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Doença Renal Crônica

Fabiano Klaus
Disciplina Nefrologia
Faculdade de Medicina - UNISINOS
 Descrita Século XIX por
Richard Bright (1789-1858) no
Guy’s Hospital em Londres.
 Pacientes apresentavam
edema e na autópsia com
achados de Hipertrofia de
Ventrículo Esquerdo,
hemorragias cerebrais e rins
com aspecto contraído e
granular – complicações da
Hipertensão Arterial Sistêmica -
descrita como Doença de
Bright.
Problema Saúde Pública Global
 Estima-se que 8 – 16% da população mundial
apresentem a patologia.
 História natural insidiosa, assintomática por longo
período.
 Pouco reconhecida por médicos e pacientes.
 Mais prevalente em países subdesenvolvidos.
 Relacionada ao aumento da prevalência de DM, HAS,
obesidade, dislipidemia, sedentarismo, tabagismo.
Problema Saúde Pública Global
 A detecção e tratamento precoce na atenção primária
são importantes porque a progressão da DRC está
associada a desfechos clínicos adversos: necessidade
de hemodiálise, doença cardiovascular, infecções,
aumento na mortalidade.
 Impacto qualidade de vida pacientes e familiares.
 Alto custo tratamento.
 Projeção que se torne a 5º maior causa de mortes no
mundo em 2040.
 Definição:
Anormalidade funcional ou estrutural renal, persistente
por mais de 3 meses e com implicação a condição clínica
dos pacientes.
 Anormalidade estrutural ou funcional renal por > 3
meses:

 TFG < 60 mL/min/1,73 m2.


 Albuminúria.
 Anormalidades no sedimento urinário.
 Alteração histológica ou imagem sugestiva de dano renal.
 Desordens tubulares renais.
 História de transplante renal.
 Apresentação Clínica:

 Geralmente identificada por “screening” de rotina.


 Assintomática nas fases iniciais. Pacientes podem apresentar
sintomas relacionados a doença de base.
 Manifestações clínicas tardias (estágio 3b-4 doença): fadiga,
náuseas, vômitos, hálito metálico, inapetência, emagrecimento,
prurido, alteração estado mental, dispnéia, edema periférico.
 Manifestações uremia progressiva, anemia, sobrecarga de volume,
anormalidades eletrolíticas, distúrbio mineral e ósseo, acidemia.
 Sinais e sintomas associados a DRC:
- Cardiovasculares: Sobrecarga de volume, HAS, ICC, coronariopatia,
pericardite urêmica.
- Pulmonares: Pleurite, derrame pleural, pulmão urêmico.
- Gastrointestinais: anorexia, náuseas, vômitos, hálito urêmico,
desnutrição, sangramentos.
- Hematológicas: anemia, disfunção plaquetária – diátese
hemorrágica, disfunção leucocitária.
- Neurológicos – psiquiátricos: cefaléia, alterações sono, irritabilidade,
convulsões, coma, depressão, ansiedade, psicose, parestesias,
síndrome pernas inquietas.
 Sinais e sintomas associados a DRC:
- Dematológicas: Palidez, prurido, pigmentação, escoriações,
alterações ungueais, depósito de cálcio de cristais de uréia –
orvalho urêmico, necrose cutânea – calcifilaxia.
- Endócrinas e Metabólicas: Hiperparatireoidismo, amenorréia,
infertilidade, disfunção sexual, dislipidemia, gota.
- Musculo-esquelética: feaqueza e osteodistrofia renal.
- Oculares: retinopatia hipertensiva e diabética, Depósitos de cálcio
conjuntiva e córnea.
 Screening:

 Screening em pacientes jovens assintomáticos deve


ser indicado pois identifica pacientes com DRC
estabelecida, permite tratamento e melhora desfechos.

Sempre Solicite Creatinina!!!!


História Médica:
 Avaliar fatores de risco para doença renal: uso de AINES,
uso de antibióticos, quimioterápicos, história de nefrolitíase,
ITUs repetição.
 Presença de comorbidades: HAS, DM, Obesidade, doença
auto-imune, infecções crônicas.
 História familiar de doença renal.
 Sinais e sintomas que podem sugerir:
 Doença sistêmica (hemoptise, rash cutâneo,
linfadenomegalia, neuropatia).
 Obstrução urinária (hesitação, urgência miccional,
esvaziamento incompleto da bexiga).
 Exame Físico:
- Estado geral, Mucosas – palidez e hidratação, neurológico, avaliar
estado volêmico, peso altura – IMC.
- Ausculta cardíaca, atrito pericárdico, pressão arterial e frequência
cardíaca, turgência jugular.
- Ausculta pulmonar e avaliação sinais congestivos pulmonares.
- Sopro abdominal.
- Presença de edema, avaliação pulsos.
- Alterações cutâneas.
- Fundo de Olho.
Investigação: Laboratorial
 Creatinina - Utilizado como marcador de função
renal desde 1926.
 Cistatina C: “extremos” (obesidade ou
caquexia), amputação extremidades, dietas
hiperproteicas ou uso de suplementos,
medicamentos interferem secreção tubular de
creatinina – trimetropim, cimetidina.
 EQU e Pesquisa Albuminúria Urina.
 Eletrólitos (Na, K, Ca, P, Mg, Cl), Bicarbonato,
Hemograma e reservas de ferro, PTH, Vit D,
Ácido Úrico.
 Com o diagnóstico o próximo passo é calcular a
TFG para determinar o estágio da DRC:
- Avaliar TFG
1) DCE em urina de 24h
2) Equações:
- CKD – EPI
- Crockcoft-Gault
www.sbn.org.br
www.sbn.org.br
 Caso Clínico:

Paciente sexo masculino, branco, 63 anos, encaminhado ao


nefrologista para avaliação de função renal – creatinina 2,3 mg/dL,
peso 78 kg, altura 1,75m.
Calcule TFG

CG – MDRD - CKDEPI
www.sbn.org.br
Avaliação Albuminúria
 Métodos de Imagem:
- Ultrassonografia: avalia o tamanho, espessura e ecogenicidade do
parênquima renal.
Sinais de nefropatia crônica – redução tamanho dos rins,
hiperecogenicidade cortical – perda da diferenciação corto-
medular e redução parênquima renal, contornos lobulados.
Causas de doença renal com rins tamanho normal: DM, rins
policísticos, doenças de depósito – amiloidose, mieloma múltiplo.
- CT: atentar nefrotoxicidade contrastes exógenos, avaliação cistos,
lesões sólidas – neoplasias.
- RNM: fibrose nefrogênica – gadolíneo, contra-indicado TFG < 30
ml/min/1,73m².
 Principais Causas de Doença Renal Crônica:
1) Doenças crônicas - DM, HAS, ICC, Obesidade.
2) Infecciosas – Hep B, Hep C, HIV, Esquistossomose, Malaria,
Hanseníase, Tuberculose.
3) Doenças Císticas – Doença Policística Autossômica Dominante,
Recessiva, Rim Espongio-medular, Complexo Esclerose tuberosa.
4) Glomerulopatia – Glomerulonefrite Proliferativa Difusa, GNRP, GNLM,
GESF, Nef IgA, GNM, GNMP, GN colapsante, Lupus, Microangiopatia
Trombótica.
5) Doenças Tubulo-Intersticiais – Pielonefrites, Nefrite intersticial,
Deposição de Cristais e Cilindros, Granulomatosas.
6) Hereditárias - Síndrome de Alport, Fabry, Glomerulopatia C3, Amiloidose
Familiar.
7) Fármacos – Lítio, Inibidores da calcineurina, AINES, Quimioterápicos.
8) Urológicas – Uropatia Obstrutiva, Litíase Renal, Infecção Urinária e
Tumores.
- Perda progressiva de Néfrons e da TFG:
- Declínio TFG - hipertrofia compensatória nos néfrons funcionantes
remanescentes, fazendo com que paciente possa estar totalmente
assintomático até perder 70% função renal.
- Hiperfiltração glomerular > glomeruloesclerose néfrons remanescentes,
com perda adicional de função renal.
- Evolução:
1) Anormalidades balanço hídrico, compensação eletrolítica e do PH -
metabólico.
2) Acúmulo de produtos de degradação normalmente excretados pelos
rins.
3) Anormalidades produção e metabolismo hormonais (eritropoetina, Vit
D ativa).
 Fatores de Risco Implicados na Progressão Doença Renal:
- Diabetes, HAS, obesidade, dislipidemia, doença cardiovascular,
hiperuricemia, tabagismo.
- Nefrotoxicidade – drogas e contrastes.
- Glomerulopatias – proteinúria.
- Nefrites intersticiais, quadros de lesão renal aguda.
- Infecções, malformações congênitas trato urinário.
- Perda fisiológica de néfrons relacionada a idade.
- Hiperfosfatemia com depósitos de cálcio.
O reconhecimento da causa
primária e dos fatores
secundários envolvidos
implicará em cuidados
individualizados conforme a
gravidade do quadro, buscando
tratamento para evitar a
progressão da doença.
Doença Renal Crônica
 Tratamento:
1) Medidas não farmacológicas: Restrição de sódio e proteínas,
atividade física regular e abandonar tabagismo.
2) Redução de cisco cardiovascular e controle dos fatores de risco
para progressão doença renal - Tratamento Diabetes /
Hipertensão / Dislipidemia.
3) Atenção com medicações com potencial nefrotóxico e ajuste das
doses das medicações.
4) Manejo complicações doença: anemia e hiperparatireoidismo
secundário.
 Tratamento – Medidas Não Farmacológicas:

- Redução ingestão de sódio – 2-4 g/dia.


- Proteínas 0,6-0,7 g/Kg/dia.
- Atividades físicas regulares – 150 min/semana.
- Redução peso – IMC 20-25.
- Cessar tabagismo.
 Tratamento:
- Controle de Pressão Arterial:
PAS < 120 mm Hg.
Avaliar Albuminúria > Inibidores Enzima Conversora Angiotensina e
Antagonistas dos Receptores da Angiotensina 2.
- Controle Glicêmico no Diabético:
Hemoglobina Glicada < 6,5 - 7,0% previne a progressão das complicações
microvasculares, em fases mais avançadas e pacientes com risco de
hipoglicemia 7,5-8,0%.
Inibidores da SGLT2 – glicosúricos.
- Dislipidemia: Estatinas e ezetimibe individualizado.
- Controle ácido úrico sérico.
 Manifestações Cardiovasculares:
- Mortalidade cardiovascular aumentada em relação a população geral.
- Fatores associados: Progressão doença renal, idade, HAS, DM,
dislipidemia, tabagismo, anemia, desnutrição, inflamação e alterações do
metabolismo ósseo e mineral.
- Hipertrofia de Ventrículo Esquerdo (HVE) por sobrecarga pressão e
volume, Insuficiência Cardíaca com Fração de Ejeção Normal ou
Reduzida, Arritmias Cardíacas - Morte Súbita, Doença Aterosclerótica
com sintomas anginosos – isquemia miocárdica, calcificações vasculares.
- Tratamento: estatinas, ezetimibe, antiagregantes plaquetários e
anticoagulantes, b-bloqueadores, inibidores sistema renina angiotensina
aldosterona, iSGLT2 e diuréticos.
 Complicações DRC - Anemia:
- Deficiência de eritropoetina é a principal causa.
- Multifatorial – inflamação, deficiência de ferro, hiperparatireoidismo,
redução vida média das hemáceas, perdas sanguíneas, deficiência
de ácido fólico e vitamina B12.
- Diagnóstico níveis de HGB:
< 13g/dL homens.
< 12 g/dL mulheres – normocítica/normocrômica.
- Sintomas de cansaço, indisposição, piora os sintomas de ICC.
- Associada a Hipertrofia de Ventrículo Esquerdo e eventos
cardiovasculares, com maiores taxas de hospitalização e
mortalidade.
 Compicações DRC - Anemia:
- Indicado iniciar tratamento com HGB < 10 g/dL.
- Tratamento com reposição de eritropoetina, ferro VO ou EV, folato,
vitamina B12.
- Manejo hiperparatireoismo secundário, identificação de condições
inflamatórias crônicas ou de infecções sub-clínicas.
- Correção anemia melhora consideravelmente sintomas – qualidade
de vida, reduz risco cardiovascular.
- Hemoglobina alvo entre 10-12 g/dL.
 Complicações DRC - Hiperparatireoidismo
Secundário – Distúrbio Mineral e Ósseo da Doença
renal Crônica:
- Anormalidade do metabolismo cálcio e fósforo, com consequente
aumento PTH.
- Calcificações vasculares, disfunção endotelial e remodelação
miocárdica com aumento do risco cardiovascular.
- Tratamento:
1) Estabilização dos níveis de cálcio e fósforo - medicações reduzem
a absorção fósforo (carbonato de cálcio, sevelamer).
2) Controle de nível de PTH - Calcitriol, Cinacalcet, paricalcitol,
mantendo níveis de PTH 150-600 pg/dL.
Distúrbios Metabolismo Mineral e
Ósseo

ALTERAÇÕES
Maior risco de fraturas
ÓSSEAS
Anormalidades dos
níveis de Ca, P,
vitamina D, PTH  Calcificação vascular,
CALCIFICAÇÕES
disfunção endotelial, Maior mortalidade
EXTRA-
remodelação
ESQUELÉTICAS
miocardica
DRC - Prognóstico
Prediz probabilidade de necessidade de
diálise / transplante em 2 e 5 anos em
pacientes com DCE < 60 mL/min /1.73m2
Estima risco em pacientes com DCE
<30 mL/min/1.72m2
Fornece informações adicionais de
risco cardiovascular e óbito
Quando
Encaminhar ao
Nefrologista ?
 Encaminhar para nefrologista quando TFG < 30 mL/min/1.73m²:
 Planejar início TRS – Hemodiálise ou Diálise Peritoneal.
 Avaliação pré-transplante ou Transplante Preemptivo.
 Início de diálise deve ser individualizada:
 Sintomas urêmicos.
 Anormalidades eletrólitos (hiperpotassemia / acidose metabólica).
 Sobrecarga volêmica.
 Indicações diálise de urgência: encefalopatia, convulsões,
pericardite, pleurite por uremia severa.
 Escolha do método dialítico - FAV quando TFG 15 – 20
mL/min/1.73m²
www.kdigo.org/guidelines
 Bibliografia:
1. Veronese F, Manfro R, Thomé F, Barros, E. Nefrologia na Prática Clínica. 1ªed. 2019.
2. Riella M. Princípios de Nefrologia e Distúrbios Hidroeletrolíticos. 6ª ed. 2018.
3. KDIGO 2012 Clinical Practice Guideline for the Evaluation and Management of Chronic
Kidney Disease, 2013.
4. Leitura rápida do KDIGO 2012: Diretrizes para avaliação e manuseio da doença renal
crônica na prática clínica. J Bras Nefrol 2014;36(1):63-73.
5. Chronic Kidney Disease Diagnosis and Management. A Review. JAMA.
2019;322(13):1294-1304.
6. Chronic Kidney Disease. The Lancet. 2021; published online June 24, 2021.
7. Censo Brasileiro de Diálise: Jornal Brasileiro de Nefrologia 2022.
8. www.sbn.org.br
OBRIGADO

fabianoklaus@unisinos.br
51 99199 2822

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