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CONTEÚDO

ASSUNTO Página

MEMBRANA BIOLÓGICA __________________________________________________________06

x Composição química das células___________________________________________08

x Moléculas orgânicas_____________________________________________________15

x A água e a sua importância biológica_________________________________ 23

x Princípios da bioenergética________________________________________________24

x Energética das interações biológicas ________________________________________32

x Composição e estruturação de membranas celulares_______________ ____________36

x Transporte através da membrana___________________________________________44

BIOELETROGÊNESE ______________________________________________________________53

POTENCIAL DE REPOUSO__________________________________________________________ 60

SINALIZAÇÃO NO SISTEMA NERVOSO: EXCITABILIDADE ELETRICA CELULAR_____________64

COMO AS CÉLULAS FOTORRECEPTORAS RESPONDEM A LUZ __________________________92

CONTRAÇÃO MUSCULAR ___________________________________________________________96


6

MEMBRANA BIOLÓGICA
ESTRUTURAÇÃO E TRANSPORTE

Objetivos

1. Recordar a composição química das células


2. Conhecer os tipos de ligações químicas envolvidas na estruturação da membrana biológica
3. Entender a importância biológica da água
4.Descrever a estrutura e composição da membrana biológica, aplicando os conceitos de bioenergética.
5. Descrever e entender as funções da membrana.
6. Descrever as características do transporte passivo simples, mediado e do transporte ativo.

A membrana biológica além de representar a interface entre o indivíduo e


o meio, e entre o indivíduo e outros indivíduos, mantém a integridade do
indivíduo. (Luiz R. Travassos)

MEMBRANA BIOLÓGICA

CONTEÚDO
1. Introdução
2.Composição química das células
3. Moléculas orgânicas
4. A água e a sua importância biológica
5. Energética das interações biológicas/ Princípios da Bioenergética
6. Composição e estruturação de membranas celulares
Lipídeos
Proteínas
Modelo do mosaico fluido
7. Transporte através de membranas
Transporte passivo simples
Transporte passivo mediado
Transporte ativo
8. Bibliografia
7

INTRODUÇÃO

Um ser vivo deve ser encarado como uma entidade dinâmica permanentemente sofrendo
transformações. Se, por um lado, os constituintes orgânicos interagem na busca de uma maior
estabilidade (menor conteúdo de energia livre), por outro lado, precisam de uma fonte externa de energia
para reativar todos ou alguns destes estados, estabelecendo uma sequência de transições cíclicas que no
final de tudo irão possibilitar a manutenção da vida propriamente dita (em estado de fluxo constante).
O organismo vivo é constituído predominantemente de água, moléculas orgânicas grandes e
pequenas e de íons que se complexam em diversos níveis de organização (complexos moleculares livres,
organelas, células, tecidos, órgãos, etc.), de modo a formar um conjunto harmônico e capacitado a exercer
funções múltiplas e altamente sofisticadas, como as requeridas nos mecanismos vitais.
A vida de qualquer ser vivo depende da sua capacidade de interação com o meio em que vive. Se
considerarmos isto a nível celular, observaremos que a vida da célula depende da troca de informações e
de substâncias entre o meio externo (extracelular ou intersticial) e o meio interno, através da membrana.
Podemos visualizar a célula como um conjunto de compartimentos, cada qual com composição química
diferente e com capacidade de realizar conjuntos distintos de reações químicas. Cada compartimento é,
portanto, separado dos demais por uma membrana. Assim temos, além da membrana plasmática, as
membranas que envolvem cada organela celular (mitocôndria, sistema de Golgi, núcleo, etc.). Já que, para
a sua sobrevivência, a célula necessita receber matéria prima e eliminar os produtos manufaturados
(mantendo ao mesmo tempo a constância do meio intracelular), sua unidade estrutural básica é a
membrana cuja função é a de agir como barreira à entrada e saída de substâncias.

Para entendermos como qualquer informação entra ou sai da célula, através da membrana
plasmática precisamos primeiro entender a estrutura da membrana.

Do ponto de vista estrutural, podemos definir a membrana plasmática como um agrupamento não
covalente, termodinamicamente estável de lipídeos e proteínas. Freqüentemente a estes
constituintes majoritários, também são encontrados resíduos de carboidratos aderidos a eles.

Desta definição surgem algumas indagações?


x Como são as diferentes moléculas que compõem a membrana plasmática?
x Como estas diferentes moléculas (lipídeos, proteínas, carboidratos, íons e água se relacionam
para formar uma estrutura extremamente ordenada e complexa como a membrana?
x Quais as leis físico-químicas que regem esta organização?
x Por quê a estrutura da membrana é termodinamicamente estável?
x Para que possamos responder, em parte, à perguntas como estas, precisamos agora introduzir ou
relembrar resumidamente certos conceitos básicos:
8
Composição química das células

Elementos Químicos mais abundantes nos seres vivos:

As moléculas que constituem as células são formadas pelos mesmos átomos encontrados nos
seres inanimados (mais que 100 elementos químicos diferentes, cada um apresentando diferente número
atômico, o qual é dado pelo número de prótons presentes no núcleo).Todavia, apenas 4 deles compõem
mais de 95% dos organismos vivos: hidrogênio, carbono, oxigênio e nitrogênio (C H O N). A substância
mais abundante da célula viva é a água, que é responsável por quase 70% do peso celular e todas as
outras moléculas na célula são compostos do átomo de carbono.
A figura 1, compara a predominância dos elementos químicos encontrados nos organismos vivos e
na crosta terrestre.

Figura 1. Comparação entre a abundância relativa dos elementos químicos entre os organismos vivos e a
crosta terrestre
Cada átomo consiste de um denso núcleo formado por prótons e neutrons, circundados por uma
nuvem de elétrons, cujo nº é igual ao nº de protóns no núcleo. (Figura 2). Cada partícula atômica tem a
seguinte carga e massa:
Protón: +1; 1.672 Da
Neutron: 0; 1.674 Da
Elétron: -1; 0.001 Da
Uma vez que o nº de elétrons é igual ao nº de prótons, cada átomo, no seu estado elementar é
eletricamente neutro.
9

Figura 2: Estrutura de um átomo.

Embora a massa de um átomo seja dependente do número de prótons e neutrons no núcleo, sua
reatividade depende dos elétrons circundantes. Os fenômenos químicos envolvem somente as últimas
camadas eletrônicas; a última camada é chamada camada de valência, pois normalmente é aí que
ocorrem as ligações químicas.

Qual o princípio que rege a interação entre os átomos?

Os elétrons não ocupam órbitas fixas, mas apresentam probabilidades distintas para ocupar
diferentes níveis de energia. Quando a camada mais externa de um átomo contém o nº máximo de
elétrons possível, o átomo é altamente estável e resiste à reações com outros átomos. Isto é o que
acontece com os gases nobres, que são encontrados na natureza em sua forma atômica, pois são
estáveis.
Entretanto a maioria dos elementos químicos não apresenta níveis externos com nº completo de
elétrons tornando-os reativos com outros átomos.
Estes elementos atingem a estabilidade quando completam oito elétrons em sua última camada ± camada
de valência. Isso deu origem à Teoria dos Octetos.
Atualmente, explica-se que essa estabilidade pode ser obtida quando átomos adquirem a configuração
eletrônica do gás nobre de número atômico mais próximo.
Portanto, a interação entre os átomos ocorre no sentido de se alcançar a configuração eletrônica estável,
isto é a configuração eletrônica dos gases nobres: REGRA DO OCTETO.
A figura 3 abaixo salienta o número de elétrons presentes, na camada de valência de diferentes
elementos químicos:
10

Figura 3: A tabela salienta o número de elétrons presentes, na camada de valência de diferentes


elementos químicos.

Assim, a interação entre os átomos, formando as moléculas, surge da necessidade de os elementos


adquirirem estabilidade. Para isso, os átomos precisam ligar-se uns aos outros, perdendo, ganhando ou
compartilhando elétrons. Esta interação pode ser conseguida de diversas maneiras, dando origem a
diversos tipos de ligações químicas. Estas diferentes formas de associação dos átomos entre si,
resultarão na variedade de substâncias existentes, com distintas propriedades .
Recapitularemos a seguir, de modo sucinto, os principais tipos de ligações químicas:
LIGAÇÃO COVALENTE: Um ligação covalente é formada quando 2 átomos tornam-se muito próximos e
compartilham um ou mais elétrons. Essas ligações representam o tipo mais forte de ligação química
(Figura 4 ).

Figura 4: Ligação Covalente


Os átomos compartilham elétrons completando o número de elétrons na camada externa. Em uma
ligação simples um elétron de cada um dos dois átomos é compartilhado, em uma ligação dupla um total
de 4 elétrons são compartilhados.

ELETRONEGATIVIDADE: de um elemento é a medida da sua capacidade de atrair elétrons das ligações


covalentes das quais ele participa.
A tabela abaixo indica a eletronegatividade de elementos químicos.
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Se os dois átomos, conectados por uma ligação covalente exercem diferentes atrações para com os
elétrons da ligação, isto é apresentam diferentes eletronegatividades, a ligação é dipolar, com uma porção
terminal um pouco mais negativamente carregada (G -) e a outra um pouco mais positivamente carregada
(G +). Forma-se então uma molécula polarizada chamada dipolo permanente. Exemplo: água.

Uma ligação onde os átomos ligados apresentam eletronegatividades iguais é denominada não
polar. Exemplo: metano.

Figura 5: Exemplo de moléculas polares e apolares.

A natureza das ligações covalentes (polares ou apolares) afeta a capacidade da molécula em


dissolver na água. As ligações covalentes apolares são hidrofóbicas, isto é têm baixa solubilidade em
água e tendem a associarem ± se com outras moléculas apolares . Isto porque os pólos negativos e
positivos da água não encontram qualquer carga para interagir com moléculas não polares (hidrofóbicas).
As ligações covalentes polares são hidrofílicas possuindo alta solubilidade em água.
Uma cadeia macromolecular é mantida por ligações covalentes, as quais são fortes o suficiente para
preservar a sequência de subunidades por longos períodos de tempos.
Além das ligações covalentes outras ligações não covalentes também são encontradas nas
moléculas biológicas:

INTERAÇÕES ELETROSTÁTICAS: É uma força eletrostática que atrai partículas com cargas elétricas
opostas. A ligação ocorre entre elementos que doam ou aceitam elétrons (Figura 6 ).

Figura 6: Comparação entre ligação covalente e ligação iônica.


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Além de íons inorgânicos, temos cargas elétricas em grupos carboxilatos (COO-), amínicos (NH3+)
e outros, presentes em proteínas e alguns tipos de lipídeos.
As ligações iônicas são mais facilmente quebradas que as ligações covalentes.
Em presença de água os átomos ligados ionicamente podem se separar em íons, cada um
contendo a camada externa preenchida com o número de elétrons.

Ex. NaCl o Na ± doa e- / Cl ± recebe e-

INTERAÇÕES POLARES: São mais fracas que as eletrostáticas e ocorrem principalmente entre dipolos
(Figura 7).

Figura 7: Associação de Dipolos

A maioria das moléculas biológicas possui dipolos permanentes formados pelas ligações
covalentes entre átomos de eletronegatividades diferentes ou com assimetria na distribuição eletrônica.
Como exemplos de dipolos temos:

C=O CN SH OH NH


G+ G G+ G- G- G+ G- G+ G- G+

PONTES DE HIDROGÊNIO: São possíveis porque a ligação entre hidrogênio e oxigênio ou nitrogênio é
do tipo covalente polar; os elétrons não estão igualmente distribuídos entre os dois átomos ligados (Figura
8). Pelo contrário, hidrogênio retém um pequeno conteúdo de cargas positivas e o oxigênio ou o nitrogênio
retém um pequeno conteúdo de carga negativa.

Figura 8: Pontes de Hidrogênio


13
Na figura acima, o átomo de oxigênio é o receptor e o átomo de nitrogênio é o doador de
hidrogênio. Para que a ponte de hidrogênio seja formada é preciso que as ligações covalentes contendo o
doador e o receptor de hidrogênio estejam numa posição relativa adequada, isto é, o eixo destas ligações
deve estar na mesma linha. Além disso, a distância entre o hidrogênio e o receptor (o átomo de oxigênio)
precisa ter um valor bem definido. Se estas condições não forem perfeitamente satisfeitas, haverá a
formação de uma interação do tipo polar comum entre NH e C=O. A diferença entre estas duas
condições é que a ponte de hidrogênio contribui muito mais para diminuir a entalpia de um sistema do que
a interação polar comum.

FORÇA DE VAN DER WAALS: É outro tipo de ligação fraca que resulta da interação entre os
elétrons de átomos de duas moléculas adjacentes. Os elétrons em um átomo ou em uma molécula
encontram-se em movimento contínuo de modo que em períodos de tempo extremamente curtos, as
nuvens eletrônicas podem criar distorções na distribuição de carga originando os dipolos instantâneos. Ao
mesmo tempo, dipolos permanentes podem induzir uma assimetria de carga semelhante em ligações
químicas homopolares vizinhas criando dipolos induzidos. As interações entre estes tipos de dipolos são
extremamente fracas e de alcance muito curto (interações de van der Waals), pois requerem uma
aproximação íntima dos grupos químicos participantes. Como exemplos, temos as interações entre
moléculas de metano, butano, benzeno, etc. (Figura 9).

Figura 9: Forças de Van der Waals

Embora pontes de hidrogênio e forças de Van der Waals sejam referidas como fracas elas tem
grande importância na determinação da estrutura tridimensional de BIOMOLÉCULAS, tais como proteínas,
RNA, DNA, fundamentais para o funcionamento celular.

INTERAÇÕES HIDROFÓBICAS: Essa ligações não resultam da atração entre os dois grupamentos
ligados, e sim de forças externas com grupos ligados. Moléculas hidrofóbicas em contato com a água, se
juntam por exclusão porque são repelidas pela água (Figura 10).

Figura 10: Interações Hidrofóbicas


14

O diagrama abaixo indica as principais forças intermoleculares:


15

MOLÉCULAS ORGÂNICAS

Através de diferentes interações químicas, os constituintes orgânicos, se unem, formando as


principais famílias de pequenas moléculas orgânicas encontradas nas células: os açúcares, os ácidos
graxos, os aminoácidos e os nucleotídeos.
As células são constituídas majoritariamente de macromoléculas orgânicas, que pertencem a uma
das quatro classes de moléculas: proteínas, polissacarídeos, lipídeos e ácidos nucléicos. Estas
macromoléculas são formadas pela união de centenas ou milhares de precursores de baixo peso
molecular: aminoácidos, monossacarídeos , ácidos graxos e nucleotídeos respectivamente.

MONOSSACARÍDEOS

Os açúcares mais simples são os monossacarídeos, que apresentam a fórmula geral (CH2O)n ,(n =
3  7).
A glicose tem a fórmula C6H12O6.
Os açúcares podem existir na forma aberta ou cíclica.
Na forma aberta os açúcares contém vários grupos hidroxila e um grupo aldeído ou cetona.
O grupo aldeído ou cetona tem um papel especial. Primeiro de poder reagir com um grupo hidroxil
na mesma molécula em anel. No anel pode ser reconhecido como o único que é ligado a 2 oxigênios.
(Figura 11). Segundo, uma vez em forma de anel este carbono pode tornar ± se ligado a um grupo hidroxil
de uma outra molécula de açúcar, criando um dissacarídeo.
A adição de outros monossacarídeos forma os oligossacarídeos e moléculas com centenas de
monossacarídeos são chamadas polissacarídeos.
Como cada monossacarídeo tem vários grupos hidroxil livre que podem formar uma ligação com
outro monossacarídeo e o número de estruturas possíveis é variável.

Figura 11 : Estrutura Básica de alguns monossacarídeos

A glicose é o principal alimento de muitas células. Uma série de reações oxidativas forma a partir
desta hexose, vários açúcares derivados pequenos e eventualmente CO2 e H2O.
A equação pode ser escrita como :
C6H12O6 + 6 O2 o 6 CO2 + 6 H2O + energia
'XUDQWHDTXHEUDGDPROpFXODGHJOLFRVHHQHUJLDH³IRUoDUHGXWRUD´DVTXDLVVmRHVVHQFLDLVQDV
reações biossintéticas, são recuperadas e armazenadas, principalmente na forma de ATP, no caso de
energia e NADH, para força redutora.
16
Polissacarídeos ( resíduos de glicose ), principalmente glicogênio, em células animais e amido
em plantas são utilizados para estocar energia para uso futuro.
Principais funções: fonte e reserva de energia; estrutura (celulose)

ÁCIDOS GRAXOS

Os ácidos graxos como o ácido palmítico apresentam duas regiões distintas: uma longa cadeia de
hidrocarboneto, que é hidrofóbica, não muito reativa quimicamente; e um grupo de ácido carboxílico que
está ionizado em solução, extremamente hifrofílico ou amínico, para formar ésteres e amidas (Figura 12).

Figura12: Estrutura de um ácido graxo

A diferença entre os ácidos graxos presentes nas células está no tamanho da cadeia de
hidrocarbonetos e no número e posição de duplas ligações presentes nestas cadeias. A presença de
duplas ligações nestas cadeias promove uma flexão na molécula ( Figura 13).
17

Figura 13: Exemplos de ácidos graxos

Os ácidos graxos também são fontes de energia, pois podem também ser metabolizados para
produzir glicose. Eles são estocados na forma de triglicérides, que consistem de 3 cadeias de ácidos
JUD[RV³OLJDGDV´DRJOLFHURO )LJXUD).
18

Figura 14 : Estrutura de um triglicéride

Lipídeos presentes nas membranas celulares

Os principais lipídeos que constituem as membranas são os fosfolipídeos que são derivados do
glicerol, apresentando 2 cadeias de ácidos graxos e um grupo fosfato carregado negativamente, o qual,
por sua vez, é ligado a pequenos compostos hidrofílicos tais como: etanolamina, colina ou serina.
Tipos diferentes de fosfoglicerídeos são denominados de acordo com o álcool da sua cabeça polar
(Figura 15).

Figura 15: Principais fosfolipídeos da membrana


19
AMINOÁCIDOS

Aminoácidos são subunidades das proteínas e são quimicamente variados, mas todos apresentam
um grupamento ácido carboxílico e um grupamento amino, ambos ligados a um único átomo de carbono
chamado carbono D.
As proteínas representam polímeros de aminoácidos unidos através de ligações peptídicas
formadas pela união de um grupo ácido carboxílico de um aminoácido com o amino do próximo (Figura
16).

Figura 16: Ligação peptídica entre aminoácidos.

Embora existam muitos aminoácidos, somente vinte são comuns nas proteínas, cada um
apresentando diferente cadeia lateral ligada ao carbono D.
Assim, de acordo com sua cadeia lateral, os aminoácidos são agrupados em quatro grandes famílias:
1. Aminoácidos básicos: apresentam cargas positivas.(Lisina, Arginina, Histidina)
2. Aminoácidos ácidos: apresentam cargas negativas. (ácido glutâmico, ácido aspártico)
3. Aminoácidos polares não carregados: asparagina, glutamina, serina, treonina, tirosina
4. Aminoácidos não polares: glicina, alanina, valina.

As propriedades das cadeias laterais dos aminoácidos determinam as diferentes propriedades e


características das proteínas. As proteínas apresentam diferentes níveis de organização estrutural.
O dobramento de uma proteína depende da sua seqüência de aminoácidos, que é chamada de estrutura
primária. A estrutura primária pode variar em 3 aspectos, definidos pela informação genética da célula:
número de aminoácidos; seqüência de aminoácidos; natureza dos aminoácidos. A estrutura primária
da proteína resulta em uma longa cadeia de aminoácidos semelhante a um "colar de contas", com uma
extremidade amino terminal e uma extremidade carboxi terminal. A estrutura primária de uma proteína é
destruída por hidrólise química ou enzimática das ligações peptídicas, com liberação de peptídeos
menores e aminoácidos livres.
20
A estrurura secundária refere-se ao arranjo espacial dos radicais de aminoácidos que estão pertos
uns dos outros na sequência linear. Algumas dessas relações estéricas são de um tipo regular, dando
origem a uma estrutura periódica. A alfa-hélice e a fita beta são elementos da estrutura secundária.
A variedade de cadeias laterais dos aminoácidos direciona a diversidade de estruturas que as
proteínas podem formar. Ligações não covalentes (interações fracas) entre as partes distintas de uma
longa cadeia polipeptídica determinarão a conformação da proteína.
Um dos fatores importantes que determinam o dobramento de uma proteína, é a distribuição de suas
cadeias laterais polares e não polares. As muitas cadeias apolares, hidrofóbicas são atraídas para o
interior da molécula, enquanto as cadeias laterais polares tendem a se arranjarem no lado externo da
molécula, onde elas podem interagir com água e outras moléculas polares (Figura 17). As ligações
peptídicas como são polares podem formar pontes de hidrogênio tanto com outras ligações peptídicas
como com cadeias laterais polares.

Figura 17: Dobramento de um polipeptídeo em ambiente aquoso.

A estrutura terciária refere-se ao arranjo espacial de aminoácidos que estão bem longe na sequência
linear. A linha divisória entre a estrutura secundária e a terciária é questão de gosto. As proteínas que
contêm mais de uma cadeia polipeptídica exibem mais de um nível de organização estrutural. Cada cadeia
polipeptídica em tal proteína é chamada de uma subunidade.
A estrutura quaternária refere-se ao arranjo espacial de subunidades e à natureza de seus
contatos. As cadeias que constituem uma proteína com várias subunidades podem ser idênticas ou
diferentes. Por exemplo, na hemoglobina (constituída de quatro cadeias), as interfaces das subunidades
participam na transmissão de informação entre os centros de ligação para O2, CO2 e H+. Nas moléculas
de anticorpos o centro de combinação ao antígeno é formado de segmentos de dois tipos diferentes de
cadeias.
A figura 18 mostra os diferentes níveis de organização estrutural que as proteínas apresentam:
21

Figura 18: Níveis de organização estrutural das proteínas .

NUCLEOTÍDEOS

São as subunidades do DNA e RNA, constituídos de uma base nitrogenada, um açúcar de 5


carbonos e um grupo fosfato.
As bases podem ser púricas ou pirimídicas.
Bases púricas: adenina e guanina
Bases pirimídicas: citosina, timina, uracila
Os nucleotídeos podem agir como transportadores de energia química como o ATP. Outros
Nucleotídeos como o AMPc servem como moléculas sinalizadoras dentro da célula.Uma função
importante dos nucleotídeos é a de armazenar informação biológica.Os ácidos nucléicos são grandes
polímeros de nucleotídeos.
Há dois tipos de ácidos nucléicos diferindo no tipo de açúcar e nas bases nitrogenadas. A
seqüência de bases no RNA e DNA representa a informação genética nas células vivas.

ACIDO RIBONUCLÉICO ÁCIDO DESOXIRRIBONUCLÉICO

Açúcar: ribose Açúcar: desoxiribose


Bases: A U G C Bases: A T G C
22

Figura 19: Principais nucleotídeos

A interação de diversos tipos de moléculas entre si, com afinidades químicas específicas forma
estruturas complexas estáveis num organismo vivo como a membrana plasmática.
Como o organismo vivo é constituído predominantemente de água, precisamos compreender como
moléculas orgânicas de naturezas químicas diferentes como lipídeos, proteínas e açúcares se complexam
com a água para formar uma estrutura extremamente ordenada como a membrana celular.

Como moléculas de naturezas químicas diferentes como lipídeos e


proteínas interagem com a água formando a estrutura extremamente
ordenada e complexa , que é a membrana celular?

Para respondermos esta questão faremos uma análise da molécula de água e da sua interação
com solutos de diferentes características químicas.
23

A ÁGUA E A SUA IMPORTÂNCIA BIOLÓGICA:


Sem água não há seres vivos

Características da Água

A molécula de H2O perfaz mais de 70% da massa da maioria dos organismos vivos. É, portanto, o
solvente universal de reações biológicas e está presente em todas as estruturas. Obviamente, a análise da
sua interação com solutos de diferentes características químicas deve ser essencial para um entendimento
mais completo de todos os processos biológicos.
A molécula de água pode ser representada do seguinte modo:

É, portanto, uma molécula polarizada (dipolo permanente), formando predominantemente pontes


de hidrogênio com outros grupamentos polares ou com outras moléculas de água. Soluções aquosas
puras são geralmente constituídas, não apenas por moléculas de água aleatoriamente dispersas, mas por
uma mistura de complexos, alguns dos quais estão representados a seguir:

O O O O

H H H H H H H H

O O O O

H H H H H H H H

O O

H H H H

Figura 20: Alguns tipos de complexos na estrutura da água.

As pontes de hidrogênio entre as moléculas de água fornecem as forças coesivas que fazem da
água um líquido à temperatura ambiente e que favorecem o ordenamento extremo das moléculas da água
cristalizada (gelo) (Figura 21).
24

Figura 21: Moléculas de água no estado sólido.

As pontes de hidrogênio promovem a atração entre moléculas de água adjacentes e dão à água
líquida uma grande coesão interna e por isso conferem à água suas propriedades incomuns (alto ponto de
fusão, ebulição e calor de vaporização) quando comparada a maioria dos outros líquidos.
As pontes de hidrogênio são mais fracas que as ligações covalentes. As pontes de hidrogênio na
água líquida tem uma energia de ligação ( energia necessária para romper a ligação) cerca de apenas 20
KJ/mol, comparada com 460 KJ/mol para ligação covalente. O tempo de vida de uma ponte de hidrogênio
é menor que 1x 10-9 s.
No estado líquido: a água está em movimento contínuo e as pontes de hidrogênio são constante e
rapidamente formadas e quebradas.
No estado sólido: a água está fixa em um ponto do espaço e estabelece pontes de hidrogênio com
4 moléculas de água, formando uma rede regular.
Para quebrar um grande número de pontes de hidrogênio em tal rede é necessária uma grande
quantidade de energia térmica ( energia cinética resultante do movimento dos átomos e moléculas
individuais (20 KJ/mol), e isto é responsável pelo ponto de fusão relativamente alto da água.

PRINCÍPIOS DA BIOENERGÉTICA

I. INTRODUÇÃO

Para entender a energética das interações biológicas, vamos estudar as leis físicas que governam
qualquer atividade biológica no que concerne às suas trocas energéticas. Isto nos leva à Bioenergética. O
objetivo da Bioenergética é estudar as trocas de energia nos processos biológicos e está baseada na
Energética que estuda as trocas de energia em processos simples, geralmente abstratos, ideais, que não
ocorrem na natureza. Mas as leis obtidas a partir destes estudos são tão gerais que podem ser passadas
para os processos reais e complexos, de tal maneira que os princípios da Energética valem em sua
totalidade na Biologia.

II. DEFINIÇÕES

Vamos ver, agora, uma série de conceitos abstratos que vão permitir verificar como moléculas, que
são intrinsecamente inanimadas, dão vida aos organismos.

1. Sistema, fronteira e arredores

Um sistema termodinâmico é aquela parte do universo físico cujas propriedades estão sob
investigação. O sistema está localizado em um espaço definido pela fronteira que o separa do resto do
universo ou arredores.

2. Energia, calor e trabalho

Energia: é a capacidade de um sistema realizar trabalho e/ou trocar calor.


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Calor: é a forma pela qual a energia é trocada entre o sistema e os arredores como consequência da
diferença de temperatura.
Trabalho: é qualquer forma de energia trocada entre o sistema e os arredores, independentemente da
diferença de temperatura. Ex.: mecânico; gravitacional (mgh), de expansão ou compressão (P'V); elétrico
(Q'<), etc.

Logo, trabalho e calor não são tipos de energia, mas são entidades que só têm significado em
termos de transferência de energia entre sistemas ou sistema-arredores (energia em trânsito). Falamos em
energia de um sistema, mas não calor ou trabalho de um sistema.

3. Tipos de sistemas
O sistema pode ser:
a) aberto: troca matéria e energia com os arredores (Ex.: homem);
b) fechado: só troca energia com os arredores (Ex.: botijão de gás lacrado);
Existe também, o chamado sistema adiabático, que é um tipo de sistema fechado, pois apenas
pode trocar trabalho (não troca calor e nem matéria com os arredores). Ex.: garrafa térmica com tampa
sob pressão.
c) isolado: não troca nem matéria nem energia com as vizinhanças
(Ex.: Universo).
4. Estado de um sistema

O sistema tem um conjunto de atributos chamados propriedades do sistema que, uma vez
medidas, permitem descrevê-lo de maneira completa. Esta descrição completa define o estado do sistema.
Estas propriedades são chamadas função de estado e o seu valor depende, por definição, somente do
estado em que o sistema se encontra.
Exemplos conhecidos de função de estado são: pressão,temperatura, volume, concentração
Em energética existem, além destas, outras funções de estado que iremos definir futuramente:
a) Energia interna (E)
b) Entalpia (H)
c) Entropia (S)
d) Energia Livre (G)
As variações das funções de estado durante qualquer processo só dependem do estado inicial e
final do sistema e não do caminho que o levou de um estado para outro. Assim, se determinarmos a
variação de uma função de estado em um processo simples, ideal e abstrato, esta será igual para um
processo biológico complexo que passou do mesmo estado inicial para o mesmo estado final.
As variações das funções de estado, que são, do ponto de vista experimental, ditas macroscópicas,
sempre permitem obter informações adicionais a respeito dos processos estudados, quando damos a elas
interpretação atômico-molecular (nível microscópico). Embora, no decurso deste assunto, alguma ênfase
seja dada a certas interpretações moleculares de princípios termodinâmicos, devemos esclarecer que a
Energética como um todo não depende de detalhes explícitos da teoria atômico-molecular.

Propriedades intensivas e extensivas

As propriedades de um sistema qualquer podem ser divididas em duas categorias: intensivas e


extensivas. As propriedades intensivas são as que caracterizam o sistema como um todo e não são
aditivas (exemplos: temperatura, pressão). As propriedades extensivas, por outro lado, são dependentes
da extensão (tamanho) do sistema e são aditivas (exemplo: volume, massa).
Entre os possíveis estados que um sistema assume, existem estados importantes que devem ser
definidos:

4.1. Estado de equilíbrio


Atinge-se o estado de equilíbrio quando o sistema não apresenta qualquer tendência de mudar as
suas propriedades com o tempo. Este estado é alcançado pelo sistema quando deixado evoluir sem
qualquer restrição externa. Uma propriedade dos sistemas em equilíbrio é que os parâmetros internos
estão completamente determinados pelos parâmetros externos, isto é, no estado de equilíbrio os
parâmetros externos podem ser utilizados para se determinar as funções de estado do sistema em estudo.
Esta propriedade é importante, pois simplifica a descrição de tal sistema e esta é uma das razões porque a
Energética trata primariamente com estados em equilíbrio.
26
4.2. Estado padrão
É o estado do sistema escolhido como referência. Geralmente é à temperatura de 25°C (ou 298 K)
e 1 atm ou 0° (273 K) e 1 atm. Não se utiliza a temperatura de 0 K, porque pelo Terceiro Princípio da
Termodinâmica (o zero absoluto é inatingível na prática), não se pode determinar as funções de estado de
referência do sistema à temperatura do zero absoluto (-273,16°C). Na prática, no entanto, este fato não
importa, visto que o nosso interesse está voltado geralmente para transformações Físico-Químicas que
podem ocorrer como ponto de referência.

4.3. Estado de fluxo constante ("steady state")

O sistema biológico vivo não está em equilíbrio no estado inicial e nem estará em equilíbrio no
instante da análise. Ele se encontra num estado estacionário, denominado também de "steady state" ou
estado de fluxo constante, onde a entrada e saída de alimento, oxigênio, catabólitos e metabólitos é tal
que não se observa nenhuma alteração de sua homeostase, de sua temperatura, etc., isto é, o sistema
está sempre repondo na justa medida aquilo que perde.
Este estado assemelha-se ao equilíbrio na sua invariância com o tempo e a diferença é que
existem fluxos constantes das propriedades conservativas (massa, energia) no sistema.

5. Processos
5.1. Definição:
É um método operacional, através do qual uma mudança de estado é efetuada no sistema.

5.2. Tipos de Processos:


Entre os possíveis processos que um sistema pode sofrer, os mais importantes a serem
definidos são:
5.2.1. Processo Isotérmico: Aquele que ocorre a temperatura constante;
5.2.2. Processo Isobárico: Aquele que ocorre a pressão constante;
5.2.3. Processo Isocórico: Aquele que ocorre a volume constante;
5.2.4. Processo reversível ou processo quase estático: Durante tal processo, o sistema será
sempre muito próximo do equilíbrio de tal modo que o sentido da alteração pode ser sempre revertido por
uma alteração infinitamente pequena dos arredores, portanto, é um processo de duração infinita, ideal. Um
processo reversível em termodinâmica é análogo ao movimento sem atrito na mecânica. A vantagem
deste conceito é que introduz a idéia de continuidade da análise do processo e permite assim o uso do
Cálculo. Além disso, vimos que se o sistema se encontra em equilíbrio com os arredores durante o
processo reversível, então os seus parâmetros internos são iguais aos parâmetros externos, possibilitando
a utilização dos mesmos para a descrição completa do estado deste sistema. Os parâmetros dos
arredores são de fácil acesso, evitando-se assim, a necessidade de se introduzir no interior do sistema
instrumentos de detecção que poderiam alterar o estado do mesmo.
5.2.5. Processo cíclico: É aquele no qual o sistema sofre transformações tais que o levam a um
estado final idêntico ao inicial. Nesta condição, a variação de qualquer função de estado do sistema é igual
a zero.
5.2.6. Processo irreversível, natural: É aquele observado na natureza. Ocorre num único sentido,
que é o de atingir o estado de equilíbrio. Alcançando este estado, o processo para. Assim, num processo
espontâneo, há dissipação do seu poder movente. Este aspecto dissipativo atraiu a atenção dos
termodinâmicos do século passado, porque eles suspeitavam que, na degradação da energia movente,
estaria o critério de unidirecionalidade do processo espontâneo, isto é, o fator que faz com que um
processo ocorra na natureza num sentido determinado.
Embora na natureza os processos sejam sempre irreversíveis, será que podemos utilizar as
informações obtidas a partir do estudo dos processos ideais reversíveis para descrever as transformações
(de estados) naturais? Sim, pois os parâmetros utilizados para descrever os estados de qualquer sistema
são funções de estado cujas variações durante uma transformação qualquer só dependem dos estados
inicial e final, não dependendo, em absoluto, do tipo ou natureza do processo que levou o sistema de uma
situação dita inicial para uma situação final. Assim, usamos todas as vantagens da simplicidade de um
processo ideal para se obter leis gerais e, portanto, aplicáveis a qualquer processo, inclusive aos
processos complexos como os biológicos.
Vamos agora passar a ver com maiores detalhes estas leis e as correlações mais importantes,
deduzíveis a partir destas e que permitem descrever adequadamente os fenômenos biológicos
fundamentais.
27
III. LEI ZERO DA TERMODINÂMICA

Nossa idéia primitiva de temperatura está ligada a sensações fisiológicas de frio e quente,
permitindo-nos uma escala qualitativa de temperatura. Verificamos depois que existem diversas
propriedades mecânicas e elétricas que variam de forma regular com a temperatura. Assim, construiu-se
um instrumento que permite medir este parâmetro, o termômetro. O estudo, então, de sistemas mantidos
em contato físico por período de tempo suficientemente longo, leva-nos ao princípio zero: "se o sistema 1
está em equilíbrio térmico com o sistema 2 e o sistema 2 está em equilíbrio térmico com o sistema 3, ao se
colocar o sistema 1 em contato com o sistema 3 verificamos que 1 também está em equilíbrio térmico com
3". Esta lei implica na possibilidade de se construir uma escala universal de temperatura, que é o caso da
escala Kelvin. Em um sistema em equilíbrio térmico, assume-se que a energia encontra-se distribuída
uniforme por todo o sistema. Um aumento na energia ('E) do sistema como um todo é assumido como
aumento do nível de energia de todas as partes do sistema e consequentemente a temperatura (T) do
sistema aumenta monotonicamente com o conteúdo de energia do sistema, isto é 'E/ 'T> 0, o que define
a direção da escala de temperatura absoluta.
Do ponto de vista molecular demonstra-se que a temperatura absoluta (T) do sistema é
diretamente proporcional à energia cinética média (EC) das moléculas que o constituem, isto é:

2 1
T =   EC
3 k

onde k é a constante de Boltzmann (1,38062 x 10-23 J/K).


Toda matéria é constituída de átomos e moléculas que se encontram em constante movimento e
em constante colisão entre si. Como resultado disto, existe uma certa quantidade de energia cinética
distribuída pelas partículas e a noção macroscópica de temperatura está relacionada simples e
diretamente a esta quantidade de energia. A existência de um zero absoluto de temperatura torna-se,
assim, fácil de compreender, visto que corresponderia ao estado em que todas as moléculas (e átomos)
tivessem energia cinética zero e é lógico que nenhuma temperatura mais baixa seria possível.
A idéia de um intervalo bastante restrito de temperatura para os fenômenos biológicos pode ser
também analisada conforme esta perspectiva. À baixa temperatura, as moléculas possuem pouca energia
e os processos se tornam mais lentos. À alta temperatura, as estruturas biológicas estão sujeitas a muitas
colisões com moléculas vizinhas de alta energia, o que provocará um aumento na velocidade dos
processos e reações em geral. Nunca devemos, no entanto, esquecer o outro lado destes processos
efetuados a temperaturas mais elevadas, que é o problema da desnaturação da maioria das
macromoléculas biológicas. Muitas sofrem alterações conformacionais permanentes ou não (irreversíveis
ou reversíveis), dependendo da temperatura do meio, podendo perder por completo as suas propriedades
biológicas.

IV. PRIMEIRO PRINCÍPIO DE TERMODINÂMICA

Energia Interna
Um sistema num dado estado possui uma quantidade de energia bem definida que é denominada
energia interna (E). Ao sofrer um processo qualquer que o leve para um outro estado, este sistema pode
trocar calor (q) e trabalho (w) com os arredores, tendo portanto, a sua quantidade de energia alterada.
Normalmente nos processos biológicos, a energia interna é a energia química ligada à estrutura das
moléculas biológicas.
*Nota: a convenção para os sinais de q e w, adotados por nós, é a seguinte:

a) calor: absorvido pelo sistema é positivo (processo endotérmico).


perdido pelo sistema é negativo (processo exotérmico).
b) trabalho: realizado pelo sistema é positivo.
recebido dos arredores pelo sistema é negativo.

Se analisarmos outros sistemas, iremos verificar que sempre o trabalho e o calor trocados pelo
sistema com os arredores quando este sofre uma mudança de estado dependem do processo escolhido e
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a diferença q - w é invariante, dependendo somente do estado inicial e final. Esta diferença, q - w,
corresponde à variação de energia interna, 'E, do sistema, isto é:
'E = q - w (2)

Esta última afirmação não é tão óbvia quanto parece. Nela está implícito o conceito de conservação
de energia que é o primeiro princípio da Termodinâmica: "A energia não pode ser criada ou
destruída" ou "A energia do universo é constante" (Ilustrado na figura abaixo), e a equação (2) é a
expressão matemática desta lei para uma mudança de estado.

Entalpia
Esta função de estado é de interesse, uma vez que os processos biológicos ocorrem à pressão
constante. Se o processo ocorrer a pressão constante (isobárico), a quantidade de calor trocada (qp) é
igual à variação de entalpia ('H), isto é:
'H = qp (3)

Ora, já vimos que 'E = qp - w, logo


'E + w = qp e daí,

'H = 'E + w
Sabemos que w = P'V onde P é a pressão a que está sujeito o sistema e 'V é a variação de volume que
ocorre durante o processo. Assim, obtemos a seguinte relação:

H = E + PV (4)

A equação (4) define matematicamente a entalpia, que também é uma função de estado. Esta é muito
importante em Química e Bioquímica pois, o calor de reação, de solução, de combustão (que são calores
trocados à pressão constante) correspondem à variação de energia, no caso 'H, que acompanham estes
processos.
Nos processos isocóricos, w = 0 e, portanto, 'E = qv, onde qv é o calor trocado no processo a
volume constante.
Os processos biológicos, de um modo geral, se dão à pressão constante, no entanto como ocorrem
em líquidos e sólidos (que são praticamente incompreensíveis) temos 'V = 0, e por isto podemos dizer
que nos sistemas biológicos 'E = 'H.
Não é possível se ter para E e H um estado de referência, que corresponderia ao estado à
temperatura de zero absoluto (lembre-se do Terceiro Princípio). Isto quer dizer que não é possível se
determinar absolutos de E e H. Assim sendo, num processo qualquer, só se determinam as variações de
entalpia e energia interna ('H e 'E). Como estes valores variam com a temperatura, tem-se que tomar
uma situação de referência que, como já vimos, é o estado padrão. Os valores correspondentes às
variações destas funções de estado no estado padrão são representados por 'E° e 'H°.
29
V. SEGUNDO PRINCÍPIO DA TERMODINÂMICA

Entropia

Em uma solução em contato com a água pura observa-se que o soluto difunde-se até que a
concentração seja igual em todo o sistema, sem no entanto, a energia útil total do sistema ter-se alterado
com este processo (se admitirmos que não há interação entre as moléculas de soluto e água). Agora, se
lembrarmos que o estado de equilíbrio é o estado mais provável, concluiremos que ao se colocar a água
em contato com a solução, a distribuição mais provável é aquela que tem o soluto distribuído
uniformemente no sistema. Logo, a principal diferença entre o estado inicial e final deste sistema está no
número de combinações (W) nas quais as moléculas do soluto podem se distribuir pelo volume total
disponível para elas. Quanto maior o volume, maior é o número de maneiras de se distribuir N moléculas
de soluto. Assim, podemos determinar o equilíbrio de um sistema através do grau de desordem, pois há
mais opções nas configurações desordenadas que nas ordenadas. Podemos dizer que o equilíbrio é
apenas alcançado quando a energia do sistema é mínima.
Resumindo, a tendência universal de todas as transformações é levar os sistemas ao estado de
equilíbrio, o que pode ser correlacionado com rearranjos das moléculas passando de configurações
ordenadas para configurações desordenadas. Para medir este grau de desordem foi definida uma função
de estado chamada Entropia (S) que está relacionada com o número de combinações (W) conforme a
equação:
S = k ln W (7)
onde k é a constante de Boltzmann. A entropia já havia sido definida por Clausius na Termodinâmica
Clássica, para máquinas térmicas, como

dqrev
dS = _________ (8)
T

onde dqrev seria a quantidade infinitamente pequena de calor trocada por um sistema com os arredores
quando sofresse um processo reversível, dS é a variação infinitesimal de entropia correspondente e T a
temperatura absoluta durante esta variação. Como a entropia é também uma função de estado, a sua
variação ('S) por um processo qualquer, em um dado sistema, pode ser calculada utilizando-se a equação
(8) e um processo reversível conveniente.
Podemos agora formular o Segundo Princípio: "Num sistema isolado, toda transformação
espontânea é aquela que se dá com aumento de entropia". E como na Natureza todos os processos são
irreversíveis, Clausius formulou o seguinte aforisma: "A energia do universo é constante, a entropia tende
para um máximo".
Na formulação deste conceito devemos enfatizar que se o sistema não for isolado, os arredores
estarão incluídos.
Portanto, podemos caracterizar um sistema em termos entrópicos da seguinte maneira:

a) Sistema aberto: (biológico)


Sistema Arredor
m
o

'Ssistema 'Sarredores

'STotal = 'Ssistema + 'Sarredores


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b) Sistema isolado:

Sistema Arredor

'S sistema 'Sarredores = 0

e portanto, 'STotal = 'Ssistema

Considerando-se um sistema aberto, sua variação de entropia, isoladamente ('Ssistema), não


é suficiente para definir a espontaneidade dos processos que nele ocorrem. Há necessidade de se
determinar também 'Sarredores e, às vezes, fica muito difícil delimitar as suas vizinhanças.
Para melhor esclarecermos este aspecto, consideramos o processo de formação do corpo humano.
Percebe-se que durante o mesmo há aumento da ordem e, portanto, 'Ssistema < 0 (entropia diminui),
concluiríamos pela não espontaneidade deste processo. Como você explica esta aparente contradição do
Segundo Princípio da Termodinâmica? Na realidade, durante a formação do corpo, temos que considerar
o 'Sarredores que, certamente, foi positivo o suficiente ('Sarredores >> 0), permitindo que 'STotal fique
também positivo ('STotal > 0), tornando o processo espontâneo.
O aumento contínuo na ordem dentro de uma célula viva deve ser acompanhado por um aumento
maior na desordem do meio ambiente da célula. O calor é a energia na sua forma mais desordenada ( o
movimento de moléculas ao acaso) e é liberado da célula através de reações que ordenam as moléculas
que o contém. Dessa forma, o universo como um todo se torna mais desordenado compensando o
aumento da ordem da célula, como requisitado pelas leis da Termodinâmica para processos espontâneos.

Como no estado hígido as células buscam sempre maior organização, podemos dizer que
diferença entre saúde e doença está apenas no aumento de Entropia nos estados patológicos. Assim,
enquanto em linguagem biológica podemos definir a ARTEROSCLEROSE como uma alteração patológica
decorrente da deposição de gordura e cálcio nas paredes dos vasos, acarretando alterações estruturais e
funcionais dos vasos, em linguagem termodinâmica ela poderia ser explicada como um aumento de
Entropia na circulação devido `a desorganização da estrutura íntima das artérias. Distúrbios energéticos
da hemodinâmica.

³1HQKXPDHVWUXWXUDQmRELROyJLFDQHQKXPDUWHIDWRDSHUIHLoRDGRSHOo homem, possui, a


37 °C, uma EnWURSLDWmREDL[DFRPRDGDFpOXODYLYD´ (Ibraim Felippe Heneine.)

Como vimos, para definir a espontaneidade de um processo através da entropia, devemos


determinar duas grandezas, 'Ssistema e 'Sarredor. Do ponto de vista operacional, a determinação do
'Sarredor não é muito prática, devido à conceituação de arredor ser, em alguns casos, difícil de ser
31
estabelecida. Em vista disso, procurou-se uma nova função de estado que dependesse de parâmetros
restritos ao sistema. Esta nova função é a chamada energia livre (G).

Energia livre

1- Conceito
A vida na terra é mantida graças a elevada entropia do Sol. Como se dá o processo de
transferência de energia do Sol para o Homem veremos mais adiante e, para isto necessitamos definir
uma outra função de estado: a energia livre (G). Esta função é uma propriedade extensiva.
A variação de energia livre ('G) representa o máximo de trabalho que se pode obter de um dado
processo isotérmico e isobárico, e guarda a seguinte relação com 'H e 'S:

'G = 'H - T'S (9)


Se o processo se der também a volume constante (o que é caso de processos biológicos), a energia livre
é dada por

'G = 'E - T'S (10)


onde não existe trabalho realizado por variação de volume. Como a maioria dos processos biológicos que
nos interessam se dá a pressão e temperatura constantes, o valor de 'G dado pela equação (9) nos
permite determinar a espontaneidade destes processos.
A variação de energia livre recebe este nome porque ela define aquela porção da variação total de
energia ('H ou 'E) que é disponível para realizar um trabalho qualquer quando o sistema caminha para o
equilíbrio (à pressão e à temperatura constantes). Atingido este equilíbrio, a entropia do sistema +
arredores aumentou ao máximo e G do sistema atingiu o mínimo, isto é, a capacidade de realizar trabalho
pelo sistema em equilíbrio se torna zero (observe pela equação (9) ou (10), que quanto maior o fator
entrópico T'S, mais negativo será o valor de 'G).
Em resumo, quando o sistema se encontrar em equilíbrio, 'G = 0, e se o sistema estiver fora do
equilíbrio, o processo se dará no sentido de se atingir sempre o valor mínimo de G. Logo, como 'G =
Gfinal - Ginicial e Ginicial é maior que Gfinal, temos que 'G<0, e dizemos que o processo é exergônico
ou espontâneo. Se determinarmos para um processo a temperatura e pressão constantes, um valor de 'G
> 0 (processo endergônico) podemos afirmar que o mesmo não é espontâneo. Vê-se, então, a importância
do parâmetro energia livre: ele nos permite definir o sentido ou a espontaneidade da transformação de um
sistema qualquer. Assim, para reação de hidrólise de ATP, podemos finalmente dar o seu sentido:
'G = -30514 J, logo, ela é espontânea, na temperatura e pressão estudadas.
No sistema biológico, ocorrem basicamente três tipos fundamentais de processos:
primeiro: a troca de informações entre organelas celulares, entre células, entre célula e meio
extracelular. Esta troca se dá graças aos transportes de "mensageiros", que podem ser moléculas
orgânicas (hormônios) ou inorgânicas e mesmo íons.
segundo: reações bioquímicas em cadeia que constituem o metabolismo em geral.
terceiro: interações químicas que permitem a estruturação de membranas, organelas celulares,
tecidos, etc., além dos processos que ocorrem em sistemas imunológicos (antígeno-anticorpo), e
farmacológicos (droga-receptor).
Em todos estes processos é sempre possível relacionar a variação de energia livre com alguma
propriedade de estado do sistema em estudo (concentração no caso de reações químicas ou transporte;
entropia e entalpia, no caso de interações químicas). Da análise desta variação de G, determina-se a
espontaneidade do processo, descrevendo, assim, o seu comportamento termodinâmico.

VI. TROCAS ENERGÉTICAS E A VIDA

1. Acoplamento de Transformações

Durante o relaxamento muscular ocorre a transferência de íons Ca2+ do citoplasma (10-5 M) para o
retículo sarcoplasmático (>> 10-5 M), caracterizando portanto, um processo endergônico (µCaret > µCacit).
Como, então, nos sistemas biológicos, ocorrem certos processos que analisados isoladamente, não são
espontâneos?
32
Isto só é possível se acoplarmos o processo endergônico ('G' > 0) a um processo exergônico
('G'' < 0) adequado, de maneira que a variação de energia livre total de ambos os processos combinados
satisfaça a condição de:
'G' + 'G'' = 'G < 0
o processo exergônico mais extensivamente utilizado nos organismos biológicos para se acoplar aos
processos endergônicos é o da hidrólise do ATP (adenosina trifosfato), dando ADP + Pi, com liberação de
32.000 J/mol de energia. A Figura 5 dá um esquema geral dos acoplamentos entre a reação de hidrólise
de ATP (produzido no organismo pela queima de glicose) e os demais processos biológicos que ocorrem
no homem. A energia proveniente da glicose é transferida ao fosfato inorgânico, que se liga ao ADP
através de uma ligação de "alta energia", formando ATP.
Esta molécula de ATP pode transferir este fosfato de alta energia à creatina formando então
creatina-fosfato que é a forma de armazenamento de ligações de alta energia, ou pode transferir, pelo
acoplamento, a energia a qualquer processo biológico, realizando qualquer trabalho celular. O que torna
possível o acoplamento e transferência de energia, e impede a quebra desacoplada das moléculas de alta
energia são as enzimas. Somente na presença de enzima apropriada, a creatina-fosfato transfere seu
fosfato de alta energia ao ADP, formando ATP. As enzimas, portanto, permitem que as reações se dêem
numa sequência útil para a vida celular.
O Sol é a fonte única de energia de toda a vida na Terra. Através de reações fotossintéticas nas
plantas verdes, um pouco desta energia é armazenada na forma de energia química nos carboidratos.
luz
nCO2 + nH2O o carboidrato + nO2
Esta energia química dos carboidratos recebida pelo homem é convertida nos seguintes usos
finais:
a. formação de membranas, células, organelas e órgãos
b. manutenção de temperatura
c. movimento (trabalho muscular)
d. síntese de materiais estruturais, tais como proteínas, lipídeos, etc.
e. atividade elétrica de sistemas musculares e nervosos
f. manutenção da homeostase celular

Pouca energia livre é desperdiçada pelo organismo biológico sendo ele por isto, um sistema
bastante eficiente. Em outras palavras, a queima da glicose, por exemplo, não se dá numa única centelha
(como no pouco eficiente motor de combustão interna), mas numa série de etapas, cada uma das quais
diminui o potencial termodinâmico G, de um degrau relativamente pequeno, que será transferido a
ligações químicas de alta energia. Um exemplo deste tipo de processo será visto em Bioquímica com o
nome de ciclo de Krebs onde se tem que a transferência de energia a cada estágio ocorre através das
ligações fosfato de alta energia. No final deste ciclo tem-se a produção de 38 ligações deste tipo. A
combustão de um mol de glicose produz 2.867.480 J de energia pela via aeróbica, e no sistema biológico,
1.207.184 J desta são convertidos em ligações químicas de alta energia, que serão envolvidos na
manutenção e no trabalho celular. Logo a eficiência deste sistema é de 42% (!). Para você poder
comparar, temos que uma máquina térmica a vapor, ideal, tem eficiência de 21,4% (se queimasse a
mesma quantidade de glicose).

ENERGÉTICA DAS INTERAÇÕES BIOLÓGICAS

Como sabemos, todos os processos biológicos nos animais homeotérmicos ocorrem a


temperaturas definidas (37qC) e a uma pressão ambiente constante em torno de uma atmosfera. Nestas
condições, a análise termodinâmica de qualquer tipo de interação pode ser efetuada com base na
equação clássica:

'G = 'H - T'S

E, se considerarmos que a maioria destes processos também ocorre sem alterações significativas
de volume, a equação ainda passa a ser representada do seguinte modo:

'G = 'E - T'S


33

Deste modo, a espontaneidade de qualquer processo que envolva interações moleculares é regida
basicamente pelos fatores entálpico e entrópico do sistema. Quanto maior a diminuição da entalpia e/ou
aumento da entropia (desordem do sistema) mais estável será a estrutura formada, pois esta atinge um
valor mínimo de energia livre ('G  0).
Vamos tomar como exemplo inicial o processo de fusão e evaporação da água.
Quando o gelo funde ou a água evapora, uma certa quantidade de energia calorífica é absorvida
pelo sistema.

H2O(s) o H2O(l) 'H= +5.9 KJ/mol

H2O(l) o H2O(g) 'H= +4.4 KJ/mol

'H= 'Hf - 'Hi

Durante a fusão ou evaporação a entropia do sistema aumenta à medida que os arranjos de


moléculas de água tornam ± se menos ordenados.

PROCESSO ESPONTÂNEO: 'G < 0 (variação de energia livre )

'G = 'H - T'S

'G= força impulsionadora


'H= energia originada da quebra e síntese das ligações
'S= representa o aumento da desordem

Desde que 'H é positivo para fusão e evaporação, é claro que é o aumento na entropia ('S) que
faz 'G ser negativo e impulsiona estas transformações.

Voltemos agora ao exemplo de um complexo sendo formado a partir de uma mistura heterogênea
de inúmeras moléculas orgânicas e íons e tendo-se a água como o único solvente deste processo de
estruturação. Logicamente a espontaneidade ou não da formação deste complexo será dependente da
somatória dos fatores entálpicos e entrópicos de todas as interações químicas efetuadas (formadas ou
rompidas) entre os diferentes solutos entre si e com as moléculas de água.
Para que possamos entender melhor este processo da formação do complexo, precisamos agora
introduzir os seguintes tópicos:

Hidratação de moléculas polares

A água é um solvente polar e por isso ela dissolve facilmente as biomoléculas carregadas
eletricamente ou polares.
As biomoléculas polares dissolvem±se facilmente na água porque elas podem substituir as
interações moleculares água ± água energeticamente favoráveis por água ± soluto (pontes de hidrogênio e
interações eletrostáticas).
Assim, os açúcares, dissolvem ± se facilmente na água devido ao efeito estabilizador das
numerosas pontes de hidrogênio que elas formam entre os grupos hidroxila e o oxigênio do grupo
carboxila do açúcar de um lado e as moléculas polares do outro.
A água interage eletrostaticamente com solutos que exibem carga elétrica.
34
A água dissolve sais como o NaCl por hidratação e estabilização dos íons sódio e cloreto
enfraquecendo suas interações eletrostáticas e, desta forma, contrapondo± se à tendência deles a se

F= Q1. Q2
Hr2
associarem, formando uma rede cristalina. A solubilidade na água, de solutos carregados também é o
resultado da hidratação das cargas e da atenuação da interação entre elas. A força (F) destas interações
iônicas depende da magnitude das cargas (Q), da distância entre os grupos carregados ( r ) e da
constante dielétrica ( H ) do solvente no qual a interação ocorre:

H = é uma propriedade física que reflete o número de dipolos em um solvente. A 250C, H água = 78.5
enquanto a do benzeno é de = 4.6.
Todas as moléculas de solutos ou íons dissolvidos na água interferem com as pontes de hidrogênio
e algumas moléculas de água que estão na sua vizinhança imediata; entretanto os solutos polares ou
carregados compensam parcialmente a perda de pontes de hidrogênio pela formação de novas interações
água-soluto. A variação de Entalpia ( 'H ) é pequena .
A formação de pontes de hidrogênio entre as moléculas de água e substâncias cristalinas provoca
algum ordenamento das moléculas de água, entretanto à medida que um sal como o NaCl se dissolve, os
íons Na+ e Cl- , ao deixarem a grade cristalina, adquirem um grau de liberdade muito maior do que aquele
que possuíam no cristal, ocorrendo um aumento na entropia (Figura 22).
O conseqüente aumento na entropia é maior responsável pela facilidade de dissolução de sais
como o NaCl na água (Figura 22).
Em termos termodinâmicos, a formação da solução ocorre com uma variação favorável na energia
livre: 'G= 'H - T'S, onde 'H tem um valor positivo pequeno e T'S um valor positivo grande, assim 'G é
negativo.

Figura 22: Hidratação hidrofílica (Solubilização do NaCl em água).

HIDRATAÇÃO DE MOLÉCULAS APOLARES

Compostos não polares forçam mudanças energeticamente desfavoráveis na estrutura da água.


Quando a água é misturada com compostos apolares formam ± se duas fases, nenhum composto é
solúvel no outro. Estes compostos são hidrofóbicos. Eles são incapazes de interagir de forma
energeticamente favorável com as moléculas da água e interferem com as pontes de hidrogênio entre as
moléculas de água.
Estas moléculas não polares tendem, quando em solução aquosa a agregarem±se de forma a
minimizar os efeitos energeticamente desfavoráveis provocados por sua presença.
35
Há uma nítida diminuição da entropia do sistema devido a uma organização maior das moléculas
de água em torno do soluto apolar. E por serem moléculas com possibilidade de interagir apenas por
ligações muito fracas (van der Waals), pois podem, no máximo, apresentar dipolos instantâneos ou
induzidos. Por isso, praticamente não se observam alterações no valor entálpico deste processo ('H #0).
Deste modo, como há uma predominância do efeito entrópico ('S < 0), o valor final de 'G será positivo e
este processo de dissolução do composto apolar em água não é espontâneo ('G >0).
Concluindo, a espontaneidade para este tipo de composto será a de fugir do contato com as
moléculas de água e interagir entre si. Esta é a chamada interação hidrofóbica (Figura 23).

Figura 23: Interação Hidrofóbica: água aproxima grupos hidrofóbicos, a fim de minimizar o efeito
entrópico.

Um exemplo simples e clássico deste tipo de interação é a mistura água: benzeno (apolar). As
moléculas de benzeno se associam entre si, fora do contato com a água. Forma-se, portanto, uma solução
com duas fases imiscíveis.
Os gases não polares também são pouco solúveis na água. Nas moléculas diatômicas O2 e N2 os
elétrons são compartilhados igualmente pelos dois átomos.
No CO2, cada ligação C = O é polar, mas os dois dipolos estão direcionados de forma oposta e
cancelam ± se mutuamente.
A passagem dessas moléculas da fase gasosa desordenada para a solução restringe a liberdade
de movimento e portanto representa uma diminuição na entropia. Esses gases são portanto muito pouco
solúvel em água.
Portanto, baseado no que foi acima explicado podemos concluir que, a análise termodinâmica da
formação espontânea de uma estrutura baseia-se nos seguintes mecanismos:

Interação hidrofóbica: associação entre grupos apolares (geralmente cadeias alifáticas ou


aromáticas de proteínas, lipídeos, etc.) no sentido de fugir do contato com a água e evitar diminuição da
entropia do sistema).
Hidratação e interação hidrofílica: associação entre grupos polares e ionizados entre si ou com
moléculas de água.
Sabendo-se que muitos dos componentes biológicos como proteínas e lipídeos são substâncias
anfipáticas, isto é, podem apresentar dualidade de funções químicas, isto é, regiões polares e apolares
em uma mesma molécula, os mesmos se orientarão e se associarão na mistura aquosa heterogênea de
conformidade com estas regras termodinâmicas citadas, à procura sempre de um estado final mais
estável. Como exemplo temos os fosfolipídeos (Figura 24).

Figura 24: Arranjo dos fosfolipídeos em solução aquosa.


36

COMPOSIÇÃO E ESTRUTURAÇÃO DE MEMBRANAS CELULARES

A membrana celular é formada predominantemente de proteínas e lipídeos ligados por interações


não covalentes. A membrana plasmática contém, em geral, 20 a 70 de seu peso em proteínas, 20 a 40%
em lipídeos e o restante em carboidratos.
As membranas são barreiras de permeabilidade altamente seletivas. Criam compartimentos que
podem ser toda a célula ou uma organela dentro da célula. Bombas e poros na membrana regulam a
composição molecular e iônica destes compartimentos. As membranas também controlam o fluxo de
informações entre células e, além disso, estão intimamente envolvidas em processos de conversão de
energia como a fotossíntese e a fosforilação oxidativa.
As membranas são estruturalmente e funcionalmente assimétricas, como exemplificado pelos seus
sistemas direcionais de transporte de íons (que veremos posteriormente) e a ligação de carboidratos
apenas na superfície externa das membranas plasmáticas de mamíferos (Figura 25). As membranas de
células eucarióticas contêm geralmente de 2 a 10% de carboidratos na forma de glicolipídeos e
glicoproteínas.

Figura 25: Localização dos resíduos de açucares de glicoproteínas e glicolipídeos na superfície externa
da membrana plasmática de mamíferos.

Lipídeos

As principais classes de lipídeos da membrana são os fosfolipídeos, glicolipídeos e colesterol.


Os fosfolipídeos são derivados ou do glicerol ou da esfingosina. Os fosfolipídeos derivados do
glicerol são chamados de fosfoglicerídeos, sendo que um fosfoglicerídeo consiste de um esqueleto de
glicerol, duas cadeias de ácido graxo e um álcool fosforilado. Cada molécula de fosfolipídeo, portanto, tem
uma cauda hidrofóbica, composta de 2 cadeias de ácidos graxos e uma cabeça polar, onde o fosfato está
localizado (Figura 26 ).
37

Figura 26 : As partes de uma molécula de fosfolipídeo.

A esfingomielina é o único fosfolipídeo na membrana que não é derivado do glicerol. Em vez dele,
o esqueleto na esfingomielina é a esfingosina (Figura 27).

Figura 27: O esqueleto na esfingomielina é a esfingosina

Os glicolipídeos são também lipídeos derivados da esfingosina, contendo um ou mais açúcares no


lugar da unidade de fosforil-colina da esfingomielina .

O colesterol é um esteróide, presente em células eucarióticas, mas não em células


procarióticas.Também é uma molécula anfipática, possuindo uma cabeça polar e uma cauda apolar
(Figura 28 ).
38

Figura 28: Molécula do colesterol.

A tabela mostrada abaixo, indica as unidades hidrofílicas e hidrofóbicas dos principais lipídeos de
membrana.

Tabela 1. Unidades hidrofóbicas e hidrofílicas de lipídeos de membrana.

Lipídeo de membrana Unidade hidrofóbica Unidade hidrofílica

Fosfoglicerídeo Cadeias de ácido graxo álcool fosforilado

Esfingomielina Cadeia de ácido graxo e fosforil-colina


cadeia de hidrocarboneto da
esfingosina

Glicolipídeo Cadeia de ácido graxo e Açucares


cadeia de hidrocarboneto da
esfingosina

Colesterol Molécula inteira, exceto o grupo OH no C-3


grupo OH

Em soluções aquosas os lipídeos simples como os ácidos graxos que são compostos anfipáticos
(ou anfifílicos), isto é, possuem tanto uma região apolar quanto uma polar tendem a formar uma estrutura
denominada micela.
Nas micelas, os lipídeos posicionam-se de modo a ter a cabeça polar para fora, em contato com o
solvente ou íons, e a cauda apolar para dentro. A constituição de uma micela é regida por dois
mecanismos básicos:
a. interação hidrofóbica das caudas em sua região central.
b. repulsão eletrostática entre cabeças ionizadas ou hidratação de cabeças polares.
Estes dois mecanismos funcionam de uma maneira sincrônica. No caso de lipídeos com cabeças
ionizadas com cargas de mesmo sinal, a força de atração entre as caudas hidrofóbicas compensa a
39
repulsão eletrostática das cabeças. Em uma micela estável, as cabeças estão posicionadas em uma
distância suficiente para tornar desprezível esta repulsão. No caso de micelas com cabeças polares em
que a repulsão eletrostática esteja ausente, as cabeças interagem entre si ou precisam ter uma posição
relativa tal que permita a formação de camadas de hidratação e de interação com íons suficientes para
contribuir na estabilização micelar.

Os fosfolipídeos, cuja estrutura apresenta duas cadeias alifáticas na cauda para apenas uma
cabeça apolar, também são compostos do tipo anfipático. Entretanto, diferentemente dos ácidos graxos,
em solução aquosa estruturam-se formando as chamadas bicamadas. (Figura 29).

Figura 29: Estrutura geral de lipídeos em solução aquosa

Do mesmo modo que nas micelas vistas anteriormente, duas forças opostas integram-se para
estabilizar a estruturação das bicamadas: a atração hidrofóbica na matriz central e a repulsão eletrostática
das cabeças polares ou ionizadas. No caso das bicamadas, contudo, o fato de existir duas cadeias para
cada cabeça permite a estruturação lamelar em que o maior efeito hidrofóbico central permite uma maior
aproximação das cabeças polares ou ionizadas. Por isso, a bicamada tem a tendência geral de crescer
nos dois sentidos e fundir seus dois extremos para formar uma vesícula (lipossomo) (Figura 29).
A preferência para uma estrutura em bicamada é de importância biológica crítica. Uma micela é
uma estrutura limitada, cujo tamanho em geral é inferior a 20 nm de diâmetro. Em contraste, uma camada
bimolecular pode ter dimensões macroscópicas de até 1 milímetro (106 nm).
40
A figura abaixo esquematiza a distribuição dos lipídeos na membrana:

Figura 30: Esquema da distribuição dos lipídeos na membrana.

Se a membrana celular fosse constituída somente por lipídeos, como


seria sua permeabilidade?

A figura abaixo (Figura 31) mostra que quanto menor for a molécula e quanto mais solúvel ela for em óleo
(isto é, quanto mais apolar ou hidrofóbica ela for) mais rapidamente ela se difundirá através de uma
bicamada lipídica. Por outro lado, a bicamada lipídica é altamente impermeável à moléculas carregadas.

Figura 31: Esquema mostrando a permeabilidade de uma bicamada lipídica.


41
Entretanto, diversas moléculas polares, tais como íons, açúcares, aminoácidos, nucleotídeos, etc,
que são essencialmente hidrossolúveis e com baixa solubilidade em lipídeos, apresentam a capacidade de
atravessar as membranas biológicas. Isto é possível pela presença das proteínas transportadoras na
membrana, as quais conferem seletividade à membrana plasmática.

Proteínas

As diferentes funções da membrana biológica, como o transporte, comunicação e transdução de


energia, são mediadas por proteínas específicas que se associam à bicamada lipídica. De acordo com
esta associação, as proteínas podem ser classificadas em dois tipos fundamentais:

x Proteínas periféricas ou extrínsecas

Ficam localizadas preferencialmente na parte externa da bicamada. Requerem, portanto,


tratamentos brandos tais como aumento da força iônica do meio ou adição de um agente quelante para
dissociá-las, molecularmente intactas, da membrana. Elas dissociam-se livre de lipídeos e, neste estado
dissociado, são relativamente solúveis em meio aquoso neutro. Estes critérios sugerem que a proteína
periférica está presa à membrana por interações não covalentes, principalmente do tipo eletrostática, e
não está fortemente associada aos lipídeos da membrana. Como exemplos de proteínas periféricas temos
o citocromo C (na superfície interna da membrana de mitocôndrias) e a espectrina (na superfície interna
da membrana de eritrócitos).

x Proteínas integrais ou intrínsecas

Localizam-se predominantemente dentro da bicamada lipídica, podendo inclusive atravessá-la de


um lado a outro (proteína transmembrana). Para dissociá-las da membrana necessitam-se tratamentos
muito mais drásticos, com reagentes tais como detergentes, desnaturantes protéicos ou solventes
orgânicos. Em muitos casos elas permanecem associadas aos lipídeos e mesmo quando, finalmente
dissociadas, são altamente insolúveis ou formam agregados em solução aquosa neutra. As proteínas
integrais constituem a principal porção (>70%) das proteínas membranais.
O fato de as proteínas integrais localizarem-se preferencialmente dentro da matriz lipídica sugere
um caráter bastante apolar à sua estrutura química. Na realidade, a maioria destas proteínas tem
propriedades anfipáticas como os fosfolipídeos, isto é, elas são estruturalmente assimétricas, com um
terminal altamente polar (em contato com o meio exterior aquoso ou com a cabeça polar dos lipídeos) e
outro apolar (dentro da bicamada lipídica). A região polar destas proteínas integrais seria principalmente
aquela na qual se localizariam as cadeias laterais ionizáveis de alguns aminoácidos e os resíduos polares
de certos carboidratos covalentemente ligados a elas. A região apolar seria aquela praticamente isenta
destes resíduos polares, contendo uma grande quantidade de resíduos de aminoácidos apolares.
A figura 32 mostra um esquema da membrana plasmática, com as proteínas nela inseridas.

Figura 32: Localização postulada de proteínas periféricas e integrais em membranas biológicas.


42
As proteínas presentes na membrana podem realizar inúmeras funções, sumarizadas na figura
abaixo:

Figura 33: Principais funções das proteínas de membrana.

Modelo do mosaico fluido

Os requisitos termodinâmicos necessários para uma estruturação estável, associados à


composição química da membrana, colocam restrições nos modelos propostos para sua estrutura. Dessa
forma, diversos modelos anteriormente propostos para a membrana celular tornam-se altamente
improváveis. Por exemplo, analisemos o modelo clássico de um arranjo trilamelar de uma bicamada
lipídica contínua disposta entre duas monocamadas de proteínas. Esse modelo é termodinamicamente
instável não somente porque os resíduos de aminoácidos apolares das proteínas estão amplamente
expostos à água, mas também porque os grupos iônicos e polares dos lipídeos estão sequestrados do
contato com a água por uma camada de proteínas. Desta forma, nem interações hidrofóbicas nem
hidrofílicas estão facilitadas neste modelo clássico.
As considerações termodinâmicas e os resultados experimentais obtidos até agora se encaixam no
modelo do mosaico fluido proposto em 1972 por Singer e Nicholson. Neste modelo as proteínas periféricas
e os carboidratos posicionam-se em contato com o meio aquoso externo. As proteínas integrais
constituem um conjunto heterogêneo de moléculas globulares, cada uma delas arranjada em uma
estrutura anfipática, com os grupos iônicos e polares destacando-se da membrana e entrando em contato
com o meio aquoso e os grupos apolares mantidos no interior hidrofóbico da bicamada lipídica da
membrana (Figura 34).

Figura 34: Modelo do mosaico fluido (aspecto tridimensional). Observa-se a matriz lipídica e as proteínas
distribuídas aleatoriamente no plano da membrana.
43

A massa de fosfolipídeos está organizada como uma bicamada fluida, descontínua, embora uma
pequena fração de lipídeos possa interagir especificamente com as proteínas da membrana. O grau de
fluidez das membranas depende do comprimento da cadeia e do grau de insaturação de seus ácidos
graxos constituintes. A maioria dos lipídeos que compõem as membranas biológicas possui ponto de fusão
abaixo da temperatura corporal.
Este aspecto da fluidez é de grande importância para a função biológica das membranas pois este
estado semilíquido (semelhante ao azeite de oliva) permite um alto grau de movimentação de muitos
componentes de sua estrutura. Tal fato introduz uma concepção dinâmica para as membranas celulares,
onde as proteínas e os lipídeos difundem-se rapidamente no plano da membrana (difusão lateral), a
menos que sejam restritos por interações especiais (presença de colesterol). Em contraste, a rotação de
proteínas ou lipídeos de uma face a outra da membrana (difusão transversa ou "flip-flop") é em geral muito
lenta.
Estudos feitos na última década têm mostrado evidências de que os lipídeos na membrana não
estão distribuídos de maneira aleatória. A membrana não representa apenas um mar de lipídeos, onde as
SURWHtQDVYLVWDVFRPR³LFHEHUJV´HVWmRLQVHULGDV0DLVGRTXHLVWRH[LVWHXPDHVWUXWXUDGHQWURGR³PDU
de lipídeos, que por sua vez impõe uma organização na distribuição de proteínas na bicamada. Esta
estrutura dentro do oceano de lipídeos são chamadas de balsas ( ³UDIWV´ GHOLStGHRV )LJXUD ).
(VWHV ³UDIWV´ GH OLStGHRV VmR UHJL}HV GD PHPEUDQD FHOXODU FRP HOHYDGR FRQWH~GR GH FROHsterol,
esfingomielina e glicoesfingolipídeos e freqüentemente pobres em glicerofosfolipídeos. A cadeia lateral de
iFLGRVJUD[RVGRVIRVIROLStGHRVSUHVHQWHVQRV³UDIWV´WHQGHPDVHUPDLVVDWXUDGRVGRTXHDGRVOLStGHRV
circundantes. Este fato, aliado a presença de alto conteúdo de colesterol tornam esta região mais
empacotada que as regiões vizinhas.
$ SUHVHQoD GHQWUR GHVWHV ³UDIWV´ GH OLStGHRV GH XPD YDULHGDGH GH SURWHtQDV GH PHPEUDQD
envolvidas na sinalização celular, tem levado a um consenso de que estes domínios de lipídeos tenham
um importante papel no mecanismo de transdução de sinal.
8PD YDULHGDGH GH HVWXGRV GHPRQVWUDP TXH ³UDIWV´GH OLStGHRV FRP GLVWLQWDV SURWHtQDV H RX
componentes lipídicos coexistem dentro da célula e que eles podem ser mobilizados para diferentes
regiões da célula, frente a um estímulo.

Figura 35: (VTXHPDGHPHPEUDQDVDOLHQWDQGRRV´UDIWV´GHOLStGHRV

Concluindo, todas estas considerações feitas até o momento permitiram um entendimento mais
completo da estruturação de uma membrana biológica e é esta sua natureza dinâmica e complexa que vai
lhe possibilitar exercer diferentes funções vitais, tais como:
a) receber e transmitir sinais químicos
b) transportar moléculas pequenas ou íons
c) englobar partículas por fagocitose ou pinocitose
d) estabelecer o limite físico celular
e) resguardar o conteúdo celular
44
TRANSPORTE ATRAVÉS DE MEMBRANAS

Transporte passivo simples (difusão simples)

O transporte é considerado passivo quando sua realização não requer gasto de energia por parte
da célula. O transporte passivo simples pode ser classificado em difusão simples ou osmose. Suponha um
recipiente contendo duas soluções de concentrações diferentes, separadas por uma membrana
permeável, isto é, que permita tanto a passagem do solvente como a do soluto. Nestas condições, o soluto
atravessará a membrana obedecendo a um gradiente de concentração, ou seja, passará do meio em que
se encontrar mais para o meio em que se encontrar menos (ou seja, do compartimento de maior potencial
químico para o de menor potencial químico). A este tipo de transporte denomina-se difusão simples.

Difusão simples
Os principais pontos da difusão são:
1. O sentido espontâneo da difusão se dá sempre do compartimento de maior potencial químico (P)
do soluto para o de menor potencial químico;

2. A força responsável pela difusão de um soluto entre dois compartimentos é o gradiente de


potencial químico ou, mais especificamente, o gradiente de concentração.

3. O fluxo de soluto é dado pela lei de Fick, J = P'C, onde J representa o fluxo resultante do soluto
(mol.cm-2. min-1), 'C representa a diferença de concentração entre os dois compartimentos (mol/l) e P
representa a permeabilidade da membrana ao soluto (cm.min-1).
Diversos fatores influenciam a permeabilidade da membrana celular aos solutos, tais como
coeficiente de partição (ver mais adiante), tamanho e conformação molecular, carga do soluto, etc.
A velocidade com que uma substância atravessa a membrana celular pode ser medida pela
velocidade com que a concentração intracelular (Ci) aumenta quando a célula é colocada em uma solução
contendo a substância (Figura 36 ).

Figura 36: Comparação entre as velocidades de difusão de 3 moléculas diferentes através da membrana
celular a uma concentração externa constante.

Assim, quanto maior a permeabilidade da membrana a um soluto, mais rapidamente este penetra
na membrana e se difunde através dela. No gráfico da Figura 36, PA>PB>PC. Tanto a estrutura da
membrana quanto a estrutura química da substância transportada influem diretamente na permeabilidade.
Como já foi visto anteriormente, a matriz da membrana celular é constituída de uma bicamada lipídica.
Assim, a passagem de substâncias da fase aquosa (extracelular) para a lipídica (fase membrana), e da
lipídica (fase membrana) para a aquosa (intracelular), representam barreiras que só podem ser
ultrapassadas pelas moléculas que possuírem energia de ativação suficiente. A seguinte ilustração
esclarece o problema:
45

Meio extracelular Membrana Celular Citoplasma


(*aquoso) (lipídica) (aquoso)

o fácil difícil o
MASL MASL - molécula com alta solubilidade
em lipídeos ou alto coeficiente de partição

o
o difícil fácil MBSL - molécula com baixa solubilidade
MBSL em lipídeos ou baixo coeficiente de
partição

Definimos coeficiente de partição (Kp) como a medida da solubilidade relativa de uma substância
em óleo e em água. Podemos verificar pela figura da página anterior que uma substância com alto
coeficiente de partição terá facilidade tanto para a sua entrada quanto para a sua difusão através da
membrana, mas a sua passagem para o meio aquoso intracelular será muito dificultada. Por outro lado,
uma substância com baixo coeficiente de partição terá muita dificuldade tanto em penetrar como em se
difundir através da membrana, enquanto que a sua entrada no citoplasma estará facilitada. De fato,
quando se estuda a capacidade de uma série de substâncias em atravessar membranas biológicas,
observa-se que a permeabilidade está diretamente
relacionada com o seu coeficiente de partição, uma vez que P = m.R.T.Kp/'x, onde m é a mobilidade do
soluto na membrana (mol.cm2.s-1.J-1) e 'x é a espessura da membrana (cm).
Existem alguns tipos de moléculas que possuem alta constante de permeabilidade, apesar de
terem baixo coeficiente de partição. Como exemplos, temos a água e os íons K+, Na+ e Cl- . Outro fator
que influencia a permeabilidade da membrana às substâncias é o tamanho molecular. Algumas
substâncias com diâmetro molecular elevado conseguem penetrar rapidamente na célula em função de
seu alto coeficiente de partição. Entretanto, se compararmos duas substâncias com coeficientes de
partição iguais, será mais permeante aquela que tiver menor tamanho molecular.
A maior parte das substâncias de importância biológica é essencialmente hidrossolúvel, com baixa
solubilidade em lipídeos. Apesar disto, tem a capacidade de atravessar as membranas biológicas. Estas
observações levaram à hipótese da existência de poros nestas membranas. Tais poros seriam canais
cheios de água que atravessariam as membranas de lado a lado, dando passagem às substâncias
hidrossolúveis. O diâmetro destes poros pode ser medido indiretamente através do estudo da
permeabilidade das membranas a moléculas hidrossolúveis de diâmetro conhecido.
É evidente que a permeabilidade da membrana à substâncias que a atravessam por meio de poros
vai depender do diâmetro do poro e da carga do mesmo, assim como da camada de hidratação (caso de
íons), entre outros fatores.

Osmose
Osmose refere-se ao fluxo de solvente (em geral água) através de uma barreira (membrana) como
resposta a um gradiente de concentração de solutos impermeantes. Difusão e osmose são fenômenos
relacionados, pois ambos são processos espontâneos que envolvem transporte de matéria em resposta a
gradientes de concentração. No entanto, somente na osmose esse transporte de matéria vem
acompanhado de uma mudança no volume. A osmose pode ser vista como uma difusão particular da
água, causada indiretamente por gradientes de concentração de solutos impermeantes. Como a água é o
solvente por excelência em sistemas biológicos e as membranas são permeáveis à água (mas
impermeáveis a diversas moléculas e íons), a osmose é um fenômeno de grande relevância biológica e
médica. De fato, como a forma da membrana plasmática pode sofrer alterações perigosas em decorrência
do desequilíbrio osmótico, o controle dos processos osmóticos é fundamental na distribuição de água
entre os diversos compartimentos do organismo e na manutenção do volume celular. Pensando em termos
46
de aplicação médica, procure imaginar como suas hemácias reagiriam se você recebesse na veia um
VRURFRPDFRQFHQWUDomR³HUUDGD´GH1D&O
Membranas permeáveis à água e impermeáveis ao soluto são denominadas semipermeáveis. Se a
membrana é permeável a alguns solutos e não a outros, é chamada de seletivamente permeável. A Fig.
37 mostra um tubo em U contendo na parte inferior uma membrana semipermeável. Inicialmente, o
recipiente da esquerda contém água pura e o da direita uma solução concentrada de um soluto
impermeante. A altura inicial da coluna líquida nos dois lados do tubo é a mesma (Fig. 37a).

Figura 37: Tubos interligados por uma membrana semipermeável na parte inferior. Na situação inicial (a)
existe água pura no lado esquerdo e uma solução com solutos impermeantes do lado direito. Após atingir
o equilíbrio (b) a água migrou para a direita, aumentando a altura na coluna de água deste lado. O
equilíbrio também pode ser atingido se uma pressão hidrostática equivalente for aplicada ao tubo da direita
de forma a impedir o fluxo de água (c).

Inicialmente, o potencial químico da água nos dois compartimentos não é o mesmo. O potencial
químico de uma substância em uma solução depende da sua fração molar (concentração). No lado
esquerdo haverá somente moléculas de água; portanto, o potencial químico da água será o mesmo que
em uma solução padrão de água pura. Já no lado direito, o potencial químico da água é menor, pois há
moléculas de soluto presentes; portanto, a fração molar (concentração) de água será menor. Como a
membrana permite a passagem da água (mas não do soluto), a água fluirá do compartimento com maior
potencial químico de água (esquerda) para aquele com menor potencial químico de água (direita),
causando um aumento na altura da coluna de água no lado direito (e diminuição no lado esquerdo). À
medida que a água atravessa a membrana, a coluna de água no lado direito aumenta, gerando uma
diferença de pressão hidrostática. Gradativamente, o potencial químico da água aumentará no lado direito,
pois além de aumentar a fração molar de água, surgirá um termo adicional ao potencial químico da água,
proporcional à diferença de pressão hidrostática, dada por 'S Ugh (U é a densidade da água, g a
constante de gravitação e h corresponde à altura da coluna). Este processo continuará até que o potencial
químico da água seja igual nos dois lados Isto finalmente ocorre quando a diferença de pressão, ¨S, entre
os dois compartimentos, compensa a diferença de concentração de água nos dois lados (Fig. 37b). Essa
pressão 'S adicional é chamada de pressão osmótica, e pode ser entendida como a pressão hidrostática
que deve ser aplicada à solução mais concentrada em impermeantes para que não haja fluxo resultante
de água (Fig. 37c).
Em soluções não muito concentradas, e assumindo que a membrana é absolutamente
impermeável ao soluto, a diferença de pressão osmótica entre dois compartimentos com concentrações
diferentes de soluto pGDGDSHODHTXDomRGHYDQ¶W+RII YHMDOHLWXUDFRPSOHPHQWDUDEDL[R 
'S RT 'C imp (7)
No SI, a unidade de pressão é pascal (Pa) e ¨Cimp é a diferença de osmolaridade (unidade: osmol/l) entre
os dois compartimentos. Se houver diferentes solutos em solução, a pressão osmótica total será dada pela
soma de todas as diferenças de concentração dos solutos. Em geral, somente a diferença de
concentração dos solutos impermeantes deve ser levada em conta, pois as diferenças de concentração
dos solutos permeantes serão dissipadas no equilíbrio.
O fluxo de água sempre se dará do compartimento de menor para o de maior pressão osmótica.
Podemos caracterizar a pressão osmótica em cada compartimento em função da concentração de solutos
impermeantes neste compartimento:
S1 = RT C1 S2 = RT C2
¨S = RT ¨Cimp (8)
Isto facilita a determinação do sentido do fluxo de água entre os compartimentos envolvidos.
47
É importante sempre ter em mente que o sentido do fluxo resultante de água só depende da
diferença de concentração (ou fração molar) de água. Entretanto, em geral temos acesso somente à
concentração dos solutos. Quanto maior a concentração de solutos impermeantes, menor será a fração
molar de água e, portanto, menor será o potencial químico da água. Portanto, é possível avaliar o fluxo de
água a partir da soma das concentrações de todos os solutos (impermeantes) em solução (osmolaridade).

i) Osmolaridade. A osmolaridade, ou concentração osmótica de uma solução, depende somente


do número total de partículas dispersas na solução e não da natureza química dos solutos. Assim,
soluções 1 M de ureia ou 1 M de sacarose terão todas a mesma osmolaridade. Entretanto, se o soluto for
um eletrólito, deve-se considerar como partículas dispersas todos os íons que este soluto fornece em
solução. Por exemplo, uma solução 1 M de NaCl tem a mesma concentração osmótica que 2 M de glicose,
pois 1 M de NaCl se dissocia em 1 M de Na+ e 1 M de Cl- em meio aquoso. Da mesma maneira, 1 M de
Na2SO4 resulta em 2 M de Na+ e 1 M de SO4±, equivalente a 3 M de glicose. A unidade que expressa
osmolaridade é osmol/l. Portanto, 1 M de glicose resulta em uma solução 1 osmol/l, 1 M de NaCl tem
concentração osmótica de 2 osmol/l; 1 M de CaCl2 tem concentração osmótica de 3 osmol/l, etc.

ii) Tonicidade. A tonicidade de uma solução é definida em função de sua capacidade para causar
deslocamento de água através de uma membrana semi-permeável. É preciso estar muito claro que
concentração osmótica não implica necessariamente em atividade osmótica; ainda que haja diferença de
concentração entre as partículas de cada lado, a diferença de pressão osmótica será nula se a membrana
for permeável às partículas. Assim, a forma de uma membrana celular é um indicador vivo da quantidade
relativa de partículas no meio externo que não conseguem atravessar esta membrana; em outras palavras,
é um indicador vivo da tonicidade do meio externo em relação à tonicidade do meio interno; esta é dada
em função da concentração osmótica dos impermeantes presentes no meio intracelular. Colocando o
problema em termos investigativos (não apenas classificatórios), se uma célula sofreu lise, este fato indica
que ocorreu movimento de água através da membrana no sentido fora-dentro da célula; em relação à
célula, isto significa que a fração molar de água no meio externo era maior; a tonicidade (concentração de
impermeantes) do banho era menor; portanto, o meio era hipotônico. Inversamente, se uma célula
murchou, então houve movimento de água no sentido dentro-fora da célula; em relação à célula, a fração
molar de água no meio externo era menor; a tonicidade do banho era maior; portanto, o meio era
hipertônico. O caso intermediário (frequentemente usado como controle) é de uma célula que não mudou
de forma; se a célula continua íntegra, água não saiu da célula nem entrou nela; então, as frações molares
de água nos meios externo e interno são iguais; a tonicidade do banho é igual à da célula; portanto, o meio
é isotônico. Esses três casos estão exemplificados na Figura 38.

Figura 38: Tonicidade de uma solução em relação ao interior de uma célula (hemácia). Em uma solução isotônica não ocorre
alteração de volume celular. Em presença de uma solução hipotônica (hipertônica) o volume interno aumenta (diminui).

TONICIDADE ALTERAÇÃO DO VOLUME CELULAR


HIPOTÔNICA aumento do volume celular (inchamento, lise)
ISOTÔNICA manutenção do volume celular
HIPERTÔNICA diminuição do volume celular (murchamento)
48
Resumindo, Osmose é o fluxo de solvente através de uma membrana semi-permeável (isto é,
que permite apenas a passagem do solvente) que separa dois compartimentos contendo um soluto em
diferentes concentrações. Com relação à osmose:

1. O transporte de água é passivo e ocorre do compartimento de menor pressão osmótica para o


de maior pressão osmótica;
2. A pressão osmótica é, por definição, a diferença de pressão que deve existir entre esta e seu
solvente puro para que não haja fluxo de solvente através de uma membrana semi-permeável. Seu valor é
dado pela equação de van't Hoff, S = R.T.'C, onde S é expresso em unidades de pressão (Pa), R é a
constante universal dos gases (8,2 J. K-1.mol-1), T é a temperatura absoluta (K) e 'C é a diferença de
concentração das partículas dispersas e impermeantes nos dois compartimentos (mol/l).

Transporte passivo mediado (difusão facilitada)

A difusão passiva de determinadas substâncias como açúcares e aminoácidos através da


membrana ocorre muito lentamente para suprir as necessidades da célula. Por isto, a membrana celular
possui mecanismos especiais ligados a sua estrutura, que facilitam o movimento das mesmas através da
membrana. Tal processo é chamado de transporte mediado ou difusão facilitada. Tal transporte, assim
como o transporte passivo simples, ocorre a favor de gradiente químico (ou eletroquímico, em se tratando
de um soluto eletricamente carregado). Além disso, o transporte mediado apresenta as seguintes
propriedades:

a) Especificidade química

É a habilidade em transportar um grupo específico de substâncias químicas (Figura 39). Nesta


Figura observa-se que apesar de a diferença entre os dois aminoácidos ser apenas na geometria da
molécula, o L-aminoácido penetra bem mais rapidamente que o D-aminoácido, indicando que tal sistema
de transportadores é mais específico para o L-aminoácido.

Figura 39: Comparação entre as velocidades de passagem do L-aminoácido e do D-aminoácido através


da membrana.

b) Saturação

Na difusão simples (transporte passivo simples), o fluxo de moléculas que entra na célula a
qualquer instante é proporcional à concentração da substância no meio externo (Jeoi = PCe),
considerando-se constante o valor da concentração no meio intracelular (Ci).
No transporte mediado, o influxo aumenta com a concentração extracelular da substância até um
determinado ponto. Existe, portanto, uma velocidade máxima de transporte e quando esta é atingida,
dizemos que o sistema atingiu a saturação (Figura 40).
49

Figura 40: Comparação entre o transporte passivo simples e o mediado quanto à saturação.

c) Competição

É a terceira característica do transporte mediado. Se duas moléculas A e B, penetrando na célula


pelo mesmo sistema transportador, estiverem presentes simultaneamente no meio extracelular, disputarão
entre si os sítios transportadores disponíveis em número limitado na membrana. A presença de B
diminuíra, portanto, o ritmo de entrada de A (Figura 41).
As propriedades de especificidade, de saturação e de competição sugerem que sítios químicos
específicos da membrana são capazes de se combinar com as moléculas transportadas (S). Chamaremos
de transportadores (C) estes sítios de ligação da membrana.

Figura 41: Comparação entre o transporte passivo simples e o transporte passivo mediado quanto à
competição.

O modelo da existência de transportadores procura explicar as propriedades dos sistemas de


transporte mediado em termos de deslocamento dos transportadores e dos complexos transportador-
substância a ser transportada (C-S) através da membrana.
Assim, uma molécula de transportador livre se combinaria com uma molécula da substância a ser
transportada numa das superfícies da membrana e formaria o complexo transportador-substância. Tal
complexo se deslocaria, por difusão passiva (da região de maior para a de menor potencial químico ou
eletroquímico), para a superfície oposta onde ocorreria a dissociação da substância de seu transportador.
O transportador livre retornaria à outra superfície, recomeçando assim um novo ciclo.

Cinética do transporte mediado


O modelo da existência de transportadores procura explicar as propriedades dos sistemas de
transporte mediado em termos de deslocamento dos transportadores e dos complexos transportador-
substância a ser transportada (C-S) através da membrana.
50
A figura abaixo mostra o comportamento da velocidade com a concentração de substância [S].
Para [S] muito grande a velocidade de transporte atinge a velocidade máxima, que corresponde a quando
todos os carregadores estão complexados à substância e realizando o transporte.

Em casos de transporte mediado pode-se usar a equação de Michaelis-Menten, indicada abaixo, para
expressar a velocidade de transporte em função da concentração de soluto .
[S]
V Vmax
K M  [S]

A constante de Michaelis-Menten KM corresponde à concentração de soluto transportado quando a


velocidade é igual à metade da velocidade máxima. KM está relacionado à afinidade entre carregador e
soluto:
KM alto ± baixa afinidade: é necessária uma concentração grande de [S] para que Vmax/2 seja
atingida.
KM baixo ± alta afinidade: é necessária uma concentração pequena de [S] para que Vmax/2 seja
atingida.

Transporte ativo

Os mecanismos de transporte passivo simples (difusão simples e osmose) e transporte passivo


mediado têm uma propriedade em comum, qual seja, a de provocarem fluxo resultante de material
somente por diminuição ou dissipação da energia livre total disponível do sistema. Todavia, a tendência ao
equilíbrio não é característica dos organismos vivos e é incompatível com a vida. Todo ser vivo deve poder
impedir, ao menos por um breve instante, esta condição energeticamente degradada. Já que o sistema
inerte tem mecanismos de transporte passivo, é evidente que as células vivas podem manter um "steady
state " somente através do fornecimento de energia livre no mesmo ritmo em que a mesma é
espontaneamente degradada; a fonte para esta energia é o metabolismo bioquímico dos substratos
energéticos.
Assim, ao contrário dos transportes passivos simples e passivo mediado, o transporte ativo ocorre
contra ou na ausência de gradiente químico ou eletroquímico, com utilização de energia metabólica. É,
portanto, dependente de substratos energéticos tais como a glicose, ou do metabolismo aeróbico quando
O2 será consumido, sendo que o ritmo do transporte está relacionado estequiometricamente com o
consumo de energia. Apresenta sensibilidade a venenos metabólicos que inibam ou desacoplem as
reações metabólicas, como por exemplo o DNP (dinitrofenol). Também se dá por meio de carregadores e
portanto apresenta, como o transporte mediado, as características de especificidade química, competição
e saturação.
51
A figura abaixo ilustra os principais tipos de transporte através da membrana celular:

INFORMAÇÕES ADICIONAIS

Quando o transporte de solutos é efetuado por algum tipo de proteína (carregadores), este
transporte pode ser classificado segundo o esquema representado na figura abaixo:

Figura 42 : Classificação do transporte mediado

Uniporte é o transporte simples de um único soluto de um lado a outro da membrana e, quando se


tem a participação simultânea de dois solutos, temos o chamado cotransporte. Se a passagem dos solutos
for na mesma direção, é classificado como cotransporte do tipo simporte e, se em sentidos contrários, do
tipo antiporte. Esta nomenclatura é válida para o transporte passivo mediado e para o transporte ativo.
Este último, pode ainda ser classificado em transporte ativo primário e transporte ativo secundário.
Transporte ativo primário
É aquele que utiliza diretamente a energia proveniente da hidrólise de ATP. Como exemplos, temos
a bomba de Ca2+ no retículo sarcoplasmático (tipo uniporte) e a bomba de Na+ - K+ (tipo antiporte).

2. Transporte ativo secundário

O fluxo na ausência ou contra-gradiente de uma dada espécie se dá graças ao acoplamento com o


transporte de um outro soluto (íon) que se difunde normalmente segundo o seu gradiente eletroquímico
mantido por um sistema primário de transporte ativo. Este tipo de transporte funciona, portanto, sempre
como um sistema de cotransporte.
52
Como exemplos, temos a entrada de aminoácidos nas células e a passagem de açucares través
do epitélio intestinal impulsionados pela diferença de potencial eletroquímico de Na+ que é mantido pela
atividade da bomba de Na+- K+ (simporte).
Um outro exemplo importante de transporte ativo secundário do tipo simporte ocorre no ramo
ascendente da alça de Henle, onde a difusão do Na+ da luz para o interstício (gradiente também mantido
pela bomba de Na+ - K+) determina o transporte de Cl- no mesmo sentido.
Ao nível da membrana da fibra cardíaca, tem-se um cotransporte do tipo antiporte: para a entrada
de 3 Na+ (a favor de um gradiente eletroquímico) para o meio intracelular, tem-se a saída de um Ca2+ para
o interstício.

Figura 43 : Exemplos de cotransportes do tipo antiporte.

No conjunto dos processos de transporte que ocorrem nas membranas celulares, os transportes
ativos secundários contribuem para a economia de energia celular. A célula investe ATP apenas no
transporte de uma espécie química e consegue transportar contra-gradientes (por acoplamento de
processos) aminoácidos, Cl-, Ca2+, etc.

BIBLIOGRAFIA:
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MOLECULAR DA CÉLULA ³- ARTMED
Castellan, G. W. "Físico-Química"
Cooper, Geoffrey M. The Cell - A Molecular Approach. 2nd ed. Sunderland (MA): Sinauer Associates, Inc;
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Klotz, I. M. "Energy changes in Biochemical Reactions""Introduction to Chemical
Thermodynamics"
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Lodish, Harvey; Berk, Arnold; Zipursky, S. Lawrence; Matsudaira, Paul; Baltimore, David; Darnell, James E.
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Moore, W. J. "Físico-Química", Volume 1
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Reif, F. "Statistical Physics" - Berkeley Physics Course - Volume 5
Van Holde, K. E. "Physical Biochemistry"
53
BIOELETROGÊNESE E POTENCIAL DE REPOUSO

Objetivos
1. Analisar as condições para a gênese e manutenção de uma diferença de potencial elétrico através de
uma membrana: equações de Nernst e de Goldman, Hodgkin e Katz.
2. Entender o potencial de repouso de uma célula.
3. Reconhecer os íons que estão em equilíbrio através da membrana celular.
4. Entender a função da bomba Na+/K+.

CONTEÚDO

x Introdução
x Condições necessárias
x Forças que atuam no transporte dos íons
x Força química
x Força elétrica
x Gradiente eletroquímico
x Membrana permeável a um íon: Equilíbrio eletroquímico
x Membrana permeável a diversos íons: Equilíbrio eletroquímico
x Condição Estacionária
x Potencial de Repouso
x Modelo difusional
x Modelo elétrico
x Bibliografia

INTRODUÇÃO

Nas células em repouso há um acúmulo de cargas positivas do lado externo da membrana e um


acúmulo de cargas negativas do lado interno da membrana. Esta separação de cargas através da
membrana é originada a partir do movimento de íons pelos canais iônicos e é responsável pela diferença
de potencial elétrico (DDP ou Vm), denominada potencial de membrana de repouso, característica de
todas as células vivas. (Figura 44)

Figura 44: Cátions e ânions se acumulam em cada lado da membrana plasmática.


54
O potencial de repouso é uma condição necessária para que as células possam exercer suas
funções específicas no organismo.
O fluxo de informações dentro e entre os neurônios é feita por sinais elétricos e químicos e alterações
rápidas e transientes do potencial de repouso são particularmente importantes na transferência de informação
a longas distâncias.
Assim, compreender como o potencial de repouso é gerado é a primeira etapa para entendermos um
importante mecanismo de sinalização celular, isto é como sinais elétricos transientes são gerados.

CONDIÇÕES NECESSÁRIAS

Qual seria a origem dos potenciais elétricos (bioeletrogênese) através da membrana?


Quais as condições necessárias?

Para responder a estas perguntas vamos analisar algumas situações que permitem o aparecimento
de potencial elétrico através de uma membrana.
Analisando os experimentos abaixo mostrados, onde temos dois compartimentos contendo
diferente concentrações de íons , separados por uma membrana responderemos estas questões.

Experimento 1A: Temos dois compartimentos, separados por uma membrana impermeante (MI),
(por exemplo, uma bicamada lipídica), contendo diferentes concentrações Na+ Cl-.
A MI B

Na+ Na
+
x
x

Cl- x Cl- x

Como a membrana é impermeável aos íons, pois íons não atravessam a bicamada lipídica, não
ocorre passagem dos mesmos, por isso, não verificamos nenhum movimento de íons . Portanto a 1a
condição é que a membrana seja permeável aos íons.
Dizer que uma membrana é permeável aos íons, implica na presença de canais iônicos na membrana. Um
canal iônico através da membrana pode ser comparado como uma ponte atravessando um rio.

Experimento 1B: Temos dois compartimentos contendo concentrações iguais de KCl, separados por uma
membrana permeável a um dos íons.

Nesta situação, verificamos que embora a membrana seja permeável a um dos íons, isto é existe
a presença de canais iônicos na membrana, não observamos DDP, através da membrana.
A presença de um canal aberto na membrana não implica em movimento de íons através da
membrana. Tal movimento de íons depende primariamente de uma diferença de concentração dos íons
55
através da membrana, denominada gradiente de concentração, para que ocorra a difusão específica de
íons através de canais seletivos. Portanto a 2a condição para que observemos DDP através da
membrana é gradiente de concentração dos íons através da membrana.
Uma vez que estas duas condições tenham sido satisfeitas, vamos analisar quais as forças que
atuam no transporte dos íons verificando quando a membrana é permeável a apenas um íon ou a
diversos íons.

FORÇAS QUE ATUAM NO TRANSPORTE DE ÍONS:

1- Membrana permeável a um único íon

A permeabilidade de uma membrana aos íons permeantes é determinada pela proporção relativa
dos vários tipos de canais iônicos.
No exemplo abaixo, (Figura 45), vamos considerar uma célula que seja somente permeável ao
potássio. Esta célula contém alta concentração K+ e ânions orgânicos no citoplasma e alta concentração
de Na+ e Cl- no meio extra-celular.
Assumimos que inicialmente não exista diferença de potencial elétrico através da membrana.

Figura 45: Esquema de uma célula que é somente permeável ao potássio.

Como a membrana é seletivamente permeável ao potássio, ocorre difusão dos íons K+ a favor do
seu gradiente de concentração. Por isso eles saem da célula, deixando os ânios não permeantes no
interior da célula.
Como os íons são partículas carregadas eletricamente, a difusão de íons promove a separação de
cargas elétricas através da membrana, resultando no estabelecimento de um gradiente elétrico através da
membrana plasmática.
Como o potássio não é acompanhado ânions (a membrana é impermeável aos ânions) ele forma uma
camada carregada positivamente ao lado externo da membrana em relação a uma camada carregada
negativamente, ao lado interno da membrana . Cria-se, portanto uma diferença de potencial elétrico entre
os dois meios chamada potencial de difusão.
À medida que ocorre o estabelecimento de um gradiente elétrico (Força elétrica) através da
membrana, a difusão deste íon também passa a ser influenciada por esta força. (Lembre-se: cargas de
sinais iguais se repelem, enquanto cargas de sinais opostos se atraem).
O aparecimento do gradiente elétrico através da membrana retarda a passagem do potássio,
agindo portanto em sentido oposto ao gradiente de concentração.
56
Assim, o fluxo do íon K+ através deste canal, assim como o fluxo de qualquer íon (i) através de
um canal está sob a infuência de duas forças, a química e a elétrica, as quais podem ser calculadas
pelas seguintes equações:
Ci (2)
FORÇA QUÍMICA= 'µi = µi2 - µi1 = R.T. ln_____
Ci (1)
onde R: constante dos gases = 8,3 J/K. mol
T: temperatura absoluta (K)

FORÇA ELÉTRICA = Zi.F (<2 - <1)

onde Zi corresponde à valência do íon e F é o número de Faraday (carga elétrica de i mol de íons
monovalentes = 96.500 Coulomb/mol) e <1 e <2 são os valores do potencial elétrico nos pontos 1 e 2 do
sistema.

A somatória destas duas forças constitui o gradiente eletroquímico ('µ૆i ).


Assim, para solutos eletricamente carregados, quando entre duas regiões 1 e 2 existem simultaneamente
diferenças de potencial elétrico e de concentração, a diferença de potencial eletroquímico ou de energia
livre molar do componente i será a soma algébrica das diferenças de potencial químico e elétrico:

Ci (2)
'µ૆i = µi2 - µi1 = R.T. ln ________ + Zi F (<2 - <1)
Ci (1)

Sendo 'µi a diferença de potencial eletroquímico do componente i entre as regiões 1 e 2.

O gradiente eletroquímico ('µ૆i) determina o sentido do fluxo de um íon através da membrana e


o movimento passivo de um íon ocorre sempre a favor do seu gradiente eletroquímico: da região de maior
potencial eletroquímico para a região de menor potencial eletroquímico.
No experimento analisado, a difusão do potássio devido ao gradiente químico (de dentro para fora)
prossegue até que o equilíbrio seja alcançado isto é quando a difusão do potássio devido ao gradiente
químico (de dentro para fora) fica igual à passagem de potássio de (de fora para dentro), devido ao
gradiente elétrico. As duas forças química e elétrica são iguais, mas em sentidos opostos. Portanto, nesta
situação ambos os termos da equação anulam-se entre si e 'µi = 0 e não há fluxo resultante do íon.
Dizemos que nesta condição o íon está em equilíbrio eletroquímico.

Ci (2)
'µ૆i = µi2 - µi1 = R.T. ln ________ + Zi F (<2 - <1) = 0
Ci (1)

A diferença de potencial elétrico atingida quando o íon está em equilíbrio eletroquímico é


denominada de potencial elétrico de equilíbrio e é dada pela equação abaixo, denominada EQUAÇÃO
DE NERNST.

'<2 - 1 = - R.T ln C2
Z.F C1
57
Portanto, o potencial elétrico de equilíbrio ('<2 - 1) representa a diferença de potencial elétrico
necessária e suficiente para equilibrar uma diferença de concentração do componente i entre as duas
regiões (potencial de equilíbrio do componente i).
E como já vimos este potencial ('<2 - 1 ) corresponde à diferença de potencial elétrico que surge
através da membrana contrabalançando exatamente a difusão deste íon provocada pelo gradiente de
concentração. Isto significa que se um íon com uma determinada distribuição através de uma membrana
tiver seu potencial calculado pela equação de Nernst igual à diferença de potencial existente através da
membrana, ele estará em equilíbrio através da mesma. Este equilíbrio deve ter sido atingido por
mecanismos puramente passivos, ou seja, sem utilização de energia externa ao sistema (equilíbrio
eletroquímico).

A evolução temporal da diferença de potencial através da membrana será:

O valor da diferença de potencial através da membrana é um valor estável (não se altera com o
tempo) e corresponde ao valor calculado através da equação de Nernst que é aplicada na situação de
equilíbrio Nesta condição o gradiente eletroquímico é nulo, não há fluxo resultante ('P = 0, Jres = 0).

2- Membrana permeável a todos os íons

2.1. Condição de equilíbrio (Equação de Nernst)

Na verdade, as membranas biológicas são sempre permeáveis a várias espécies iônicas. Neste
caso, se a membrana estiver banhada por soluções de composições diferentes em cada um de seus
lados, a difusão dos íons a favor de seus gradientes de concentração poderá gerar uma diferença de
potencial elétrico através da membrana. Imaginemos uma membrana separando dois compartimentos
contendo cloreto de sódio em concentrações diferentes e suponhamos que a permeabilidade da
membrana seja maior ao sódio do que ao cloreto. A difusão do sódio induz o aparecimento de uma
diferença de potencial elétrico através da membrana que se opõe à sua própria difusão e favorece a
difusão do cloreto.
Conforme a difusão continua, os gradientes de concentração para Na+ e Cl- vão diminuindo até que
as concentrações se igualam nos dois compartimentos. Assim, no caso de íons difusíveis para os quais a
permeabilidade da membrana seja diferente (e diferente de zero), observa-se o surgimento de uma
diferença de potencial elétrico de caráter transitório ou dissipativo.
Nesta situação no equilíbrio, a '< através da membrana será nula uma vez que o gradiente de
concentração dos íons difusíveis através da membrana também se anula.
58

A B C

(1) (2) (1) (2) (1) (2)

Na+ Na+ - + Na+ Na+


_- +
Cl- Cl- - + Cl- Cl-
- +
Na+ Na+

- +
- +
- +
- +
Cl-
Cl-

PNa+ > PCl- o Na+ Na+ Cl-


o Cl- m m
'\ z 0 o o
'\ = 0

O perfil da evolução temporal da diferença de potencial de membrana descrito acima é:

2.2. Condição Estacionária - (Steady State)


(Equação de Goldman, Hodgkin e Katz)

A diferença de potencial elétrico que surge através de uma membrana permeável a todos os íons
pode, sob algumas circunstâncias, ser também uma diferença de potencial elétrico do tipo estacionário. Na
condição estacionária, todavia, devemos observar que, além de a diferença de potencial elétrico através
da membrana se manter estável, as concentrações dos íons nos compartimentos não se alteram apesar
da existência do fluxo constante de massa (reveja a definição de estado de fluxo constante). Assim, a
diferença de potencial elétrico transitória observada no item anterior poderia ser mantida em condição
estacionária desde que a membrana pudesse, através de algum mecanismo, manter constantes as
concentrações iônicas nos dois compartimentos sem haver, portanto, dissipação dos gradientes químicos.
59
Nesta situação estacionária, a intensidade da '< que se estabeleceria através da membrana
dependeria das permeabilidades relativas dos ânions e cátions permeantes, sendo dada pela equação de
Goldman, Hodgkin e Katz (GHK):

<2 - <1 = R.T ln PNa[Na]1 + PCl[Cl]2


F PNa[Na]2 + PCl[Cl]1

Em um gráfico '< x tempo, observaríamos o aparecimento de uma '< estável e constante através
da membrana, que não corresponderia a uma '< de equilíbrio, uma vez que o sistema não se encontraria
neste estado ('P z 0, Jres z 0).
60
POTENCIAL DE REPOUSO

Modelo difusional

Todas as membranas biológicas são caracterizadas por uma diferença de potencial elétrico, ou
voltagem, através da membrana denominada potencial de membrana ('<, DDP ou Vm), que na maioria
das células em repouso, é orientada de forma que o interior da membrana é eletricamente negativo em
relação ao meio externo. (Figura 46).
O termo geral, potencial de membrana (Vm) refere-se a diferença de potencial elétrico através da
membrana em qualquer tempo: ou no repouso ou durante a sinalização.
Por convenção o potencial elétrico no lado externo da célula é arbitrariamente definido como zero,
de tal forma que potencial de membrana (Vm) é definido como:
Vm= Vi- Ve
onde Vi é o potencial dentro da célula e Ve é o potencial fora da célula.
De acordo com esta convenção, introduzindo-se um microeletrodo de vidro no interior de uma
célula viva qualquer, mede-se o potencial de membrana de repouso entre os meios externo e o interno
da ordem de -50 mV a -100mV, sendo o meio interno negativo em relação ao meio externo (Figura 46).
O potencial de repouso em diferentes células neurais pode variar entre -40 e -80 mV, enquanto em
células musculares ele é da ordem de -90 mV. Em diferentes tipos celulares o Vm é variável, e esta
variação é responsável pela propagação de sinais pelos tecidos nervosos, contração do músculo e
acoplamento estímulo-secreção em células endócrinas e secretórias.

A B

Figura 46: (A) Diferença de potencial elétrico através da membrana.(B) Existe uma delgada camada de
íons negativos e positivos distribuídos ao longo das superfícies interna e externa da membrana celular. Os
meios intra e extracelular mantém a eletroneutralidade. (Figura extraída do livro: Randall D., Burggren W.,
French K., Animal Physiology, 4a edição, 1997, Capítulo 5).
61

Qual a origem do potencial de repouso que ocorre em todas as


células do organismo?

Como já foi discutido anteriormente, a diferença de potencial através de uma membrana qualquer
surge de uma separação de cargas. Esta separação de cargas ocorre quando existe um gradiente de
concentração através da membrana e quando a membrana apresenta coeficiente de permeabilidade
diferente em relação às espécies iônicas envolvidas. A diferença de potencial pode ser transitória ou
estável se o sistema for mantido em condição estacionária ou evoluir para uma situação de equilíbrio.
Nosso sistema de estudo, a célula, consiste em um sistema mantido em condição estacionária: o potencial
através da membrana, bem como as concentrações iônicas intracelulares, não se alteram com o tempo
apesar do fluxo constante de massa.
O meio celular é constituído por proteinatos carregados negativamente (em decorrência do pH
intracelular) e por íons tais como sódio, cloreto, potássio, hidrogênio, magnésio, bicarbonato, fosfato e
cálcio. Com exceção dos proteinatos, a membrana plasmática é seletivamente permeável a estes íons. No
entanto, os íons que podem contribuir para a gênese do potencial através da membrana são o Na+, o K+ e
o Cl- (cujas distribuições celulares estão mostradas na tabela abaixo) por estarem presentes nos tecidos
vivos em quantidades bem maiores do que as outras espécies iônicas, cujos fluxos resultantes podem ser
desprezados.
A tabela abaixo mostra a distribuição dos íons sódio, potássio e cloreto em uma célula muscular de
mamífero, cujo potencial de repouso é de -90 mV.

Íon Concentração Concentração '<eq (mV)


intracelular Extracelular
(mM) (mM)
K+ 155 4 -97
Na+ 12 145 +66
Cl- 4 117 -90

Os cálculos de 'P para cada um dos íons, através dos dados da tabela acima, permitiriam verificar
que na célula muscular em repouso ocorre um fluxo resultante de K+ para fora da célula (efluxo) e um fluxo
resultante de Na+ para dentro da célula (influxo), enquanto que o fluxo resultante de Cl- é nulo (o Cl-
encontra-se em equilíbrio eletroquímico através da membrana). A permeabilidade da membrana é cerca
de 100x maior ao K+ do que ao Na+ e assim, admitindo-se inicialmente que não exista potencial de
membrana, para cada 100 íons potássio que saem, 1 íon sódio entra na célula. Portanto, a separação de
cargas através da membrana celular é devida primariamente à difusão de potássio através da célula (tanto
é assim, que o potencial de repouso da célula muscular encontra-se muito próximo ao potencial de
equilíbrio do K+ e muito afastado, com polaridade inversa, do potencial de equilíbrio do Na+). Com o
desenvolvimento do potencial elétrico, ocorre uma diminuição gradativa do fluxo resultante de K+ e um
aumento do fluxo resultante de Na+ através da membrana. Estes dois fluxos resultantes em sentidos
opostos se igualam a partir do momento em que o potencial elétrico atinge o valor de -90 mV, que é o
potencial de repouso. Nesta situação, não existe mais fluxo resultante de cargas positivas através da
membrana; o sistema atinge o estado estacionário, não ocorrendo alteração imediata na magnitude do
potencial. Todavia, o sistema não poderia permanecer assim por muito tempo uma vez que continuaria
ocorrendo perda de K+ e ganho de Na+ pela célula de tal modo que a concentração intracelular de K+
diminuiria e a de Na+ aumentaria com o decorrer do tempo. Embora estas alterações devessem ocorrer
muito lentamente pelo fato de os fluxos resultantes destes íons serem muito pequenos, a longo prazo
observaría-se diminuição do gradiente dos íons K+ e Na+, com consequente diminuição de seus potenciais
de difusão e do potencial de membrana. Entretanto, não é isto que se verifica. A célula mantém o seu
potencial de repouso durante muito tempo e as concentrações de K+ e Na+ são mantidas constantes. O
potencial de repouso é mantido graças à atuação de transporte ativo, onde um transportador
específico (bomba de Na+ e K+), utilizando energia metabólica, retira Na+ do meio intracelular e
repõe o K+ no interior da célula.
62
Um esquema da célula muscular em repouso poderia ser representado pela na figura 47:

Figura 47: Mecanismos de transporte de íons em um modelo de célula muscular.

O valor do potencial de repouso da célula muscular, portanto em condição estacionária pode ser previsto
pela equação de Goldman, Hodgkin e Katz (GHK):

<i - <e = R.T 2,3 log PK[K]e + PNa[Na]e + PCl[Cl]i


F PK[K]i + PNa[Na]i + PCl[Cl]e

Onde: PK = 2 x 10-6 cm/s PNa = 2 x 10-8 cm/s PCl = 4 x 10-6 cm/s

Como o Cl- encontra-se em equilíbrio eletroquímico através da membrana, não participando


portanto da gênese do potencial de repouso, a equação de GHK poderia ser utilizada excluindo-se o fator
a ele relacionado, sendo que o mesmo valor de <i-<e seria obtido:

<i - <e = R.T 2,3 log PK[K]e + PNa[Na]e


F PK[K]i + PNa[Na]i

Podemos verificar através desta equação que a distribuição iônica do íon mais permeante terá
maior influência sobre o valor do potencial de repouso. Assim, torna-se evidente que o K+, sendo mais
permeante através da membrana da célula muscular, destaca-se como o íon mais importante na gênese
do potencial de repouso da mesma.
Diversas comprovações experimentais foram feitas a respeito da importância do potássio para o
potencial de repouso devido basicamente à sua permeabilidade.
Em diversos tipos de células foi demonstrado que o potencial de repouso é dependente das
concentrações interna e externa de K+, tais como células gliais do nervo óptico da salamandra Necturus,
nervo de lula, músculo de rã e várias células vegetais. Em nenhum caso, a alteração na concentração de
Na+ externo resultou em alterações significativas do potencial de membrana.
Assim, o principal responsável pelo aparecimento do potencial de repouso celular é o potencial de
difusão ao K+, visto que a membrana é mais permeável a este íon. Como na célula em repouso existe uma
tendência difusional passiva de saída de potássio para o meio externo e uma entrada de Na + para o meio
intracelular, o transporte ativo desempenha um importante papel para a manutenção do potencial de
repouso da célula uma vez que ele é responsável pela manutenção do estado estacionário da mesma. O
seu funcionamento evita alterações nas concentrações iônicas, expelindo Na+ e captando K+ (manutenção
da homeostasia celular), consequentemente mantendo constante o potencial elétrico transmembranal ao
redor de -90mV.
63
Uma outra consequência importante da existência deste transporte ativo relaciona-se com a
propriedade do desequilíbrio osmótico. Observa-se que numa célula em repouso a presença dos
proteinatos intracelulares (impermeantes) acaba sendo compensada pela manutenção de altas
concentrações extracelulares de Na+ (como se este íon fosse "impermeante"), evitando deste modo o
desequilíbrio osmótico.
Enfim, a presença de um mecanismo de transporte ativo, embora mantido às custas de energia
externa, torna-se essencial para a versatilidade das células dos organismos animais.
A figura 48 sumariza os principais fluxos dos íons envolvidos no potencial de repouso.

Figura 48: Principais fluxos dos íons envolvidos no potencial de repouso.


64
SINALIZAÇÃO NO SISTEMA NERVOSO: EXCITABILIDADE ELETRICA CELULAR

Objetivos

1. Comparar o Potencial de Repouso pelos modelos difusional e elétrico.


2. Compreender o comportamento elétrico de uma célula excitável e de uma não excitável.
3. Identificar as principais diferenças entre potencial eletrotônico e potencial de ação.
4. Descrever o comportamento de uma célula excitável em resposta a um estímulo abaixo e acima do limiar.
5. Entender como é disparado o potencial de ação, utilizando o conceito de limiar.
6. Compreender a importância dos canais iônicos dependentes de voltagem para as células excitáveis.
7. Interpretar as propriedades do potencial de ação (potencial liminar, mecanismo de "feedback", período
refratário absoluto e relativo) em termos de canais iônicos.
8. Entender os fatores que afetam a propagação do potencial eletrotônico e do potencial de ação.
9. Entender o papel da mielina como isolante e caracterizar a condução saltatória.

1. Recapitulando o Potencial de Repouso

Modelo difusional

A diferença de potencial elétrico ('< ou Vm) através de uma membrana celular surge da separação
de cargas. Esta separação de cargas ocorre quando existe um gradiente de concentração de íons
através da membrana e quando a membrana apresenta coeficiente de permeabilidade diferente em
relação às espécies iônicas envolvidas.
As espécies iônicas presentes nas células não estão igualmente distribuídas através da membrana
celular. Assim, Na+ e Cl- são mais abundantes no meio extracelular (~110 mM) e o K+ e os ânions
orgânicos (A-) no meio intracelular.
A distribuição assimétrica dos íons e a permeabilidade seletiva da membrana aos diferentes íons
determinam o potencial de membrana de uma célula. A permeabilidade seletiva da membrana a uma
determinada espécie iônica é determinada presença de vários tipos de canais iônicos na membrana
celular.
Como vimos, no repouso, o efluxo de K+ compensa o influxo de Na+. No entanto, estes
vazamentos contínuos dos íons não podem permanecer sem oposição por muito tempo porque os
gradientes de Na+ e de K+ se dissipariam, reduzindo o potencial de membrana.
A dissipação dos gradientes iônicos é evitada pela bomba de Na+ -K+, que transporta estes íons
contra seus gradientes eletroquímicos. A bomba joga Na+ para fora da célula e K+ para dentro. Portanto
esta bomba requer energia para trabalhar que provém da hidrólise do ATP.
Até agora ignoramos a contribuição dos íons cloreto (Cl-) no potencial de repouso, apesar de
algumas células nervosas terem canais de Cl- abertos no potencial de membrana. Esta simplificação é
válida para as células nervosas que não possuem um mecanismo de transporte ativo de Cl- contra um
gradiente eletroquímico. Nestas células, o potencial de repouso só depende dos fluxos de K + e de Na+
porque as concentrações intracelulares de K+ e de Na+ são determinadas pelo transporte ativo (a bomba
de Na+ -K+), enquanto que a concentração intracelular do Cl- só é afetada pelas forças passivas (potencial
elétrico e gradiente de concentração). Portanto, o fluxo de Cl- através da membrana tende ao equilíbrio de
modo que '< de equilíbrio do Cl- , ECl é igual ao potencial de repouso, Vr, e o fluxo resultante de Cl- é
zero no repouso.
Portanto, em diferentes células, no repouso, os fluxos de Na+, K+, Cl- e outros íons, embora possam
não ser nulos individualmente, estão exatamente contrabalançados de modo que a carga total que atravessa
a membrana é nula. Portanto, a condição de repouso em termos elétricos é definida como "steady state" ,
sendo o fluxo resultante de corrente através da membrana plasmática nulo. Um esquema da célula muscular
em repouso poderia ser representado na figura 49.
65

Figura 49: Mecanismos de transporte de íons em um modelo de célula muscular. (Figura do livro: Kandel
E. R., Schwartz, J. H. , Jessell, T. M., Principles Of Neural Science, 3a Edição, 1991,Capítulo 6).

Cálculo do Potencial de repouso pelo modelo difusional:


Embora os fluxos de Na+ e de K+ determinem o valor do potencial de repouso, Vm não é igual a EK e
nem a ENa, mas asssume um valor entre os dois. Como regra geral, quando Vm é determinado por duas ou
mais espécies iônicas, a influência de cada espécie iônica não depende apenas das concentrações intra e
extracelulares dos íons, mas também da facilidade com a qual o íon atravessa a membrana. Uma medida
adequada para indicar a facilidade com a qual um íon atravessa a membrana é a permeabilidade (P) da
membrana ao íon, expressa em unidades de velocidade, cm/s. Este parâmetro é semelhante à constante
de difusão, que mede a velocidade do soluto em solução. A dependência do potencial de membrana
com a permeabilidade e a concentração dos íons é expressa através da equação de Goldman:

Onde: PK = 2 x 10-6 cm/s PNa = 2 x 10-8 cm/s PCl = 4 x 10-6 cm/s

Esta equação estabelece que quanto maior a concentração e a permeabilidade da membrana a


uma determinada espécie iônica, maior seu papel na determinação do potencial de membrana. Como o Cl -
encontra-se em equilíbrio eletroquímico através da membrana, não participando portanto da gênese do
potencial de repouso, a equação de GHK poderia ser utilizada excluindo-se o fator a ele relacionado,
RT PK [ K  ]e  PNa [ Na  ]e  PCl [ Cl  ]i
Vm ln , Equação de Goldman
F PK [ K  ]i  PNa [ Na  ]i  PCl [ Cl  ]e
sendo que o mesmo valor de <i-<e seria obtido:

RT P [ K ]e  PNa [ Na ]e
Vm 2,3 log K
F PK [ K ]i  PNa [ Na ]i
Podemos verificar através desta equação que a distribuição iônica do íon mais permeante terá
maior influência sobre o valor do potencial de repouso. Assim, torna-se evidente que o K+, sendo mais
permeante através da membrana da célula muscular, destaca-se como o íon mais importante na gênese
do potencial de repouso da mesma.
Quando a permeabilidade a um íon é excepcionalmente alta, a equação de Goldman se reduz à
equação de Nernst para este íon. Por exemplo, se PK >> PCl ou PNa, como é o caso das células da glia, a
equação pode ser escrita da seguinte forma:
RT [ K  ]e
Vm ln 
F [ K ]i

A equação de Goldman é limitada para o cálculo do Vm, pois é válida quando Vm não se altera.
Assim não pode ser utilizada para determinar as alterações rápidas do potencial de membrana em
resposta a uma alteração da permeabilidade. Estas informações podem ser obtidas através de um simples
modelo matemático deduzido dos circuitos elétricos. Neste modelo, denominado circuito elétrico
66
equivalente, iremos relacionar as propriedades da membrana em relação ao transporte de íons a um
modelo elétrico.

Modelo elétrico

A Membrana Biológica Pode Ser Representada por um Circuito Elétrico Equivalente


No circuito elétrico equivalente as propriedades da membrana em relação ao transporte de íons:
os canais iônicos; o gradiente de concentração dos íons e a capacidade da membrana para armazenar
íons são representadas por condutâncias (resistores), baterias e capacitores respectivamente.
O estudo deste circuito equivalente é importante para a compreensão de princípios básicos da
sinalização celular e como fundamento na interpretação de testes clínicos tais como eletroencefalograma,
eletrocardiograma, eletromiografia, etc.
Os canais iônicos presentes na membrana podem embora sejam melhores condutores de fluxo de
corrente do que a bicamada lipídica, eles ainda oferecem resistência ao fluxo de íons. Seu pequeno
diâmetro somente permite a passagem de poucos íons. Adicionalmente os canais apresentam diferentes
seletividades, restringindo o tipo de íon que passa por eles. Assim, como cada canal oferece resistência ao
fluxo de íons, cada canal também pode ser representado como tendo uma resistência.
Chamamos a resistência do canal de K+ de (RK+ ) e condutância do canal de K como (gK+).
A resistência de um canal é inversamente proporcional à sua condutância, e por isso, podemos
representar a resistência do canal de potássio como:
RK+ = 1
g K+

O termo condutância do canal é mais comumente utilizado, porque ele é diretamente proporcional à
intensidade de corrente através do canal.
Como os íons estão desigualmente distribuídos através da membrana, cada canal aberto contribui
para a geração de uma diferença de potencial elétrico através da membrana.
Por exemplo, íons potássio, que estão presentes em alta concentração no citosol tendem a se
difundir, através canais seletivos ao K+. Esta difusão leva a separação de cargas através da membrana.
Cargas positivas se acumulam do lado de fora, enquanto cargas negativas ficam do lado de dentro. A
diferença de potencial elétrico que se estabelece representa o potencial de equilíbrio para o K+ (Ek+),
calculado pela equação de Nernst. A combinação de um gradiente de concentração para o K+ e a maior
permeabilidade ao K+ garantem a separação de cargas através do canal, que age como uma constante
fonte de potencial elétrico. Uma fonte de potencial elétrico é chamada força eletromotriz ou (neste caso)
uma bateria iônica. A bateria iônica gerada neste caso resulta da difusão passiva de K+ através de canais
de K+. Portanto, nós podemos representar o potencial elétrico gerado através de cada canal com o símbolo
para uma bateria E K+ em série com o condutor g, K+ (Figura 50).

Figura 50: Um canal seletivamente permeável ao potássio pode ser representado por bateria E K+ em
VpULH FRP R FRQGXWRU ȖK+ (Figura do livro: Kandel E. R., Schwartz, J. H. , Jessell, T. M., Principles Of
Neural Science, 3a Edição, 1991,Capítulo 6).

É importante ressaltar que a condutância varia com a concentração iônica, enquanto a


permeabilidade não. A permeabilidade aos diferentes íons reflete o número e o tipo de canais iônicos
presentes na estrutura da membrana e a condutância depende de ambos, do estado da membrana e
do gradiente de concentração dos íons.
Por analogia ao que foi descrito para os canais de K+ , todos os outros canais também podem ser,
representados pela combinação de uma bateria e condutância (Figura 51).
67

Figura 51: Todos os canais passivos da membrana também podem ser representados pela combinação
de uma bateria em série com um condutor. (Figura extraída do livro: (Figura do livro: Kandel E. R.,
Schwartz, J. H. , Jessell, T. M., Principles Of Neural Science, 3a Edição, 1991, Capítulo 6).

Assim, para construir um circuito elétrico equivalente, devemos conectar os elementos


representando cada tipo de canal aos seus dois terminais que representam o fluido extracelular e o
citoplasma. Os canais são colocados em paralelo na bicamada lipídica, a qual apresenta condutibilidade
negligenciável. Por outro lado, o fluido extracelular e o citoplasma são excelentes condutores, com
resistência igual a zero .
Além da condutância e da força eletromotriz devemos acrescentar ao circuito elétrico equivalente a
terceira propriedade elétrica passiva da membrana que é a capacitância (Figura 52).
Dizemos que a membrana biológica possui características de um capacitor porque existe uma
diferença de potencial elétrico estável através da membrana, ou seja um armazenamento de cargas
elétricas através da membrana. Além disto, a bicamada lipídica é altamente hidrofóbica, constituindo um
meio elétrico isolante.
Todo capacitor é caracterizado por sua capacitância, ou seja, por sua capacidade de armazenar cargas por
unidade de potencial, que é dado pela seguinte relação:
C = Q/V onde:
Q: é o valor absoluto das cargas armazenadas em uma das placas (Coulomb).
V: é o valor absoluto do potencial de uma das placas (Volt).
C: é a capacitância (Farad = 1 Coulomb/ 1 Volt).
Toda membrana biológica pode ser caracterizada por sua capacitância específica, isto é a
capacitância de 1 cm2 de membrana, que em geral tem o valor de 1PF/cm2.
Assim, do ponto de vista elétrico, podemos representar a membrana biológica, de um modo geral,
pelo circuito equivalente mostrado a seguir:

Figura 52: Representação da membrana pelo circuito elétrico equivalente , onde:


Cm: representa o elemento capacitivo equivalente da membrana.
Rm: representa o elemento resistivo equivalente da membrana.
68

Entretanto, como o potencial de membrana de repouso, é mantido em condição estacionária, não


apresentando variação do potencial de membrana, a representação do circuito elétrico equivalente, no
repouso não inclui o elemento capacitivo, conforme mostrada na figura 53.

Figura 53: Circuito elétrico equivalente, representativo da membrana plasmática em repouso. (Figura
extraída do livro: (Figura do livro: Kandel E. R., Schwartz, J. H. , Jessell, T. M., Principles Of Neural
Science, 3a Edição,1991, Capítulo 6).

2. Cálculo do potencial de membrana pelo modelo do circuito elétrico equivalente:

Nos circuitos elétricos convencionais a Lei de Ohm, que relaciona a diferença de voltagem (V) e a
condutância (G) intensidade de corrente (I) pode ser assim escrita:
I = GV
Semelhante à lei de Fick (J = P.AC), a lei de Ohm (V= Rl ou i =gV) descreve tanto o fluxo de elétrons
em condutores metálicos, como o de íons através de canais iônicos. Neste caso, a corrente passa a ter
significado de fluxo, e os termos C e V são as forças moventes. No caso das soluções eletrolíticas e dos
canais iônicos, a força que move uma espécie iônica pode ser decomposta em dois termos: um deles (V),
independente, e outro (Ex) dependente das concentrações do íon considerado de cada lado da membrana.
Assim, para uma dada diferença (V- Ex), a corrente Ix vai depender do grau de restrição imposto pela
condutância do canal. A corrente Ix total que atravessa a membrana é a soma das correntes que atravessam
a população de canais x.
3DUDXPGHWHUPLQDGRYDORUGH9PDIRUoDUHVXOWDQWHRXIRUoDPRYHQWH GRLQJOrV³GULYLQJIRUFH´ TXH
promove a saída ou entrada de um determinado íon na célula (corrente iônica) é descrita como:
fmx = Vm - Ex
onde:
fmx: corresponde à força movente para o íon X
Ex: corresponde ao potencial de equilíbrio do íon X

A corrente carreada pelo íon x é dada por:


Ix = Gx. fmx
onde: Gx: corresponde à condutância da membrana ao íon x (corresponde ao inverso da resistência e
a unidade de condutância é o Siemens (S).
Portanto, mesmo se a condutância da membrana ao íon x for alta, nenhuma corrente será
transportada através da membrana por aquele íon (Ix = 0), se o potencial de membrana (Vm) for igual a Ex.
Como os gradientes iônicos geralmente são mantidos constantes na célula (e portanto, Ex não varia), as
alterações de Gx (condutâncias) são as responsáveis pela modulação da corrente transportada por um
determinado íon. Portanto, são as alterações nas condutâncias iônicas, isto é no número de canais ativados,
que controlam a intensidade da corrente elétrica carreada através das membranas biológicas.
Durante o repouso, os fluxos iônicos de cada íon estão compensados de tal maneira que a corrente
elétrica total resultante através da membrana é zero.
Se as condutâncias dos canais para os íons Na+ e K+ forem respectivamente GNa e GK, as correntes
de Na (INa+) e K+ (IK+) serão, respectivamente, GNa (Vm - ENa) e GK (Vm - EK).
+

Conseqüentemente, se Vm for igual ao potencial de repouso (PR), a seguinte equação deve ser
satisfeita:
69
GNa.( Vm - ENa) + GK.(Vm - EK) + corrente originada pela bomba Na+/K+ + correntes carreadas por
outros íons = 0 .
Por isso, no repouso a corrente carreada pelo K+ (IK+) é igual, mas em sentido contrário à corrente
carreada pelo sódio (INa+) .
Assim,
IK+ = - INa+ ou IK+ + INa+ = 0
Assim temos que,
IK+ = gK (Vm - EK) = - INa+ = - gNa (Vm - ENa) ou
gK (Vm - EK) + gNa (Vm - ENa) = 0
Deste modo isolando o Vm da equação acima, podemos expressar o potencial de membrana
(Vm ) através da seguinte equação:
g Na E Na  g K E K
Vm
g Na  g K
onde:
GNa e GK: condutância da membrana ao íon Na+ e K+, respectivamente.
ENa e EK: potencial de equilíbrio do íon Na+ e K+, respectivamente.

Através desta equação podemos calcular o Vm em qualquer situação em que a célula se encontre: no
repouso ou durante a sinalização celular.

3. Sinalização celular envolvendo alterações no potencial elétrico de membrana

3.1 Introdução

Como discutido anteriormente, é característica de todas as células apresentar uma diferença de


potencial elétrico de repouso. Todas as células também podem apresentar uma alteração local do Vm
(potencial eletrotônico), enquanto outras células, como as nervosas ou musculares podem apresentar uma
alteração rápida e intensa do Vm, (potencial de ação), que se propaga ao longo da célula, como forma de
codificação e transmissão de informação (comunicação celular nas células nervosas ou como gatilho para
o mecanismo de contração muscular).
Os mecanismos de sinalização celular dos neurônios, responsáveis pela excitabilidade celular são
semelhantes aos que ocorrem na célula muscular estriada. Portanto este capítulo se concentrará no
funcionamento dos neurônios, que é o principal componente do sistema nervoso.

3.2 Excitabilidade celular

Para se estudar a excitabilidade celular, isto é a capacidade da célula gerar, propagar e transmitir o
impulso nervoso, devemos ter uma maneira experimental de gerar um estímulo elétrico através da membrana,
portanto um circuito estimulador, (geralmente uma fonte de corrente ou de tensão) e uma maneira de
captar, registrar e armazenar a resposta biológica decorrente deste estímulo, e portanto, um circuito de
registro (geralmente um voltímetro ou osciloscópio, ou outra combinação de aparelhos de medida mais
sofisticados). Além disto, como a excitabilidade celular depende de variações do potencial e da presença de
correntes eletrolíticas através da membrana, em qualquer experimento eletrofisiológico é necessário a
presença de um dispositivo (os eletrodos ou microeletrodos) que permite a transformação da corrente
eletrolítica (aquela que ocorre na preparação biológica, ou seja através da movimentação de íons) em
eletrônica (aquela que é percebida pela circuitaria eletrônica, ou seja através da movimentação de elétrons) e
vice-versa. (Figura 54).
70

Figura 54: Circuito para a estimulação elétrica de uma célula (A) e circuito de registro do potencial através da
membrana (B). (Figura extraída do livro: Randall D., Burggren W., French K., Animal Physiology, 4a edição,
1997, Capítulo 5).

3.2 Diferenciando uma célula excitável de uma não excitável.

Para respondermos se uma célula apresenta excitabilidade ou não, fazemos uma montagem
experimental que permite a aplicação de um estímulo elétrico na mesma, como apresentado na figura 55. De
acordo com o esquema, o circuito de estimulação corresponde a um eletrodo de corrente conectado a uma
fonte de corrente ou de tensão, que permite enviar corrente para dentro ou para for a da célula (convenção
para corrente: sentido das cargas positivas; corrente para dentro: entrada de cargas positivas na célula e
registrada como deflexões negativas; corrente para fora: saída de cargas positivas da célula e registrada
como deflexões positivas). Chamamos de estímulo hiperpolarizante àquele que determina aumento da
negatividade do meio celular (o potencial de membrana varia de -70 para -100 mV, por exemplo) e de
estímulo despolarizante àquele que determina diminuição da negatividade do meio celular (o potencial de
membrana varia de -70 para -50 mV, por exemplo). O circuito de captação e registro do sinal é constituído de
um microeletrodo colocado no meio intracelular e conectado a um dos terminais do voltímetro e de um
outro microeletrodo conectado ao segundo terminal do voltímetro e em contato com o meio externo, sendo
este ligado ao "terra" do sistema (microeletrodo de referência). Deste modo mede-se, de acordo com a
convenção, Vi-Ve, com Ve igual a 0 mV (esta convenção deve ser SEMPRE obedecida).
Por exemplo, no caso da célula hepática, uma vez feita a montagem experimental, verifica-se que
antes de ligar o circuito de estimulação, ao introduzir o microeletrodo no banho, registra-se inicialmente no
voltímetro uma diferença de potencial nula (microeletrodo e eletrodo de referência no mesmo meio,( Figura 55
A). Quando o microeletrodo é deslocado para o interior da célula, registra-se no voltímetro uma diferença de
potencial negativa, que obviamente corresponde ao potencial de repouso da célula (Figura 55 B).
71

Figura 55: Registros do potencial de referencia (A) e do potencial de repouso (B). (Figura extraída do livro:
Randall D., Burggren W., French K., Animal Physiology, 4a edição,1997 Capítulo 5).

Aplicando-se um estímulo hiperpolarizante (Figura 56: 1,2), observa-se uma variação lenta do
potencial de membrana, estabilizando-se em um novo valor mais negativo (hiperpolarizado) em relação ao
potencial de repouso após um determinado intervalo de tempo, e aí permanecendo desde que o estímulo seja
mantido. A resposta da membrana neste caso é proporcional à intensidade e duração do estímulo. Assim,
quanto maior a intensidade do estímulo, maior será a hiperpolarização atingida pela membrana. O mesmo
acontece se um estímulo despolarizante (Figura 56: 3) for aplicado. O potencial de membrana assumirá
valores mais positivos (despolarizados) que o potencial de repouso, de acordo com a intensidade do
estímulo, e aí permanecerá enquanto durar o estímulo. Denominamos potencial eletrotônico à variação
gradual do potencial de membrana em resposta a um estímulo hiperpolarizante (Figura 56, registros 1 e 2 )
ou despolarizante abaixo do limiar de excitabilidade (Figura 56 , registro 3).
No caso da célula muscular estriada, a aplicação de um estímulo hiperpolarizante de qualquer
intensidade sempre determinará uma variação do potencial de membrana no sentido hiperpolarizante,
caracterizando uma resposta eletrotônica, com as mesmas características descritas para a célula hepática
(Figura 56, registros 1 e 2). Já a aplicação de um estímulo despolarizante determina comportamentos distintos
do potencial de membrana de acordo com a intensidade e duração do mesmo. Abaixo de uma determinada
intensidade e duração do estímulo (limiar de excitabilidade), observamos o desenvolvimento de uma
resposta graduada, e portanto, eletrotônica (Figura 56, registros 3). Porém, quando um estímulo
despolarizante de intensidade e duração igual ou acima do potencial liminar é aplicado, observamos
SEMPRE um mesmo tipo de resposta: uma variação rápida e transiente do potencial de membrana, com 2 a
3 ms de duração (no caso de nervos e músculos estriados) e de amplitude constante, qualquer que seja a
intensidade do estímulo despolarizante aplicado. Denomina-se este tipo de resposta de potencial de ação
(PA) e de potencial liminar ao valor do potencial de membrana que determina o aparecimento do potencial
de ação em resposta a um estímulo despolarizante de intensidade e/ou duração mínimos (Figura 56, registro
4).
72

Figura 56: Respostas elétricas passivas de um neurônio à estímulos hiperpolarizantes (1,2),


despolarizante subliminar (3) e resposta a um estímulo despolarizante supraliminar (4). (Figura extraída do
livro: Randall D., Burggren W., French K., Animal Physiology, 4a edição,1997, Capítulo 5).

Concluindo, a célula hepática é dita não excitável porque em resposta a um estímulo elétrico hiper ou
despolarizante, desenvolve sempre um potencial eletrotônico (PE); já a célula muscular estriada e a
nervosa são excitáveis porque desenvolvem o potencial de ação (PA) em resposta a um estímulo
despolarizante igual ou acima do limiar de excitabilidade.

Potencial eletrotônico

Observando a figura abaixo (figura 57), que indica a variação eletrotônica do potencial de membrana
('Vm) frente a um estímulo surge a pergunta:
Por quê a alteração do potencial de membrana ('Vm) não é instantânea, mas consome
certo tempo para se estabelecer?

Figura 57: Variação eletrotônica do potencial de membrana (Vm) (2) frente a um pulso de corrente (1).
(Figura extraída do livro: Boron W. F., Boulpaep E. L., Medical Physiology, A celular and Molecular
Approach., 2005, capítulo 6).
73

Para entendermos este fenômeno precisamos relembrar o modelo elétrico da membrana.


Como já vimos, podemos representar a membrana biológica, do ponto de vista elétrico, como um
circuito RC em paralelo. Estes elementos Cm e Rm são colocados em paralelo pelo fato da extensão total da
membrana se encontrar submetida ao mesmo potencial (Figura 58).
Submetendo este circuito a um estímulo despolarizante no instante em que fechamos o circuito
verificamos que a corrente transversal através da membrana (Im) se distribui apenas pelo ramo capacitivo (Ic
máxima) e nenhuma corrente passa pelo ramo resistivo (Ir nula). Imediatamente após, devido à corrente
capacitiva gerada em resposta ao estímulo, o potencial através das placas do capacitor vai sendo
gradualmente deslocado (ajuste do potencial de membrana ao estímulo), provocando queda da corrente
capacitiva e consequente aumento da corrente resistiva, até o potencial se estabilizar no novo valor
determinado pela intensidade do estímulo. Assim, em qualquer instante deste ajuste a corrente total (Im) é
igual a IC + Ir, e o tempo para o potencial estabilizar no novo valor depende da constante de tempo (W) do
circuito (constante de tempo da membrana), definida pelo produto RmCm. Finalizado o ajuste, quando então
IC é nula, o potencial permanecerá neste valor enquanto o estímulo for mantido (duração). Cessado o
estímulo, o potencial retornará ao valor observado antes da estimulação, também de modo gradual, e
novamente refletindo a constante de tempo do circuito (Figura 58). O mesmo sucederá se o estímulo for
hiperpolarizante, apenas com aumento do potencial através das placas do capacitor.
O mesmo efeito é observado em uma membrana biológica submetida a um estímulo hiperpolarizante
de qualquer intensidade e duração, ou despolarizante de intensidade abaixo de um determinado valor
(limiar), isto é, enquanto o estímulo despolarizante não alterar o valor de Rm da célula. A este tipo de
resposta gradual e proporcional à intensidade e duração do estímulo denominamos potencial eletrotônico, o
qual reflete a propriedade capacitiva da bicamada lipídica da membrana. Apesar da aplicação da corrente ser
instantânea e constante, o potencial de membrana NÃO se modifica instantaneamente. Existe um intervalo
de tempo no qual o potencial de membrana se desloca gradualmente até alcançar seu valor final.

Figura 58: (a) Circuito elétrico equivalente a uma membrana biológica submetida a um pulso de corrente
constante. (b) Decurso temporal da variação do potencial de membrana e das correntes capacitiva (Ic) ,
resistiva (Ir) e total (Im) através da membrana. (Figura extraída do livro: Randall D., Burggren W., French
K.,Animal Physiology, 4a edição, 1997, Capítulo 5).
74
Este processo de carga da membrana é uma função exponencial do tempo, de acordo com a sua
constante de tempo (W).
Assim, qualquer alteração do potencial de membrana em função de um estímulo hiper ou
despolarizante abaixo do limiar obedecerá à seguinte equação:
'V = 'Vmáx (1 - e-t/W) = 'Vm (1 - e-t/RmCm)

indicando não ocorrer qualquer modificação na resistência da membrana durante a vigência de um potencial
eletrotônico hiper ou despolarizante. Portanto, a resposta do potencial de membrana ocorre
independentemente de quaisquer alterações moleculares na membrana, tais como abertura ou fechamento
de canais iônicos. A corrente iônica que produz as respostas elétricas passivas da membrana flui
primariamente por canais ditos inexcitáveis (isto é, não dependentes de voltagem, canais "leak" ou de
vazamento), e já sabemos que deve se tratar de canais de K+ e Na+, que estão em funciomanento no repouso
e que se mantém assim durante a variação do potencial de membrana.
Quando na equação acima t for igual ao produto RmCm, 'Vt será igual a 'Vmáx.(1 - 1/e) = 0.63.'Vmáx,
caracterizando a constante de tempo (W) do processo, que pode ser medida experimentalmente. Este
parâmetro indica o tempo necessário para a voltagem atingir 63% do valor final da variação do potencial
máximo imposto na membrana em função do estímulo (Figura 59).

Figura 59: Medida da constante de tempo da membrana. Variação do potencial de membrana em função do
tempo e de um estímulo de corrente despolarizante constante. (Figura extraída do livro: Byrne J> H., Schultz
A.G., 1988 An Introduction to Membrane Transport and Bioeletricity , Capítulo 10) .

É de fundamental importância entender que a constante de tempo é um índice simples que indica
quão rápido uma membrana biológica responde a um estímulo.
A variação eletrotônica do potencial de membrana depende das propriedades elétricas passivas da
membrana: resistência da membrana (Rm), constante de tempo (W), constante de espaço ( O),(que será
explicada no item de propagação do impulso nervoso) e capacitância da membrana (Cm).
O potenciais eletrotônicos podem variar em amplitude e duração dependendo do estímulo aplicado
e podem ser gerados em todas as células. O potencial eletrotônico também apresenta as características
de somação espacial e somação temporal, como podemos ver na figura abaixo.
75

Ilustramos abaixo, exemplos de potenciais eletrotônicos observados em alguns receptores


sensoriais.

A) Alterações do potencial de membrana


em uma célula fotorreceptora em B) Mecanismo de transdução da audição
resposta a um estímulo luminoso

3.4 Potencial de Ação

Ilustramos abaixo, o perfil do potencial de ação observado em diferentes células excitáveis.


76
Nesta fase do curso, estaremos detalhando os mecanismos celulares responsáveis pela geração e
condução do Potencial de Ação (impulso nervoso) no axônio motor.

Que fatores determinam a mudança do potencial de membrana, justificando o desenvolvimento de


um potencial eletrotônico ou do potencial de ação nas células excitáveis?

Potenciais de Ação podem ocorrem em células excitáveis, porque a membrana destas células além
GRV³OHDNFKDQQHOV´SUHVHQWHVHPWRGDVDVFpOXODVDSUHVHQWDPFDQDLVHVSHFLDLVRVTXDLVGHVFUHYHUHPRVD
seguir.

3.4.1 Importância dos canais iônicos no controle do Potencial de membrana (Vm)

Como já vimos, a diferença de potencial elétrico (voltagem) através da membrana plasmática de uma
célula, isto é, o potencial de membrana (Vm), depende da distribuição das cargas elétricas através da mesma.
As cargas são transportadas de um lado ao outro da membrana da célula nervosa através dos íons
inorgânicos, principalmente Na+, K+, Cl- e Ca2+, mas estes só conseguem atravessar a bicamada lipídica
através de canais protéicos especiais. Quando os canais iônicos abrem ou fecham, a distribuição das
cargas através da membrana é alterada, e consequentemente o Vm através dela. A sinalização neuronal
depende da presença de canais cuja permeabilidade é controlada ± estes canais são denominados "gated
FKDQQHOV´ 'XDV FODVVHV GH "gated channels" são de extrema importância: (1) canais dependentes de
voltagem, que desempenham papel central no disparo da atividade elétrica através da qual os PAs são
propagados ao longo de um processo celular nervoso e (2) canais dependentes de ligantes, que convertem
sinais extracelulares químicos em sinais elétricos, desempenhando papel central no funcionamento das
sinapses. Estes dois tipos de canais não são restritos apenas aos neurônios: são também encontrados em
outros tipos de células (endotelial, renal, etc.), entre as quais as musculares (estriada, cardíaca e lisa), onde
desempenham funções semelhantes (Figura 60).
77
L eak channels

Figura 60: Vários tipos de canais iônicos. (Figura extraída do livro de Lodish, Harvey; Berk, Arnold;
Zipursky, S. Lawrence; Matsudaira, Paul; Baltimore, David; Darnell, James E. Molecular Cell Biology, New
York: W. H. Freeman & Co.; 1999).

3.4.2 Descrição do Potencial de Ação (PA)

Conforme podemos observar na figura abaixo (Figura 61) o Potencial de Ação (PA) é uma variação
rápida e transiente do potencial de membrana, com 2 a 3 ms de duração (no caso de nervos e músculos
estriados) e de amplitude constante, em resposta a um estímulo despolarizante igual ou acima do limiar de
excitabilidade.

Figura 61: Uma ilustração mostrando que uma vez atingido o potencial liminar o potencial de ação (PA) é
deflagrado.

Uma vez atingido o limiar de excitabilidade a amplitude do potencial de ação é praticamente constante
e não está relacionada à intensidade do estímulo, por isso dizemos que o Potencial de Ação (PA) é uma
Resposta Tudo ou Nada: uma vez disparado, o sistema se dirige para saturação, independentemente do
estímulo do disparo.
Potencial Liminar ou Limiar de Excitabilidade pode ser definido como o valor do potencial de
membrana no qual um potencial de ação ocorre 50% das vezes, ou valor do potencial de membrana que
dispara o potencial de ação. Uma vez atingido este limiar, um aumento na intensidade do estímulo
despolarizante não altera mais a amplitude de voltagem de pico atingida pela membrana: uma vez disparado,
o sistema se dirige para saturação, independentemente do estímulo de disparo (Figura 62).
78

Figura 62: Propriedades tudo-ou-nada dos PAs. O conjunto de curvas sobrepostas mostra as respostas de
uma membrana de tecido excitável a estímulos de deferentes intensidades. As duas curvas menores são
potenciais eletrotônico em reposta a estímulos subliminares. A terceira curva é um PA em resposta a um
estímulo liminar. As demais curvas são PAs em resposta a estímulos supraliminares.

Também é verificado durante o Potencial de Ação, o período refratário absoluto, quando a


membrana fica refratária à qualquer estímulo, mesmo aos supraliminares, e o período refratário relativo,
quando então a membrana é capaz de responder somente à estímulos supraliminares (Figura 63).

Figura 63: Ilustração mostrando durante o PA, o período refratário absoluto, quando a membrana fica
refratária à qualquer estímulo, mesmo aos supraliminares e o período refratário relativo, quando então a
membrana é capaz de responder somente à estímulos supraliminares. (Figura extraída do livro: Moffet, D. F.,
Moffett, S. B., Schauf, C., Human Physiology, 2a Edição, 1993, Capítulo 7).

A 1a fase do PA (Figura 61) corresponde à despolarização, ficando o potencial de membrana


menos negativo até a inversão da a polaridade da membrana. Seguindo este período, o potencial de
membrana retorna aos valores do potencial de repouso, sendo esta fase conhecida como repolarização
(Figura 61, fase 2). Em muitas células a repolarização continua até que a membrana fique transientemente
hiperpolarizada, pós potencial hiperpolarizante, (Figura 61, fase 3) e então o potencial de membrana (Vm)
retorna ao seu valor de repouso original.

3.4.3 Mecanismos iônicos relacionados ao Potencial de Ação (PA)

Importante contribuição a respeito de como são gerados os potenciais de ação veio de


experimentos realizados em 1938 por Kenneth Cole e Howard Curtis. Eles verificaram, no axônio gigante
de lula que durante o potencial de ação, a condutância da membrana aos íons aumenta de forma muito
acentuada.
Uma década depois, os experimentos de Alan Hodgkin e Bernard Katz indicavam que a
despolarização era causada por um aumento da permeabilidade da membrana ao Na+ e que a fase
descendente do potencial de ação seria causada por aumento tardio da permeabilidade da membrana ao K+.
79
Para testar esta hipótese, era necessário variar o potencial de membrana, de forma sistemática,
medindo-se, então as alterações resultantes da condutância da membrana ao Na+ e ao K+. Este experimento
é de difícil realização, pois o funcionamento desses canais de Na+ e K+ dependeriam de alterações do
potencial de membrana. Em 1949, Cole projetou um aparelho, conhecido como fixador de voltagem (voltage
clamp) para resolver esses problemas. No início dos anos 50, Hodgking e Andrew Huxley, utilizando esta
técnica, em axônio gigante de lula, descreveram pela primeira vez os mecanismos iônicos responsáveis pelo
potencial de ação.
O estudo do comportamento cinético de um canal iônico foi possível no final dos anos 70 e início dos
80, quando se desenvolveu a WpFQLFDGH³SDWFKFODPS´ que permite o registro de corrente através de uma
única molécula protéica.
A partir destes estudos, foi possível interpretar o potencial de ação em termos de canais iônicos.

Interpretando o potencial de ação (PA) em termos de canais iônicos

Figura 64: Canais de Na+ dependentes de voltagem (VOCs de Na+) tornam as células nervosas
eletricamente excitáveis.

Os canais de Na+ dependentes de voltagem (VOCs de Na+) tornam as células nervosas eletricamente
excitáveis, capacitando-as a gerar e conduzir os PAs. Quando a membrana de uma célula, contendo muitos
canais de Na+, é parcialmente despolarizada por
um estímulo momentâneo, alguns destes canais são abertos imediatamente, permitindo a entrada de íons
Na+ em seu interior. Para abrir canais de Na+ em quantidade suficiente para disparar o PA, a variação inicial
do Vm deve ser suficiente para despolarizar a membrana até uma determinada voltagem liminar, onde o
influxo de Na+ exceda o efluxo de K+RXVHMDXPDGHVSRODUL]DomRFDSD]GHYHQFHURYD]DPHQWR ³OHDN´ GH
íons potássio (Figura 65).

Figura 65: No limiar de excitabilidade o influxo de Na+ excede o efluxo de K+.(Figura extraída do livro: Moffet,
D. F., Moffett, S. B., Schauf, C., Human Physiology, 2a Edição, 1993, Capítulo 7).
80
Este influxo inicial de cargas positivas despolariza ainda mais a membrana, determinando assim a
abertura de outros canais, que admitem a entrada de mais íons Na+, causando despolarização ainda maior.
Este processo continua de modo auto-amplificador até que o Vm, saindo do repouso elétrico, é deslocado em
direção ao ENa, que é de aproximadamente +50 mV (mecanismo de "feedback" positivo, (Figura 66).

Figura 66: Mecanismo de "feedback" positivo. (Figura extraída do livro de Purves, Dale; Augustine, George
J.; Fitzpatrick, David; Katz, Lawrence C.; LaMantia, Anthony-Samuel; McNamara, James O.; Williams, S.
Mark., Neuroscience , Sunderland (MA): Sinauer Associates, Inc.; 2001).

Quando o Vm é deslocado em direção ao ENa, neste ponto, a força movente resultante (eletroquímica)
para o fluxo de Na+ seria nula, se a conformação do canal no estado aberto fosse estável, e a célula atingiria
um novo estado de repouso, com os canais de Na+ estando permanentemente abertos. Na realidade, a célula
é salva deste espasmo elétrico permanente pela inativação espontânea dos canais de Na+, que agora fecham
gradualmente e assim permanecem até que o Vm retorne ao seu valor de repouso inicial negativo. O ciclo
completo, do estímulo inicial até o retorno ao estado de repouso original, leva alguns milisegundos ou menos
e corresponde ao potencial de ação. (Figura 67 B, Figura 68, curva 1). O intervalo de tempo que os canais de
Na+ dependentes de voltagem permanecem no estado inativado corresponde ao período refratário absoluto,
quando então a membrana fica refratária à qualquer estímulo, mesmo aos supraliminares (Figura 67 B).

Figura 67: Disparo de um potencial de ação. (A) Um estímulo de curta duração e intensidade liminar (ou
supraliminar) é capaz de despolarizar parcialmente a membrana. (B) A curva contínua mostra a evolução
temporal do PA devido à abertura e subseqüente inativação dos canais de Na+ voltagem dependentes. A
curva tracejada mostra o comportamento de Vm para o mesmo estímulo, caso a membrana não
apresentasse canais dependentes de voltagem. (C) Observe que a membrana não dispara o próximo PA
81
antes dos canais se recuperarem da conformação inativa, quando então a membrana fica refratária aos
estímulos, mesmo aos supraliminares (período refratário absoluto) (Figura extraída do livro: Abberts B., Bray
D., Lewis J., Raff M., Roberts, K., Watson J. D., Molecular Biology Of The Cell, 3nd edition, 1994, capítulo
11).

Em diferentes tipos de neurônios, a repolarização é acelerada pela presença na membrana plasmática


de canais de K+, dependentes de voltagem (VOCs de K+). De modo similar aos canais de Na+, estes canais
abrem em resposta à despolarização da membrana, mas com decurso temporal mais lento. O aumento da
permeabilidade da membrana ao K+ no momento em que os canais de Na+ estão se inativando, contribui
para a volta rápida do Vm em direção ao EK, e portanto, ao estado de repouso (Figura 68). A repolarização da
membrana permite que os canais de Na+ se recuperem da inativação, além de provocar o fechamento dos
canais de K+. Por um breve intervalo de tempo, parte dos canais de K+ ainda permanecem abertos, enquanto
que os canais de Na+ já se encontram no estado fechado, caracterizando o período refratário relativo, quando
então a membrana é capaz de responder somente à estímulos supraliminares, uma vez que se encontra
hiperpolarizada (Figura 68). Gradualmente, os canais de K+ restantes vão se fechando, determinando o
retorno do potencial de membrana ao seu valor de repouso. Assim, a membrana celular fica pronta para
responder a um segundo estímulo despolarizante em menos de 1 ms. Deste modo, podemos verificar que
durante o potencial de ação ocorre inicialmente aumento rápido e transiente da condutância da membrana
aos íons Na+ (GNa) e seguido do aumento mais lento da condutância da membrana aos íons K+ (GK),
responsáveis pela fase de despolarização e repolarização do potencial de ação. A figura 68 relaciona a
evolução temporal do PA com a condutância da membrana ao Na+ e ao K+.

Figura 68: Evolução temporal do PA. (A) A curva 1 mostra a despolarização rápida do PA devido à ativação
exclusiva dos canais de Na+ dependentes de voltagem. E a lenta repolarização subseqüente. A curva 2
mostra a rápida repolarização quando os canais de K+ dependentes de voltagem são também ativados.
Observe que após a repolarização há uma ligeira hiperpolarização devida à condutância ainda elevada da
membrana ao K+ (período refratário relativo). (B) O registro do PA é o mesmo da curva 2 da figura ao lado, e
as curvas de condutância ao Na+ e K+ demonstram como a participação dos canais dependentes de voltagem
alteram o decurso temporal do PAS.

Destacamos a seguir as propriedades dos canais de Na+ dependentes de voltagem, uma vez que a
maioria delas são bem semelhantes às propriedades de outros canais dependentes de voltagem, como por
exemplo, os canais de K+. Primeira, os canais são seletivos a íons específicos, podendo ser inibidos por
drogas seletivas. Segunda, eles não abrem lentamente, mas sim por transições abruptas entre várias
conformações discretas. Eles podem estar abertos ou fechados, mas nunca parcialmente abertos. Terceira,
há pelo menos duas conformações fechadas distintas - uma (fechada), em que o canal tem a possibilidade
de abrir em resposta a uma variação de voltagem da membrana, e outra em que está inativado. (Figura
69).Quarta, as transições de uma conformação para outra ocorrem probabilisticamente; uma dada
conformação em determinadas condições tem uma certa probabilidade por unidade de tempo de transitar
para um outro estado Também é característica dos canais iônicos apresentarem valores específicos de
condutância, que são determinados experimentalmente.
82

O canal de Na+ dependente de voltagem pode adotar qualquer das três conformações do canal:
aberto, fechado ou inativado, enquanto o canal de K+ dependente de voltagem só assume as conformações
aberta ou fechada.

Figura 69: Conformações dos VOCs de Na+ e dos VOCS de K+. O canal de Na+ dependente de voltagem
pode adotar qualquer das três conformações quase-estáveis atualmente conhecidas. Medidas cuidadosas
mais recentes sugerem a presença de mais de três conformações para este canal. (Figura extraída do livro de
Purves, Dale; Augustine, George J.; Fitzpatrick, David; Katz, Lawrence C.; LaMantia, Anthony-Samuel;
McNamara, James O.; Williams, S. Mark., Neuroscience,Sunderland (MA): Sinauer Associates, Inc.;
2001).

3.4.4 Importância da bomba Na+/K+ alimentando o Potencial de Ação (PA)


Na maioria dos neurônios, os íons mais importantes envolvidos na propagação do PA são o Na+ e o
K . Os neurônios, como todas as outras células, utilizam grande parte da energia metabólica jogando Na+
+

para fora e K+ para dentro da célula através de uma ATPase Na+/K+ presente na membrana plasmática. Como
resultado de sua atuação, a concentração de Na+ dentro da célula é cerca de 10 vezes menor que fora,
enquanto a distribuição de K+ é oposta à distribuição do Na+. Estas diferenças nas concentrações iônicas
constituem um depósito de energia livre disponível para promover o fluxo de íons através da membrana
plasmática. Este depósito é bem significativo de modo que ele é pouco afetado pelos fluxos transientes de
íons associados à passagem de um ou mais PA(s). Uma célula nervosa típica, mesmo com a bomba Na+/K+
inibida por um bloqueador, como por exemplo a ouabaína, à semelhança de um capacitor carregado,
consegue propagar milhares de PAs antes de se descarregar. Isto porque a quantidade de íons transferida
por PA é pequena, porém suficiente para provocar alteração significativa de Vm. Portanto, podemos
considerar as concentrações intra e extracelulares de Na+ e K+ praticamente constantes, mesmo quando a
célula está eletricamente ativa: os fluxos iônicos responsáveis pelo PA são tão pequenos que só provocam
pequeníssimas alterações de concentração.
83
4. Propagação do potencial eletrotônico (PE) e do potencial de ação (PA)

4.1 Propagação do potencial eletrotônico

Como podemos ver na figura abaixo (Figura 70), a propagação de um potencial eletrotônico ao longo
de um neurônio, diminui de amplitude, em função do ponto de estimulação. Para compreendermos porque
ocorre esta atenuação devemos considerar novamente o modelo de circuito elétrico da membrana, mas que
mostre também a geometria do neurônio.

Figura 70: O potencial eletrotônico decai em função do local de estimulação. (Figura extraída do livro: Boron
W. F., Boulpaep E. L., Medical Physiology, A celular and Molecular Approach., 2005,capítulo 7).
84
A propagação de um potencial eletrotônico depende das propriedades físicas passivas dos
neurônios (capacitância e condutância). Por isso podemos representar um segmento de axônio de um nervo
pelo circuito elétrico equivalente ilustrado abaixo (Figura 71).

Figura 71: Conjunto de váris circuitos equivalentes elementrde distânca, representando a capacitância e a
resistência uniformemente distribuídas ao longo da membrana do axônio em repouso, onde:
Rm: resistência de membrana
Cm: capacitância de membrana
Ri: resistência longitudinal do citoplasma
Re: resistência longitudinal do meio extracelular

Portanto, um segmento de axônio é representado por um conjunto de vários circuitos equivalentes


elementares/unidade arbitrária de distância, representando a capacitância e a resistência uniformemente
distribuídas ao longo da membrana do axônio em repouso. No circuito acima, as capacitâncias e
condutâncias elementares estão mostradas como elementos discretos apenas para fins didáticos.

Como ocorre a propagação de um potencial eletrotônico numa estrutura como a apresentada na


figura acima?
Para responder a esta pergunta, podemos despolarizar artificialmente a célula , inserindo um
microeletrodo de corrente no corpo celular do axônio, e vários outros microeletrodos de registro dispostos ao
longo do axônio. Antes de estimular a célula, registramos em todos os eletrodos, no corpo celular e no axônio,
o potencial de repouso, digamos de -70 mV. Aplicando um estímulo despolarizante subliminar, que
despolariza o corpo celular a -50 mV, e após esperarmos o tempo suficiente para que as alterações no
potencial se estabilizem, verificaremos que o potencial registrado em um ponto muito próximo do local de
estimulação é de -50 mV, mas o potencial registrado nos eletrodos de captação colocados em locais do
axônio cada vez mais afastados do ponto de estimulação vai ficando gradualmente mais negativo (por
exemplo, -55 mV), até que o potencial de repouso é novamente registrado. Se fizermos um gráfico do
potencial registrado em função da distância do ponto de estimulação, verificaremos que o perfil do potencial é
uma função exponencial da distância. (Figura 72).

Figura 72: Variação do potencial elétrico registrado em função da distância do ponto de estimulação. (Figura
extraída do livro: Randall D., Burggren W., French K., Animal Physiology, 4a edição, 1997, Capítulo 6).
85

Como isto pode ser interpretado em função do circuito elétrico equivalente


descrito acima?
Para entender como ocorre a propagação passiva através da membrana celular considere a estrutura
mostrada na figura abaixo (Figura 73).

Figura 73: Propriedades de cabo de uma célula cilíndrica, como por exemplo o axônio (A) Circuito elétrico
equivalente de um cabo imaginário. (B) Respostas elétricas registradas através dos elementos RC em
resposta a um pulso de corrente. (Figura extraída do livro: Randall D., Burggren W., French K., Animal
Physiology, 4a edição, 1997,Capítulo 6).

Se a corrente injetada for pequena, a despolarização é subliminar, e portanto, praticamente não


ocorre a abertura de canais de Na+ HPQ~PHURVXILFLHQWHSDUDYHQFHUR³OHDN´GH.+, e o PA não é disparado.
No estado de "steady state" resultante, a entrada de corrente, injetada através do microeletrodo, é
contrabalançada pela saída de corrente através da membrana, de modo que a entrada total é igual à saída
total de cargas do axônio. Parte da corrente fluirá para o meio externo nas vizinhanças do microeletrodo, e
parte se deslocará no interior do axônio em todas as direções até uma certa distância do ponto de injeção da
corrente, antes de escapar para o meio externo.
Desprezando inicialmente o elemento capacitivo (já que esperamos o tempo suficiente para o
potencial se estabilizar no novo valor em função do estímulo), e assumindo que a corrente flui somente
através da resistência, estimulemos um segmento de axônio no ponto 0, como mostrado na figura 73.
A soma de todas as correntes que deixam o ponto de estimulação dentro do circuito deve ser igual à
soma de todas as correntes que entram naquele mesmo ponto (1ª lei de Kirchoff). Além disto, de acordo com
a lei de Ohm, a corrente se distribui na proporção inversa às resistências dos vários caminhos por ela
encontrado em cada ponto de diversificação da mesma. Assim, quando no circuito equivalente o estímulo é
dado, o pulso de corrente constante ('I) se distribui e flui através da "membrana" nos pontos de ramificação
(pontos 0, 1, 2, 3 e 4). A corrente longitudinal se divide em cada ponto de ramificação (pontos 1, 2, 3 e 4),
parte atravessando o segmento de membrana (corrente transmembranal, Im) e parte continua ao longo do
axônio (corrente longitudinal, Il) (Figuras 73 e 74). A quantidade de corrente que flui através de cada local de
saída depende da resistência (resistência transversal ou da membrana, Rm) deste local à passagem de
corrente.
A corrente transmembranal, através de Rm, decresce exponencialmente à medida que aumenta a
distância entre o ponto de injeção da corrente de estímulo e o local de registro (Figura 73, ponto 0 até 4).
86
A corrente longitudinal diminuirá para cada incremento na resistência longitudinal (Ri) encontrada,
porque esta é cumulativa (lembrar que R = Ul/A, onde U, l e A são a resistividade, comprimento e área,
respectivamente) (Figura 74).
Como U= Ri, a alteração do potencial de membrana ('Vm) diminui à medida que se afasta do ponto
de estimulação (Figura 74).

Figura 74: A corrente longitudinal diminui à medida que o sinal se afasta do local de estimulação.

A intensidade da perturbação ocorrida no Vm decai exponencialmente com a distância do local de


estimulação de acordo com a seguinte equação:
' Vx = 'V0.e-x/O
onde:
'Vx: valor do potencial à distância x do ponto de origem.
x: distância do ponto de origem
'V0: valor do potencial no ponto de origem, isto é x = O.
O : constante de espaço

Define-se como constante de espaço (O) como a distância do ponto de estimulação na qual o sinal
decai a 37% do seu valor inicial, já que o decaimento exponencial do potencial, uma vez estabilizado, é
descrito pela equação:
' Vx = 'V0.e-x/O
Quando x = O, então,
'Vx = 'V0.e-1 = 'V0.1/e = 0,37'V0
Portanto, nestas condições, podemos determinar a constante de espaço (O), conforme ilustrado na
figura 75.
A constante de espaço está relacionada à resistência do axônio pela expressão:
O = —Rm/(Re + Ri) = — Rm/Ri
onde:
Rm: resistência de uma unidade de comprimento do axônio.
Ri: soma das resistências longitudinais interna por unidade de distância.
Re: soma das resistências longitudinais externas por unidade de distância.

Concluindo, o alcance da corrente elétrica ao longo do interior do axônio (corrente longitudinal) é


aumentado quando a resistência da membrana é elevada e/ou a resistência longitudinal interna é baixa. Outra
conclusão interessante a se observar é que em cada ponto de ramificação da corrente longitudinal, a corrente
que flui através de Rm (corrente através da membrana) é a responsável por despolarizar aquele segmento de
membrana, sendo cada vez menor à medida que se distancia do ponto de origem, como ilustrado na figura
75.
87

Figura 75: Determinação gráfica da constante de espaço. (Gráfico extraído do livro: Byrne J> H., Schultz
A.G., 1988 An Introduction to Membrane Transport and Bioeletricity , Capítulo 10) .

Por esta razão, as características elétricas envolvidas na propagação passiva são geralmente
designadas como as propriedades de cabo do axônio (Rm, Cm, constantes de espaço e de tempo).
Esta propagação passiva do sinal elétrico ao longo de um processo celular nervoso ±
isto é, a transmissão de um sinal elétrico, na ausência de amplificação pela abertura de canais dependentes
de voltagem (na ausência de PA), é análoga à transmissão de um sinal ao longo de um cabo telegráfico
submarino. Um cabo submarino é formado por um núcleo constituído de um material altamente condutor
(geralmente cobre), envolvido por uma camada isolante (geralmente neoprene), mergulhado em um meio
condutor (água do mar). A finalidade do cabo submarino é enviar sinais elétricos a longas distâncias com alta
eficiência. A analogia do axônio ao cabo submarino pode ser feita se reconhecermos que o citoplasma contido
ao longo do axônio constitui um meio condutor (água e íons), envolvido por uma camada isolante (a
membrana) e mergulhado em um meio condutor (meio extracelular). Todavia as qualidades de cabo da
membrana celular são piores que as dos cabos submarinos, que apresentam um melhor condutor central,
bem isolado do meio condutor. Apesar disto, é possível empregar as equações desenvolvidas para a
comunicação via cabo na comunicação celular.
Os axônios são piores condutores que os cabos elétricos, e a propagação passiva é inadequada para
transmitir um sinal à distâncias superiores a alguns milímetros, mesmo quando a fonte do sinal produz um
distúrbio que é mantido por um intervalo de tempo prolongado.
A propagação passiva é ainda menos satisfatória para a transmissão de sinais transientes a longas
distâncias, porque a alteração do Vm que resulta do fluxo de corrente não é instantânea, mas consome certo
tempo para se estabelecer. Este tempo depende da capacitância da membrana, isto é, da quantidade de
carga que deverá ser acumulada em cada lado da membrana para estabelecer o novo valor de Vm. A
capacitância da membrana tem o efeito de desacelerar a propagação passiva dos sinais ao longo do axônio,
assim como distorcê-los, de modo que um estímulo induzido em um dado ponto, na forma de uma onda
quadrada, será detectado a poucos milímetros do mesmo somente como um aumento e queda de potencial,
lento e gradativo, e com amplitude significativamente menor. Consequentemente, para que ocorra a
propagação fiel do sinal a uma distância superior a poucos milímetros, o axônio deverá ter, além de suas
propriedades passivas de cabo, XP PHFDQLVPR DWLYR PHFDQLVPR GH ³IHHGEDFN´ SRVLWLYR Mi GHVFULWR  SDUD
manter a intensidade do sinal durante a mesma.
88
4.2 Propagação do Potencial de Ação

4.2.1 Os Potenciais de Ação Garantem a Comunicação Rápida a Longas Distâncias


Injetando-se uma corrente de intensidade suficiente para despolarizar localmente a membrana acima
do seu limiar em um dado ponto do axônio, os canais de Na+ dependentes de voltagem se abrem, permitindo
a entrada de Na+ na célula. Consequentemente há despolarização nesta região da membrana, disparando um
PA. Este influxo elevado de Na+ determina a passagem de correntes ao longo do comprimento do axônio
(corrente longitudinal), despolarizando a membrana das regiões vizinhas, do mesmo modo como a injeção de
corrente através do microeletrodo produziu uma despolarização nas condições de propagação passiva.
Entretanto, a despolarização das regiões vizinhas, por transmissão passiva, ainda é de intensidade suficiente
para excitá-las, levando-as a atingir o limiar, de modo que elas disparam PAs. Este processo ocorre ao longo
de toda a extensão do axônio. (Figura 76).

Figura 76: O elevado influxo de na+ que ocorre na deflagração do potencial de ação (pa) determina a
passagem de correntes ao longo do comprimento do axônio (corrente longitudinal), despolarizando a
membrana das regiões vizinhas. (Figura extraída do livro: Purves, Dale; Augustine, George J.; Fitzpatrick,
David; Katz, Lawrence C.; LaMantia, Anthony-Samuel; McNamara, James O.; Williams, S. Mark.,
Neuroscience ,Sunderland (MA): Sinauer Associates, Inc.; 2001).

4.2.2 A Mielinização Acelera a Condução

Qualquer fator que aumente a velocidade e a eficiência da propagação passiva da despolarização ao


longo da membrana, aumentará também a velocidade e a eficiência de propagação dos PAs. Um dos fatores
a ser considerado é o diâmetro do axônio. Os invertebrados, por exemplo a lula, desenvolveram axônios
gigantes, com diâmetros de até 1 mm, garantindo assim uma rápida sinalização. Entretanto, os vertebrados
desenvolveram uma estrutura mais adequada. Estes conseguem altas velocidades de condução, sem alterar
as dimensões do axônio, através do isolamento de grande parte do axônio pela bainha de mielina. A bainha
de mielina é constituída por células especializadas, células gliais - células de Schwann, nos nervos periféricos
e oligodendrócitos no SNC. Estas células envolvem, em camadas concêntricas, suas membranas plasmáticas
em uma espiral bem comprimida ao redor do axônio.
Cada célula de Schwann está comprometida com um único axônio, formando diversos segmentos de
mielina de aproximadamente 1 mm de comprimento ao longo do axônio; os oligodendrócitos formam
segmentos de camadas semelhantes, porém para diversos axônios simultaneamente.
89
A bainha de mielina é comprimida e espessa, podendo atingir em alguns casos até 100 camadas
concêntricas de membrana plasmática, de modo a impedir praticamente todo o vazamento ("leakage") de
corrente através da porção recoberta da membrana do axônio por mielina (internodo). Entre um segmento de
bainha e o próximo permanecem expostas pequenas regiões da membrana plasmática do axônio. Os
chamados nodos de Ranvier, com cerca de 0,5 µm de extensão, são os focos da atividade elétrica.
Praticamente todos os canais de Na+ do axônio estão concentrados nestes nodos, fornecendo uma densidade
de vários milhares de canais por µm2 nesta região (aproximadamente 12000 por Pm2), enquanto os internodos
são praticamente desprovidos destes canais. Conforme já foi descrito, quando um PA é disparado em um
nodo, ele despolariza as regiões vizinhas.
Consequentemente, as correntes associadas ao PA nodal são pronta e eficientemente canalizadas
por propagação passiva ao próximo nodo, onde um novo PA é disparado. Portanto, a condução é saltatória: o
sinal é propagado ao longo axônio saltando de nodo a nodo. A mielinização tem duas vantagens principais: os
PAs se propagam rapidamente, e a energia metabólica é economizada porque a excitação ativa está
confinada à pequenas regiões nodais (Figura 77).

Figura 77: Condução saltatória em uma fibra mielinizada. (Figura extraída do livro: Purves, Dale; Augustine,
George J.; Fitzpatrick, David; Katz, Lawrence C.; LaMantia, Anthony-Samuel; McNamara, James O.;
Williams, S. Mark., Neuroscience, Sunderland (MA): Sinauer Associates, Inc.; 2001).
90

Os internodos não são excitáveis, pois além de não possuírem os canais adequados, são regiões que
oferecem grande resistência à passagem de corrente através delas. Por outro lado, estas mesmas áreas
possuem excelentes propriedades de cabo - baixa capacitância e alta resistência ao vazamento de corrente.
Isto aumenta a velocidade e a eficiência de propagação dos PAs. (Figura 78).
Enfatizamos, que duas propriedades passivas da membrana dos axônios são importantes para a
velocidade de propagação do potencial de ação: a constante de tempo (W)HDFRQVWDQWHGHHVSDoR Ȝ (VWDV
propriedades são ditas passivas porque elas não dependem diretamente do metabolismo ou qualquer
alteração da permeabilidade da membrana, dependente de voltagem, tal como acontece no potencial de
ação. São propriedades intrínsecas que refletem as propriedades físicas de todas as membranas celulares.

Figura 78: O alcance da corrente elétrica ao longo do interior do axônio (corrente longitudinal) é aumentado
quando a resistência da membrana é elevada.

Resumo A sinalização elétrica nas células nervosas e musculares depende das mudanças do potencial de
membrana devido ao movimento de um pequeno número de íons através de canais. A bomba sódio/potássio,
às custas de energia metabólica, sustenta estes movimentos iônicos, diminuindo a concentração de sódio
intracelular e aumentando a de potássio, garantindo a manutenção dos gradientes iônicos. Na membrana do
neurônio em repouso, os canais seletivos aos íons potássio mantêm a permeabilidade deste íon mais alta que
para os demais; consequentemente, o potencial da membrana está muito próximo do potencial de equilíbrio
do potássio, que é de -70 mV. Uma despolarização repentina da membrana altera a permeabilidade iônica
devido à abertura dos canais de sódio dependentes de voltagem, os quais são inativados, caso a
despolarização seja prolongada. Os canais individuais sofrem transições abruptas entre seus estados
conformacionais alternativos (aberto, inativado e fechado), influenciados pelo campo elétrico da membrana.
Um potencial de ação surge logo depois que um breve estímulo despolarizante causa a abertura de alguns
canais de sódio dependentes de voltagem, tornando a membrana mais permeável ao sódio, e posteriormente
deslocando o potencial da membrana em direção ao potencial de equilíbrio do sódio. Este "feedback" positivo
causa a abertura de um número maior de canais de sódio, dando ao potencial de ação um caráter tudo-ou-
nada. O potencial de ação é rapidamente interrompido pela inativação dos canais de sódio e, em muitos
neurônios, pela abertura dos canais de potássio dependentes de voltagem. A propagação do potencial de
ação através da fibra nervosa depende de suas propriedades passivas de cabo elétrico. Quando, após uma
91
despolarização local, a membrana dispara um potencial de ação, a corrente atravessa a membrana através
dos canais de sódio que foram abertos, causando assim a ativação das regiões vizinhas e consequentemente
propagando o PA. Em muitos axônios de vertebrados, a velocidade e a eficiência da propagação do potencial
são maiores devido à existência de uma bainha de mielina, que permite a ativação de apenas algumas
regiões excitáveis da membrana, isto é os nodos de Ranvier.

5. Bibliografia

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CONTRAÇÃO MUSCULAR

Objetivos:

1. Identificar os componentes da maquinaria contrátil de um músculo.


2. Descrever a ultra-estrutura de um sarcômero (unidade estrutural).
3. Descrever a estrutura molecular dos miofilamentos.
4. Entender a teoria dos filamentos deslizantes para a contração muscular.
5. Descrever a sequência de eventos relacionados com o acoplamento excitação-contração no músculo.
6. Identificar a unidade regulatória do processo de contração muscular.
7. Identificar as fontes de energia para a contração muscular.
8. Explicar o papel do ATP e do cálcio na interação da actina com a miosina.
9. Entender a rigidez cadavérica.

C O N T R A Ç Ã O M USC U L A R

A característica fundamental do músculo é a de transformar a energia química, proveniente da


hidrólise do ATP, em energia mecânica, a contração. Para a realização desta tarefa, os músculos
estriados, tanto esqueléticos como cardíacos, apresentam um sistema altamente organizado de
miofibrilas. Já os músculos lisos formam um sistema bem heterogêneo, com grande diversidade
morfológica e funcional, dependendo do tipo de órgão estudado (vasos sanguíneos, útero, canal deferente,
etc.). Nosso objetivo será o de estudar o mecanismo de contração da musculatura esquelética estriada.

1. Estrutura macroscópica e microscópica do músculo estriado

O músculo esquelético é constituído de numerosas fibras alongadas, sendo cada fibra muscular
correspondente a uma célula de 10 cm ou mais de comprimento. Cada fibra é multinucleada, com os
núcleos localizados na periferia.
A célula muscular contém, além da maquinaria bioquímica característica de qualquer célula,
miofilamentos orientados longitudinalmente em relação a ela, e dois sistemas de membranas, transversal
e longitudinal, que participam do ciclo excitação-contração-relaxamento dos filamentos. Tais elementos
serão discutidos a seguir.

1.1 Sarcolema

É a membrana celular da fibra muscular. Consiste de uma membrana celular verdadeira


(membrana plasmática) e de uma fina camada de material polissacarídeo. Na camada mais externa do
sarcolema estão também presentes as fibras colágenas. Nas extremidades das fibras, as camadas
superficiais do sarcolema se fundem com as fibras tendinosas que, por sua vez, formam os tendões
musculares que se inserem nos ossos.
Os tendões não apresentam por si só atividade contrátil. As forças geradas pelas fibras musculares
são transmitidas pelos tendões aos ossos, possibilitando o movimento.

1.2. Miofibrilas, filamentos de actina e de miosina, sarcômero, bandas e zonas

Cada fibra muscular (célula muscular) é constituída de centenas a milhares de miofibrilas (Figura
79). Cada miofibrila apresenta 1 a 2 PM de diâmetro, e comprimento igual ao da fibra muscular a que
pertence.
97
À microscopia ótica, cada miofibrila apresenta uma série de bandas transversais claras e escuras
que se alternam regularmente ao longo da mesma, dando uma aparência em estrias. Daí estes músculos
serem denominados estriados (Figura 79).
As bandas claras foram denominadas Bandas I (isotrópicas, por permitirem a passagem da luz em
todas as direções) e as bandas escuras denominadas bandas A (anisotrópicas, por apresentarem
diferentes índices de refração com a direção), indicando que a fibra muscular apresenta uma certa
orientação molecular (Figura 79).
Quando a fibra muscular encontra-se em repouso, a banda A possui cerca de 1,5 Pm de
comprimento e a banda I ao redor de 0,8 Pm. Na parte central da banda A, observa-se uma zona mais
clara, denominada zona H, e no meio da banda I, observa-se uma linha mais escura, denominada linha Z.
Denomina-se sarcômero à região delimitada por duas linhas Z. Tal região corresponde à unidade contrátil,
repetitiva, da célula muscular, com um tamanho variando entre 1,5 a 3,5 Pm (Figura 79).
Um único sarcômero contém cerca de 1000 filamentos grossos e ao redor de 2000 filamentos finos.
No comprimento de repouso (2,3 Pm), os filamentos grossos e finos estão sobrepostos em cerca de 1/3 de
seus comprimentos. O comprimento do sarcômero durante a contração máxima atinge cerca de 1,5 Pm,
isto é, um encurtamento ao redor de 30%.

2. Ultra-estrutura do músculo estriado

2.1. Filamentos

À microscopia eletrônica, cada miofibrila é constituída por dois tipos de filamentos: filamentos
grossos, com cerca de 12 nm de diâmetro e 1,5 Pm de comprimento, dispostos na região central do
sarcômero, e filamentos finos, com aproximadamente 8 nm de diâmetro e 1 Pm de comprimento, que se
inserem nas linhas Z, dirigindo-se para a região central do sarcômero onde se entremeiam aos filamentos
grossos (Figura 79).
Cada tipo de miofilamento se associa a outros filamentos do mesmo tipo, e os dois conjuntos se
sobrepõem parcialmente, de modo que a banda A, densa, corresponde à região de sobreposição dos
filamentos finos e grossos. Na banda I encontram-se apenas filamentos finos, enquanto que na zona H
encontram-se apenas filamentos grossos. Observa-se ainda na banda A, com exceção da zona H, uma
conexão entre os filamentos finos e grossos através de pontes.

Figura 79: Esquema da estrutura macroscópica e microscópica do músculo estriado esquelético.


98

2.2. Sarcoplasma

É o meio onde as miofibrilas estão suspensas no interior da célula muscular. O líquido do


sarcoplasma contém baixa concentração de cálcio, grandes quantidades de potássio, magnésio, fosfato,
enzimas, e um grande número de mitocôndrias que se localizam entre e paralelamente às miofibrilas.

2.3. Sistema de membranas

Antes ainda do advento da microscopia eletrônica, observou-se que a célula muscular possui dois
sistemas de membrana, um deles disposto perpendicularmente aos miofilamentos (túbulos transversos) e
o outro disposto paralelamente aos mesmos (sistema longitudinal), ambos ocupando cerca de 15% do
volume celular total.

2.3.1. Túbulos transversos (túbulos T)

São invaginações do sarcolema na altura das linhas Z (Figuras 80 e 81). Estes canalículos
distribuem-se para o interior da célula de modo a passar perpendicularmente às miofibrilas e são
extensões do espaço extracelular para dentro das fibras musculares, mantendo os sarcômeros situados
em diferentes níveis em contato direto com o líquido extracelular. O sistema é exclusivo do músculo
esquelético e cardíaco e mantém os sarcômeros de cada miofibrila alinhados ao sarcômero de outra
miofibrila.

Figura 80: Representação esquemática do túbulo transverso (Túbulo T) e do retículo sarcoplasmático


longitudinal, com as cisternas laterais a cada lado do túbulo T formando a tríade.

2.3.2. Retículo sarcoplasmático

É constituído de canalículos orientados longitudinalmente, que ocupam toda a extensão do


sarcômero. Em suas extremidades estes canalículos formam estruturas bulbosas denominadas cisternas,
que estão em íntima conexão com os túbulos transversos, formando as tríades. O retículo sarcoplasmático
está envolvido na captação e liberação de íons cálcio.

2.3.3. Tríade

Como citado anteriormente, a cada lado do túbulo T observam-se estruturas bulbosas


denominadas sacos laterais ou cisternas, que são contínuas ao retículo sarcoplasmático. Cada cisterna
entra em contato com cerca de 30% do túbulo T, através de projeções dispostas regularmente no espaço
que separa estas duas estruturas. Tais projeções são denominadas pés-juncionais e são importantes na
transmissão de sinais do túbulo T para o retículo sarcoplasmático (Figuras 80 e 81). Denomina-se tríade
ao conjunto formado por duas cisternas do retículo sarcoplasmático e um túbulo T.
99

Figura 81: Estrutura tridimensional dos túbulos transversos e do retículo sarcoplasmático.

3. Características Moleculares dos Miofilamentos

A principal proteína constituinte do filamento grosso é a miosina, enquanto o filamento fino é


constituído de três proteínas: actina, tropomiosina e troponina.

3.1. Miosina

A microscopia eletrônica da miosina isolada em solução de alta força iônica (KCl 0,6 M) mostra
uma molécula alongada com cerca de 0,15 a 0,16Pm de comprimento, constituída de uma porção
filamentosa, denominada cauda e outra globular, a cabeça.
Seu peso molecular é da ordem de 470.000 e ela é constituída de duas cadeias polipeptídicas
principais e quatro "cadeias leves", que se encontram ligadas não covalentemente às partes globulares da
molécula (Figura 82).
Cada cadeia polipeptídica possui peso molecular de 200.000, e na região da cauda as duas
cadeias se enrolam entre si numa estrutura chamada dupla hélice. Em uma das extremidades as cadeias
se separam e se enrolam sobre si mesmas, constituindo as regiões globulares (ou cabeças).
O papel das cadeias leves da cabeça da miosina ainda não está bem estabelecido, mas há
sugestões de que elas possam desempenhar um papel estabilizador da conformação tridimensional das
regiões globulares e também um papel regulatório durante a contração.
A molécula de miosina apresenta pontos particulares de suscetibilidade ao tratamento com enzimas
proteolíticas. Assim, pela ação da tripsina, a molécula é rompida em dois fragmentos, denominados
meromiosina leve (MML) e pesada (MMP) (Figura 82). Com tratamento mais prolongado pela tripsina, a
MMP é quebrada nos subfragmentos S-1 e S-2 . O fragmento S-1 corresponde às partes globulares
isoladas, enquanto que o subfragmento S-2 corresponde à parte filamentosa. O tratamento por papaína
separa o subfragmento S-1 do restante da molécula de miosina. Acredita-se que os pontos de maior
flexibilidade da molécula de miosina localizem-se na junção entre a MML e a MMP e entre o S-1 e S-2
(Figura 82).
100

Figura 82: Representação esquemática da molécula de miosina com os fragmentos obtidos após a ação
de enzimas proteolíticas.

A molécula de miosina apresenta, portanto, duas regiões que são morfologicamente e


funcionalmente distintas. A cauda desempenha um papel estrutural, formando o arcabouço do filamento
grosso. A cabeça, por sua vez, é capaz de se ligar aos filamentos finos e é a sede do processo de
transdução de energia química em mecânica, base do processo contrátil. Portanto, encontramos em cada
cabeça um sítio de interação com a actina e outro sítio de ligação e hidrólise do ATP, esta última uma
reação fornecedora de energia (exergônica) essencial para a movimentação das pontes.
Diminuindo-se a força iônica do meio a valores fisiológicos, as moléculas de miosina se agregam,
formando filamentos de aspecto muito semelhante a dos filamentos grossos observados em cortes ou em
homogeneizados de músculos. Tais filamentos apresentam projeções típicas, espaçadas em toda a sua
extensão, exceto na parte central (denominada zona careca). Nos sarcômeros, as zonas carecas estão
localizadas na altura da zona H .
Acompanhando-se o processo de polimerização das moléculas de miosina à microscopia
eletrônica, observa-se que as moléculas de miosina se agregam inicialmente cauda a cauda, seguida de
uma agregação lado a lado. Desta maneira, 300 a 400 moléculas de miosina formam um filamento bipolar,
não apresentando cabeças na região central do filamento (isto explica o fato de o filamento de miosina ser
capaz de puxar o filamento fino em direção ao centro do sarcômero no processo de contração muscular)
(Figura 83).

Figura 83: Foto e representação esquemática dos filamentos grossos: as cabeças são projetadas para
ambos os lados, em direção às linhas Z, enquanto que as caudas estão voltadas para a zona H.

Além da miosina, o filamento grosso possui duas outras proteínas. A Proteína C é uma molécula
alongada, e está enrolada ao redor das caudas de miosina de modo a manter o feixe de moléculas de
miosina intacto. A Proteína M está localizada na linha M no centro da zona H, postulando-se uma função
similar à da proteína C.
101
3.2. Actina

É a principal proteína constituinte do filamento fino, sendo solúvel em água ou em solução de força
iônica baixa. Nestas condições ela é chamada G-actina (G de globular) sendo uma molécula quase
esférica, com um diâmetro de 5,5 nm. Aumentando-se a força iônica de soluções de G-actina no sentido
da força iônica fisiológica, a actina se polimeriza, formando a F-actina (F de filamentosa). Para que a
polimerização ocorra é necessária a presença de íons cálcio e ATP no meio.
A F-actina assim obtida apresenta à microscopia eletrônica um aspecto semelhante aos filamentos
finos obtidos diretamente de homogeneizados de músculos. Verificamos assim que, na força iônica vigente
no interior da célula (aproximadamente 0,15M), tanto a actina como a miosina encontram-se na forma
agregada e insolúvel.
No filamento fino, que possui 1 Pm de comprimento, as moléculas de actina estão arranjadas em 2
filamentos de F-actina, enrolados entre si como dois colares de contas, formando uma dupla hélice. Cada
molécula de actina ocupa 5,5 nm da cadeia (cordão), de modo que para a distância que separa duas
cabeças de miosina consecutivas (14,3 nm), encontramos 2,6 moléculas de actina (Figura 84).
Caso fragmentos S-1 da molécula de miosina sejam adicionados a uma solução contendo
filamentos de actina puros, eles espontaneamente se ligarão de modo estável na razão de um fragmento
S-1 para uma molécula de actina. A dissociação deste complexo requer ATP, que se liga ao fragmento S-1
na razão de 1:1.

3.3. Tropomiosina

É uma proteína filamentosa, com peso molecular de 70.000 e é constituída por duas cadeias
polipeptídicas diferentes, enroladas entre si, formando uma dupla hélice de aproximadamente 40 nm de
comprimento. As moléculas de tropomiosina são capazes de se unirem pelas extremidades, formando um
filamento.
Cada filamento fino, por sua vez, possui dois filamentos de tropomiosina que se enrolam ao redor
da espiral dupla formadas pelos monômeros de actina ocupando os sulcos entre estes últimos. Cada
molécula de tropomiosina se estende por sete monômeros de actina (Figura 84).

3.4. Troponina

É uma proteína com peso molecular de 76.000, formada por três subunidades globulares, unidas
entre si por ligações não covalentes.
a) Troponina T (TnT): é a maior das subunidades, com peso molecular de 37.000, capaz de se ligar à
tropomiosina e à TnC. Sua função é a de unir o restante da molécula de troponina ao filamento fino ou,
mais especificamente, à tropomiosina.
b) Troponina I (TnI) (troponina inibidora): tem peso molecular de 20.800 e é capaz de se ligar à TnC e à F-
actina. Sua principal função é a de fortalecer a ligação tropomiosina-actina, fixando a tropomiosina numa
posição adequada, de modo a impedir a interação miosina-actina na ausência de cálcio (Figura 84).
c)Troponina C (TnC): é a menor subunidade (peso molecular de 18.000) e apresenta em sua estrutura
sítios de alta afinidade pelos íons cálcio, sendo a combinação destes íons com a troponina C o gatilho que
inicia a contração muscular.
No filamento fino, as moléculas de troponina estão encaixadas na tropomiosina através da TnT.
Cada complexo aparece periodicamente a cada 38,5 nm de modo que grande parte dos monômeros de
actina não estão em contato com a troponina.
102

Figura 84: Representação esquemática da das proteínas do filamento fino.

4. Mecanismo molecular da contração muscular

4.1. Tipos de contração

O processo de contração consiste no acoplamento de uma reação química (hidrólise do ATP) a um


mecanismo capaz de gerar tensão e liberar calor, ou então capaz de sofrer encurtamento, produzindo
calor e trabalho. Podemos observar, portanto, dois tipos de contração:

4.1.1. Contração isométrica

Ocorre contração isométrica do músculo quando não se observa o encurtamento do mesmo ao ser
estimulado. Este tipo de contração é obtido quando se coloca uma carga (ou peso) acima daquela que o
músculo é capaz de movimentar. Nestas condições, o músculo gera tensão, mas seu comprimento
permanece constante. Durante uma contração isométrica, a maioria da energia proveniente da hidrólise do
ATP é transformada em calor e tensão e o músculo não realiza trabalho. As contrações isométricas
constam, em geral, do enrijecimento de um conjunto de músculos contra um objeto imóvel (uma parede,
uma barra, etc.). No organismo, por exemplo, os músculos posturais desenvolvem tensão atuando contra
a gravidade.

4.1.2. Contração isotônica

Ocorre contração isotônica do músculo, quando seu comprimento diminui ao ser estimulado,
permanecendo praticamente constante a tensão. O músculo realiza trabalho ao deslocar uma carga ou
peso (trabalho = carga x distância percorrida). Durante a contração isotônica, grande parte da energia
proveniente da hidrólise é liberada na forma de calor.
Fisiologicamente, a resposta muscular envolve a combinação das contrações isotônica e
isométrica. Suponha que se deseje elevar um peso de 3 Kg acima da cabeça. Inicialmente, será
necessário o desenvolvimento de uma contração isotônica pelos músculos do braço, levando-o à posição
desejada. Posteriormente, para a manutenção desta posição, será necessário o desenvolvimento de
contração isométrica dos músculos que irão manter fixa a articulação do cotovelo.

4.2. Mecanismo da contração por deslizamento (contração isotônica)

A Figura 85 ilustra o mecanismo básico da contração muscular, onde está representado o


sarcômero no estado relaxado e no estado contraído. No estado contraído, observa-se a aproximação das
103
linhas Z e a diminuição da banda I e zona H (que até podem desaparecer, conforme o grau de
contração). A dimensão da banda A e o comprimento dos filamentos finos e grossos permanecem
constantes.
O estímulo determina inicialmente a contração de um sarcômero. Este puxa os demais na sua
direção (já que a disposição dos sarcômeros no músculo é em série), resultando no encurtamento do
músculo como um todo.
Tais observações levaram Huxley a formular a teoria dos filamentos deslizantes, onde o
encurtamento do músculo decorre do deslizamento dos filamentos finos entre os grossos. Os filamentos
grossos funcionam como ponto de apoio para os finos.
A participação da cabeça da miosina neste processo foi demonstrada pelo movimento das cabeças
durante o processo contrátil e pela observação de que no músculo em repouso elas se encontram
orientadas em um ângulo de 90q em relação ao filamento fino, enquanto que no músculo contraído elas se
encontram em um ângulo de 45q.
Portanto, a base para a contração é a formação de pontes transversais entre os filamentos grossos
e finos, através da interação da cabeça da miosina com uma determinada região do monômero de actina
(sítio de interação). Cada filamento grosso tem possibilidade de interagir com 6 filamentos finos
circundantes e, por sua vez, cada filamento fino, com 3 grossos (arranjo hexagonal).

Figura 85: Mecanismo básico da contração muscular pela teoria dos filamentos deslizantes.

Existe uma certa correlação entre as etapas bioquímicas e as conformações assumidas pela
cabeça de miosina. Assim, foi proposto por Eisenberg e Greene (1980) o seguinte Modelo (figura 86) para
um ciclo completo de movimentação das pontes transversais:

Figura 86: Diagrama ilustrando o ciclo de eventos químicos e mecânicos que ocorrem a nível da cabeça
da miosina durante o processo contrátil.
104

Comecemos a análise do ciclo pelo canto superior esquerdo, com as cabeças da miosina na
conformação de 90q que corresponde à de baixa afinidade pela actina. Existe um equilíbrio rápido entre a
miosina ligada com a actina e a miosina livre (como no estudo anterior cinético com as proteínas em
solução). A hidrólise de ATP e o passo limitante ocorrem nesta conformação de 90q. O próximo passo é a
transição da conformação de 90q para 45q, onde ocorre a liberação do Pi , e a miosina passa a ter alta
afinidade pela actina. Esta transição se dá em duas etapas diferindo do comportamento das proteínas em
solução. No caso da solução não existe restrição à mudança de conformação da cabeça da miosina, e ela
pode assumir uma conformação estável de 45q. No caso do músculo, a estrutura restringe esta mudança
gerando uma força positiva, representada no esquema por uma flecha curva, que vai induzir o
deslocamento ou deslizamento do filamento de actina, com a realização de trabalho. Em seguida há a
liberação do ADP e a entrada do ATP quando, como visto nos ensaios bioquímicos, a miosina tenderia a
assumir a conformação de 90q, com baixa afinidade pela actina. No músculo, porém, novamente vamos
encontrar esta transição em duas fases resultando no relaxamento do músculo. A primeira, com uma força
negativa, tenderia a reverter o deslocamento, uma vez que a miosina continua ligada à actina. No entanto,
isto não acontece porque a velocidade com que o complexo miosina.ATP se desliga da actina é muito
grande, possibilitando assim a conformação de 90q da cabeça da miosina sem que haja qualquer
deslocamento do filamento de actina.
Se o fornecimento de ATP ao músculo não for adequado, as pontes transversais permanecem na
conformação de 45q que corresponde ao estado típico de rigidez observado após a morte (rigor mortis).
A figura 87 ilustra o ciclo de eventos químicos e mecânicos que ocorrem ao nível da cabeça da
miosina durante o processo contrátil.

Figura 87: Diagrama ilustrando o ciclo de eventos químicos e mecânicos que ocorrem ao nível da cabeça
da miosina durante o processo contrátil.
105

5. Acoplamento excitação-contração

A excitação elétrica precede a contração mecânica. A fase de subida do potencial de ação precede
em 2 ms o início dos fenômenos mecânicos. Durante este período ocorrem uma série de processos
intermediários que dão por resultado a transmissão de um sinal elétrico da superfície da membrana até os
miofilamentos no interior da fibra. Este conjunto de processos recebe o nome de acoplamento excitação-
contração.
Descreveremos o acoplamento excitação-contração a partir do impulso nervoso.
A despolarização que o caracteriza, atravessando a junção neuro-muscular, atinge a membrana da
fibra muscular e pelos túbulos transversos pode penetrar profundamente na massa muscular. Daí distribui-
se rapidamente de maneira uniforme para regiões adjacentes às cisternas terminais do retículo
sarcoplasmático longitudinal, provocando a liberação do cálcio estocado na cisterna para o sarcoplasma
(Figura 91). O cálcio liberado é translocado para a troponina localizada no filamento fino, permitindo que a
miosina se ligue ao sítio da actina. O complexo actomiosina assim formado hidrolisa o ATP, iniciando-se
desta maneira a contração. Ao final da despolarização, o cálcio é reacumulado pelo retículo
sarcoplasmático longitudinal, utilizando a energia proveniente do ATP. Então, a diminuição da
concentração de cálcio ao nível da troponina desliga a maquinaria contrátil e o músculo relaxa.
O mecanismo pelo qual o túbulo transverso comunica o seu sinal para as cisternas do retículo
sarcoplasmático ainda não está completamente claro. A hipótese mais aceita atualmente está
esquematizada na Figura 88.
Na membrana dos túbulos T existem muitas unidades de uma proteína intrínseca denominada
receptor de dihidropiridina (DHP), moléculas que agem como sensores de voltagem. Na membranas das
cisternas laterais, por sua vez, existem proteínas chamadas receptores de rianodina (pés-juncionais), que
constituem canais pelos quais os íons cálcio são liberados e estão em íntima conexão com os receptores
de DHP. Quando a despolarização atinge a membrana dos túbulos T, os receptores de DHP sofrem uma
alteração conformacional que provoca a abertura dos canais de cálcio. Estes íons, que no retículo
sarcoplasmático se encontram ligados a uma proteína chamada calsequestrina, difundem-se para o
sarcoplasma até que, com o término do estímulo despolarizante, os canais sejam novamente fechados.

Figura 88: Sequência de eventos no acoplamento excitação-contração

5.1. Túbulos T

Como eles estão em contato com o espaço extracelular e são contínuos com a superfície da
membrana, a sua função é propagar a despolarização da superfície da membrana até o centro da fibra de
modo que as miofibrilas mais internas possam contrair-se mais rapidamente.
106

5.2. Papel do íon cálcio na contração muscular

Há inúmeras evidências experimentais de que as membranas do retículo sarcoplasmático ligam


cálcio com alta afinidade. Há um sistema de enzimas ligado à membrana do retículo sarcoplasmático
capaz de hidrolisar ATP. A energia proveniente desta reação de hidrólise é utilizada para bombear
ativamente cálcio do sarcoplasma para o interior do retículo sarcoplasmático sendo que, na célula
muscular em repouso, a concentração de cálcio no sarcoplasma é baixa (10-7 M) graças à atuação desta
bomba.
A onda despolarizante (estímulo), chegando ao nível das cisternas, provoca um aumento na
permeabilidade da membrana destas ao íon cálcio. Consequentemente, há um aumento no fluxo deste íon
para o sarcoplasma, elevando a sua concentração para cerca de 10-5 M e iniciando o processo contrátil. A
bomba de cálcio, embora continue retirando cálcio do sarcoplasma, não consegue contrabalançar o
grande fluxo passivo deste íon. Cessada a estimulação, este excesso de cálcio no sarcoplasma se
extingue com o tempo (a bomba de cálcio continua funcionando normalmente) e a concentração
citoplasmática do íon volta a ser baixa (10-7 M).

5.3. Papel da troponina-tropomiosina na contração muscular

O papel do cálcio como fator regulador da contração foi confirmado quando foi feito um estudo da
hidrólise de ATP em preparações de músculos estriados de vertebrados contendo apenas os filamentos
grossos e finos, ATP, Mg2+ e concentrações variáveis de cálcio. Havia necessidade de uma concentração
crítica de cálcio para que aquela hidrólise se desencadeasse. O processo está ligado à presença de
tropomiosina e troponina nos filamentos finos, pois, uma vez que estas são removidas, a hidrólise de ATP
passa a ser cálcio independente, ocorrendo indefinidamente enquanto houver substrato. Estes resultados
indicam que a regulação da contração a nível molecular é feita pela tropomiosina, complexo troponina e
íons cálcio.
No músculo em repouso, em que a concentração de cálcio ao nível dos filamentos é baixa, o
complexo troponina-tropomiosina atua como um inibidor da interação entre a actina e a miosina. Quando a
concentração de cálcio aumenta, este se liga à troponina e o complexo passa a não mais inibir a interação
actina-miosina e o músculo pode contrair.
A regulação da contração está relacionada a modificações que ocorrem no filamento fino pela
interação de algumas de suas proteínas com íons cálcio, provocando a exposição dos sítios de interação
da actina com a cabeça da miosina. Identificou-se, no complexo troponina, a subunidade TnC, tendo esta
alta afinidade pelo cálcio e desenvolvendo alterações conformacionais quando interage com aquele íon.
Durante a contração muscular, o filamento de tropomiosina é deslocado mais para dentro do sulco
formado pela dupla hélice de monômeros de actina, expondo os sítios de interação da actina com o
complexo miosina-ATP. Esta situação pode ser visualizada na Figura 89. Na ausência de cálcio, a
subunidade TnT da troponina está ligada à tropomiosina e a TnI à actina (estado desligado da actina com
a miosina).
Quando o cálcio sai da cisterna para o sarcoplasma, ele se liga à subunidade TnC e, em
consequência, ocorre uma modificação em sua estrutura que a faz interagir fortemente com a TnT e com a
TnI (estado ligado da actina). Com isso, o filamento de tropomiosina rola mais para dentro do sulco entre
os monômeros de actina liberando o sítio de interação dos mesmos com a miosina.
107

Figura 89: Esquema mostrando as mudanças conformacionais do complexo troponina e tropomiosina


após a ligação de cálcio, disparador do processo de contração muscular.

A figura 90 sumariza os eventos do processo de contração muscular, indicando o estados de baixa


e alta afinidade da cabeça de miosina pela actina e o papel dos íons cálcio.

Figura 90: Esquema dos eventos do processo de contração muscular, indicando o estados de baixa e alta
afinidade da cabeça de miosina pela actina e o papel dos íons cálcio.
108
6. Fontes de energia para a contração muscular

Os substratos energéticos, provenientes dos alimentos, fornecem abundante energia química


potencial. Cerca de 50% da energia livre dos substratos advindos dos alimentos é armazenada na porção
terminal da molécula de adenosina trifosfato (ATP), sob forma de ligações fosfato de alta energia. O ATP,
portanto, constitui a moeda energética: é através de sua hidrólise, por um complexo enzimático disponível
na miosina muscular (ATPase), que suficiente energia livre é fornecida para a contração. Grande parte
desta energia é utilizada para ativar o mecanismo de contração, mas pequenas quantidades de ATP são
também necessárias para o bombeamento de cálcio do sarcoplasma para o retículo sarcoplasmático e
para recompor os gradientes de sódio e potássio (bomba Na/K).
A concentração total de ATP é de aproximadamente 4-8 mmol.g-1 de tecido e somente alguns
poucos segundos de exercício seriam mantidos pelo ATP localmente armazenado. Portanto o ATP deve
ser continuamente regenerado ou refosforilado. O ATP é decomposto em ADP + Pi e é, em segundos,
refosforilado a ATP novamente. Há várias maneiras de produzir esta refosforilação. A primeira via de
regeneração do ATP é direta e corresponde a uma reação de transfosforilação catalisada pela mioquinase,
enzima específica das células musculares. (essa via é utilizada em situações mais críticas, porque pode
levar À perda de bases: AMP passa para IMP e sai da célula)

mioquinase
2 ADP o AMP + ATP

Outra fonte rápida de energia é a fosfocreatina, complexo composto por fósforo + creatina (PCr)
que é encontrada no músculo em quantidades pequenas, apesar de ter uma concentração 5 vezes maior
que a de ATP. Admiravelmente, tal reação pode fornecer ATP em altas taxas, 3-6 mmol.g ±1.seg ±1.

creatina quinase
ADP + PCr o ATP + Creatina

Por outro lado, os processos metabólicos da célula, tanto aeróbio (ciclo de Krebs) como anaeróbio,
têm papel fundamental na ressíntese de ATP. A via oxidativa (aeróbia) produz muito mais ATP que a via
anaeróbia (36 ATP contra 2 ATP). No entanto, a utilização de uma ou outra via metabólica dependerá do
fornecimento adequado de oxigênio pela circulação em função da intensidade do exercício. A quantidade
de mitocôndrias presentes na fibra muscular está diretamente ligada ao condicionamento físico e é de
grande relevância para ativação da via oxidativa.
Em exercícios leves, a chegada de O2 ao músculo pela circulação está perfeitamente ajustada à
demanda do músculo em atividade. Neste caso, a via metabólica utilizada é a oxidativa, de modo que o
músculo pode manter-se ativo por período prolongado. Todavia, em exercícios intensos a velocidade de
chegada de O2 ao músculo não é suficiente e a via preferencial passa a ser a via glicolítica. Como a
produção de ATP por esta via é bem menor, o músculo entra rapidamente em fadiga. Deve-se ressaltar
aqui que o condicionamento físico está diretamente ligado a eficiência das enzimas das vias glicoliticas, do
ciclo de Krebs, bem como com a quantidade de mitocôndrias.
Os depósitos intramusculares de gordura presentes nos músculos são importantes fatores para a
oxidação lipídica, mas essa via energética depende de oxigênio, número de mitocôndrias, bem como a
eficiência de diversas enzimas envolvidas.

Figura 91: Diferentes vias de regeneração do ATP utilizado na contração muscular


109

7. Bibliografia

- BIOFÍSICA. Ed. Guanabara - Koogan, capítulo 13, Contração Muscular, F. Lacaz-Vieira e G. Malnic.
- SCIENTIFIC AMERICAN, 230 (2): 59, 1974, J.M. Murray e A. Weber.
-PHYSIOLOGY: A REGULATORY SYSTEM APPROACH. 2a. Edição - Capítulo 23
Macmillan Publishing Co., Inc., 1983, Fleur l. Strand.
- HUMAN BIOCHEMISTRY- Macmillan Publishing Co., Inc., 1982 - Capítulo 32,Muscle, Wilhelm R. Frisell.
- SCIENCE 227: 997-1006, 1985,Muscle contraction and free energy transduction in biological system,
Eisenberg, E. and Hill, T.L.
- ANN. REV. PHYSIOL. 49: 655-672, 1987.Mechanical and structural approaches to correlation of cross-
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