Você está na página 1de 20

Direito Penal – noção formal e âmbito

O direito penal caracteriza-se por ser um conjunto de normas que considera certos comportamentos como
crime e lhes atribui uma determinada consequência: pena ou medida de segurança. Crime é aquilo que está
previsto na lei como tal. As penas e as medidas de segurança são coisas distintas.

Pena e medida de segurança


A pena pressupõe uma censura, aquilo a que se chama de forma não técnica, um castigo. Assenta sobretudo
na responsabilização dos comportamentos que adotamos. O que legitima esta censura pelo direito penal,
através dos tribunais, é o facto de esse comportamento resultar de uma decisão, opção, de uma pessoa livre
– que não está viciada. Quem aplica esta censura num estado de direito, como o nosso, são os cidadãos
através dos órgãos competentes, os tribunais - emitem o juízo de censura em nome da comunidade, artigo
202º CRP. Esta censura tem de ser legítima: não se pode censurar algo que qualquer cidadão normalmente
fiel ao direito, naquela mesma situação tivesse a mesma atuação, cometendo crime. Por outro lado, se a
decisão for livre e havendo culpa, o tribunal pode apresentar o juízo de culpa (a censura) com a
correspondente pena. Portanto, se não houve liberdade de decisão a pessoa não será punida pelo crime
doloso.

Isto porque existem situações que não têm a ver com a própria pessoa; situações em que a pessoa não é
livre na sua decisão, mas que resulta do facto do sujeito sofrer de anomalia psíquica, por exemplo, o que lhe
retira a liberdade de decisão e por isso essas pessoas não podem ser censuradas – os chamados inimputáveis,
reconhecido pela medicina médica. É daqui que surge a medida de segurança, pois o crime, advindo dessa
anomalia, além de tornar a pessoa perigosa para a sociedade, tem probabilidade de se repetir enquanto a
pessoa não estiver curada e não podendo ser punida não pode deixar de se reagir. Esta solução existe para
acautelar tanto a liberdade de decisão da pessoa como o direito à segurança (artigo 27 CRP). Estas medidas
de segurança restringem direitos e liberdades do inimputável, mas não são punitivas. Servem, então, para
retirar a pessoa da vida social devido ao facto de esta ser perigosa, devido à sua falta de liberdade consciente
de decisão – segregação do inimputável. Não se fica, porém, por aqui, dando abertura para que se possa
controlar a anomalia e libertar-se essa pessoa, quando esta não represente mais um perigo.

Quando se fala de inimputável e imputável falamos da possibilidade de imputar culpa, ou não, quando
cometido um crime. Imputa-se culpa a quem tem liberdade de decisão e é inimputável de culpa aquele que
não tem liberdade de decisão, por anomalia psíquica. A inimputabilidade de culpa pode ser momentânea
por força de pressão psicológica do facto – quando se atenta contra a sua vida por exemplo. São
inimputáveis, também, aqueles pela razão da idade (menos de dezasseis anos) e por falta de maturidade.
Nestes casos, antes dos dezasseis anos, a medida de segurança dá-se pelo nome de medida tutelar
educativa; esta diferença dá-se, pois, a criança não vai propriamente ser curada de uma anomalia psíquica,
mas a terapia dar-se-á pela educação, de forma a evoluir a maturidade.

1
Teoria da Lei Penal
Âmbito de direito penal – vários ramos de direito penal
1. Sentido amplo: abrange-se mais que o direito penal substantivo. Abrangemos, portanto:
• Substantivo
• Adjetivo: direito processual penal
• Executivo: direito de execução das penas e das medidas de segurança
2. Sentido restrito: refere-se apenas o direito penal substantivo
• Clássico: o que é o direito penal em termos de lei, ou seja, são os crimes que estão previstos
no código penal
• Secundário: a legislação avulsa em vários diplomas

Por vezes falamos do direito penal em termos materiais, referente ao bem jurídico protegido pelo direito
penal. Advém dos primórdios do direito penal - clássico - onde se começou a procurar que se restringisse o
menos possível outras figuras jurídicas, acompanhando a visão liberal iluminista da época. Assim, o direito
só pode atuar quando estamos perante um facto que ofenda outro direito fundamental, direitos subjetivos
individuais, sendo a sanção penal defensora dos direitos fundamentais de outrem, mas também que restrinja
o mínimo possível os direitos fundamentais do criminoso. Temos assim uma balança com direitos
fundamentais, por um lado com os direitos fundamentais dos cidadãos, que não podem ser violados,
podendo recair num crime, mas por outro os direitos fundamentais do criminoso ou suspeito de tal, que
devem ser o mínimo restringidos. Temos assim direito penal mínimo neste sentido, aquele que resulta ainda
da nossa atual constituição, no artigo 18º.

No século XIX passou a designar-se os bens materiais de bens jurídico-penais, visto o direito penal proteger
bens jurídicos individuais e pessoais (personalistas), acompanhando a visão mais social da época. Quando se
atenta contra a propriedade, pessoa, etc, temos duas dimensões jurídicas que reagem: o direito civil e o
direito penal; o direito civil tutela o titular do direito, tendo direito à responsabilidade civil, tutelando os
direitos subjetivos e protegendo-os (inclui o direito de indeminização por exemplo), enquanto o direito penal
surge como interesse do estado e da comunidade em geral em que se tutela também a propriedade (por
exemplo) mas não na dimensão individual, mas sim o valor propriedade enquanto valor fundamental e
enquanto valor que estrutura a nossa sociedade (todos nós ficamos desconfortáveis quando há uma onda
de assaltos, mesmo que não sejamos diretamente afetados). E por isso falamos de bens jurídicos individuais,
que no fundo são valores que têm a sua base em valores jurídicos pessoais e direitos subjetivos individuais.
Assim o direito penal clássico em sentido material tem por base a pessoa humana e os seus valores de modo
a proteger toda a comunidade face a ofensas a esses bens jurídicos (exemplo do direito à segurança).

O século XX trouxe grandes alterações ideológicas rumo ao estado social e a vida tornou-se mais complexa
o que fez suscitar bens jurídicos coletivos supra-individuais, não referentes à pessoa individual, tutelando-
se a pessoa em último caso - por exemplo crimes contra o ambiente ou economia. Criminalizam-se estes de
modo a defender a qualidade de vida das pessoas, protegendo os bens jurídicos coletivos. Se os crimes
contra a economia degradarem esta, reflexamente as pessoas vão acabar por perder qualidade de vida, e aí
temos o ponto liberal, pois o fim é sempre proteger o indivíduo. Como outro exemplo, os crimes contra
animais de companhia foram criados com o fim último de proteger os donos dos próprios animais, não
perdendo assim o referente liberal.

2
Teoria da Lei Penal
Assim, o direito penal clássico protege bens jurídicos individuais, enquanto o direito penal secundário, mais
recente, mais correspondente ao estado social, protege bens jurídicos coletivos. Protege, portanto, os bens
jurídicos coletivos supra-individuais, pois apesar de serem coletivos está sempre a ser protegido o indivíduo.
Em suma, chama-se secundário não tanto por estar em legislação avulsa, mas por proteger os bens jurídicos
supra-individuais (por exemplo, crimes ambientais, que formalmente fazem parte do direito penal clássico,
mas que materialmente fazem parte do direito penal clássico).

Localização do direito penal no sistema jurídico – enquadramento do direito penal


Direito penal interestadual vs Direito Internacional Penal

No primeiro caso, Direito penal que se aplica no nosso país e que tem como origem fontes nacionais – CRP,
Código Penal (direito penal clássico no sentido formal) e legislação avulsa (direito penal secundário no
sentido formal). Em termos constitucionais o direito penal está mais ligado aos direitos fundamentais de
primeira geração, protegendo os bens jurídicos mais importantes.

O direito intraestadual é aquele cujas fontes são nacionais e não somente aquele que vigora no nosso país,
visto o direito penal internacional penal vigorar também no nosso ordenamento através de convenções e
tratados internacionais – não é nada mais que DIP referente a direito penal.

Fontes nacionais:

São direitos fundamentais que devem ser protegidos ao máximo, mas também que, por outro lado, devem
ser ao mínimo restringidos (a balança falada) – referente à CRP. Normas que estabelecem limites jurídicos
ao poder político

• Artigo 24º CRP, direito à vida: neste artigo inclui-se nos direitos, liberdades e garantias, de vocação
liberal e de primeira geração. É o direito mais importante. Não é absoluto pois pode ser restringido
em casos muito excecionais – crimes por ação ou omissão: matar alguém em legitima defesa por
exemplo, pois matar alguém é crime, porém em legitima defesa é lícito; em conflito de deveres, o
médico em serviço no hospital, se não auxiliar uma pessoa em perigo de vida e essa pessoa morrer,
comete um homicídio por omissão, porém se não houver possibilidade física de ajudar 2 pessoas em
perigo de vida, é legitima a escolha de apenas salvar uma. O legislador reconhece a relatividade do
nº 1 deste artigo e por isso resguarda-se e impõe limites ao direito penal proibindo a pena de morte.
Em suma, é necessário punir quem atenta contra a vida humana, porém, nesta relação de equilíbrio,
não se inclui a pena contra a vida na punição.
• Artigo 25º CRP, integridade pessoal: inclui a integridade moral e física das pessoas. A última pode
variar conforme gravidade. Uma ofensa à integridade física pode afetar também a integridade moral.
Estes dois artigos (24º e 25º) são o núcleo essencial da dignidade humana: a vida e a integridade
dessa, sobretudo no sentido que as pessoas têm direito a sua integridade pessoal e livre
desenvolvimento de personalidade. O próprio direito penal não pode aplicar penas cruéis,
degradantes ou desumanas em violação da integridade pessoal.
• Artigo 27º CRP, direito à liberdade e à segurança: para termos ao mesmo tempo liberdade e
segurança é necessário que nenhum deles seja absoluto, pois para termos segurança o estado tem
de ter o poder de restringir em parte a liberdade. Com total liberdade as pessoas, à partida, entrarão

3
Teoria da Lei Penal
em guerra constante uns contra os outros. O nº 2 deste artigo legitima o direito penal, um direito
que tenha como uma das funções a pena privativa de liberdade, nas exceções previstas neste artigo.
Também durante um processo penal é possível restringir a liberdade, em plena presunção de
inocência, segundo o nº 3 do mesmo artigo.
• Artigo 29 CRP: aplicação da lei criminal, princípio da legalidade. Significa que os cidadãos devem ter
garantia de poder conhecer quais os factos que a lei considera crime e os que ficam fora desse
conceito para que dada essa possibilidade possam os tribunais aplicar uma sanção criminal de forma
“limpa” de modo que censurem comportamentos considerados crime e que o cidadão teve
oportunidade de conhecer, advindo do preceito do nº 1 “ninguém pode ser sentenciado
criminalmente senão em virtude de lei anterior (…) nem sofrer medida de segurança cujos
pressupostos não estejam fixados em lei anterior”. Além disto é proibida a retroatividade. O nº 3
reforça a retroatividade. o nº 4 estabelece limites. Deve se aplicar retroativamente leis que sejam
beneficiárias ao cidadão, ou seja, se uma lei posterior tiver uma pena mais favorável a um crime
anterior a essa, quando julgado deve ser aplicada a mais favorável retroativamente. O nº 5 estabelece
o princípio do ne bis indivel, ou seja, ninguém poder ser julgado mais do que uma vez pelo mesmo
crime de forma que ninguém seja reprovado mais que uma vez pelo mesmo crime, pois se um
segundo julgamento for mais favorável pode ocorrer.
• Artigo 30º CRP: limites das penas e medidas de segurança. Proibição da privação da liberdade com
caráter perpétuo, proibindo penas perpétuas, mas também a acumulação de penas que privassem
perpetuamente o cidadão da liberdade. Porém segundo o nº 2 e em termos dos inimputáveis e caso
estes não sejam recuperáveis, as medidas de segurança poderão ser sucessivamente prorrogadas por
meio judicial indefinidamente. Se a pessoa não for nunca mais curada nem controlada pode levar a
que a constituição não pudesse estabelecer um limite caso contrário o estado seria obrigado a
libertar alguém perigoso para a sociedade. No nº 3 estabelece-se o princípio da intransmissibilidade
das penas. O nº 4 e 5 estabelece que um cidadão nunca pode ser privado de qualquer direito por via
da pena.

Também o código penal é uma fonte nacional, partido em dois livros, um de parte geral com normas que se
aplicam a todos os crimes, e uma parte especial dos crimes específicos. Por fim temos ainda a legislação
penal avulsa (onde têm crimes como os económicos etc), à qual se aplicam também as normas da parte geral
do código penal, a não ser que essa legislação avulsa tenha alguma norma em contrário.

Direito penal relativamente ao direito civil (responsabilidade) – artigos 483 CC e ss

Muitos comportamentos considerados crimes pelo direito penal geram também responsabilidade civil, pois
muitas vezes ofendem-se bens jurídicos que são também ofensas de direitos subjetivos, por exemplo.

Um crime contra a nossa propriedade, como um furto, gera um crime e sanção por parte do direito penal,
porém gera também responsabilidade civil de forma a proteger os interesses subjetivos do cidadão furtado.
Quando a pessoa lesada reage contra aquele que o lesa, o direito civil tutela o direito civil da pessoa, o
interesse civil, enquanto o direito penal reage ao mesmo comportamento, não para ressarcir o lesado nem
tutelar o interesse deste, mas tutelar o interesse do estado e da comunidade, os bens jurídicos da
comunidade.

4
Teoria da Lei Penal
Direito administrativo sancionatório

E o direito de mera ordenação social – DL 433/82. São normas próximas do direito penal, vinculadas a
similares princípios constitucionais, mas com a diferença que este apenas tutela a mera ordem judicial não
protegendo bens jurídicos em primeira instância – como o código da estrada. A proteção dos bens jurídicos
e muito indireta pois se proibimos passar no vermelho procuramos proteger em última instância a vida dos
outros, mas somos sancionados mesmo quando ao não cumprir a regra não colocamos em risco ninguém,
sendo a proteção da vida uma última instância, assim dizendo. Não impede que alguns destes também não
sejam sancionados criminalmente.

Legitimação e finalidades da pena


Saber qual a razão para que se possa aplicar penas e quem decide essa razão. Essa legitimidade é dos
cidadãos e foram eles que decidiram dessa finalidade – através do contrato social.

Quais as grandes teorias/modelos?


Teorias absolutas
Segundo estas, a punição não tem propriamente uma finalidade útil, apenas se pretende fazer justiça. Não
se pretende diminuir a criminalidade por exemplo, apenas procura a justiça mesmo que a mensagem da
mesma não tenha a ver com a diminuição do crime – apenas pune. Têm uma ideia de castigo pelo facto
passado, não perspetivando o futuro nem efeitos da pena nesse tempo.

As teorias absolutas transmitem uma ideia de retribuição do mal que o criminoso cometeu, e a melhor
forma de retribuir o mal é fazer-lhe algo o mais próximo do facto que a pessoa cometeu – se matou será
condenado à morte. Por outro lado, pode retribuir-se o mal conforme a culpa da pessoa em ter cometido o
facto e não apenas o mal cometido, dando importância a certos parâmetros.

• Retribuição do facto
A lei de talião advém da bíblia e transmite a ideia de retaliação, a ideia de “olho por olho, dente por dente”,
fazendo exatamente o mesmo mal a quem o fez. Procura-se a retaliação do facto, não dando importância
ao contexto em que o crime foi cometido, à liberdade de escolha do momento, os motivos e as intenções
focando-se apenas no facto cometido.

• Retribuição da culpa
Por outro lado, temos a retribuição da culpa, uma ideia mais moderna, com origem já no novo testamento,
com apoio do liberalismo alemão (Kant e Engel). O facto praticado tem relevância, sendo mais ou menos
grave, mas a proporcionalidade do mal não é em relação ao facto cometido apenas, mas no grau de culpa
do facto cometido. O grau de culpa calcula-se com base no livre-arbítrio, ou seja, com base na livre decisão
do Homem, analisando o contexto da prática de cada crime sobretudo com base em dois aspetos: as
circunstâncias que levam a pessoa a cometer o crime e a saúde mental dessa pessoa (aqueles que sofrem
de anomalias e aqueles que pela idade não tem maturidade para ser detentores da totalidade do livre-
arbítrio).
5
Teoria da Lei Penal
A culpa, assim, pode ser graduada conforme o contexto, não tirando relevância também à gravidade do
crime – se ambos têm total liberdade e um comete um furto e outro um homicídio, a gravidade do crime
aumenta a culpa, que parte do grau da ilicitude do facto. A culpa pode ser totalmente excluída se for um
menor, se sofrer de anomalias – inimputável -, ou se for cometido num contexto que retire a liberdade de
decisão face aquele facto. A liberdade de decisão é a liberdade que a pessoa tinha para não cometer o crime.

Críticas:

Retribuição do facto

É criticável quando se punem as pessoas de forma igual pelo mesmo facto, deixando de lado o merecimento
da pena. Além disso não se distingue aqueles que sendo imputáveis não tiveram capacidade de decisão
naquele momento. Visto procurar-se a justiça parece algo injusto.

Retribuição da culpa

A retribuição da culpa mede-se pela liberdade de decisão, porém os fins não são úteis à sociedade. Punir
apenas por razões de justiça é uma ideia meramente metafísica e se o direito penal for laico, punir apenas
com base numa entidade perfeita, Deus, é vago, e gera hipocrisia, havendo necessidade de deixar o ideal
religioso e concentrar-se na justiça humana, tendo esta de ser útil aos cidadãos. O que a retribuição da culpa
pretende é a diminuição do crime e via esta teoria isso não acontece.

Teorias relativas
Vocacionadas para a diminuição da criminalidade. Procuram uma influência para o futuro, apesar de se
estar a punir um facto passado. São essencialmente orientadas para a prevenção do crime. É influenciada
pela ideia liberal contratualista, em que os cidadãos delegam parte da sua soberania ao estado em troca de
segurança. Desta maneira, o contrato social é a única forma legítima de restringir liberdades individuais.

• Prevenção geral
A prevenção geral significa que a pena quando aplicada a determinada pessoa tenha um efeito mensagem,
dissuasora do crime em relação aos cidadãos em geral – ideia utilitarista da pena com vista a reduzir a prática
do crime.

Prevenção geral negativa

Segundo a prevenção geral negativa, as penas devem ser o mínimo necessário, mas o suficiente para
amedrontar os cidadãos de modo que o mesmo crime não seja praticado

Beccaria defende penas iguais para todos de modo que qualquer cidadão vendo outro a cumprir pena pelo
crime não o cometerá por medo. O medo de sofrer a pena, apesar do mínimo possível para amedrontar, é
dissuasor. Pretende-se assim que a pena tenha um efeito de dissuasão geral através do medo.

A teoria da coação psicológica de Feuerbach, no mesmo sentido da prevenção geral negativa, considera que
a pena serve de coação psicológica sobre as pessoas, de modo que a pessoa pense que não compensa o
crime.

6
Teoria da Lei Penal
A principal critica feita a esta teoria vem dos idealistas alemães, como Kant e Engel. O primeiro refere que
uma pena ameaçadora é indigna para um ser humano pois, na linha de um dos seus imperativos categóricos,
o ser humano nunca pode ser utilizado como um meio, mas sim como um fim (o ser humano nesta teoria
está a servir de exemplo). Já Engel considera que quando quer que o seu cão faça alguma coisa levanta um
pau, algo que, em igual forma de ameaça, não se deve fazer aos seres humanos.

Na prevenção geral negativa apesar de se esperar que se aplique o mínimo possível de pena de forma que
transmita medo, a tendência é contrária, aumentando as penas, violando a dignidade humana e podendo
descredibilizar o próprio estado. Por último, esta prevenção, baseando-se na ameaça, não tem tanta
importância saber o contexto em que se realizou o crime e esquecendo um pouco a diferença entre
imputáveis e inimputáveis. A prevenção geral negativa prevaleceu no século XVIII e XIX.

Prevenção geral positiva

Como os sistemas europeus continentais tiveram sempre uma ideia quer contratualista, quer
retribucionista, entendeu-se que segundo estas críticas a pena preventiva não devia ser ameaçadora e
tentou-se afastar essa ideia da prevenção. Passou a dar-se uma grande importância a uma mensagem não
negativa, mas a uma ideia positiva: em vez de se dissuadir as pessoas de cometer crimes através do medo,
devíamos dissuadi-las mostrando a importância que tem para todos e para a comunidade determinados
valores, aqueles que todos estão de acordo e que devem ser salvaguardados, até porque caso contrário a
sociedade desaparece. Quando alguém vai cometer um crime, a contra motivação não devia ser ir para a
cadeia, mas sim o respeito pelo valor que a pessoa acredita. É necessário também que a pena aplicada a
determinado sujeito tenha mensagem de dissuasão através da reafirmação do valor violado por via da
consciência coletiva, pois quanto mais estiver presente na consciência coletiva ainda mais as pessoas estarão
contrariadas a violá-lo.

A pena traz um efeito de confiança aos cidadãos: que a justiça protege os bens jurídicos e os bens mais
importantes da sociedade, e a pena é a garantia dessa proteção. Este efeito de confiança diminui a
propensão aos crimes pois a via positiva dá respeito aos valores, algo mais eficaz do que o medo.

É uma teoria bastante recente datada do século XX até ao século presente.

• Prevenção especial
Estamos a falar do efeito da pena não na comunidade, mas na própria pessoa a quem se aplicou uma pena.
A prevenção especial tem dois momentos: que a pessoa enquanto cumpre pena de prisão não volta a
cometer crimes, e esperando que quando termine a pena não o volte a repetir. Face ao nosso sistema
jurídico todas as pessoas que sofrem pena de prisão serão libertadas e, portanto, temos de pensar nos dois
momentos.

Prevenção especial negativa

Quando falamos do afastamento do condenado da sociedade, isto é importante pelo facto da pessoa num
futuro próximo não cometer crimes, é uma ideia de prevenção especial negativa. Previne-se que aquela
pessoa em especial, ao ser condenada, mal inicia a pena de prisão se coloque afastada da sociedade e desse

7
Teoria da Lei Penal
modo não voltará a cometer outro crime tão cedo. É defendido pela teoria da defesa social, originária de
França e defende que acima de todo deve defender-se a sociedade do criminoso - segregação.

Há uma outra vertente da prevenção especial negativa com a ideia de que a pena de prisão deve ser tão
desagradável que o delinquente não queira repetir a experiência, o que visualiza a pena de prisão para além
da mesma, defendendo a sociedade da pessoa enquanto está segregada, mas dá também uma vertente pós
pena, pois a ameaça de nova pena implica um medo avultado para o delinquente - aterrorização.

É uma ideia de defesa da sociedade em dois momentos.

Prevenção especial positiva

Contrapõe-se a prevenção especial positiva, com duas vias: através da correção ou da socialização.

Pela via correcionalista é própria de estados autoritários, com aplicação em Itália, Portugal e Alemanha.
Durante a execução da pena tenta-se mudar a personalidade da pessoa de forma a, na prática, haver uma
execução de pena severa, com influência da prevenção negativa: pelo medo. É típica a pena de prisão em
que a pessoa fica isolada por muito tempo, por exemplo. Por outro lado, pode ir mais além e tentar mesmo
uma terapia por via de choques elétricos de forma que se tente mudar a personalidade por via de choques
que a tornem maldisposta quando se vê violência.

A socialização por outro lado, característica do seculo XX e XXI, parte do princípio natural que se reconhece
o direito à diferença e o estado não pode intervir nisso. Todavia deve adotar padrões de comportamento
que ajude à socialização, não deixando a eventual mudança de personalidade de ser voluntária. A pessoa
deve estar em contacto com as outras para aprender a viver em sociedade e sempre com respeito pela
diferença.

Em Portugal – artigo 40º CP

Na prática não há modelos puros. No nosso sistema do artigo 40º decorre a ideia, através da interpretação,
que existem duas finalidades da pena: a prevalente, como grande objetivo de prevenção geral positiva: “a
aplicação das penas visa a proteção de bens jurídicos”. Através da reafirmação dos mesmos valores quando
a pena é aplicada, e da reafirmação dos valores pelo direito penal quando a pessoa está na prisão. Quando
ocorrem vários crimes sem serem penalizados isso seria contra motivador e as pessoas desacreditariam os
valores, e por isso reafirma-se os bens jurídicos e valores aquando do cumprimento da pena. A finalidade
complementar é a socialização, não como obrigação senão seria correção, mas sim de proporcionar
condições de ressocialização e dando condições materiais mínimas de modo a dar a ideia de que o estado
acredita que elas se ressocializam. Sem que com isso, se faça da prisão um local muito agradável.

Legitimação e finalidades das medidas de segurança


Legitimidade e finalidade

A legitimidade de uma medida de segurança relaciona-se com o princípio da culpa, o que significa que as
pessoas para serem punidas têm de ter tomado uma opção livre para cometer ou não o crime, e é isso que
se censura. Pode haver certas anomalias psíquicas que levem a que não se distinga o bem do mal, em que
não existe a emoção de empatia, o poder de ver em cada um de nós aquilo que podia ser em nós, que nos
8
Teoria da Lei Penal
faz ter o maior respeito pela outra pessoa. A questão de respeitar os valores e os outros é uma questão com
base emocional, ou seja, relacionado com o cérebro, mas também racional pois se todos cometerem
homicídios acabava a humanidade.

Estas anomalias levam a que as pessoas não tenham capacidade de avaliar a ilicitude, distinguindo o bem
do mal, podendo levar a pessoa a não perceber o porquê de ser considerado ilicitude de um facto – artigo
20º nº 1 CP. Por outro lado, pode fazer com que a pessoa não consiga resistir a cometer um crime apesar de
saber da ilicitude do mesmo e de distinguir o bem do mal - artigo 20º nº 1 CP. Se a censura é perceber que
um comportamento é errado e que não devemos cometer, não se pode censurar a pessoa se ela não tiver a
capacidade de o distinguir.

Falando em inimputáveis não podemos falar em ressocialização, nem em prevenção geral positiva, pois
quem cometeu o crime foi um inimputável e o que as pessoas querem é defesa, que esteja num local onde
não possa fazer mal às pessoas em geral. A defesa tem uma grande importância na legitimação das medidas
de segurança – artigo 18º CRP. Estamos, assim, perante um equilíbrio de valores constitucionais que deve
respeitar a dignidade do inimputável e a segurança da população, e é isso que se procura com medidas de
segurança. Neste contexto, nos termos do artigo 18º CRP, é necessário este equilíbrio da segurança com a
dignidade do inimputável, incluindo a sua liberdade, enquanto as penas normalmente procuram a defesa da
segurança da sociedade.

Os inimputáveis

Tanto a menoridade como a anomalia psíquica podem conduzir a um processo de formação de vontade não
livre. Isto leva a que não haja responsabilidade criminal, visto que a culpa advém da decisão livre, não
havendo nestes casos legitimidade para sancionar os atos destes. A imputabilidade é um pressuposto da
culpa, sem imputabilidade não pode haver culpa, enquanto a decisão livre é aquela em que o agente tem
possibilidade de saber que determinado comportamento é crime. Sendo a decisão livre e o sujeito optando
pelo comportamento criminoso já há legitimidade para censurar, porém se a pessoa sofre de anomalia
psíquica ou é menor essa ponderação está condicionada, sendo a prova pericial (nomeadamente da
psiquiatria) que nos diz se essa pessoa tem liberdade de decisão, sendo imputável ou não.

O artigo 20º define os termos da inimputabilidade por anomalia psíquica, enquanto a inimputabilidade por
menoridade é linear, ou seja, são todos inimputáveis se forem menores. A anomalia advém da capacidade
de avaliar a ilicitude (até porque pode ter consciência, porém não conseguir avaliar), conseguindo desse
modo perceber o significado da ilicitude. Ou a pessoa não tem capacidade de avaliar a ilicitude, ou aqueles
que tendo não se conseguem resistir de forma quase mecânica à prática do crime.

NOTA: Menoridade penal: aplica-se até aos 15 anos, aos 16 anos os menores podem já responder
criminalmente. A regra geral relativamente a prazos de menoridade está no 279º CC.

Tanto uma como outra são pessoas perigosas. O epicentro da inimputabilidade é a perigosidade, enquanto
no imputável o conceito fundamental é a culpa (para ser suscetível de ser censurado). Sem perigosidade não
há medida de segurança, pois estamos perante uma pessoa que não distingue bem do mal ou não se
determina de acordo com essa avaliação, e se cometeu um crime em razão disso poderá voltar a repetir – e
a isto se chama perigosidade.

9
Teoria da Lei Penal
O nº2 deste artigo não é uma definição de inimputabilidade, mas visa resolver a questão daqueles que
estando próximas do conceito de inimputabilidade não o é completamente definido e suscitam dúvidas.
Deste modo, nesta zona cinzenta mais duvidosa que pende para a inimputabilidade, ao que se chama uma
inimputabilidade político criminal, enquanto a inimputabilidade em si é biopsicológica, esta questão não ser
100% segura. Haverá dificuldade diminuta para distinguir bem do mal, mas o tribunal pode ou não declarar
a inimputabilidade.

O nº 3 ajuda nesta situação, como uma avaliação que se pode fazer de modo a tomar a decisão referida no
nº 2, que tem de ser tomada pelo tribunal. Há situações em que o parecer declara logo a inimputabilidade,
mas há outras em que os peritos não têm a exatidão necessária para declarar a inimputabilidade, e para
ajudar na decisão da melhor sanção - medida ou pena – estabelece-se este critério.

O nº 4 faz uma referência a situações de ações livres na causa. Estas significam que se a pessoa no momento
da prática do ato está numa situação de inimputabilidade, mas se se colocou nessa situação de livre vontade
sabendo que ficará sem controlo, não se exclui a imputabilidade – até porque há situações de pessoas que
se colocam nestas situações para conseguirem cometer crimes. Neste caso pode censurar-se a pessoa não
na prática do facto, pois aí é realmente inimputável, mas sim na colocação na situação de inimputabilidade,
podendo aplicar-se uma pena, visto que há uma decisão livre de se colocar nessa situação.

Há um regime especial para a inimputabilidade por anomalia em que se cumpre a medida de segurança em
hospital, enquanto na menoridade cumpre-se a medida de forma tutelar-educativa.

Legitimação

A legitimação das medidas é a proteção social, como já referido, pois o inimputável é uma pessoa que a
qualquer momento pode voltar a cometer o crime.

Temos um primeiro momento de prevenção especial negativa e num segundo prevenção geral positiva. Há
que levar a medida num sentido terapêutico com o objetivo de curar e que seja a privação da liberdade a
menor possível. No próprio artigo 40 nº 1, a proteção de bens jurídicos vai de acordo com retirar o
inimputável por via da defesa pessoal, enquanto nas penas procura-se a reafirmação dos valores. Isto
acontece porque a sociedade, em termos psicológicos, e o próprio valor violado, não sofre um abalo tão
grande na comunidade quando foi um inimputável a violá-lo, e não há tantas expetativas comunitárias neste
sentido, apenas que se proteja a sociedade deste indivíduo protegendo os bens jurídicos para o qual ele é
perigoso. Há também que ser terapêutico e procurar a cura ou controlar a doença mental.

Deste modo a finalidade das penas é a prevenção geral positiva enquanto nas medidas de segurança é a
prevenção especial positiva.

De forma secundária, nas medidas de segurança, procura-se a prevenção geral positiva porque há crimes
bastante graves cometidos por um inimputável, apesar de se perceber que a pessoa não é assim tão
perigosa, até porque a perigosidade pode ser ocasional. Mesmo assim, se a comunidade, perante um crime
grave, percebe que a pessoa sai em liberdade mesmo sendo inimputável, pode reagir mal vendo defraudadas
as suas expetativas. O artigo 91 nº 2 prevê protege estas situações e refere que o inimputável só é libertado
antes de um período de 3 anos, desde que a sua imediata libertação não seja compatível com a paz social -
ideia de prevenção geral positiva e a reação dos cidadãos a liberdade do indivíduo. Imaginemos que a pessoa

10
Teoria da Lei Penal
não é perigosa ou deixa de ser considerada perigosa, pode ser libertada ao fim de 3 anos, de modo a não se
opor à paz social – temos, portanto, a prevenção geral positiva. Pode, também, excecionalmente ser
libertado antes dos 3 anos se for compatível com a paz social – artigo 91º nº 2.

O regime da medida de segurança - CRP

Enquanto for perigoso o individuo fica em medida de segurança e é libertado quando assim deixar de o ser.
Isto pode levar à perpetuidade da medida, e a própria constituição assim o admite no artigo 30º CRP. Apesar
de no número 1 se proibir penas perpétuas, no seu número 2 menciona que em caso de anomalia psíquica
poderão as medidas de segurança ser prorrogadas indefinidamente de 2 em anos, podendo assim ficar toda
a vida. Isto apesar de o princípio ser a não perpetuidade.

Nunca há uma decisão do inimputável ficar indefinidamente sob a medida de segurança, mas a
perrogatividade das medidas sucessivamente pode levar a isso – artigos 92º e 93º CP. Deste modo o código
penal regula esta situação, e caso se mantenha a perigosidade o tribunal pode prorrogar a medida a cada 2
anos.

As terapias feitas na cura do inimputável não têm de ser aceites pelo próprio, ofendendo assim em parte a
liberdade do inimputável, ma com vista que seja possível libertar a pessoa.

Relação das penas com as medidas de segurança


Imputáveis perigosos

Existem duas vias de reação ao crime: as penas e medidas de segurança. Poderão elas ser aplicadas
cumulativamente ao mesmo sujeito? Esta hipótese coloca-se nas situações em que um sujeito cometendo
um crime e sendo imputável, nem por isso deixa de sofrer de anomalia psíquica que não deixa de o tornar
perigoso (apesar de ser imputável). São pessoas que têm a liberdade condicionada, mas que nem por isso
deixam de ser imputáveis – artigo 20º nº 2 e 3 CP.

É necessária uma estratégia para lidar com os imputáveis perigosos, havendo duas formas de lidar com esta
situação:

Sistema monista e sistema dualista


O sistema dualista refere que ao mesmo sujeito, pelo mesmo crime, possa ser aplicável cumulativamente
uma pena e uma medida de segurança, ou seja, se estamos perante pessoas que cometem um crime e que
não são inimputáveis, mas revelam um grau de perigosidade aplicam tanto pena como medida de segurança.

Acontece do seguinte modo: A cometeu homicídio, e é considerado imputável apesar de ter um grau de
inimputabilidade, porém a anomalia não é suficientemente grave para ter esse estatuto. Então, de acordo
com esses sistemas, determina-se a aplicação da medida de segurança, para controlar a anomalia psíquica,
e uma pena que visa a prevenção geral e a ressocialização.

O tempo cumprido na medida de segurança normalmente desconta-se na pena. A medida de segurança


aplica-se primeiro para priorizar a cura da anomalia e depois desconta-se na pena para que não se prive
demasiado a pessoa da liberdade, visto que já penou durante a medida de segurança – sistema vicariato.

11
Teoria da Lei Penal
O que distingue os dois sistemas é que num sistema dualista é possível ao mesmo agente, pelo mesmo
crime, cumular uma pena e uma medida de segurança. Os sistemas monistas não o permitem que pelo
mesmo crime se cumulem os dois.

Sistema português

O sistema português é monista, mas em algumas exceções permite a aplicação conjunta de medidas de
segurança e pena. Nesse sentido, permite que ao mesmo agente, por factos diferentes, se acumule pena e
medida de segurança (mas não pelo mesmo facto), desde que seja imputável numa situação e não na outra,
numa situação de concurso de crimes (sem que tenha sido julgado por nenhum deles). Caso o julgamento
do primeiro crime tenha já transitado em julgado o segundo já não acontece em concurso.

É preciso articular a pena e a medida de segurança e no nosso sistema faz-se do seguinte modo:

• Artigo 99º CP e 77º nº 2: o limite de 25 anos só se aplica até a decisão transitar em julgado, até la os
crimes estão em concurso. Se por um deles já houve transito em julgado a pessoa é punida por 2
crimes diferentes e podem cumular as penas. Imagine-se que a pessoa tá a ser julgada em concurso:
pelo homicídio pode ser imputável e no caso do furto inimputável e irá cumprir medida de segurança.
A execução de pena e medida de segurança, na articulação entre elas, segue-se o sistema de vicariato
e o tempo que se passou a cumprir a medida de segurança desconta-se na pena.
• Pena relativamente indeterminada: artigos 83º a 90º CP. Não é uma pena totalmente determinada
ou indeterminada, de forma que a pena tem um limite mínimo e um limite máximo. O critério para
definir a libertação da pessoa, seja no período mínimo ou máximo ou até mesmo entre estes, é o
facto da pessoa deixar de ser perigosa. Se a pessoa ao fim do período máximo de continuar a revelar
perigosa não é libertada, prorrogando-se a medida de segurança por via judicial, tendo de ser o
tribunal a prorrogar essa decisão. A partir do limite mínimo a pessoa pode ser libertada a qualquer
momento por decisão também ela judicial.
• Tratamento de imputável – artigos 104º e 105º CP. Pessoas que sofrem de anomalia psíquica, mas
não são inimputáveis. Esta anomalia psíquica até pode surgir depois do crime. Se a anomalia psíquica
for anterior ao crime pode não ser suficiente para declarar a pessoa inimputável ou não ser
relacionada com o crime. Devido a esta anomalia não é aconselhável cumprir a pena de prisão e por
isso é recomendável que o tempo de privação da liberdade seja executado num centro de tratamento
de inimputáveis.

Pena relativamente indeterminada - artigo 83º CP.

Pressupostos para que seja aplicada:

➢ Pena efetiva concreta superior a 2 anos


➢ Ser reincidente em crimes dolosos (ser a 3ª vez que pratica o facto)
➢ A cada um destes deve ter sido aplicada pena efetiva por mais de 2 anos
➢ Os crimes e a avaliação personalística do agente revelar acentuada inclinação para o crime,
persistente aquando da condenação.

A pena relativamente indeterminada tem um mínimo de 2/3 da pena relativa ao crime cometido e um
máximo correspondente a essa pena acrescido de 6 anos, com um máximo de 25.
12
Teoria da Lei Penal
O artigo 99º CP clarifica esta cumulação de penas e num contexto de concorrência de crimes (por exemplo
furto com agressão) podendo o agente ser declarado imputável para um crime e não imputável para outro,
sendo modo ser condenado a medida de segurança por um dos crimes e a pena de prisão por outro. A
cumulação destes faz-se do seguinte modo: em primeiro lugar cumpre-se a medida de segurança de modo
a afastar a pessoa perigosa da sociedade e tentar curá-la; assim que essa perigosidade esteja afastada e
cesse a medida de segurança, tem-se em conta a pena de prisão ditada pelo tribunal, descontando-se nesta
pena de prisão o tempo cumprido na medida de segurança – artigo 99º nº 1 CP. Esse desconto permite que
a pessoa vá imediatamente em liberdade ou cumpra os restantes anos. Porém, a lei permite que se o tempo
cumprido em medida de segurança ultrapasse metade da pena de prisão em medida de segurança, se
antecipe a liberdade condicional - artigo 99º nº 2 CP. Se o tempo em medida de segurança não for suficiente
para cumprir metade da pena pode cumprir o restante em trabalho a favor da comunidade, que não pode
ultrapassar um ano. Se faltar mais de um ano para metade da pena de prisão então terá mesmo de cumprir
a pena até atingir esse período.

Conceito material de crime


O conceito formal é positivista-legalista. O estado deve limitar-se à intervenção mínima necessária para
proteger o bem-estar dos cidadãos e os seus direitos naturais. Assim, havia um direito mínimo: tinha
natureza de sancionar ou disciplinar, sendo uma forma de restringir liberdades individuais e por isso na
perspetiva liberal jusracionalista, o direito deve limitar-se ao mínimo. Assim o conceito formal de crime diz-
nos aquilo que em certo momento é crime segundo a letra da lei. O conceito formal é bastante redundante
visto que não sai do conceito da lei. Mais importante do que saber o que é crime e não é, é saber aquilo que
deve ou não ser crime através duma compreensão deste. Tem de haver um conceito exterior ao direito penal
de forma que seja possível avaliar aquilo que se deve manter como crime e aquilo que não é, mas não deveria
ser e através desse modelo iremos pensar o direito penal.

O conceito material aparece com Garofalo, da escola positivista italiana. Este defende a existência do
conceito de delito natural, ou seja, independentemente do momento, local, havia de ser possível construir
um conceito universal de crime. Não significa que os crimes devam ser os mesmos, mas sim o conceito deve
ser semelhante. Para Durkeim os crimes seriam os atos que as pessoas tomariam como crime. Desta primeira
abordagem nasce desde logo uma grande diferença entre duas figuras: axiologicamente relevantes ou
positivistas e as axiologicamente neutras. A primeira censura comportamento que estando ou não na lei são
antecedidos de censura social independentemente da razão jurídico-legal, enquanto a segunda figura
enquanto a segunda figura são as normas jurídicas que não tem expressão na ressonância social (crimes
proibidos por lei que não é acompanhado do sentimento da população). Uma outra questão tem a ver com
a função e os fundamentos deste conceito. Este conceito dá-nos a medida da possibilidade de intervenção
das normas do direito penal conforme estejam ou não adaptadas ao direito atual. Em relação à função,
atualmente tem se como a proteção subsidiária dos bens jurídicos mais relevantes. Porém a certa altura a
legitimação era a questão da ofensividade e dos danos dos comportamentos penais. Isto para chegar ao
conceito material, o que implicaria que apenas eram comportamentos criminosos aqueles que ofendessem
determinados bens jurídicos. Surge o problema do pressuposto de o que é um bem jurídico.

13
Teoria da Lei Penal
Num contexto geral a visão positivista entende que as normas do Código Penal são adequadas desde que o
processo legislativo das mesmas esteja conforme o previsto constitucionalmente, sendo desta forma justa.
Sendo óbvio que é relevante uma lei penal estar de acordo com a lei não é legitimo assumir-se que a justiça
se resume a isso.

Daqui abre-se a perspetiva jurídica sociológica, que refere que a vida em sociedade exige respeito por
determinadas regras de conduta e valores e o direito penal ocupar-se-á das violações mais flagrantes destes
valores éticos-sociais. Nasce assim um direito penal contruído em função de concessões éticas e morais.
Crime será tudo o que afete a sociedade, independentemente da lei. Cai assim na confusão entre mal social
e o conceito de crime, descurando-se a gravidade dos atos, banalizando-se o crime e valoriza-se demasiado
ideologismos.

Na perspetiva moral-social evolui-se para um conceito de crime onde o sujeito não cumpre os deveres do
convívio social. Assim, alarga-se o comportamento livre do indivíduo na sociedade e o livre-arbítrio do
mesmo visto que nem todo o mal social é crime necessariamente. A evolução desta perspetiva esbarra na
evolução da sociedade moderna que considera que não crime não é a violação do mínimo ético (deveres de
convívio) mas sim o núcleo essencial desse mínimo ético (surgimento dos deveres fundamentais que
protegem os bens jurídicos mais importantes das sociedades). Havendo diversas morais devido ao
multiculturalismo passou-se a uma perspetiva racional.

Esta toma como um ato criminoso aquele que atenta contra os bens jurídicos transversais a todas as
culturas (o tal núcleo essencial do mínimo ético. Assim é necessário definir o conceito de bem jurídico. O
conceito de bem jurídico tem de arrancar do conceito pré ou extrapenal, tem de vir de fora, visto que o
direito penal não se pode legitimar a si mesmo. O que legitima o direito penal são os valores que ele defende,
há muitos valores da vida social que nem sequer entram no direito e há muitos valores importantíssimos
tutelados pelo direito e não pelo direito penal – princípio do pacta sut servanda, os contratos são para ser
pontualmente cumpridos. Rege-se assim o modelo de atuação por um princípio de mínima intervenção
necessária, atuando contra aqueles que atentam os bens jurídicos e caso essa criminalização seja necessária
e eficaz, com vista a controlar e objetivando findar esses comportamentos – em respeito pelo artigo 18º nº
2 CRP.

Princípio da legalidade

Lei Penal

Escrita Certa Estrita Prévia

Não pode haver crime nem pena que não esteja prevista em lei que seja escrita, certa, estrita e prévia.

A lei e o costume são fontes imediatas de direito em geral. No direito penal não há a possibilidade de uma
lei surgir de costume, tendo obrigatoriamente de estar previsto em lei o comportamento criminoso (a
previsão) e a sua consequência (estatuição). A lei tem de ser a fonte imediata do direito penal. A única
intervenção que um costume pode vir a ter é na avaliação do comportamento descrito como aceite pelos

14
Teoria da Lei Penal
bons costumes (em clima de praxe prender alunos numa sala, poderia constituir crime de sequestro, mas
pelos bons costumes percebemos que não constitui um crime).

Falamos de lei penal como restrição aos direitos fundamentais dos cidadãos, apesar de nem toda a lei penal
o ser (por exemplo a proibição de punir os inimputáveis).

O artigo 29º CRP refere que para que alguém seja sentenciado criminalmente deve haver uma lei escrita
que seja anterior a essa prática. Os comportamentos têm de estar descritos na lei penal e têm de ser certos,
a lei tem de ser certa, de forma que a lei penal tenha os seus pressupostos, aqueles que um tipo legal prevê,
tenham de ser preenchidos para que possa ser punível. A preocupação com a certeza jurídica surge de forma
que cada cidadão possa perceber o que é crime e o que não é crime, sabendo os pressupostos para tal e que
esses não causem dúvidas no sujeito. A lei penal ser certa é também uma garantia do cidadão. Neste sentido
o que não estiver tipificado na lei penal como crime não é crime.

A lei tem de ser estrita, proibindo-se a analogia – artigo 29º nº 3 CRP e artigo 1º nº 3 Código Penal.

Além de tudo isto tem de ser prévia – artigo 29º nº 1 CRP – como já referido. Coloca-se então a questão das
leis penais que sucedem no tempo. O problema surge quando alguém comete um facto criminoso, temos de
aplicar a norma em vigor no momento da prática do ato – artigo 2º CP. As alterações que houver a esta lei,
ou seja, uma nova lei com a mesma descrição típica da anterior, mas com pena diferente. Se algo não é crime
e passa a ser crime não está aliada a culpa, e aplica-se o princípio da não retroatividade das leis penais (a ver
mais à frente com a aplicação das leis no tempo). Assim, o artigo 29º nº 1 CRP é também um meio de
proteção dos cidadãos e relacionado com o princípio da culpa.

Se a lei nova que surgir prever uma pena mais desfavorável, aliado com os fins do direito penal e à
prevenção, sendo mais desfavorável e protegendo mais o bem jurídico, devia ser essa a pena mais aplicada,
porém não é isso que se verifica. A sanção não pode ser maior que aquela que é prevista no momento -
princípio da culpa, legalidade. Porém se acontecer a situação contrária, entrando em vigor lei mais favorável,
a reafirmação do bem jurídico não implica lei mais severa, bastando com pena menos grave, e sendo
suficiente para os efeitos de prevenção geral (não sendo suficiente para efeito da retribuição da culpa que
não é o objetivo principal), aplica-se retroativamente as penas mais favoráveis. Esta questão é a exceção à
regra de aplicação da pena prevista no momento da prática do facto.

Quando se diz que a lei penal deve ter certeza jurídica este não é apenas um princípio, mas um indicador. A
certeza tem que se equilibrar com a justiça da regra. A justiça, como a regras são geris e abstratas, necessita
às vezes de um contorno mais vago, sendo o equilíbrio muito difícil.

Normas penais em branco

Estas são normas penais cujo tipo legal de crime está descrito, mas parte dos pressupostos do tipo legal
estão na norma penal e outra parte está numa outra norma (pode ser regulamento, portaria, ato
administrativo, lei da AR) – por exemplo artigo 152º B do CP. As normas de segurança a que se refere estão
noutros diplomas. O problema é que estas remissões são para normas que não respeitam o princípio de
reserva de lei pela sua natureza (não necessita de ser da competência da AR). Isto põe em crise o princípio
da legalidade e a sua constitucionalidade. É assim necessário perceber se estas violam a constituição e o
critério utilizado é o de que há que perceber relativamente à norma penal em causa se o conteúdo essencial

15
Teoria da Lei Penal
do ilícito está na norma penal ou se está na norma remetida. No exemplo do artigo 152º B, apesar das regras
de segurança que devem ser cumpridas estarem nas remissões, aquilo que se criminaliza está na norma
penal, portanto é constitucional. O conteúdo essencial do ilícito é aquilo especificado da norma.

Acontece também que a norma remetida não cumpra outros princípios, como o princípio da certeza jurídica
da norma penal. Se a remissão for feita para normas cuja determinabilidade seja difícil pode considerar-se
inconstitucional.

A última questão colocada é haver sucessão de leis da norma remetida. Imagine-se que as normas
remetidas são revogáveis por outras normas; temos de considerar a norma inconstitucional por não
respeitar o princípio de reserva de lei (pois a norma remetida outrora pela lei penal criada pela AR ou
governo, tinha já sido já avaliada, enquanto a nova lei não foi tida em conta). Aqui chamamos de lei penal
completamente em branco. Assim, são inconstitucionais pois o conteúdo das novas normas não foi
verificado aquando da feitura da lei. Porém, não se podendo prescindir destas normas, se o conteúdo da
ilicitude penal for descrito na norma penal, esta continua a remeter para a norma que revogou a anterior,
continua a norma penal a respeitar o princípio da legalidade e a ser constitucional.

Aplicação da lei penal no tempo


A regra é de que a lei aplicada é quela em vigor no momento da prática do facto – artigos 29º nº 1 CRP e 2º
nº 1 CP. Acontece que podemos ter um problema de sucessões de leis.

Temos de perceber qual a lei em vigor no momento da prática do facto - artigo 3º. O momento da prática
do facto, segundo o mesmo artigo, é o momento que o agente atuou ou, em caso de omissão, o momento
em que deveria ter atuado. Havendo lei posterior, coloca-se a questão da sucessão de leis em situações que
durante a prática uma lei seja revogada por outra - é comum nos crimes continuados ou de execução
duradoura.

No caso de existir uma lei anterior menos favorável confrontada com lei posterior mais favorável: temos de
perceber qual a norma em vigor aquando do facto praticado e posteriormente na tal sucessão de leis,
aplicando-se a lei mais favorável aquando do julgamento; isto advém da finalidade das penas - artigo 2º nº
2 CP e 29º nº 4 CRP.

No caso de crimes continuados ou permanentes (ou tendenciosamente permanentes): levantam o


problema de perceber o momento de prática do facto - como crime de sequestro por exemplo. Se tivermos
duas leis sucessivas há um problema em perceber qual delas é a lei da prática do facto. O professor Taipa de
Carvalho, de forma a solucionar esta questão, estabeleceu um critério: temos de perceber se durante a
execução de um crime entra em vigor lei que se sucede a outra, sendo leis em que o facto de enquadra,
olhamos para as duas leis e escolhemos uma, e essa escolha deve ser conforme a CRP e CP, no sentido lógico
dos conceitos. Se a primeira lei for menos favorável e a segunda mais favorável aplica-se a lei mais favorável
no espírito do artigo 29 nº 4 CRP. No caso de a lei mais favorável for a primeira há que ter em conta que o
efeito dissuasor da própria norma e, portanto, nesse sentido devemos aplicar a lei nova menos favorável se
os seus pressupostos se verificarem após a entrada em vigor. Procura-se defender o efeito dissuasor da lei
nova menos favorável: imaginemos que a lei é referente ao sequestro e aumenta a pena se durar mais de 2

16
Teoria da Lei Penal
dias; se o sequestro se mantiver por 2 dias após a entrada em vigor da nova lei, cumpre os pressupostos e
aplicamos a lei menos favorável mais recente. Isto surge também a ressalvar o efeito não retroativo da lei.

lei - fav. Crime Lei + fav. lei + fav. crime lei - fav.

Aplica-se a lei mais favorável no Aplica-se a lei – favorável se se


espírito do artigo 29º nº 4 CRP verificarem os seus
pressupostos.

Se o indivíduo estiver já condenado e a cumprir pena, julga-se novamente o indivíduo, mas apenas em
matéria de direito - artigo 276º A CPP (Código Processo Penal), de modo a julgar o agente com a pena mais
favorável quando essa for suscetível de ser aplicada; aplicação retroativa da lei mais favorável (nº 10).

Descriminalização e despenalização

Se a norma penal passar a ser norma contraordenacional aplicamos o artigo 2º nº 2, havendo uma
descriminalização. Se houver uma atenuação da pena podemos ter novo julgamento (caso a pessoa tivesse
sido já julgada) ou aplica-se já no julgamento, havendo uma despenalização e aplicando-se o artigo 2º nº 4
CP.

Leis de emergência (temporárias)

Lei que predefine, no momento da sua entrada em vigor, o período de vigência da lei. Uma lei de emergência
ou lei temporária, como predetermina a sua vigência, não entra em vigor porque se mudaram os valores,
mas sim como instrumento de combate a certo tipo de comportamento que só relevam numa situação
anormal, e aplica-se com essa situação. Visto ser uma situação excecional, de forma a combater certos
comportamentos, funciona a prevenção geral negativa de forma a levar o medo a quem comete certos atos.
São exemplos destes atos as leis aplicadas no período da pandemia e na época de incêndios.

A lei de emergência no momento em que cessa passa a estar em vigor uma lei mais favorável (pois o facto
nem era crime ou tinha punição mais favorável), não se podendo aplicar a lei mais favorável em casos
cometidos durante o período de vigência da lei mais favorável – cometido um crime durante um período de
vigência de uma lei de emergência e sendo julgado após o fim desse período não se irá aplicar a lei posterior
mais favorável mas sim a lei de emergência. Apesar de aparentemente não parecer, compatibiliza-se com o
artigo 29º nº 4 CRP e com o artigo 2º nº 4 CP, devido ao facto do artigo 2º nº 3 CP referir que quando a lei
vale para um período de tempo continua a ser punível o facto segundo essa lei, mesmo depois de findar esse
período de emergência. De atentar que nestas situações há apenas caducidade e não revogação das leis de
emergência, o que significa que o valor protegido continua a existir, apenas o período de especial proteção
terminou e, portanto, não viola a constituição.

Aplicação da Lei no Espaço


Princípio da territorialidade

O princípio regra é o da territorialidade (artigo 4º/a) CP), ou seja, a lei penal portuguesa é aplicada aos factos
praticados por duas razões:

17
Teoria da Lei Penal
1) por ser o local onde o bem jurídico foi violado e, portanto, cada estado protege os bens jurídicos e tem a
intenção de tutelá-los e reafirmá-los;

2) visto ser importante para o processo penal que o julgamento ocorra no lugar onde o crime foi praticado,
porque a produção de prova é mais fácil

Para tal é necessário em primeira instância averiguar o local onde foi praticado o facto e mesmo o local do
resultado do facto praticado. Deste modo, acarreta-se o princípio da ubiquidade e possibilita-se a capacidade
de mais do que um Estado julgar cero crime praticado em vários estados ou com local da prática e resultado
do facto em países diferentes. Neste sentido, o artigo 7º CP estabelece que o local da prática do facto é tanto
o local onde o agente atuou como o local onde se deu o resultado.

No âmbito do princípio da territorialidade será a lei portuguesa competente (artigo 4º CP):

• Quando o facto for praticado em território português

Este é delimitado por tratados e convenções internacionais.

Além disso, o artigo 4º CP estabelece que no caso de o crime ser praticado a bordo de navio ou aeronave
portuguesa, é a lei penal portuguesa aplicável a esse(s) facto(s): o critério do pavilhão (artigo 4º alínea b)
CP) – navios ou aeronaves civis. Desde que esses navios ou aeronaves estejam em espaço internacional e
que tenha matrícula portuguesa. O que determina verdadeiramente a nacionalidade é a matrícula, existindo
no âmbito do direito marítimo a obrigatoriedade de colocar o pavilhão da nacionalidade correspondente à
matrícula. Porém se entrar em águas estrangeiras, deve colocar-se o pavilhão desse outro país.

Caso o crime ocorra fora de território nacional, pode a lei penal ser igualmente competente, por via do
artigo 5º CP

Princípio da proteção dos interesses nacionais – artigo 5º nº1/a) CP

Se ocorrerem os crimes previstos nos artigos 221º, 262º a 271º, 308º a 321º, 325 a 334º, 336º a 345º CP,
mesmo sendo os factos ocorridos fora do território nacional, é a lei penal portuguesa aplicável a estes factos
de modo se protejam estes bens jurídicos.

Princípio da nacionalidade – artigo 5º nº1/b) CP

A aplicação da lei portuguesa no espaço alarga-se igualmente a situações em que o agente que pratica o
facto ou a vítima são de nacionalidade portuguesa ou que residem habitualmente em Portugal (mas neste
caso seja encontrado em Portugal).

Evita-se desta forma que se pratiquem certos crimes em locais onde esses factos não são criminalizados,
sendo assim o agente punido pela lei portuguesa.

Princípio da universalidade – artigo 5º nº 1/c) CP.

Aplica-se a lei penal portuguesa a crimes que se entendem que pela sua gravidade são de aplicação
universal, por protegerem bens jurídicos de relevância universal. Em certos princípios de direitos humanos,
Portugal arroga-se sempre competente de julgar os crimes que os violem independentemente de haver

18
Teoria da Lei Penal
portugueses ou não e em qualquer território. É necessário que o agente seja encontrado em Portugal e não
possa ser extraditado (artigo 33º CRP; não alberga os casos em que a extradição não é sequer pedida).

Este artigo inclui os crimes dos artigos 144º A e B, 154º B e C, 159º a 161º, 278º a 280º, 335º e 372º a 374º
CP.

Princípio da proteção de menores – artigo 5º nº 1/d) CP.

Quando sejam praticados os crimes dos artigos 171º, 172º, 174º, 175º e 176º a 176º B ou, sendo as vítimas
menores, dos artigos 144º, 163º e 164º CP. deve o agente ser encontrado em Portugal e não possa ser
extraditado, ou se o agente for português ou residir habitualmente em Portugal ou mesmo que o crime
ocorra contra menor que reside em Portugal.

Princípio da nacionalidade ativa ou passiva – artigo 5º nº 1/e) CP.

A lei penal portuguesa aplicar-se-á sempre que o facto seja praticado por português ou contra português
quando o agente seja encontrado em Portugal, os crimes forem também puníveis no lugar da prática do
facto (salvo quando nesse não se exerça poder punitivo) e quando esse crime admita extradição que não é
possível ou admitida.

Princípio da aplicação supletiva da lei penal portuguesa – artigo 5º nº 1/f) CP

Esta alínea permite que em certos casos a lei penal portuguesa, não podendo extraditar o agente., não deixe
de o julgar, evitando a impunidade em situações não abrangidas pelos princípios anteriores. Abranges crimes
praticados por estrangeiros contra estrangeiros, encontrados em Portugal, e quando co9nstituam crimes
que admitam extradição não é admitida ou não é possível.

Crimes cometidos por pessoas coletivas – artigo 5º nº1/g) CP

A lei portuguesa é aplicável a factos que tenham sido praticados por pessoa coletiva ou contra pessoa
coletiva com sede em território português.

Princípio da aplicação convencional – artigo 5º nº 2 CP

O estado português pode-se vincular por convenção ou tratado a julgar certos factos praticados fora do
território português.

Se a lei penal portuguesa for aplicável a factos praticados fora de Portugal, temos de submeter o caso ao
artigo 6º CP: restrições à aplicação da lei penal portuguesa a crimes cometidos no estrangeiro

Estabelece como requisito de aplicação da lei penal portuguesa nos casos do artigo 5º CP, que o sujeito não
tenha sido julgado no estrangeiro (no país de prática do facto), e se foi que se tenha subtraído total ou
parcialmente à pena. Se se suceder esta última situação Portugal julga novamente e aplica a pena. Se o
cumprimento for parcial, desconta-se o tempo de pena já cumprido noutro país – artigo 82º CP.

O artigo 6º nº 2 CP considera a importância do lugar da prática do facto. Deste modo, sendo aplicável a
ordem portuguesa, mas se a ordem jurídica portuguesa foi chamada pelo artigo 5º CP, o facto é julgado
segundo a lei do país mais favorável ao agente.

19
Teoria da Lei Penal
O artigo 6º nº 3 CP estabelece que o regime do número anterior não se aplica nos crimes da alínea a) e b)
do artigo 5º nº 1 CP.

Âmbito pessoal da lei penal


Pelo princípio da igualdade entre todos que resulta da revolução francesa (1789) e resultante do artigo 13º
da CRP, a lei deve ser igual para todos há porem situações em que isso não acontece:

• Diplomatas
• Titulares de cargos políticos e órgãos de soberania
Quando falamos da aplicação da lei no espaço falamos das imunidades em embaixadas – acontecendo um
crime na embaixada de um país esse crime é cometido no país dessa embaixada, nos termos do costume
internacional.
Imunidades do corpo diplomático
Falamos das representações diplomáticas que se dividem em dois grupos: embaixadores e dos povos
consulares. As pessoas que trabalham nas embaixadas beneficia de imunidades relativamente ao estado
onde se encontra acreditado. Pretende-se vetar a possibilidade de os estados onde estão essas embaixadas
de fraudelamente perseguirem esses funcionários. Sendo praticados crimes pelo corpo dessas embaixadas
o país onde está sediada pode declarar o diplomata como persona non grata dando-lhe um período para
abandonar o país. Se não abandonar o país nesse período Portugal pode proceder à sua detenção, pois deixa
de reconhecer as imunidades diplomáticas.
Titulares de órgão de soberania
Presidente da república
Há crimes exercidos no exercício da funções e crimes que são praticados fora desses efeitos. O artigo 130º
CRP estabelece que crimes praticados no exercício das suas funções podem ser julgados pelos mesmos no
exercício do seu mandato perante o Supremo Tribunal de Justiça. Segundo o nº 2 deste artigo tem de haver
proposta de iniciativa de 1/5 dos deputados de forma a destituir o PR e tem de ser votada por pelo menos
2/3 dos deputados.se for condenado perder imediatamente o mandato e não pode recandidatar-se. Quanto
aos crimes praticados fora do exercício de funções pode ser julgado nos tribunais comuns após o término de
mandato.
Deputados da AR
O deputado condenado por crime praticado no exercício das suas funções perde o seu mandato. Os
deputados gozam de imunidades que à partida enquanto exerçam o cargo de deputado não pode ser
chamado a prestar declarações no âmbito de processo penal, como arguidos, nem ser julgados no âmbito
de processo penal. Para que a imunidade seja levantada é necessária votação da AR no âmbito da comissão
de ética e direitos humanos da AR. É esta quem propõe ao plenário o levantamento da imunidade dos
deputados.
Imunidades dos membros do governo
Podem ser constituídos arguidos sendo praticado crime. Para ser detido ou preso tem de haver autorização
pela AR. Se algum membro de governo estiver a responder em algum processo-crime e for definitivamente
acusado (pronunciado) a AR pode suspender o exercício das suas funções – artigo 196º CRP.

20
Teoria da Lei Penal

Você também pode gostar