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Diretor Administrativo
Eduardo Santini
UNIFATECIE Unidade 3
Web Designer Rua Pernambuco, 1.169,
Thiago Azenha Centro, Paranavaí-PR
(44) 3045 9898
UNIFATECIE Unidade 4
BR-376 , km 102,
Saída para Nova Londrina
FICHA CATALOGRÁFICA
Paranavaí-PR
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNIFATECIE.
Credenciado pela Portaria N.º 527 de 10 de junho de 2020,
(44) 3045 9898
publicada no D.O.U. em 15 de junho de 2020.
Núcleo de Educação a Distância;
SANTOS, Renata Oliveira dos. www.unifatecie.edu.br
Antropologia Cultural.
Renata. Oliveira dos Santos.
Paranavaí - PR.: UniFatecie, 2020. 83 p.
As imagens utilizadas neste
Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária livro foram obtidas a partir
Zineide Pereira dos Santos. do site ShutterStock
AUTORA
Caro(a) aluno(a),
O objetivo geral desta disciplina será refletir sobre os estudos antropológicos, com-
preendendo o conceito dessa ciência, sua importância e seus objetivos. Com o propósito de
entender as diferenças entre o eu e o outro, para que não haja nenhum tipo de preconceito
dentro da ciência chamada de Antropologia. Espera-se que você entenda que culturas
são diferentes e precisam ser respeitadas. Porém, sem o conhecimento de seu sentido e
Sendo assim, na Unidade II vamos compreender um pouco mais sobre essa relação
dos conceitos de etnocentrismo, relativismo cultural e identidade que nos ajudarão a per-
ceber o quanto estamos interligados. Isso nos revelará que a relação entre os sujeitos
sociais é permeada por muitos símbolos que demonstram quem somos e como agimos em
sociedade.
bre a questão do sincretismo religioso e as religiões de matrizes africanas que fazem parte
UNIDADE I....................................................................................................... 7
Cultura, pra quê?
UNIDADE II.................................................................................................... 22
Respeito às Diferenças: Eu e o Outro
UNIDADE III................................................................................................... 39
Antropologia Brasileira e o Sincretismo Religioso
UNIDADE IV................................................................................................... 58
Por uma Pedagogia Antirracista
UNIDADE I
Cultura, pra quê?
Professora Mestra Renata Oliveira dos Santos
Plano de Estudo:
● Você sabe o que é cultura?
● Antropologia: uma ciência em constante mudanças
● O antropólogo: quem é ele?
● Entenda: cada cultura tem sua própria lógica
Objetivos de Aprendizagem:
● Conceitos e Definições de Cultura
● Campos de estudo da Antropologia
● Refletir sobre o papel do Antropólogo
● Compreender a importância dos estudos antropológicos contra discriminação,
preconceito e intolerância
7
INTRODUÇÃO
Logo de cara, ler essa frase nos causa um pouco de desconforto, não é mesmo?
Pois bem, é justamente para repensar nossos privilégios sociais e lugares que ocupamos
na sociedade que a Antropologia começará a fazer parte das nossas discussões.
Você verá que muitas coisas que faz, fala, a maneira como reage e age no meio
social estão relacionadas a sua cultura. Mesmo que não saiba ainda, nós reproduzimos
muitas falas e ações de quem faz parte do cotidiano que vivenciamos. Assim, vamos cons-
truindo e desconstruindo nossas ideias e maneira de pensar o mundo.
Claro que você já deve ter percebido que muitos atos de racismos, preconceitos em
relação a identidades de gênero, violências contra mulheres e homossexuais estão cada
vez mais presente nos noticiários, nas redes sociais. Denúncias que se repetem e que
deveriam nos levar a pensar: “Mas, afinal, por que essas coisas acontecem?”
Bom, sabe aquela frase que nossos pais/avós falam e que, muitas vezes, nos irrita:
“na minha época não era assim”? Então, é que vivemos em contextos históricos, políticos,
educacionais e econômicos diferentes. Assim, a maneira como uma coisa era pensada
anteriormente pode não ter nenhum significado e sentido agora.
Lembre-se, culturas são dinâmicas. Elas se movem e se modificam o tempo todo.
Por isso, atos racistas, preconceituosos e discriminatórios, que historicamente foram
naturalizados, em nossos tempos, são cada vez mais problematizados e combatidos. As
diferenças fazem parte da nossa sociedade e elas precisam ser entendidas e respeitadas.
Todos os sujeitos sociais devem ter seus direitos sociais e judiciários assegurados, para
quem ninguém fique à margem do todo social, simplesmente porque sua forma de ver,
pensar, agir e estar no mundo é singular, específica em relação ao outro.
Dessa Maneira, vamos nos aprofundar um pouco mais sobre a antropologia, de-
monstrando como, na prática cotidiana, ela nos permite compreender o outro e a nossa
própria sociedade por meio de perspectivas diversas, que não podem ser consideradas
melhores ou piores; superiores ou inferiores; boas ou ruins.
Nossos estudos estão ancorados, justamente, nessa última área, em que gestos,
trocas simbólicas e os detalhes de quem somos e agimos no dia a dia fazem parte daquilo
que buscamos compreender. Já que muitas vezes essas manifestações são responsáveis
por criar nossa própria identidade.
Não se esqueça que, para a antropologia, nossa maneira de andar, dormir, nos
encontrar, emocionar, comemorar e reagir são produtos de escolhas culturais que podemos
realizar de maneira consciente ou apenas reproduzindo os reflexos que interiorizamos.
Dessa maneira, quando nos propomos a ver o mundo com outra perspectiva, somos
conduzidos, por essa ciência, a uma verdadeira revolução do olhar:
“Eu sou mil possíveis em mim; mas não posso me resignar a querer apenas um
deles” (Roger Bastide).
Diante disso, podemos afirmar que o ato de olhar, ouvir e escrever são pró-
prios da antropologia, e podem promover uma maneira de entender o mundo de forma
relativizada. Eles devem ser vistos de maneira tematizada e etapas da construção de novos
conhecimentos.
Você sabia que a vaca é considerada um animal sagrado entre os indianos? O que pode
parecer estranho, esquisito e exótico tem uma explicação lógica. Para saber mais, leia o
texto indicado e descubra como as diferenças fazem parte do nosso mundo.
REFLITA
Qual a razão da cultura ser um aspecto tão importante para a compreensão do meio em
que vivemos?
Você acha que nossa cultura é melhor do que outra? Aliás, será que você já parou
para pensar nos detalhes culturais que se manifestam em nossa formação?
Pensando nessas indagações convido você a ler um texto bem divertido e que vai te causar
muitos estranhamentos. Vamos lá?
MINER, H. Os ritos corporais dos Nacirema. In: ROONEY, A. K.; VORE, P. L. de (Orgs.). YOU AND T HE
OTHERS - Readings in Introductory Anthropology. Cambridge: Erlich, 1976. Disponível em: https://ediscipli-
nas.usp.br/pluginfile.php/364413/mod_resource/content/0/Nacirema.pdf. Acesso em: 10 ago. 2020.
LIVRO
• Título: Cultura: um conceito antropológico
• Autor: Roque de Barros Laraia
• Editora: Zahar
• Sinopse: Dividido em duas partes, o livro refere-se ao conceito
de cultura a partir das manifestações iluministas até os autores
contemporâneas, enquanto a segunda procura demonstrar como
a cultura parece influenciar o comportamento social e diversificar
a humanidade, apesar de sua unidade biológica. O autor busca
utilizar, sempre que possível, exemplos referentes à sociedade e
às sociedades tribais que compartilham o território brasileiro, o que
não impede a utilização de exemplos de autores que trabalham em
outras partes do mundo.
FILME/VÍDEO
• Título: O casamento Grego
• Ano: 2002
• Sinopse: Todos na família Portokalos estão preocupados com
Toula (Nia Vardalos). Ainda solteira aos 30 anos de idade, ela tra-
balha no Dancing’s Zorba, o restaurante de seus pais, Gus (Michael
Constantine) e Maria (Lainie Kazan). Após começar a trabalhar na
agência de viagens de sua tia, ela se apaixona por Ian Miller (John
Corbett), um professor que é alto, bonito e que definitivamente não
é grego. Toula não está certa do que será mais aborrecedor para o
seu pai: Ian ser estrangeiro ou ser vegetariano.
WEB
Pegar toda a complexidade de uma pessoa e de seu contexto
e reduzi-los a um só aspecto é o que Chimamanda chama de o
perigo da história única. Como uma estudante nigeriana em uma
universidade nos Estados Unidos, ela vivenciou com frequência
isso.
• Link do site: https://www.youtube.com/watch?v=EC-bh1YARsc
Plano de Estudo:
● Eu e o outro: Sociedade do Desvio
● Etnocentrismo.
● Relativismo Cultural
● Identidade
Objetivos de Aprendizagem:
● Refletir sobre as diferenças da relação entre eu e o outro
● Compreender o conceito de Etnocentrismo e como sua perpetuação provoca ações
preconceituosas e discriminatórias
● Entender a importância do conceito de relativismo cultural para a diversidade
● Refletir sobre o que significa ter identidade
22
INTRODUÇÃO
BONS ESTUDOS!
Para convivermos em sociedade, é preciso entender que cada grupo social faz as
suas próprias regras e, por isso, tentam impor-lás aos indivíduos que fazem parte de uma
determinada estrutura social.
O fato é que as regras sociais tendem a definir os comportamentos adequados
das pessoas para cada situação, o que pode significar a definição do que é certo ou errado.
Com toda certeza você já deve ter passado por experiências em que pensou: “quem definiu
que isso era correto?”.
Pois bem, a ideia de certo e errado está mais relacionada às subjetividades impos-
tas pelo coletivo do que na liberdade individual. Aprendemos e ensinamos essas noções,
sem, muitas vezes, questionar como elas foram determinadas.
Segundo Becker (2008), todas as pessoas que não seguem regras impostas são
consideradas infratoras e vistas como outsiders. A pessoa rotulada dessa maneira é per-
cebida por outros como aquela que está fora da normalidade, do padrão e que quebra
todas as regras, simplesmente por não as seguir. Como você acha que um outsider é visto
socialmente?
Será que você pode ser entendido como um outsider? Este se caracteriza por ser
um desviante e é rotulado assim por outras pessoas. O julgamento que precede a esse tipo
de indivíduo se baseia na ideia de que todos devemos agir de maneira igual, quando isso
não ocorre deve ser corrigido.
Em uma sociedade repleta de padrões sociais, não é fácil conviver com as dife-
renças. Bom, até agora você já deve ter aprendido uma porção de coisas sobre cultura e,
provavelmente, deve estar imaginando como poderá absorver todo esse conhecimento para
o seu dia a dia. Pois bem, a partir do momento em que respeitamos o outro, é impossível
ser um etnocêntrico e é sobre esse conceito que vamos debater a partir de agora.
No mundo em que vivemos podemos observar uma grande dificuldade de aceitar
quem é diferente do padrão normativo. Muitas vezes somos questionados por nossa forma
de pensar, de agir, falar, nos vestir e, até mesmo, andar. Para aqueles que acreditam que o
mundo pode ser apenas de um jeito, ser alguém considerado diferente, como vimos, é ser
um desviante.
Mas, o que acontece para que os seres humanos não consigam viver de maneira
harmoniosa a diversidade? O fato é que todas as vezes que uma pessoa julga a outra
ou tenta homogeneizar os modos de ser, viver e se comportar, o que ela está fazendo é
entender o outro por sua própria ótica. Ficou confuso? Vamos a explicação.
Bom, toda vez que fazemos um comentário sobre um indivíduo, podemos utilizar
a expressão popular de que “estamos medindo a pessoa com a nossa própria régua”.
Isso significa que os padrões que temos fazem com que eu acredite que o outro deva ser
e pensar exatamente igual a mim. Assim, todo aquele que se recusar a ter as mesmas
Se neste momento eu lhe perguntasse qual sua identidade, como você responde-
ria? Será que aquela imagem que está no documento de identidade representa exatamente
quem você é? Pois bem, saber quem somos faz parte de entendermos como nos diferen-
ciamos das demais pessoas com quem convivemos e nos tornamos alguém único.
Quando falamos de identidade podemos entender o conceito como um espaço de
pertencimento se estamos refletindo sobre o lugar que habitamos ou nos reconhecemos
em grupo. Por isso, a ideia de identidade cultural pode ser entendida como cada sociedade
elabora sua própria cultura a partir das influências e do encontro com outras manifestações
que vão determinando a maneira como cada grupo irá agir no cotidiano.
Para o sociólogo polonês Zygmunt Bauman (2005), vivemos em uma sociedade
moderna que se caracteriza pela liquidez. Isso significa que as nossas ações são rápidas e
fluídas, por essa razão os laços que estabelecemos com o próximo são líquidos. Para ele,
a descoberta da identidade pode ser identificada como problemática quando se pretende
defini-la apenas de maneira única. Assim, a nossa existência individual pode ser entendida
como fragmentada. Com isso, somos muitos, ao mesmo tempo que habitamos apenas um
corpo.
Se eu perguntasse a você como seria a sua maneira de se representar, o que você
me diria? A questão “quem eu sou” é muito antiga e profunda. Ela pode ser pensada de
diferentes formas. Desta maneira, você pode ser homem ou mulher, casado ou solteiro, tor-
SAIBA MAIS
Você sabia que na Índia as pessoas trans são tratadas como o terceiro gênero e respei-
tadas por lei?
Conhecidas como hijras, são consideradas sagradas na tradição hindu. Por essa razão,
até hoje, elas são chamadas para abençoar casamentos na zona rural. Por outro lado,
acredita-se que matar, agredir ou desagradar uma delas resultaria em uma maldição
para a vida toda. Essa superstição ajuda a prevenir ataques transfóbicos nos redutos
mais conservadores e no interior do país.
Fonte: a autora
REFLITA
Quando chamamos alguém de louco, o que de fato queremos dizer? E quando alguém
nos chama de louco, será que se trata de alguma questão de fato mental?
“Às vezes não tenho tanto a certeza de quem tem o direito de dizer quando um homem
é louco e quando não é. Às vezes penso que não há ninguém completamente louco tal
como não há ninguém completamente são até a opinião geral o considerar assim ou
assado. É como se não fosse tanto o que um tipo faz, mas o modo como a maioria das
pessoas o encara quando o faz” (William Faulker).
Fonte: Becker (2008).
Fonte: BRUM, E. De uma Branca para Outra. El País, fev. 2017. Disponível em: https://brasil.elpais.com/
brasil/2017/02/20/opinion/1487597060_574691.html. Acesso em: 15 ago. 2020.
LIVRO
• Título: Identidade
• Autor: Zygmunt Bauman
• Editora: ZAHAR
• Sinopse: Identidade volta a uma questão central do pensamento
de Zygmunt Bauman em alguns de seus livros: no mundo de hoje,
qual é o espaço do eu e do outro? Qual é a medida da liberdade in-
dividual? E do respeito ao próximo, com todas as suas diferenças?
É possível construir uma identidade sem levar a alteridade – o
outro – em conta? A sobrevivência de um Estado-nação moderno
pode se afirmar na falência ou na negação de outros estados?
Nessa entrevista que concedeu ao jornalista italiano Benedetto
Vecchi, um dos maiores teóricos da atualidade, mostra como a
identidade se tornou um conceito-chave para o entendimento da
vida social na era da “modernidade líquida” – termo que Bauman
cunhou para falar do esgarçamento das relações na atualidade.
Segundo o sociólogo, à medida que nos deparamos com as
incertezas e as inseguranças da “modernidade líquida”, nossas
identidades sociais, culturais, profissionais, religiosas e sexuais
sofrem um processo de transformação contínua. Isso nos leva a
buscar relações transitórias e fugazes e faz com que soframos as
angústias inerentes a essa situação. A confusão atinge os valores,
mas também as relações afetivas: “Estar em movimento não é
mais uma escolha: agora se tornou um requisito indispensável”,
afirma Bauman.
FILME/VÍDEO
• Título: Ninguém sabe que estou aqui.
• Ano: 2020
• Sinopse: é a história de Memo (Jorge Garcia), morador de uma
remota fazenda de ovelhas no Chile, que esconde sua linda voz
do mundo. Traumatizado por acontecimentos do passado, ele vive
de maneira solitária, até que uma mulher lhe oferece a chance de
encontrar a paz que tanto procura.
WEB
• Propaganda - Identidade - Fernando Meirelles.
Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=yKG8no8OKDg.
Acesso em: 14 ago. 2020.
Plano de Estudo:
● Cultura Material e Imaterial
● Antropologia das religiões
● Sincretismo religioso no Brasil
● Religiões afro brasileiras: Candomblé e a Umbanda
Objetivos de Aprendizagem:
● Conceituar a diferença entre cultura material e imaterial
● Compreender a importância dos estudos da antropologia da religião
● Refletir sobre o sincretismo religioso no Brasil
● Conhecer as principais religiões de matriz africana que fazem parte da cultura brasileira
39
INTRODUÇÃO
BONS ESTUDOS!
Você já deve ter percebido que a cultura é algo muito importante para a compreen-
são dos grupos e povos de todo mundo. Ela nos ajuda a entender que cada pessoa sofrerá
influências diversas para a sua formação social e, assim, verá o mundo com perspectivas
que irão se modificar a partir do momento que seu contato com a realidade for permeado
por contatos e ações variadas.
Segundo Oliveira (2001), para conhecermos um determinado povo, devemos pres-
tar atenção aos elementos que os formam, representados pelos traços culturais; complexo
cultural; área cultural; padrão cultural; subcultura.
● Traços Culturais: são considerados os elementos mais simples de uma cultura
que só tem sentido e significado quando entendida dentro de uma cultura
específica. Ex.: adornos religiosos, uso das tecnologias culturais.
● Complexo Cultural: representado pela combinação de traços culturais que são
reproduzidos em uma atividade básica. Ex.: futebol, cujo traços culturais são a
bola, o campo, o juiz, a torcida, os jogadores, as comidas do estádio etc. Tudo
isso combinado torna-se um complexo de coisas. Por isso, muitos cronistas de
futebol gostam de repetir a frase: “Não é apenas futebol”.
● Área Cultural: trata-se da região geográfica em que o complexo cultural se
manifesta. Por isso, os indivíduos que vivem em determinadas áreas são seme-
lhantes entre si, seja física ou socialmente. Muitos afirmam que as pessoas que
Com toda certeza você já deve ter caminhado por sua cidade. Se você fez esse
tipo andança, deve ter reparado que a religião está presente em vários momentos. Seja por
meio das inúmeras igrejas existentes ou templos, mesquitas, terreiros e casas de orações.
Quando nos propomos a estudar Antropologia, o que vai nos acontecer é que
nosso olhar, até então bem restrito, vai começar a se desenvolver, no sentido de que é
preciso ver além para poder entender que somos diferentes e isso implica na maneira como
entendemos a fé e suas manifestações.
Como já sabemos, a convivência pacífica entre as culturas diferentes e as religiões
só é possível quando compreendemos que não existe algo nem melhor ou pior, maior
ou menor, superior ou inferior. Afinal, vivemos e proferimos nossas crenças de maneira
diferente e isso precisa ser respeitado.
As manifestações religiosas são um marco na formação humana. Desde sempre
estamos rodeados de símbolos que nos remetem alguma relação entre o eu e o sagrado.
Crucifixos, fitinhas amarradas no braço, livros sagrados, rituais de iniciação e conversão
que fazem sentido para quem os pratica e também aqueles que se propõem a aprender
sobre coisas que desconhecem.
Somente através de muita leitura e estudos somos capazes de não sermos pre-
conceituosos e promover uma sociedade mais harmônica. Capaz de conviver com as
diferenças entre as pessoas, suas crenças e manifestações religiosas.
4.1 Candomblé
A primeira coisa que você precisa saber sobre o candomblé é que ele não se trata
de um único culto religioso, mas sim de uma série de cultos que se parecem muito com
outras denominações religiosas. Assim, existem variados templos e vertentes dele que são
conhecidas como nações: efã, ijexá, nagô e mina-nagô, ela pertence ao tronco conhecido
como iorubá, com origens africanas localizadas em partes da Nigéria e do Benim. Existem
ainda candomblés de nações angola e jeje, entre outras menos conhecidas.
Você sabia que o nome candomblé está associado, de maneira histórica, aos
cultos da Bahia? Entretanto, outras religiões semelhantes recebem outras denominações
regionais, como xangô, em Pernambuco, tambor de mina, no Maranhão, e batuque, no
Rio Grande do Sul. Segundo o site do Museu Afro Brasileiro (2020), é possível entender
o termo candomblé simplesmente por representar um conjunto de cultos com o nome de
religião dos orixás, deixando de lado as diferenças entre eles.
Segundo os pesquisadores sobre religiões africanas e Orixás, existem mais de
400 divindades. Entretanto, no Brasil, o panteão de Orixás mais cultuados é composto por
cerca de 20 divindades. Sabemos que não são apenas esses, por isso a importância de não
generalizar, só demonstrar que esses são os mais conhecidos. Os mais conhecidos são:
Ogum, Oxumarê, Oxóssi, Iemanjá, Iansã ou Oyá, entre outros.
Características: os participantes de cada terreiro se dividem em uma hierarquia
organizada de acordo com o grau de proximidade do fiel com as divindades. Segundo o
candomblé, toda pessoa tem seu espírito ligado a um orixá específico – ou a um conjunto
de orixás, em alguns casos. Atribui-se ao indivíduo características de personalidade condi-
zentes com seu orixá patrono. Essa ligação pode ser estreitada por meio de uma complexa
série de rituais de iniciação, os mais simples dos quais são a lavagem do colar de contas e
o bori, cerimônia destinada a fortalecer o espírito do fiel e prepará-lo para o contato direto
com o orixá. Esses estágios iniciais podem ou não se desdobrar na iniciação completa, por
meio da qual o fiel, então chamado iaô ou filho-de-santo, torna-se um veículo de seu orixá
na terra.
4.2 Umbanda
Essa é uma palavra derivada do dialeto quimbundo e tem por significado “curan-
deirismo ou arte da cura”. Como já adiantei para você, ela é uma religião criada no Brasil,
em 1908, por Zélio Fernandino de Moraes, que passou a incorporar um espírito chamado
Caboclo das Sete Encruzilhadas. A partir daí ele começou a dar instruções de cura, dando
início à Umbanda. Trata-se de uma religião com a cara brasileira, misturando elementos
Você sabia que o candomblé começou a surgir no Brasil entre os séculos XVI e XIX, com
a chegada de escravos da África ocidental?
Apesar de a descoberta do país ter sido pelos portugueses, e por terem implementado a
religião cristã, os escravos conseguiram, de alguma forma, também manter a sua práti-
ca, mas com nem metade dos orixás que são venerados na África. Enquanto em terras
brasileiras são cultuados de 15 a 20, existem mais de 200 conhecidos pela África.
REFLITA
Acredito que você tenha aprendido muitas coisas novas com essa unidade, não é
mesmo? Bom, se isso ocorreu significa que você já abriu um pouco mais seu olhar sobre
a sociedade e entendido que somos seres humanos diferentes e, consequentemente, com
culturas diversas.
Nossas discussões começaram a partir dos conceitos de cultura material e imate-
rial. Vimos que uma cultura possui vários elementos que a formam e para poder preservá-la
até os dispositivos legais são utilizados. Assim, aprendemos sobre traços, área, complexo,
padrões culturais e também sobre patrimônio material e imaterial como parte fundamental
para a preservação de um povo e suas especificidades.
Para estudar as características da religião você foi apresentado a Antropologia da
Religião e há alguns importantes autores que nos auxiliaram a entender a importância das
representações simbólicas e da noção de dádiva.
Depois descobrimos o que determina que sejamos um país onde existe um forte
sincretismo religioso. Esse conceito revelou que, por conta da nossa formação, advinda do
invasor português, do indígena brasileiro e dos escravos africanos, nossas manifestações
religiosas são repletas de simbologias que foram sendo adaptadas para que todos pudes-
sem conviver com harmonia.
Por fim, aprendemos sobre as diferenças entre Candomblé e Umbanda. Enten-
demos que são religiões de matrizes africanas e que fazem parte do nosso cotidiano. No
caso do Candomblé, vimos que ele faz parte, hoje, de vários lugares no Brasil e aqui temos
20 Orixás como referência. Como já tínhamos ressaltado, muitas dessas entidades foram
personificadas nas imagens de santos católicos.
Em relação à Umbanda podemos compreender que se trata da única religião de
fato desenvolvida em solo brasileiro. Repleta de referências de várias outras religiões, ela
se caracteriza por todo esse sincretismo religioso, como também pelos atos de caridade
que pratica.
Espero que você tenha gostado das novas descobertas e, assim, possa se tornar
um educador capaz de respeitar as diferenças e não reproduzir ações discriminatórias e
preconceituosas.
Menina vítima de intolerância religiosa diz que vai ser difícil esquecer pedrada
Criança é do candomblé e foi agredida na saída do culto.
A marca da violência está na cabeça da menina de 11 anos que foi agredida no Su-
búrbio do Rio por intolerância religiosa, mas esta não é a maior cicatriz. “Achei que ia mor-
rer. Eu sei que vai ser difícil. Toda vez que eu fecho o olho eu vejo tudo de novo. Isso vai ser
difícil de tirar da memória”, afirmou Kailane Campos, que é candomblecista e foi apedrejada
na saída de um culto. Ela deu a declaração em entrevista ao RJTV desta terça-feira (16).
A garota foi agredida no último domingo (14) e, segundo a avó, que é mãe de santo,
todos estavam vestidos de branco, porque tinham acabado de sair do culto. Eles caminha-
vam para casa, na Vila da Penha, quando dois homens começaram a insultar o grupo. Um
deles jogou uma pedra, que bateu num poste e depois atingiu a menina.
“O que chamou a atenção foi que eles começaram a levantar a Bíblia e a chamar
todo mundo de ‘diabo’, ‘vai para o inferno’, ‘Jesus está voltando’”, afirmou a avó da menina,
Káthia Marinho.
Na delegacia, o caso foi registrado como preconceito de raça, cor, etnia ou religião e
também como lesão corporal, provocada por pedrada. Os agressores fugiram num ônibus
que passava pela Avenida Meriti, no mesmo bairro. A polícia, agora, busca imagens das
câmeras de segurança do veículo para tentar identificar os dois homens.
A avó da criança lançou uma campanha na internet e tirou fotos segurando um car-
taz com as frases: “Eu visto branco, branco da paz. Sou do candomblé, e você?”. A campa-
nha recebeu o apoio de amigos e pessoas que defendem a liberdade religiosa. Uma delas
escreveu: “Mãe Kátia, estamos juntos nessa”.
Iniciada no candomblé há mais de 30 anos, a avó da garota diz que nunca havia
passado por uma situação como essa.
Fonte: G1. Menina vítima de intolerância religiosa diz que vai ser difícil esquecer pedrada. 2015. Dis-
ponível em:
http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/2015/06/menina-vitima-de-intolerancia-religiosa-diz-que-vai-ser-difi-
cil-esquecer-pedrada.html. Acesso em: 25 ago. 2020.
LIVRO
• Título: Mitologia dos Orixás.
• Autor: Reginaldo Prandi
• Editora: Companhia das Letras
• Sinopse: Mitologia dos orixás, do sociólogo Reginaldo Prandi, é a
mais completa coleção de mitos da religião dos orixás já reunida em
todo o mundo. São 301 relatos mitológicos, histórias que contam,
por meio de imagens concretas e não de ideias abstratas, como
são, o que fazem, o que querem e o que prometem os deuses
desse riquíssimo panteão africano que sobreviveu e prosperou em
países da América – em particular no Brasil e em Cuba – e que
nos últimos anos tem sido exportado para a Europa. Na sociedade
tradicional dos iorubás, é pelo mito que se alcança o passado, se
interpreta o presente e se prediz o futuro. Cada mito, portanto, é
uma surpresa sempre renovada, um segredo revelado que jamais
se deixa desvendar completamente. Ao narrar episódios em que se
envolveram deuses como Exu, Ogum, Iemanjá e Iansã, Mitologia
dos orixás chama a nossa atenção para sentidos vitais profundos
e nos aproxima do vasto patrimônio cultural dos negros iorubás
ou nagôs. O livro é ricamente ilustrado, com fotos coloridas de
todos os orixás que se manifestam em cerimônias do candomblé
no Brasil e ilustrações do artista plástico Pedro Rafael.
FILME/VÍDEO
• Título: Besouro
• Ano: 2009
• Sinopse: No começo do século XX, apesar da escravidão já ter
acabado no Brasil há muitos anos, os negros ainda eram oprimidos
pelos brancos. Enquanto isso, no Recôncavo Baiano, o menino
Manoel Henrique aproveita sua infância para aprender uma tra-
dição afro-brasileira proibida na época, a capoeira. Junto com os
amigos Quero-Quero e Dinorá, o garoto toma aulas com o Mestre
Alípio, considerado o líder comunitário dos negros da região. Vinte
anos depois, Manoel já é conhecido por todos como Besouro, um
dos maiores capoeiristas da região. Assim como a maior parte dos
negros, ele trabalha nas fazendas de cana do Coronel Venâncio,
mas é o único que não se sente intimidado pelos poderosos. Certo
dia, quando Besouro se distrai, Mestre Alípio é assassinado, como
forma de diminuir a voz dos negros. Se sentindo culpado e tendo
a missão de dar continuidade ao trabalho de seu mestre, o aluno
se isola para aperfeiçoar suas técnicas. Depois de ser abençoado
pelos orixás, Besouro fica com o corpo fechado e aos poucos volta
para lutar pelos direitos dos negros. Desafiando as autoridades,
o capoeirista ainda se mantém a distância, o que faz sua fama
crescer ainda mais. Em pouco tempo, todos comentam os seus
feitos, e se começa a falar que ele tem poderes especiais e até
mesmo pode voar. A presença de Besouro faz com que os negros
se sintam mais confiantes para lutar pela liberdade e, com isto, os
poderosos tentam de tudo para matar seu adversário. Baseado
na história real de Manoel Henrique Pereira, Besouro é o primeiro
trabalho como cineasta do publicitário João Daniel Tikhomiroff.
Plano de Estudo:
● Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa, por Paulo
Freire.
● Lugar de Fala, por Djamila Ribeiro.
● O que é empoderamento? Por Joice Berth
● Educar para uma sociedade Antirracista.
Objetivos de Aprendizagem:
● Refletir sobre uma prática pedagógica docente que seja libertadora, humanizada e
conscientizadora.
● Compreender o que significa o conceito de Lugar de fala.
● Entender a importância do empoderamento social, econômico, político e cultural dos
grupos minoritários.
● Pensar como desenvolver uma ação Antirracista que se construa e se perpetue dentro
e fora do ambiente escolar.
58
INTRODUÇÃO
Você já deve ter ouvido falar do grande educador brasileiro Paulo Freire, não é
mesmo? Ele é uma referência em vários países e universidades do mundo todo. É tão
importante que se tornou tema de um curso em uma das maiores universidades do Estados
Unidos.
Como educador, Paulo Freire defendia uma prática pedagógica que pudesse liber-
tar as pessoas, a partir da problematização e da palavra geradora. Consciente do grande
número de analfabetos em nossa sociedade, Freire criou uma pedagogia capaz de educar
com o aluno e não apenas para ele. Assim, seria possível conhecer as demandas reais para
o seu ensino-aprendizagem.
Diante de uma sociedade totalmente desigual, esse educador acreditava que a
educação deveria ser libertadora e não bancária. O conceito de educação bancária remete
a ideia de que os professores seriam os detentores do saber e poderiam fazer depósitos
de conhecimento nos alunos que jamais o questionariam, mantendo-o como o detentor
absoluto do saber.
Para Freire essa era uma ideia absurda e que deveria ser abandonada pelos
professores e professoras, que deveriam promover uma prática educativa transformadora.
Uma pedagogia que fosse fundada na ética, no respeito à dignidade, à diversidade e na
própria autonomia do educando.
Você já deve ter percebido que nos últimos anos tem-se acirrado a luta contra
vários tipos de preconceitos, não é mesmo? Casos de racismo, homofobia, machismo e
sexismo são constantes em nossa sociedade. Para alguns, isso é normal e são considera-
das práticas sociais aceitáveis. Mas, nada é normal ou natural.
Os comportamentos sociais são muito influenciados pela cultura. A expressão “na
minha época não era assim”, permite compreender exatamente como as pessoas desejam
manter o mundo. Para uma minoria, a sociedade é pensada por meio de inúmeros privilé-
gios, que são realmente para poucos.
Quais são os privilégios que você possui? É homem? Branco? Heterossexual?
Cristão? Mulher? Branca? Heterossexual? Ou você acha que nada disso influi em seu
dia a dia? Pois bem, quando somos privilegiados, dificilmente queremos pensar sobre o
outro. Essa é a razão para que muitas lutas e reivindicações sejam chamadas de “mimimi”.
Expressão usadas por aqueles que não conseguem admitir que nossa sociedade é desi-
gual ou que, de alguma maneira, sente que seus privilégios serão retirados, divididos e
repartidos com o outro, que lhes parece tão inferior.
Vivemos em uma sociedade desigual. Em que a relação entre eu e outro se esta-
belece das mais diferentes formas. Assim, as diferenças culturais e sociais estão sempre
nos permitindo entender como o próprio meio social se constrói, determinando quem tem
ou não direitos ou deveres.
Diante de uma sociedade tão diversa e com muitos casos de preconceito e discrimi-
nação, faz-se necessário aprender que ser fora do que é chamado de padrão por um grupo
social, não é nenhum problema. O problema maior é impedir que as pessoas possam viver,
pensar, agir e se comportar da maneira como acharem pertinente. Sem interferir na ação
do outro, com respeito e tendo assegurados seus direitos e deveres.
O conceito lugar de fala que vimos anteriormente tem sido muito usado para dar
voz aqueles que sempre estiveram na margem social, seja pela sua raça, crença religiosa,
orientação sexual ou gênero. Poder falar e ser ouvido é também um ato de existir.
Outra ideia que tem sido muito difundida também é a de empoderamento. Você
saberia me dizer o que isso significa? Para Joice Berth (2018, p. 14), “o empoderamento é
um instrumento de emancipação política e social” que não propõe criar relações que sejam
paternalistas ou assistencialistas e nem muito menos tratar todas as pessoas da mesma
maneira, sem respeitar suas diferenças.
Dar poder é permitir com que cada indivíduo, por meio de uma consciência co-
letiva, possa se afirmar como queira, por meio da autoafirmação, autorreconhecimento,
autovalorização e autoconhecimento de si mesmo, que o ajude a conhecer a sua própria
história, entendendo sua condição social e política. Promovendo uma autoaceitação de
suas características tanto estéticas quanto culturais.
Você consegue imaginar por que essas dimensões são importantes para as mulhe-
res? É que, infelizmente, vivemos em um país em que o índice de crimes e violências contra
mulheres ainda é muito grande. E o mais assustador é que eles ocorrem, muitas vezes,
dentro de casa, o que dificulta a independência feminina. Por isso, uma mulher empoderada
é aquela que pode se proteger desses abusos e se manter na sociedade com voz ativa.
Você já deve ter reparado que essa disciplina é marcada pela ideia do respeito e
da mudança de atitude. A coisa mais difícil para mudar em uma sociedade é, justamente,
a cultura. E sabe por que isso ocorre? Porque somos acostumados a sermos apenas de
um único jeito. Porém, você já deve ter entendido que vivendo com pessoas tão diversas
é impossível não mudar. Aqueles que escolhem evitar a mudança, continuam no mundo,
muitas vezes, cheios de preconceitos e avessos à diversidade.
Caso você já atue em sala de aula, já percebeu o quanto aquele é um espaço da
diversidade... Pois bem, o que fazer com tantas demandas e pessoas diferentes? Se você
ainda não está na sala de aula, faça uma reflexão de como foi sua vivência escolar. Com
toda certeza perceberá que não existe um espaço mais variado de pessoas, estilos, modos
de agir e de pensar diferenciado.
Por essa razão, o término da disciplina de Antropologia Cultural não poderia ser
de outro jeito. Já que você aprendeu sobre o conceito de cultura, a relação com outro,
identidade, crenças e representações religiosas estigmatizadas. Nada mais correto do que
refletirmos sobre a nossa atuação como professores, não é mesmo?
Diante de tanta diversidade social e cultural, qual o melhor caminho para seguimos?
Vimos com Paulo Freire, no início da unidade, que ser professor ou professora possui vá-
rias exigências, em especial, a capacidade de escutar e dialogar. Isso implica em entender
Para Ribeiro (2019), ao se perceber criticamente, você deverá ter uma outra pos-
tura frente a uma sociedade opressora que não promove o respeito. É preciso entender
sobre privilégios e lutar para que eles não sejam para poucos. Se faz necessário querer
aprender sempre: “Pessoas brancas devem se responsabilizar criticamente pelo sistema
de opressão que as privilegia historicamente, produzindo desigualdades, e pessoas negras
podem se conscientizar dos processos históricos para não reproduzi-los” (RIBEIRO, 2019,
p. 108).
Então, será que você está pronto(a) para ser um(a) professor(a) ou um(a) profes-
sor(a) antirracista?
REFLITA
Leia o conto abaixo e reflita sobre como o racismo faz parte da estrutura social do cotidiano.
Espiral
Geovani Martins – Livro: O sol na cabeça.
Começou muito cedo. Eu não entendia. Quando passei a voltar sozinho da escola, percebi
esses movimentos. Primeiro com os moleques do colégio particular que ficava na esqui-
na da rua da minha escola, eles tremiam quando meu bonde passava. Era estranho, até
engraçado, porque meus amigos e eu, na nossa própria escola, não metíamos medo em
ninguém. Muito pelo contrário, vivíamos fugindo dos moleques maiores, mais fortes, mais
corajosos e violentos. Andando pelas ruas da Gávea, com meu uniforme escolar, me sentia
um desses moleques que me intimidavam na sala de aula. Principalmente quando passava
na frente do colégio particular, ou quando uma velha segurava a bolsa e atravessava a rua
pra não topar comigo. Tinha vezes, naquela época, que eu gostava dessa sensação. Mas,
como já disse, eu não entendia nada do que estava acontecendo. As pessoas costumam
dizer que morar numa favela de Zona Sul é privilégio, se compararmos a outras favelas na
Zona Norte, Oeste, Baixada.
De certa forma, entendo esse pensamento, acredito que tenha sentido. O que pouco
se fala é que, diferente das outras favelas, o abismo que marca a fronteira entre o morro e
o asfalto na Zona Sul é muito mais profundo. É foda sair do beco, dividindo com canos e
mais canos o espaço da escada, atravessar as valas abertas, encarar os olhares dos ratos,
desviar a cabeça dos fios de energia elétrica, ver seus amigos de infância portando armas
de guerra, pra depois de quinze minutos estar de frente pra um condomínio, com plantas
ornamentais enfeitando o caminho das grades, e então assistir adolescentes fazendo aulas
particulares de tênis. É tudo muito próximo e muito distante.
E, quanto mais crescemos, maiores se tornam os muros. Nunca esquecerei da mi-
nha primeira perseguição. Tudo começou do jeito que eu mais detestava: quando eu, de tão
distraído, me assustava com o susto da pessoa e, quando via, era eu o motivo, a ameaça.
Prendi a respiração, o choro, me segurei, mais de uma vez, pra não xingar a velha que
visivelmente se incomodava de dividir comigo, e só comigo, o ponto de ônibus. No entanto,
dessa vez, ao invés de sair de perto, como sempre fazia, me aproximei. Ela tentava olhar
pra trás sem mostrar que estava olhando, eu ia chegando mais perto. Ela começou a olhar
em volta, buscando ajuda, suplicando com os olhos, daí então colei junto dela, mirando di-
retamente a bolsa, fingindo que estava interessado no que pudesse ter ali dentro, tentando
parecer capaz de fazer qualquer coisa pra conseguir o que queria. Ela saiu andando pra
longe do ponto, o passo era lento.
Eu a observava se afastar de mim. Não entendia bem o que sentia. Foi quando, sem
LIVRO
• Título: Ensinando a transgredir: A educação como prática de
liberdade.
• Autora: bell hooks
• Editora: WMF Martins Fonte
• Ano: 2017
• Sinopse: Em Ensinando a transgredir, bell hooks – escritora,
professora e intelectual negra insurgente – escreve sobre um novo
tipo de educação, a educação como prática da liberdade. Para
hooks, ensinar os alunos a “transgredir” as fronteiras raciais, se-
xuais e de classe a fim de alcançar o dom da liberdade é o objetivo
mais importante do professor. Ensinando a transgredir, repleto
de paixão e política, associa um conhecimento prático da sala de
aula com uma conexão profunda com o mundo das emoções e
sentimentos. É um dos raros livros sobre professores e alunos que
ousa levantar questões críticas sobre Eros e a raiva, o sofrimento
e a reconciliação e o futuro do próprio ensino. Segundo bell hooks,
“a educação como prática da liberdade é um jeito de ensinar que
qualquer um pode aprender”. Ensinando a transgredir registra a
luta de uma talentosa professora para fazer a sala de aula dar
certo.
FILME/VÍDEO
• Título: Menino 23
• Ano: 2016
• Sinopse: Em 1998, o historiador Sydney Aguilar ensinava sobre
nazismo alemão para uma turma de ensino médio, quando uma
aluna mencionou que havia centenas de tijolos na fazenda de
sua família estampados com a suástica, o símbolo nazista. Essa
informação despertou a curiosidade de Sidney e desencadeou
sua pesquisa. Pouco a pouco, o filme mostra como o historiador
avançou com a sua investigação, revelando que, além de fatos,
ele também descobriu vítimas. Sidney mostrou que empresários
ligados ao pensamento eugenista (integralistas e nazistas) re-
moveram 50 meninos órfãos do Rio de Janeiro para Campina do
Monte Alegre/SP para 10 anos de escravidão e isolamento na Fa-
zenda Santa Albertina de Osvaldo Rocha Miranda. O trabalho de
Sidney vai reconstituir laços estreitos entre as elites brasileiras e
crenças nazistas, refletidos em um projeto eugênico implementado
no Brasil. Aloísio Silva, um dos sobreviventes, lembra a terrível
experiência que escravizou os meninos ao ponto de privá-los do
uso de seus nomes, transformando-o no “23”. Sidney e outros
historiadores e especialistas irão delinear os contextos históricos,
políticos e sociais do Brasil durante os anos 20 e 30, explicando
como um caldeirão étnico, como o Brasil, absorveu e aceitou as
teorias de eugenia e pureza racial, a ponto de incluí-los em sua
Constituição de 1934. A investigação culmina com a descoberta
de Argemiro, outro sobrevivente do projeto nazista da Cruzeiro do
Sul. Sua trajetória reforça ainda mais como os conceitos de “supre-
macia branca” e as tentativas de “branqueamento da população”
marcaram nossa sociedade, deixando sequelas devastadoras até
os dias de hoje. Sendo o racismo e – mais ainda – a negação dele,
as mais permanentes.
• Link do vídeo: https://www.youtube.com/watch?v=rYSspBodYSQ
BRASIL. Decreto nº 3.551, de 4 de agosto de 2000. Institui o Registro de Bens Culturais de Natu-
reza Imaterial que constituem patrimônio cultural brasileiro, cria o Programa Nacional do Patrimônio
Imaterial e dá outras providências. Brasília, 2000. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/cci-
vil_03/decreto/d3551.htm. Acesso em: 28 ago.2020.
EXAME. IBGE: População negra é principal vítima de homicídio no Brasil. 2019. Disponível em:
https://exame.com/brasil/ibge-populacao-negra-e-principal-vitima-de-homicidio-no-brasil/. Acesso
em: 28 ago. 2020.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz
& Terra, 2017.
MÍDIA NINJA. Numa sociedade racista, não basta não ser racista, é necessário ser antirra-
cista. 2018. Disponível em: https://www.facebook.com/MidiaNINJA/photos/numa-sociedade-ra-
cista-n%C3%A3o-basta-n%C3%A3o-ser-racista-%C3%A9-necess%C3%A1rio-ser-antirracista-
-n/1340647316093410/. Acesso em: 28 ago. 2020.
RIBEIRO, D. Pequeno Manual Antirracista. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
RIBERIO, D. O povo brasileiro: a formação e o sentido do Brasil. São Paulo: Companhia das Le-
tras, 1995.
WE MYSTIC. 5 coisas que você precisa saber sobre o Candomblé. 2020. Disponível em: https://
www.wemystic.com.br/curiosidades-candomble/. Acesso em: 24 ago. 2020.
Estudar e estar disposto a conhecer o novo é realmente gratificante, você não acha?
Isso é perceptível quando, ao finalizarmos uma etapa de aprendizado, somos capazes de
pensar o quanto nos modificamos. Você esteve em contato com uma disciplina que entende
o homem como um ser completo, que discute um conceito muito repetido no cotidiano e, na
maioria das vezes, nem refletimos o quanto somos influenciados por nossa cultura.
A cultura, como vimos na Unidade I, pode ser entendida como uma teia de sentido
e de significado, em que pessoas e grupos sociais se identificam e se reconhecem como
pertencentes. Ela não é simplesmente os hábitos e os costumes, mas sim como, a partir de-
les, nossas ações são moldadas e motivadas em sociedade. Aprendemos ainda que quem
estuda a cultura são os antropólogos, por meio de uma ciência chamada de Antropologia.
Vimos que, a princípio, se defendia que cabia a essa ciência o estudo do primitivo
e do selvagem. Porém, compreendeu-se, com o tempo, que a cultura se manifesta em dife-
rentes grupos sociais e, por isso, precisa ser entendida, interpretada e descrita de maneira
densa. O trabalho do antropólogo se constitui em olhar, ouvir e escrever.
Esse trabalho é muito importante para entendermos que não existe alguém ou
alguma nação que seja melhor ou pior, superior ou inferior, boa ou ruim em relação a outra.
O que existe são culturas diferentes. Assim, na Unidade II discutimos sobre a necessidade
de respeitar o outro. Isso só é possível quando respeitamos a diferença e somos incapazes
de cometer atitudes etnocêntricas. O oposto desse tipo de ação é marcado pelo relativismo
cultural, em que somos capazes de observar, compreender e respeitar o outro como ele é.
Cada pessoa e grupo social tem o direito de ser o que deseja. Deve ser garanti-
do o seu direito de não seguir regras ou padrões que não fazem parte da sua formação
identitária. Vimos que aqueles que não seguem as normas estabelecidas por outrem são
chamados de Outsiders. Infelizmente, alguns sujeitos sociais acreditam que todos devemos
ser iguais, esquecendo que a identidade pode ser entendida como algo fluído e variado.
Assim, ao adentrarmos nas discussões da Unidade III, somos convidados a colocar
nossos velhos saberes e conhecimentos de lado e a olharmos o mundo com novas possi-
bilidades. Debatemos sobre a Antropologia da religião e como essa ciência atuou para a
compreensão das religiões de matriz africana. Descobrimos que, por exemplo, a Umbanda