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GRUPOS INTERATIVOS: UMA FORMA DE GARANTIR EQUIDADE NA

APRENDIZAGEM EM SALA DE AULA


Cristiane Sousa Lima1
Eliane de Almeida Lima2

Introdução

As inquietações que deram origem a esse trabalho sugiram a partir de estudos


realizados no curso de Formação em Comunidade de Aprendizagem, realizado pelo Instituto
Natura em parceria com a Secretaria de Educação do Estado do Ceará, com o objetivo de
capacitar os gestores da rede estadual de ensino a implantarem o projeto “Comunidade de
Aprendizagem” nas Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral - EEMTI3, que estão em
processo de implantação no estado.
Esse projeto tem como base os sete princípios da Aprendizagem Dialógica e, em todas
as suas atividades propostas, é possível identificá-los, os quais são diálogo igualitário,
inteligência cultural, transformação, dimensão instrumental, criação de sentido, solidariedade
e igualdade de diferenças.
Com a formação dos gestores e a implantação do projeto Comunidade de
Aprendizagem nas escolas, o Estado pretende promover equidade e desenvolver em seu
sistema de ensino uma Gestão voltada para resultados de aprendizagem, impactando
positivamente o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB) e,
consequentemente, proporcionando melhores oportunidades para os estudantes e reduzindo as
desigualdades sociais.
Para chegar aos resultados almejados, o projeto conta com as práticas denominadas
Atuações Educativas de Êxito (AEEs)4, que são definidas como ações que favorecem o êxito
escolar dos alunos tanto em relação aos rendimentos quanto ao convívio social. São elas:

1
Professora da Rede Estadual de Ensino do Ceará, graduada em Letras e especialista em Gestão Escolar pela
Universidade Federal do Ceará.
2
Professora da Rede Estadual de Ensino do Ceará, graduada em Biologia e mestre em Bioquímica pela
Universidade Federal do Ceará.
3
Visando concretizar a meta do Plano Nacional de Educação que é “oferecer educação em tempo integral em, no
mínimo, 50% das escolas públicas, de forma a atender, pelo menos, 25% dos(as) alunos(as) da Educação
Básica”, o governo institucionalizou a Escola em Tempo Integral, que visa diversificar o currículo e oportunizar
a construção do itinerário formativo de acordo com seus interesses e projeto de vida no decorrer do ensino
médio, sendo ofertadas 45 horas/aulas semanais e nove tempos diários com disciplinas da base comum,
diversificada e opcional (http://www.seduc.ce.gov.br/index.php/projetos-e-programas?id=10229:escolas-
regulares-em-tempo-integral-na-rede-estadual-de-ensino).
4
A identificação de Atuações Educativas de Êxito (AEEs) é a maior contribuição do projeto INCLUD-ED. Essas
ações foram identificadas através das pesquisas conduzidas nos projetos 1, 2 e 6. Nelas, os pesquisadores
analisaram sistemas, teorias e resultados educacionais, contrastando-os com o estudo de escolas bem sucedidas
em toda a Europa, algumas das quais envolvendo a participação e empoderamento dos familiares e comunidade.
grupo interativo, tertúlia dialógica, biblioteca tutorada, formação de familiares, participação
educativa da comunidade, modelo dialógico de prevenção e resolução de conflitos e formação
pedagógica dialógica.
Para o presente estudo, a ação educativa de êxito selecionada foi o “grupo interativo”,
uma vez que está é uma prática que pode ser desenvolvida em sala de aula, sem maiores
alterações na rotina da escola, permite a participação da comunidade escolar e considera a
diversidade e os diferentes níveis de aprendizagem existente na sala de aula, promovendo a
inclusão de todos os alunos e garantindo melhores resultados de aprendizagem.

Desenvolvimento

A Constituição da República Federativa do Brasil afirma como princípios


fundamentais e compromisso do país: construir uma sociedade livre, justa e solidária;
erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais, além de
promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer
outras formas de discriminação (Brasil, 1988). Observa-se que, por meio da educação, é
possível oferecer um conjunto mínimo de oportunidades sociais básicas, contribuindo para
assegurar equidade e justiça social. Para isso, é preciso desvencilhar-se da ideia de que uma
escola igualitária é aquela que oferece as mesmas oportunidades a todos, uma vez que os
alunos não chegam à escola nas mesmas condições. Já questionavam Aubert, Flecha, Garcia e
Racioneiro (2008), em sua publicação “Aprendizaje dialógico en la Sociedad de la
Información ”, sobre as desigualdades no processo de ensino-aprendizagem:
Numerosos estudos concluem que meninos e meninas de bairros desfavorecidos
economicamente e culturalmente obtêm resultados piores na educação. (...) A
questão é: quais são as transformações necessárias no nível das práticas e sistemas
educacionais para conseguir que todo o alunado, e sobretudo aqueles que pertence a
grupos sociais e culturais mais vulneráveis, obtenha resultados máximos?

É imprescindível a garantia de equidade no ambiente escolar, entendida como


“possibilidade de as diferenças serem manifestadas e respeitadas, sem discriminação;
condição que favoreça o combate das práticas de subordinação ou de preconceito em relação
às diferenças de gênero, políticas, étnicas, religiosas, culturais, de minorias, etc.” (SPOSATI,
2002, p.5).
A implantação do projeto Comunidade de Aprendizagem nas EEMTIs da rede
Estadual de Ensino tem como objetivo proporcionar a aprendizagem dos estudantes, associada
à melhoria nas relações dentro e fora da escola, buscando reflexos efetivos também em sua
comunidade. Partindo desse objetivo, observa-se que o processo de transformação de uma
escola em Comunidades de Aprendizagem demanda esforço coletivo e reflexão. Nesse
sentido, Comunidades de Aprendizagem apresenta-se como uma alternativa para a superação
do fracasso escolar e garantia de equidade, objetivando proporcionar um ensino de qualidade
para todas as pessoas a partir da aprendizagem dialógica. Segundo Aubert, Flecha, Garcia e
Racioneiro (2008):
A aprendizagem dialógica é produto de processos de criação de significado a partir
de interações destinadas a aprendizagens melhores. O conhecimento se cria a se
recria por meio de um diálogo orientado pelo desejo de entendimento pela intenção
de alcançar a maior compreensão e quantidade de acordos possíveis sobre algum
aspecto da realidade, os conteúdos de aprendizagem e a escola.

Nessa perspectiva, observa-se que a aprendizagem é resultado do processo de


interação entre aluno, meio e todos aqueles que participam do processo, motivado pelo
diálogo orientado e pela necessidade de investigar e compreender o mundo em que vive.
Entre as Atuações Educativas de Êxito, identificadas pelo projeto INCLUD-ED, e
propostas pelo projeto Comunidade de Aprendizagem, os “Grupos Interativos” apresentam-se
como uma estratégia educativa bastante significativa na garantia da equidade no processo
ensino-aprendizagem em sala de aula. Essa prática apresenta características que favorecem a
melhoria da convivência e da qualidade de ensino dentro da sala de aula. São elas: a
participação da comunidade, por meio de voluntários que interfere diretamente do processo
ensino-aprendizagem em sala de aula, incentivando os alunos a interagirem durante a
resolução das atividades propostas pelos professores; a aplicação dos conteúdos curriculares
trabalhados em sala de aula pelo professor e a construção do conhecimento a partir do diálogo
igualitário, que elege a consistência dos argumentos como aspecto primordial da situação
comunicativa. Além disso, essa prática é, facilmente, desenvolvida em sala de aula sem
maiores alterações da rotina escolar, tornando-se plenamente exequível do ponto de vista
logístico. Em síntese, os grupos interativos são:
Uma forma de organização sala de aula que proporciona os melhores resultados da
atualidade quanto à melhora da aprendizagem e da convivência. Por meio deles, as
interações se multiplicam, se diversificam, e o tempo de trabalho efetivo se expande.
Esse tipo de organização inclui todos os estudantes, contando com o apoio de outros
adultos, além do professor responsável pela aula. Nos Grupos Interativos o objetivo
é desenvolver, em uma mesma dinâmica, a aceleração da aprendizagem para todos,
além de valores e sentimentos como a amizade e a solidariedade. 5

Para a realização de um Grupo Interativo em sala de aula, algumas condições são


imprescindíveis: a divisão da turma em pequenos grupos heterogêneos (o importante é
garantir a maior diversidade e heterogeneidade entre os alunos de cada grupo, primeiramente,
5
Trecho extraído do caderno “Comunidade de Aprendizagem – Grupos Interativos”, uma adaptação feita a partir
do material de formação produzido pelo CREA, Centro de Investigação em Teorias e Práticas de Superação de
Desigualdades da Universidade de Barcelona. (http://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/3.0/deed.pt_BR)
entre os diferentes níveis de aprendizagem); a participação de um voluntário (ex-aluno,
familiar, funcionário, etc) em cada grupo, independentemente, de seu nível de escolaridade ou
conhecimento prévio sobre o conteúdo da aula, uma vez que sua função será promover a
interação entre os alunos participantes do grupo certificando-se de que todos interagiram na
realização da atividade proposta; a realização de atividades, previamente planejadas pelo
professor, abordando um conteúdo já trabalhado em sala de aula, dentro de um determinado
tempo e que sejam realizadas por todos os grupos, sendo conduzidas pelos voluntários; a
presença do professor esclarecendo possíveis dúvidas de conteúdos que surgirem durante o
momento. Durante esse processo de ensino-aprendizagem serão autores os alunos, os
voluntários e os professores em uma construção coletiva do conhecimento com base no
diálogo igualitário, em que prevalece a validade dos argumentos apresentados,
independentemente, da posição hierárquica dos participantes. O objetivo é que todos os
alunos concluam satisfatoriamente as atividades propostas a partir da interação entre os
participantes do grupo, mediados pelo estímulo do voluntário e do professor, possibilitando
que todos atinjam um nível aproximado de conhecimento a cerca do conteúdo abordado e
garantindo a equidade no processo de ensino-aprendizagem em sala de aula.

Conclusão

Com base no exposto, verifica-se que o desenvolvimento da Atuação Educativa de


Êxito denominada “Grupos Interativos”, proposta pelo projeto Comunidade de
Aprendizagem, pode contribuir de maneira significativa para que haja equidade no processo
ensino-aprendizagem em sala de aula, uma vez que diversos fatores negativos, os quais
reduzem a qualidade das aulas, podem ser minimizados pelas estratégias metodológicas do
projeto, como, por exemplo, a dificuldade do professor em atender, individualmente, as
necessidades diversas dos alunos durante suas aulas.
Com a presença de um adulto em cada grupo de cinco até sete alunos motivando-os a
interagirem entre si no processo de construção do conhecimento, o acompanhamento se torna
mais individual e eficiente, já que, na rotina escolar em sala de aula, cada professor em um
tempo mínimo, precisa garantir o sucesso do processo ensino-aprendizagem de turmas com 30
ou até 45 alunos que apresentam características e níveis de aprendizagem diversos. Além
disso, a participação da comunidade na rotina escolar gera um sentimento de pertencimento
nos familiares tornando a sua presença, que é tão necessária na escola, mais efetiva no
cotidiano escolar.
Outro ponto forte dessa prática é a proposta de organização dos alunos em pequenos
grupos heterogêneos, considerando sua diversidade e o seu nível de aprendizagem. Essa
variedade, quando orientada por um adulto, promove um rico momento que possibilita a troca
de experiências e a construção coletiva e colaborativa do conhecimento, favorecendo a
convivência harmônica entre os alunos. Por outro lado, cria-se uma oportunidade para que os
alunos com menor nível de aprendizagem aprendam com o auxílio dos alunos com melhores
níveis e com o professor.
Desse modo, observa-se que todos os envolvidos no processo tem uma participação
fundamental na construção do ensino de qualidade, oportunizando todos os alunos da turma a
aprenderem segundo as suas necessidades, ou seja, garantindo equidade na aprendizagem em
sala de aula.

Bibliografia

Aubert, A.; Flecha, A.; García, C.; Flecha, R.; Racionero, S. Aprendizaje dialógico en la
Sociedad de la Información. Barcelona: Hipatia, 2008.
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil:
promulgada em 5 de outubro de 1988. Organização do texto: Juarez de Oliveira. 4. ed. São
Paulo: Saraiva, 1990.
INSTITUTO Natura. Nossa Biblioteca. Cadernos de Formação. Disponível em:
<www.comunidadedeaprendizagem.com.br>. Acesso em: jan. 2018.
SPOSATI, A. Mapa da exclusão/inclusão social. Com ciência, SBPC/Labjor, 2002.
Disponível em: < http://www.comciencia.br/dossies-1-72/reportagens/ppublicas/pp11.htm>.
Acesso em: jan 2018.

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