• Nas últimas décadas, especialmente a partir do que
foi desenvolvido do segundo pós-guerra, os estudos e os debates sobre a argumentação jurídica acirraram- se, ou melhor dizendo, encontraram seu lugar sob os holofotes acadêmicos. • Habermas entende por argumentação “o tipo de discurso em que os participantes tematizam pretensões de validade controversas e procuram resolvê-las ou criticá-las com argumentos”, e os argumentos como “meios com os quais é possível obter o reconhecimento intersubjetivo de uma pretensão de validade levantada pelo proponente de forma hipotética”, contendo “razões que se ligam sistematicamente à pretensão de validade de uma exteriorização problemática”, e sua “força” mede-se, contextualizando-a, pela acuidade das razões, que se revela, por exemplo, da efetividade no convencimento dos participantes de um discurso, motivando-os a assentir à respectiva pretensão de validade. A racionalidade dos participantes, então, nos proporcionaria outra análise: a capacidade de fundamentar exteriorizações racionais por parte das pessoas que se portam racionalmente. • Habermas, racional será aquela pessoa que no campo cognitivo-instrumental (ou prático-moral) “age de maneira eficiente e exterioriza opiniões fundamentadas”, sendo, pois, “uma disposição de sujeitos capazes de falar e agir”. As exteriorizações racionais, a partir de sua capacidade de fundamentação que reflete a possibilidade de sofrerem críticas, são passíveis de correção, a um julgamento objetivo: “o que vale para todas as exteriorizações simbólicas que estejam ligadas ao menos implicitamente a pretensões de validade (ou a pretensões que mantenham uma relação interna com uma pretensão de validade passível de crítica)”. Especificamente quanto ao cenário prático-moral (semelhante ao discurso teórico), a racionalidade surge a partir da possibilidade de justificação das ações diante de um contexto normativo existente, denominando-se discurso prático, “ou melhor, a forma de argumentação que permite tematizar pretensões à correção normativa, constitui o medium que permite examinar hipoteticamente se determinada norma de ação, reconhecida faticamente ou não, pode ser justificada de modo imparcial”. • Entende-se por técnica argumentativa a produção de argumentos que tomam como orientação não o que é pertinente ao fato em avaliação, mas, relações lógicas, circunstâncias e situações de outras esferas das atividades humanas e que, por pressuposição, têm condições para exercer força de convencimento: •é como se as técnicas argumentativas fosse o meio, o recurso •que empresta prestígio e valores duma determinada prática •para transformá-los em argumentos — no caso do Direito — jurídicos. considera-se como verdadeiro, dentro da lógica, que, se: a = b
também é verdade que b = a
se a = b e b = c, então, a = c.
a construção de uma versão que interesse à sustentação da
tese requer a substituição das incógnitas a, b e c por valores que serão trabalhados como se pudessem estabelecer as mesmas relações lógicas • considera-se como verdadeiro, dentro da lógica, que, se a = b, então também é verdade que b = a; ou, então, se a = b e b = c, então, a = c. Os efeitos que produzem os dois tipos de relações lógicas (reciprocidade e transitividade) serão aproveitados, devido ao prestígio que tem o saber lógico, pela argumentação jurídica, especialmente no caso de fragilidade de provas e indícios: • a construção de uma versão que interesse à sustentação da tese requer a substituição das incógnitas a, b e c por valores que serão trabalhados como se pudessem estabelecer as mesmas relações lógicas. • Mais: as inferências e as deduções que resultam das propriedades que têm as relações lógicas serão utilizadas e aplicadas aos valores sociais e aceitas como argumentos importantes no julgamento jurídico. • Outras técnicas para produzir argumentos, • e que podem servir de exemplo ilustrativo para explicar o processo, • são as que buscam apoio, quer seja no pressuposto de que o ponto de vista da pessoa de prestígio social é importante, • quer seja na concepção • na comparação de fatos • Pode ajudar a interpretar, a julgar melhor, • na definição da importância da história, da educação e das emoções na conduta dos indivíduos etc. • As técnicas podem, pois, ser consideradas recursos que se justificam a partir de PRESSUPOSIÇÕES que devem ter aceitação acadêmica e/ou social, o que, no Direito, se torna por demais importante e sublinha o cuidado que o argumentador deve ter na escolha da técnica e das estratégias interativas que visam a estabelecer um acordo acerca das pressuposições subentendidas nos argumentos produzidos e utilizados. recursos que se justificam a o cuidado que o Visa a estabelecer partir de um acordo acerca argumentador deve das pressuposições Técnicas pressuposições ter na escolha da subentendidas nos Argumentativas devem ter técnica e das argumentos estratégias aceitação interativas produzidos e acadêmica utilizados e/ou social • Em outras palavras, a construção da versão de um fato jurídico pode, quando apoiada em provas e indícios frágeis, valerse de técnicas argumentativas, o que, na verdade, não envolve, • num primeiro plano, • o que está sendo julgado e permite dizer que provas e indícios são argumentos produzidos através da pesquisa e da interpretação do fato, • ao contrário dos argumentos que são resultado das técnicas argumentativas • e que apenas são aceitos como tais devido à pressuposição de que os “empréstimos” são possíveis e úteis. • A argumentação jurídica, embora difira dos conteúdos dos raciocínios formais, busca pois, aproximar-se ou orientar-se por eles porque se pressupõe que a coerência, a coesão e a congruência possam contribuir com o poder de convencimento, de forma que, por exemplo, na argumentação jurídica:“Quem critica um argumento tenderá a pretender que o que tem à sua frente depende da lógica; a acusação de cometer uma falta de lógica é, em geral, por sua vez, uma argumentação quase-lógica. A pessoa se prevalece, com essa acusação, do prestígio do raciocínio rigoroso”. (PERELMAN, 1996 a, p. 220) • A distinção entre argumentos lógicos e quase-lógicos que faz Perelman não receberá, porém, considerações mais demoradas, porquanto se entende que, na prática jurídica, especialmente quando se trata de valores, isso se torna bastante complexo, precisamente porque a argumentação jurídica, onde o objetivo não é nem demonstrar, nem descobrir verdades ou testar hipóteses, mas justificar teses, pode ser caracterizada, em grandes traços, sempre como quase-lógica. • O que importa, todavia, é observar que um raciocínio jurídico, • para poder usufruir do prestígio do rigor lógico, precisa adotar procedimentos que deverão dar consistência e credibilidade à prática, e que podem ser de diferentes níveis: PROCEDIMENTOS 1. realizar interpretações que sejam aceitáveis e defensáveis, o que exige do argumentador um sistema de referência competente e abrangente; 2. procurar controlar a heterogeneidade linguística, o que exige, por sua vez, habilidades do argumentador para definições e delimitações dos sentidos das palavras; 3. adotar um modelo lógico como orientação • O estudo, pois, de diferentes técnicas argumentativas que • podem ser úteis à prática jurídica enfatizará sempre os aspectos • relacionados à atividade lingüística e à orientação lógica, e destaca • os seguintes: • o argumento da coerência; o argumento da reciprocidade; o argumento da transitividade; o argumento da comparação; o argumento da inclusão da parte no todo; o argumento da divisão do todo em partes; o argumento ad ignorantium; os argumentos a pari ea contrario; o argumento da analogia; o argumento da fixação de um grau; o argumento da relação de meios e fins; o argumento da probabilidade; o argumento do vínculo causal; o argumento pragmático; o argumento do; desperdício; o argumento da direção; o argumento que ; relaciona ato e pessoa; o argumento da autoridade; o argumento da relação entre ato e essência; o argumento do exemplo; o argumento da ilustração. O ARGUMENTO DA COERÊNCIA • Esse primeiro tipo de técnica vale-se do prestígio do rigor • lógico e requer, por isso, uma atividade intensa com e sobre a • linguagem — mais precisamente, de controle e de delimitação dos • sentidos — para, assim, utilizar a coerência como argumento. • A coerência — como já se enfatizou — é uma qualidade considerada imprescindível a qualquer argumentação, • pois não se aceita a contradição dentro de um raciocínio, • ou seja, não se deve afirmar algo e depois assumir uma outra idéia que negue a primeira afirmação. • Para manter a coerência e utilizá-la como argumento, • é preciso que se assuma um comprometimento com uma referência socialmente aceita e tomá- la como orientação rigorosa para a produção de sentidos que não apresentem contradições. • E isso tem seus motivos: • O prestígio do rigor lógico leva a que a contradição possa ser interpretada, uma vez, como falta de convicções claras e incapacidade para escolher com segurança a referência que orienta a atividade, e, por outro lado, como um desrespeito com o auditório em termos de não lhe facilitar a compreensão dos objetivos da argumentação, precisamente por não haver uma organização lógica correta e rigorosa das relações entre referência e sentidos verbalizados. • Entende-se, por isso, que a falta de coerência, uma vez denunciada, expõe o argumentador à condenação e ao insucesso: • a frouxidão referencial e a contradição denunciam a incapacidade de produzir boas interpretações dos fatos, • vale dizer, de construir boas teses. • Perde, pois, o argumentador uma das qualidades — • se não a mais importante — • que a interação cobra dos participantes, ou seja, a da credibilidade. • Ser coerente diz, • respeito à competência tanto para escolher os conceitos que serão referência para o raciocínio, • como para organizar os argumentos sem que haja contradição com a referência escolhida. • Na argumentação jurídica, a referência quase obrigatória é a lei. • Pode, porém, também ser uma jurisprudência ou um conceito que tenha aceitação social ou uma presunção jurídica • — desde, porém, que se enquadre nos limites dos modais MORAIS • PRINCIPALMENTE OS DEVERES PROPRIOS DE CADA PROFISSÃO • De qualquer modo, o importante é considerar que a coerência só poderá ser invocada como argumento quando determinada referência tem • — ou poderá vir a ter — prestígio junto ao auditório, • ou seja, ao invocar a coerência como argumento, o argumentador se vê diante de duas importantes tarefas: fazer com que a referência escolhida seja aceita pelo auditório, o que implica saber fazer avaliações preliminares corretas quanto ao universo referencial aceito pela sociedade e determinar com competência o sentido desta referência, tendo em vista o que interessa à argumentação
conduzir o raciocínio de modo a
que não haja contradições em relação à referência, o que representa dominar os processos de manutenção da coerência, da coesão e da congruência • Enfim, a técnica que produz o argumento da coerência é essencialmente uma atividade lingüística que visa à utilização do prestígio do rigor lógico • , ou seja, um recurso em que o argumentador se ocupa ou em observar o rigor da relação não contraditória entre uma referência e as interpretações e justificativas que por ela se orientam, ou em denunciar a falta dessa condição na argumentação adversária. • Na produção das peças processuais, o prejuízo pela falta de organização de um plano textual talvez fique ainda mais evidente porque a persuasão do magistrado e o consequente sucesso na demanda são favorecidos pelo encadeamento • A coerência e a validade de determinados institutos jurídicos dependem, não raro, da ordem em que são apresentados. • Exemplificando: imagine-se uma consumidora cujos cabelos caíram quando da utilização de uma tintura capilar. • Pretende a parte lesada indenização por danos morais em virtude do fato do produto. • Como elaborar adequadamente a tese argumentativa? • É comum na prática forense iniciar-se teses colacionando precedentes jurisprudenciais e lições doutrinárias sobre o que são danos morais, sem, contudo, • expor com precisão qual foi o direito violado. • Nesses casos, como poderia ser considerada adequada a argumentação sobre os danos morais se sequer o magistrado tomou conhecimento de qual obrigação foi descumprida? • Nesse passo, compreender a diferença entre argumentação e demonstração Diferença entre argumentação e demonstração • Argumentar e demonstrar não são exatamente sinônimos. • Enquanto a • demonstração busca a verdade, a argumentação busca a adesão do auditório, • ou seja, a argumentação é uma atividade que tem por objeto o estudo das técnicas que permitam provocar ou aumentar a adesão dos espíritos às teses que se apresentam nas mais variadas atividades humanas. • A demonstração pode ser vista como um meio de prova, fundada na proposta de uma racionalidade matemática que visa a delimitar os passos a serem percorridos - isto é, método silogístico - para deduzir premissas de outras já existentes. Deste modo, a demonstração opera-se por premissas consideradas evidentes e que, por isso, não precisam ser comprovadas, enquanto a argumentação recorre às teses cuja aceitação dependerá da capacidade de persuasão do argumentador. • E o que isso representa? • Bem, a demonstração possibilita que alguém formalize um sistema cujas regras são previamente delimitadas e controladas, não importando em que contexto seja aplicado. • O resultado almejado sempre será tido como verdade. • De modo distinto, o argumentador não pode ignorar fatores exteriores para alcançar a adesão de seu auditório, • pois o contexto em que atua é determinante de quais valores prevalecem e de quais estratégias são acatadas com mais facilidade para alcançar a permeabilidade do ouvinte. • o argumentador, para sustentar sua tese, inúmeras vezes necessita de um conjunto de informações prévias (base probatória mínima), a partir do qual produzirá seus argumentos. Ou seja, a demonstração poderá ser utilizada a serviço da argumentação. • A titulo de exemplo, suponha-se que o advogado necessite comprovar o nexo de causalidade entre a conduta de uma construtora - que é acusada de agir com negligência na utilização de materiais considerados de baixa qualidade - e o desabamento de um edifício, evento em que morreram vários moradores. • Não há dúvida de que o argumentador só conseguirá convencer o julgador de que existe a responsabilidade civil do construtor se recorrer, por exemplo, a laudos produzidos por profissionais de áreas específicas da construção civil. • A argumentação usará os pareceres técnicos que demonstrem, por exemplo, que o ferro utilizado na sustentação das colunas não era adequado para suportar o peso esperado. • Este é o mérito da demonstração • Mas nem sempre a mera demonstração é apta, por si só, • Para da sucesso quanto a reparação por dano moral, • Principalmente quando se trata de quantificação baseada na extensão do dano. • No exemplo, o advogado deverá se valer de informações externas ao evento, como o perfil econômico das partes, o grau de culpa da construtora e a repercussão causada à vítima. • É um raciocínio persuasivo e essencialmente argumentativo sem o qual as chances de persuasão do auditório serão pequanas, • sendo geralmente insuficiente à tal pretensão o mero silogismo entre fato e norma. Prestem atenção • A demonstração não abre espaço à discussão, pois é baseada na evidência, • não exigindo maior esforço • Em razão mostrar ao auditório o acolhimento de uma conclusão, como ocorre, por exemplo, com o uso das provas ou de um laudo pericial. • Já a argumentação privilegia a discussão das ideias tendo como objetivo a adesão do auditório às teses propostas, valendo-se de técnicas fundamentais para o sucesso da lide. Não esquecam • argumentação e demonstração não são sinônimos, mas ferramentas que devem ser utilizadas em conjunto para tornar uma tese vencedora à rival. • E nesse ponto, a argumentação jurídica pode ser mais bem compreendida à luz da Teoria Tridimensional do Direito e seu objeto de estudo: fato, valor e norma. ARGUMENTO DE RECIPROCIDADE • Apóia-se também no prestígio do rigor lógico, especificamente na propriedade das relações para construir uma aproximação ou simetria entre dois fatos ou idéias (ou mesmo valores) de modo a que a semelhança de características implique que se possa aplicar o mesmo tratamento ou julgamento a ambos, mesmo se houver uma inversão de situações ou de posições da simetria inicial. • A atividade do argumentador, nessa técnica de raciocínio, • exige, principalmente, saber interpretar e construir o contexto das situações, • ou seja, é preciso que a aproximação de dois fatos diferentes se faça pelo que se pode localizar de semelhante neles e nos elementos contextualizadores. • Isso requer, sobremodo, saber produzir interpretações apropriadas, • o que, mais uma vez, enfatiza • a importância de um sistema de referência produtivo e competente, e, por isso, da linguagem: para poder aproveitar uma correlação lógica como se a = b
então b = na argumentação jurídica, a 1º
atividade refere-se à delimitação conceitual
deverá dar condições para que o raciocínio se
beneficie da relação lógica. • por exemplo, adotando essa técnica, o argumento sustentará que, se cabe aos pais dar proteção e abrigo aos filhos enquanto estes puderem ser considerados dependentes, da mesma forma caberá aos filhos a responsabilidade de prover as condições de sobrevivência dos pais quando estes, eventualmente, atravessarem uma situação em que se puder considerá-los dependentes. • O raciocínio precisa definir, obrigatoriamente, o que se entende por dependência para que o caráter de reciprocidade da relação entre pais e filhos possa ser sustentado com apoio no modelo lógico. ARGUMENTO DA COMPARAÇÃO • A técnica que faz da comparação um argumento tem o objetivo de comparar enquadrando uma imagem (do réu ou da vítima, por exemplo) ou a versão de um fato (um delito, por exemplo) dentro duma seqüência hierarquizadora que inclui outras imagens ou versões. • Cabe ao argumentador a tarefa de fazer as escolhas das imagens ou versões com as quais organizará a seqüência escalar que servirá de parâmetro de avaliação, • SÃO AS EscolhaS QUE FARÁ PARA estruturar SEU raciocínio. • A comparação passa, portanto, a produzir argumentos, quer seja a favor, quer seja contra o que • está sendo julgado: • se se quiser condenar, • TEM AS TESES DAS DECISOES QUE SÃO COLOCADAS EM PARALELO, • ELE CONFRONTA E deve privilegiar aquelas imagens (referências) que têm um conceito elogiável no instituído social. • E o inverso ocorrerá • quando o objetivo for o de defender: o cotejo do que está sendo • julgado será feito com o que houver de condenável no imaginário do auditório. ARGUMENTO DA AUTORIDADE • O argumento da autoridade parte, assim, do pressuposto de que a citação de outrem possibilita usar o prestígio e a autoridade do enunciante citado, valorizando o citado como argumento. Para conseguir a adesão a uma tese, o argumentador busca, pois, dar à própria fala o prestígio e a autoridade de outrem, citando o que entende como conveniente à sustentação que está fazendo. • O argumento de autoridade, como a própria nomenclatura sugere, é aquele que invoca o prestigio dos atos ou juízos de determinada pessoa ou grupo a partir do qual a afirmação ganha relevância. • Importante identificar quem são as pessoas ou os grupos de onde provém a fala da autoridade. • Não há dúvidas de que a lição de um profissional conhecido e reconhecido em determinada disciplina - um psicólogo para tratar de questões ligadas à personalidade; um médico para opinar sobre uma patologia; um historiador para avaliar as consequências de um dado evento de grande relevância para a sociedade de uma época, etc. - possui grande valor. • Portanto, a doutrina, a opinião fundamentada de especialistas em geral e a legislação podem ser utilizadas como fundamentos relevantes na redação de argumentos de autoridade. • Ainda sobre a doutrina, seu papel é exatamente o de trazer legitimidade ao que se está defendendo. • É uma maneira de se dizer que algum jurista, cuja autoridade já foi reconhecida pela maioria, pensa como você e que, por isso, sua tese deve ser acolhida. • É fundamental tomar cuidado, entretanto, com uma postura cada vez mais comum na prática forense: • alguns operadores do Direito se iludem com a ideia de que a simples referência a um dispositivo legal já caracteriza a fundamentação de uma tese pelo argumento de autoridade. • Isso não é verdade. • Não bastaria, portanto, em dada fundamentação, dizer que “o que se verifica, no caso em análise, é a verificação da carência de ação por parte do autor, conforme dispõe o CPC”. • O que se comprova, no caso em análise, é a verificação da carência de ação (art. 330, inciso III do CPC) por parte do autor, em virtude da ausência do chamado interesse de agir, condição indispensável para o regular exercício do direito de ação, uma vez que o autor nunca teve a posse efetiva da área, objeto do litígio. Isso impede que o seu pedido seja possessório. • É perceptível que no parágrafo anterior, a legislação reforça o que o argumentador sustenta por meio dos fatos. • É importante QUE VOCES SAIBAM QUE apesar de muito persuasivo, o argumento de autoridade deve ser exposto de maneira a que se comprove seu percurso lógico. • Ele não vale apenas porque está amparado pela legislação ou pela doutrina; espera-se que o ponto de vista sustentado seja também coerente e razoável. • Por isso não se deve fazer da argumentação um amontoado de citações. • A colação de argumentos de autoridade deve ser utilizada adequadamente. O ARGUMENTO DA ANALOGIA • Antes de explicitar como a analogia pode ser utilizada como estratégia argumentativa e como se caracteriza esse tipo de argumento, é importante que se entenda o significado desse termo e quais as implicações de sua utilização. • Reale (2000, p. 17) leciona que “a analogia consiste, em sua essência, no preenchimento da lacuna verificada na lei, graças a um raciocínio fundado em razões de similitude, ou ainda, na correspondência entre certas notas características do caso regulado e as daquele que não o é”. • Analogia, portanto, é o procedimento por meio do qual se pode estabelecer uma relação de semelhança entre coisas diversas. Recorrer à analogia significa fazer uma espécie de comparação entre os termos em questão. • Por exemplo quando queremos sustentar que a Constituição da República Federativa do Brasil exerce sobre seus cidadãos poder soberano: • A Constituição protege os direitos fundamentais dos seus cidadãos e estabelece as normas de estruturação e organização do Estado, assim como a Bíblia reúne as orientações de Deus ao homem para que este viva em paz e seja feliz junto a seus pares. • Ora, se as orientações da Bíblia são soberanas em decorrência de quem as inspirou, por analogia, essa característica - soberania - passa a Constituição da Republica, por consequência da aproximação sugerida na argumentação • Não é adequado, nesta hipótese, falar-se em lacuna, mas ainda assim a analogia mostra-se eficiente, • pois é por meio dela que se podem transmitir características conhecidas – • garantidas pelo conhecimento prévio do auditório - a situações novas, produzindo conhecimento novo. Outro exemplo • o tema dos direitos civis dos homo afetivos procedeu à argumentação por analogia para alcançar a tutela desses direitos, • tendo em vista a ausência de legislação que tratava do assunto na época, • apesar das inúmeras decisões favoráveis a essa minoria, especialmente as recentes decisões do Superior Tribunal Federal. conclusao • assim como a entidade familiar composta por homem e mulher está amparada pela Constituição da República, a união entre dois homens ou duas mulheres - já que todos são iguais perante a lei - deve ser também amparada pelo Estado. • Ninguém negou a importância da analogia na conduta da inteligência. Todavia, reconhecida por todos como um fator essencial de invenção, foi olhada com desconfiança assim que se queria transformá-la num meio de prova. (...) Longe de nós a idéia de que uma analogia não possa servir de ponto de partida para verificações posteriores; mas nisso ela não se distingue de nenhum outro raciocínio, pois as conclusões de todos eles sempre podem ser submetidas a uma nova prova. (...) Todo estudo global da argumentação deve, pois, incluí-la enquanto elemento de prova. (PERELMAN, 1996a, p. 423-24) Outro exemplo • “Agredir a mulher é como agredir o membro central da família e, por isso, a célula da sociedade”, • estará construindo uma relação de semelhança que, ao fazer a valorização do instituído social, • cria condições de valorizar a família e a mulher, • ao mesmo tempo que reforça a acusação contra um eventual agressor. • Ainda um outro aspecto da técnica diz respeito ao cuidado na construção da analogia, pois • A escolha dos termos de comparação adaptados ao auditório pode ser um elemento essencial da eficácia de um argumento, mesmo quando se trata da comparação numericamente especificável: haverá vantagem, em certos casos, em descrever um país como tendo nove vezes o tamanho da França em vez de descrevê-lo como tendo a metade do Brasil. (PERELMAN, 1996a, p. 278) O ARGUMENTO DE OPOSIÇÃO • todo profissional do Direito, quando argumenta, sabe que seu ponto de vista será contraposto por outro profissional que atua no polo adverso. • O contraditório é uma realidade a ser enfrentada pelo argumentador na prática forense. • Por isso que tentar prever alguns valores ou argumentos a serem utilizados pela outra parte ao longo da busca da solução jurisdicional para o conflito pode ser uma estratégia discursiva bastante útil, • pois ao mesmo tempo em que o advogado argumenta a favor de sua tese, já conseguiria também mostrar que outra possibilidade de compreender os fatos - a do seu adversário – • seria incompatível com a razoabilidade, como no exemplo hipotético a seguir: • No presente caso inexiste relação de consumo, ao contrário do que alega a empresa Autora. Não se ignora que a lei consumerista também respalda a Pessoa Jurídica como consumidora (art. 2º CDC), mas preconiza como pressuposto que consumidor é todo aquele que utiliza produto ou serviço como destinatário final, o que aqui não se vislumbra. • É justamente por essas razões que a oposição se mostra um tipo de argumento eficiente para a redação de uma boa fundamentação jurídica. • Ao assinalar objeções à sua própria tese, dá-se uma aparência de objetividade e imparcialidade. • O indivíduo apresenta-se como sendo capaz de considerar outros pontos de vista que não o seu; valoriza a opinião do outro, e essa valorização parece um esforço de clarividência, de honestidade e não de propósito. ARGUMENTO AD HOMINEM • Foi demonstrado que o argumento de autoridade busca o prestígio de uma determinada pessoa ou grupo pq sua afirmação ganha relevância. O argumento ad hominem, é totalmente oposto • Consiste no ataque a uma pessoa cujas ideias, argumentos ou depoimentos pretende desqualificar. • Ao invés de se enfrentar o argumento do adversário, ataca-se a pessoa do adversário. • Ataca-se o homem e não a ideia. • Apesar de não possuir bases lógicas, este argumento constitui uma forte arma retórica. • O ataque à pessoa pode ocorrer por duas diferentes estratégias: • a) ataque direto à pessoa (argumento ad hominem abusivo), quando coloca seu caráter e seus valores morais em dúvida e, portanto, a validade de sua argumentação, porque eivada de descredibilidade. Exemplo • O Ministro Joaquim Barbosa, em sessão no Supremo, atacou o Ministro Gilmar Mendes quando disse que ele não tem condições de lhe dar lições de moral, • já que conquistou sua condição de prestígio usando capangas cm sua cidade de origem e fazendo uso político da mídia, o que estava destruindo a credibilidade do STF. • Fecha seu raciocínio recorrendo ao senso comum: “Saia à rua, Ministro Gilmar, e constate o que as pessoas dizem a vosso respeito”. • b) ataque às circunstâncias em que o adversário realiza certa afirmação (argumento ad hominem circunstancial), que ocorre quando a pessoa, não por seu valores morais ou pessoais, mas pelo contexto, mostra-se incapaz de fazer certas afirmações. • É esse o caso da desqualificação da chamada “testemunha ocular” pelas condições em que assistiu aos fatos sobre os quais testemunha. exemplo • Imagine um caso de homicídio cometido por um policial, • o defensor público questionava a única testemunha do crime, uma senhora de 72 anos, o seguinte: • como a senhora - que tem 6,5 graus de miopia - pode garantir que foi o réu quem matou, se acabou de afirmar que levantou de madrugada, com o barulho do tiro, e olhou pela janela? • A senhora dorme de óculos, ou sua miopia não a impede de reconhecer um rosto a noite a quase oitenta metros de distancia? Outro exemplo • João disse: - Foi este o homem que vi roubando aquele carro! Maria respondeu: - Como pode afirmar isso, se você estava bêbado? Percebam • que o argumento ad hominem circunstancial pode ser muito eficiente quando a instrução do processo ainda está em curso,
• ou seja, quando a produção das provas depende
da maior ou menor credibilidade de quem a oferece. ARGUMENTO POR ABSURDO • O argumento por absurdo é aquele que não apenas mostra que o argumentador está certo, mas também que o advogado da parte contrária está errado. • Consiste, portanto, em demonstrar a não validade de uma tese. Para isso, é necessário não apenas pressupor que ela seja verdadeira, mas mostrar, dividindo sua explicação em pedaços, que sua aplicação leva a resultados contraditórios e inadmissíveis, ou seja, absurdos. • NESSE TIPO DE ARGUMENTO SE BUSCAR MOSTRAR a falsidade de uma afirmação ou a invalidade de uma ideia • evidenciando que seus efeitos ou desdobramentos contradizem essa mesma ideia, • ou conduzem ao impossível, ao inadmissível. • ESSA ESTRATÉGIA A GENTE ACEITA PROVISORIAMENTE a tese que se quer combater, e desenvolve-a até conseguir demonstrar seus efeitos absurdos. • No campo hermenêutico, usa-se o argumento por absurdo para mostrar que a aceitação de uma interpretação da norma levaria a) a contrariar o fim visado pela mesma norma; b) a contradizer norma hierarquicamente superior; c) à antinomia entre a norma interpretada e o sistema em que está inserida; ou d) a uma inconstitucionalidade. JURISPRUDÊNCIA • Victor Gabriel Rodríguez, por sua vez, destaca importante reflexão quanto ao uso da jurisprudência como meio de persuasão: • Dosar a citação na jurisprudência é mais um trabalho de coerência argumentativa. Se muito curta, ela perde seu valor de analogia e não persuade o interlocutor. Se muito longa, desestimula a leitura ou a atenção do ouvinte e, por mais detalhada que seja, cairá no vazio (muito provavelmente, no texto escrito, o leitor não terá o menor escrúpulo de pulá-la, partindo para o próximo texto). • Quando se trata da citação da jurisprudência como auxílio à argumentação, é válida a exposição de julgados de tribunais diversos, para demonstrar que tal orientação tem apoio em autoridades diversas. • Busca-se então a ideia de unanimidade do posicionamento defendido, na mesma medida em que se persuade o julgador, qualquer que seja, que decidir de forma diversa seria ir contra uma maioria, o que geralmente não é recomendável. • ainda que se possa firmar o entendimento de que é relevante encarar o uso da jurisprudência como argumento de autoridade, o excesso de julgados recortados em um discurso judiciário raramente contribui para a persuasão. • Sabe-se que o trabalho intenso do Poder Judiciário produz decisões em grande número, e então não é bem a quantidade, por si só, que representa fato de convencimento. • Quando à qualidade, a jurisprudência persuadirá como argumento de autoridade desde que haja proximidade e atualidade entre o tema discutido no julgado e o caso concreto. •Isto serve de alerta a muitos operadores do direito que constroem discursos escritos com recortes de ementas, que pouco contribuem para a efetiva persuasão do destinatário. • Por outro lado, não há uma delimitação exata do que se considera adequado em termos de quantidade de excertos jurisprudenciais colacionados numa petição. Aqui irá preponderar o bom senso e a coerência do operador do Direito em face de cada caso concreto. • Caso se esteja, por exemplo, diante de uma cobrança indevida que deu azo à negativação do nome da pessoa lesada, a jurisprudência é uníssona e sedimentou o entendimento de que o dano moral é presumido (in res ipsa). • não se mostra necessário colacionar mais do que dois precedentes análogos em função de se tratar de um tema pacífico perante os Tribunais, portanto, neste caso, juntar dez ementas se mostra à evidência excessivo. • Em suma, a qualidade deve ser compreendida objetivamente: o grau de persuasão dependerá da proximidade e atualidade entre o tema discutido no julgado e o caso concreto. • A quantidade, por sua vez, deve ser interpretada subjetivamente: o uso menor ou maior de julgados irá variar conforme as particularidades de cada caso.
Da Investigação Sobre os Instrumentos Argumentativos Utilizados Pelos Ministros do STF Quando do Julgamento da ADPF 54/DF: Uma Análise Cartográfica do Discurso Prático Adotado pelo Supremo sob a Luz da Retórica da Objetividade