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O tratamento endodôntico dos molares possui peculiaridades que vão além do maior
número de canais. A dupla curvatura dos canais radiculares, as zonas de perigo (ABOU-RASS et al.,
1980; LEONARDO, 2008; LEONARDO; LEONARDO, 2009), a menor amplitude e as variações de
localização dos canais são características que os diferenciam dos demais elementos dentários e que
tornam o tratamento endodôntico, nesses dentes, uma missão desafiadora (LOPES; SIQUEIRA, 2013,
p. 264). Caso tais peculiaridades anatômicas não forem observadas, durante a abertura coronária e
preparo biomecânico, haverá risco significativo de se promoverem iatrogenias.
Leonardo (2008, p. 4) nota que o empirismo e o desconhecimento orientam os
procedimentos endodônticos e afirma que a habilidade manual, a sensibilidade táctil e a delicadeza
não garantem, por si só, o bom desenvolvimento do tratamento endodôntico.
O autor considera que a terapia endodôntica impõe, além do desafio técnico, o desafio
biológico e este é enfrentado com conhecimento técnico e científico que deve ser adquirido,
ampliado e atualizado constantemente.
O teto da câmara pulpar do 1ºMS apresenta reentrâncias sob as cúspides como, também, em
alguns casos, pelo lado lingual, sob o Tuberculo de Carabelli.
As paredes laterais são, geralmente, convexas. A acentuada convexidade que ocorre na parede
mesial dificulta a localização, bem como a instrumentação do canal mésio-vestibular. A remoção
cuidadosa desta convexidade apenas com o objetivo de promover-se o acesso retilíneo e livre ao canal
radicular é oportuna e deve ser realizada com critério, prudência e atenção configurando-se como um
desgaste adicional ou desgaste compensatório o qual repercute na forma de conveniência.
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Figura. Convexidade das paredes laterais da câmara pulpar do 1ºMS com ênfase na
convexidade da parede mesial (LEONARDO, 2008).
O assoalho da câmara pulpar também se apresenta convexo e deve ser preservado, pois a
manutenção de sua integridade reduz a chance de ocorrência de iatrogenias, eleva a possibilidade de
se encontrarem as embocaduras dos canais radiculares e facilita a introdução das limas endodônticas
nos canais radiculares durante o preparo biomecânico.
Considerando a análise do corte transversal da câmara pulpar, ao nível do terço coronário médio,
as paredes laterais revelam-se convexas, lisas e polidas. Ao nível da junção entre esmalte e cemento,
observa-se morfologia triangular cuja base do triângulo é voltada para vestibular, sendo que, nos ângulos
desse triângulo, geralmente ocorrem depressões referentes às embocaduras, orifícios ou entradas dos
canais radiculares.
As embocaduras dos canais radiculares podem ser interligadas por sulcos (linhas) no assoalho
com a forma da letra ípsilon "Y", o que pode ocorrer em cerca da metade dos casos e receber a
denominação de “Rostrum Canalium” (LEONARDO, 2008).
Figura. “Rostrum Canalium”: sulcos (linhas) no assoalho com a forma da letra ípsilon "Y" que se estendem de
uma embocadura à outra.
O 1ºMS apresenta-se, em geral, com três raízes separadas contendo, cada uma delas, um canal
radicular; no entanto, a raiz mésio-vestibular pode apresentar, com maior frequência, dois canais
radiculares (LEONARDO, 2008). O 1ºMS pode apresentar, portanto, quatro canais, sendo que os
achados na literatura são conflitantes e dão conta que o quarto canal ocorre em 28 a 70% dos casos.
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1.2.1 Da Anatomia Interna da Raiz Mésio-Vestibular do 1ºMS
Figura. Curvatura, para distal, do terço apical da raiz mésio-vestibular do 1ºMS. Em detalhe, o risco de
iatrogenia em função de tal curvatura (LEONARDO, 2008).
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1.2.2 Da Anatomia Interna da Raiz Lingual ou Palatina do 1ºMS
O canal lingual ou palatino pode apresentar dupla curvatura com o ápice apontando para
vestibular, bem como com a embocadura apontando para vestibular. Em adição, o canal palatino
pode terminar em delta apical, o que dificulta sua completa instrumentação.
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1.3 Das Complicações Anatômicas do 1ºMS
A forma da coroa, vista pela oclusal, do 1ºMS, foi relacionada, na literatura, com a incidência
de três ou quatro canais. A forma quadrangular ou poligonal relacionou-se à presença de somente
três canais. O formato trapezoidal relacionou-se com a ocorrência de quatro canais (LEONARDO, 2008).
Figura. Relação da anatomia externa da coroa do 1ºMS com o número de canais radiculares.
À esquerda, morfologia que tende a quadrangular ou poligonal associada à ocorrência de três canais.
À direita, formato que tende a trapezoidal relacionado à presença de quatro canais (LEONARDO, 2008).
Segundo Leonardo (2008), no preparo biomecânico dos canais radiculares com dupla curvatura,
deve-se, com prudência e atenção, proceder ao que segue:
=> desgaste compensatório cuidadoso e prudente da convexidade das paredes laterais da câmara
pulpar (principalmente da parede mesial);
=> a instrumentação (modelagem) do batente apical deve ser realizada somente após o desgaste das
interferências coronárias e atenuação da curvatura da metade coronária ou dos dois terços
coronários do canal radicular;
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=> na instrumentação (modelagem) do batente apical, limitar-se ao uso das limas endodônticas com
flexibilidade ótima (lima menor ou igual a nº 25) e/ou compatível com a curvatura do canal radicular
[nos canais, com dupla curvatura, vestibulares do MS e mesiais do MI, limas nº 30 ou nº 35];
=> atuar somente nas áreas de segurança e evitar as áreas de perigo do canal radicular.
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2 Peculiaridades do Segundo Molar Superior (2ºMS)
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Figura. Aspectos gerais da anatomia interna do 2ºMS com três
raízes (TORABINEJAD; WALTON, 2010).
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Figura. Aspectos gerais da anatomia interna do 2ºMS com raízes
fusionadas (TORABINEJAD; WALTON, 2010).
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2.3 Das Inclinações e dos Comprimentos Médios do 2º MS
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distalizada. “A técnica de Le Master [também] é muito útil para evitar a sobreposição do processo
zigomático com os ápices radiculares dos molares superiores” (LEONARDO, 2008, p. 554).
Em planos de tratamento geral de casos especiais, a manutenção do 3ºMS pode ser oportuna
ou desejável justificando a terapia endodôntica. Nesses casos, os exames por imagem são os meios
de se obterem informações clinicamente indispensáveis para o tratamento endodôntico.
O teto da câmara pulpar do 1ºMI apresenta reentrâncias sob as cúspides, rememorando, três
cúspides vestibulares e duas linguais.
As paredes laterais são, geralmente, convexas. A acentuada convexidade que ocorre na
parede mesial dificulta a localização, bem como a instrumentação dos canais mesiais. A remoção
desta convexidade é oportuna, deve ser realizada com critério, prudência e atenção configurando-se
como um desgaste adicional ou desgaste compensatório repercutindo na forma de conveniência.
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Figura. Convexidade da parede mesial e assoalho da câmara pulpar do 1ºMI (LEONARDO, 2008).
O assoalho da câmara pulpar também se apresenta convexo e deve ser preservado, pois a
manutenção de sua integridade reduz a chance de ocorrência de iatrogenias, eleva a possibilidade de
se encontrarem as embocaduras dos canais radiculares e facilita a introdução das limas endodônticas
nos canais radiculares durante o preparo biomecânico.
Considerando a análise do corte transversal da câmara pulpar; ao nível do terço coronário
médio, as paredes revelam-se convexas, lisas e polidas. Já, ao nível da junção entre esmalte e
cemento, observa-se morfologia triangular cuja base do triângulo é voltada para mesial, sendo que,
nos ângulos desse triângulo, ocorrem depressões referentes às embocaduras, orifícios ou entradas
dos canais radiculares.
Embora a embocadura do canal mésio-vestibular (m-v) encontre-se abaixo da cúspide m-v, a
abertura do canal mésio-lingual (m-l) localiza-se sobre o sulco central (LEONARDO, 2008). Ou seja, a
embocadura do canal m-l situa-se pela vestibular do vértice da cúspide m-l.
Os canais mesiais do 1ºMI apresentam curvatura do terço apical para distal, ou seja, ápice
apontando para a distal. Em adição, ocorre curvatura no terço cervical para distal, isto é,
embocadura apontando para distal. Tais ocorrências concomitantes levam alguns autores a
afirmarem que a raiz mésio-vestibular do 1ºMS apresenta dupla curvatura (LEONARDO, 2009; ABOU-
RASS et al., 1980). Poder-se-ia considerar que a anatomia interna da raiz mésio-vestibular do 1ºMI é
curvada em toda a sua extensão configurando morfologia próxima a um arco ou próxima a um
segmento de circunferência.
Embora com menor frequência, pode ocorrer que os dos canais mesiais encontrarem-se no
terço apical compartilhando o mesmo forame.
É importantíssimo destacar que, com a finalidade de permitir a modelagem do batente apical
nos canais mesiais do 1ºMI, reduzindo o risco de iatrogenias, torna-se necessário remover as
interferências coronárias (convexidade da parede mesial da câmara pulpar) por meio do desgaste
compensatório e atenuar a curvatura da metade coronária ou dos dois terços coronários do canal
radicular por meio da limagem anti-curvatura.
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Figura. Inclinações do longo eixo do 1ºMI. À esquerda, vista proximal evidenciando a inclinação
lingual (coroa para lingual). À direita, em A: inclinação mésio-distal (coroa para mesial); em B:
inclinação vestítulo-lingual (coroa para lingual).
A dupla curvatura, frequente nos canais mesiais do 1ºMI, quando não considerada, pode
levar à iatrogenia. Com a finalidade de modelar o batente apical com menor risco de iatrogenias, a
dupla curvatura dos canais mesiais do 1ºMI deve ser atenuada exigindo ações prudentes, atentas e
criteriosas, a saber:
=> desgaste compensatório da convexidade da parede mesial da câmara pulpar;
=> limagem anti-curvatura;
=> na modelagem do batente apical, limitar-se ao uso das limas endodôntica somente com
flexibilidade ótima e/ou compatível com a curvatura do canal radicular após sua atenuação na
porção coronário do canal radicular.
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Salienta-se, no entanto, que, na superfície distal do terço cervical da raiz mesial do 1ºMI, há
uma concavidade que oferece grande risco à perfuração quando do emprego da broca Gates Glidde
durante a limagem anti-curvatura. De uma maneira geral, cuidados com a cinemática e trajetória de
utilização da broca citada são imperativos, mas, neste caso, a avaliação clínica do risco é
imprescindível para determinação da relação custo/benefício do emprego ou não desse método de
limagem anti-curvatura, bem como do direito de informação do paciente com relação ao risco da
terapêutica, às alternativas de tratamento e ao prognóstico.
A indicação da limagem anti-curvatura, com a finalidade de atenuar a curvatura do canal,
deve-se à necessidade de prevenir iatrogenias nos cinco milímetros apicais (porção nobre do canal
radicular) durante a modelagem do batente apical (LEONARDO, 2008), mas esta ação clínica
apresenta em si um risco inerente à concavidade cervical citada no parágrafo anterior e este fato
deve ser considerado pelo profissional e informado ao paciente, pois ambos influenciam de maneira
determinante o prognóstico.
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Figura. Peculiaridades anatômicas do 1ºMI direito.
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5.2 Peculiaridades dos Canais Radiculares do 2ºMI
Segundo Leonardo (2008), o 2ºMI apresenta-se, em geral, com duas raízes separadas em
71% dos casos observando as seguintes peculiaridades:
=> raízes perfeitamente diferenciadas a partir do plano cervical em 39,2% dos casos;
=> diferenciação das raízes ocorrendo a partir do terço médio com 32,8% de frequência;
=> raízes fusionadas nos demais casos.
Nos casos de raízes fusionadas, os canais oferecem uma dificuldade adicional, pois são mais
estreitos.
Em adição, destaca-se que os canais do 2ºMI apresentam-se com curvaturas menos
acentuadas quando comparados com os canais dos 1ºMI.
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O compartilhamento do forame pelos canais mesiais é uma ocorrência que pode gerar
complicações para o profissional que não está preparado para essa variação anatômica.
O 2ºMI pode apresentar apenas dois canais, sendo um por raiz, o que pode gerar alguma
insegurança ou desconfiança no profissional.
Com relação ao 2ºMI, destaca-se a ocorrência de câmara pulpar com a forma da letra “C”
(LEONARDO, 2008).
Outa achado morfológico anatômico importante é denominado de istmo e definido por
Cohen e Hargreaves (2007) como uma comunicação estreita entre dois canais.
Figura. Molar Inferior. Em A, câmara pulpar em forma de “C”. Em B, lesão periapical. Em C, corte
transversal no terço apical, onde a seta evidencia parte do canal sem desbridamento e sem obturação.
Em F, secção transversal do canal radicular em forma de “C”(TORABINEJAD; WALTON, 2010).
Figura. Molar inferior com canal radicular em forma de “C”(COHEN; HARGREAVES, 2007).
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Figura. Peculiaridades do 2ºMI direito (TORABINEJAD; WALTON, 2010).
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Figura. 2ºMI direito com secção transversal do canal em forma de “C” (TORABINEJAD; WALTON, 2010).
Figura. Classificação dos istmos por Cohen e Hargreaves (2007) definido como uma comunicação estreita
entre dois canais.
Em planos de tratamento geral de casos clínicos especiais, a manutenção do 3ºMI pode ser
oportuna ou desejável justificando a terapia endodôntica. Nesses casos, os exames por imagem são os
meios de se obterem informações clinicamente indispensáveis para o tratamento endodôntico.
Por ser um dente com inclinações acentuadas, no caso do3ºMI, corre-se um risco
significativo de iatrogenia (trepanação do assoalho) durante a abertura coronária.
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7 Do Assoalho da Câmara Pulpar em Dentes Multiradiculares
As zonas de dentina delgada, voltadas para a furca dos molares, são consideradas zonas de
perigo para a limagem e/ou desgaste e devem ser evitadas no sentido de reduzir as chances de
iatrogenia. Por outro lado, as zonas de dentina volumosa, opostas à furca, são consideradas seguras
para a limagem e/ou desgaste anticurvatura dentro dos limites de segurança (ABOU-RASS et al., 1980).
Figura 9. Desenho esquemático do preparo do canal radicular por meio da limagem anticurvatura mostrando o
acesso modificado direto (livre e retilíneo) para o ápice, evitando zonas delgadas de perigo, limite apical definitivo
e espaço preparado para ser obturado com guta-percha (ABOU-RASS, 1980).
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9 Bibliografia
ABOU-RASS M, FRANK AL, GLICK DH.The anticurvature filing method to prepare the curved root canal.JADA, v. 101, p. 792-
794. 1980. Disponível em: <http://www.abourass.com/docs/12.pdf>. Acesso em: 26 mar. 2014.
COHEN, S.; BURNS, R. Caminhos da Polpa. 7ª ed., Rio de Janeiro, Editora Guanabara Kogan, 2000.
COHEN, S; HARGREAVES, K. M. Caminhos da polpa. 9ª ed, Rio de Janeiro, Elsevier, 2007.
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ESTRELA, C. Ciência da Endodontia. 1ª ed., Editora Artes Médicas, 2004.
LEONARDO MR, LEONARDO RT. Endodontia: conceitos biológicos e recursos tecnológicos. Artes Médicas (Divisão
Odontológica), São Paulo, 2009.
LEONARDO, M.R.; LEAL, J.M. Endodontia. Tratamento de Canais Radiculares. 3ª ed., São Paulo, Editora Panamericana, 1998.
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LOPES, H. & SIQUEIRA JR, J.F. Endodontia: Biologia e Técnica. 2ª ed., Rio de Janeiro, Editora Medsi, 2004.
RAMOS, C. A. S.; BRAMANTE, C. M. Endodontia: Fundamentos biológicos e Clínicos. 2ª ed., São Paulo, Editora Santos, 2001.
TORABINEJAD, M.; WALTON, R. E. Endodontia: princípios e prática. 4ª ed., Rio de Janeiro, Elsevier, 2010.
WALTON, R.E.; TORABINEJAD, M. Princípios e Práticas em Endodontia. 1ª ed., São Paulo, Editora Santos, 1997.
4 Revisões
Revisado pelos Autores, Corpo Editorial (PEE-FO-UFPel) e pela colaboradora Lucieli Andreia
Zajkowski (PEE-FO-UFPel).
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