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PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS


PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

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Núcleo de Educação a Distância
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

PRESIDENTE: Valdir Valério, Diretor Executivo: Dr. Willian Ferreira.

O Grupo Educacional Prominas é uma referência no cenário educacional e com ações voltadas para
a formação de profissionais capazes de se destacar no mercado de trabalho.
O Grupo Prominas investe em tecnologia, inovação e conhecimento. Tudo isso é responsável por
fomentar a expansão e consolidar a responsabilidade de promover a aprendizagem.

GRUPO PROMINAS DE EDUCAÇÃO


Diagramação: Gildenor Silva Fonseca

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Prezado(a) Pós-Graduando(a),

Seja muito bem-vindo(a) ao nosso Grupo Educacional!


Inicialmente, gostaríamos de agradecê-lo(a) pela confiança
em nós depositada. Temos a convicção absoluta que você não irá se
decepcionar pela sua escolha, pois nos comprometemos a superar as
suas expectativas.
A educação deve ser sempre o pilar para consolidação de uma
nação soberana, democrática, crítica, reflexiva, acolhedora e integra-
dora. Além disso, a educação é a maneira mais nobre de promover a
ascensão social e econômica da população de um país.
Durante o seu curso de graduação você teve a oportunida-
de de conhecer e estudar uma grande diversidade de conteúdos.
Foi um momento de consolidação e amadurecimento de suas escolhas
pessoais e profissionais.
Agora, na Pós-Graduação, as expectativas e objetivos são
outros. É o momento de você complementar a sua formação acadêmi-
ca, se atualizar, incorporar novas competências e técnicas, desenvolver
um novo perfil profissional, objetivando o aprimoramento para sua atua-
ção no concorrido mercado do trabalho. E, certamente, será um passo
importante para quem deseja ingressar como docente no ensino supe-
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rior e se qualificar ainda mais para o magistério nos demais níveis de


ensino.
E o propósito do nosso Grupo Educacional é ajudá-lo(a)
nessa jornada! Conte conosco, pois nós acreditamos em seu potencial.
Vamos juntos nessa maravilhosa viagem que é a construção de novos
conhecimentos.

Um abraço,

Grupo Prominas - Educação e Tecnologia

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Olá, acadêmico(a) do ensino a distância do Grupo Prominas!..

É um prazer tê-lo em nossa instituição! Saiba que sua escolha


é sinal de prestígio e consideração. Quero lhe parabenizar pela dispo-
sição ao aprendizado e autodesenvolvimento. No ensino a distância é
você quem administra o tempo de estudo. Por isso, ele exige perseve-
rança, disciplina e organização.
Este material, bem como as outras ferramentas do curso (como
as aulas em vídeo, atividades, fóruns, etc.), foi projetado visando a sua
preparação nessa jornada rumo ao sucesso profissional. Todo conteúdo
foi elaborado para auxiliá-lo nessa tarefa, proporcionado um estudo de
qualidade e com foco nas exigências do mercado de trabalho.

Estude bastante e um grande abraço!

Professora: Lívia Lemos Cury de Oliveira


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O texto abaixo das tags são informações de apoio para você ao
longo dos seus estudos. Cada conteúdo é preprarado focando em téc-
nicas de aprendizagem que contribuem no seu processo de busca pela
conhecimento.
Cada uma dessas tags, é focada especificadamente em partes
importantes dos materiais aqui apresentados. Lembre-se que, cada in-
formação obtida atráves do seu curso, será o ponto de partida rumo ao
seu sucesso profissional.

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Esta unidade se dedica ao estudo das Psicopatologias. A Psico-
patologia é uma importante área de estudo e conhecimentos referentes
ao adoecimento mental do ser humano. Esse ramo da ciência tem grande
parte de suas raízes vindas da tradição médica, mas também se nutre e
é embasada nas tradições humanísticas, como a filosofia, a psicanálise, a
literatura e a arte. É um campo de estudo norteador nas diferentes áreas
de atuação da Psicologia e Psiquiatria, embasando teoricamente a clínica
e os diagnósticos que sustentam a direção de um tratamento psicológico
e/ou psiquiátrico. Diante de tantas informações e fácil acesso, atualmente,
cabe ao profissional e aos transmissores do conhecimento, não somente
fornecer informações, mas a transmissão de como fazer: observar, ouvir,
interpretar, saber pensar e desenvolver pensamento crítico. Em suma,
aprender a fazer a clínica.
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Psicopatologia, Psicologia, Psiquiatria, Diagnóstico Clínico,


Direção do tratamento.

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Apresentação do Módulo ______________________________________ 11

CAPÍTULO 01
ASPECTOS GERAIS SOBRE A PSICOPATOLOGIA

Noções de Psicopatologias: Critérios de Saúde e Doença Mental _ 12

Evolução do Conhecimento Psicopatológico ____________________ 17

Ética em Psicopatologia ________________________________________ 26

Recapitulando _________________________________________________ 29

CAPÍTULO 02
A AVALIAÇÃO PSICOPATOLÓGICA

O Exame Psíquico e a Súmula Psicopatológica __________________ 34


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Semiologia e Psicopatologia ___________________________________ 47

A Psicopatologia Fenomenológica e a Psicopatologia Existencial 48

Recapitulando _________________________________________________ 51

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CAPÍTULO 03
A PSICOPATOLOGIA NAS NEUROSES E NAS PSICOSES

Sobre as Neuroses e Psicoses ___________________________________ 56

Principais Transtornos Mentais e do Comportamento ___________ 63

Recapitulando __________________________________________________ 72

Fechando a Unidade ____________________________________________ 76

Referências _____________________________________________________ 80
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O módulo “Psicopatologias” apresenta, de uma forma didática,
o estudo dos principais transtornos mentais. Para isso, é necessário
compreender tantas outras questões em conjunto. Dessa forma, o ca-
pítulo 1 trata de conceitos iniciais importantes, como a compreensão do
que é normal/patológico e o conceito de saúde/doença em psicopato-
logia.
A compreensão da evolução histórica ao longo dos anos sobre
esse tema é fundamental para se entender e estudar o que é hoje e o
tratamento atual dos transtornos mentais. Ainda no primeiro capítulo,
aborda-se sobre a ética em psicopatologia, essencial aos profissionais
da saúde mental. É importante ressaltar desde já que, apesar da divi-
são didática, para fins de estudo, cada tema abordado não é separado,
dividido. Na prática clínica, cada conceito ou tema que didaticamente
dividimos aqui, se conectam entre si para compreensão global do sujei-
to. Isso mostra a complexidade do tema que trataremos neste módulo.
Dedicar-se à avaliação psicopatológica é essencial para um
diagnóstico cuidadoso e para a direção do tratamento mais eficaz e
condizente com o transtorno mental, para que se possa oferecer aos
pacientes melhor qualidade de vida e diminuição do sofrimento psíqui-
co. Existem vias de avaliação que se complementam, sendo importante
o profissional levar em consideração todas elas. O posicionamento crí-
tico, o saber pensar e a discussão do caso com os pares, por exemplo,
serão aspectos abordados neste módulo.
Ao longo do capítulo 2 ver-se-á a importância e complexidade
de realizar a avaliação em psicopatologia. Outro ponto importante e tra-
balhado ao longo de cada capítulo é a singularidade, a necessidade de
o profissional avaliar e tratar cada caso como único, observando a sin-
gularidade e particularidade de cada paciente. Dessa forma, é preciso
escutar e compreender os signos e sintomas de cada um, considerando
o sofrimento intenso e individual do sujeito.
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Por fim, após percorrer sobre várias questões como citado aci-
ma, é possível chegar às principais doenças e transtornos psiquiátricos
e suas possíveis abordagens de tratamento, causas e definições. O úl-
timo capítulo irá apresentar não somente as doenças, mas seus prin-
cipais sintomas e as diferenças entre as estruturas clínicas (psicose e
neurose), aspectos essenciais para a direção do tratamento.

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ASPECTOS GERAIS SOBRE
A PSICOPATOLOGIA

NOÇÕES DE PSICOPATOLOGIAS: CRITÉRIOS DE SAÚDE E DOEN-


ÇA MENTAL
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O conceito de saúde e normalidade em psicopatologia e em


saúde mental é tido como uma questão bastante controversa. Quando
se observa na clínica casos considerados extremos, com importantes
alterações comportamentais e mentais, sendo a intensidade e duração
dessas alterações os principais norteadores, torna-se menos problemá-
tico e mais fácil delinear aquilo que é considerado normal ou patoló-
gico. Porém, há casos considerados limítrofes, em que o profissional
muitas vezes se depara com uma linha bastante tênue entre a saúde e
a doença mental. Em todos os casos, mas em especial nesses casos
limítrofes, a observação clínica, bem como a escuta, as interpretações e
o saber pensar são primordiais para a condução do caso. Compreender
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o que é normal ou patológico em psicopatologia é de extrema impor-
tância, para isso, é necessário levar em conta diversos aspectos do
diagnóstico clínico.
Dalgalarrondo, importante nome na área da psicopatologia,
apresenta-nos em um de seus livros, diversas questões para pensar
sobre normalidade em psicopatologia e a definição de saúde e doença
mental: “O conceito de normalidade em psicopatologia também implica
a própria definição do que é saúde e doença mental. Esses temas apre-
sentam desdobramentos em várias áreas da saúde mental” (DALGA-
LARRONDO, 2008, p. 31).

É possível, então, já pensar que não há uma definição fechada


e única sobre os conceitos de normalidade, saúde e doença mental.

Abaixo, seguem as diferentes áreas da saúde mental citadas


pelo autor. Em cada uma delas, há diferentes desdobramentos ao discu-
tir esses temas. Pensar nas diferentes áreas da saúde mental também
abre espaço para refletirmos acerca dos cuidados e da complexidade
referentes ao tema da psicopatologia.

Quadro 1 – Áreas da saúde mental citadas por Dalgalarrondo

Áreas da Saúde Mental:


Psiquiatria legal ou forense
Epidemiologia psiquiátrica
Psiquiatria Cultural ou Etnopsiquiatria
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Planejamento em saúde mental e políticas de saúde


Orientação e capacitação profissional
Prática Clínica

Fonte: DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos Transtor-


nos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008

Critérios de Normalidade
É de comum acordo entre diferentes autores de que há mui-
tos critérios para se pensar sobre normalidade e anormalidade em
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psicopatologia.
O primeiro, e muito comum, é se pensar em normalidade como
ausência de doença. No caso da psicopatologia, pensar em saúde
como ausência de doença é pensar que a saúde mental é definida pela
ausência da doença mental. Se tivermos somente essa definição como
base, a qual parece bastante falha, termos uma percepção precária e
simplista.
Outro critério é o de normalidade ideal. Nesse caso, a norma-
lidade é tida como uma “utopia”, uma idealização de um normal. Uma
norma ideal, aquilo que supostamente é sadio ou mais evoluído. São
trazidas aqui algumas questões para se pensar sobre esse critério de
normalidade: O que é ideal? O que é considerado evoluído ou ideal em
saúde mental? Seria uma construção social, cultural ou ideológica que
nos daria a definição daquilo que é ideal ou normal em saúde?
Outro critério de normalidade que também nos parece falho,
especialmente por estarmos discutindo sobre saúde mental, é a norma-
lidade estatística. É uma normalidade que costuma ser aplicada em fe-
nômenos quantitativos. Nesse caso, o normal é aquilo que é observado
com mais frequência. Será que a utilização somente desse critério com
seres humanos é viável?
Normalidade como bem-estar é baseada a partir da definição
de saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS). Segundo a OMS, a
saúde é definida como o completo bem-estar biopsicossocial do sujeito.
Há críticas por se apresentar como uma definição vasta e imprecisa,
uma vez que o completo bem-estar de um sujeito é tão utópico que
poucas pessoas seriam avaliadas como saudáveis.
A normalidade funcional é baseada em aspectos funcionais.
Nesse caso, é considerado normal ou patológico quando um determina-
do fenômeno é disfuncional, ou seja, que produz sofrimento ao sujeito
ou para um grupo social.
Normalidade como processo apresenta uma visão de norma-
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lidade a partir de aspectos dinâmicos. Leva-se em conta os aspectos


dinâmicos do desenvolvimento, das crises, das mudanças que são pró-
prias a cada período.
Normalidade subjetiva é um critério de normalidade que dá ên-
fase à própria percepção do sujeito sobre si e sobre sua saúde. Dalga-
larrondo nos alerta ao cuidado necessário ao adotar esse critério, pois
há muitas pessoas que dizem sentir-se muito bem e saudável, mas por
detrás daquilo que falam, podem estar vivenciando um período de ma-
nia, que é um transtorno mental grave.
Normalidade como liberdade: esse critério de normalidade é
muito usado por profissionais que se guiam pela linha da abordagem fe-
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nomenológica e existencial. Haverá um item no capítulo 2, mais adiante,
em que falaremos mais detalhadamente sobre a psicopatologia feno-
menológica e existencial. Por enquanto, ficaremos somente com o crité-
rio de normalidade/anormalidade, que propõe a doença mental como a
perda da liberdade existencial.
Normalidade operacional considera como critério do que é
normal ou patológico de forma pragmática, definindo a priori o que é
doença e o que é saúde, e trabalha de maneira operacional sobre os
conceitos já definidos.
Diante dos diferentes critérios apresentados acima sobre o que
é normal ou patológico, podemos ter ideia da complexidade do tema
que é retratado nesta unidade.

Pode-se concluir que a psicopatologia é uma área que exige


uma postura crítica e reflexiva constante dos profissionais. A clínica em
psicopatologia está intimamente ligada ao como fazer: observação, es-
cuta, estudo teórico permanente, supervisão dos casos clínicos e saber
pensar.

... enfatiza-se a impossibilidade de desconsiderar as implicações subjacen-


tes aos “critérios” que definem o normal e o patológico. Trata-se de não igno-
rar que o sujeito é multifacetado e, portanto, não pode ser reduzido a apenas
uma de suas dimensões, principalmente quando se abarcam questões acer-
ca do sofrimento humano. (MORAES & MACEDO, 2018, s.p.).

Para Gaino et al (2018), o conceito de saúde e doença na área


de saúde mental segue apenas dois paradigmas para a discussão des-
se tema. Segundo esses autores, o primeiro paradigma é denominado
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biomédico, em que o foco é exclusivo na doença e nas manifestações


dela, em que a loucura é o único objeto de estudo. O outro paradigma
tem o viés social, chamado produção social de saúde. Neste caso, a
saúde é vista de forma mais complexa, levando-se em consideração ou-
tros aspectos para além da sintomatologia da loucura, como aspectos
sociais, econômicos, culturais e ambientais. No segundo paradigma, a
loucura vai para além de um diagnóstico psiquiátrico.

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Figura1: Normal e patológico
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Fonte: DALGALARRONDO, P. Psicopatologia e semiologia dos transtornos


mentais, 2007.

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Indicação de livro: GREEN, H. Nunca lhe prometi um Jar-
dim de Rosas. Rio de Janeiro: Editora Imago, 1974.

O psicopatólogo não julga moralmente o seu objeto, busca


apenas observar, identificar e compreender os diversos elementos da
doença mental (DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semio-
logia dos Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008, p. 27).

EVOLUÇÃO DO CONHECIMENTO PSICOPATOLÓGICO

A evolução do conhecimento psicopatológico se deu ao longo


de muitos anos e a compreensão se dá a partir do contexto histórico-
-político de cada época. Compreender a evolução do tema é também
articulá-la com a história da própria humanidade. Para cada período
histórico há uma particularidade, um conceito ou uma compreensão so-
bre as doenças mentais. Levar em conta a história da humanidade nos
remete, mais uma vez, à amplitude e complexidade do tema.
Desde a Grécia Antiga há uma tentativa de compreender e lidar
com as doenças e os transtornos mentais. Nessa época, as tragédias
gregas eram escritas como forma de dar conta dos ‘desvios’ comporta-
mentais e mentais. A intenção não era explicar teoricamente as psico-
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patologias, mas retratar o cotidiano das pessoas numa tentativa de ela-


borar, através da arte, os desvios e dramas vivenciados e presenciados.
Nas tragédias gregas, a loucura era exposta como a impossibi-
lidade de escolha do sujeito. É importante lembrar e ressaltar que, nes-
sa época, o destino dos indivíduos era imposto pelos deuses. Dar conta,
de alguma forma, da loucura nessa época, era estar atravessado pela
divindade. Nesse período, tirava-se da pessoa, que era considerada
louca, seu lugar de sujeito na sociedade. Os efeitos do assujeitamento
do indivíduo com transtorno mental serão vistos ao longo de toda a his-
tória. Esse aspecto se difere dos dias atuais?
Ainda na Grécia Antiga, em meados de 400 a.C, começa a sur-
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gir a concepção do Hipócrates, em que o modelo mítico – teológico pas-
sa a ser substituído por outro, uma visão mais racionalista, afastando,
então, a influência divina na loucura. A partir de Hipócrates, a loucura
passa a ser vista como uma doença, decorrente de desarranjos no ho-
mem. Essa proposta se dá a partir de uma visão organicista. A busca
de Hipócrates, na tentativa de explicar esses desarranjos, influenciou
significativamente a medicina nos séculos XVIII e XIX. Ao enfatizar o or-
ganicismo para na etiologia das doenças mentais, a doutrina hipocrática
desconsiderou explicações e elementos psíquicos.
No segundo século depois de Cristo surge outra concepção
acerca da loucura e da doença mental. Claudio Galeno, atravessado
pela cultura judaico-cristã, passa a considerar a existência da alma. Ao
mesclar as teorias de Platão e Hipócrates, sustentou sua teoria funda-
mentando a dualidade corpo-mente. Apesar de ainda ser uma teoria
bastante organicista, ela abriu espaço para se pensar em conceitos psi-
cológicos que até então não eram considerados. Antes disso, o psíquico
era considerado somente como reflexo de eventos somáticos.
No período medieval, que data dos séculos V ao XV, há um
retorno de uma visão mítico-teológica sobre a loucura. Nessa época,
o louco era visto como perigoso. As manifestações mentais eram tidas
como anormais e insanas, assumindo uma marca de condenação e
culpa. Nesse período, o homem passou a ser considerado novamente
um ser passivo. As manifestações emocionais e mentais advindas da
doença eram vistas como uma possessão demoníaca, o que reforçava
a exclusão do louco da sociedade e de seu lugar como perigoso e mal.
Mais uma vez se observa o assujeitamento do indivíduo com transtorno
mental.
É importante ressaltar, nesse momento, os mecanismos de ex-
clusão do louco na sociedade. Nesse período, a loucura não era perce-
bida como um fenômeno que necessitasse de um conhecimento cien-
tífico. Foram criados estabelecimentos para retirar do convívio social o
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indivíduo que não se adaptava à sociedade. Estabelecimentos como


asilos e hospitais foram criados para esse fim.
Com o fim da Idade Média e o consequente declínio do poder
das Igrejas, surgem as novas teorias, conhecidas como as teorias re-
nascentistas. Essas teorias propiciaram o início das investigações cien-
tíficas a partir de uma corrente filosófica que defendia que a verdade de-
veria ser alcançada por meio da razão, e não da fé. O surgimento dessa
visão racionalista foi possível a partir da dissociação das influências teo-
lógicas. Descartes é o teórico que surge nesse momento, defendendo
a conhecida frase “Penso, logo existo”. Segundo ele, o homem existe,
pois é possível inscrevê-lo no simbólico e no pensamento. A partir dele,
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dá-se início ao discurso da ciência.
Apesar de introduzir esse novo método, Descartes não deixou
de afirmar a existência de Deus no pensamento humano e, apesar des-
sa nova proposta, não deixa claro suas considerações acerca do dua-
lismo mente-corpo. Para Descartes, o eu estava ligado ao pensamento
e à consciência, como uma entidade racional.
Com base nessa definição proposta por Descartes, o eu na
loucura não estava amparado pela razão; portanto, os loucos ficavam,
mais uma vez, à margem da sociedade. Considerados irracionais, eram
colocados como excluídos, diferentes daqueles que pensam e racionali-
zam. É nessa época que surgem os confinamentos e encarceramentos
dos loucos. Acompanhamos aqui mais um momento na história da hu-
manidade do assujeitamento do indivíduo com doença mental.

Uma vez que o “eu” associado à loucura não estava amparado na razão, em
um contexto que sustentava a primazia do pensamento e, logo, da consciên-
cia, os loucos ficavam à margem, excluídos das novas perspectivas que se
vislumbravam na cena social. Foucault (1978) sustenta que a loucura, mais
enfaticamente no século XVIII, foi associada à marginalidade humana, já que
muitas pessoas nessas condições assumiam o comportamento de animais e,
portanto, deveriam ser tratadas como tais. Estas manifestações passam, en-
tão, a ser vistas como uma forma de alienação das regras sociais. Nesse con-
texto, ocorreu o movimento social do denominado “Grande Confinamento”,
no qual os membros da sociedade que eram considerados irracionais foram
encarcerados e institucionalizados em asilos. Destaca-se que esse momento
histórico, marcado por acelerada urbanização e crescente industrialização no
mundo do trabalho, favoreceu o confinamento da loucura, em decorrência da
inadaptação do louco diante das mudanças e de sua incômoda presença na
paisagem social (FOUCAULT, 1978 apud MORAES & MACEDO, 2018, s.p.).

É no século XIX que ocorre uma importante modificação sobre


a visão da loucura. É com Phillippe Pinel que se inaugura uma nova
especialidade médica: a psiquiatria. Segundo a concepção de Pinel, a
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loucura é tida como uma contradição da própria razão, assim, uma par-
cela de razão era mantida nos momentos tidos como alienação. A lou-
cura é vista como uma alienação e doença, como um desequilíbrio entre
razão e afeto. A palavra afeto aparece pela primeira vez no processo de
teorização da loucura.
Não foi só a teorização e visão sobre a loucura que Pinel mo-
dificou radicalmente, mas também o tratamento. É ele quem reinventa
o manicômio como lugar de tratamento. Para ele, “os alienados eram
doentes cujo doloroso estado merecia toda a consideração devida à
humanidade que sofre e para quem se deve buscar, pelos meios mais
simples, restabelecer a razão desviada” (PEREIRA, 2004, p. 114, apud
19
MORAES e MACEDO).
Ao longo de todos os anos percorridos na história da humani-
dade, parece ser a primeira vez que o indivíduo considerado como lou-
co é tratado de outra forma e os comportamentos tidos como anormais
foram vistos como um sofrimento a ser tratado e cuidado. O tratamento
médico baseado na observação dos sintomas como proposta foi um
marco radical. Pinel marca, então, a essência da loucura como desar-
ranjo psíquico. É a partir da nova teorização sustentada por ele que
outros médicos puderam se debruçar sobre os estudos mais aprofunda-
dos dos sintomas e manifestações psicopatológicas.
A psicopatologia apareceu como disciplina em 1913, a partir da
publicação do livro A psicopatologia geral de Karl Jaspers. Essa obra é
considerada uma das mais importantes na área.

A Psicopatologia geral, de Karl Jaspers (1979), primeiramente editada em


1913, é, certamente, a obra maior da psicopatologia. É “o grande tratado”,
cuja força primordial é ter lançado as bases metodológicas da disciplina: ba-
ses a um só tempo clinicamente rigorosas e filosoficamente muito bem em-
basadas (DALGALARRONDO, 2008, p. 13).

Apesar de toda a descoberta sobre a psicopatologia, emba-


sando-se na ciência, e não mais atrelada ao mítico-teológico, processo
muito importante para história e o conhecimento da psicopatologia, as
pessoas com transtornos mentais continuavam encarceradas nas ins-
tituições, o que não levava a nenhuma melhora ou solução dos sinto-
mas daqueles que se encontravam nessa situação. A constante busca
e preocupação pela classificação da psiquiatria acabaram gerando uma
ideia de cronicidade da doença, como consequência do confinamento
perpétuo nos manicômios.
É então nesse contexto que surge, no final do século XIX, a
psicanálise. Sigmund Freud apresenta proposições que se deram a par-
tir dos questionamentos e descobertas acerca dessas doenças. Com a
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psicanálise ocorreram importantes transformações na compreensão e


terapêutica das patologias psíquicas.
Com que foi apresentado aqui, é possível perceber o empenho
do homem na busca de explicações sobre si mesmo e sobre o mundo.
Esse processo se deu, e ainda se dá, ao longo dos séculos, na história
da humanidade. No processo de construção de conhecimento ocorre-
ram avanços e retrocessos. Na evolução do conhecimento sobre a psi-
copatologia não foi diferente. As concepções sobre esse tema oscilaram
ao longo da história. O tema estudado: a loucura, a doença mental,
aquilo que escapa ao dito normal, gera desconforto, causa ainda mais
dificuldade a sua teorização e busca pela verdade. Mas, afinal, o que é
20
a verdade? Deixar a loucura escondida, nos hospícios, manicômios ou
asilos, como se deu por várias vezes e por muito tempo, foi o possível
encontrado para lidar com o limite do saber, escancarando ao homem a
complexidade do tema e impossibilidade de um saber total.
A complexidade na definição sobre psicopatologia e todos os
entraves para sua compreensão ao longo da história, mostra-nos que
não há uma única conceituação, restrita e homogênea. Há uma busca
pela praticidade no diagnóstico, presente nos manuais classificatórios
de psicopatologia, porém, é necessário que não se confunda essa visão
descritiva e pragmática com a compreensão dinâmica do adoecimento
mental.
Os manuais classificatórios de psicopatologia, como o Manual
Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM), surgem como
consequência dessa busca, ao longo dos séculos, por sistematizar e
classificar as doenças mentais. A primeira edição desse manual, o DS-
M-I, foi publicada em 1952, sendo revista e atualizada em 1968 (DSM-
II), 1980 (DSM-III), 1987 (DSM- III- R) e sua última atualização foi em
1994 (DSM- IV) (MATOS ET AL, 2005). Os manuais são importantes e
foram revolucionários na área, principalmente na psiquiatria. Porém, o
uso exclusivo deles para a realização do diagnóstico não parece reco-
mendado. É primordial o uso cuidadoso dos manuais, somado à com-
preensão dinâmica e ao diagnóstico clínico, que requer a observação e
escuta.
A partir do que foi exposto, é possível retomar a discussão so-
bre normal e patológico em psicopatologia, relacionando os dois temas
discutidos até aqui. Tendo em vista toda a complexidade exposta sobre
as doenças da mente e todo o percurso ao longo da história, não tem
como desconsiderar os critérios de normalidade como parte da com-
preensão sobre a evolução do conhecimento em psicopatologia.
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“...Trata-se de não ignorar que o sujeito é multifacetado e, por-


tanto, não pode ser reduzido a apenas uma de suas dimensões, princi-
palmente quando se abarcam questões acerca do sofrimento humano”
(MORAES & MACEDO, 2018, s.p).

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A luta antimanicomial é um processo social de transformação
dos serviços psiquiátricos que ocorre como efeito durante todo esse
tempo de evolução dos conhecimentos e tratamento das doenças men-
tais. No Brasil, é comemorada no dia 18 de maio, mas ela se dá em
escala mundial e deriva de uma série de eventos políticos globais. O
Movimento Antimanicomial ou Luta Antimanicomial é baseado no dis-
curso do médico italiano Franco Basaglia.
Esse processo histórico se dá pela defesa dos direitos huma-
nos e pela busca da cidadania das pessoas que se encontram em in-
tenso sofrimento psíquico. Como vimos, ao longo de toda história da
humanidade, a loucura foi, por muito tempo, considerada anormal, e
a exclusão e marginalização do sujeito com transtorno mental foi uma
prática comum. A luta Antimanicomial surge como uma subversão àquilo
que foi feito até então, resgatando o sujeito, trazendo-o para o convívio
social, criticando as internações, oferecendo tratamentos possíveis fora
do contexto hospitalar. Os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS),
tão importantes no tratamento, surgem como proposta subversiva ao
tratamento no manicômio e de exclusão. O paciente que necessita de
tratamento o fará em um espaço próprio, com profissionais capacita-
dos, mas viverá cotidianamente em sua casa e inserido na sociedade.
A internação se dará em casos extremos, de muita gravidade, mas será
feita a partir de avaliações multi e interdisciplinares.
Ainda há um desafio constante aos profissionais da saúde
mental para sustentarem esse modelo de tratamento. Mas, não há
como negar o avanço e as conquistas possíveis que essa luta histórica
oferece às pessoas com transtorno mental. Ao reconhecer os aspectos
psíquicos envolvidos na etiologia e sintomatologia de uma psicopatolo-
gia, as possibilidades terapêuticas se transformaram, sendo que a atua-
ção de outros profissionais, em conjunto com o médico, é primordial
para a melhora dos sintomas e do sofrimento do sujeito. Assim, Psicó-
logos, Terapeutas ocupacionais e Assistentes sociais são profissionais
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necessários à sustentação do tratamento e inserção do sujeito junto à


sociedade. Abaixo segue uma figura que mostra o funcionamento da
rede de atenção à saúde mental.

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Figura 2: Rede de Atenção à Saúde Mental

PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

Fonte: Ministério da Saúde, 2013.

Psicopatologia e Psicanálise: efeitos da evolução do conhecimen-


to psicopatológico
Moraes & Macedo (2018) afirmam que, apesar de todo avanço
importante e necessário feito por Pinel, que postula “um resto de razão
na loucura” (p. 89), Freud traz contribuições revolucionárias a respeito
do sujeito psíquico. Através da psicanálise, o fundador traz à tona o
sujeito do inconsciente, subvertendo toda a ordem médica e a concep-
ção da época sobre a loucura. Diferentemente de Pinel, Freud buscará
23
encontrar “uma razão na loucura” (p. 89). Freud causa na humanidade
uma ferida narcísica ao sustentar que o sujeito é regido pelo inconscien-
te, rompendo com o paradigma consciencialista defendido até então.
Freud antecede a psicanálise a partir de sua experiência com
o neurologista Charcot, em Paris, em que, a partir das observações do
tratamento de mulheres histéricas, o pai da psicanálise mostra que com
a observação foi possível a compreensão das manifestações psicopa-
tológicas. Foi então, e a partir do cargo de docente adscrito no Hospital
Salpêtrière, que Freud introduziu uma grande modificação no tratamen-
to da histeria e demais neuroses, deslocando o olhar para a escuta e
mudando de forma significativa a forma de relacionamento entre médico
e paciente.
É possível perceber, a partir de Freud e da psicanálise, a
presença da observação e da escuta como fatores importantes no diag-
nóstico e na condução de um caso, quando se trata de um tratamento a
uma pessoa com intenso sofrimento psíquico.
Freud vai cada vez mais sustentando sua concepção teórica e
suas proposições técnicas, destacando o valor da singularidade tanto
no método do tratamento quanto no sofrimento psíquico. A psicanálise
é caracterizada a partir de três vias: ela é um método de investigação do
inconsciente, ela é uma técnica de tratamento e uma teoria. Trabalhar a
partir dela é ter esses três pilares presentes no diagnóstico e na condu-
ção do tratamento. A sua marca revolucionária é o olhar singular para a
compreensão das configurações psíquicas a partir da experiência única
de cada sujeito do inconsciente.
Apesar de Freud ter apresentado ao longo de sua obra as di-
ficuldades de tratamento ao sujeito psicótico, toda sua obra contribuiu
grandemente para a compreensão das diferentes estruturas psíquicas,
sendo que todas elas são encontradas e tratadas a partir da psicopato-
logia.
Os estudos de casos escritos por Freud retratam tanto as neu-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

roses, como as as psicoses e a perversão. Fazer o diagnóstico da es-


trutura clínica é primordial para a direção do tratamento, pois, para cada
uma delas, há um manejo diferente. E, para cada paciente, em sua
estrutura clínica, deve haver uma condução e escuta singulares.

Café Filosófico: PEREIRA, M.E.C. O que é transtorno men-


tal? 2016. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=I_UDI-
ZnQQlM>. Acesso em: 30.09.2020
24
Quadro 2 – Momento Histórico e a Concepção de Loucura
MOMENTO HISTÓRICO CONCEPÇÃO DA ‘LOUCURA’
Grécia Antiga Impossibilidade escolha do sujeito; visão míti-
co-religiosa; destino da loucura imposta pelos
deuses.
Grécia Antiga – Hipócrates Visão mais racionalista; afasta influência di-
vina na loucura; doença como desarranjo no
homem; visão organicista.
Século II d. C – Galeno Influência judaico-cristã; existência da alma;
dualidade corpo-mente.
Período Medieval Visão mítico-religiosa; louco como perigoso;
exclusão do louco na sociedade; assujeita-
mento do indivíduo com transtorno mental.
Renascentismo – Descartes Visão racionalista; verdade alcançada através
da razão e não da fé; início do pensamento
científico; loucos continuavam à margem da
sociedade.
Século XIX – Phillippe Pinel Nova especialidade médica: psiquiatria; lou-
cura como alienação e doença; desequilíbrio
entre razão e afeto; mudança de visão e tra-
tamento.
Final século XIX – Freud Radicalizou a concepção e tratamento; sujeito
do inconsciente; singularidade.
Fonte: OLIVEIRA, L.L.C DE, 2020
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

Indicação de livro: MURAT, L. O Homem que se achava Na-


poleão: Por uma história política da loucura. São Paulo: Três Estre-
las, 2012.

25
ÉTICA EM PSICOPATOLOGIA

Tratar do tema ética, em psicopatologia, é também retomar o


Código de Ética da profissão, seja o código de ética em Psicologia ou
Medicina. É mister considerar sempre o sigilo, os cuidados e a respon-
sabilidade ao tratar e cuidar de seres humanos. No caso da psicopato-
logia, é o cuidado e o tratamento do sujeito que se encontra em intenso
sofrimento psíquico.
Não cabe aqui retomar item por item do código de ética pro-
fissional, mas lembrar da importância de se estabelecer padrões es-
perados quanto à prática profissional, a fim de garantir ao sujeito um
tratamento com embasamento científico e humano. Cabe a cada profis-
sional frente a determinada dúvida referente ao código de ética retomar
a leitura deste.

Código de Ética do Psicólogo


Acesso pelo link: https://site.cfp.org.br/wp-content/uploads/
2012/07/codigo-de-etica-psicologia.pdf Acesso em: 24.09.2020

Código de Ética Médica


Acesso pelo link: https://portal.cfm.org.br/images/PDF/cem
2019.pdf Acesso em: 24.09.2020

Porém, não basta a retomada mecânica de cada item, mas ter


a capacidade de articular com a prática, com o trabalho em equipe e
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

com a escuta do sujeito. Estar apoiado ao estudo permanente da teoria,


bem como na discussão de casos ou supervisão clínica também são
posturas éticas do profissional diante do sujeito em sofrimento.
Se retomarmos novamente a psicanálise, ela é uma prática e
uma ética. A escuta analítica é compreendida como um exercício ético
que oferece um espaço para um trabalho com a singularidade do sujei-
to, seus desejos e sofrimentos. O tratamento psicanalítico vai na con-
tramão das imposições sociais, sua escuta tem como objetivo, também
ético, de resgatar o sujeito e implicá-lo em seu tratamento e sintomas.
Outro ponto importante relacionado à ética é o tripé da psica-
nálise. Esse tripé é sustentado pelo estudo da teoria, supervisão dos ca-
26
sos clínicos e análise/psicoterapia do profissional. Estar em permanente
movimento nesses três pilares também demarca a ética do profissio-
nal na sua prática. Trabalhar com pessoas que apresentam transtornos
mentais muito provavelmente irá mobilizar psíquica e emocionalmente
questões internas dos profissionais. Se propor ao próprio processo de
análise/psicoterapêutico é uma postura ética frente ao seu paciente e à
sua prática clínica.
Os outros dois pilares também são importantes ao se discu-
tir sobre o tema da ética em psicopatologia. O estudo permanente da
teoria é um dever, mantendo-se informado de novos estudos teóricos
ou terapêuticos, a fim de tentar oferecer sempre um tratamento de qua-
lidade e atual.
A supervisão dos casos clínicos consiste na discussão de caso
supervisionado por um profissional mais experiente. Poder compartilhar
as dificuldades de diagnóstico ou manejo de um determinado paciente,
com espaço para pensar e se questionar sobre a direção do tratamento,
é uma postura ética e cuidadosa com o sujeito em sofrimento.
As supervisões são momentos possíveis de se pensar e discu-
tir em outro momento, de outra forma sobre o caso acompanhado, afi-
nal, no momento do atendimento, muitas vezes, não é possível pensar
em alguns detalhes (de diagnóstico, manejo ou interpretação, como al-
guns exemplos) que podem ser melhor compreendidos depois. Esses
três momentos, conhecidos como o tripé da psicanálise, também contri-
buem para a escuta singular de cada sujeito em tratamento.
A discussão clínica com outros profissionais que acompanham
o caso também faz parte da postura ética. Considerar o sujeito multifa-
cetado, como nos afirma Moraes e Macedo (2018), é respeitar não só
a singularidade, mas a compreensão desse sujeito como um todo. A
discussão clínica multiprofissional é a forma de respeitar esse aspecto
do tratamento e do próprio sujeito. É importante ressaltar a importância
do sigilo, mesmo na discussão com outras áreas, dividindo com outros
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profissionais aquilo que é relevante para o tratamento daquela pessoa.


Relatos íntimos, que vão surgir frequentemente no discurso do indiví-
duo, muitas vezes são importantes para o tratamento psíquico, mas não
são relevantes para a discussão multiprofissional. Estar atento ao res-
peito do sigilo é um dever ético do profissional.
Vale a pena trazer para a discussão que, independente da
abordagem psicológica usada pelo profissional na direção do tratamen-
to, o respeito à singularidade, o sigilo, a discussão de casos e o cuidado
mental do profissional consigo mesmo são posturas éticas para além da
conceituação teórica.
A presença da psicanálise para a compreensão e mudança de
27
paradigma para o tratamento dos transtornos mentais foi fundamental
para a evolução do conhecimento nessa área. Os efeitos da concepção
sustentada por Freud, que dá valor à experiência singular do sujeito,
transformaram a forma de lidar e tratar as doenças mentais para além
da abordagem utilizada pelo profissional. Afinal, a psicanálise nasce an-
tes da psicologia e, é a partir dela, que surgem outras linhas teóricas e
métodos terapêuticos.
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28
QUESTÕES DE CONCURSOS
QUESTÃO 1
Ano: 2017 Banca: COMPERVE Órgão: UFRN Prova: Psicólogo Clínico
O psicodiagnóstico inspirado na compreensão fenomenológica
propõe uma prática diagnóstica que se afaste de uma patologi-
zação dos modos de existir. Nessa perspectiva, define-se a com-
preensão diagnóstica como:
a) um processo de acompanhar o modo como a pessoa constrói signi-
ficados de existência.
b) um procedimento de descrição de sintomas para categorizá-los.
c) um instrumento para distinguir saúde e doença como condições
opostas.
d) uma prática que deve buscar os aspectos coerentes e estáveis da
personalidade.

QUESTÃO 2
Ano: 2019 Banca: IBADE Órgão: Prefeitura de Vilhena - RO Prova:
Psicopedagogo
A avaliação psicopedagógica de uma criança ou adolescente com
TDAH pode sugerir:
I- intervenções durante a entrevista.
II- intervenções durante a entrevista, a partir do momento em que
já exista um vínculo entre terapeuta e a criança.
III- uso do método cognitivo.
IV- que profissional pode focalizar dificuldades específicas da
criança, em termos de habilidades sociais. Está (ão) correta(as),
apenas:
a) I.
b) III.
c) I e II.
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d) IV.
e) II, III e IV.

QUESTÃO 3
Ano: 2018 Banca: UFMT Órgão: Prefeitura de Várzea Grande - MT
Prova: Técnico de Desenvolvimento Econômico e Social - Psicólogo
Ao pensar-se a formação de um psicoterapeuta na atualidade, é
preciso considerar os novos paradigmas referentes às psicopato-
logias e às formas de cuidado, às relações terapêuticas e seus ob-
jetivos, entre outras variáveis. Especificamente quanto à formação
de um psicoterapeuta com ênfase nas Terapias Cognitivo-Compor-
29
tamentais (TCC), assinale a afirmativa INCORRETA.
a) No contato inicial é necessário estabelecer uma relação positiva de
colaboração, com a identificação de problemas emocionais, cognitivos
e comportamentais apresentados como motivos para a procura da psi-
coterapia.
b) É necessário organizar um procedimento de manutenção e especifi-
cação por meio de programas de manutenção, monitoramento, especi-
ficação e acompanhamento a curto, médio e longo prazo, pelo período
máximo de seis meses.
c) É possível realizar um diagnóstico psicopatológico, utilizando-se para
isso os manuais de classificação (DSM V e CID 10) e as delimitações ali
constantes para a identificação de transtornos mentais.
d) Realiza-se a análise funcional, observando-se os modos sincrônicos
e anacrônicos das inter-relações entre comportamento, emoção e cog-
nição, as relações interpessoais e sociais e sua importância na situação
apresentada.

QUESTÃO 4
Ano: 2016 Banca: CESPE/CEBRASPE Órgão: TCE-PA Prova: Audi-
tor de Controle Externo - Área Administrativa - Psicologia
No que se refere à avaliação psicológica e ao psicodiagnóstico,
julgue o item que se segue.
O processo psicodiagnóstico é um instrumento eficaz na avaliação
diagnóstica e prognóstica.
( ) Certo
( ) Errado.

QUESTÃO 5
Ano: 2018 Banca: AOCP Órgão: Prefeitura de São Luís - MA Prova:
Técnico de Nível Superior - Psicologia
A respeito do objetivo do profissional da psicologia que lida com
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psicopatologias, assinale a alternativa correta.


a) Observar, identificar e compreender os diversos elementos da doen-
ça mental.
b) Associar a doença mental a aspectos morais.
c) Estabelecer princípios filosóficos a serem seguidos pelo paciente
com transtorno mental.
d) Realizar tratamentos compulsórios.
e) Apenas diagnosticar a doença mental.

30
QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE

Descreva, com base no que foi estudado no capítulo 1, o processo de


evolução do conhecimento em psicopatologia e articule com a Luta An-
timanicomial nos dias de hoje.

TREINO INÉDITO

Sobre o normal e o patológico em Psicopatologia:


a) Existe uma única definição sobre o tema.
b) Trata-se de ignorar o sujeito multifacetado.
c) A complexidade do tema requer compreensão de diversos critérios,
exigindo postura crítica no diagnóstico.
d) Normalidade em saúde é a ausência de doença.
e) Não é necessário levar em consideração as diferentes áreas de saú-
de mental.

NA MÍDIA

CONVERSANDO COM FERREIRA GULLAR


Texto escrito pelo psicanalista e escritor Contardo Calligaris, em sua
coluna semanal na Folha de São Paulo, o qual também pode ser en-
contrado em seu livro “Todos os reis estão nus”, publicado em 2013. O
livro consiste na publicação de textos do autor escritos em sua coluna
ao longo dos anos.
O texto em questão foi escrito em 2009, mas, apesar do tempo, con-
tinua atual e vale a pena a leitura. Conversando com Ferreira Gullar
trata de uma análise e crítica referente ao processo histórico conheci-
do como Luta Antimanicomial. A maneira como Calligaris se posiciona
frente a esse tema, com sua visão psicanalítica, vai ao encontro do que
foi exposto neste capítulo, podendo vir a somar às questões colocadas
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

sobre o tema proposto. Calligaris também escreve de forma a convidar


o leitor a pensar, o que foi muito marcado na produção desse material,
uma vez que, estudar e trabalhar com pessoas que apresentam alguma
psicopatologia requer saber pensar, questionar e observar.

Fonte: Folha de São Paulo


Data: 23 de julho de 2009.
Acesse o link:
https://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2307200922.htm
Acesso em 23.09.2020

31
NA PRÁTICA

Deparar-se com a psicopatologia em diferentes áreas de atuação é um


fato. Compreender a complexidade do tema é primordial para quem tra-
balha com a saúde mental. Hospitais gerais é uma possibilidade comum
do profissional se deparar com casos e pacientes com alguma doença
mental, uma vez que a luta antimanicomial propiciou a inserção na so-
ciedade da pessoa com transtorno mental. Se essa pessoa precisar de
uma internação hospitalar, o psicólogo ou o médico, muito comumente,
encontrará o ‘louco’ no leito do hospital.
A complexidade do normal e do patológico, a exclusão, o preconceito ou
a dificuldade no manejo desses pacientes, muitas vezes se escancara-
rá. Os psicólogos hospitalares podem se deparar com muitas situações
como essas. Segue abaixo o exemplo de uma situação clínica que uma
psicóloga acompanhou durante sua prática no hospital.
Na enfermaria do hospital geral foi internada uma mulher, de aproxi-
madamente 45 anos, por tentativa de suicídio. A paciente fez ingestão
de soda cáustica, o que impossibilitava o uso oral de medicamentos e
sua alimentação teve que ser realizada por outras vias. Como não era
possível o uso de medicação, a equipe médica não pôde entrar com
psicotrópicos, como antidepressivo. Foram realizadas injeções quando
houvesse alguma agitação psicomotora ou algum sintoma “anormal”.
Essas injeções foram feitas de forma excessiva, ocasionando um agra-
vamento do quadro clínico da paciente. Foi possível observar a dificul-
dade da equipe em lidar com um caso que era uma tentativa de suicídio.
A equipe se mostrou mobilizada ao se deparar com alguém que tinha
tentado se matar, desconsiderando o sofrimento psíquico intenso da-
quela pessoa. Frase como: ‘mas ela queria morrer mesmo’ era comum
de se ouvir. Coube ao profissional da saúde mental manejar, entre pa-
ciente e equipe, a situação. Muitas vezes, a equipe de saúde que cuida
do paciente terá dificuldades em lidar com um caso de transtorno men-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

tal, seja pela falta de capacitação, seja pelos resquícios que a história
da loucura tem atualmente. Nesse caso, coube ao psicólogo hospita-
lar oferecer atendimento e escuta ao sofrimento da paciente. Mas não
bastou o atendimento somente à paciente, foi preciso o manejo com a
equipe, que muitas vezes apresenta dificuldades em lidar com situa-
ções e sofrimentos extremos desse tipo, podendo estar carregada de
preconceitos e de uma visão não singular à experiência do sujeito. A
partir desse exemplo clínico é possível pensar nos critérios de normal
e patológico, singularidade, sofrimento intenso, diagnóstico, compreen-
são do caso específico para direção e condução do tratamento.

32
PARA SABER MAIS

Texto sobre assunto estudado: A luta Antimanicomial e a Reforma


Psiquiátrica de Rafael Polakiewicz.
Acesse o link: https://pebmed.com.br/a-luta-antimanicomial-e-a-refor-
ma-psiquiatrica/
Acesso em 23.09.2020

Vídeo no Youtube da Casa do Saber: Questões entre a Psicanálise e


o DSM (Christian Dunker).
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=WP4pdaC1PYk
Acesso em: 23.09.2020

PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

33
A AVALIAÇÃO
PSICOPATOLÓGICA

O EXAME PSÍQUICO E A SÚMULA PSICOPATOLÓGICA

A avaliação psicopatológica do paciente consiste na realização


PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

do exame psíquico e de entrevistas, com o objetivo de obter melhor


compreensão sobre o sujeito avaliado, através de outros aspectos da
vida dele para além do exame psíquico. Muitas vezes, entrevistar a fa-
mília também favorece muito esse processo de avaliação. As entrevis-
tas são tão importantes quanto o exame psíquico para o diagnóstico e
direção do tratamento.
Não existe um número fechado de entrevistas a serem reali-
zadas nesse processo. Como foi muito discutido no capítulo anterior,
aqui rege a máxima da singularidade, no caso a caso. Uma avaliação
psicopatológica consiste, portanto, na soma das entrevistas e no exame
psíquico do paciente, sendo que não há um número determinado de
34
entrevistas e, muito possivelmente, familiares também serão entrevista-
dos. As entrevistas são também chamadas de anamnese: ...“o histórico
dos sinais e dos sintomas que o paciente apresenta ao longo de sua
vida, seus antecedentes pessoais e familiares, assim como de sua fa-
mília e meio social” (DALGALARRONDO, 2008, p. 61).
Afinal, o que é o exame psíquico? Ele consiste na avaliação ou
exame do estado mental. Avaliar o psiquismo humano é avaliar o que se
denomina de funções psíquicas. Apesar de funcionarem conjuntamen-
te, elas são descritas de forma independente.
Dalgalarrondo (2008) nos alerta sobre o cuidado que se deve
ter na realização do exame psíquico. O autor afirma que a avaliação
separada das funções psíquicas é um procedimento artificial. Apesar
da utilidade dessa estratégia de avaliação, pois favorece o estudo mais
aprofundado, é também complicada e arriscada, pois muitas vezes leva
a acreditar no funcionamento independente das funções psíquicas, sim-
plificando o funcionamento delas.
O profissional deve, portanto, ter cuidado ao realizar o exa-
me do estado mental do sujeito, não deixando que a rotina da prática
clínica simplifique o trabalho realizado. Podemos, então, retomar aqui
uma questão importante do capítulo 1, que é a complexidade da psi-
copatologia. O autor citado insiste, deixando muito bem marcado, que
as funções psíquicas não funcionam de forma isolada e que a pessoa,
quando adoece, adoece em sua totalidade. Considerar as alterações
das funções isoladamente consiste no objeto da neurologia, da neurop-
sicologia ou da neurofisiologia, e não da psicopatologia.

“Não existem funções psíquicas isoladas e alterações psicopa-


PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

tológicas (grifos meus) compartimentalizadas desta ou daquela função.


É sempre a pessoa na sua totalidade que adoece” (DALGALARRON-
DO, 2008 p. 85).

Funções Psíquicas
Vamos agora nos debruçar sobre quais são as funções psíqui-
cas presentes em todo e qualquer indivíduo.
Consciência: avaliar o nível de consciência, ou seja, do quanto
desperto e funcionante está o nível de consciência do paciente. É muito
35
comum o uso do termo rebaixamento de consciência, quando o paciente
se encontra confuso. Há diferentes graus de consciência, podendo variar
entre alerta, vígil, sonolência (oscila entre estar dormindo ou acorda-
do), torpor (acorda com dificuldade), estupor (paciente acorda frente a
estímulos vigorosos) e coma (não acorda), sendo esse o maior grau de
rebaixamento de consciência. Avaliar essa função psíquica já dá alguns
sinais se as demais funções estarão alteradas. Observar alguma alte-
ração na consciência, muito provavelmente será encontrado alterações
em outras. Além das alterações quantitativas, é necessária a avaliação
de alterações qualitativas da consciência. Dalgalarrondo (2008) apre-
senta diferentes alterações qualitativas da consciência. São elas:
• Estados crepusculares: estado patológico transitório. Ob-
serva-se, nesse caso, um estado de obnubilação (que é um rebaixamen-
to em grau leve) acompanhada de uma certa conservação da atividade
motora coordenada. Esse estado é caracterizado pelo aparecimento e
desaparecimento abrupto do rebaixamento de consciência, com dura-
ção variável. Podem ocorrer atos explosivos, violentos e descontroles
emocionais. Dependendo da área de atuação em saúde mental, pode
haver implicações legais (psicologia/psiquiatria forense, por exemplo).
Primeiramente, esses episódios foram relacionados à epilepsia. São ob-
servados também em situações como intoxicação por álcool ou outras
substâncias, em quadros dissociativos histéricos agudos, após a ocor-
rência de um traumatismo craniano; após choques emocionais intensos
também pode ser observado esse quadro de alteração da consciência.
• Estado segundo: estado patológico também transitório. As-
semelha-se ao estado crepuscular. Essa alteração de consciência é ca-
racterizada por uma atividade psicomotora coordenada, mas que é es-
tranha à personalidade do sujeito. A atividade psicomotora apresentada
não se integra à personalidade do sujeito que está acometido por essa
alteração de consciência. Geralmente, ocorre após choques emocionais
intensos. Os atos que ocorrem no estado segundo são caracterizados
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

como incongruentes e extravagantes. São atos que são contraditórios


com a educação, opiniões ou condutas habituais da pessoa acometida.
Não costumam ser graves ou perigosos.
• Dissociação da consciência: caracterizada pela fragmen-
tação da consciência, levando à perda da unidade psíquica. É muito
comum ocorrer nos quadros histéricos, comumente conhecida como
crise histérica dissociativa ou do tipo dissociativo. Observa-se uma dis-
sociação da consciência, estado semelhante ao sonho. Geralmente é
desencadeado após acontecimentos psicologicamente significativos,
sejam eles conscientes ou inconscientes, causando grande ansieda-
de ao paciente. São crises que, normalmente, têm duração de minutos
36
ou horas. Esse tipo de alteração da consciência pode ocorrer também
em situações de ansiedade intensa, mesmo não se tratando de perso-
nalidade ou traço histérico. Nesse caso, a dissociação funciona como
uma estratégia defensiva, como um mecanismo de defesa inconsciente,
como forma possível de lidar com a ansiedade e o sofrimento. O sujeito
se desliga da realidade para parar de sofrer.
• Transe: é considerado um estado de dissociação da consciên-
cia, parecido a um sonhar acordado. Difere-se de um sonhar acordado,
pois há a presença de uma atividade motora automática e a suspensão
dos movimentos voluntários. Esse estado de dissociação costuma ocor-
rer em contextos religiosos e culturais. É importante diferenciar o transe
religioso (que é culturalmente contextualizado) do transe histérico. Este,
por sua vez, é considerado um estado dissociativo relacionado a con-
flitos interpessoais e alterações psicopatológicas. Essa é uma situação
relevante de ressaltar a importância da avaliação do sujeito como um
todo, inserido em seu contexto social, compreendendo não somente os
sintomas e funções psíquicas isoladamente.
• Estado hipnótico: estado de consciência semelhante ao
descrito anteriormente. É um estado de consciência que pode ser indu-
zido por outra pessoa. Nesse caso, a pessoa hipnotizada tem que estar
suscetível a isso, sua atenção fica concentrada na pessoa que está
hipnotizando. A hipnose é considerada uma técnica de concentração
de atenção. Quando a pessoa se encontra em estado hipnótico, ela
pode ser sugestionada a lembrar de fatos ou lembranças esquecidas e
pode ser induzida à anestesia, paralisia ou rigidez muscular. A hipnose
antecedeu a psicanálise. Freud fez uso dessa técnica para que pessoas
falassem sobre lembranças esquecidas, mas ela foi abandonada após
ele se dar conta daquilo que se denominou associação livre, única téc-
nica psicanalítica deixada pelo fundador da psicanálise.
• Experiência de quase morte: ocorre em situações críticas,
em que há ameaça da vida, como hipóxia grave, parada cardiorrespira-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

tória, isquemia, entre outras. É observada quando algum sobrevivente


de uma situação grave como essas citadas contam ter vivido uma ex-
periência de quase morte. São experiências rápidas, que duram de se-
gundos a minutos. Esse é considerado como um estado de consciência
particular.
Estudos mostram que as características que mais aparecem
desses estados são: sensação de paz, sensação de estar fora do cor-
po, de estar rodeado por uma luz intensa, de estar em ‘outro mundo’,
sensações de união cósmica, de compreensão imediata (NELSON et al,
2006, apud DALGALARRONDO,2008). Os conteúdos dessas experiên-
cias variam conforme as diferentes culturas.
37
Indicação de documentário: “Experiência de quase morte”.
Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=BR9uNvk3yjY>
Acesso em 01.10.2020

Frente ao que foi exposto acima, conclui-se que a avaliação


qualitativa da consciência é necessária na avaliação psicopatológica.

Quadro 3 – Semiotécnica da consciência - I


Lembrar que qualquer alteração do nível de consciência repercute no fun-
cionamento global do psiquismo. Ele deve ser avaliado em primeiro lugar.

Observar as fácies e a atitude do paciente e, se possível, notar se ele está


desperto ou sonolento.

Observar se o paciente está perplexo, com dificuldade de integrar coerente-


mente os estímulos ambientais.

Lembrar que é por meio da orientação (sobretudo têmporo-espacial) que,


muitas vezes, se avalia o nível de consciência.

Teste da parede ou do papel branco: pedir ao paciente que olhe atenta


e fixamente para uma parede branca (ou papel grande branco); o paciente
com leve rebaixamento do nível de consciência pode, ao fazer isso, apre-
sentar alucinações visuais simples ou complexas.
Fonte: DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos Transtor-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

nos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008

Indicação de Série Televisiva: Freud, criação de Marvin Kren,


Benjamin Hessler e Stefan Brunner. Disponível na Netflix

38
Atenção: é considerada uma função psíquica que está relacio-
nada à consciência. A atenção dirige a consciência; dá ao ser humano a
capacidade de selecionar, filtrar e organizar as informações.
Existem dois tipos básicos de atenção: 1) Atenção voluntária,
também chamada de atenção ativa, que consiste em concentrar a aten-
ção a determinada situação. Colocar a atenção de forma intencional
sobre um objeto. 2) Atenção involuntária ou espontânea, dirigida a um
foco que não é considerado principal. É um tipo de atenção que susci-
ta o interesse no momento sobre um determinado objeto ou situação.
Normalmente, a atenção involuntária é aumentada nos indivíduos que
têm pouco controle sobre sua atividade mental. A concentração está
muito ligada à atenção, refletindo na capacidade de manter a atenção
voluntária.
Orientação: é a capacidade do sujeito em referir, precisamen-
te, sobre o tempo, o espaço, as pessoas e sobre si mesmo no momento
da avaliação. É importante que se avalie a orientação temporal, que
se dá pela capacidade da pessoa avaliada em responder o dia, a hora
e ano. A orientação espacial é a capacidade de a pessoa responder o
local em que ela está no momento, bem como o local onde mora, como
cidade, país, rua. Por fim, a orientação sobre si, ou autopsíquica, é a
capacidade de dizer sobre si mesma, como nome, profissão, sua iden-
tidade.
Dalgalarrondo (2008) afirma que a pessoa que tem a capaci-
dade de orientação do espaço que está inserida ou sobre si mesma é
um elemento básico sobre a atividade mental. Avaliar a orientação é um
instrumento extremamente importante para verificar as perturbações do
nível de consciência. As alterações dessa função psíquica podem tam-
bém estar relacionadas a problemas de memória.
Mais uma vez, é possível ir se aproximando da complexidade
do tema estudado e do quanto cada uma das funções psíquicas estão
ligadas entre si, não sendo possível funcionarem isoladamente no ser
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humano.
Memória: é a capacidade do sujeito em registrar, manter e evo-
car situações, fatos ou experiências que já ocorreram. Essa capacidade
está relacionada a outras funções, como consciência, atenção e afeto. A
relação com o afeto abre espaço para se pensar sobre a singularidade,
em que as pessoas memorizam (ou não) situações ou vivências que
tenham interesse afetivo. A aprendizagem está intimamente ligada à
capacidade de memorização de uma pessoa. Pode-se falar em diferen-
tes tipos de memórias, como memória cognitiva, genética, imunológica
e coletiva/cultural. Outra forma de avaliação da memória, é a partir da
memória de longa e de curta duração.
39
Pensamento: o pensamento é avaliado a partir do discurso do
paciente. É importante a atenção do profissional ao que o paciente está
contando. Deixar o paciente falar, escutando-o, é a principal forma de
avaliar o pensamento. O pensamento deve ser avaliado quanto à sua
forma, o seu curso e o seu conteúdo.
A forma do pensamento é avaliada a partir da maneira como as
ideias são encadeadas. É a estrutura básica do pensamento. O curso é
a maneira como flui o pensamento, sua velocidade e ritmo. Eles podem
ser lentificados ou acelerados, a depender do transtorno mental com o
qual o paciente é diagnosticado.
Entende-se por conteúdo do pensamento aquilo que dá subs-
tância. Não é nada além do tema, o assunto que o sujeito traz em seu
discurso.
Sensopercepção: para se compreender o conceito de senso-
percepção, é importante que se entenda o que são sensação e percep-
ção. A sensação é considerada um fenômeno passivo. Ela é gerada a
partir de estímulos físicos, biológicos ou físicos e pode se originar tanto
fora como dentro do organismo. Esses fenômenos irão produzir alguma
alteração nos órgãos receptores. Já a percepção é um fenômeno ativo.
É o momento em que se percebe a sensação recebida do estímulo.
Como se fosse o momento em que o sujeito toma consciência do estí-
mulo sensorial.
Existem alterações quantitativas e qualitativas. Para a psico-
patologia, o mais importante para o diagnóstico é compreender as al-
terações qualitativas. São elas: ilusões, alucinações, alucinose e pseu-
doalucinações.
Inteligência: existe uma grande dificuldade na definição de in-
teligência. Apesar de ser um conceito fundamental, não há um modo
definitivo em conceituá-la. De maneira ampla, é definida como as ha-
bilidades cognitivas do indivíduo, bem como a capacidade em resolver
e identificar novos problemas e encontrar as melhores soluções para si
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ou para o mundo/ambiente. Na avaliação psicopatológica não há uma


forma estruturada para se avaliar, ela costuma ser avaliada ao longo de
todo curso da entrevista e do exame psíquico. É preciso observar ao
longo do discurso habilidades como raciocínio, planejamento, resolução
de problemas e compreensão de ideias complexas.
Linguagem: a linguagem é uma especificidade do humano,
sendo ela o principal meio de comunicação. Ela é fundamental para a
elaboração e expressão do pensamento. A linguagem é uma criação
social e, devido a essa grande flexibilidade em sua produção, torna-
-se bastante complicado definir o que é patológico ou não a partir da
avaliação da linguagem. Dentre as possíveis alterações linguísticas, o
40
profissional poderá se deparar com as afasias (perda da linguagem,
falada ou escrita), agrafia (perda da linguagem escrita, devido a uma
perda orgânica), alexia (perda da capacidade de leitura, de origem neu-
rológica), parafasias (deformações de determinadas palavras), disartria
(incapacidade de articular corretamente as palavras, de origem neuro-
lógica), disfonia e disfemia, dislalia.
Algumas alterações de linguagem estão associadas a trans-
tornos psiquiátricos primários, são eles: logorréia, taquifasia e loquaci-
dade; bradifasia; mutismo; ecolalia; palilalia e logoclonia; tiques verbais
ou fonéticos e coprolalia; glossolalia. Na esquizofrenia, que é um trans-
torno mental psicótico, pode haver alterações na linguagem muito pe-
culiares. Essas alterações costumam ocorrer em doentes muito graves.
Afeto: é a manifestação da resposta emocional de alguém.
Avaliar o afeto, ou a maneira como a pessoa responde emocionalmente
a uma situação ou a alguém, são aspectos muito importantes na ava-
liação psicopatológica. É considerado um termo genérico, compreen-
dendo diferentes modalidades de vivência afetiva, tal como o humor,
as emoções e os sentimentos. É uma função psíquica muito ligada às
vivências singulares e intimamente relacionadas à subjetividade. Com-
preender e se aprofundar na complexidade da afetividade e suas altera-
ções são atitudes primordiais para o diagnóstico psicopatológico.
Vontade: considerada uma dimensão complexa da vida mental
do ser humano, está atrelada às esferas instintiva, intelectiva e afetiva.
Para alguns autores, a vontade está relacionada ao desejo (consciente
ou inconsciente). Tem um viés bastante singular e se relaciona também
a princípios, valores e hábitos culturais e sociais do sujeito. Frequente-
mente, comportamentos volitivos se conflitam com valores morais da
sociedade, podendo causar uma série de conflitos emocionais. De uma
forma mais simplista, pode-se dizer que a vontade é o empenho ou a
intenção de uma pessoa direcionada a seu objetivo, impulsionada por
uma motivação.
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Juízo: “...alterações de juízo da realidade são alterações de


pensamento” (DALGALARRONDO, 2008, p. 206). Ajuízar, segundo o
autor citado, é produzir juízos. Não há como produzir juízo sem que
haja julgamentos. Julgamentos são, por um lado, individuais, subjeti-
vos; e por outro, sociais, isto é, construídos culturalmente. Juízos falsos
podem, ou não, ser psicopatológicos. A principal alteração do juízo é o
delírio. Jaspers (1979) apud Dalgalarrondo (2008) afirma que os delírios
são considerados juízos patologicamente falsos. Sendo assim, a ideia
delirante é um erro do ajuizar que tem como base a doença mental.
A compreensão mais detalhada sobre essa função psíquica oferecerá
mais dados para escuta e diagnóstico de pessoas que apresentam uma
41
estrutura psicótica.
Psicomotricidade: é a exteriorização comportamental motora
dos estados psíquicos. A agitação psicomotora é uma das alterações
em psicomotricidade mais comuns. Ela é caracterizada pela acelera-
ção e exaltação de toda atividade motora do sujeito. É considerada um
sinal psicopatológico bastante frequente. É muito comum encontrar pa-
cientes com agitação psicomotora em hospitais, em especial nos servi-
ços de emergência, como o pronto-socorro. É uma reação comumente
encontrada e associada a episódios de mania, esquizofrenia, quadros
agudos como intoxicação com substâncias ou síndromes de abstinên-
cia. Existe também o quadro contrário, denominado lentificação psico-
motora, que nada mais é que a lentificação de toda atividade psíquica,
refletindo na movimentação voluntária mais lenta do sujeito. Há uma
série de importantes alterações psicomotoras observadas em quadros
psicopatológicos, como as mencionadas acima. Mas, há dois bastante
comuns na área, sendo importante a menção.
A conversão consiste no surgimento abrupto de sintomas físi-
cos (paralisia, cegueira, parestesias). Os sintomas de conversão costu-
mam acontecer em situação estressante, como de ameaça ou conflito
intrapsíquico.

Segundo a teoria psicanalítica, a conversão expressa a representação sim-


bólica de um conflito psíquico em termos de manifestações motoras (ou sen-
soriais). A conversão ocorre sobretudo na histeria e no transtorno da perso-
nalidade histriônica (DALGALARRONDO, 2008, p. 186).

O maneirismo é uma alteração psicomotora que tem como ca-


racterística a repetição de movimentos bizarros que buscam certo obje-
tivo. Costuma ocorrer na esquizofrenia catatônica, em formas graves de
histeria e na deficiência mental.
Antes da avaliação psicopatológica, é necessário que o indi-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

víduo passe por outras avaliações de seus sintomas, como avaliação


clínica e neurológica. Chamamos de diagnóstico diferencial. Há muitos
sintomas que podem se assemelhar a um transtorno mental, mas sua
etiologia pode ser clínica ou neurológica. Realizar um diagnóstico dife-
rencial é considerar outras áreas antes da avaliação em psicopatologia.
Refere-se a diferenciar o que é orgânico do que é psíquico. Ter a capa-
cidade de trabalhar em conjunto com outras áreas da saúde, encami-
nhando ou solicitando avaliações, é um diferencial em psicopatologia. A
linguagem, como visto acima, é um exemplo de que muitas alterações
podem ser biológicas/neurológicas.
Segue abaixo uma tabela com o objetivo de apresentar, de
42
forma resumida, para que o leitor possa ter um resumo visual das al-
terações comuns em um exame psíquico. Nessa tabela, observa-se
que o autor apresenta alterações que indicam disfunções clínicas, não
somente psicopatológicas, mostrando a importância dessas distinções
para a realização do diagnóstico diferencial.

Quadro 4: Alterações Comuns de exame psíquico

Fonte: BARROS, D.M.de. Entrevista psiquiátrica e Exame Psíquico, 2008.


PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

Antes da avaliação psicopatológica, é necessário que o indi-


víduo passe por outras avaliações de seus sintomas, como avaliação
clínica e neurológica. Chamamos de diagnóstico diferencial. Há muitos
sintomas que podem se assemelhar a um transtorno mental, mas sua
etiologia pode ser clínica ou neurológica. Realizar um diagnóstico dife-
rencial é considerar outras áreas antes da avaliação em psicopatologia.
Refere-se a diferenciar o que é orgânico do que é psíquico.
43
Abaixo, segue um modelo de protocolo de avaliação do exa-
me psíquico em casos de primeiro episódio psicótico. Esse protocolo
foi elaborado pela equipe médica psiquiátrica do Hospital das Clínicas
da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São
Paulo. A figura apresentada serve como base para reflexão e discussão
acerca das possibilidades de realizar um exame psíquico.
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44
Figura 3: Protocolo de avaliação de primeiro episódio psicótico

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Fonte: DEL-BEN ET AL, 2010

45
Figura 4: Protocolo de avaliação de primeiro episódio psicótico
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

Fonte: DEL-BEN ET AL, 2010

46
SEMIOLOGIA E PSICOPATOLOGIA

A semiologia é a base, o pilar fundamental da atividade médica. Saber ob-


servar com cuidado, olhar e enxergar, ouvir e interpretar o que se diz, saber
pensar, desenvolver um raciocínio clínico crítico e acurado são as capacida-
des essenciais do profissional de saúde (DALGALARRONDO, 2008, p. 13)

A semiologia, de uma forma geral, é entendida como a ciên-


cia dos signos. Essa conceituação é para além da medicina ou
psicopatologia. A semiologia é compreendida como a ciência dos signos
em diferentes áreas de atuação, como por exemplo a música (semio-
logia musical) ou nas artes. É um campo de conhecimento para toda e
qualquer área humana em que ocorra a comunicação ou interação entre
duas pessoas em que essa comunicação se dê através de signos.
Particularmente, em psicopatologia, a semiologia é a área de
conhecimento e do estudo sobre os sintomas e sinais (os signos) das
doenças mentais. É exatamente por isso que é necessário iniciar esse
tópico com a citação de Paulo Dalgalarrondo, em que ele marca a se-
miologia como a base fundamental da psicopatologia, insistindo na im-
portância da observação, no saber pensar, na capacidade de raciocínio
clínico crítico entre outras características fundamentais no profissional
da saúde mental. Esse ponto faz com que retomemos muito do que foi
trabalhado no capítulo 1, lembram?
Apesar de haver grande proximidade com a linguística, os sig-
nos não se limitam à linguagem, existem os gestos, comportamentos
não verbais, os signos matemáticos e musicais. Todos eles são formas
de comunicação e/ou interação entre dois interlocutores.
O signo é como um sinal. Ele é considerado o elemento nu-
clear na semiologia e este sinal terá sempre um significado. Em psico-
patologia são tratados os signos (ou sinais) que indicam a existência de
um sofrimento psíquico, um transtorno mental ou psicopatológico. Se-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

gundo Dalgalarrondo (2008), os sinais comportamentais e os sintomas


são de maior interesse em psicopatologia. O primeiro é percebido atra-
vés da observação direta ao paciente, enquanto o segundo é verificável
através da fala do paciente, aquilo que ele relata, como suas queixas,
narrativas, ou seja, a vivência subjetiva dele.
Diante do que foi exposto até aqui, percebe-se que não há
como separar a semiologia da avaliação psicopatológica. Compreender
a base, que é a semiologia, como a importância dos sinais de um trans-
torno mental, seja ele a partir do comportamento observável seja pela
subjetividade relatada nas entrevistas do paciente, sustenta a possibili-
dade da realização da avaliação. É possível, então, ir costurando tudo
47
o que foi apresentado até aqui. A complexidade do tema e que, apesar
das separações didáticas para realizar o ensino em psicopatologia, são
matérias dentro da disciplina que, na prática, não há como separar, pois,
andam juntas. Entender que o sintoma é um sinal, um signo daquilo que
o paciente está mostrando e de que ele está carregado de significado
e vivências pessoais e singulares, favorece a escuta, a observação, a
avaliação clínica crítica do profissional. É um “ir e vir” nos diferentes
temas tratados separadamente, mas que, na prática clínica, não são.
Em Dalgalarrondo (2008), é apresentada uma divisão na se-
miologia, de forma bastante didática, que favorece a compreensão do
profissional acerca da semiologia como o “pilar fundamental” (p. 13)
da psicopatologia. Segundo ele, há duas grandes áreas na semiologia:
semiotécnica e semiogênese.
• Semiotécnica: compreende as técnicas ou procedimentos es-
pecíficos de observação e para coletar os sinais e sintomas. No caso da
psicopatologia, estamos falando das entrevistas, seja com o próprio pa-
ciente, seja com familiares ou pessoas que convivem com ele. É funda-
mental que, durante a entrevista, o profissional esteja atento, de forma
minuciosa, ao comportamento do paciente, ao conteúdo do discurso ou
à sua maneira de falar, bem como o que está vestindo ou como reage
ou se relaciona com as pessoas à sua volta.
• Semiogênese: é entendido como o campo de investigação.
Investigação de que? Da origem, dos mecanismos, do valor diagnóstico
e clínico dos comportamentos e sintomas.

A PSICOPATOLOGIA FENOMENOLÓGICA E A PSICOPATOLOGIA


EXISTENCIAL

Existem diversas abordagens teóricas que buscam explicar os


transtornos mentais e as psicopatologias. Há muitas críticas devido a
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

essa multiplicidade teórica, muitas vezes, sendo colocada como uma


área de debilidade científica. A diversidade parece incomodar a ciência,
como se tivesse que ter uma explicação e uma verdade única de um
determinado fenômeno. Ao levar-se em consideração a complexidade
da psicopatologia, parece muito mais interessante a diversidade das ex-
plicações e teorias, que abrem espaço para melhor compreensão dessa
área multifacetada. Dalgalarrondo (2008) descreve como “simplista” e
“artificial” (p.35) uma única explicação e concepção teórica sobre um
tema como da psicopatologia.

48
Aqui o conflito de ideias não é uma debilidade, mas uma necessidade. Não
se avança em psicopatologia negando e anulando diferenças conceituais e
teóricas; evolui-se, sim, pelo esforço de esclarecimento e aprofundamento
de tais diferenças, em discussão aberta, desmistificante e honesta (DALGA-
LARRONDO, 2008, p. 35)

Mediante a diversidade teórica, será apresentado aqui um pou-


co mais sobre a psicopatologia fenomenológica-existencial. Entende-se
a psicopatologia fenomenológica-existencial como uma das concep-
ções teóricas que buscam compreender e tratar os transtornos mentais
e psicopatológicos a partir de uma determinada visão de homem, em
que o sujeito é constituído a partir de sua experiência particular. Nessa
abordagem, o doente é visto como uma existência singular e a doença
mental não é vista somente como uma disfunção biológica ou psicológi-
ca, mas como um modo particular de existência, como uma maneira trá-
gica de ser e estar no mundo, uma forma dolorosa de ser com os outros.
A psicopatologia fenomenológica-existencial se fundamenta a
partir de obras filosóficas de Kierkegaard (1813-1855), Nietzsche (1844-
1900), Heidegger (1899-1976) e Sartre (1905-1980). Segundo Teixeira
(1997), essa abordagem em psicopatologia não se constitui a partir de
uma visão unificada, incluindo vários pontos de vista. Ela se baseia na
busca do significado da existência. A singularidade de cada caso parece
ser um dos principais valores dessa abordagem teórica.
Segundo Tatossian (2006) apud Karwowski (2015), a psicopa-
tologia fenomenológica é compreendida como uma releitura dos fenô-
menos e processos psiquiátricos, beneficiando-se a sincronia que ocorre
entre o desvendar das estruturas da existência e o movimento engajado
da fenomenologia. Nessa abordagem não há uma interposição teórica
ou de um saber que predetermina uma experiência. Essa concepção
implica a valorização do caráter imediato da experiência do sujeito que
está doente. Ao examinar a relação do homem com seu mundo, no
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caso em psicopatologia, do ser humano com um transtorno mental, o


que interessa é o que se revela de humano, e não a objetividade de sua
condição.
A abordagem fenomenológica-existencial se apresenta como
uma das diversas possibilidades em se trabalhar em psicopatologia, so-
mando-se à busca pela compreensão dos transtornos mentais, a qual,
como vimos no capítulo anterior, faz parte de um processo histórico e de
evolução do conhecimento psicopatológico.
A valorização pela experiência singular do sujeito, não se pren-
dendo a verdades absolutas de explicações biológicas sobre os trans-
tornos mentais, é o que marca essa abordagem. A teoria fenomenoló-
49
gica-existencial fundamenta os estudos teóricos e é uma possibilidade
de tratamento, a partir da psicoterapia com a mesma fundamentação.

A psicopatologia é, por natureza e destino histórico, um campo


de conhecimento que requer debate constante e aprofundado. Aqui o
conflito de ideias não é uma debilidade, mas uma necessidade. Não se
avança em psicopatologia negando e anulando diferenças conceituais
e teóricas; evolui-se, sim, pelo esforço de esclarecimento e aprofunda-
mento de tais diferenças, em discussão aberta, desmistificante e ho-
nesta. (DALGALARRONDO, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos
Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 2008, p. 35).


PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

50
QUESTÕES DE CONCURSOS
QUESTÃO 1
Ano: 2016 Banca: FUNIVERSA Órgão: IF-AP Prova: Psicólogo
A respeito das psicopatologias e dos transtornos mentais, assinale
a alternativa correta.
a) Os principais sintomas relacionados à depressão são os sentimentos
de inadequação, melancolia e ansiedade.
b) Sem o psicodiagnóstico precoce, o tratamento dos Dorts e da depres-
são vinculada ao trabalho é ineficaz.
c) A entrevista psicológica é um importante instrumento nos processos
de diagnóstico de transtornos mentais. Por essa razão, é importante
o psicólogo conhecer diferentes técnicas e adotar uma abordagem de
teoria de personalidade para interpretação dos dados.
d) O psicólogo deve realizar dinâmicas de grupo com a equipe de saúde
para melhorar as relações interpessoais e o desempenho.
e) A intervenção psicológica é imprescindível para tratamento de doen-
ças como alcoolismo, depressão, estresse e Dorts.

QUESTÃO 2
Ano: 2018 Banca: AOCP Órgão: FUNPAPA Prova: Psicólogo
No campo das psicopatologias, os transtornos da personalidade
recebem atenção crescente. Acerca do Transtorno da Personalida-
de Borderline, identifique, nas seguintes alternativas, um sintoma
característico e muito comum em pacientes que apresentam o qua-
dro Borderline.
a) Obsessões.
b) Repressões.
c) Automutilações.
d) Dissociações.
e) Alucinações.
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QUESTÃO 3
Ano: 2017 Banca: VUNESP Órgão: Prefeitura de Marília - SP Prova:
Psicólogo
Uma psicóloga recebe uma mãe aflita com o recente hábito de ar-
rancar os próprios cabelos desenvolvido por seu filho de 10 anos
de idade. A mãe relata que isso vem ocorrendo há cerca de um
mês, e que o garoto tem se mostrado envergonhado com isso.
Considerando esses dados para o diagnóstico, a psicóloga deve
considerar que:
a) o caso atende aos critérios de transtorno de personalidade compulsiva.
51
b) essa conduta é um dos primeiros sintomas de autismo.
c) arrancar os cabelos costuma ser um comportamento associado a
desequilíbrio hormonal.
d) sentimentos de despersonalização tendem a provocar esse compor-
tamento.
e) esse comportamento pode ser um hábito temporário na infância.

QUESTÃO 4
Ano: 2016 Banca: Gestão Concurso Órgão: Consurge - MG Prova:
Psicólogo
O psicodiagnóstico é um processo desencadeado, muitas vezes,
através de um encaminhamento, que tem início numa consulta, na
qual se delineiam os passos do exame.
Considerando os cuidados nesse processo, analise as afirmativas
a seguir e assinale V para as verdadeiras e F para as falsas.
( ) O psicólogo deve pesquisar e avaliar as circunstâncias que pre-
cederam a consulta e a possível existência de um problema prévio
para chegar ao diagnóstico.
( ) Quando da consulta de um paciente acompanhado de seu grupo
familiar, cabe ao psicólogo ouvir as queixas desse grupo, sem se
preocupar com quem é o paciente.
( ) Os transtornos psiquiátricos podem ser identificados pelos si-
nais apresentados pelo paciente e pelo histórico relatado por sua
família, sem um exame mais profundo.
( ) Um problema pode ser identificado quando são reconhecidas as
alterações ou mudanças nos padrões de comportamento comum,
que podem ser percebidas, sendo de natureza quantitativa ou qua-
litativa.
( ) A entrevista clínica é um conjunto de técnicas de investigação,
de tempo delimitado, com objetivo de descrever e avaliar aspectos
pessoais, relacionais ou sistêmicos de indivíduos, casal, família.
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Assinale a sequência CORRETA.


a) F F V F F
b) V V F F V
c) F V V F V
d) V F F V V

QUESTÃO 5
Ano: 2016 Banca: Gestão Concurso Órgão: Consurge - MG Prova:
Psicólogo
Segundo Dalgalarrondo (2008), os critérios de normalidade e doen-
ça em psicopatologia variam consideravelmente em função dos fe-
52
nômenos específicos com os quais se trabalha.
No que se refere à prática clínica do psicólogo, é CORRETO afirmar:
a) O profissional deve ter a capacidade de discriminar, no processo de
avaliação psicodiagnóstica, se o fenômeno apresentado pelo paciente
é normal ou patológico, isto é, se é parte de um momento existencial ou
é patológico.
b) O profissional deve se basear no conceito de normalidade apoia-
do em critérios socialmente construídos e referendados, com base na
adaptação do indivíduo às normas e políticas vigentes numa dada so-
ciedade. O que foge a essas normas é considerado patológico.
c) O profissional deve ter a capacidade de fazer um exame clínico utili-
zando testes de personalidade que identifiquem potenciais transtornos
psiquiátricos.
d) O profissional deve observar o que o paciente relata sobre os seus
sintomas. A verificação de ausência de sintomas significa normalidade,
que pode ser concebida como a saúde no silêncio dos órgãos.

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE

A partir do que foi exposto no capítulo 2, escreva sobre a avaliação psi-


copatológica e a semiologia em psicopatologia, relacionando-as.

TREINO INÉDITO

A avaliação psicopatológica consiste:


a) Na realização do exame psíquico.
b) Em exame psíquico e entrevista do paciente.
c) Em entrevistas dos familiares e exame psíquico do paciente.
d) Em entrevistas do paciente e de familiares e exame psíquico do pa-
ciente.
e) Na realização de uma entrevista com o paciente.
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NA MÍDIA

Trata-se de uma notícia sobre a Experiência de quase-morte (EQM) de


uma menina de 10 anos. Segundo essa notícia, as EQMs começaram a
ser estudadas há mais de 150 anos. A notícia trata de uma menina de
10 anos que reconhece o médico que a salvou e que relata o reconheci-
mento do médico a partir de sua experiência de quase-morte.

Fonte: Site Globo.com


Data: 16.09.2011
53
Leia a notícia na íntegra:
http://g1.globo.com/globo-reporter/noticia/2011/09/menina-ressuscita-
da-em-hospital-reconhece-medico-que-salvou.html
Acesso em: 01.10.2020

NA PRÁTICA

Será apresentado um texto sobre um caso clínico, o qual, apesar de


se mostrar propensão poética, é efeito e produção de um caso clínico
acompanhado.
“A PEQUENA FLOR SOBRE A MESA, NA SALA DE JANTAR”.
Guilherme Gutman
Pedro ficou muito preocupado com o que leu no diário do irmão. A pri-
meira coisa que chamou a sua atenção foi, em contraste com os rela-
tos bem escritos e perfeitamente concatenados com que habitualmente
Paulo preenchia as páginas de seu caderno de anotações, a presença
da “salada de palavras”, a má estruturação do texto e, principalmente, o
conteúdo que, seria difícil dizer do que se tratava, em termos de estilo,
pois seus escritos ficavam entre relatos de histórias, fragmentos de nar-
rativas vividas ou imaginadas, segmentos de pensamentos, fórmulas
matemáticas e citações de caráter místico-filosófico.
Pedro ficou ainda mais preocupado quando Paulo, ao despertar na cama
ao lado da sua, no quarto que dividem há 19 anos, perguntou a opinião do
irmão sobre o que achava do sonho que ele, Paulo, acabava de ter tido.
O diálogo prosseguiu assim:
— Como assim Paulo? Como Posso saber o que você sonhou?
Paulo parece não compreender a pergunta, olhando com incredulidade
e, é bem possível, com alguma desconfiança para o irmão.
Então, disse em tom mais firme:
— Você sabe Pedro! Há semanas você sabe o que tenho pensado e
sonhado.
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Ao que, desconcertado, Pedro retruca:


— Paulo, tudo isso é estranhíssimo! Está tudo bem?
Neste momento, o olhar de Paulo muda, e seu comportamento passa
a ser francamente hostil. Daquele tom ameno, ainda que algo ansioso,
que caracterizou o início do diálogo entre eles, ele desliza para uma
tonalidade desagradável do humor:
— Então você também faz parte daquela escumalha! Eu já devia saber!
Por isso a cama sempre forrada e o livro de biologia sempre aberto
sobre a mesa! Tudo muito claro agora, irmão, tendo sido esta última
palavra dita com sarcasmo e repetida, sem motivo aparente, algumas
vezes: “—irmão, irmão, irmão…”.
54
Paulo prosseguiu:
— Quando eu vi a pequena flor, sobre a mesa da sala de jantar, comecei
imediatamente a descobrir o que se passa no mundo.
Alguns meses depois, logo após a internação, Paulo ainda apresentava
parte dos sintomas que motivaram o início do tratamento psiquiátrico.
Dizia escutar vozes que comentavam as suas ações e que, eventual-
mente, lhe davam ordens.
Achava que, pelo fato de ter sido escolhido por Deus para divulgar “a
nova ordem”, era vítima de uma perseguição atroz, da qual fazia parte
manipulações de seu corpo e de suas ações, de modo que parte de
seus atos, ainda que realizados por ele, eram, por assim dizer, contra a
sua vontade.
Diante de toda essa nova experiência, passou a apresentar uma inquie-
tude – por exemplo, esfregando as mãos, levantando-se a todo momen-
to e caminhando pelo quarto, num vai e vem aflitivo de se assistir.
Além disso, considerava-se o “Profeta Ambrósio” (o que parecia justifi-
car a túnica que vestia, além de inúmeros terços de tamanhos e de ma-
teriais diferentes), embora soubesse fornecer adequadamente os seus
dados pessoais.
Prestava atenção no que lhe era falado e respondia adequadamente,
ainda que às vezes interrompesse subitamente o fluxo das ideias dizen-
do ter tido o pensamento “roubado”.
Interrompeu o curso universitário e passou a apresentar dificuldades na
gerência do dia a dia, ainda que tivesse muitos planos para os meses
seguintes.
Ficou especialmente irritado quando diziam que precisava tomar remédios.
— O único louco aqui em casa é o papai!
Disponível em:
https://psicopatologiapuc.wordpress.com/casos-clinicos/caso-2-2
Acesso em: 01.10.2020
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PARA SABER MAIS

Vídeo no YouTube do Canal Falando nisso: Afeto, emoção e senti-


mento em psicanálise, Christian Dunker
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=LNjcXFKGW_c&lis-
t=PLlHDVKUxuaFrxiBXW4jLfgCDTxg8VS8Mk&index=38
Acesso em: 01.10.2020
Vídeo no YouTube do Canal Concursos Psi: Exame Psíquico, Fabia-
na Kubiak
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=oazK9NHLlXo
Acesso em: 30.09.2020
55
A PSICOPATOLOGIA
NAS NEUROSES & NAS PSICOSES

SOBRE AS NEUROSES E PSICOSES


PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

Neurose: etiologia, definições, causas e abordagens


As neuroses são caracterizadas pelos conflitos e dificuldades
intrapsíquicos e interpessoais, que causam e mantêm o sofrimento do
sujeito. A angústia é o centro de todas as neuroses. O ser humano com
estrutura psíquica neurótica vive os conflitos humanos de forma parti-
cularmente dolorosa e recorrente. Os conflitos intrapsíquicos, caracte-
rísticos da neurose, inibem e perturbam as relações sociais. Há uma
perturbação no equilíbrio interior do sujeito neurótico (DALGALARRON-
DO, 2008).
É interessante notar que nos manuais classificatórios, especi-
ficamente no DSM, houve a retirada das síndromes neuróticas, sendo
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caracterizadas como transtornos mentais menores, porém, existem di-
versos e importantes transtornos neuróticos que causam intenso sofri-
mento psíquico. No manual CID-10, apesar de não ter sido abandona-
do, há uma crítica. Há uma certa desvalorização da neurose como um
quadro psicopatológico em comparação com vários transtornos graves,
como os psicóticos, o que parece ser um certo equívoco, visto que há
muito sofrimento no sujeito neurótico. Como dito anteriormente, além de
doloroso, é recorrente, tendo as relações sociais atravessadas por esse
sofrimento e funcionamento psíquico.
A neurose se dá a partir das relações inter e intrapessoais, pela
forma como cada sujeito lida com situações adversas no ambiente em
que está inserido. Os principais transtornos neuróticos serão abordados
mais adiante neste capítulo.
As principais abordagens psicológicas oferecem tratamento ao
sujeito neurótico, cada uma com sua visão de homem e de mundo para
o tratamento. São elas: as teorias cognitivas comportamentais (TCC).
A abordagem fenomenológica-existencial, ou conhecida também como
teorias humanistas na área da psicologia, tem como princípio funda-
mental o homem em sua totalidade, trabalhando o sujeito no aqui e ago-
ra. E a psicanálise, com todas as suas teorias e autores pós-freudianos
sustentando o trabalho a partir da escuta do inconsciente.

Indicação de literatura: YALOM, I.D. Quando Nietzsche


Chorou. Rio de Janeiro: Harper Collins, 2019.
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Psicose: etiologia, definições, causas e abordagens


A psicose é um transtorno mental que tem como mecanismo
específico característico dessa estrutura clínica a rejeição da realidade.
O sujeito rejeita a realidade em que está inserido, apresentando diver-
sos sintomas, sendo o delírio e a alucinação os mais comuns. Iremos
abordar mais adiante os principais transtornos psicóticos.
São apresentadas diversas teorias acerca da etiologia da psi-
cose. Há especialistas que apresentam algumas doenças psicóticas a
partir de explicações etiológicas genéticas, alterações cerebrais ou hor-
monais. Mas não há como descartar fatores ambientais, relacionais e
psíquicos que podem contribuir para o desencadeamento da psicose.
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Seríamos simplistas demais definir a psicose a partir de uma
única explicação, como a genética, por exemplo. Vimos ao longo deste
módulo, a complexidade das doenças e transtornos psicopatológicos. A
psicose é uma das mais comuns em psicopatologia. O abuso de subs-
tâncias, como álcool ou drogas, é considerado fatores de risco para o
desencadeamento desse transtorno mental. Levar em consideração os
mecanismos de defesa do sujeito, ou seja, a maneira como ele expe-
riencia determinada situação, também contribui para um possível de-
sencadeamento de uma psicose.
Dessa forma, retomamos mais uma vez, Paulo Dalgalarrondo,
que foi citado várias vezes ao longo deste módulo, a questão da sin-
gularidade no diagnóstico e tratamento em psicopatologia. A maneira
singular como cada indivíduo lida com situações da vida e com as ques-
tões emocionais também é importante para a possibilidade de desen-
volvimento da psicose. Na psicanálise, a estrutura psicótica é explicada
a partir do Complexo de Édipo. Assim, muitas pessoas têm uma estru-
tura psicótica, mas não apresentam sintomas, pois, possivelmente, não
vivenciaram alguma situação que pudesse ser um gatilho para desen-
cadear a psicose.
Existem diferentes abordagens psicológicas para a teorização
das psicoses e suas doenças. Foi falado no capítulo anterior sobre a
psicopatologia na abordagem fenomenológica-existencial, que sustenta
a psicose e outros transtornos mentais como uma maneira trágica de
estar no mundo e se relacionar com o outro. Segundo os teóricos feno-
menológicos, é uma forma dolorosa de estar com o outro. O sofrimento
existencial singular do sujeito psicótico é uma marca dessa abordagem.
A causa se dá a partir da singularidade de sua existência e do significa-
do que o sujeito dá à própria vivência. A causa não é definida somente
pela disfunção biológica ou psicológica.
Na psicanálise, a psicose é considerada uma estrutura clínica,
sendo muito importante o diagnóstico dessa estrutura nas entrevistas
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preliminares, pois a direção do tratamento nessa linha teórica será dife-


rente a depender desse diagnóstico. Desde Freud, a psicanálise discute
em sua teoria as psicoses, as neuroses e a perversão como os três
possíveis diagnósticos clínicos de um sujeito. Freud apresentou casos
clínicos que são até hoje referência para o estudo da teoria, no caso da
psicose, o conhecido caso Schereber.

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Indicação de leitura: FREUD, S. Notas psicanalíticas sobre
um relato autobiográfico de um caso de paranóia, 1911.
Disponível em: <http://www.freudonline.com.br/livros/volume-1
2/vol-xii-1-notas-psicanaliticas-sobre-um-relato-autobiografico-de-um-
-caso-de-paranoia-dementia-paranoides-1911/> Acesso em: 04.10.2020

A Teoria Cognitiva Comportamental (TCC) é uma abordagem


psicológica também possível de tratamento a pacientes psicóticos. Es-
tudos têm mostrado a eficácia no tratamento a pacientes diagnostica-
dos com doenças psicóticas. Os autores afirmam observar melhora dos
sintomas em pacientes com diagnóstico de esquizofrenia em conjunto
com o uso de medicamentos psicotrópicos. Segundo as pesquisas, há
auxílio na redução dos índices de recaídas, observa-se a diminuição
da severidade das alucinações e delírios, contribuindo para o funciona-
mento global do paciente.
Em 1952, foi relatado o primeiro tratamento com o uso da TCC
em pacientes diagnosticados com alguma psicose. As principais téc-
nicas da teoria cognitiva comportamental usadas no tratamento a pa-
cientes com esquizofrenia são: Normalização, Módulos e Técnicas do
reforço das estratégias de enfrentamento (BARRETO & ELKIS, 2007).

Neurose e Psicose na Psicanálise


A teoria da sexualidade proposta por Sigmund Freud descreve
o funcionamento psíquico humano a partir do desenvolvimento sexual
infantil. Para ele, a formação do adulto é reflexo das fases que com-
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põem essa teoria. Recebe destaque, dentro deste processo, o comple-


xo de Édipo.
A teoria psicossexual do autor propõe a divisão do desenvolvi-
mento em fases representativas de cada período em paralelo ao ama-
durecimento fisiológico da criança. Essa divisão é composta por cinco
fases, sendo a primeira delas denominada de fase oral, que tem como
principal zona de satisfação a boca e ocorre no primeiro ano de vida.
Em seguida, a fase anal, caracterizada pelo controle dos esfíncteres. A
principal zona de libido nesse período, de 1 a 3 anos aproximadamente,
é o ânus. A fase fálica é o período em que ocorre o complexo de Édipo
e os genitais são onde há maior concentração de libido. Seguido pelo
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período de latência, dando a conotação de descanso da energia libidi-
nal. Período em que a criança se concentra em outras tarefas como, por
exemplo, os estudos. O quinto e último estágio é conhecido como fase
genital, que perdura até a morte e é caracterizado pelo amadurecimento
das energias e interesses libidinais.
Sabe-se que o complexo de Édipo é um conceito fundamental
da Psicanálise. “Em extensão sempre crescente, o complexo de Édipo
revela sua importância como o fenômeno central do período sexual da
primeira infância” (Freud, 1924, p. 193). Como descrito anteriormente,
ocorre durante a fase fálica do desenvolvimento psicossexual proposto
pelo autor, sendo então um fenômeno universal, que ocorre entre os
três e cinco anos de idade. O complexo de Édipo refere-se à relação
triangular entre mãe-filho-pai, em que um deles fica de fora dessa rela-
ção em algum momento, e os desdobramentos disso é que vão explicar
a personalidade de cada indivíduo, seja ela considerada saudável ou
não. Poder compreender esse conceito como ponto-chave para os des-
dobramentos psíquicos do sujeito, os quais se repetirão em outras rela-
ções ao longo da vida, é fundamental para compreensão da psicanálise.
Outros conceitos psicanalíticos são importantes para a com-
preensão do complexo de Édipo como, por exemplo, relações objetais,
narcisismo primário, complexo de castração e identificação.
Os pais são as primeiras pessoas com as quais o bebê se re-
laciona. Isso é compreendido como as primeiras relações objetais da
criança. Freud observa a importância da qualidade dessa relação para
o desenvolvimento psíquico do indivíduo. Em um primeiro momento, o
bebê recebe muito cuidado e afeto dos pais. Além da necessidade de
cuidados que uma criança tem quando nasce, os pais também deposi-
tam expectativas e sonhos frente ao filho. Freud refere ser o narcisismo
dos pais reativado com o nascimento de um filho, denominando esse
processo como “narcisismo primário”. Para o autor, o narcisismo primá-
rio é necessário para o desenvolvimento emocional da criança, fazendo
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parte de todo o desenvolvimento humano. Nesse momento, a criança


se sente amada e única para os pais. O trecho abaixo refere a essa
questão:

Além disso, sentem-se inclinados a suspender, em favor da criança, o fun-


cionamento de todas as aquisições culturais que seu próprio narcisismo foi
forçado a respeitar, e a renovar em nome dela as reivindicações aos privi-
légios de há muito por eles próprios abandonados. A criança terá mais di-
vertimentos que seus pais; ela não ficará sujeita às necessidades que eles
reconheceram como supremas na vida. A doença, a morte, a renúncia ao
prazer, restrições à sua vontade própria não a atingirão; as leis da natureza e
da sociedade serão ab-rogadas em seu próprio favor, ela será mais uma vez

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o centro e o âmago da criação – ‘Sua Majestade o Bebê, como outrora nós
mesmos nos imaginávamos. A criança concretizará os sonhos dourados que
os pais jamais realizaram – o menino se tornará o grande homem e um herói
em lugar de seu pai, e a menina se casará com um príncipe como compen-
sação para sua mãe. No ponto mais sensível do sistema narcisista, a imorta-
lidade do ego, tão oprimida pela realidade, a segurança é alcançada por meio
do refúgio na criança. O amor dos pais, tão comovedor e no fundo tão infantil,
nada mais é senão o narcisismo dos pais renascido, o qual, transformado em
amor objetal, inequivocamente revela sua natureza anterior. (Freud, 1914, p.
97-98).

Os anos vão se passando e o desenvolvimento psicossexual


vai acontecendo na criança. O período em que ocorre a fase fálica é
o momento em que a criança se percebe nessa relação triangular. Ela
passa a sentir desejos amorosos ao seu progenitor do sexo oposto, de-
sejando tê-lo somente para ela. Consequentemente, possui sentimen-
tos hostis ao progenitor do mesmo sexo, desejando que este não faça
parte dessa relação, o que é muito penoso para a criança, uma vez
que os sentimentos hostis são depositados em alguém que também
cuida afetuosamente dela. Esses sentimentos inconscientes, apesar de
universal, serão vivenciados singularmente por cada sujeito. Toda essa
trama é chamada de complexo de Édipo. Laplanche e Pontalis (1992) in
Souza (2006) apresentam o conceito da seguinte forma:

Conjunto organizado de desejos amorosos e hostis que a criança sente em


relação aos pais. Sob a sua forma dita positiva, o complexo apresenta-se
como na história de Édipo-Rei: desejo da morte do rival que é a personagem
do mesmo sexo e desejo sexual pela personagem do sexo oposto. Sob a sua
forma negativa, apresenta-se de modo inverso: amor pelo progenitor do mes-
mo sexo e ódio ciumento ao progenitor do sexo oposto. Na realidade, essas
duas formas encontram-se em graus diversos na chamada forma completa
do complexo de Édipo. Segundo Freud, o apogeu do complexo de Édipo é vi-
vido entre os três e os cinco anos, durante a fase fálica, o seu declínio marca
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a entrada no período de latência. É revivido na puberdade e é superado com


maior ou menor êxito num tipo especial de escolha de objeto. O Complexo
de Édipo desempenha papel fundamental na estruturação da personalidade
e na orientação do desejo humano. Para os psicanalistas, ele é o principal
eixo de referência da psicopatologia (p.77).

O declínio da fase fálica e o consequente desfecho do comple-


xo de Édipo se dão a partir do complexo de Castração. O complexo de
Castração é compreendido como a ameaça da perda do falo, represen-
tado pelo órgão genital masculino, o pênis. Em um primeiro momento,
toda criança acredita que todos (homens e mulheres) têm a mesma
coisa, ou seja, que todos são iguais. Ao se darem conta da diferença
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do órgão sexual masculino e feminino, a menina sente que foi castra-
da e o menino se sente ameaçado pela castração. Esse é um ponto
de diferença no Édipo do menino e da menina. Inclusive, Freud se viu
com dificuldade de compreender e explicar a saída do Édipo na menina.
Nesse sentido, o desfecho do complexo de Édipo começa a partir das
percepções das diferenças e da falta (a falta do falo).
Esse conceito é entendido como um limite colocado à criança
diante da relação triangular. Na dissolução ideal do Édipo, a criança é
quem fica “de fora” dessa relação. O limite imposto e vivenciado nes-
se momento também será vivenciado em outras relações e em outras
questões ao longo da vida. Mais uma vez, a maneira como a criança vi-
vencia a castração também terá desdobramentos em sua vida psíquica.
É necessário ressaltar a importância desse processo e suas repercus-
sões na sociedade. O limite que a castração coloca diante da criança
também será a maneira como viver dentro de regras e leis, necessárias
em qualquer sociedade. Se não for realizada de forma clara, haverá
desordem (desordem psíquica, que também se refletirá nas relações e
na sociedade). Para que a castração ocorra de forma clara, espera-se
que tanto o pai quanto a mãe realizem a castração.
Freud afirma:

Se a satisfação do amor no campo do complexo de Édipo deve custar à


criança o pênis, está fadado a surgir um conflito entre seu interesse narcísico
nessa parte de seu corpo e a catexia libidinal de seus objetos parentais. Nes-
se conflito, triunfa normalmente a primeira dessas forças: o ego da criança
volta as costas ao complexo de Édipo (1924, p. 196).

A partir da Castração, outro conceito psicanalítico surge para


poder seguir com a compreensão de todo esse processo. A Identifica-
ção. Ela é conhecida, segundo a psicanálise, como a expressão de um
laço emocional com outra pessoa. “Já aprendemos que a identificação
constitui a forma mais primitiva e original do laço emocional” (Freud,
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1920, p. 116). Considerando a saída ideal do Édipo, ao sentir-se amea-


çado pela castração, a criança se identifica com o seu progenitor do
mesmo sexo.

As catexias de objeto são abandonadas e substituídas por identificações.


A autoridade do pai ou dos pais é introjetada no ego e aí forma o núcleo do
superego, que assume a severidade do pai e perpetua a proibição deste con-
tra o incesto, defendendo assim o ego do retorno da catexia libidinal (Freud,
1924, p. 196).

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Freud propõe dois tipos de resolução edípica. Uma delas é
conhecida como a saída anaclítica, em que as diferenças percebidas
(aquelas colocadas acima, ao discutir sobre o complexo de Castração)
foram sustentadas. A segunda é denominada como saída narcísica, em
que essas diferenças não foram sustentadas e as relações serão mar-
cadas pela busca de si mesmo no outro.
A partir dessa compreensão é que o autor passa a entender
os tipos de funcionamento psíquico de cada indivíduo e sua relação
com o outro. Segundo suas observações clínicas, as saídas edípicas
favoreceram a continuidade de sua teoria, propondo as estruturas de
personalidade: Neurose (Histeria, Neurose-obsessiva e Fobia), Psicose
e Perversão.
Na neurose, o sujeito nega a castração a partir do recalque.
Recalque é definido como um mecanismo de defesa frente ao conflito.
O que este mecanismo faz é empurrar para o lado e não extinguir to-
talmente determinado conteúdo. A frase tão conhecida para entender
a neurose é o retorno do recalcado, ou seja, aquilo que o sujeito recal-
cou, retorna através do sintoma, atos falhos e chistes que o indivíduo
irá apresentar se adoecer. A dúvida é uma característica do neurótico,
denotando a divisão do sujeito.
Na psicose, o sujeito nega rejeitando a castração, a falta do
outro, causando um conflito entre o eu e o mundo externo, sendo a alu-
cinação e delírio os principais sintomas. Esses sintomas (delírio/aluci-
nação) se dão como tentativa de cura. Compreender essas diferenças
clínicas é essencial na psicanálise e na condução de um caso.

PRINCIPAIS TRANSTORNOS MENTAIS E DO COMPORTAMENTO

Atualmente, existem dois sistemas de classificações que reali-


zam a definição e descrição dos transtornos mentais. Esses dois siste-
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mas são os conhecidos manuais de classificação, denominados DSM


(Manual de diagnóstico e estatístico de transtornos mentais) e o CID-10
(Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas rela-
cionados a saúde). O CID-10 não é exclusivo dos transtornos mentais.
Tais sistemas são importantes para o diagnóstico psiquiátrico, porém,
deve-se lembrar que o uso deles deve ser realizado com cuidado, e não
de forma exclusiva.

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DSM-5: Manual de diagnóstico e estatístico de transtornos
mentais, 5° Edição, 2013
Acesso pelo link:
http://www.clinicajorgejaber.com.br/2015/estudo_supervisiona-
do/dsm.pdf Acesso em: 08.10.2020

“As síndromes são conjuntos de sinais e sintomas que se agru-


pam de forma recorrente e são observadas na prática clínica diária”
(DALGALARRONDO, 2008, p. 301). Identificar as síndromes é conside-
rado o primeiro passo na ordenação e observação psicopatológica seja
dos sinais, seja dos sintomas que os pacientes apresentam. O diagnós-
tico da síndrome é um importante e estratégico ato clínico no raciocínio
clínico.
Abaixo segue um quadro para ilustração com exemplo de clas-
sificação do CID-10 e DSM-5, com o objetivo de apresentar semelhan-
ças entre os critérios dos dois Manuais de classificação.
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Figura 5: Semelhanças entre os critérios CID-10 e DSM-5

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Fonte: NUTE-UFSC, 2016

Na neurose
Segundo Dalgalarrondo (2008), as principais síndromes neuró-
ticas podem ser classificadas e descritas da seguinte forma:
• Síndromes Fóbicas: são caracterizadas por medos intensos
e consideradas irracionais. Esses medos podem ser de objetos, animais
ou situações que, objetivamente, não oferecem perigo real ou que seja
proporcional ao medo que o sujeito sente.
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• Síndromes obsessivo-compulsivas: são caracterizadas por
ideias, imagens, fantasias obsessivas ou atos, rituais ou comportamen-
tos obsessivos. Esses atos são vividos pelo sujeito como uma pressão,
como algo que o obriga e o submete. Na prática clínica é importante
ter muito cuidado no diagnóstico, pois é muito comum a proximidade
de sintomas do sujeito neurótico obsessivo com o fóbico ou entre o
obsessivo e o psicótico. Segundo Dalgalarrondo (2008), elas são sub-
divididas em dois tipos básicos: a) Síndromes obsessivas são aquelas
em que predominam as ideias obsessivas e b) Síndromes compulsivas
são aquelas que predominam atos ou comportamentos compulsivos.
• Síndromes Histéricas: são caracterizadas por apresentarem
manifestações clínicas tanto referentes ao corpo como à mente e ao
comportamento. No corpo, são predominantes as alterações das fun-
ções sensoriais e motoras, enquanto na mente, estão relacionadas à
consciência, à memória e às percepções. O comportamento do sujeito
com estrutura neurótica é caracterizado pela teatralidade e dramatici-
dade, sendo infantil e sedutor. Esse comportamento ainda é visto de
forma muito pejorativa e estereotipada, desconsiderando o sofrimento
por detrás deles. São subdivididos em dois grandes grupos: a) Histe-
ria de conversão (ou conversiva): apresenta sintomas e perturbações
corporais variáveis (paralisias histéricas, anestesias e analgesias histé-
ricas, cegueira histérica, perda da fala, perturbações do andar ou ficar
em pé) e b) Histeria dissociativa, marcada por possíveis alterações da
consciência que se assemelham a crises epiléticas. Crises histérico-dis-
sociativas são caracterizadas pelo estado crepuscular de consciência
(apresentado no capítulo 1 deste módulo) e por amnésias (esquecimen-
to seletivo e significativo). Freud deu início à psicanálise a partir da ob-
servação de seu trabalho com mulheres histéricas em Paris.
• Síndromes Ansiosas: encontramos frequentemente (mas
não só) síndromes ansiosas em pessoas que apresentam estrutura psí-
quica neurótica, por essa razão, decide-se incluí-las neste ponto do mó-
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dulo. As síndromes ansiosas costumam ser ordenadas em dois grandes


grupos: a) são os quadros de ansiedade marcados pelos sintomas an-
siosos constantes e permanentes, como a ansiedade generalizada e b)
são caracterizados pelos quadros de crises de ansiedade que ocorrem
de forma abrupta (crises de ansiedade, crises de pânico ou síndromes
de pânico). A ansiedade generalizada é caracterizada por sintomas an-
siosos excessivos na maior parte do dia, por aproximadamente 6 meses.
A pessoa que apresenta esse quadro de ansiedade costuma ser uma
pessoa irritada, angustiada, preocupada e/ou nervosa. É muito comum
observar, nesses casos, sintomas como insônia, angústia constante,
dificuldade em relaxar, dificuldade de concentração. Sintomas físicos
66
como, dores de cabeça (cefaleia), dores ou queimação no estômago,
taquicardia, tontura e sudorese também são comuns. O segundo grupo
é marcado por crises intermitentes, em que há uma eclosão de vários
sintomas ansiosos de forma bastante intensa. Dalgalarrondo (2008)
apresenta uma diferença entre crise de pânico e transtorno de pânico,
em que a primeira é marcada por crises intensas de ansiedade, em que
ocorre importante descarga no sistema nervoso autônomo. Enquanto
os transtornos de pânico são casos em que as crises são recorrentes
e a pessoa tem medo do desenvolvimento de uma nova crise e um
sofrimento subjetivo significativo. Os quadros de ansiedade são muito
comuns na clínica e, muitas vezes, os sintomas físicos são confundidos
com problemas de saúde físicos, sendo importante o diagnóstico dife-
rencial desses casos. O tratamento psicoterapêutico é extremamente
importante nessas situações. Segue abaixo um quadro com critérios de
diagnóstico para os transtornos de ansiedade do DSM – IV – TR, apud
DALGALARRONDO, 2008:

Quadro 5: Critérios diagnósticos para os transtornos de ansiedade segundo o


DSM-IV-TR (APA, 2002)

TRANSTORNO DE ANSIEDADE ATAQUE DE PÂNICO E TRANS-


GENERALIZADA TORNO DE PÂNICO
– Ansiedade e preocupação excessi- Ataque de pânico
vas, na maioria dos dias por período Período de intenso desconforto ou de
mínimo de 6 meses, em diferentes sensação de medo com pelo menos
atividades e eventos da vida quatro dos seguintes critérios
– A pessoa considera difícil controlar – Palpitações ou taquicardia
a preocupação e a ansiedade – Sensação de falta de ar, desconfor-
– A ansiedade e a preocupação estão to respiratório
associadas a pelo menos três dos se- – Sensação de asfixia ou de estar su-
guintes sintomas: focando
• Inquietação ou sensação de estar – Suor das mãos, pés, face, geral-
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“com os nervos à flor da pele” mente frio


• Cansaço fácil, fatigabilidade – Medo de perder o controle ou en-
• Dificuldade de concentrar-se, sentir louquecer
um “branco” na mente – Medo de morrer, de ter um ataque
• Irritabilidade, “pavio curto” cardíaco
• Tensão muscular, dificuldade de re- – Tremores ou abalos
laxar • Alteração do sono (dificuldade – Formigamentos ou anestesias
de pegar no sono ou mantê-lo) – Ondas de calor ou calafrios
– O foco da ansiedade ou preocupação – Desrealização (sensação de que o
não é decorrente de outro transtorno ambiente familiar está estranho) ou
mental (como medo de ter crises de pâni- despersonalização (sensação de es-
co, ser contaminado - no caso de TOC -, tranheza quanto a si mesmo)

67
ganhar peso – no caso da anorexia – Tontura, instabilidade –
–, etc.) Dor ou desconforto torácico
– Ansiedade, preocupação ou sinto- – Náusea ou desconforto abdominal
mas físicos causam sofrimento signi- Transtorno de pânico
ficativo ou prejuízo no funcionamento – Ter ataques de pânico de forma re-
social petitiva e inesperada
– Pelo menos um dos ataques foi se-
guido por período mínimo de um mês
com os seguintes critérios:
• Preocupação persistente de ter no-
vos ataques
• Preocupação sobre implicações ou
consequências dos ataques como
perder o controle, enlouquecer ou ter
um infarto
• Ter alterações do comportamento
relacionadas aos ataques
• Presença ou não de agorafobia as-
sociada

Fonte: DSM IV- TR apud DALGALARRONDO, 2008, p. 306.

Indicação de leituras: FREUD, S. Fragmento de uma análi-


se de um caso de histeria, 1905.
Disponível em: <http://www.freudonline.com.br/livros/volume-
07/vol-vii-1-fragmento-da-analise-de-um-caso-de-histeria-19051901/>
Acesso em: 05.10.2020
FREUD, S. Notas sobre um caso de neurose obsessiva, 1909.
Disponível em: <http://www.freudonline.com.br/livros/volume-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

10/vol-x-2-notas-sobre-um-caso-de-neurose-obsessiva-1909/> Acesso
em: 07.10.2020

Na psicose
As síndromes psicóticas são caracterizadas, portanto, pelos
sintomas alucinatórios e de delírios, além de pensamentos desorgani-
zados e comportamentos tidos como bizarros. Muito comuns são os sin-
tomas paranoides, que são caracterizados pelos delírios e alucinações
de conteúdos persecutórios. Abaixo seguem as principais doenças e
transtornos mentais psicóticos:
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• Esquizofrenia: considerada a principal forma de psicose,
tanto pela sua frequência quanto pela sua importância clínica. Alguns
sintomas são considerados muito significativos para o diagnóstico da
esquizofrenia. São eles: percepção delirante, alucinações auditivas (vo-
zes que comentam ou comandam ação), eco do pensamento (paciente
escuta os próprios pensamentos ao pensar), difusão do pensamento
(o paciente acredita que os seus pensamentos são ouvidos ou perce-
bidos pelas outras pessoas), roubo do pensamento (sensação de que
seu pensamento é extraído, de forma inexplicável, como se tivesse sido
roubado), vivências de influência na esfera corporal ou ideativa. Esses
sintomas são denominados sintomas de primeira ordem, segundo Kurt
Schneider, apud Dalgalarrondo (2008). “Os sintomas de primeira ordem
indicam a profunda alteração da relação Eu-mundo, o dano radical das
“membranas” que delimitam o Eu em relação ao mundo, uma perda
marcante da dimensão da intimidade” (DALGALARRONDO, 2008, p.
328).
• Transtorno delirante (Paranoia): é uma forma de psicose
muito conhecida entre os clínicos. É caracterizado pelo surgimento e
desenvolvimento de um delírio com uma certa preservação da persona-
lidade e do resto do psiquismo do sujeito. Ele se caracteriza, portanto,
por um delírio que costuma ser organizado e sistematizado, com con-
teúdos persecutórios. Normalmente, ocorre em sujeitos com mais idade
(a partir de 40 anos).
• Parafrenias: outra forma de psicose esquizofreniforme com
aparecimento tardio, em que ocorrem delírios normalmente acompa-
nhados de alucinação. Muitos autores consideram as parafrenias como
uma esquizofrenia tardia (entre 45-50 anos)
• Síndromes de agitação psicomotora e de estupor e lenti-
ficação psicomotora: esses são os dois tipos de síndromes psicomo-
toras. São bastante comuns em quadros de psicopatologia psicótica,
como na agitação maníaca (ex.: quadros de transtorno bipolar) e na
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agitação paranoide, agitação catatônica (a agitação pode estar asso-


ciada a ideias delirantes ou alucinações), agitação explosiva (associa-
da a transtornos de personalidade como, por exemplo, personalidade
borderline). Em síndromes de estupor e lentificação, ocorrem casos de
estupor catatônico esquizofrênico, estupor depressivo (há muitos casos
de depressão acompanhado de sintomas delirante). No caso de um es-
tupor depressivo, são casos muito graves de depressão.
• Síndromes Depressivas: existem vários subtipos de síndro-
mes depressivas, sendo que algumas delas podem ser acompanhadas
de sintomas psicóticos (alucinações e delírios). O humor triste e desâni-
mo são os elementos mais salientes desses tipos de síndrome, porém,
69
uma marca de multiplicidade de sintomas afetivos, instintivos, ideativos,
cognitivos, relativos à vontade e à psicomotricidade também pode estar
presente. Sintomas psicóticos observados em síndromes depressivas
graves: ideias delirantes com conteúdo negativo, alucinações (geral-
mente auditivas) com conteúdo depressivo, ilusões auditivas ou visuais,
ideação paranoide e outros sintomas psicóticos com humor incongruen-
te. Outro subtipo importante a ser destacado, frequentemente observa-
do sintomas psicóticos, é o episódio ou fase depressiva e transtorno de-
pressivo recorrente, em que há evidentes sintomas depressivos (como
o humor depressivo, anedonia, diminuição da concentração, ideias de
culpa e inutilidade, distúrbios de apetite e sono). O tempo é marcante
para esse diagnóstico, sendo que os sintomas devem estar presentes
há, pelo menos, duas semanas e não por mais de dois anos de forma
ininterrupta. Os episódios costumam ter uma duração de 3 a 12 meses.
Existe a depressão psicótica como possível diagnóstico dentro das sín-
dromes depressivas.
• Síndromes maníacas: são caracterizadas pela euforia ou
alegria patológica. Há ainda a denominação de elação, que é a expan-
são do eu. Outra característica fundamental, quase sempre presente, é
o taquipsiquismo, compreendido pela aceleração de todas as funções
psíquicas. É possível observar, de maneira geral, os seguintes sinais
e sintomas nas síndromes maníacas: aumento da autoestima, elação
(sentimento de expansão do eu), insônia, loquacidade (rápida produção
verbal), logorreia, pressão para falar, distraibilidade (que é a atenção
voluntária diminuída e a atenção espontânea aumentada), agitação psi-
comotora, irritabilidade, heteroagressividade, desinibição social e se-
xual, tendência exagerada de compras ou a dar seus pertences, ideia
de grandeza, poder e de importância social, delírios de grandeza ou
de poder, alucinações (essas geralmente são auditivas e de grande-
za). Dentro das síndromes maníacas, destacam-se entre os transtornos
mentais psicóticos, a mania com sintomas psicóticos e os transtornos
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

bipolares. Os transtornos bipolares são caracterizados pelo caráter fási-


co, episódico, em que se alternam episódios de mania e de depressão.
Tais episódios são delimitados no tempo por períodos de remissão, em
que o paciente apresenta eutímico, e as alterações psicopatológicas
que costumam ser intensas regridem. Pode-se subdividir os transtornos
em 3 tipos: a) Transtorno bipolar tipo I, em que o sujeito apresenta epi-
sódios depressivos leves e graves, que são intercalados entre as fases
de mania bem caracterizadas e com períodos de normalidade; b) Trans-
torno bipolar tipo II, que tem como características episódios depressivos
leves e graves, intercalados com fase de normalidade. Nesse caso, não
se observa casos de mania, apenas humor depressivo/hipomaníaco; c)
70
Transtorno afetivo bipolar, tipo ‘ciclador’ rápido, tem como característica
a presença de todas as fases (maníaca, normal, depressiva, mistas) em
um tempo bastante curto. Os períodos de remissão são breves. Para
esse diagnóstico, é necessário que o paciente tenha apresentado os 4
episódios de mania em até 12 meses.

Indicação de filme: “O Lado bom da vida”


Indicação de literatura: MARÇAL, A. Eu receberia as piores
notícias dos seus lindos lábios. São Paulo: Companhia das letras,
2005.

PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

71
QUESTÕES DE CONCURSOS
QUESTÃO 1
Ano: 2014 Banca: UFU-MG Órgão: UFU-MG Prova: Psicólogo Clínico
Quanto aos processos defensivos, presentes nas neuroses e psi-
coses, é correto afirmar que:
a) na paranoia, há o predomínio da negação.
b) na melancolia, manifestam-se a identificação e a projeção.
c) na neurose obsessiva e na histeria, manifesta-se o deslocamento.
d) na esquizofrenia, há o predomínio da repressão.

QUESTÃO 2
Ano: 2018 Banca: CESPE/CEBRASPE Órgão: STJ Prova: Analista
Judiciário - Psicologia
Com relação a neuroses, psicoses e transtornos de personalidade,
julgue o item a seguir.
Tanto as neuroses quanto as psicoses se distinguem nitidamente
do estado hígido.
( ) Certo
( ) Errado

QUESTÃO 3
Ano: 2010 Banca: FCC Órgão: TRE-RS Prova: Analista Judiciário -
Psicologia
José Bleger, autor da obra “Psico-Higiene e Psicologia Institucio-
nal”, afirma que a função do psicólogo não deve ficar reduzida à
terapia das neuroses e psicoses e aponta a necessidade de se:
a) pretender uma atividade racional e frutífera, para uma ação em hi-
giene mental, abrindo-se consultórios para atender os doentes mentais,
garantindo a psico-higiene.
b) abrirem vagas para atendimento psicoterápico para todos os cida-
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

dãos, mesmo que em clínicas particulares, uma vez que todos têm di-
reito ao acesso a tratamentos de saúde mental.
c) confiar e se basear em esforços profissionais totalmente estatais,
para a elaboração de projetos e ações, já que os psicólogos não são
um “poder público”.
d) aplicar planos de vasto alcance social no terreno da higiene mental
e da saúde pública, voltando-se, o psicólogo, para a psicoprofilaxia e
promoção da saúde.
e) esperar que a pessoa doente venha consultar o psicólogo para que
se possa tratar e intervir nos processos psicológicos que gravitam e
afetam a estrutura da personalidade, em geral.
72
QUESTÃO 4
Ano: 2008 Banca: CESPE/CEBRASPE Órgão: TJ-DFT Prova: Ana-
lista Judiciário - Psicologia
Texto associado
A partir de 1952, o DSM-IV (Manual Diagnóstico e Estatístico dos
Distúrbios Mentais, em sua quarta revisão) substituiu os conceitos
de psicose, neurose e perversão pela noção de distúrbio.
Na segunda revisão de classificação das doenças (CID-10), a OMS
definiu os distúrbios mentais e do comportamento segundo os
mesmos critérios do DSM-IV. Considerando essas classificações,
dois pacientes, um diagnosticado com distúrbio dissociativo e, o
outro, com diagnóstico de perturbação do curso do pensamento,
podem apresentar, respectivamente neurose e psicose.
( ) Certo
( ) Errado

QUESTÃO 5
Ano: 2018 Banca: CESPE/CEBRASPE Órgão: STJ Prova: Analista
Judiciário - Psicologia
Com relação a neuroses, psicoses e transtornos de personalidade,
julgue o item a seguir.
Neuroses são definidas como os desvios psíquicos que não en-
volvem inteiramente o próprio homem; psicoses são os desvios
psíquicos que acometem o homem em sua totalidade.
( ) Certo
( ) Errado

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE

A partir do capítulo 3, disserte sobre os principais sintomas na psicose e


na neurose. Qual é o principal transtorno mental na psicose encontrado
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

na clínica?

TREINO INÉDITO

Escolha a alternativa que indica os principais transtornos mentais na


psicose:
a) Esquizofrenia, ansiedade generalizada e transtorno bipolar.
b) Síndromes fóbicas, Esquizofrenia e Parafenia
c) Síndromes histéricas, síndromes fóbicas e síndromes depressivas.
d) Esquizofrenia, síndromes maníacas e transtorno de pânico.
e) Esquizofrenia, Paranóia e síndromes maníacas.
73
NA MÍDIA

O filme Nise, o coração da loucura, trata da história da psiquiatra Nise


da Silveira, que revolucionou o tratamento com pacientes esquizofrêni-
cos dentro das instituições psiquiátricas. O filme é brasileiro, foi lançado
em 2016, dirigido por Roberto Berliner e atuado pela atriz Glória Pires.
Quando lançado, foi muito comentado nas mídias e em sites de crítica
de cinema, além de ser muito utilizado em discussões e debates entre
profissionais e estudantes da área da saúde mental.

Fonte: Site Adoro Cinema


Data: 22.02.2016
Acesse o link: http://www.adorocinema.com/noticias/filmes/noticia-119
508/
Acesso em: 09.10.2020

NA PRÁTICA

O caso clínico exposto trata-se de uma experiência profissional no con-


texto de residência multiprofissional em um hospital geral. Esse caso
específico ocorreu no Pronto Socorro psiquiátrico (PS da psiquiatria),
ala localizada dentro desse hospital geral. Pacientes que entravam no
hospital com sintomas ou hipóteses de diagnóstico psiquiátrico eram
encaminhados para essa área especifica do hospital. Antes de chega-
rem ao PS da psiquiatria, normalmente, os pacientes passavam pela
avaliação clínica ou neurológica, para descartar se os sintomas apre-
sentados eram biológicos, fisiológicos ou neurológicos. A escolha desse
caso é a possibilidade de retomar o que foi trabalhado no capítulo ante-
rior sobre diagnóstico diferencial, lembram?
Em um determinado dia, o PS foi acionado para receber um paciente
jovem que, na época, se encontrava entre seus 25-30 anos. O paciente
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

foi resgatado pelo SAMU (Serviço de Atendimento Móvel de Urgência)


em uma avenida movimentada de uma grande cidade, se encontrava
despido e dançando, apresentando importante sintoma de agitação
psicomotora e sintomas muito comuns observados em pacientes com
síndromes maníacas, como: taquipsiquismo, elação, desinibição social
e sexual.
Ao chegar ao hospital, foram descartadas as possibilidades etiológicas
biológicas e neurológicas, chegando à equipe do Pronto-socorro psi-
quiátrico, o paciente foi atendido pelos médicos psiquiatras de plantão.
Devido à importante agitação psicomotora do paciente, foi necessária
a presença de outros profissionais, como da enfermagem, para a reali-
74
zação de contenção e posterior uso de medicamento adequado para a
melhora de tais sintomas e para que fosse possível a realização da ava-
liação psiquiátrica. No momento, a intervenção médica medicamentosa
foi necessária. O trabalho do psicólogo foi de observação e discussão
do caso com a equipe, pois não era possível o atendimento psicológico
ao paciente naquele momento.
A hipótese diagnóstica foi de uma síndrome maníaca, sendo importante
a intervenção de urgência, afinal, se tratava de um pronto-socorro. Com
a hipótese diagnóstica de um surto maníaco, a partir dos sintomas bem
definidos naquele momento, foi realizado o encaminhamento necessá-
rio para o tratamento após a crise. Não era possível o diagnóstico defini-
do e fechado, devido ao tempo de atendimento e urgência, mas, a partir
dos sintomas do paciente, o encaminhamento era adequado para que
ele pudesse seguir com seu tratamento. Os familiares foram contatados
pela equipe de Assistência Social do hospital.

PARA SABER MAIS

Vídeo no YouTube: O que é o Complexo de Édipo para a psicopatolo-


gia clínica? (Christian Dunker).
Acesse o link: https://www.youtube.com/watch?v=x6optR2yDiI&t=311s
Acesso em: 07.10.2020

PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

75
GABARITOS

CAPÍTULO 01

1 2 3 4 5
A E B CERTO A

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE – PADRÃO


DE RESPOSTA

A evolução do conhecimento em psicopatologia se deu ao longo de toda


a história da humanidade. Na tentativa de buscar explicações acerca
das alterações comportamentais e mentais, desde a Grécia Antiga, o
homem buscou dar conta dessas questões de diversas maneiras. Levar
em consideração o momento histórico é primordial para a compreen-
são da evolução desse conhecimento. Para cada época, há uma ex-
plicação. A Grécia Antiga é marcada pelo atravessamento dos deuses,
em que a loucura era exposta como a impossibilidade de escolha do
sujeito. Com Hipócrates, ainda na Grécia Antiga, há um afastamento
das explicações mítico-religiosas, com uma visão racionalista, em que
havia desarranjos no homem. Ao longo da história, é possível observar
avanços e retrocessos sobre esse tema. Na Idade Média há um retorno
da crença mítico-religiosa sobre a doença mental, levando à exclusão
do louco da sociedade, em que asilos e hospitais foram construídos
a fim de afastar o doente mental do convívio social. Nessa época, a
loucura era encarada como algo perigoso e do mal. Durante todo esse
processo, é possível observar o lugar do louco na sociedade e, por mui-
to tempo, houve um assujeitamento do indivíduo que apresentava um
transtorno mental, colocando-o como incapacitado de suas escolhas e
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

vida em sociedade.
Descartes surge apresentando outra concepção da loucura, de forma
muito racionalizada, ainda não considerando aspectos psíquicos e men-
tais. Dessa forma, se mantém a exclusão, pois se o sujeito considerado
louco não tinha capacidade de pensar racionalmente, este não tinha
condições de seguir vivendo em sociedade. Pinel, em outro momento
da história, apresenta sua concepção revolucionando a visão sobre o
sujeito doente mental e o seu tratamento, levando em conta, então, as-
pectos psíquicos e mentais. A Psicanálise surge com Freud, no final do
século XVIII e começo do século XIX, subvertendo toda a concepção até
então na história da humanidade, sustentando o sujeito do inconsciente
76
e a singularidade no diagnóstico e tratamento da pessoa com doença
mental. O intenso sofrimento psíquico presente na pessoa considerada
louca e a importância de tratar tal sofrimento, o que gera os sintomas,
como consequência da experiência individual.
Todo esse processo na evolução do conhecimento em psicopatologia
tem efeitos na luta antimanicomial atualmente, que busca pelos direitos
humanos e pela cidadania do sujeito com intenso sofrimento psíquico. A
luta antimanicomial vai ao encontro da psicanálise e proposta freudiana
de resgatar o sujeito com transtorno mental.

TREINO INÉDITO
Gabarito: C

PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

77
CAPÍTULO 02

1 2 3 4 5
C C E D A

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE – PADRÃO


DE RESPOSTA

A avaliação psicopatológica consiste na realização de entrevistas ao


paciente e seu exame psíquico, que nada mais é que a avaliação das
funções mentais do sujeito. Esses dois instrumentos se somam para
um diagnóstico adequado e de qualidade. O número de entrevista é
variável, a depender de cada caso. Além da entrevista ao paciente, é
também importante a entrevista aos familiares ou pessoas que convi-
vem com o indivíduo, a fim de contribuírem para a compreensão do
todo do paciente, além dos sintomas. A entrevista ao sujeito é também
chamada anamnese.
A semiologia é considerada a base fundamental da psicopatologia. Ela
é entendida como o estudo dos signos. Signos são os sinais ou os sinto-
mas da doença mental. Semiologia e a avaliação psicopatológica, ape-
sar de serem apresentadas separadamente, como uma maneira mais
didática para compreensão, elas andam juntas em todo processo de
avaliação. Compreender a semiologia é a base para a realização de um
diagnóstico. O profissional deve estar atento aos signos ou sinais dos
sintomas que o sujeito apresenta, para poder realizar a avaliação da
psicopatologia.

TREINO INÉDITO
Gabarito: D
PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

78
CAPÍTULO 03

1 2 3 4 5
C C D C C

QUESTÃO DISSERTATIVA – DISSERTANDO A UNIDADE – PADRÃO


DE RESPOSTA

Na psicose, o delírio e a alucinação são os principais sintomas. É por


meio deles que há uma tentativa de cura do sujeito, de lidar com o sofri-
mento psíquico intenso. Existem outros possíveis sintomas, como agi-
tação, pensamento acelerado, entre outras alterações psíquicas, mas a
psicose é marcada pelo delírio e alucinação. A neurose é marcada pela
angústia. Os conflitos humanos inter e intrapsíquicos no sujeito neuró-
tico são recorrentes e dolorosos, sendo o sintoma da angústia o centro
principal do sofrimento dos sujeitos com essa estrutura psíquica.
A esquizofrenia é o transtorno mental psicótico mais comum encontrado
na clínica.

TREINO INÉDITO
Gabarito: E

PSICOPATOLOGIAS - GRUPO PROMINAS

79
BARRETO, E. M. de P. & ELKIS, H. Evidências de eficácia da terapia
cognitiva comportamental na esquizofrenia. Rev. Psiq. Clínica. 34
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em: 05.10.2020

BARROS, D. M. de. Entrevista psiquiátrica e Exame Psíquico,


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