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Acórdão Nº 1724698
EMENTA
1. A irresignação recursal em face aos critérios de fixação dos honorários de sucumbência não
configura inovação recursal, uma vez que esta deriva diretamente das razões adotadas pelo Juízo a quo
ao proferir a sentença recorrida. Preliminar rejeitada.
3. É possível a exclusão judicial de sócio mediante iniciativa dos demais sócios, por falta grave
no cumprimento das obrigações ou por incapacidade superveniente, nos termos do art. 1.030 do Código
Civil.
4. No caso, a parte autora demonstrou a quebra da affectio societatis pelo réu, sendo
incontroversa a gestão temerária, ausência de prestação de contas e elevação dos débitos tributários,
sem justo motivo. Ademais, as ameaças proferidas pelo sócio réu contra a sócia subsistente acarretaram
o ajuizamento de ação penal, restando patente o prejuízo à administração da sociedade empresária e
cometimento de falta grave apta a justificar sua exclusão judicial.
5. Nos termos do artigo 85, § 8º, do CPC, a fixação do valor dos honorários por apreciação
equitativa é critério excepcional e somente deve ser aplicado de forma subsidiária nos processos em
que for inestimável ou irrisório o proveito econômico ou, ainda, quando o valor da causa for muito
baixo, o que não ocorre no caso em apreço.
ACÓRDÃO
RELATÓRIO
Em razão da sucumbência, condenou o réu ao pagamento das custas e honorários advocatícios, os quais
foram fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, nos termos do art. 85, § 2º, do CPC,
corrigidos monetariamente desde o ajuizamento da ação e com juros de mora de 1% ao mês, a partir do
trânsito em julgado.
Em suas razões recursais (ID 39255186), sustenta o apelante, em suma, que não praticou gestão
temerária dos recursos da sociedade empresária, que ficou demonstrado nos autos a “confusão
patrimonial” entre os recursos financeiros da sociedade e as finanças pessoais de ambos os sócios,
porquanto durante os quase 27 (vinte e sete) anos em que mantiveram relação conjugal, sempre fizeram
o uso das contas bancárias da escola sem a diferenciação daquilo que era da empresa e o que era do
casal; que a sócia, sra. Alessandra tinha total conhecimento de que a escola não tinha capacidade
financeira para adimplir com as obrigações, necessitando da contratação de empréstimos bancários em
diversos momentos para formação de caixa da empresa; que não há nos autos informação sobre o
trânsito em julgado do acórdão que condenou o apelante pelo crime de ameaça no âmbito doméstico e
familiar, valendo a premissa de que é inocente e não pode ser penalizado por algo que não cometeu;
que a inadimplência das obrigações tributárias da sociedade foi agravada pela pandemia da Covid-19,
inexistindo falta grave imputável à gestão do apelante; que não há qualquer elemento que evidencie a
existência de relacionamento extraconjungal entre o apelante e a sra. Rayane ou mesmo com qualquer
outra pessoa; que os relacionamentos amorosos posteriores ao término do relacionamento conjugal e
existentes entre os sócios diz respeito apenas à intimidade das partes; que não ocorreu a quebra da
affectio societatis; que foi a representante da sociedade apelada que assumiu a dívida referente à
entrega de material de construção em favor da sra. Rayane; que não houve desvio de patrimônio social
para benefício de terceiros, não havendo qualquer prova nesse sentido; que as planilhas juntadas aos
autos foram produzidas unilateralmente, inexistindo justo motivo para a exclusão do apelante do
quadro societário da empresa.
Requer, ao final, a reforma da sentença para que o pedido seja julgado improcedente.
O advogado da autora, ARLINDO VIEIRA MACHADO JÚNIOR, a seu turno, interpôs apelação
adesiva (ID 39255195), alegando que por força do art. 292, inciso II, do CPC, o valor da causa em
processos de dissolução parcial da sociedade terá como parâmetro a quantia controvertida, que foi
quantificada pelas cotas do sócio dissidente; que o capital descrito no contrato social não reflete o
volume patrimonial da empresa, mas somente a distribuição da cota de cada sócio; que a fixação dos
honorários de sucumbência com base no valor atribuído à causa mostra-se irrisório ao volume
patrimonial da sociedade e o trabalho do patrono no curso processual, razão pela qual os honorários de
sucumbência devem ser arbitrados com base na equidade, no valor de R$30.000,00 (trinta mil reais).
Requer, portanto, que a sentença seja reformada quanto ao critério de fixação dos honorários de
sucumbência, para que sejam arbitrados com base no disposto no art. 85, § 8º, do CPC.
É o Relatório.
VOTOS
Inicialmente, pugna o réu, em suas contrarrazões, pelo não conhecimento do recurso adesivo, ao
argumento de que a base de cálculo dos honorários advocatícios de sucumbência não foi analisada
pelo Juízo a quo, configurando inovação recursal.
Contudo, não há que se falar em inovação recursal referente aos critérios de fixação dos honorários de
sucumbência, uma vez que esta decorre diretamente das razões adotadas pelo Juízo a quo ao acolher
ou não o pedido e proferir a sentença recorrida.
Outrossim, não conheço do pedido de provimento da apelação e redistribuição dos honorários de
sucumbência aduzido em contrarrazões, porquanto estas se qualificam processualmente como meio de
defesa, não sendo a via adequada a deduzir pedido recursal.
Rejeito, portanto, a preliminar de inovação recursal e não conheço do pedido formulado pelo
réu/apelado em contrarrazões.
Cinge-se a controvérsia sobre a existência de falta grave do sócio Alessandry da Costa Maciel, ora
apelante, da qual decorreu a declaração da dissolução parcial da sociedade empresária autora,
ESCOLA JARDIM DO ÉDEN E.J.E LTDA-ME, mediante a sua exclusão dos quadros sociais.
Para melhor compreensão dos fatos narrados na inicial, convém transcrever o relatório da sentença
(ID 39255176), in verbis:
Vistos etc.
ESCOLA JARDIM DO ÉDEN E.J.E LTDA-ME, representada por Alessandra Silveira Di Giorno
Costa, ajuizou ação de dissolução parcial de sociedade contra ALESSANDRY DA COSTA MACIEL.
Para tanto, a sociedade alegou que foi constituída em 1993; que o atual quadro societário é
composto por Alessandra e Alessandry, divorciados, cada um com 50% das cotas sociais; que, após o
divórcio, os sócios pactuaram que todo o financeiro da empresa, que estava sob a responsabilidade
exclusiva do requerido, seria repassado para um profissional técnico; que o réu se recusa a repassar
a informações financeiras que tem em sua posse ao contador; que com o trabalho de contabilização
foi descoberta a existência de um alto passivo; que o réu realizou gestão temerária e praticou faltas
graves, tais como (i) procedeu à retenção na fonte dos valores de INSS de seus funcionários, porém,
não os repassou ao fisco durante a administração do financeiro pelo requerido, (ii) não pagou o
FGTS de funcionários, o que impede o usufruto do saldo por aqueles que foram demitidos durante a
pandemia, (iii) deixou de quitar o parcelamento do Simples Nacional, no ano de 2020, (iv) deixou de
pagar dívidas vencidas aos fornecedores, as quais superavam o valor de R$59.805,55, (v) contratou
serviços com serralheiro em troca de isenção de mensalidades para os seus três filhos, porém, os
serviços praticados foram superfaturados em até 300% (trezentos por cento) e (vi) o requerente usou
da empresa para avalizar compra de materiais de construção em favor da ex-funcionária Rayane,
cuja dívida foi paga pela escola. Aduziu ainda que o réu ameaçou, mental e fisicamente, a sócia; que
adentrou à residência dela e furtou várias caixas de documentos antigos da empresa; que furtou um
cofre da empresa, o qual continha cheques, dinheiro em espécie e notas promissórias; que insiste em
retirada de pró-labore em prejuízo do capital social; e que, portanto, não há a mínima harmonia
entre os sócios.
Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu parágrafo único, pode o sócio ser excluído
judicialmente, mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta grave no cumprimento de
suas obrigações, ou, ainda, por incapacidade superveniente.
Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja
quota tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art. 1.026.
Como disposto, a exclusão judicial do sócio demanda a existência de prova da falta grave cometida no
cumprimento das suas obrigações sociais. No caso, conquanto o apelante sustente a inexistência de
cometimento de falta grave e quebra da affectio societatis, não é o que se depreende dos documentos
coligidos aos autos, corroborados pelos depoimentos das testemunhas.
Ademais, em que pese não ter havido o trânsito em julgado da ação penal n.
0709216-56.2020.8.07.0006, ajuizada pelo Ministério Público do Distrito Federal e Territórios em
face do apelante, fundada na prática do crime de ameaça, certo é que o fato, isoladamente
considerado, pode ser considerado falta grave, impossibilitando a convivência entre os sócios e, por
consequência, a administração da sociedade empresária.
Convém transcrever o acórdão que julgou procedente o pedido deduzido na denúncia oferecida contra
o apelante (ID 39255084), in verbis:
A ameaça de violência não foi apenas um desentendimento, no caso, foi necessária, inclusive, medida
protetiva em favor da sócia representante da sociedade empresária (ID 39254827).
Há de ser destacado, ainda, que a oitiva das testemunhas, no inquérito policial (ID 39254831, p.
46/49), as trocas de mensagens entre os sócios (ID 39254841) e os depoimentos das testemunhas
proferidos no curso processual (IDs 39255093/39255108 e IDs 39255159/39255170) demonstram a
impossibilidade de convivência pacífica entre os ex-cônjuges, resultando, obviamente, em prejuízo à
gestão da sociedade empresária. Acresça-se a isso os atos temerários ocorridos durante a gestão do
apelante, em não adimplir débitos e esquivar-se da prestação de contas, que levaram a uma expressiva
inadimplência tributária da sociedade empresária, sem justificativa, frise-se.
Com efeito, as provas colacionadas aos autos comprovam o cometimento de falta grave pelo sócio nas
suas obrigações sociais, justificando a sua exclusão do quadro societário, porquanto patente a ruptura
da affectio societatis.Neste sentido, examinem-se os precedentes deste egrégio Tribunal de Justiça:
O advogado da parte autora, por seu turno, em recurso adesivo, pretende a reforma da sentença, em
relação ao critério de fixação dos honorários de sucumbência, uma vez que o capital descrito no
contrato social não reflete o volume patrimonial da empresa, razão pela qual os honorários de
sucumbência devem ser arbitrados com base na equidade.
Na hipótese, o valor atribuído à causa foi de R$20.000,00 (vinte mil reais), importe referente às cotas
do réu no contrato social, que também consubstancia o proveito econômico obtido com sua exclusão.
Em face da sucumbência, o réu foi condenado ao pagamento das custas processuais e dos honorários
advocatícios fixados em 10% (dez por cento) do valor da causa, nos termos do artigo 85, § 2º, do
CPC, o que remunera adequadamente o advogado, observando-se os critérios estabelecidos no art. 85,
§ 2º, inc. I a IV do CPC.
A propósito, quanto à fixação dos honorários advocatícios por equidade, o c. Superior Tribunal de
Justiça, em julgamento sob o rito dos Recursos Repetitivos (Tema 1.076), fixou, dentre outros, o
entendimento de que “apenas se admite arbitramento de honorários por equidade quando, havendo
ou não condenação: (a) o proveito econômico obtido pelo vencedor for inestimável ou irrisório; ou
(b) o valor da causa for muito baixo”, o que não é a hipótese dos autos, já que é critério excepcional e
somente deve ser aplicado de forma subsidiária, nos temos do art. 85, § 8º, do CPC.
Ante o exposto, conheço e NEGO PROVIMENTO ao recurso do réu e conheço e NEGO
PROVIMENTO ao recurso adesivo.
É como voto.
DECISÃO