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DOI: http://dx.doi.org/10.15601/2237-0587/fd.v8n1p44-57
Resumo
Este artigo tem como objetivo apresentar um relato de experiência desenvolvida na disciplina
de Estágio Supervisionado em Ensino de Matemática I do Curso de Licenciatura em
Matemática, do Campus Professor Alberto Carvalho da Universidade Federal de Sergipe
(UFS) no Brasil. Propomo-nos a discutir algumas questões relacionadas à formação do
professor de Matemática para a Educação Básica, descrevendo como elas aconteceram no
ambiente de formação, que envolve a universidade e a escola-campo de estágio. A experiência
de ensino com licenciandos aponta a importância da articulação entre teoria e prática,
evidenciando a necessidade do desenvolvimento da postura questionadora e crítica do futuro-
professor contemplando as competências necessárias ao ofício da docência.
Palavras-chave: Formação do Docente de Matemática. Estágio Supervisionado.
1
Doutora em Educação Matemática. Mestre em Educação em Ciências e Matemática. Professora de Ensino de
Matemática do Curso de Licenciatura em Matemática da Universidade Federal de Sergipe (UFS). E-mail:
tetcheverria@gmail.com
2
Doutora em Educação, Mestre em Educação em Ciências e Matemática. Docente do Programa de Pós-
Graduação em Educação do Centro Universitário La Salle (UNILASALLE) e Visiting Scholar at University of
Maryland - College Park – EUA em 2015. Atua em projetos de pesquisa relacionados à linha de pesquisa
Formação de Professores, Teorias e Práticas Educativas. E-mail: verafelicetti@ig.com.br
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and practice, highlighting the need to develop the critical and questioning posture by the
future teacher contemplating the necessary skills to the teaching performance.
Keywords: Mathematics Teacher Training. Supervised Internship.
Introdução
Vemos o estágio como uma situação de aprendizagem e como tal deve promover
mudanças. Nosso propósito é de que o graduando, na experiência de estágio enquanto
observador e atuante, ao refletir sobre o fazer do outro possa apropriar-se dessa atitude e,
refletir sobre o seu fazer docente para poder transformá-lo. Assim como Freire (1980),
entendemos que ser crítico não é negar o que se faz nem absorver tudo o que é novo. Ser
crítico é refletir sobre o que se faz e transformar constantemente esse fazer num melhor fazer.
Como reforça Nóvoa (2004), o docente ao pensar a sua prática em busca de caminhos e
soluções assumindo decisões caracteriza-se como agente em sua formação.
O Estágio Docente
Para tanto, é essencial uma formação que associe teoria e prática regada por momentos
de discussão, reflexão, momentos para pensar a práxis. Neste sentido, a formação de
47
A prática precisa ser intencional, social, coletiva, e representar sua realização efetiva
como trabalho humano. Portanto, o estágio é um processo de aprendizagem indispensável a
um profissional que deseja estar preparado para enfrentar os desafios de uma carreira.
Embora o estágio docente seja para a maioria dos estagiários a primeira experiência
docente, ele não representa seu primeiro contato com o contexto escolar, pois enquanto aluno
os estagiários ficaram imersos nele desde o começo de sua vida escolar. Contudo, no período
de estágio, o futuro-professor tem a oportunidade de conhecer seu campo de trabalho com o
olhar do outro lado, o olhar de futuro professor e a partir das experiências adquiridas e das
teorias estudadas, construir conhecimentos que o auxiliem a ser um profissional melhor
qualificado e capaz de desenvolver as competências e habilidades indicadas nas Diretrizes
Curriculares Nacionais para graduandos nos cursos de graduação em Matemática
Bacharelado/Licenciatura.
Dentre as competências e habilidades a serem desenvolvidas citamos a capacidade de
expressar-se com clareza e precisão, tanto na escrita quanto oralmente; de trabalhar em
equipe; de compreender, criticar e resolver problemas usando novas ideias e tecnologias, de
aprender continuamente (BRASIL, 2002).
Diante das competências e habilidades exigidas à formação do futuro professor de
Matemática é possível conjecturar que: “A atividade teórica é que possibilita de modo
indissociável o conhecimento da realidade e o estabelecimento de finalidades para sua
transformação. Mas para produzir tal transformação não é suficiente a atividade teórica; é
preciso atuar praticamente.” (PIMENTA, 1994, p. 92). O que pode ser conseguido na
atividade de estágio ao se refletir sobre a experiência vivenciada tendo como suporte a teoria
estudada.
Já Fazenda (1991, p. 22) define o estágio como “um processo de apreensão da
realidade concreta que se dá através de observação e experiências, no desenvolvimento de
uma atitude interdisciplinar”. Para Imbernón (2009) o professor deve ser formado na mudança
e para a mudança, e esse processo de formação deve acontecer num espaço reflexivo, no
compartilhamento tanto do conhecimento como do contexto. A constituição de um espaço
dessa natureza na disciplina de Estágio possibilita aos graduandos socializarem e repensarem
suas concepções sobre educação, ensino e aprendizagem. Esse passo se faz muito importante,
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pois sabemos que suas crenças influenciam seu fazer docente e desse contexto emerge a
construção de sua identidade como professores.
Assim, a prática do estágio torna-se fonte de aprendizado, pois uma prática discutida
crítica e reflexivamente produz uma referência, uma filtragem e/ou uma adaptação entre a
prática e a teoria (ETCHEVERRIA; FELICETTI, 2011). Discutir a prática permite um
revisitar as suas experiências enquanto aluno, um reolhar no que ele vivenciou, um associar
ao que está experienciando e um projetar ao que poderá fazer.
Para Larrosa (1999) a experiência vivenciada no estágio não é aquilo que, no caso do
estagiário, ele conheceu na realização de uma prática, mas o que se passa com ele, isto é, o
movimento interno estabelecido entre o que conhece e acredita e o que desconhece e almeja.
Professores. Embora eles apareçam numa sequência e para cada um deles o graduando
produza um texto, nas discussões os temas se articulam, até porque não poderia acontecer de
outra forma.
Optamos por fazer uso de um instrumento amplo, porque nossa experiência anterior
nos revelou que a ausência de um instrumento deste tipo compromete os registros realizados
pelos estagiários.
assunto. A partir dessas leituras eles fizeram o segundo registro com as ideias dos autores,
novamente essas ideias foram discutidas em aula. Na terceira etapa cada estagiário produziu o
seu texto utilizando suas ideias iniciais e as ideias dos autores.
O planejamento dessa atividade foi feito em duplas e antes de ser executado foi
discutido com a professora orientadora de estágio, a professora titular da turma e, também,
com os colegas que realizaram a atividade de estágio na mesma escola, como descrevem os
estagiários E2 e E19.
O registro feito pelos estagiários revela uma postura reflexiva, na qual eles buscam
inserir conhecimentos teóricos, adquiridos no curso, na realização de uma atividade prática
(PIMENTA, 1994) que teve como foco as dificuldades que identificaram na turma observada.
possibilita uma reflexão mais aprofundada do campo em estudo. Nesta direção seguem
algumas reflexões entrelaçadas às observações dos estudantes estagiários3.
Algumas Reflexões
Uma comparação que faço sobre o ensino nesses anos é com a construção
de um enorme prédio de conhecimento, pois ao chegarmos, nos anos
iniciais, nos deparamos com ajudantes entusiasmados para a realização da
obra e o que vêm no futuro. Porém, nos anos finais nos deparamos com
“trabalhadores cansados” e desestimulados em ver essa construção. E, nos
anos seguintes, foi notório que o alicerce de alegria e conhecimento, tem o
tronco do edifício arrancado, pois tem em seus meados uma má construção
que é essencial para a sustentação de ideias. (E1)
Pude perceber que nos anos iniciais o professor apresenta uma dedicação
maior para com suas aulas e o seu relacionamento com os alunos é de uma
afetividade grandiosa, tanto do professor com o aluno quanto do aluno para
com o professor. Nos anos finais o relacionamento professor versus aluno é
totalmente diferente, o professor já não dá aquela atenção ao aluno como
nos anos iniciais, como também do aluno para o professor. Neste período
em muitos casos já é notável que o professor se afaste mais dos alunos
transmitindo assim um ar de superioridade. Já no Ensino Médio é tudo
totalmente diferente tanto com a preocupação dos professores com o
aprendizado bem como com o relacionamento. Nesse período passa a ser
mais amigável. (E10)
3
Os depoimentos dos estagiários estarão identificados em itálico e identificado pela letra E seguido de
numeração entre 1 e 29 correspondendo a quantidade dos mesmos.
53
Além disso, poder falar sobre suas fragilidades e sentir que outros também as têm,
oportunizou que se fortalecessem a ponto de se sentirem preparados emocionalmente para o
exercício da docência. Isso ficou evidente no depoimento do estagiário E4:
Eu tenho certo receio de enfrentar uma sala de aula, por isso o encontro
com a psicóloga me ajudou bastante a lidar com esse medo. Gostei muito
quando ela falou sobre como se comportar diante dos alunos, ou seja,
manter a postura de autoridade e ao mesmo tempo ser amigo dos alunos.
(E4)
Na opinião dos estagiários, tão importante quanto o encontro com a psicóloga foi o
encontro com a psicopedagoga. A conversa com a psicopedagoga possibilitou perceber:
A prática exige muito mais do que saber a teoria, exige saber desenvolver a teoria na
prática, fato este observado pelo estagiário acima, quando passou a exercer a docência no
lugar do professor observado (PIMENTA, 1997).
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Com relação à prática podemos destacar três componentes básicos para a formação do
professor de Matemática: o conhecimento dos conteúdos específicos, o conhecimento dos
conteúdos de Educação Matemática e os conhecimentos das áreas que contribuem para a
formação do educador (BERTONI, 1995). Ao relacionar a matemática estudada na
Licenciatura com a Matemática ensinada na Educação Básica os depoimentos dos estagiários
giraram em torno da não percepção de alguma evidência sobre essa relação, como pode ser
observado no depoimento de E7:
Nas aulas que observei não me deparei muito com a matemática que é
trabalhada na universidade. A matemática que vi nessas aulas foi aquela
contida nos livros didáticos e dada de forma puramente expositiva. (E7)
Sabemos que para contribuírem na formação do futuro professor seria necessário que
as disciplinas de conteúdo matemático se transformassem em disciplinas de Educação
Matemática, nas quais se enfatiza o ensino junto com a aprendizagem, deslocando-se a ênfase
no saber para o desenvolvimento de competências no saber ensinar (CARNEIRO, 2002).
Considerações finais
Essa realidade provoca algumas indagações. Por que nossos estagiários não
conseguem ver a Matemática estudada na universidade na Matemática ensinada na Educação
Básica? Por que alguns professores da Educação Básica insistem em dizer aos estagiários que
a teoria é diferente da prática, quando querem justificar suas escolhas metodológicas? Por que
alguns professores que conhecem as tendências pedagógicas mais atuais, persistem numa
proposta que prioriza apenas as aulas expositivas sem a dialogação com o aluno?
Percebemos que se faz necessário investir neste tipo de atividade para que aos poucos
os estagiários se apropriem de uma postura questionadora, crítica e reflexiva, capaz de formá-
los educadores.
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Referências
FREIRE, P. Conscientização: teoria e prática da libertação. São Paulo: Cortez & Moraes,
1980.