ser citado não para o comparecimento em audiência de mediação
ou conciliação (como ocorre no procedimento comum), mas, desde logo, para a
apresentação de resposta.

5. A possibilidade de designação de audiência de mediação ou conciliação


mediante requerimento pelas partes: a não obrigatoriedade da audiência de mediação ou
conciliação no rito das ações possessórias de força nova não significa que as partes autor,
réu ou ambos não possam requerer ao órgão jurisdicional, a qualquer momento antes da
prolação da sentença, a designação de tal audiência, em entendendo possível a obtenção de
uma solução consensual para o litígio possessório judicializado, caso em que a audiência
deverá ser designada pelo órgão jurisdicional, em atenção ao dever de incentivo à solução
consensual dos conflitos, então previsto nos artigos 3º, §§ 2º e 3º, e 139, V, do Código de
Processo Civil de 2015.

Art. 565. No litígio coletivo pela posse de imóvel, quando o esbulho ou a turbação afirmado
na petição inicial houver ocorrido há mais de ano e dia, o juiz, antes de apreciar o pedido de
concessão da medida liminar, deverá designar audiência de mediação, a realizar-se em até
30 (trinta) dias, que observará o disposto nos §§ 2º e 4º.
§ 1º Concedida a liminar, se essa não for executada no prazo de 1 (um) ano, a contar da data
de distribuição, caberá ao juiz designar audiência de mediação, nos termos dos §§ 2º a 4º
deste artigo.
§ 2º O Ministério Público será intimado para comparecer à audiência, e a Defensoria Pública
será intimada sempre que houver parte beneficiária de gratuidade da justiça.
§ 3º O juiz poderá comparecer à área objeto do litígio quando sua presença se fizer
necessária à efetivação da tutela jurisdicional.
§ 4º Os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União, de Estado
ou do Distrito Federal e de Município onde se situe a área objeto do litígio poderão ser
intimados para a audiência, a fim de se manifestarem sobre seu interesse no processo e sobre
a existência de possibilidade de solução para o conflito possessório.
§ 5º Aplica-se o disposto neste artigo ao litígio sobre propriedade de imóvel.
764
1. Referência na legislação anterior: não há similar no Código de Processo Civil
de 1973.

2. Ação possessória coletiva de força velha: o artigo 565 do Código de Processo


Civil de 2015, que dialoga com os parágrafos do artigo 554 do mesmo Código, trata também
das ações possessórias coletivas, ou seja, daquelas que têm, em seu polo passivo, conjunto
de pessoas unidas por interesse individual homogêneo. Entretanto, diferentemente das
regras dos parágrafos do artigo 554 (que se aplicam a todas as modalidades de ações
possessórias coletivas), as disposições do artigo 565 são específicas às ações possessórias
coletivas de força velha.
O § 1º do artigo 565 do Código de 2015 indica, ainda, que as regras do mesmo artigo
aplicam-se também quando não houver a execução da liminar possessória no prazo de 01
(um) ano da distribuição da demanda, disposição essa que transmite a impressão de
relacionar-se à hipótese de ação possessória coletiva de força nova.
Todavia, o texto legal não pode ser assim interpretado, sob pena de a parte garantida
pela tutela liminar restar sujeita a injusto prejuízo.
Isso porque, por ser automática a expedição de mandado liminar de reintegração ou
de manutenção de posse caso deferida a liminar possessória, a execução dessa não depende
de requerimento da parte interessada, mas tão somente da atividade do Poder Executivo, o
que significa que a parte favorecida pela tutela liminar, que diligenciou para propor a ação
possessória dentro do prazo de ano e dia da violação, não tem qualquer culpa pela eventual
demora na execução da liminar, razão por que não é justo que, por essa demora, seja o rito
possessório especial convertido no rito comum.
Ademais, não se pode desconsiderar a hipótese de a autoridade do Poder Executivo,
responsável pela execução da medida liminar possessória, postergar voluntária e
maliciosamente, por razões meramente políticas, o cumprimento de liminar concedida em
ação possessória coletiva de força nova, a fim de alterar o procedimento dessa ação para o
rito comum, retirando a efetividade da tutela judicial provisória e retardando o trâmite da
ação possessória, em claro prejuízo tanto ao interesse público que norteia o processo, como
à parte litigante cujo direito à tutela liminar foi reconhecido.
Desse modo, a disposição do § 1º do artigo 565 do Código de Processo Civil de 2015
deve ser compreendida à luz do caput do mesmo artigo, referindo-se, portanto, também à
ação possessória coletiva de força velha, quando a liminar possessória conferida em seu
bojo não for executada no prazo de um ano da distribuição da ação.
765
3. Termo inicial do prazo de um ano do § 1º do artigo 565: o artigo 565, § 1º, do
Código de Processo Civil de 2015, ao dispor sobre a segunda hipótese de realização de
audiência de mediação e conciliação no âmbito das ações possessórias coletivas de força
velha, especifica o cabimento da referida audiência para o caso de a liminar possessória
concedida nessa ação não ser executada no prazo de um ano contado da distribuição da ação
coletiva. O termo inicial desse prazo ânuo, portanto, não é a data da expedição do mandado
liminar como, a propósito, seria mais adequado , mas a data de distribuição da ação
possessória coletiva.

4. Regramento adaptado da liminar possessória nas ações possessórias coletivas


de força velha: como verificado nos comentários ao artigo 558 supra, a tutela sumária
própria do procedimento especial das ações possessórias, prevista nos artigos 562 e 563 do
Código de Processo Civil de 2015 é, via de regra, aplicável apenas às demandas possessórias
de força nova, de modo que, nas ações possessórias de força velha não se afigura, como
regra, possível a concessão da tutela liminar possessória de evidência, embora seja possível,
nessas ações de força velha, o requerimento e o deferimento de qualquer das modalidades
gerais de tutela antecipatória de urgência ou de evidência, desde que preenchidos os
respectivos requisitos dos artigos 300 e 311 do mesmo Código Processual.
Entretanto, essa regra não se aplica quando a ação possessória de força velha é de
natureza coletiva. Isso porque o Código de Processo Civil de 2015, por regramento
específico constante de seu artigo 565, mantém, para as demandas possessórias de força
velha, a aplicabilidade da tutela de evidência liminar própria das possessórias de força nova,
apenas exigindo que, previamente à análise do pedido de tutela liminar, seja realizada
audiência de mediação.
Trata-se de adaptação que busca compatibilizar a possibilidade de concessão da
medida liminar especial ao iter do procedimento comum ao qual se prevê genericamente
a referida audiência de mediação ou conciliação, conforme artigo 334 do Código de
Processo Civil de 2015 , visto que esse é o procedimento a ser seguido pelas ações
possessórias de força velha, inclusive as coletivas.

5. Intimação do Ministério Público e da Defensoria Pública: o § 2º do artigo 565


do Código de Processo Civil de 2015 estabelece que o Ministério Público e a Defensoria
Pública essa última apenas em havendo no processo sujeitos economicamente
hipossuficientes também serão intimados a participar da audiência de mediação das ações
possessórias coletivas de força velha. Trata-se de disposição legal inócua, uma vez que há
766
já, no artigo 554 do Código de Processo Civil de 2015, regra de intimação obrigatória
desses entes para participação nas ações possessórias coletivas, sejam elas de força nova ou
de força velha, regra essa que, por ser geral e ampla, já engloba a hipótese de audiência de
mediação do artigo 565 do mesmo Código.

6. Intimação de órgãos responsáveis pelas políticas públicas agrárias e urbanas:


segundo o § 4º do artigo 565 do Código de Processo Civil e 2015, podem também, a critério
do órgão jurisdicional, ser intimados para a audiência de mediação nas ações possessórias
de força velha os órgãos responsáveis pela política agrária e pela política urbana da União,
do Estado ou do Distrito Federal e do Município onde se situe a área objeto do litígio. Como
se nota, diferentemente do que ocorre em relação ao Ministério Público e à Defensoria
Pública, a intimação desses órgãos é meramente facultativa, dependendo de análise judicial
acerca de sua conveniência.
Note-se, nesse ponto, que a intervenção dos órgãos públicos responsáveis pela
política agrária e pela política urbana, nos termos do que permite o artigo 565, § 4º, do
Código de Processo Civil de 2015, uma vez que precipuamente destinada a fornecer
informações acerca de uma possível solução do conflito possessório, pode assumir a forma
de: (i) intervenção de amicus curiae, nos termos da ampla permissão do artigo 138 do
Código de Processo Civil de 2015, sempre que demonstrado seu interesse institucional
que é jurídico na demanda; ou (ii) intervenção anódina, nos moldes da estabelecida no
artigo 5º, parágrafo único, da Lei nº 9.469/1997, quando não demonstrado, para a sua
atuação, qualquer interesse jurídico.
Nada impede, porém, que a Fazenda Pública intervenha no processo a fim de
defender efetivo interesse jurídico próprio, por ser atingida seu âmbito fático ou em sua
esfera jurídica, casos em que intervirá, respectivamente, como assistente simples ou como
assistente litisconsorcial, ocorrendo, se o caso, deslocamento de competência, em
conformidade com o artigo 109, I, da Constituição Federal de 1988, bem como nos termos
do Enunciado de Súmula nº 150 do Superior Tribunal de Justiça.

7. Inspeção judicial: o § 3º do artigo 565 do Código de Processo Civil de 2015


autoriza ao juiz, nas ações possessórias coletivas de força velha, o seu comparecimento ao
local em que situado o bem imóvel objeto do litígio. Trata-se de mais uma regra despicienda
deste artigo, uma vez que prevê nada além da inspeção judicial, meio de prova já fartamente
regulado nos artigos 481 a 484 do Código de Processo Civil de 2015 e naturalmente passível
de aplicação ao procedimento possessório.
767
8. Aplicação das regras do artigo 565 do Código de Processo Civil de 2015 às
demandas reivindicatórias coletivas sobre bens imóveis: por fim, o § 5º do artigo 565 do
Código de Processo Civil de 2015 estabelece que as disposições constantes do caput e dos
parágrafos desse artigo se aplicam não apenas às ações possessórias coletivas de força velha,
mas também às ações reivindicatórias coletivas relacionadas a bens imóveis, ou seja, às
demandas de natureza petitória voltadas à proteção do direito à posse (ius possidendi) com
fundamento na propriedade ou em outro direito real.

Art. 566. Aplica-se, quanto ao mais, o procedimento comum.

1. Referência na legislação anterior: artigo 931 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Aplicação do procedimento comum a partir da contestação: o artigo 566 do


Código de Processo Civil de 2015 esclarece que a especialidade do procedimento das ações
possessórias de força nova assim como das ações possessórias coletivas de força velha
encerra-se com a apresentação da contestação pelo réu, sendo aproveitado, desse momento
em diante, o procedimento comum.

3. Cumulação de pedidos e reconvenção: justamente o aproveitamento do


procedimento comum após a contestação é que facilita, nas ações possessórias, a cumulação
de outros pedidos além dos mencionados no artigo 555 do Código de Processo Civil de
2015, bem como permite a reconvenção quanto a matérias distintas das indicadas no artigo
556 do mesmo Código.

Seção III - Do Interdito Proibitório

Augusto Jorge Cury

Art. 567. O possuidor direto ou indireto que tenha justo receio de ser molestado na posse
poderá requerer ao juiz que o segure da turbação ou esbulho iminente, mediante mandado
proibitório em que se comine ao réu determinada pena pecuniária caso transgrida o preceito.
768
1. Referência na legislação anterior: artigo 932 do Código de Processo Civil de
1973.

2. Ação preventiva: diferentemente das ações de reintegração e de manutenção de


posse, que objetivam remover ato ilícito (turbação ou esbulho) já perpetrado contra a posse,
o interdito proibitório tem por finalidade tutelar, preventivamente, a posse na hipótese de
ameaça de violação, ou seja, de iminência de esbulho ou de turbação. Por corolário, o escopo
do interdito proibitório é impedir a violência à posse, com expedição de mandado proibitório
e fixação de multa por descumprimento
A previsão do interdito proibitório como instrumento de tutela preventiva da posse
atende ao preceito do artigo 5º, XXXV, da Constituição Federal, que garante a
inafastabilidade da tutela jurisdicional (direito de ação) não apenas nos casos de lesão a
direito, mas também para as hipóteses de ameaça a direito.
Todavia, vale explicitar que o interdito proibitório não é demanda de natureza
cautelar, visto ser ação cuja tutela final é fruto de juízo de cognição exauriente, além, é claro,
de lhe faltar a acessoriedade típica das ações cautelares. Trata-se o interdito proibitório,
como já afirmado, de efetiva demanda preventiva, voltada à busca de tutela profilática à
posse ameaçada de iminente esbulho ou turbação.

3. Tutela inibitória: enquanto as ações de reintegração e de manutenção de posse


buscam a concessão de uma tutela de remoção do ilícito já perpetrado contra a posse, o
interdito proibitório tem por precípua finalidade a obtenção de tutela inibitória, porquanto
visa proteger a posse do autor contra ameaça de esbulho ou de turbação violação que,
apesar de iminente, ainda não se perfez , de modo a obstar a prática efetiva do ato ilícito
possessório.

4. Mandado proibitório e cominação de astreintes: uma vez que o interdito


proibitório é ação possessória pela qual se busca uma tutela inibitória, tanto sua procedência
final como eventual decisão concessiva da liminar possessória de evidência prevista no
artigo 562 do Código de Processo Civil de 2015 resultarão na expedição de mandado
proibitório de esbulho ou de turbação.
O artigo 567 do Código de Processo Civil de 2015, ao tratar do tema, menciona que
o mandado proibitório incluirá a cominação de pena pecuniária para a hipótese de o
sucumbente insistir nas ameaças à posse do vencedor da demanda possessória preventiva.
O dispositivo refere-se, claramente, à multa diária (astreintes), que é medida de apoio
769
voltada, no caso do interdito proibitório, à efetivação, por tutela específica, da decisão
quanto à obrigação de não fazer consistente na não repetição da ameaça possessória
combatida.
A cominação de multa diária é instrumento abrangido pelas disposições gerais dos
artigos 139, IV, 497, 536 e 537 do Código de Processo Civil de 2015, determinável ex
officio. Não se desconsidera que a parte litigante da ação possessória possa, nos termos do
parágrafo único do artigo 555 do Código de 2015, requerer, já desde a petição inicial, a
cominação de multa diária como medida de apoio.
Entretanto, o artigo 567 do Código de 2015, em consonância com a orientação do
artigo 537 do mesmo Código, reforça que a fixação judicial de multa diária não depende de
requerimento da parte, por estar inserida na abrangência do princípio inquisitorial, e não na
do dispositivo.

Art. 568. Aplica-se ao interdito proibitório o disposto na Seção II deste Capítulo.

1. Referência na legislação anterior: artigo 933 do Código de Processo Civil de


1973.

2. Procedimento do interdito proibitório: nos termos do que preceitua o artigo 568


do Código de Processo Civil de 2015, o rito a ser observado para o processamento do
interdito proibitório é exatamente o mesmo que rege as ações de força nova de reintegração
e de manutenção de posse. Isso porque o interdito proibitório, ao contrário de suas irmãs, é
sempre ação possessória de força nova.
Deveras, contrariamente às ações de reintegração e de manutenção de posse que
se voltam à obtenção de uma tutela de remoção de ato ilícito (turbação ou esbulho) já
perpetrado contra a posse , o interdito proibitório é ação possessória de natureza
preventiva, cabível quando há ameaça próxima de violação da posse, tendo como escopo,
justamente, a obtenção de uma tutela inibitória destinada a prevenir a prática do ilícito então
iminente.
Ora, o termo inicial do prazo de ano e dia que caracteriza as ações possessórias de
força velha é o ato de violação da posse. Desse modo, visto que na hipótese de interdito
proibitório não há ainda efetiva violação da posse, não há, igualmente, a contagem do prazo
de ano e dia que caracteriza as ações possessórias de força velha.
Isso significa que o interdito proibitório é espécie de demanda possessória que se
apresenta, invariavelmente, como ação de força nova, devendo, pois, sempre ser processado
770
conforme o rito especial próprio das ações de força nova inclusive sendo-lhe aplicável a
tutela liminar possessória de evidência , como, a propósito, corretamente prescreve o artigo
568 do Código de Processo Civil de 2015.
Das disposições dos artigos 560 a 566 do Código de Processo Civil de 2015, apenas
as do artigo 565 não se aplicam aos interditos proibitórios, uma vez que referido dispositivo
legal cuida das ações possessórias coletivas de força velha, restando, consequentemente,
incompatível com o interdito proibitório, que se configura sempre como ação possessória
de força nova, como acima esclarecido.

CAPÍTULO IV - DA AÇÃO DE DIVISÃO E DA DEMARCAÇÃO DE TERRAS


PARTICULARES
Seção I - Disposições Gerais

Adilson Elias de Oliveira Sartorello247


Dirceu Carreira Junior248
Arts. 569 - 598

Art. 569. Cabe:


I - ao proprietário a ação de demarcação, para obrigar o seu confinante a estremar os
respectivos prédios, fixando-se novos limites entre eles ou aviventando-se os já apagados;
II - ao condômino a ação de divisão, para obrigar os demais consortes a estremar os
quinhões.

A ação demarcatória é instrumento processual posto à disposição tão somente do


proprietário, com o propósito de tutelar o seu direito de estabelecer os limites de sua
propriedade, com a demarcação ou delimitação compulsória da área, o avivamento de rumos

247
É graduado pela Faculdade de Direito da Alta Paulista - FADAP, de Tupã-SP, Pós-Graduação em Gestão
de Estratégia e Negócios pela Universidade Estadual Paulista/UNESP de Bauru-SP, em Direito Imobiliário
Empresarial pela Universidade Secovi de São Paulo-SP e em Direito Processual Civil pela Escola Superior de
Advocacia da OAB/SP. Advogado militante desde 1998, foi membro do Comitê de Ética em Pesquisas da
Faculdade de Odontologia da USP em Bauru-SP; foi Assessor da Presidênciae Relator da X Turma do Tribunal
de Ética e Disciplina da OAB/SP; foi Coordenador da Comissão do Jovem Advogado, Membro efetivo da
Comissão de Direitos e Prerrogativas, Presidente da Comissão de Ética e Disciplina, Presidente da Comissão
de Atualização e Aperfeiçoamento Jurídico e Diretor Secretário Geral da OAB Bauru. Atualmente, é Diretor
Regional do IBRADIM - Instituto Brasileiro de Direito Imobiliário, Coordenador de Assuntos Legislativos da
Regional Bauru do SECOVI/SP e Vice-Presidente da OAB Bauru/SP.
248
É graduado em 2002 pela Faculdade de Direito da Universidade Paulista - UNIP - campus
de Bauru e pós-graduado em Direito do Trabalho pela mesma universidade. Cursou especialização em
Educação Ambiental pela Escola de Engenharia da Universidade deSão Paulo - USP - campus São Carlos,
turma 2009/2010 e pós-graduado em Direito Processual Civil pela Escola Superior da Advocacia - ESA, turma
2017/2018. Foi Presidente da Comissão da Caixa de Assistência dos Advogados de São Paulo CAASP e
assessor da Comissão de Ética e Disciplina da 21ª Subseção da OAB Bauru/SP, exercendo atualmente a
função de Relator no Tribunal de Ética e Disciplina Décima Turma Disciplinar Bauru (SP).

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