DA IMPREVISÃO - ONEROSIDADE EXCESSIVA - LIMINAR DEFERIDA - REQUISITOS ATENDIDOS - SUSPENSÃO DO CONTRATO - EFEITOS DA MORA - AFASTAMENTO - DANOS MORAIS - INOCORRÊNICA - RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Para o acolhimento da pretensão de resolução ou de revisão do contrato, com fundamento na aplicação da Teoria da Imprevisão, imprescindível a demonstração da onerosidade excessiva para uma das partes, com extrema vantagem para a outra, e, ainda, a o desequilíbrio contratual em razão de acontecimento extraordinário e imprevisível. 2. Malgrado não haver a autora demonstrado a manutenção da situação de onerosidade excessiva (desequilíbrio contratual) decorrente da crise econômica causada pela pandemia da COVID-19, esta restou inicialmente comprovada, justificando o deferimento do pedido de tutela antecedente para sobrestamento das prestações do contrato. 3. Diante a comprovação nos autos da onerosidade excessiva decorrente da pandemia da COVID-19, ao tempo do ajuizamento da ação, motivadora do deferimento do pedido de tutela cautelar antecedente, impõe-se o parcial acolhimento do pedido, para o fim de afastar os efeitos da mora, durante o período em que sobrestado o contrato por força de decisão antecipatória. 4. Não demonstrada a ocorrência de ilegalidade na contratação, o reconhecimento da aplicação da teoria da imprevisão, para fins de sobrestamento dos efeitos da mora em contrato bancário, não caracteriza a prática de ilícito, impondo-se a rejeição do pedido de indenização por danos morais.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 1.0000.21.228235-4/001 - COMARCA DE
BELO HORIZONTE - APELANTE (S): GRASIELE DO NASCIMENTO IZIDORIO - APELADO (A)(S): BV FINANCEIRA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO
ACÓRDÃO
Vistos etc., acorda, em Turma, a 12ª CÂMARA CÍVEL do Tribunal
de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO.
JD. CONVOCADO MARCELO PEREIRA DA SILVA
RELATOR
JD. CONVOCADO MARCELO PEREIRA DA SILVA (RELATOR)
VOTO
GRASIELE DO NASCIMENTO IZIDORIO apela da r. sentença de
ordem 60 que, nos autos da ação ordinária ajuizada em face de BV FINANCEIRA S.A. CRÉDITO, FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO, julgou improcedentes os pedidos iniciais, extinguindo o processo, com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015.
Revogou a liminar anteriormente concedida (em junho de 2020),
"para suspender a mora e os seus efeitos, com relação ao contrato de financiamento de veículo objeto do pedido, desde o dia 20 de março de 2020, até que ocorra a cessação do denominado estado de calamidade no município de Belo Horizonte".
Condenou a apelante ao pagamento das custas processuais e de
honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, mas suspensa a exigibilidade da cobrança, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/2015.
Em suas razões recursais, à ordem 67, sustenta, em síntese, que: a)
"o juízo, em decisão bastante democrática e atenta às dificuldades geradas pela COVID-19, deferiu tutela de urgência suspendendo a mora e seus efeitos junto à BV Financeira"; b) "a liberação da atividade em 2020 em nada mudou situação de fragilidade da demandante"; c) "com a cassação da medida liminar, a autora está novamente exposta a perder seu patrimônio, visto que há em aberto cerca de 18 prestações no valor original de R$ 828,82, ou seja, uma dívida de mais de R$ 14.918,76"; d) "não tem condições de efetuar o pagamento desse valor, em uma única vez, pois é extremamente elevado para seus padrões"; e) "não há que se exigir a conclusão integral de um contrato, se este ficou extremante oneroso para uma das partes"; f) "a interpretação que melhor atende ao princípio da boa-fé é o fato de que a autora sempre disse que quer efetuar o pagamento total da dívida, porém se encontra impossibilitada"; g) "não pode responder, sozinha, pelo caso fortuito e força maior causado pela pandemia, visto que era impossível que ela impedisse ou evitasse tal acontecimento"; h) "é imperioso restabelecer o equilíbrio entre as partes, realizando a revisão do contrato, diante do evento que não era previsível às partes"; i) "as atitudes de patente má-fé as quais a autora foi submetida geraram sofrimento, angústia e constrangimento".
Ao final, pugna pelo provimento do recurso, julgando-se
procedentes os pedidos iniciais.
Recurso dispensado de preparo, pois à apelante foi deferida a
gratuidade de justiça (ordem 60).
Contrarrazões à ordem 75, pela manutenção da r. sentença
considerando-se o "princípio da força obrigatória dos contratos", bem assim "a imutabilidade ou intangibilidade das cláusulas contratuais, que somente seriam apreciadas judicialmente no caso de estarem eivadas de nulidade ou vício de vontade".
Nos termos do despacho de ordem 76, determinou-se a remessa
dos autos ao CEJUSC de 2º Grau, para se viabilizar a tentativa de celebração de acordo entre as partes em relação ao objeto deste recurso.
Conforme ata de audiência juntada à ordem 78, restou frustrada a
tentativa de conciliação em razão da ausência da apelada e de seus procuradores.
É o relatório.
Presentes os pressupostos de admissibilidade conheço do recurso.
Cinge-se a controvérsia em verificar o acerto da r. sentença de
improcedência dos pedidos versados nesta ação ordinária, da qual se extraem os seguintes fundamentos, verbis:
"Consoante relatado, pretende a autora por meio da presente
demanda a prorrogação, bem como a renegociação do seu contrato de financiamento de veículo realizado com o banco réu, ao argumento de a situação de calamidade pública vivenciada pela COVID-19 impediu que autora honrasse com os pagamentos habituais, além da excessiva onerosidade do contrato, sendo necessária, ainda, ver-se indenizada pela desproporção contratual entre as partes.
Por outro lado, sustenta o réu a impossibilidade da prorrogação,
bem como da renegociação do contrato, tal como pretendido pela autora, rechaçando os pedidos autorais atinentes aos danos morais.
Inicialmente, necessário de se salientar que pelo princípio da
obrigatoriedade dos contratos, o que foi estipulado pelas partes tem força de lei. O cerne deste princípio consiste na segurança dos negócios jurídicos, aplicando-se a máxima pacta sunt servanda (os pactos devem ser cumpridos).
Evidentemente que este princípio sofreu mitigações pelo direito
moderno, sobretudo com relação ao princípio da boa-fé objetiva e à função social do contrato.
(...)
Nesse contexto é que se enquadra o pedido revisional, visto que a
preservação do contrato deve ser buscada enquanto possível, o que se relaciona com sua função social, pois, por vezes, para preservar o acordo de vontades, se faz necessário readequar seus termos.
A revisão do contrato por fato superveniente é prevista tanto
no Código Civil, quanto no Código de Defesa do Consumidor.
Na legislação civil, a revisão contratual por fato superveniente
compreende a imprevisibilidade e a onerosidade excessiva (teoria da imprevisão). A imprevisibilidade prevista no art. 478, do CC, deve ser entendida levando em consideração critérios pessoais dos contratantes, bem como a relação deles com o meio em que inseridos. A onerosidade ocorre quando a situação de uma das partes é extremamente desfavorável, o que geralmente acontece com a parte mais fraca da relação
No âmbito consumerista, o fato superveniente que justifica a
revisão contratual é baseado apenas na onerosidade excessiva ao consumidor (art. 6º, V, do CDC), sendo irrelevante que ela seja proveniente de fatos imprevisíveis; basta um fato novo que gerou desequilíbrio (teoria da onerosidade excessiva).
Em todo caso, o fator fundamental desta revisão é a alteração da
capacidade financeira da autora em virtude da crise de saúde pública instaurada pela pandemia da COVID-19.
É fato notório que a doença e as medidas restritivas impostas pelos
governos das três esferas afetaram diretamente a economia e, por consequência, a capacidade financeira da população em geral.
Como exposto acima, tanto a imprevisão, quanto a onerosidade
excessiva, devem ser analisadas de acordo com as particularidades do caso, representando desequilíbrio do pacto firmado, impondo severos prejuízos a uma parte em detrimento da outra.
Acontece que a situação posta na atualidade atingiu todos os
setores, não excluindo a ré, instituição financeira, também afetada pela inadimplência dos seus devedores. A intervenção judicial em contrato privado é medida excepcional, admitida em situações específicas e devidamente comprovadas. A teoria da imprevisão constitui-se em fundamento que autoriza a relativização do pacta sunt servanda e, pois, a mitigação da vontade contratual, mas exige a demonstração clara de que um fato absolutamente imprevisível tenha sido suficiente para deixar um dos contratantes em situação de onerosidade excessiva, enquanto a parte contrária passa a se beneficiar de extrema vantagem.
Mesmo no contexto atual da pandemia COVID-19, em que toda a
sociedade sofre os impactos na área da saúde, bem como no setor social e econômico, é necessária a demonstração não apenas de que quem pretende a revisão do contrato esteja sofrendo sérios prejuízos financeiros, mas também de que a parte contrária esteja se beneficiando da situação. Os efeitos adversos da pandemia atingem a todos, isto é, numa relação contratual afetam tanto o contratante, quanto o contratado, e não se deve revisar as obrigações de uma parte em detrimento da outra.
Diante desse cenário é que a improcedência se impõe.
Seja diante da relação consumerista, seja sob o âmbito da
legislação civil ordinária, não há dúvidas de que a alteração da economia impôs ônus a autora e à instituição financeira ré, pelo que não pode a autora se socorrer do judiciário para pleitear a legitimação de sua mora, pretendendo a suspensão e, por conseguinte, a prorrogação do contrato às expensas da ré.
Nesse sentido, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São
Paulo já se pronunciou sobre o tema:
(...)
Destarte, a eclosão em si da pandemia não pode servir de escusa
para o indiscriminado descumprimento de obrigações previamente contratadas, notadamente por se tratar de evento imprevisível que atinge negativamente ambas as partes contratantes, e não exclusivamente uma delas, não havendo que se falar em aplicação da teoria da imprevisão ou do cabimento da revisão por onerosidade excessiva.
Assim, não havendo qualquer elemento a autorizar a revisão
forçada do contrato para suspender as parcelas do financiamento, a improcedência é medida que se impõe."
No presente recurso, a autora/apelante reedita a tese de cabimento
da revisão do contrato firmado entre as partes, em razão da "onerosidade excessiva", decorrente da crise de saúde pública instaurada pela pandemia do COVID-19.
A hipossuficiência do consumidor e o comprometimento da
capacidade de pagamento da apelante, qualificada como "manicure", não correspondem, necessariamente, à probabilidade do direito alegado para a suspensão e alteração do contrato celebrado.
A situação atual de pandemia requer solução adequada no âmbito
coletivo, e por meio de políticas públicas concertadas para enfrentamento da crise em âmbito nacional.
Conforme sabido, o Conselho Monetário Nacional, em razão da
pandemia da COVID-19, tem orientado as instituições financeiras no sentido de sobrestar a exigibilidade das prestações de contratos de financiamento.
A despeito dos efeitos maléficos à economia, decorrentes da
pandemia da COVID-19, inviável sua invocação, de forma genérica, sem qualquer comprovação documental, com vistas à suspensão ou revisão dos contratos em curso.
No caso em apreço, verifica-se estar a pretensão autoral lastreada
na necessidade de suspensão (pedido de tutela antecipada antecedente - ordem 02) e, posteriormente, de revisão do contrato (emenda da inicial à ordem 35), em decorrência de superveniente onerosidade excessiva, em razão de impedimento de pagamento, decorrente da pandemia.
A Teoria da Imprevisão encontra fundamento normativo nos
artigos 478 a 480, do Código Civil, nos seguintes termos:
"Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a
prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Art. 479. A resolução poderá ser evitada, oferecendo-se o réu a
modificar equitativamente as condições do contrato.
Art. 480. Se no contrato as obrigações couberem a apenas uma das
partes, poderá ela pleitear que a sua prestação seja reduzida, ou alterado o modo de executá-la, a fim de evitar a onerosidade excessiva."
Portanto, para o acolhimento da pretensão de resolução ou de
revisão do contrato, com fundamento na aplicação da Teoria da Imprevisão, imprescindível a demonstração da onerosidade excessiva para uma das partes, com extrema vantagem para a outra, e, ainda, a o desequilíbrio contratual em razão de acontecimento extraordinário e imprevisível.
Sobre o tema, já decidiu este E. Tribunal de Justiça:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO DE REVISÃO
CONTRATUAL - TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA - PLEITO DE ALTERAÇÃO DO VALOR DAS PARCELAS PREVISTAS NO CONTRATO DE FINANCIAMENTO FIRMADO ENTRE AS PARTES - TEORIA DA IMPREVISÃO - NECESSIDADE DE PRESENÇA DE CIRCUNSTÂNCIAS OBJETIVAS - FATO SUBJETIVO - REQUISITOS DO ART. 300, DO CÓDIGO DO PROCESSO CIVIL NÃO PREENCHIDOS - RECURSO NÃO PROVIDO. - Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, a concessão da tutela de urgência condiciona-se à coexistência de elementos que evidenciem a probabilidade do direito invocado e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo. - A teoria da imprevisão somente poderá ser aplicada ante a ocorrência de acontecimentos supervenientes e imprevisíveis que acarretem onerosidade excessiva para uma das partes, gerando um desequilíbrio contratual. - Ausente o indispensável requisito de probabilidade do direito invocado pela parte autora, não há como se deferir a medida de urgência requerida, consistente na redução do valor das parcelas previstas no contrato de financiamento firmado entre as partes." (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv XXXXX-4/001, Relator (a): Des.(a) Octávio de Almeida Neves , 12ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 08/08/2019, publicação da sumula em 12/08/2019) (grifo nosso).
Tratando, especificamente, dos reflexos da crise decorrente da
pandemia COVID-19, leciona CARMEN LÍGIA NERY:
"Pode ser que a crise advinda da COVID-19 torne demasiadamente
onerosa a prestação contratual para uma das partes e extremamente vantajosa para a outra. Não se discute base subjetiva do negócio jurídico (que diz de perto com o conteúdo volitivo do contrato), mas sim a base objetiva do contrato, que respeita sua base ético-econômica. Nesse caso, o juiz é chamado a integrar a causa, modificando-a, para que se ajuste às cláusulas gerais de boa-fé, função social do contrato, proibição de enriquecimento ilícito etc. A consequência disso é que se o juiz entender que os efeitos derivados da pandemia do coronavírus justificam sua intervenção na modificação da causa do negócio jurídico, os efeitos do contrato também se modificam necessariamente". (Notas introdutórias sobre a repercussão da COVID-19 no direito brasileiro [livro eletrônico]. Ana Cláudia Guimarães [et.al]. 1ª. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020). Anote-se, por oportuno, que, embora prorrogado até 31 de dezembro de 2021 o estado de calamidade pública declarado no art. 1º do Decreto Municipal nº 17.334, de 20 de abril de 2020 (Decreto nº 17.635/2021), é de conhecimento geral a retomada das atividades de prestação de serviços em Belo Horizonte.
Ademais, não restou demonstrado nos autos a manutenção do
impedimento de realização da atividade laborativa exercida pela autora, registrado no documento de ordem 05, relativo ao início do ano de 2020.
Por outro lado, cumpre observar que a pretensão revisional de
contrato, manifestada pela autora, ora apelante (ordem 35), está lastreada, apenas, na ocorrência da onerosidade excessiva, não se indicando no contrato, especificamente, qualquer clausula ilegal ou abusiva.
Data venia, malgrado não haver a autora demonstrado a
manutenção da situação de onerosidade excessiva (desequilíbrio contratual) decorrente da crise econômica causada pela pandemia da COVID-19, esta restou inicialmente comprovada, justificando o deferimento do pedido de tutela antecedente, para sobrestamento das prestações do contrato.
Em caso semelhante, inclusive, já decidiu esta egrégia 12ª Câmara
Cível:
"AGRAVO DE INSTRUMENTO - REVISIONAL DE CONTRATO
BANCÁRIO - CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE VEÍCULO - PANDEMIDA DA COVID-19 - TEORIA DA IMPREVISÃO E ONEROSIDADE EXCESSIVA - RECONHECIMENTO - SUSPENSÃO DA COBRANÇA DAS PARCELAS - CONCEDIDA - DELIMITAÇÃO DO PERÍODO - NECESSIDADE. Deve ser concedida a tutela provisória de urgência de natureza cautelar ou antecipada, nos termos do artigo 300 do CPC, quando comprovados elementos que evidenciem a probabilidade do direito invocado pelo autor, somado ao perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo. Orienta a jurisprudência do STJ que a intervenção do Poder Judiciário nos contratos, à luz da teoria da imprevisão ou da teoria da onerosidade excessiva, exige a demonstração de mudanças supervenientes nas circunstâncias iniciais vigentes à época da realização do negócio, oriundas de evento imprevisível (teoria da imprevisão) ou de evento imprevisível e extraordinário (teoria da onerosidade excessiva)( AgInt no REsp XXXXX/SP; AgInt no AREsp XXXXX/PR). A situação de pandemia de Covid-19 permite a aplicação da teoria da imprevisão e da onerosidade excessiva, em sede de cognição sumária, frente à situação extraordinária experimentada pelo consumidor, afetado pela ausência de condições de exercer seu labor, e falta de condições financeiras para arcar com a integralidade de parcelas anteriormente convencionadas, a que não deu causa. Deve ser delimitado o período de suspensão da mora, de modo que, depois do prazo de sua limitação recairão sobre o consumidor todos os efeitos decorrentes do não pagamento das parcelas vencidas e a vencer." (TJMG - Agravo de Instrumento- Cv XXXXX-3/001, Relator (a): Des.(a) José Augusto Lourenço dos Santos , 12ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 17/12/2020, publicação da sumula em 11/01/2021).
Anote-se, oportunamente, não haver a ré/apelada sequer se
insurgido contra a decisão que concedeu a tutela requerida, da qual se extraem os seguintes fundamentos, verbis:
"O pedido de concessão da tutela deve ser deferido, vez que
entendo presentes os requisitos legais, porque a alegada pandemia, diante das restrições impostas pelas autoridades públicas para a circulação de pessoas e funcionamento de estabelecimentos comerciais, deve ser reconhecida como força maior, capaz de impactar as relações negociais, ao ponto de se impossibilitar que grande parte dos devedores não possa cumprir a tempo e modo as suas obrigações, como alegado pela autora, o que deverá ser comprovado no curso do processo. Impende reconhecer que o mesmo fato também e por certo impacta as condições da ré, como todas as demais pessoas e instituições do país, que muito provavelmente também foram atingidas em suas finanças, o que, entretanto, deve ser considerado, analisado e comprovado caso a caso. É relevante dizer que entendo, em princípio, que a autora encontra-se de boa fé, tanto que reconhece livremente a dívida e se dispõe a retomar o pagamento tão logo cessada a excepcionalidade da pandemia.
Assim sendo defiro a tutela de urgência, nada obstante a
necessidade de emenda da inicial, para suspender a mora e os seus efeitos, com relação ao contrato de financiamento de veículo objeto do pedido, desde o dia 20 de março de 2020, até que ocorra a cessação do denominado estado de calamidade no município de Belo Horizonte-MG ou até 30 dias depois da liberação, por parte do município, do exercício das atividades da autora, o que ocorrer primeiro.
Diante disso, embora não mais se vislumbre a necessidade de
suspensão do contrato, diante a comprovação da onerosidade excessiva decorrente da pandemia da COVID-19, motivadora do deferimento da tutela cautelar antecedente, impõe-se o parcial acolhimento do pedido, para o fim de afastar os efeitos da mora, durante o período no qual sobrestado o contrato por força da decisão antecipatória proferida nestes autos.
No tocante à pretensão indenizatória, a responsabilização civil
impõe, para ser acolhido o pedido de reparação de danos, que o autor comprove a prática de ato ilícito pelo réu e o nexo de causalidade entre sua conduta e o dano concretamente demonstrado.
Nesse sentido, já decidiu este E. Tribunal de Justiça:
"APELAÇÃO. AÇÃO REVISIONAL DE CARTÃO DE CRÉDITO
CONSIGNADO. TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOS. - O pacto referente à tarifa de juros remuneratórios somente pode ser alterado se reconhecida sua abusividade, em cada hipótese, perante a tarifa média de mercado. - À luz dos artigos 186 e 927 do Código Civil, o êxito da demanda indenizatória vincula-se à presença cumulativa dos seguintes requisitos: a) dano ou lesão a bem jurídico de terceiro; b) ação ou omissão culposa do agente; c) relação de causalidade entre o comportamento do agente e o dano causado. Considerando que os juros cobrados estavam amparados em permissivo contratual, ausente um dos requisitos da responsabilidade civil, qual seja, o ato ilícito. (TJMG - Apelação Cível XXXXX-1/001, Relator (a): Des.(a) Cláudia Maia , 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 02/07/2020, publicação da sumula em 02/07/2020).
Reitera-se, no tocante, não se insurgir a autora, especificamente,
em ralação às cláusulas contratada, mas, apenas, à situação imprevisível causada pela pandemia da COVID-19, cujos efeitos, evidentemente, não podem ser imputados à apelada.
Ademais, embora alegue a ocorrência de suposto reajuste indevido
de R$ 16,82 (dezesseis reais e oitenta e dois centavos), elevando o valor da prestação para R$ 828,82 (oitocentos e vinte e oito reais e oitenta e dois centavos, o referido valor vem sendo pago pela autora desde o início da contratação (ordem 07).
Assim, não demonstrada a ocorrência de ilegalidade na
contratação, o reconhecimento da aplicação da teoria da imprevisão, para fins de sobrestamento dos efeitos da mora em contrato bancário, não caracteriza a prática de ilícito, impondo-se a rejeição do pedido de indenização por danos morais.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO,
julgando parcialmente procedentes os pedidos iniciais, para sobrestar o vencimento das prestações relativas ao contrato de ordem 08 (Cédula de Crédito Bancário nº 351618815), desde o dia 20 de março de 2020, até a revogação da decisão de deferimento do pedido de tutela cautelar antecedente, implementada pela r. sentença de ordem 60.
Em razão da sucumbência, condeno as partes, em igual proporção,
ao pagamento das custas processuais, inclusive as recursais, e de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa, mas suspensa a exigibilidade da cobrança em relação à autora/apelante, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC/2015.
Deixo de fixar honorários com fundamento do art. 85, § 11, do CPC,
considerando-se o parcial provimento da apelação ( REsp nº 1.539.725).
DES. JOSÉ AUGUSTO LOURENÇO DOS SANTOS - De acordo
com o (a) Relator (a).
DESA. JULIANA CAMPOS HORTA - De acordo com o (a) Relator