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O artigo 55º do CPTA, que tem um alcance claramente objetivista, continua a conferir
legitimidade para impugnar atos administrativos a titulares de meros interesses de facto,
alarga a ação de grupo e a ação popular, e amplia a legitimidade do ministério público e a ação
pública nas relações inter-administrativas.
Uma das grandes novidades do CPTA de 2002 foi justamente a de que mesmo relativamente
aos meios impugnatórios, a parte no processo passa a ser a pessoa coletiva pública ou, no caso
do Estado e das Regiões Autónomas, o Ministério ou a secretaria regional, se o ato for da
autoria de um órgão integrado numa estrutura ministerial ou do governo ou do governo
regional respetivamente (artigo 10º, nº2).
Desde logo, estas ações têm, por determinação legal, um valor indeterminável, considerando-
se, por isso, de valor superior ao da alçada dos TCA. Por isso, as sentenças proferidas em
primeira instancia não suscetíveis, se for caso disso, de recurso per saltum ou de recurso
excecional de revista para o STA. Acresce que é obrigatório, para o MP, o recurso das decisões
de primeira instância que declarem a ilegalidade de qualquer regulamento com força
obrigatória geral (art.73º, nº4 e 5 CPTA).
Parece-nos, porem, que a condenação à emissão de normas também deveria ter lugar em
outras hipóteses de estrita vinculação administrativa à elaboração de regulamentos, quer o
respetivo dever seja imposto por princípios jurídicos em determinadas situações, quer resulte
de uma auto-vinculação administrativa, quer mesmo resulte do vazio normativo resultante de
uma sentença de declaração de ilegalidade de uma norma com força obrigatória geral –
embora sempre sem prejuízo do núcleo essencial da discricionariedade normativa legalmente
reconhecida, designadamente no quadro das administrações autónomas.
Obviamente que a omissão pode resultar de uma ordem legal concreta de regulamentação,
dirigida à administração, quer a lei fixe, ou não, um prazo para o efeito – na hipótese de a lei
não fixar prazo, como tal não significa que a administração goze de total liberdade para
escolher o momento da regulamentação, justifica-se o pedido de declaração de ilegalidade por
omissão para que o tribunal determine, através de critérios de razoabilidade, se já (ou ainda)
se verifica a ilegalidade por falta das normas necessárias para dar exequibilidade ao ato
legislativo.
Saliente-se, por fim, que tendo em conta a razão de ser do preceito, a omissão se refere a
“normas” e não a diplomas, de modo que se o regulamento existir, mas for deficiente em
termos de, manifestamente, não conter as normas que sejam necessárias à execução dos
preceitos legais, está verificado o pressuposto da utilização da açao de condenação na emissão
de normas.
4. Acha que na execução contratual pela administração interessa saber se está perante uma
declaração negocial?
O CPTA não prevê que a ação sobre contratos possa ser utilizada quando se pretenda
impugnar um ato administrativo praticado em execução de um contrato: nessas hipóteses,
terá de lançar-se mão da impugnação do ato.
Outra questão é a de saber qual o processo a utilizar quando se pretenda obter a condenação
da administração à prática de um ato administrativo em cumprimento de um contrato que
envolva o exercício de poderes públicos. Poderia entender-se que, nessa situação, se deveria
utilizar a ação relativa a contratos, por se tratar de um ato contratualmente devido, mas, como
já vimos, parece que deve pedir-se a condenação à prática de ato administrativo devido, pois
que a circunstância de a obrigação da prática decorrer de um contrato não altera o carácter e
as dimensões substanciais de autoridade e de subordinação legal próprias de tal forma de
atuação administrativa.
6. Acha que o tribunal administrativo pode condenar uma junta de freguesia a realizar
obras?
7. Achas que um vizinho pode demandar um particular que está a fazer numa nova
construção urbana por não cumprir as regras legais de saúde publica?
8. Acha que podem existir ações administrativas entre órgãos da mesma pessoa coletiva?
O papel que foi dado ao fumus boni iuris (ou “aparência do direito”) revelou-se excessivo
contribuindo para sobrecarregar os processos cautelares com a invocação na petição, pelos
requerentes, de praticamente todos os argumentos, de facto e de direito, que deviam
consubstanciar o processo principal. Desse modo, para além de se descaraterizar os
procedimentos cautelares, prejudicou-se a celeridade própria e desejada para este tipo de
processos urgentes, contribuindo ainda para o atraso dos processo principais não urgentes.
A revisão de 2015 modificou a relevância do fumus boni iuris na tutela cautelar em dois
aspetos significativos. Por um lado eliminou a possibilidade, antes prevista, de ele ser o único
fator relevante para a decisão de adoção da providência cautelar em caso de procedência
evidente da pretensão principal, designadamente por manifesta ilegalidade do ato. Nesta
hipótese, a lei permitia que o juiz pudesse decretar a providência adequada, mesmo sem a
prova do receio do facto consumado ou da difícil reparação do dano e sem ponderar a
gravidade dos prejuízos que a concessão pudesse eventualmente causas ao interesse público
ou aos contra-interessados. Essa solução normativa foi objeto de fortes críticas doutrinais e a
jurisprudência interpretou-a em sentido muito restritivo, tendo recusado na prática quase
todas as solicitações para a respetiva aplicação. Embora a solução pudesse ser defensável em
situações excecionais a lei optou em 2015 por eliminar esta modalidade de concessão de
providencias cautelares. Já na situação oposta, isto é, em caso de manifesta falta de
fundamentação da pretensão principal, será sempre recusada qualquer providencia, mesmo
que não tenha havido lugar à rejeição liminar do pedido. Assim, nos casos de evidencia da
ilegalidade da pretensão, o fumus malus continua a funcionar como o fundamento
determinante da recusa da providencia.
Por outro lado, a lei, em 2015, suprimiu a diferença de regime entre a concessão de
providencias conservatórias e de providencias antecipatórias, exigindo, para ambos os tipos de
providencias, a comprovação da probabilidade de procedência da ação principal. A eliminação
desta diferenciação, em 2015, pode justificar-se pela dificuldade e eventual inadequação, em
alguns casos, da distinção conceitual entre as providencias, bem como por afastamento da
ideia de presunção da legalidade do ato administrativo. Mas significa, na prática, uma maior
exigência de prova feita ao requerente para a obtenção de medidas cautelares conservatórias,
que são as mais frequentes, e portanto, um maior relevo negativo da juridicidade material,
que não só leva a uma diminuição significativa da tutela cautelar favorecendo a Administração
nos processos impugnatórios, como também sugere um indesejado empolamento do processo
cautelar com a argumentação e prova do mérito da ação principal.
O fumus boni iuris não é, só por si, decisivo, tendo de verificar-se os outros requisitos
necessários para a concessão, designadamente, o receio da constituição de uma situação de
facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para o requerente, bem
como a proporcionalidade dos efeitos.
Há aqui um tributo à justiça material (à legalidade e aos direitos dos particulares). A relevância
da juridicidade material, sobretudo nos casos de incerteza à primeira vista, não pode ser
pretexto para alongar e desvirtuar o processo cautelar sobrecarregando-o com uma
argumentação e uma instrução aprofundadas sobre o mérito da causa, como se fosse um
processo principal.
A referência ao “fumus”, ou seja, a “aparência” do direito visa justamente exprimir que a
convicção prima facie do fundamento substancial da pretensão é bastante e é adequada à
decisão cautelar, ao contrário do que se exige na decisão dos processos principais. Não se
devia, por isso, exigir uma probabilidade séria ou clara, sobretudo quando estejam em causa
providencias conservatórias.
Concretamente, está em causa a possibilidade de, mesmo que se verifiquem os dois requisitos
fundamentais – quer o periculum in mora, quer o fumus boni iuris, enquanto probabilidade de
procedência da açao principal – o juiz deve recusar a concessão da providencia cautelar,
quando o prejuízo resultante para o requerido (que será sempre, pelo menos, um prejuízo
para o interesse publico) se mostre superior ao prejuízo que se pretende evitar com a
providencia. Isto significa que a Reforma de 2002 introduziu o princípio da proporcionalidade,
na sua dimensão estrita de equilíbrio, na decisão sobre a concessão ou a recusa da providencia
cautelar.
Avaliam-se, num juízo de prognose, os resultados de cada uma das alternativas, e não se
concede a providencia, mesmo que se verifiquem os requisitos, quando os prejuízos da
concessão sejam superiores aos prejuízos que resultariam da não concessão.
Mas, em rigor, não é isso que deve retirar-se do regime geral: a lei não pode ser interpretada
como um reconhecimento implícito ou um pretexto para a prevalência sistemática do
interesse publico sobre o interesse do particular, num quadro de bipolaridade.
Na realidade, o que está em causa não é ponderar valores ou interesses entre si, mas danos ou
prejuízos e, portanto, os prejuízos reais, que numa prognose relativa ao tempo previsível de
duração da medida, e tendo em conta as circunstâncias do caso concreto, resultaria da recusa
ou da concessão (plena ou limitada) da providencia cautelar.
Por fim, é importante salientar que a concessão ou não concessão da providencia também
está associada à circunstância de a providencia poder ser substituída pelo juiz ou de este poder
decretar “contra-providências” ou “contra-cautelas”, como, por exemplo, a imposição de
garantias a prestar pelo requerente. De facto, o juiz nem sempre tem que dizer “sim” ou
“não”; pode dizer “sim, mas”, e isso favorece as hipóteses de concessão de providencia. Um
ultimo aspeto, este de garantia processual, e que também se revelam as ideias da
proporcionalidade e de ponderação é o da participação direta dos contra-interessados,
garantida pela indicação obrigatória da sua identidade e residência no requerimento inicial e
pela sua citação para eventual oposição, apesar do risco de demora inerente à diligência.
A figura legal típica configurada nesse titulo corresponde à ideia de “processos urgentes
principais”, que se distinguem quer dos processos principais não urgentes quer dos processos
urgentes não principais (processos cautelares).
Estas questões não devem ou não podem demorar a decidir aquele tempo que possa ser
considerado normal para a generalidade dos processos, nem para elas se revela suficiente ou
adequada uma proteção cautelar que, através de medidas conservatórias ou mesmo
antecipatórias, regule provisoriamente a situação em termos de poder assegurar a utilidade da
sentença produzida em tempo normal (ou longo).
A lei configura, logo em abstrato, como processos urgentes determinados processos principais,
isto é, processos que visam a pronuncia de sentenças de mérito, onde a cognição seja
tendencialmente plena, mas com uma tramitação acelerada ou simplificada, tendo em
consideração a natureza dos direitos ou dos bens jurídicos protegidos ou outras circunstancias
próprias das situações ou até das pessoas envolvidas.
Lembre-se, porém, que nos termos do próprio artigo 36º, a enumeração legal não implica o
estabelecimento de um numerus clausus que exclua a possibilidade de outros processos
revestirem carácter urgente- o que acontece, não só com os processos relativos a providências
cautelares, mas também com outros processos principais, especiais ou em especiais
circunstancias.
O CPTA também define um regime processual geral para os processos urgentes, que é
aplicável a todos eles, em acumulação com a regulação especifica de cada um.
Assim, além das fases processuais, comparadas com os processos normais, serem abreviadas e
os prazos mais curtos, consoante as espécies, todos os processos e respetivos incidentes
correm em férias judiciais, com dispensa de vistos prévios, mesmo em fase de recurso
jurisdicional, sendo os atos de secretaria praticados no próprio dia, com precedência sobre
quaisquer outros, são decididos prioritariamente, logo que prontos, e os recursos sobem
imediatamente, com os prazos respetivos reduzidos a metade.
Na versão de 2002, o CPTA limitava a sindicabilidade dos atos pré-eleitorais, admitindo apenas
a impugnação autónoma daqueles que implicassem exclusão ou omissão de eleitores nos
cadernos eleitorais ou de elegíveis nas listas eleitorais – esta opção legal pela “impugnação
unitária” justificar-se-ia pelo carater urgente do processo, mas contrariava a tendência da lei,
por exemplo, parecia não admitir, como permitia antes a LPTA, a impugnação autónoma de
ato de marcação da eleição. E da jurisprudência anteriores, que davam relevo decisivo ao
principio da aquisição progressiva dos atos, nos termos do qual o procedimento eleitoral se
desenvolvia em fases ou em cascata, não sendo possível passar à fase seguinte sem a
consolidação da anterior. Ora, há boas razões em favor do princípio da aquisição progressiva:
obstar a que impugnações extemporâneas impossibilitem a realização dos atos eleitorais nas
datas pré-fixadas ou tornem infindável o apuramento eleitoral; evitar a realização de atos
eleitorais que sejam à partida anuláveis por vícios de atos procedimentais já verificados –
sempre com o inevitável protelamento da instalação estável dos órgãos eleitos. Assim, para
conseguir tempestivamente uma estabilização do universo eleitoral e para prevenir contra o
resultado perverso de repetições sistemáticas de atos eleitorais, designadamente em
procedimentos complexos ou em eleições que envolvam muitos eleitores, a revisão de 2015
estabeleceu que, nestes processos, a ausência de reação contra a exclusão, a omissão, mas
também a inclusão de eleitores ou elegíveis nos cadernos eleitorais e demais atos com eficácia
externa anteriores ao ato eleitoral impedem o interessado de impugnar as decisões
subsequentes com fundamento nas ilegalidades de que padeçam esses atos. E o mesmo vale
para a ausência de impugnação de atos eleitorais, quando estes se inscrevam no âmbito de
procedimentos eleitorais encadeados (art.98º, nº3).