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ENDOCARDITE INFECCIOSA
Quando pensamos em doenças infecciosas, lembramos quase sempre de condições em que as
manifestações clínicas se apresentam de forma muito franca — o paciente tem febre e alguma queixa
que permite localizar a doença: na pneumonia, febre e tosse; na infecção do trato urinário, febre,
disúria e dor lombar; na meningite, febre e rigidez de nuca... Na Endocardite Infecciosa (EI), nem
sempre é tão simples...

Tal condição se apresenta como um quadro multissistêmico, com sinais e sintomas variados, em que,
frequentemente, não há queixa que aponte diretamente para o diagnóstico. Este frequentemente acaba
sendo suspeitado somente várias semanas após o início do quadro, quando um(a) médico(a)
“iluminado(a)” resolve colocar o estetoscópio no peito do paciente, auscultando um sopro. É sob essa
ótica que começamos o estudo da EI, buscando, além de conhecer os detalhes do tratamento
antimicrobiano, guardar o “jeitão” da doença, que permitirá suspeitarmos dela sempre que pertinente.

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Em frente.

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INTRODUÇÃO
EI é definida como a inflamação infecciosa das valvas cardíacas e do endocárdio, o revestimento interno do
coração.

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ATENÇÃO

Diferencie com cuidado EI aguda e subaguda — a definição do tratamento empírico depende disso!

EI Aguda = desenvolvimento rápido dos sintomas, com febre alta e queda do estado geral. Seu principal
agente etiológico é o Staphylococcus aureus. Como vimos, essa bactéria vive em nosso revestimento
cutâneo!
EI Subaguda = início insidioso, com febre baixa e arrastada, além de perda ponderal e sudorese
noturna. Em nosso meio, tem como principal causa Streptococcus do grupo viridans, que normalmente
colonizam nossa boca e garganta.

SAIBA MAIS

Antigamente, classificávamos a endocardite em aguda e subaguda com base no tempo de sobrevida


após o surgimento de sintomas. Àquela época, definíamos a endocardite como aguda caso o tempo
entre início dos sintomas e óbito fosse menor que seis semanas e subaguda se maior que seis semanas.
Apesar de parecer sombrio, na época em que essa classificação foi criada, não havia antibióticos para o
tratamento adequado das EI e a mortalidade era praticamente 100%.

FISIOPATOLOGIA
A sequência fisiopatológica da EI é lógica e previsível. Observe os quatro eventos principais:
1. Lesão endocárdica: evento inicial

2. Surgime​nto de vegetações estéreis

Três fenômenos principais podem causá-la:


1)
Jato sanguí​neo em alta velocidade atingindo o
endotélio (turbilhona​mento).
2)
Grande diferença pressórica entre duas câmaras
cardíacas.
3)
Fluxo que passa por um pequeno orifício em alta
velocidade.
No sítio de lesão endote​lial, forma-se um agre​gado de
pla​quetas e fibrina, dando origem a vegeta​ções
estéreis. Esse fenôme​no é conhe​cido como Endocar​‐
dite Trombó​tica Não Bac​teriana (ETNB).

3. Infecção das vegetações

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4. Proliferação bacteriana

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Durante um episódio de bacteremia, por doença dentária, infecção de pele ou outras, pode ocorrer a
semeadura da vegetação.
Os micro-organismos agora passam a se multiplicar a partir da vegetação, invadindo a superfície
endocárdica, levando então à EI.

AGENTES ETIOLÓGICOS
EI DE VALVAS NATIVAS
A EI comunitária — isto é, adquirida fora do ambiente hospitalar — é majoritariamente causada por

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estreptococos (principal), estafilococos e enterococos. Esses germes fazem parte da nossa microbiota da
pele, orofaringe e trato urogenital e acabam tendo acesso frequente à corrente sanguínea. Além disso,

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possuem receptores específicos que aderem facilmente às superfícies valvares lesadas, o que explica sua
dominância.

A depender da apresentação clínica (formas subagudas ou agudas) teremos algumas mudanças nesse
panorama geral. Conhecê-las será fundamental para direcionar a terapêutica.

EI SUBAGUDA
Os estreptococos viridans (alfa-hemolíticos) são os estreptococos mais comuns nas EI subagudas de valvas
nativas. Outros, como os estreptococos do grupo B (beta-hemolíticos) também podem causar EI,
especialmente em pacientes cirróticos, diabéticos e usuários de drogas intravenosas.

Se olharmos especificamente para a população mais idosa, veremos que o Streptococcus gallolyticus é o
mais prevalente. Os pacientes com EI por esse germe frequentemente têm lesões colônicas que funcionam
como porta de entrada (ex.: adenocarcinoma de cólon) para o germe.
ATENÇÃO

Sempre que seu paciente tiver EI por S. gallolyticus, você deve realizar investigação endoscópica para
pesquisa de lesões malignas do trato gastrointestinal.

Os enterococos (cocos gram-positivos) estão em segundo lugar e são micro-organismos associados à


bacteremia durante manipulação do trato genitourinário, principalmente em pacientes hospitalizados. A
grande maioria das infecções enterocócicas são causadas pelo Enterococcus faecalis (> 90%).

Mais raramente, porém não menos importantes, estão os germes gram-negativos do grupo HACEK.

Aqui, o bicho pega um pouco. Você não tem obrigação de decorar — só leia!

HACEK é o acrônimo com as iniciais dos germes que representam o grupo:


(1)
Haemophilus aphrophilus,
(2)
Actinobacillus actinomycetemcomitans,
(3)
Cardiobacterium hominis,
(4)

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Eikenella corrodens e
(5)

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Kingella kingii (mais fácil decorar somente “HACEK”, não é verdade?).

Mais recentemente, o A passou a se referir ao gênero Aggregatibacter, que inclui os antigos Haemophilus
aphrophilus e Actinobacillus actinomycetemcomitans. Estes germes são responsáveis por cerca de 5% dos
casos de EI subaguda e caracteristicamente são germes “teimosos” para crescer em cultura, sendo
necessários mais de sete dias para ser detectado crescimento (podendo chegar a 14–21 dias de incubação).

EI AGUDA
O Staphylococcus aureus é o germe mais associado à EI aguda, principalmente na presença de infecções de
pele e/ou subcutâneo (ex. furunculose) e após procedimentos médicos, como por exemplo, acesso venoso
profundo.

Outro importante agente, cuja incidência vem caindo progressivamente nos últimos anos, é o Streptococcus
pneumoniae.

EI DE PRÓTESES VALVARES
A etiologia da EI em portadores de prótese valvar varia de acordo com o tempo decorrido desde a cirurgia
de troca...

Nos pacientes que desenvolvem EI com menos de dois meses de pós-operatório, predominam germes
hospitalares, destacando-se os estafilococos, principalmente coagulase-negativos, seguido de S. aureus,
gram-negativos e fungos.

Quando a EI ocorre no período tardio, ou seja, em mais de um ano de pós-operatório, os causadores são
Quando a EI ocorre no período tardio, ou seja, em mais de um ano de pós-operatório, os causadores são
semelhantes aos de EI comunitária, porém, comparado a indivíduos com válvula nativa, os pacientes com
válvula protética têm maior frequência de S. aureus. Desta forma, os mais comuns nesta fase são os
estreptococos, seguidos de S. aureus e estafilococos coagulase-negativos.

SAIBA MAIS!

Os estafilococos coagulase-negativos são importantes agentes causadores da EI nos pacientes com


prótese valvar, principalmente em infecções precoces e intermediárias. O mais comum no primeiro
ano de colocação da prótese é o S. epidermidis, sendo 84–87% das cepas resistentes à oxacilina. Em
contrapartida, mais da metade dos estafilococos coagulase-negativos que causam EI após 1 ano de
colocação da válvula protética são não-epidermidis, e apenas 22–30% destes são resistentes à oxa.

E os pacientes com infecção na fase intermediária (2–12 meses de pós-operatório)?

Nesses casos há uma “mistura” de germes hospitalares, causando infecção nosocomial tardia, além de
germes comunitários.

MANIFESTAÇÕES

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Como vimos anteriormente, as manifestações da EI podem variar enormemente de um paciente para o
outro: nos quadros agudos, por exemplo, surgem sinais de sepse grave, enquanto nas formas

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subagudas/crônicas, o doente tem sintomas inespecíficos, febre baixa e evolução insidiosa de semanas a
meses.

Para pensarmos em endocardite, no geral, o paciente deve apresentar febre não justificada por processos
infecciosos mais comuns — pneumonia, infecção do trato urinário — sopro à ausculta cardíaca e algum
fator de risco para a doença.

SUSPEITA DE ENDOCARDITE = Febre + Sopro + Fator de risco

A maioria esmagadora (85–90%) dos pacientes terá febre, podendo ela estar ausente em pacientes com
insuficiência cardíaca congestiva, grave debilidade, insuficiência renal ou hepática, uso prévio de
antibióticos ou em endocardites causadas por agentes menos virulentos. Por outro lado, o sopro, apesar de
também ser comum (85%), pode estar ausente em pacientes com lesões murais ou no coração direito
(comuns em usuários de drogas injetáveis).

Vejamos alguns detalhes para diferenciar entre EI subaguda e aguda.

EI SUBAGUDA
Na doença subaguda, em geral o paciente apresentará febre baixa prolongada, com duração de semanas a
meses, sudorese noturna, anorexia, perda de peso e sopro cardíaco na ausculta. Sintomas como artralgia e
mialgia estão presentes em metade dos casos.

EI AGUDA
EI AGUDA
Na forma aguda, o quadro é toxêmico, com febre elevada, sopro cardíaco e prostração importante. A
apresentação é grave e os sintomas progridem rapidamente.

DIAGNÓSTICO

TRATAMENTO

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O tratamento da EI é prolongado, com altas doses de antibióticos por via parenteral. Caso a apresentação
clínica seja compatível com endocardite infecciosa aguda, com sinais de toxemia, febre elevada e sopro
cardíaco, o tratamento deve ser iniciado o mais rápido possível, logo após as coletas de culturas. Entretanto,
em casos com apresentação compatível com endocardite subaguda, podemos aguardar o resultado das
culturas para iniciar o tratamento antibiótico guiado pelo TSA (Teste de Sensibilidade aos Antibióticos).
Cobertura empírica no tratamento da endocardite infecciosa.
*Devido ao crescimento de cepas MRSA, muitas bibliografias americanas recomendam a antibioticoterapia empírica com
vancomicina e gentamicina na EI de valva nativa comunitária;
** Os portadores de valva protética há mais de um ano são geralmente tratados da mesma forma que os pacientes com EI de valva
nativa.

COBERTURA ESPECÍFICA NO TRATAMENTO DA ENDOCARDITE INFECCIOSA.

PATÓGENO

OPÇÕES DE DROGAS

Estreptoco​cos viridans sensíveis à


penicilina, S. gallolyti​cus (S. bovis)
e outros estreptoco​cos com MIC
menor ou igual a 0,12 microgra​‐

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ma/ml.

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1.
PENICILINA G 2–3 milhões ​de unida​des​ IV 4/4h por 4 semanas.
2.
CEFTRIAXONE 2 g IV/dia por 4 semanas.
3.
VANCOMICI​NA 15 mg/kg IV de 12/12h por 4 semanas.
4.
PENICILINA G ou CEFTRIAXONE (mesmas doses acima) +
GENTAMICINA 3 mg/kg/dia ou 1 mg/kg de 8/8h IV ou IM por 2 semanas.

Estrepto​cocos relativame​nte
resistentes à penicilina, com MIC >
0,12 e < 0,5 microgra​mas/ml.

1.
PENICILINA G 4 milhões de unidades IV de 4/4h ou CEFTRIAXONE
(mesma dose acima) + GENTAMICI​NA (mesma dose acima) por 2
semanas.
2.
VANCOMICI​NA (mesma dose acima) por 4 semanas.

Estreptoco​cos com MIC maior ou


igual a 0,5 microgra​mas/ml para
penicilina, Granulica​tella,
Abiotrophi​a, Gemella morbillo​rum.

1.
1.
PENICILINA G em dose alta (4–5 milhões de unidades) IV de 4/4h ou
CEFTRIAXONE (mesma dose acima) + GENTAMICI​NA (mesma dose
acima) por 6 semanas

Estreptoco​cos*

1.
PENICILINA​ G em dose alta ou AMPICILINA 2 g​ ​IV 4/4h ou
VANCOMICI​NA (mesma dose acima) + GENTAMICINA+ (mesma dose
acima) por 4–6 semanas
Pode ser substituída por estreptomicina (7,5 mg/kg de 12/12h) se não
houver alta resistência à dro​ga

Estafiloco​cos sensíveis à meticilina


(MSSA) em valva nativa

1.
OXACILINA 2 g IV 4/4h por 4–6 semanas.**
2.
CEFAZOLINA 2 g IV 8/8h por 4–6 semanas.
3.

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VANCOMICINA (mesma dose acima) por 4–6 semanas.
** Era comum a associação com gentamicina, porém estudos recentes não

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demonstraram benefício desta estratégia, sendo hoje opcional.

Estafiloco​cos resistentes à
meticilina (MRSA) em valva nativa

1.
VANCOMICINA (mesma dose acima) por 4–6 semanas.

Estafiloco​cos sensíveis à meticilina


(MSSA) em valva protética

1.
OXACILINA (mesma dose acima) por 6–8 semanas + GENTAMICINA
(mesma dose acima) por 2 semanas + RIFAMPICINA 300 mg VO 8/8h por
6–8 semanas

Estafiloco​cos resistentes à
meticilina (MRSA) em valva
protética

1.
VANCOMICINA (mesma dose acima) por 6–8 semanas + GENTAMICINA
(mesma dose acima) por 2 semanas + RIFAMPICINA (mesma dose
acima) por 6–8 semanas

Microrgani​smos HACEK
1.
CEFTRIAXONE (mesma dose acima) por 4 semanas.
2.
AMPICILINA-SULBACTAM 3 g IV 6/6h por 4 semanas.

Coxiella burnetti

1.
DOXICICLI​NA 100 mg VO 12/12h + hidroxicloroqui​​na 200 mg VO de 8/8h
por 18 meses (valva nativa) ou 24 meses (valva protética).

Bartonella spp.

1.
CEFTRIAXONE (mesma dose acima) ou AMPICILINA (mesma dose
acima) ou DOXICICLINA (mesma dose acima) por 6 semanas +
GENTAMICINA (mesma dose acima) por 3 semanas.

*Pacientes em tratamento para EI por enterococo devem usar associado ao aminoglicosídeo, uma droga com ação bactericida que
atue na parede celular (penicilina, ampicilina, vancomicina). Além disso, apesar de ser mais segura, a dose única diária de
aminoglicosídeo não deve ser feita nos casos de EI por enterococo.

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MONITORANDO A TERAPÊUTICA
Os pacientes que estiverem usando vancomicina ou aminoglicosídeos, devem ser avaliados rotineiramente
com exames hematológicos, renais, hepáticos e, idealmente, nível sérico da droga, a fim de monitorar seus
efeitos tóxicos.

Espera-se que os pacientes fiquem afebris em 3–5 dias de tratamento antibiótico. Caso o paciente apresente
persistência da febre por mais de 7 dias, devem ser investigadas as complicações que discutimos
anteriormente.

Os pacientes com EI devem ter hemoculturas repetidas até que fiquem estéreis. Os resultados devem ser
revisados em caso de retorno de febre ou após 4–6 semanas de tratamento, para documentação da cura.

Em quanto tempo as culturas ficam negativas? Precisamos monitorar as vegetações também?

Em média, pacientes que apresentam EI por Streptococos viridans, enterococo ou um dos HACEK ficam
com hemocultura negativa após dois dias de tratamento antimicrobiano, no caso de EI por S. aureus,
três a cinco dias em MSSA e sete a nove dias caso seja MRSA.

As vegetações podem até reduzir com o tratamento eficaz, entretanto, no final de três meses após a
cura, metade das vegetações estará inalterada e 25% estará aumentada! Portanto, de nada adianta
ficar monitorando as vegetações!

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