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APG 08 – “COUVE-FLOR?


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Objetivos IMPORTANTE: Os agentes causais diferem razoavelmente quanto aos


principais grupos de alto risco. Por exemplo, o Staphylococcus aureus
1- Discutir a etiologia, epidemiologia e os fatores de é o principal agente agressor em usuários de drogas intravenosas,
enquanto a EI em próteses valvares tende a ser causada por
risco da endocardite infecciosa;
estafilococos coagulase-negativos (p. ex., Staphylococcus epidermidis).
2- Debater a fisiopatologia da endocardite infecciosa Além disso, o S. epidermidis foi associado à contaminação em
e suas manifestações clínicas; dispositivos implantáveis e a infecções relacionadas ao atendimento de
3- Explicar o diagnóstico e tratamento da saúde (PORTH, 10ª ed.).
endocardite infecciosa;
↠ O principal fator causador de EI é a contaminação do
4- Explanar as medidas preventivas da endocardite
sangue por microrganismos. A porta de entrada para a
infecciosa;
corrente sanguínea pode ser:
5- Realizar uma breve discussão sobre o
atendimento à saúde da população rural. ➢ uma infecção manifesta;
➢ um procedimento odontológico ou cirúrgico que
Endocardite Infecciosa
causa bacteremia transitória;
DEFINIÇÃO: Endocardite infecciosa é uma doença resultante da ➢ a injeção de uma substância contaminada
colonização de fungos, vírus e principalmente de bactérias causando diretamente no sangue de usuários de drogas
inflamação e danos é uma infecção localizada nos tecidos internos do intravenosas;
coração (endocárdio), bem como estruturas associadas (válvulas) ➢ presença de uma fonte oculta na cavidade oral
(GALVÃO, 2016).
ou no intestino.
↠ A endocardite infecciosa (EI) é uma doença causada
FATORES DE RISCO (PORTO & PORTO)
por microrganismos que se aderem à superfície endotelial
do coração ou sobre algum dispositivo, como eletrodos ➢ Doença valvar (reumática e não reumática);
➢ Cardiopatias congênitas cianóticas (persistência do canal
de marca-passos, desfibriladores implantáveis ou próteses
arterial [PCA], comunicação interventricular [CIV], tetralogia
cardíacas (SOCESP, 5ª ed.). de Fallot, valva aórtica bicúspide);
➢ Prótese valvar;
OBS.: As estruturas mais suscetíveis são as valvas atrioventriculares, ➢ Cardiomiopatia hipertrófica obstrutiva;
podendo também ocorrer no endocárdio dos átrios, ventrículos e ➢ Prolapso da valva mitral com regurgitação;
grandes vasos (SOCESP, 5ª ed.). ➢ Endocardite prévia;
➢ Presença de dispositivos intravasculares e/ou intracardíacos
↠ A lesão endotelial é o primeiro evento para o
(cateteres, fios de marca-passo);
aparecimento da endocardite e ocorre por ➢ Infecção pelo HIV;
turbilhonamento do sangue que ocorre nas valvopatias, ➢ Doença periodontal;
pelas lesões endoteliais causadas por cateteres ou por ➢ Hemodiálise;
lesão bacteriana direta (SOCESP, 5ª ed.). ➢ Usuários de drogas ilícitas intravenosas;
➢ Lesões residuais após cirurgia cardíaca.
↠ A EI é doença complexa e grave, de altas morbidade
Classificação da EI
e mortalidade, com grande espectro de manifestações
clínicas, de diagnóstico e tratamento difíceis, podendo QUANTO À CLÍNICA
cursar com várias complicações cardíacas, sistêmicas,
imunes e vasculares (SOCESP, 5ª ed.). ↠ Quanto à clínica, a EI é tradicionalmente classificada nos
tipos agudo ou subagudo-crônico, dependendo do início,
Etiologia e Fatores de risco da EI da etiologia e da gravidade da doença. De modo geral, o
início dos casos agudos é rápido e envolve pessoas com
↠ As infecções estafilocócicas recentemente se
valvas cardíacas normais, sadias ou que, eventualmente,
tornaram a causa líder de EI, com os estreptococos e os
apresentam histórico de uso de medicamentos ou drogas
enterococos sendo as duas outras causas mais comuns
intravenosos, ou que se encontram debilitadas (PORTH,
(PORTH, 10ª ed.).
10ª ed.).
↠ Outros agentes causais incluem o grupo denominado
↠ Os casos subagudos-crônicos evoluem ao longo de
HACEK (espécies de Haemophilus, Actinobacillus
meses, em pacientes comumente portadores de
actinomycetemcomitans, Cardiobacterium hominis,
anormalidades valvares. O desenvolvimento de cepas de
Eikenella corrodens e Kingella kingae), os bacilos Gram-
microrganismos resistentes a medicamentos, em
negativos e os fungos (PORTH, 10ª ed.).

Júlia Morbeck – @med.morbeck


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consequência do uso indiscriminado de antibióticos e do Epidemiologia da EI


aumento da população de imunocomprometidos,
dificultou a classificação dos casos agudos e subagudos- ↠ Pacientes jovens com EI em geral são portadores de
crônicos (PORTH, 10ª ed.). sequela valvar de febre reumática, cardiopatia congênita
ou são usuários de drogas endovenosas. Um maior
CLASSIFICAÇÃO (PORTO & PORTO) número de casos tem sido observado em idosos,
pacientes institucionalizados/hospitalizados e submetidos a
↠ Endocardite em valva natural: Infecção microbiana em
procedimentos invasivos, representando cerca de 35%
valvas naturais normais ou anormais. Pode evoluir de duas
dos casos. A endocardite infecciosa consequente ao
formas:
implante de próteses valvares corresponde cerca de 10 a
➢ Endocardite infecciosa aguda: evolução rápida, com 30% dos casos, acomete 1 a 6 % dos pacientes
toxemia. O óbito pode ocorrer em poucos dias ou semanas. portadores de prótese valvar e afeta igualmente próteses
Em geral é causada por microrganismos mais virulentos
biológicas e mecânicas (SOCESP, 5ª ed.).
(estafilococos, pneumococos, e estreptococos do grupo A).
A infecção pode situar-se em valvas normais. O
↠ Há diferenças geográficas na epidemiologia da EI. Nos
prognóstico é reservado
➢ Endocardite infecciosa subaguda: início insidioso e evolução países em desenvolvimento, como o Brasil, em razão da
mais prolongada. Costuma mimetizar outras doenças alta incidência de portadores de sequela da febre
sistêmicas, pois evolui durante algum tempo com sintomas reumática, cuidado inadequado com a higiene dental e
inespecíficos (febre baixa, sudorese noturna, anorexia, deficiência ao acesso aos sistemas de saúde. Por outro
astenia, calafrios, perda de peso). Mais frequente em
pacientes com lesões valvares preexistentes. Agentes
lado, nos Estados Unidos e na Europa, endocardite em
etiológicos mais comuns: Streptococcus do grupo viridans, pacientes com lesões reumáticas ocorre em menos de
S. mutans, S. mitis, S. mitior, S. sanguis, S. salivarius. Outros 5% dos casos (SOCESP, 5ª ed.).
agentes etiológicos: Streptococcus do grupo D não
enterocócico, S. bovis, enterococos (E. faecalis, E. faecium), ↠ Outros grupos de risco são pacientes idosos,
grupo HACEK (Haemophylus, Actinobacillus, geralmente hospitalizados e com infecções associadas a
Cardiobacterium, Eikenella, Kingella). procedimentos invasivos. Portanto, a endocardite
↠ Endocardite infecciosa em usuários de drogas ilícitas: nosocomial é mais comum nos países desenvolvidos,
Afeta mais frequentemente a valva tricúspide. As enquanto as nações menos desenvolvidas mantêm o
manifestações pulmonares podem dominar o quadro perfil clássico de EI (SOCESP, 5ª ed.).
clínico (dor pleurítica, abscesso pulmonar, hemoptise). Os OBS.: O Brasil está em uma fase de transição e observa-se um padrão
microrganismos mais encontrados são Staphylococcus de infecção endocárdica de países desenvolvidos em grandes hospitais
aureus, Pseudomonas, bacilos gram-negativos e fungos. privados e, ao mesmo tempo, pacientes com a clássica endocardite
estreptocócica nos estratos menos favorecidos da sociedade.
↠ Endocardite infecciosa pós-implante de prótese valvar: Globalmente, a EI é atribuída a procedimentos invasivos (desde acessos
Forma grave que ocorre em paciente com prótese venosos, sobretudo em pacientes em diálise, até biópsias) em quase
25% dos pacientes (SOCESP, 5ª ed.).
biológica ou mecânica. Pode ser precoce (até 60 dias) ou
tardia (após 1 ano). Os germes comumente isolados na ↠ No Brasil, a real prevalência das endocardites não é
forma precoce são o S. aureus e S. coagulose-negativos, conhecida, mas especula-se que possa até ser maior em
mas pode ser causada por outros microrganismos (S. razão do contingente ainda elevado de indivíduos
aureus, bacilos gram-negativos, fungos). Na forma tardia portadores de valvopatia reumática crônica, doença que
predominam germes semelhantes aos encontrados na predispõe à endocardite e cuja prevalência diminuiu de
endocardite infecciosa de valvas naturais. maneira acentuada nos países desenvolvidos (SOCESP, 5ª
ed.).
↠ Endocardite nosocomial: Infecção associada a
internação hospitalar prolongada, procedimentos invasivos ↠ A mortalidade intra-hospitalar atual de pacientes com
e presença de dispositivos intravasculares. Os germes EI é de 15 a 20%, aumentando para até 40%, após 1 ano
mais encontrados são Staphylococcus aureus, do diagnóstico (SOCESP, 5ª ed.).
enterococos e bacilos gram-negativos. Menos de 50%
têm fatores cardíacos predisponentes e cursam com alta
mortalidade.

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degenerativas, como em idosos. Essas degenerações são detectadas


por ecocardiográfias em 50% dos pacientes considerados
assintomáticos, acima de 60 anos, em uma proporção parecida com
pacientes portadores de EI (GALVÃO, 2016).

↠ Geralmente, essa vegetação se desenvolve em


regiões em que o endotélio foi lesado devido a jatos
anormais de sangue, que se formam quando este passa
das câmaras de alta pressão para as câmaras de menor
pressão, produzindo um “efeito jato” que exerce ação
Perfil epidemiológico da endocardite infecciosa em diferentes
continentes.
abrasiva sobre a superfície endotelial provocando
desgaste, como por exemplo, em lesões valvares do tipo
estenose e insuficiência expondo tecido colágeno, o que
REGISTRO MULTICÊNTRICO
desencadeia uma sucessão de eventos fisiopatológicos
Entretanto, um interessante registro multicêntrico prospectivo da EI é como: (GALVÃO, 2016).
a Colaboração Internacional sobre Endocardite (ICE-PCS). Em estudo
produzido com a cooperação de 25 países, incluindo o Brasil, com ➢ a formação de um trombo de fibrina,
impacto significativo sobre o conhecimento da doença, foram avaliados inicialmente asséptico, que tem função de
2.781 pacientes admitidos em 58 hospitais de 25 países, entre 2000 e
reparar o endotélio;
2005. A idade média dos pacientes foi de 57,9 anos, sendo 72% dos
casos em válvula nativa. A maioria (77% dos pacientes) teve ➢ a eventual colonização desse trombo durante
apresentação precoce, dentro de 30 dias, com poucas manifestações um episódio de bacteremia por microrganismos
clínicas. Exposição a cuidados de saúde foi encontrada em 25% dos patológicos; o início de um processo infeccioso
pacientes. O Staphylococcus aureus foi o patógeno mais comum nesse local, criando condições para maior adesão
(31,2%). As valvas mitral e aórtica foram as mais infectadas, com 41,1%
plaquetária, mais deposição de fibrina, e
e 37,6%, respectivamente. As complicações mais comuns foram
insuficiência cardíaca (32,3%), embolização sistêmica (22,6%), AVC eritrócitos e células inflamatórias com o
(16,9%) e abscesso intracardíaco (14,4%). O tratamento cirúrgico foi crescimento da lesão.
realizado em 48,2% dos casos, com mortalidade intra-hospitalar de
17,7% (SOCESP, 5ª ed.).

Fisiopatologia da EI

↠ A endocardite resulta de vários eventos


independentes: (PORTO & PORTO).
➢ bacteriemia transitória;
➢ superfície endocárdica alterada, funcionando
como ponto inicial da infecção;
➢ fluxo sanguíneo turbulento;
➢ depósito de plaquetas e fibrina (trombo estéril);
➢ adesão e proliferação de germes.
IMPORTANTE: Com o depósito progressivo de mais plaquetas, fibrina e
OBS.: As vegetações (lesões características da endocardite) são
microrganismos há crescimento da vegetação. A bacteremia é um
constituídas de plaquetas, fibrina, células inflamatórias e colônias de
fator importante, sendo que o risco de endocardite infecciosa depende
microrganismos (PORTO & PORTO).
da magnitude da bacteremia e da habilidade do patógeno de atuar nas
↠ O endotélio valvular normal é resistente à colonização válvulas lesadas (GALVÃO, 2016).
e infecção por bactérias circulantes, porém quando Uma vez infectadas, essas vegetações continuam a crescer por meio
ocorre à ruptura mecânica do endotélio leva à exposição do depósito adicional de plaquetas e fibrina, fornecendo às bactérias
da matriz extracelular ao depósito de fibrina e plaquetas, um santuário contra os mecanismos de defesa do hospedeiro, como
leucócitos polimorfonucleares e complemento. Consequentemente,
facilitando a aderência bacteriana e causando a infecção uma vez que a infecção se firma, a vegetação infectada continua a
(GALVÃO, 2016). crescer de maneira largamente desimpedida (HAMMER; MCPHEE,
2015).
O dano endotelial pode resultar de lesões mecânicas provocadas pelo
fluxo sanguíneo turbulento, como pelos cateteres intravasculares, Para haver colonização endocárdica e, portanto, para se desencadear
inflamação como na cardite reumática ou por alterações uma endocardite, há necessidade de bacteriemia ou fungemia,

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transitória ou duradoura; estas se originam de infecções em diversos OBS.: Histologicamente, as vegetações são constituídas por inflamação
locais do organismo (cutâneas, urinárias, pulmonares etc.) ou são aguda, com predomínio de neutrófilos e número menor de
secundárias a manipulações dentárias, queimaduras, procedimentos macrófagos e outras células, de permeio a rede de fibrina e produtos
invasivos (hemodiálise, uso prolongado de sondas uretrais e, sobretudo, da destruição tecidual (BOGLIOGO, 10ª ed.).
cateteres intravasculares) ou uso de substâncias injetáveis por usuários
de drogas. Indivíduos nas duas últimas situações constituem grupo de IMPORTANTE: As lesões vegetativas intracardíacas também apresentam
risco para endocardite, sobretudo as do lado direito do coração efeitos locais e sistêmicos a distância. A organização frouxa dessas
(BOGLIOGO, 10ª ed.). lesões possibilita que os organismos e fragmentos da lesão formem
êmbolos, os quais são levados pela corrente sanguínea e causam
embolia cerebral, sistêmica ou pulmonar. Os fragmentos podem se
alojar em vasos de pequeno calibre, causando hemorragias de
pequeno porte, abscessos e infarto tecidual. A bacteremia também
pode iniciar respostas imunes supostamente responsáveis por
manifestações cutâneas, poliartrite, glomerulonefrite e outros
distúrbios imunes (PORTH, 10ª ed.).

↠ Lesões endoteliais inflamadas sem danos valvulares


também podem promover o surgimento dessa doença.
Inflamação local induz células endoteliais a expressar
integrinas do grupo B1 (antígeno tardio). Integrinas são
proteínas transmembrana que podem ligar componentes
extracelulares ao citoesqueleto celular. Essas integrinas ligam
fibronectinas circulantes à superfície do endotélio,
enquanto S. aureus entre outros microrganismos
causadores da EI que possuem o agente ligante da
fribronectina na sua superfície. Consequentemente,
quando ativadas as fibronectinas das células endoteliais,
elas promovem uma superfície adesiva aos patógenos
circulantes, como por exemplo, S. aureus. Uma vez
aderido, ele inicia sua colonização nas células das válvulas
endoteliais, onde o agente pode executar mecanismos de
burlar os mecanismos de defesa do hospedeiro e
antibiótico, bem como se multiplicar e se espalhar para
órgãos distintos (GALVÃO, 2016).
Patógenos clássicos dessa enfermidade compartilham a habilidade de
aderir a válvulas danificadas, ativam fator local de coagulação, e nutrem
vegetações infectadas as quais eles podem sobreviver. Seguindo sua
colonização, necessita escapar dos mecanismos de defesa do
hospedeiro. Bactérias gram positivas são geralmente resistentes.
Contudo, são alvo de proteínas microbicidas plaquetárias (PMPs), as
quais são produzidas por plaquetas ativadas e destroem
microrganismos por desregular sua membrana plasmática. Bactérias
encontradas em pacientes com EI são, na maioria das vezes,
resistentes as PMPs (GALVÃO, 2016).

Endocardite infecciosa. Vista da face atrial da valva mitral com grande


vegetação. Espécime de ressecção cirúrgica.

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Endocardite bacteriana. A valva mitral apresenta formações vegetativas


destrutivas que erodiram a margem livre do folheto valvar.

Manifestações Clínicas da EI

Em mais de 80% dos casos, o período de incubação até o início dos


sintomas é de aproximadamente 2 semanas ou menos. Contudo, na
presença de infecção por Candida relacionada, o período de incubação
pode chegar a 5 meses (PORTH, 10ª ed.).

↠ Os pacientes apresentam quadro infeccioso e


septicêmico e, portanto, têm manifestações sistêmicas
em geral exuberantes, como febre, mal-estar, cefaleia,
anorexia, aumento de linfonodos e hepatoesplenomegalia Fundoscopia em paciente com endocardite infecciosa, sendo
(BOGLIOGO, 10ª ed.). observada hemorragia retiniana, com palidez central (mancha de Roth).

Importante: A febre é o principal sintoma da EI e está presente em


cerca de 90% dos casos (SOCESP, 5ª ed.).
↠ Tosse, dispneia, artralgia ou artrite, diarreia e dor
abdominal ou no flanco podem ocorrer como resultado
↠ Em consequência de embolia séptica, podem surgir da embolia sistêmica (PORTH, 10ª ed.).
necrose e infecções em outros órgãos, com os sinais e
sintomas clínicos correspondentes. Sinais periféricos de ↠ Pode haver o desenvolvimento de insuficiência
endocardite incluem petéquias, nódulos ou pápulas cardíaca congestiva em consequência da destruição da
eritematosas muito dolorosas na polpa dos dedos e nos valva, embolia em artéria coronária ou miocardite, bem
artelhos (nódulos de Osler), hemorragias nas palmas das como de insuficiência renal decorrente da destruição ou
mãos e na planta dos pés (lesão de Janeway) e das toxicidades dos antimicrobianos (PORTH, 10ª ed.).
hemorragias conjuntivais e na retina (manchas de Roth) RESUMO DAS MANIFESTAÇÕES (PORTO & PORTO)
(BOGLIOGO, 10ª ed.).
➢ Manifestações sistêmicas: febre (ausente em cerca de 5 a
Em muitos casos, surgem pequenas petéquias hemorrágicas quando 15% dos casos), anorexia, náuseas e vômitos, perda de
os êmbolos se alojam nos vasos de pequeno calibre da pele, nos leitos peso, sudorese noturna, calafrios, fadiga, astenia, dores
ungueais e nas membranas mucosas. É comum haver hemorragias musculares, artralgias.
lineares (i. e., linhas vermelhas escuras) sob as unhas das mãos e dos ➢ Manifestações neurológicas: cefaleia, rigidez da nuca,
pés (PORTH, 10ª ed.). torpor, delirium, hemiparesia, parestesias, afasia, coma.
➢ Manifestações renais: hematúria
↠ Alguns pacientes têm manifestações de nefropatia ➢ Manifestações cutaneomucosas: petéquias, nódulos de
pela deposição de imunocomplexos nos glomérulos. Osler (pequenas formações nodulares dolorosas na polpa e
Certo número de pacientes desenvolve estado de face lateral dos dedos), hemorragia conjuntival, lesões de
Janeway (máculas eritematosas ou purpúricas, planas e
choque, séptico e/ou cardiogênico, podendo, em alguns
indolores nas regiões palmares, plantares, eminências
casos, ter componente hipovolêmico por causa das tenares e hipotenares das mãos, pontas dos dedos das
hemorragias (BOGLIOGO, 10ª ed.). mãos e superfícies plantares dos artelhos)
➢ Manifestações respiratórias: tosse, dor pleurítica, hemoptise
➢ Manifestações cardíacas: dispneia, ortopneia, dispneia
paroxística noturna, mudanças das características dos
sopros cardíacos, atrito pericárdico

Júlia Morbeck – @med.morbeck


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➢ Manifestações abdominais: dor abdominal, esplenomegalia,


hepatomegalia
➢ Manifestações oculares: manchas de Roth no fundo de olho.

Diagnóstico da EI

↠ A EI continua a impor desafios importantes ao


diagnóstico e ao tratamento, apesar dos avanços a
respeito da sua epidemiologia e microbiologia. O
diagnóstico de EI não pode ser obtido com um único
exame, e inclui a consideração das características clínicas,
laboratoriais e ecocardiográficas (PORTH, 10ª ed.).

EXAMES LABORATORIAIS
↠ Os exames laboratoriais mostram com maior Imagem de ecocardiograma transtorácico mostrando vegetação em
face atrial da valva mitral.
frequência um hemograma com leucocitose e desvio de
células jovens para esquerda e aumento de provas
inflamatórias (proteína C-reativa e velocidade de ↠ Para auxiliar no frequentemente difícil diagnóstico de
hemossedimentação) (SOCESP, 5ª ed.). endocardite infecciosa, foram criados critérios, chamados
de critérios de Duke, subsequentemente modificados
↠ A hemocultura permanece como procedimento (BOGLIOGO, 10ª ed.).
diagnóstico mais definitivo e é essencial para direcionar o
tratamento (PORTH, 10ª ed.). Devem ser coletadas com técnica Critérios maiores são:
asséptica três amostras de hemoculturas puncionadas em veia
➢ cultura positiva para microrganismos típicos de
periférica de locais diferentes e antes do início dos antibióticos. A
bacteriemia da EI é contínua, portanto não há necessidade de se colher endocardite ou culturas persistentemente
as hemoculturas em vigência de febre (SOCESP, 5ª ed.). positivas a despeito de terapêutica
antimicrobiana;
↠ A análise da urina pode mostrar hematúria, proteinúria ➢ vegetações valvares, nova insuficiência valvar,
e até mesmo piúria causada pelas alterações imunológicas abscessos intracardíacos ou deiscência de
da endocardite sobre os rins (SOCESP, 5ª ed.). prótese valvar detectada por ecocardiografia;
➢ cultura positiva para Coxiella burnetti ou título de
ECOCARDIOGRAMA
anticorpos IgG anti-fase 1 ≥ 1:800.
↠ O ecocardiograma é a técnica primária para detecção
Critérios menores são:
de formações vegetativas e complicações cardíacas
resultantes da EI, constituindo uma ferramenta importante ➢ condições predisponentes;
no diagnóstico e no tratamento da doença (SOCESP, 5ª ➢ febre (T: >38ºC);
ed.). ➢ sequelas vasculares de endocardite (eventos
embólicos);
↠ O ACC e a AHA recomendam a realização de um
➢ deficiência imunitária;
ecocardiograma em todas as pessoas com suspeita de EI.
➢ culturas positivas para microrganismos menos
Recomenda-se o uso do ecocardiograma transtorácico
típicos de endocardite.
quando há risco inicial baixo ou uma leve suspeita clínica;
e o ecocardiograma transesofágico deve ser utilizado em ↠ O diagnóstico de endocardite envolve a combinação
casos com apresentações clínicas moderada ou de:
altamente suspeitas. Os indivíduos altamente suspeitos
incluem aqueles com próteses valvares, EI anterior, ➢ dois critérios maiores;
doença congênita complexa, insuficiência cardíaca ou ➢ um critério maior e ao menos três menores;
sopro cardíaco de início recente (SOCESP, 5ª ed.). ➢ cinco critérios menores.
OBS.: Quando há um critério maior e um menor, ou três menores, a
endocardite é considerada “possível”.

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Tratamento da IE ↠ A escolha do antimicrobiano mais apropriado requer o


conhecimento: (WHALEN, 6ª ed.).
↠ Tem por objetivo identificar e eliminar o
microrganismo causal, minimizar os efeitos cardíacos ➢ da identificação do microrganismo;
residuais e tratar o efeito patológico da embolia. A escolha ➢ da suscetibilidade do organismo com relação a
da terapia antimicrobiana depende do organismo cultivado um fármaco em particular;
e da sua ocorrência em uma valva nativa ou prótese ➢ do local da infecção;
valvar (PORTH, 10ª ed.). ➢ de fatores do paciente;
➢ da segurança do fármaco;
↠ A terapia é normalmente longa e por via parenteral ➢ do custo do tratamento.
(SOUSA; PINTO, 2022).
OBS.: Entretanto, alguns pacientes precisam do tratamento empírico
↠ Além de antibioticoterapia, a cirurgia pode ser (administração imediata do(s) fármaco(s) antes da identificação
necessária em casos de infecção sem resolução, bacteriana e dos testes de suscetibilidade) (WHALEN, 6ª ed.).
insuficiência cardíaca grave e embolia significativa (PORTH,
LOCAIS DE AÇÃO DOS ANTIMICROBIANOS
10ª ed.).
↠ Os antimicrobianos podem ser classificados de várias
TRATAMENTO MEDICAMENTOSO formas: (WHALEN, 6ª ed.).
↠ Deve ser iniciado de imediato, logo após obtenção de
➢ Por sua estrutura química (p. ex., beta-lactâmicos
hemoculturas, nos casos graves, instáveis, sem condições
ou aminoglicosídeos);
clínicas para aguardar resultado das hemoculturas ou
➢ Por seu mecanismo de ação (p. ex., inibidores da
naqueles cujas hemoculturas foram negativas. Optar por
síntese da parede celular);
um esquema terapêutico levando em conta o agente
➢ Por sua atividade contra tipos particulares de
etiológico mais provável (PORTO & PORTO).
microrganismos (p. ex., bactérias, fungos ou
Estreptococos do grupo viridans e S. bovis sensíveis à penicilina vírus).
➢ 1ª opção: benzilpenicilina cristalina.
➢ 2ª opção: ceftriaxona.
➢ Pacientes alérgicos à penicilina: vancomicina.

Enterococos e estreptococos resistentes à penicilina

➢ Benzilpenicilina cristalina ou ampicilina + gentamicina.


➢ Pacientes alérgicos à penicilina: vancomicina.

Estafilococos

➢ Oxacilina.
➢ Pacientes alérgicos à penicilina: vancomicina no lugar da
oxacilina.

Estafilococos resistentes à meticilina


ANTIMICROBIANOS INIBIDORES DA PAREDE CELULAR

➢ Vancomicina. ↠ Alguns antimicrobianos interferem seletivamente na


síntese da parede celular bacteriana – uma estrutura que
Bactérias do grupo HACEK as células dos mamíferos não possuem (WHALEN, 6ª ed.).
➢ 1ª opção: ceftriaxona.
➢ 2ª opção: ampicilina + gentamicina. ↠ Os inibidores da síntese de parede celular apresentam
eficácia máxima quando os microrganismos estão se
Pacientes portadores de prótese valvar proliferando. Eles têm pouco ou nenhum efeito em
➢ Estafilococos sensíveis à meticilina: oxacilina + rifampicina, + bactérias que não estejam crescendo e se dividindo
gentamicina. (WHALEN, 6ª ed.).
➢ Estafilococos resistentes à meticilina: vancomicina +
rifampicina + gentamicina. ↠ Os antimicrobianos que interferem na síntese da
parede celular são: (WHALEN, 6ª ed.).
ANTIMICROBIANO
➢ Penicilinas;

Júlia Morbeck – @med.morbeck


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➢ Cefalosporinas; USO PROFILÁTICO DE ANTIMICROBIANOS


➢ Carbapenemos;
➢ Outros antimicrobianos. ↠ Certas situações clínicas, como procedimentos
PENICILINAS dentários e cirurgias, exigem o uso de antimicrobianos
para prevenir as infecções, em vez de combatê-las. Como
MECANISMO DE AÇÃO: interferem na última etapa da síntese da parede o uso indiscriminado dos antimicrobianos pode resultar em
bacteriana (transpeptidação ou ligações cruzadas), resultando em
exposição da membrana osmoticamente menos estável. Então pode
resistência e superinfecção, o uso profilático é limitado a
ocorrer lise celular, seja pela pressão osmótica, seja pela ativação de situações clínicas, nas quais o benefício supera os riscos.
autolisinas (WHALEN, 6ª ed.). A duração da profilaxia deve ser intimamente monitorada,
para prevenir o indesejável desenvolvimento de
ANTIMICROBIANOS INIBIDORES DA SÍNTESE PROTEICA resistência ao antimicrobianos (WHALEN, 6ª ed.).
↠ Muitos antimicrobianos exercem seu efeito
antimicrobiano agindo nos ribossomas bacterianos e
inibindo a síntese proteica das bactérias. Os ribossomas
bacterianos diferem estruturalmente dos ribossomas
citoplasmáticos dos mamíferos e são compostos de
subunidades 30S e 50S (os ribossomas de mamíferos
têm subunidades 40S e 60S) (WHALEN, 6ª ed.).

↠ Em geral, a seletividade pelos ribossomas bacterianos


minimiza potenciais consequências adversas resultantes
da interrupção da síntese proteica nas células do
hospedeiro mamífero (WHALEN, 6ª ed.).

TRATAMENTO CIRÚRGICO
↠ O tratamento cirúrgico é indicado: (PORTO & PORTO).
➢ Quando falha o tratamento farmacológico,
particularmente nos portadores de prótese
valvar com infecção precoce e nos pacientes
que desenvolvem insuficiência cardíaca ↠ A antibioticoprofilaxia está recomendada para
refratária. pacientes de alto e médio risco, antes de procedimentos
➢ Nos casos de endocardite complicada por odontológicos invasivos que estimulam sangramento
perfuração de cúspide valvar, ruptura de (CINTRA, 2015).
cordoalha, abscesso de anel e múltiplos episódios
embólicos.
➢ Em infecções em que há dificuldade de
erradicação do germe com antibióticos (fungos
e Pseudomonas aeruginosa).

Medidas Preventivas da EI

↠ A cavidade bucal abriga em seu interior uma variedade


de espécies bacterianas, e algumas delas estão
relacionadas à bacteriemia, que é a presença de
microrganismos na corrente sanguínea. Qualquer quebra
na barreira da mucosa oral coloca o ambiente interno do
corpo em contato com um elevado grau de
contaminação, resultando na penetração de
microrganismos no sangue (CINTRA, 2015).

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Política Nacional de Saúde Integral das Populações do


Campo e da Floresta (PNSIPCF), considerada um avanço
para a garantia do direito e do acesso à saúde no SUS
(SOARES et. al., 2020).

↠ No contexto de saúde da população rural, a Unidade


de Saúde da Família (USF) torna-se o principal serviço
utilizado pela maioria dos moradores. Contudo, a oferta
dos serviços nessas unidades é reduzida, isto é, muitas
vezes, não é capaz de suprir as demandas da população
adstrita (MAGALHÃES et. al., 2022).

↠ Contudo, as carências encontradas na atenção básica


rural, comprometem os atendimentos na unidade, uma
vez que sua estrutura física se torna um empecilho para
o acesso de pacientes com deficiência física, muitas vezes
diante da ausência de rampas de acesso, pisos
inapropriados e portas sem largura ideal, o que deixam os
usuários desconfortáveis por precisarem do auxílio de
familiares ou profissionais para conduzi-los. Devido ao
comprometimento da mobilidade e agilidade física dos
idosos, esta estrutura também os deixa mais susceptíveis
ao risco de queda e lesões, trazendo assim danos para
sua saúde (MAGALHÃES et. al., 2022).

MEDIDAS GERAIS DE PREVENÇÃO DE EI ↠ Percebe-se que para a maioria dos usuários, o primeiro
CARDIOPAPERS obstáculo para acessar os serviços de saúde, na zona
Higiene oral e cutânea rigorosa; rural, (seja indo até a unidade, ou recebendo visitas dos
Desinfecção de feridas; profissionais) consiste em falta de algo essencial, o
Evitar automedicação de antibióticos;
transporte oportuno. Por conta disso, seguem-se diversas
Medidas de prevenção de infecções para qualquer
procedimento de risco; dificuldades, desde estruturais a organizacionais, que
Limitar cateteres de infusão ou procedimentos invasivos, impactam diretamente no processo saúde-doença dessa
quando possível. população (MAGALHÃES et. al., 2022).

↠ Em relação ao acesso aos serviços de saúde, mesmo


Atendimento à saúde da população rural após o seu processo de descentralização, pode-se notar
barreiras enraizadas, as quais vão desde a falta de
↠ Apesar dos avanços da APS, sobretudo na ampliação transporte, longas distâncias até as unidades de saúde, até
da cobertura da Estratégia Saúde da Família e no acesso a baixa renda e, consequente impossibilidade de recorrer
da população aos serviços de saúde, permanece o mais aos serviços de forma preventiva, o que denota que
desafio de garantir o direito e o acesso à saúde da os fatores socioeconômicos continuam como fortes
população rural (SOARES et. al., 2020). condicionantes e determinantes da saúde (MAGALHÃES
↠ Estudos apontam que, quando comparada à população et. al., 2022).
urbana, a situação de saúde da população rural é mais ↠ Os problemas de cunho estrutural e organizacional,
precária, com baixa cobertura de saneamento básico como a falta de recursos materiais e humanos para
(32,8%) e maior parte da população (67,2%) captando atenderem de forma oportuna e em tempo hábil as
água sem tratamento ou com condições insalubres, o que demandas da população, marcam um problema contínuo
impacta no número de doenças de veiculação hídrica, de carência de investimentos para o setor saúde,
parasitoses intestinais e diarreias (SOARES et. al., 2020). principalmente para o SUS. Esses fatores, portanto,
↠ Visando à diminuição das iniquidades em saúde corroboram para a baixa adesão aos serviços e,
relacionadas à população rural, foi publicada, em 2014, a consequentemente, continuidade do modelo curativista,

Júlia Morbeck – @med.morbeck


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onde o indivíduo procura o serviço em um momento de


emergência para tratar um problema já instaurado
(MAGALHÃES et. al., 2022).

IMPORTANTE: Entende-se que valorizar a integralidade do


cuidado, olhando para o território, ouvindo as expressões
populares, compreendendo os valores das pessoas e de
suas necessidades de saúde, torna-se relevante nas ações
dos profissionais de saúde que atuam nesse contexto.
Essa construção contribui para alargar espaços dialógicos
com as comunidades, inserindo e fortalecendo as ações
de saúde, de promoção e prevenção (LIMA et. al., 2019).

Referências

PORTO, Celmo C.; PORTO, Arnaldo L. Clínica Médica na


Prática Diária. Grupo GEN, 2015.

FILHO, Geraldo B. Bogliolo – Patologia, 10ª edição. Grupo


GEN, 2021.
NORRIS, Tommie L. Porth - Fisiopatologia, 10ª edição.
Grupo GEN, 202.
JATENE, Ieda B.; FERREIRA, João Fernando M.; DRAGER,
Luciano F.; et al. Tratado de cardiologia SOCESP, 5ª
edição. Editora Manole, 2022

HAMMER, Gary D.; MCPHEE, Stephen J. Fisiopatologia da


doença. Grupo A, 2015.
GALVÃO, J. L. F. M. Endocardite infecciosa: uma revisão
do microrganismo ao tratamento. Trabalho de Conclusão
de Curso, João Pessoa, 2016.
SOUSA; PINTO. Endocardite infecciosa: ainda mais
desafios que certezas. Arquivos Brasileiro de Cardiologia,
2022.

CINTRA, J. N. Risco de endocardite bacteriana no


tratamento endodôntico. Revista Investigação Saúde, 2015.
SOARES et. al. Cuidado em saúde às populações rurais:
perspectivas e práticas de agentes comunitários de
saúde. Revista de Saúde Coletiva, 2020.
MAGALHÃES et. al. Acesso à saúde e qualidade de vida
na zona rural. Pesquisa, Sociedade e Desenvolvimento,
2022.
LIMA et. al. Necessidades de saúde da população rural:
como os profissionais de saúde podem contribuir? Saúde
debate, 2019.
WHALEN et. al. Farmacologia Ilustrada, 6ª edição. Porto
Alegre: Artmed, 2016.

Júlia Morbeck – @med.morbeck

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