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ESTÉTICA

Unidade III
7 BENJAMIN: OBRA DE ARTE E TÉCNICA DE REPRODUÇÃO

Walter Benjamin foi um filósofo associado à Escola de Frankfurt fortemente influenciado pelas
teorias marxistas e freudianas. Nas palavras de Benjamin,

Quando Marx empreendeu a análise do modo de produção capitalista, esse


modo de produção ainda estava em seus primórdios. [...] Concluiu que se
podia esperar desse sistema não somente uma exploração crescente do
proletariado, mas também, em última análise, a criação de condições para
a sua própria supressão (BENJAMIN, 2012, p. 179).

Figura 14 – Walter Benjamin (1892-1940)

A influência de Marx é marcante no pensamento de Benjamin. Assim, o ensaio sobre a obra de arte
e a reprodutibilidade técnica é considerado, segundo Buck-Morss (1996), uma afirmação da cultura
de massa e das novas tecnologias pelas quais a arte se dissemina.

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7.1 A reprodutibilidade técnica

Benjamin aproxima a experiência cultural tecnologicamente mediada com a política e a sociedade.


Segundo ele,

O fascismo seria uma violação do aparato técnico correlativa ao violento


esforço em organizar as massas recentemente proletarizadas – não por
lhes oferecer o que lhes é devido, mas permitindo-lhes que se exprimam.
O resultado lógico do fascismo é a introdução da estética na vida política
(BENJAMIN apud BUCK-MORSS, 1996, p. 11).

Observação

Benjamin adverte nos seus escritos que todos os esforços no sentido


de tornar a política estética culminará em uma só coisa: guerra.

A humanidade, que segundo Homero, foi um dia objeto de espetáculo para


os deuses olímpicos, agora o é para si mesma. A sua autoalienação atingiu
uma tal magnitude que é capaz de experimentar a sua própria destruição
enquanto prazer estético da mais alta ordem (BENJAMIN apud BUCK-
MORSS, 1996, p. 12).

Com essa crítica, Benjamin certamente pretende dar à arte uma tarefa difícil, a de desfazer a
alienação do aparato sensorial do corpo e restaurar o poder institucional dos sentidos corporais
humanos em nome da autopreservação da humanidade, e isso não através do rechaço às novas
tecnologias, mas pela passagem por elas. Para Buck-Morss (1996), a compreensão crítica benjaminiana
da sociedade de massa entra em ruptura com a tradição do modernismo ao politizar a arte de
forma radical.

Considerando a origem da estética como aquilo que é perceptivo ao tato e à experiência sensorial
da percepção, o campo original da estética não é a arte, mas sim a realidade, a natureza corpórea,
material. A estética nasce de uma forma de cognição alcançada via gosto, audição, visão e olfato.
Essas sensações são uma faculdade pré-linguística anterior não apenas à lógica, como também aos
significados. Para Buck-Morss (1996), esses sentidos todos podem ser aculturados, e é exatamente
esse o interesse da filosofia na Modernidade.

Os sentidos mantêm um traço não civilizado e não civilizável, um núcleo


de resistência à domesticação cultural. Isto é devido ao seu propósito
imediato ser o de servir às necessidades instintivas – de calor, alimentação,
segurança, sociabilidade, em suma, estas permanecem parte do aparato
biológico, indispensável à autopreservação tanto do indivíduo como do
grupo social (BUCK-MORSS, 1996, p. 14).

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Posto isto, é interessante observar que, no decurso da Era Moderna, o sentido do termo estética
sobre uma inversão é aplicado à arte mais do que à experiência sensível em si, ao imaginário mais
do que às sensações e ao ilusório mais do que ao real. A consciência dessas mudanças na forma de
entender a estética foi motivo de discussão na Modernidade (BUCK-MORSS, 1996).

Observação

A estética foi reconhecida no idealismo alemão como um modo de


cognição legítimo, embora associado ao sensual, à esfera dos sentidos.

Na Modernidade, e levando em consideração os ensaios de Adorno, o que fascina o homem é a


ilusão narcisista de controle total.

O fato de se poder imaginar o que não é se extrapola na fantasia de que se


pode (re)criar o mundo conformemente a um plano. Trata-se da promessa
dos contos de fadas em conceder desejos, sem a sabedoria dos contos
de fadas de que as consequências podem ser desastrosas (BUCK‑MORSS,
1996, p. 15).

Nesse contexto, Benjamin baseia-se numa ideia freudiana para entender o que é a experiência.
A saber, a consciência é um escudo que protege o organismo contra estímulos do exterior, obstando à
sua retenção e à sua impressão em forma de memória. Em situações extremas ou traumáticas, o ego
protege a consciência, bloqueando a abertura do sistema sinestésico (sensorial) e isolando
a consciência presente da memória do passado. Dessa forma, acontece um empobrecimento da
experiência, provocando na Modernidade uma resposta aos estímulos sem pensar. Segundo Benjamin,
essa é uma necessidade de sobrevivência (BUCK-MORSS, 1996). Para ele, “percepções que antes
suscitavam reflexos conscientes são agora fonte de impulsos de choque dos quais a consciência se
deve esquivar. Na produção industrial bem como na guerra moderna, o choque é a essência mesma
da experiência moderna” (BUCK-MORSS, 1996, p. 22).

Seguindo esse pensamento, o ambiente tecnologicamente alterado expõe o aparato sensorial


humano a choques físicos que têm o seu correspondente em choques psíquicos. Benjamin, assim
como Adorno, tece críticas importantes à Modernidade. Segundo ele, a indústria e a aproximação
do homem com as máquinas e as técnicas promovem movimentos repetitivos sem desenvolvimento,
brutalizando o sistema dos sentidos. A reação mimética ao ambiente é sem sentido. “O sorriso que
se desenha automaticamente nos passantes alija o contato; é um reflexo que ‘funciona como um
absorvente mimético do choque’” (BUCK-MORSS, 1996, p. 23).

Para o filósofo, em nenhum outro lugar a mímesis como um reflexo defensivo é mais aparente
do que na fábrica. O sistema fabril danifica cada um dos sentidos humanos, paralisa a imaginação do
trabalhador. “O seu trabalho é isolado da experiência, a memória substituída pela resposta condicionada,
pelo aprendizado por treinamento mecânico, pela destreza repetitiva: a prática não vale nada”
(BUCK‑MORSS, 1996, p. 23).
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Nesses casos, a percepção se tornaria experiência apenas quando se conectasse com a memória
sensorial do passado, mas, para isso, precisaria superar as barreiras da alienação. Essa exacerbação
da falta de sentido, seja sinestésico, seja cognitivo, resulta na inversão do papel: “o seu objetivo é
o de entorpecer o organismo, insensibilizar os sentidos, reprimir a memória: o sistema cognitivo da
sinestésica tornou-se, antes, um sistema anestésico” (BUCK-MORSS, 1996, p. 24).

Com a crise da percepção, a discussão não deve se ater à possibilidade de educar o ouvido
para a música, mas sim de lhe restituir a audição, e assim com todos os sentidos, restaurando a
perceptibilidade (BUCK-MORSS, 1996).

A inversão dialética, por meio da qual a estética passa de um modo


cognitivo de contato com a realidade para uma maneira de a barrar,
destrói o poder do organismo humano para responder politicamente,
mesmo quando está em jogo a autopreservação: uma pessoa que está
“para além da experiência já não é capaz de distinguir um comprovado
amigo de um inimigo mortal” (BUCK-MORSS, 1996, p. 24).

Benjamin elabora o termo fantasmagoria para a aparência da realidade, do ambiente, que engana
os sentidos por meio da manipulação técnica. As percepções que as aparências oferecem são reais o
quanto baste.

O objetivo é a manipulação do sistema sinestético através do controle


dos estímulos ambientais. Tem o efeito de anestesiar o organismo, não
por entorpecimento, mas pela inundação dos sentidos. [...] estes sentidos
estimulados alteram a consciência [...] pela distração sensorial [...] e seus
efeitos são experimentados coletivamente ao invés de individualmente
(BUCK-MORSS, 1996, p. 28).

A superexposição aos estímulos sensoriais pensada pela fantasmagoria faz com que os indivíduos
se tornem adictos sensoriais a uma realidade compensatória, e isso se torna um meio de controle
social. Nesse sentido, Benjamin mostra que o papel da arte é ambivalente. Não é mais a experiência
dos sentidos, apenas, que se distingue da realidade, a arte se insere nesse campo fantasmagórico
como entretenimento, como parte do mundo das mercadorias.

O pintor Franz Skarpina mostra esse momento na obra a seguir.

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Figura 15 – Friedrichstraße on a rainy evening, de Franz Skarpina (1902)

As pinturas retratam uma atmosfera, um gênero, então na moda, que visava pintar mais um
ambiente ou um estado de espírito do que um tema. Segundo Buck-Morss (1996), o sentido da visão
era privilegiado nesse aparato sensorial da Modernidade, mas, segundo a autora, não só a visão foi
valorizada nessa época: a capacidade olfativa foi invadida pelos perfumes, que distanciavam
as pessoas do cheiro da cidade; e a capacidade auditiva foi também foi valorizada a partir das
obras musicais intensas, e é significante para os efeitos anestésicos “destas experiências que a
singularização de qualquer um dos sentidos para estimulação intensa tem o efeito de entorpecer
os demais” (BUCK‑MORSS, 1996, p. 29).

Voltando à questão da tecnologia, para Benjamin esta afetou o imaginário social e a crise da
experiência cognitiva causada pela alienação dos sentidos e tornou possível à humanidade visionar
a sua própria destruição prazerosamente. Nas palavras de Benjamin (2012), a obra de arte sempre
foi reprodutível e, em última instância, imitável. Na história da arte, essa imitação era praticada
pelos discípulos nos exercícios, pelos mestres para a difusão da obra e, por terceiros, meramente
visando o lucro.

Mas a reprodução técnica da obra de arte era até então um processo novo, que estava se desenvolvendo
ao longo da história com interesse crescente. Acompanhando esse processo em desenvolvimento,
Benjamin mostra que a litografia influenciou a técnica de reprodução de forma direta. Esse processo
permitiu às artes gráficas, pela primeira vez, colocar no mercado suas produções não somente em
grande quantidade, mas também sob a forma de criações sempre novas.

É interessante observar, como Benjamin, que essa técnica permite que as artes gráficas ilustrem
a vida cotidiana de forma rápida. Com essa valorização da reprodução da vida cotidiana surge a
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fotografia, com um poder de comunicação bastante importante. Segundo Benjamin, “como o orno
apreende mais depressa do que a mão desenha, o processo de reprodução das imagens experimentou
tal aceleração, que começou a situar-se no mesmo nível que a palavra oral” (BENJAMIN, 2012, p. 181).
Com a fotografia surge o cinema.

A reprodução técnica do som iniciou-se no fim do século passado. Com


ela, a reprodução técnica atingiu tal padrão de qualidade que ela não
somente podia transformar em seus objetos a totalidade das obras de
arte tradicionais, submetendo-as a transformações profundas como
conquistar para si um lugar próprio entre os procedimentos artísticos
(BENJAMIN, 2012, p. 181).

7.2 A destruição da aura

Para Benjamin, mesmo na reprodução mais perfeita da obra de arte algo está ausente: sua
existência única no lugar que ela se encontra. A história da obra é parte importante dela, pois descreve
as transformações pelas quais ela passou e a própria passagem do tempo. Essas características
constituem o conteúdo da autenticidade da obra e a identificação do objeto como “aquele” objeto.
“A esfera da autenticidade, como um todo, escapa à reprodutibilidade técnica, e naturalmente não
apenas à técnica” (BENJAMIN, 2012, p. 182).

A autenticidade se perde, então, diante da reprodução técnica, mas não a torna uma falsificação,
pois a reprodução técnica pode trazer outros olhares para essa obra e outras condições de assimilação.

Em segundo lugar, a reprodução técnica pode colocar a cópia do original


em situações impossíveis para o próprio original. Ela pode, principalmente,
aproximar do indivíduo a obra, seja sob a forma da fotografia, seja do
disco. A catedral abandona seu lugar para instalar-se no estúdio de um
amador; o coro, executado numa sala ou ao ar livre, pode ser ouvido num
quarto (BENJAMIN, 2012, p. 182).

Mesmo mantendo o conteúdo da obra intacto, a reprodutibilidade desvaloriza essa autenticidade.


Essa característica da autenticidade não é exclusiva da obra de arte, sendo que a natureza reproduzida
também sofre essa desvalorização.

Benjamin introduz o conceito de aura da obra de arte, e é ela que se atrofia com a reprodutibilidade
técnica. “Na medida em que ela multiplica a reprodução, substitui a existência única da obra por uma
existência serial” (BENJAMIN, 2012, p. 182-183). Em cada encontro de uma obra com o espectador
há uma atualização dessa obra. Essa situação abala a tradição, e isso se relaciona diretamente com os
movimentos de massa.

Benjamim afirma que o cinema e sua fácil e rápida reprodutibilidade provoca a liquidação do valor
tradicional do patrimônio da cultura. Para ele, “o modo pelo qual se organiza a percepção humana,
o meio em que ela se dá, não é apenas condicionado naturalmente, mas também historicamente”
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(BENJAMIN, 2012, p. 183). Assim, a aura é uma figura singular, composta por elementos espaciais e
temporais. A partir dessa definição, para Benjamin, é fácil identificar os fatores sociais específicos que
condicionam o declínio atual da aura.

Ao mesmo tempo que as massas modernas querem estar mais próximas da arte, elas superam o
caráter único da obra e aceitam a reprodutibilidade.

Cada dia fica mais irresistível a necessidade de possuir o objeto, de tão perto
quanto possível, na imagem, ou antes, na sua cópia, na sua reprodução.
Cada dia fica mais nítida a diferença entre a reprodução, como ela nos é
oferecida pelas revistas ilustradas e pelas atualidades cinematográficas, e
a imagem (BENJAMIN, 2012, p. 184).

Nesse contexto, a obra de arte reproduzida é a reprodução de uma obra de arte criada para ser
reproduzida, e, com isso, a questão da autenticidade das cópias não tem mais nenhum sentido. “Mas,
no momento em que o critério da autenticidade deixa de aplicar-se à produção artística, toda a
função social da arte se transforma. Em vez de fundar-se no ritual, ela passa a fundar-se em outra
práxis: a política” (BENJAMIN, 2012, p. 186).

Duas características das obras de artes podem ser acompanhadas ao longo da história em
relação às suas mudanças e ao significado da obra de arte para os indivíduos, ou massas, como
Benjamin coloca em seus textos. Essas duas características são o valor do culto da obra e o seu
valor de exposição. A produção artística tem seu início em imagens a serviço da magia, por isso a
exposição pública dessa produção era controlada. Pessoas específicas em momentos específicos
poderiam ter acesso a essa produção.

À medida que as obras de arte se emancipam do seu uso ritual, aumentam


as ocasiões para que elas sejam expostas. A exponibilidade de um busto, que pode
ser deslocado de um lugar para outro, é maior que a de uma estátua divina, que
tem sua sede fixa no interior de um templo (BENJAMIN, 2012, p. 187).

Para Benjamin, os gregos estão em lugar privilegiado na história da arte, pois só conheciam dois
processos técnicos para reprodução da obra de arte, o molde e a cunhagem. Todas as obras, com
exceção das moedas e terracotas, foram produzidas para serem únicas e eternas. Isso se deu pelo
momento de desenvolvimento da técnica em que se encontravam, mas, com isso, produziram valores
eternos. Os gregos então se encontram em posição diametralmente oposta à nossa, pois nunca as
obras de arte foram reproduzidas em tal escala e amplitude. Além dessa reprodutibilidade, a obra
de arte pode ser feita e refeita até uma suposta perfeição, enquanto na Grécia era feita de uma vez
em uma única pedra de mármore. A escultura então era a mais alta obra de arte para os gregos,
enquanto, para Benjamin, o cinema é a mais alta obra de arte do seu tempo.

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Saiba mais

Para ampliar os seus conhecimentos sobre o tema, leia o artigo a seguir:

CAMPOS, L. B. O cinema nas potências do falso: devir e hibridizações.


Revista Travessias, v. 2, n. 1, p. 109-125, 2008.

8 A ESTÉTICA EM MARCUSE

Herbert Marcuse foi um filósofo alemão, naturalizado norte-americano, que fundou junto com
Adorno, Horkheimer e Benjamim a Escola de Frankfurt. Marcuse também discute a formação social
com relação à dimensão estética do ser humano.

Segundo Rodrigues (2015), Marcuse considera a dimensão estética como uma nova práxis política,
aberta à dimensão da sensualidade, da imaginação e do prazer. É importante destacar que Marcuse,
na sua obra, pretende conciliar os pensamentos de Hegel, Heidegger e Marx. Importante também
lembrar que a Escola de Frankfurt tem como “um dos temas fundamentais o iluminismo, ou seja, a
razão como caminho da emancipação humana de toda repressão desnecessária” (RODRIGUES, 2015,
p. 226). Marcuse também se interessou muito pela psicanálise de Freud, tanto que seu pensamento
pode ser chamado de freudo-marxismo.

É de notar que a racionalização excessiva – que originalmente foi concebida como processo
emancipatório que deveria conduzir o homem à autonomia e à autodeterminação – se transforma
justamente em seu contrário, um crescente processo de instrumentalização para a dominação e
repressão do homem (FREITAG, 1986).

Como apontado anteriormente, Marcuse sofre grande influência de Freud na sua análise da
sociedade, o que pode ser visto na sua obra Eros e civilização. Nela, o ponto de partida é

a interpretação freudiana da civilização, segundo a qual ela só é possível a


partir de uma repressão permanente das pulsões humanas. Marcurse
defenderá a tese contrária de que é possível uma nova civilização sem
repressão, na qual os valores predominantes serão a solidariedade e a
cooperação. Marcuse considera que as modernas sociedades industriais
foram muito competentes para criar a tecnologia necessária à reprodução
da vida material, mas foram incompetentes para desenvolver o potencial
de liberdade contido no modo de produção industrial. Torna-se então
necessário conquistar a emancipação do homem e sua felicidade
(RODRIGUES, 2015, p. 227).

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Marcuse, ao contrário de outros filósofos da Escola de Frankfurt, faz uma proposta afirmativa,
e não um diagnóstico negativo da sociedade moderna. Freud, por sua vez, aparece pessimista sobre
a possibilidade de o homem ser feliz de forma duradoura. Para ele, o homem está condenado à
infelicidade. Para Freud, no entender de Rodrigues (2015, p. 229):

Só é possível existir uma civilização a partir da repressão libidinal, isto


significa que a civilização só começa quando se renuncia eficazmente ao
objetivo primário, que é a satisfação integral das necessidades. Diante do
inevitável conflito entre os imperativos sociais e a satisfação individual
das pulsões libidinais, o homem tem que escolher a sociedade (e sua
respectiva repressão), caso contrário, ocorreria a dissolução social, não
haveria progresso possível e retornaríamos à barbárie.

Freud considera que o amor (Eros) é necessário para manter os indivíduos juntos em sociedade, mas
para preservar a civilização é necessária a renúncia pulsional, ou seja, é necessário institucionalizar a
repressão. Sem essa repressão, a vida em sociedade não seria possível.

Observação

Sigmund Freud (1856-1939) nasceu no antigo Império Austríaco, foi


médico neurologista, criador da psicanálise e segue até hoje influenciando
muitos pensadores.

Ele também afirma que, quanto mais civilizada for uma cultura, mais repressora e menos
violenta ela é. Para a sublimação dessa pulsão, é necessário controlar o Eros e canalizar a energia no
trabalho produtivo.

Saiba mais

A leitura do livro a seguir pode enriquecer o conteúdo desta unidade.

FREUD, S. O mal-estar na civilização. Rio de Janeiro: Imago, 1997.

Para Marcuse, Freud acerta em dizer que há um conflito entre indivíduo e sociedade na civilização,
mas erra ao generalizar esse conflito como necessário a toda civilização.

Em relação à Marx, Marcuse retira a ideia da revolução das massas trabalhadoras e a necessidade de
abolir o modo de trabalho capitalista. Ele percebe, também, que no capitalismo tardio o proletariado
não é mais capaz da revolução universal, pois, para ele, houve uma uniformização das classes sociais
(RODRIGUES, 2015).

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A razão tecnológica se há convertido em razão política e, desta forma,


implantado uma forma de dominação mais sutil e bem mais eficiente, pois
ela se baseia em argumentos técnicos que, a princípio, visam melhorar a
vida dos trabalhadores. As massas trabalhadoras (e o homem em geral)
da sociedade capitalista moderna estão atordoadas por um consumo
sem limites e por uma falsa liberalização dos costumes, assim elas
perdem todo sentido crítico e se convertem em um homem unidimensional,
integrando‑se totalmente ao sistema (RODRIGUES, 2015, p. 228).

Para Marcuse, o proletariado, que para Marx era o sujeito revolucionário, perde esse caráter
comprado por um aparente bem-estar oferecido pelo consumismo. Diante dessa alienação, segundo
Marcuse, é necessário usar a crítica marxista focada na felicidade total do ser humano, e, por isso, é
necessário acrescentar ao marxismo a dimensão do lúdico, da alegria, do erotismo e da eudaimonia
(RODRIGUES, 2015).

Em Aristóteles, a palavra eudaimonia foi usada como equivalente a supremo bem humano, e o
objetivo da filosofia prática é definir o que é esse bem e como ele pode ser alcançado. No entender de
Marcuse, o homem vive num mundo em que sempre falta algo para satisfazer às suas necessidades,
mas a escassez pode ser administrada favorecendo a dominação de certos grupos.

Essa escassez obriga os homens a viverem sob uma autoridade, sob uma dominação. A partir
dessa ideia, Marcuse elabora os conceitos de repressão básica e o princípio de mais-repressão, ou
repressão excessiva:

• Repressão básica: são aquelas modificações das pulsões ou restrições à satisfação libidinal
necessárias à perpetuação da raça humana na civilização.

• Repressão excessiva: corresponde às restrições pela dominação social e histórica.

Marcuse também atualiza o conceito de princípio de realidade. Este está dividido em princípio
biológico de realidade e princípio de desempenho (ou realização); o último é o princípio de realidade
na sociedade moderna. Nele, quando a sociedade controla a repressão excessiva, substitui o princípio
de desempenho por um princípio de realidade, que libera espaço para o princípio de prazer.

Paradoxalmente, são as modernas sociedades industriais que são capazes


disso, uma vez que elas são capazes de liberar, em grande parte, as pessoas
do trabalho estritamente necessário para satisfazer as necessidades
básicas. Elas são capazes de aumentar cada vez mais o tempo livre dos
trabalhadores (RODRIGUES, 2015, p. 233).

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Saiba mais

O seguinte artigo pode ampliar a visão da influência de Freud na


obra de Marcuse.

MARQUES, F. C. A dimensão estética em Marcuse e a relação arte/política.


In: SEMINÁRIO COMUNICAÇÃO, CULTURA E SOCIEDADE DO ESPETÁCULO,
3., 2015, São Paulo. Anais [...]. São Paulo: Cásper Líbero 2015. Disponível em:
https://bit.ly/3b8SKgC. Acesso em: 7 maio 2021.

Para Marcuse, a pretensão de Freud sobre a validade universal do princípio de realidade


não se sustenta. Ele afirma que “os controles repressivos determinados pelo princípio de realidade são
os mesmos do princípio de desempenho que sustentam a dominação que ocorre na sociedade
moderna” (RODRIGUES, 2015, p. 234).

Esse princípio de realidade é moldado pela civilização e, no caso da sociedade moderna, recebe o
nome de princípio de desempenho, de tal forma que uma sociedade não repressiva não deve ter os
conteúdos repressivos e buscar o prazer. Esse princípio de prazer dominante não é o fim da civilização,
como diria Freud, mas sim a passagem para um nível mais elevado de civilização, segundo Marcuse,
uma civilização sem dominação e sem repressão excessiva (RODRIGUES, 2015).

Para Marcuse, a busca pelo prazer e pelo amor (Eros) é possível por meio da dimensão estética. Ele
volta ao entendimento do que é a estética no seu momento contemporâneo:

Na sociedade moderna a estética é vista como uma dimensão irreal de


pura fantasia, ineficiente, cujos valores só servem como enfeites ou como
simples passatempo e [...] viver com esses valores é o privilégio dos gênios
ou a marca distintiva dos boêmios decadentes (RODRIGUES, 2015, p. 235).

Se a estética fosse de fato isso, não teria condições de servir como base para uma práxis política
emancipatória, como ele pretende. Para Marcuse, essa visão da dimensão estética é também o resultado
de uma “repressão cultural” que visa anular os inimigos do princípio do desempenho e manter a
sua dominação. Essa é a grande intenção do autor, resgatar a dimensão política e revolucionária
da estética a fim de suprir o princípio do desempenho e sustentar uma concepção de sociedade
emancipada (RODRIGUES, 2015, p. 235).

Lembrete

Aristóteles usou a palavra eudaimonia como equivalente a supremo


bem humano, e o objetivo da filosofia prática é definir o que é esse bem
e como alcançá-lo.
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Marcuse volta o seu olhar para Kant para elaborar a dimensão estética. Ele percorre as três Críticas
do filósofo começando pela Crítica da razão pura, onde vemos como o conhecimento científico é
possível por meio dos juízos sintéticos a priori. É importante levar em consideração que os juízos
apenas produzem conhecimento na medida em que eles sintetizam os dados da sensibilidade com as
categorias do entendimento, ou, nas próprias palavras de Kant, “intuições sem conceitos são cegas,
pensamentos sem conteúdo são vazios” (KANT, 1980, p. 57).

A sensibilidade para Kant é fornecedora da matéria empírica para o conhecimento, ou seja, não há
conhecimento sem a sensibilidade. Kant dá um passo a mais no entendimento da sensibilidade como
base para o conhecimento. Ele afirma que ela é inferior nessa relação, pois a sensibilidade é
uma faculdade passiva em contraposição à faculdade ativa do entendimento. Assim, a razão, o
entendimento e o conhecimento compõem um processo ativo.

Na Crítica da razão prática, Kant analisa a moralidade como a autonomia da vontade e da


liberdade. “Uma ação só se caracteriza como moral na medida em que for uma ação livre, e não
uma ação movida por determinações físicas e biológicas. A razão é totalmente livre para estabelecer
as regras da boa conduta” (RODRIGUES, 2015, p. 236). Nesse domínio da moral, a sensibilidade não
tem importância, pois a liberdade é justamente agir com independência em relação à sensibilidade.
“Somente o homem pode, diante de uma mesa cheia de comida e estando esfomeado, recusar-se a
comer. A razão lhe ordena que não coma, e ele, contra os imperativos biológicos, segue a lei moral”
(RODRIGUES, 2015, p. 236).

Na visão de Rodrigues (2015), o próprio Kant tentará resolver essa separação radical das duas
esferas – sensibilidade e independência – na Crítica da faculdade de julgar, quando ele introduz, como
já vimos anteriormente, a dimensão estética, que seria a dimensão intermediária entre a natureza e
a moralidade.

Rouanet (1986, p. 248) resume essas distinções:

Na perspectiva da teoria estética, a sensibilidade, longe de ser o locus


de uma faculdade cognitiva inferior, é o organon por excelência do
conhecimento, na esfera que lhe é própria: o que a sensibilidade reconhece
como verdadeiro, a estética pode representar como verdadeiro, mesmo que
o entendimento o rejeite como não verdadeiro. A estética, como ciência
da sensibilidade, tem a mesma dignidade que a lógica, como ciência do
entendimento. O trabalho mediador da sensibilidade é desempenhado
pela faculdade da imaginação. A imaginação participa tanto da natureza
da razão teórica como da natureza da razão prática. A percepção estética
é fonte de prazer, e, portanto, é essencialmente subjetiva; mas na
medida em que esse prazer é acompanhado da forma pura do objeto, e é
universalmente válido, qualquer que seja o sujeito da percepção, faz parte
de uma ordem objetiva.

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Marcuse parte dos princípios kantianos de que o prazer proporcionado pelo belo é intrinsicamente
subjetivo e não pode ser um prazer regido por interesses, ou seja, ao suspender os interesses particulares,
os homens são capazes de obter uma satisfação devida exclusivamente à beleza do objeto estético.

Essa satisfação decorre de uma harmonia entre a nossa imaginação


e o nosso entendimento, entre nossas faculdades sensíveis e nossas
faculdades intelectuais. [...]. Além disso, o belo supõe uma finalidade sem
a ideia de fim, ou seja, a beleza alcança uma finalidade que não procura
(RODRIGUES, 2015, p. 237).

Esse ponto é fundamental para Marcuse. Para ele, a beleza é finalidade sem fim, intencionalidade
sem intenção e legitimidade sem lei. Dessa forma, a existência estética é incompatível com o princípio
de desempenho e com a racionalidade instrumental, mas é plenamente compatível com o princípio de
prazer. Assim, a posição kantiana é a de que a estética é capaz de fazer a reconciliação erótica (amor
e prazer) do homem com a natureza, acabando com a repressão desnecessária e colocando o homem
no caminho da liberdade. Marcuse encontra no romantismo alemão uma influência para trabalhar a
estética não mais como um patamar mais baixo que a lógica, pois a sensualidade e a beleza passam
a ter um papel de destaque na compreensão da vida humana em sua totalidade.

Schiller foi uma das grandes influências no romantismo alemão para Marcuse. A sua obra tenta
reconstruir a civilização a partir da força libertadora da função estética, sendo que essa estética
poderia formar um novo princípio de realidade, diferente do princípio de desempenho, e ter um papel
decisivo na reformulação da civilização (RODRIGUES, 2015).

Observação

O alemão Friedrich von Schiller (1759-1805) foi poeta, filósofo, médico


e historiador. É um dos principais representantes do romantismo alemão.

Para Marcuse, não se pode ignorar que a beleza é uma condição necessária da humanidade e, por
isso, fundamental para a formação plena do ser humano. Deixar de considerar isso é alienar o ser
humano de uma importante parte de si (RODRIGUES, 2015).

A estética significa a busca revolucionária de uma liberdade que não


interessa a esse sistema. Pois esta liberdade significa emancipar-se de
uma “lógica da repressão”, que visa manter um sistema de dominação
baseado em uma alta produtividade e em um alto consumo (RODRIGUES,
2015, p. 238-239).

Assim, ficam claros os pontos de tensão em Marcuse: de um lado ele coloca em evidência o
potencial subversivo e revolucionário da arte e da estética, reconciliadas com a sensualidade
e com o prazer; do outro está a sociedade industrial, que busca desenvolver ao máximo a alienação

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humana para manter o princípio de desempenho. Para Marcuse, a sociedade industrial fragmenta os
seres humanos ao alienar essas pessoas mantendo o princípio de desempenho.

Schiller, na visão de Marcuse, conclui que a doença da civilização moderna é o conflito entre as
dimensões da existência humana, o impulso sensual e o impulso formal, mas, para conciliar esses
polos, Schiller propõe o impulso lúdico. Para Marcuse, então, a salvação da cultura envolveria a
abolição dos controles repressivos que a civilização impôs à sensualidade (RODRIGUES, 2015). Para
o autor, o impulso lúdico é o “jogo”, e não o “jogar algo”; é encarar a própria vida como um jogo no
qual o objetivo não é ganhar, mas apenas jogar. A liberdade, para Marcuse, surge quando a realidade
perde a sua seriedade, ou estruturas repressivas rígidas. Essas estruturas repressivas não deixam o ser
humano mostrar todas as suas potencialidades.

Outra característica que Marcuse encontra no impulso lúdico é a capacidade de este promover
a reconciliação entre o homem e a natureza. Dessa forma, o homem não se sentiria mais dominado
pela natureza.

Assim, Marcuse acredita que a educação estética schilleriana é o


caminho para se chegar a uma sociedade não repressiva, onde Eros e
o princípio de prazer estejam liberados. Somente as condições de uma
existência estéticas podem permitir que este objetivo seja alcançado
(RODRIGUES, 2015, p. 240).

Rodrigues (2015, p. 241) mostra o resumo de Marcuse sobre as ideias de Schiller:

1) A transformação do esforço laborioso (trabalho) em jogo (atividade


lúdica), e da produtividade repressiva em “exibição” – uma transformação
que deve ser antecedida pela conquista da carência (escassez) como
fator determinante.

2) A autossublimação da sensualidade (do impulso sensual) e a dessublimação


da razão (do impulso formal), a fim de reconciliar os dois impulsos
antagônicos básicos.

3) A conquista do tempo, na medida em que o tempo destrói a gratificação


duradoura.

De uma maneira geral, a retomada da dimensão estética como caminho da libertação é também,
até hoje, um ponto muito fecundo. Marcuse não faz essa retomada com os filósofos seus antecessores
mais recentes, como Nietzsche e Schopenhauer, mas sim com a fonte original desses pensadores, Kant
e o romantismo alemão.

82
ESTÉTICA

Exemplo de aplicação

Adorno e Horkheimer apresentam a teoria da indústria cultural. Nessa teoria, encontra-se grande
influência de Marx. Leia as alternativas e assinale a correta em relação a essa influência na teoria de
Adorno e Horkheimer:

A) O aumento do acesso à obra de arte.

B) A mercantilização da obra de arte.

C) A autonomia da obra de arte.

D) A materialização da obra de arte.

E) A desmaterialização da obra de arte.

Resolução

A resposta correta é a alternativa B, pois a mercantilização da obra de arte pelo aumento da


produção e disseminação é tema da obra de Marx. Já o aumento do acesso à obra se dá pela produção
em larga escala pela indústria e, apesar de ser tema da discussão, não é o que influencia diretamente
a obra de Adorno. Na indústria cultural não se encontra uma autonomia da obra de arte. A matéria
ou a forma da obra de arte não são o centro da discussão de Adorno nem influência de Marx. E, por
fim, a matéria da obra de arte não faz parte da influência de Marx em Adorno.

83
Unidade III

Resumo

Nesta unidade, vimos que Benjamin problematiza a questão da


reprodutividade técnica. Ao longo da história, a obra de arte sempre
foi passível de reprodução. É certo que nos gregos essa reprodução
demandava praticamente o mesmo esforço de produção da obra original.
Com a criação da reprodução em massa – iniciando pela xilogravura,
depois a litografia e então a fotografia – aconteceu uma alteração da
valoração e da relação do sujeito com a arte.

O processo de reprodução passou a ser realizado massivamente


pela indústria – para as massas – de maneira rápida e perfeita. Essa
reprodutibilidade causa controvérsias até os dias atuais. Esse maior
acesso e essa reprodutibilidade sem controle fazem com que, de um
lado, o espectador fique mais próximo da obra de arte, mas, de outro,
provoca uma perda da autenticidade. A reprodução técnica desvaloriza
as características únicas da obra de arte, despreza as marcas do tempo,
da história e da tradição da obra de arte, e, assim, a aura da obra de arte
é perdida. Para Benjamin, a aura da obra é uma figura singular, composta
por elementos espaciais e temporais; é a aparição única de uma coisa
distante, por mais próxima que ela esteja.

Em resumo, as obras deixaram de ser únicas e exclusivas para se tornarem


bens comuns e idênticos. No seu aspecto social, a reprodução técnica
em massa é capaz de exercer uma influência tão poderosa que se torna
arma de políticas.

O cinema transforma algumas características importantes e históricas


da arte, como o valor de culto e o valor de exposição: o primeiro está
relacionado a uma questão mística da obra de arte, mantendo a obra
quase que exclusiva para alguns em determinados momentos poderem
acessá-la, e esse culto manteria o encantamento da obra; e o segundo
valor trata da visibilidade da obra, pois a reprodutibilidade permite uma
maior exposição das obras de arte.

Marcuse já trata a estética com temas mais contemporâneos a ele,


mas também olhando a estética como tema central para a formação de
uma sociedade, permitindo, por meio dela, a diminuição da dominação e
a liberdade dos homens.

84
ESTÉTICA

Exercícios

Questão 1. Leia o texto a seguir.

Marcuse, o filósofo refratário

Jorge Coelho Soares – 14 de março de 2010

Figura 16 – Herbert Marcuse (1898-1979)

Herbert Marcuse é um pensador tão instigante quanto complexo, tanto pelas suas ideias quanto
pelas apropriações que foram feitas delas a partir de um imaginário que tentou delinear para ele uma
imagem de “pensador e militante revolucionário”. Foi trazido assim à cena do debate intelectual e
divulgado, inclusive no Brasil, como maître à penser dos enragés de 1968. Porém sua complexidade
e sua densidade de reflexão permitiram que sobrevivesse não como um “filósofo da moda”, mas como
um grande pensador, permanentemente envolvido pelas novas inquietudes da razão e da emoção que
a Modernidade tardia colocava em cena. Ao lado de Adorno, Horkheimer e Benjamin, estabelecerá
um alicerce teórico fundamental do que conhecemos como Escola de Frankfurt.

E é nesse “movimento de ideias”, conhecido hoje também como Teoria Crítica, surgido na
Alemanha na década de 1920 e consolidado nos anos de 1930, que Marcuse deve ser estudado e
compreendido. Não que isso implique nele, nem nos demais membros desse grupo, uma adesão
acrítica a uma forma de pensar preestabelecida, à qual todos deviam prestar obediência. Muito mais
é uma aproximação intelectual a um conjunto de inquietações compartilhadas às quais se acreditava
poder dar conta, a partir de um referencial teórico, em permanente construção, ao qual todos eles
já haviam assumido previamente como seu. É no diálogo entre seus membros que a “Escola” irá
desdobrando suas reflexões e se construindo. É nesse diálogo intelectual também que precisamos
situar o pensamento de Herbert Marcuse, como um marco referencial a que ele recorria sempre e ao
qual se sentiu ligado por toda a sua vida.

Disponível em: https://bit.ly/3unceWh. Acesso em: 30 abr. 2021.

85
Unidade III

Com base na leitura e nos seus conhecimentos, analise as asserções a seguir e a relação entre elas.

I – Marcuse, juntamente com Adorno, Horkheimer e Benjamin, estabeleceu as bases da Escola de


Frankfurt. Esses filósofos aderiram de modo integral e acrítico à racionalidade técnica da sociedade
moderna e à cultura de massa.

Porque

II – No que tange à Teoria Crítica, Marcuse debruça-se sobre a alienação que a sociedade industrial
e a arte em geral provocam no ser humano.

Assinale a alternativa correta.

A) As asserções I e II são verdadeiras, e a II justifica a I.

B) As asserções I e II são verdadeiras, e a II não justifica a I.

C) A asserção I é verdadeira, e a II é falsa.

D) A asserção I é falsa, e a II é verdadeira.

E) As asserções I e II são falsas.

Resposta correta: alternativa E.

Análise das asserções

I – Asserção falsa.

Justificativa: segundo o texto, “ao lado de Adorno, Horkheimer e Benjamin, (Marcuse) estabelecerá
um alicerce teórico fundamental do que conhecemos como Escola de Frankfurt”. No entanto, ainda
de acordo com o texto, “é nesse “movimento de ideias”, conhecido hoje também como Teoria Crítica,
surgido na Alemanha na década de 1920 e consolidado nos anos de 1930, que Marcuse deve ser
estudado e compreendido”. Prossegue-se com o seguinte: “não que isso implique nele, nem nos
demais membros desse grupo, uma adesão acrítica a uma forma de pensar preestabelecida, à qual
todos deviam prestar obediência”. Além disso, tais filósofos tinham uma visão crítica da cultura de
massa (indústria cultural) e da sociedade capitalista que se configurava no início do século XX.

II – Asserção falsa.

Justificativa: de acordo com Marcuse, o avanço da sociedade industrial gera falsas necessidades
ao indivíduo, o que leva à sua integração ao sistema de produção e de consumo. No entanto, ele não
faz essa crítica às artes. Segundo ele, a arte combate a reificação característica da sociedade técnica.

86
ESTÉTICA

Questão 2. Observe as imagens e leia o trecho a seguir, de Walter Benjamin.

Figura 17

Disponível em: https://bit.ly/3f0p6vb. Acesso em: 5 dez. 2020.

Em suma, o que é a aura? É uma figura singular, composta de elementos espaciais e temporais:
a aparição única de uma coisa distante, por mais perto que ela esteja. Observar, em repouso, numa
tarde de verão, uma cadeia de montanhas no horizonte, ou um galho, que projeta sua sombra
sobre nós, significa respirar a aura dessas montanhas, desse galho. Graças a essa definição, é fácil
identificar os fatores sociais específicos que condicionam o declínio atual da aura. Ele deriva de duas
circunstâncias, estreitamente ligadas à crescente difusão e intensidade dos movimentos de massas.
Fazer as coisas “ficarem mais próximas” é uma preocupação tão apaixonada das massas modernas
como sua tendência a superar o caráter único de todos os fatos através da sua reprodutibilidade.
Cada dia fica mais irresistível a necessidade de possuir o objeto, de tão perto quanto possível, na
imagem, ou antes, na sua cópia, na sua reprodução. Cada dia fica mais nítida a diferença entre a
reprodução, como ela nos é oferecida pelas revistas ilustradas e pelas atualidades cinematográficas,
e a imagem. Nesta, a unidade e a durabilidade se associam tão intimamente como, na reprodução, a
transitoriedade e a repetibilidade. Retirar o objeto do seu invólucro, destruir sua aura, é a característica
de uma forma de percepção cuja capacidade de captar o “semelhante no mundo” é tão aguda, que
graças à reprodução ela consegue captá-lo até no fenômeno único. Orientar a realidade em função
das massas e as massas em função da realidade é um processo de imenso alcance, tanto para o
pensamento como para a intuição.

BENJAMIN, W. A obra de arte na era da reprodutibilidade técnica. Porto Alegre: L&PM, 2014. p. 46.

87
Unidade III

Com base na leitura e nos seus conhecimentos, avalie as asserções e a relação proposta entre elas.

I – De acordo com o conceito de Benjamin, na figura, apenas na imagem em que a personagem


Mônica ocupa o lugar de Mona Lisa se observa a destruição da aura do quadro como obra de arte.

Porque

II – Na reprodução da obra de arte, evidenciam-se a transitoriedade e a repetibilidade.

Assinale a alternativa correta.

A) As asserções I e II são verdadeiras, e a II justifica a I.

B) As asserções I e II são verdadeiras, e a II não justifica a I.

C) A asserção I é verdadeira, e a II é falsa.

D) A asserção I é falsa, e a II é verdadeira.

E) As asserções I e II são falsas.

Resposta correta: alternativa D.

Análise da questão

De acordo com Benjamin, a reprodutibilidade da obra de arte, facilitada pela técnica, destrói a sua
aura, pois retira a obra de seu invólucro. A autenticidade se perde, então, com a reprodução técnica.
Dessa forma, a reprodução da Mona Lisa original na figura também está relacionada à destruição
de sua aura.

88
FIGURAS E ILUSTRAÇÕES

Figura 1

DSCF1951.PNG. Disponível em: https://bit.ly/3aSktCa. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 2

AR00033_9.JPG. Disponível em: https://bit.ly/2QIhJQZ. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 3

MICHELANGELO.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3b1UnNj. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 4

KANTFOTO.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3xMGA70. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 5

HEGELPORTRAITBYSCHLESINGER1831.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3xErK2n. Acesso


em: 30 abr. 2021.

Figura 6

HORSE.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3xFErtQ. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 7

VARIANTS-CNIDUSAPHRODITE.JPG. Disponível em: https://bit.ly/2QIu3kd. Acesso em: 30


abr. 2021. Adaptada.

Figura 8

BEETHOVENHORNEMANN.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3vsZqxZ. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 9

LUDOVISIGAULALTEMPSINV8608.JPG. Disponível em: https://bit.ly/2Rem3XW. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 10

NIETZSCHE187A.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3eMVqS4. Acesso em: 30 abr. 2021.

89
Figura 11

FONTAINE-DUCHAMP.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3vvujBH. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 12

ADORNO.JPG. Disponível em: https://bit.ly/2ReDMPf. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 14

WALTER_BENJAMIN_VERS_1928.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3t7dXhc. Acesso em: 30 abr. 2021.

Figura 15

ABEND_1902.JPG. Disponível em: https://bit.ly/3e6ocOH. Acesso em: 30 abr. 2021.

REFERÊNCIAS

Audiovisuais

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Exercícios

Unidade I – Questão 1: INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO


TEIXEIRA (INEP). Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) 2017: Filosofia. Questão 14.
Disponível em: https://bit.ly/2PYkInX. Acesso em: 7 maio 2021.

Unidade I – Questão 2: INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO


TEIXEIRA (INEP). Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade) 2014: Filosofia. Questão 12.
Disponível em: https://bit.ly/3ewQ7rj. Acesso em: 7 maio 2021.

93
94
95
96
Informações:
www.sepi.unip.br ou 0800 010 9000

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