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AVC Hemorrágico – Profa.

Karol (08/10/19) nº9


Definição de AVC Hemorrágico = alteração em que uma área encefálica é afetada transitoriamente ou definitivamente por hemorragia.
O déficit é abrupto (na medicina há somente 2 coisas que ocorrem de forma abrupta = trauma ou lesão vascular). Os AVCs isquêmicos são muito
mais comuns que os hemorrágicos, correspondendo a 80% dos AVCs; enquanto que o hemorrágico corresponde a 20% dos AVCs. Portanto,
quando chega um paciente com déficit neurológico abrupto, muito provavelmente se trata de um AVC isquêmico. O prognóstico do paciente irá
depender fundamentalmente do tratamento empregado nas primeiras horas, mas também irá advir da gravidade/extensão/localização desse AVC
e de condições prévias do indivíduo.

Os AVCs hemorrágicos são subdivididos em 2 tipos:

 Hemorragia Intraparenquimatosa (HIP): Corresponde a 80% do total de AVCs hemorrágicos. Normalmente ocorre devido HAS crônica.
O indivíduo hipertenso faz picos pressóricos durante a vida, de modo que a parede da artéria fica fragilizada, adelgaçada e até
abaulada, até novo pico pressórico, que irá provocar o rompimento dessa artéria (ruptura de microaneurismas de Charcot Bouchard).
 Hemorragia subaracnoide (HSA): corresponde a 20% do total de AVCs hemorrágicos. É provocado pela ruptura de aneurisma congênito
(verdadeiro), ou MAV congênito. Não é muito frequente.

Os sinais de alerta para pensar que o indivíduo possa estar tendo um AVC hemorrágico são: cefaleia, vômitos, rigidez de nuca (sangue no
espaço liquórico provoca irritação meníngea), crises epiléticas, coma/depressão do estado de consciência. Normalmente os níveis pressóricos
estão mais elevados, do que no AVC isquêmico, e ocorre sempre um déficit neurológico focal (déficit neurológico focal = qualquer sinal/sintoma
neurológico – hemiparesia, déficit motor, sensitivo, de linguagem, visual, etc)

Causas de AVC hemorrágico:


1. Hemorragia intraparenquimatosa primária (de origem hipertensiva)
2. Ruptura de aneurisma sacular (ou congênito)
3. Ruptura de MAV
4. Angioma cavernoso
5. Trauma
6. Distúrbios hemorrágicos (leucemia, purpura, doença hepática)
7. Tumor
8. Embolismo séptico
9. Infarto hemorrágico
10. Arterites
11. Amiloidose
12. Uso de álcool, drogas

HEMORRAGIA INTRAPARENQUIMATOSA (HIP)

É a mais comum, portanto, e corresponde a 80% dos AVCs


hemorrágicos. É decorrente de hipertensão arterial crônica, devido
alteração nas artérias cerebrais. Os locais mais comuns de
sangramento são: putâmen (50%), tálamo, hemisfério cerebelar,
ponte, cortical ou subcortical. O putâmen é o mais acometido por
causa de sua rica vasculatura; está localizado nos gânglios da base,
sendo substancia cinzenta no meio de substancia branca. O líquor
geralmente permanece inalterado quando hemorragia é distante dos
ventrículos. Porém, se o sangramento for no Tálamo, por exemplo,
que é muito próximo do ventrículo, poderá aparecer sangue no líquor.
A hemorragia intraparenquimatosa é mais comum em homens, devido
ao simples fato de homem frequentar menos o médico, e o
acompanhamento de rotina da HAS ficar prejudicado, por falta de
assiduidade, levando ao AVC hemorrágico por descompensação e
elevação do nível pressórico. Na tomografia, o sangue fica claro, igual
osso, sendo de fácil visualização, até mesmo poucos segundos após
o evento hemorrágico. Por isso é preconizado realizar a tomografia já no primeiro momento após o incidente suspeito de AVC, permitindo
identificar a área de sangramento. No AVC isquêmico, a área de lesão demora um pouco para aparecer na tomografia, ao contrário do AVC
hemorrágico, permitindo diferenciá-los através da TC.
Hemorragia putaminal

Irá provocar no indivíduo hemiplegia contralateral, cefaleia, vômitos. Dependendo do volume do sangramento, pode gerar estupor e até coma. Se
acometer o seguimento anterior, o indivíduo irá apresentar: hemiplegia menos severa - hemiparesia, negligencia contralateral (lesões a esquerda),
afasia não fluente (Broca), disgrafia. Se acometer o seguimento posterior, irá apresentar: hemianopsia, perda sensitiva significativa, anosognosia
(lesões a direita; anosognosia = pcte não reconhece a doença ), afasia de Wernicke (lesões a esquerda). Isso conclui que o putâmen faz sinapse
em suas regiões anteriores com o lobo frontal e em regiões posteriores com o lobo temporal (lembrar que a área de Wernicke é temporal-superior,
portanto compreensão da fala; e a área de Broca é frontal-inferior, à esquerda, fazendo sinapse com putâmen anterior). O quadro clinico do
putâmen vai depender se acometimento será completo ou apenas anterior/posterior. Ocorrerá exaltação de reflexo, presença de sinal de Babinski,
os membros inicialmente (fase aguda) se tornam flácidos e depois ficam espásticos, ocorre paralisia do olhar conjugado “olha para o lado da
lesão” (Foville superior) e alteração dolorosa. A respiração é irregular ou intermitente, as pupilas ficam dilatadas e fixas e ocasionalmente evolui
para descerebração.

Hemorragia talâmica

O tálamo é uma estrutura que fica bem próxima do corno occipital do ventrículo lateral, fazendo a “parede” do terceiro ventrículo. É um local de
substância cinzenta, dentro de substancia branca, que faz sinapse fundamentalmente sensitiva com várias regiões encefálicas. Quem tem infarto
talâmico costuma ter dores crônicas, lancinantes, insuportáveis, em que até o ato da roupa encostar no membro já provoca a dor severa.
Usualmente, o quadro clínico se caracteriza por severo déficit sensitivo contralateral à lesão; se for extenso, pode provocar déficit motor pela
compressão da cápsula interna; afasia fluente/Wernicke (se lesão a esquerda); negligencia contralateral (se lesão a direita); ausência de reflexo
fotomotor; desvio do olhar conjugado para baixo; miose e semiptose ipsilateral (Sd. Horner).

Hemorragia pontina

As hemorragias pontinas são trágicas. Na ponte há a formação reticular ativadora ascendente, então qualquer lesão na ponte faz com que o
indivíduo abra o quadro já em coma profundo. Não chega nenhum estímulo no córtex cerebral, pois não estão conseguindo passar pela ponte.
Ocorre postura de descerebração, paralisia global, pupilas puntiformes fotorreagentes (observável apenas através de lupa), movimentação lateral
do olhar ausente (movimento vertical do olhar pode ocorrer se movimentarmos a cabeça do paciente, através de manobras), paralisia de nervos
cranianos; usualmente morte em poucas horas.

Hemorragia cerebelar

Pode se apresentar com volume grande de hemorragia e acometer até um hemisfério cerebelar inteiro. Os sintomas incluem vômitos, cefaleia,
vertigem, inabilidade de sentar, ficar em pé e andar (indivíduo quando colocado em pé, tende a cair para o lado da hemorragia). Em fases iniciais:
ataxia, paralisia facial e do olhar conjugado contralateral à lesão (Foville inferior, ao contrário do putâmen), diminuição do reflexo córneo palpebral.

Hemorragia lobar e em outras localizações

Associado a anticoagulação, trauma, MAV, amiloidose. Sintomas dependem da localização, assim como demais locais de passíveis de hemorragia
(frontal à direita → déficit motor à esquerda; occipital → déficit visual contralateral).

Prognóstico HIP

Cerca de 30-35% evoluem a óbito nos 30 primeiros dias de todas as HIP → a gravidade depende do volume hemorrágico, extensão p/ ventrículos,
se houve necessidade de sonda para controle da PIC dos sobreviventes. Dos que sobrevivem, a recuperação funcional acaba sendo melhor do
que no AVC isquêmico (porque o sangue é reabsorvido e a área cicatricial é menor do que no AVCi = menos déficit).

Tratamento HIP

Consiste em:
 Estabilização clínica
 Se Glasgow ≤ 9 → ventilação mecânica e monitorização de PIC.
 Hiperventilação, com Pco2 = 25 A 30mmHg
 Manitol p/ diminuir edema (osmolaridade entre 295 a 305)
 Corticoide ainda é discutível
 PAm = 110mmHg
 PAalvo = 160x90mmHg → tem que abaixar a pressão mas deixar levemente hipertenso (usar drogas EV intermitentes ou continuas –
labetalol/nitroprussiato; reduzir mais agressivamente quando PAS ˃ 200. (OBS: no AVCi não reduz pressão arterial)
 Drogas antiepiléticas (usa por cerca de 1 mês, p/ prevenir eventos epiléticos, mesmo que não tenha tido nenhuma crise)
 Cirurgia – preconizada quando houver hematomas infratentoriais ˃ 3cm, hematomas supratentoriais com volume maior que 30ml e em
deterioração clínica; não recomendada em hematomas pequenos e coma profundo (Glasgow 3)
 Terapia hemostática (fator VIIa) ou redução intensiva de PA quando há Spot Sign nas primeiras 3 horas, pois sinaliza pior prognóstico

HEMORRAGIA SUBARACNOIDE (HSA)

Usualmente, decorrente de aneurismas congênitos, descobertos na sua grande maioria apenas após o sangramento, já que por ter incidência
baixa, não necessita de triagem. O sangramento irá ocorrer no espaço subaracnoide (no líquor). Para que um aneurisma se rompa, causando a
hemorragia subaracnoide, ele precisa ser ≥ 10mm (saculares – Berry). Pode ocorrer sangramento subaracnoide sem aneurisma, como por
exemplo no trauma, ser espontâneo, ser decorrente de extensão da HIP. A HSA aneurismática corresponde a 2 a 5% dos AVCs, mais prevalente
dos 50 a 60 anos, pouco mais comum em mulheres. São fatores de risco: raça negra, história familiar positiva, tabagismo, álcool, uso de drogas
simpatomiméticas, HAS e presença de aneurisma de grande tamanho (7-10mm). O local mais comum de sangramento por aneurisma é na artéria
comunicante posterior (ramo da artéria carótida interna); o segundo local mais comum é na artéria comunicante anterior. O quadro clínico se
caracteriza por: cefaleia súbita de forte intensidade (Thunderclap), náuseas, vômitos, rigidez de nuca, alteração de consciência, sinal focal, cefaleia
sentinela que precede a ruptura (10 a 43% tem dias a poucas semanas antes do ictus). Quando sangra, há uma descarga de catecolaminas, que
provoca febre, alterações no ECG, isquemia miocárdica, edema pulmonar (isso torna o quadro clínico mais exuberante) – o indivíduo pode,
portanto, fazer um AVC e um IAM → nesses casos, preconiza-se resolver o IAM através de angioplastia, e não administrar anticoagulante, para
não agravar o AVC.
OBS: o sangue se dilui no líquor, portanto dependendo da quantidade (pouco sangramento), não será possível ver alteração na tomografia (nesse
caso, se basear apenas no quadro clínico).

Quadro clínico

Cefaleia, rigidez de nuca, papiledema, rebaixamento do nível de consciência Qualquer localização do aneurisma
Paresia de MMII Artéria comunicante anterior
afasia Artéria Cerebral média
Hemiparesia ou hemiplegia Artéria Cerebral média
Paralisia do III nervo Comunicante posterior (+ comum)
Paralisia do VI nervo Aneurisma em fossa posterior (HIC)

Diagnóstico

O diagnóstico de qualquer AVC, e principalmente dos hemorrágicos, se faz através de TC! É o exame de escolha porque permite visualizar
facilmente a hemorragia, mesmo que sejam pequenas; quanto mais precoce for feita, mais sensível será a TC; se demorar mais de 12h para fazer
pode não ser mais possível ver o sangramento, especialmente na hemorragia subaracnoide. A RM é um exame caro, demorado, e não é escolha,
mas pode ser feita para acompanhamento hemorragias residuais, 4-5 semanas após o ictus, para ver a evolução. O líquor pode ser feito quando a
história clínica é sugestiva de HSA mas a TC não evidenciou sangramento nas primeiras 6h (lembrando que depois de 12h a sensibilidade diminui
muito, porque o sangue contido no líquor vai sendo absorvido). Portanto, em síntese:
 TC: detecção de hemorragias IP ≥ 1cm
Diminuição da sensibilidade p/ HSA após 12h de início do quadro
 RM: demonstrar pequenas hemorragias no tronco
Hemorragias residuais IP após 4 a 5 semanas
 LCR: história sugestiva de HSA com TC normal nas primeiras 6h
LEMBRAR QUE NA TOMOGRAFIA, SANGRAMENTO FICA BRANCO (hipersinal); ENQUANTO NA RESSONANCIA, HIPERSINAL EM T2 É
ISQUEMIA/INFLAMAÇÃO (sangramento fica preto)!

HSA: imperativo progredir no diagnóstico de localização do aneurisma: arteriografia (invasivo, mas é padrão ouro – permite identificar
pequenos aneurismas), angiotomo, angioressonância
**considerar nova arteriografia após 3 semanas do ictus para descartar presença de aneurisma não visualizado na fase aguda.

Existem algumas escalas que quantificam e pontuam o sangramento visualizado na TC. São mais utilizadas na neurocirurgia do que na neurologia
clínica, pois definem conduta cirúrgica:

Escalas em HSA aguda – Fisher e Hunt-Hess

Pontuação Escala de Fisher Escala Fisher modificada


0 - Ausência de sangramento
1 Ausência de sangramento Sangramento mínimo/fino sem hemoventrículo
2 Sangramento com espessura ˂ 1mm Sangramento mínimo/fino com hemoventrículo
3 Sangramento com espessura ˃ 1mm Sangramento extenso/espesso sem hemoventrículo
4 Hematoma intracerebral ou intraventricular Sangramento extenso/espesso com hemoventrículo

ESCORE Hunt-Hess Proporção dos Mortalidade WFNS Desfecho ruim


pacientes com Hunt-Hess (%) WFNS (%)
HSA(%)
1 Assintomático, cefaleia e 19,5 3,5 Glasgow 15, ausência de 14,8
rigidez leves sinal focal
2 Cefaleia moderada a severa, 15,5 3,2 Glasgow 13 ou 14, ausência 41,3
rigidez de nuca moderada, de sinal focal
paralisia de nervo craniano
3 Confusão mental, déficit focal 26,6 9,4 Glasgow 13 ou 14 presença 74,4
leve de sinal focal
4 Estupor, hemiparesia 14,4 23,6 Glasgow 7 a 12, presença 84,7
moderada/grave ou ausência de sinal focal
5 Coma, postura 15 70,5 Glasgow 3 a 6, presença ou 93,8
descerebração ausência de sinal focal

Prognóstico HSA
Cerca de 10-15% morrem antes de chegar no hospital; 60% morrem no primeiro mês; dos que sobrevivem, 30-50% tem sequela.

Tratamento HSA
Consiste em:
 Estabilização clínica, hidratação
 PAm = 110mmHg / PA alvo ≤ 160x90 (usar drogas anti-hipertensivas EV intermitente ou contínuas) *igual HIP
 Controle de temperatura ˂ 37°
 Manutenção da glicemia 70 a 140mg/dl
 Profilaxia para TVP (porém em doses menores, para não agravar a hemorragia)
 Bloq. Canal de cálcio p/ diminuição da isquemia associado aos vasoespasmo (Nimodipina 2 comprimidos de 30mg de 4/4h por 21 dias)
 Drogas antiepiléticas apenas após crise (10 a 25% dos pctes.)
 Não é recomendado uso de estatina
 Uso duvidoso de antifibrinolítico (ac. Tranexânico)

Aneurismas: Abordagem cirúrgica dos aneurismas é feita através de clipagem - “aneurisma diagnosticado é aneurisma clipado”. Todo aneurisma
maior que 7mm deve ser clipado. Pode ser feito tratamento endovascular, por meio de embolização (vai depender da disponibilidade, quadro
clínico, topografia, caracterização do aneurisma). Deve ser realizado o mais precoce possível (36h em escore 1 e 2 Hunt – Hess; pode haver
redução da mortalidade mesmo em escore 3 e 4; grau 5 não faz correção cirúrgica).

Os pacientes depois de 2 a 3 semanas pós HSA podem fazer hidrocefalia, que deve ser corrigida através de derivação ventricular externa (DVE).

Complicações: pode haver ressangramento em 4 a 13,6% (mais comum após endovascular); vasoespasmo (3 a 15 dias após ictus. Morbidade:
déficit isquêmico tardio. Diag. clínico: confusão, sonolência, déficit focal, isquemia visualizada na TC após 24h-48h do déficit. Terapia dos 3H =
deixar pcte. hipertenso, hipervolêmico e hemodiluído); hidrocefalia (20% dos pctes, c/ ↑ da PIC e alteração do nível de consciência; tratam. É DVE
ou punção lombar de alívio); crises epiléticas (25% dos pacientes nas primeiras 24h).

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