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Copyright © 2022 by AllBook Editora.

Direção Editorial: Beatriz Soares


Tradução: Ana Carolina Consolini
Preparação e Revisão: Clara Taveira e Raphael Pelosi Pellegrini
Capa original: Helen Williams
Adaptação de Capa,
Cristiane [Saavedra Edições]
Diagramação e Produção Digital:

Todos os direitos reservados e protegidos pela lei 9.610 de 19/02/1998. Nenhuma


parte deste livro, sem autorização prévia por escrito da editora, poderá ser
reproduzida ou transmitida sejam quais forem os meios empregados: eletrônicos,
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autor foram declarados.

Esta obra literária é ficção. Qualquer nome, lugares, personagens e incidentes


são produto da imaginação do autor. Qualquer semelhança com pessoas reais,
vivas ou mortas, eventos ou estabelecimentos é mera coincidência.

Texto de acordo com as normas do Novo Acordo Ortográfico da Língua


Portuguesa
(Decreto Legislativo nº 54, de 1995)
CIP - BRASIL. C P
S N E L , RJ
C D H -B - CRB-7/6472

B886j
Bromberg, K.
A jogada [recurso eletrônico] / K. Bromberg ; tradução Ana Carolina
Consolini. - 1. ed. - Rio de Janeiro : Allbook, 2022.

Tradução de: The catch


Sequência de: O jogador
Modo de acesso: word wide web

ISBN: 978-65-86624-72-4 (recurso eletrônico)

1. Ficção americana. 2. Livros eletrônicos. I. Consolini, Ana


Carolina. II. Título. III. Série.

22-75568
CDD: 813
CDU: 82-3(73)

DIREITOS CEDIDOS PARA ESTA EDIÇÃO À ALLBOOK EDITORA


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AOS ROMÂNTICOS INCURÁVEIS:
Algum dia vocês vão encontrar alguém que ame as partes
de vocês que ninguém soube amar.
SUMÁRIO
CAPA

CRÉDITOS

DEDICATÓRIA

01
SCOUT

02
EASTON

03
SCOUT

04
EASTON

05
SCOUT

06
EASTON

07
SCOUT

08
EASTON
09
SCOUT

10
SCOUT

11
EASTON

12
SCOUT

13
SCOUT

14
EASTON

15
SCOUT

16
SCOUT

17
SCOUT

18
EASTON

19
SCOUT

20
EASTON

21
SCOUT

22
SCOUT

23
SCOUT

24
SCOUT

25
SCOUT

26
EASTON

27
SCOUT

28
SCOUT

29
EASTON

30
EASTON

31
SCOUT
32
SCOUT

33
SCOUT

34
SCOUT

35
EASTON

36
SCOUT

37
SCOUT

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SCOUT

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SCOUT

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SCOUT

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EASTON

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SCOUT

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SCOUT

45
SCOUT

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EASTON

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SCOUT

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SCOUT

49
EASTON

50
SCOUT

51
EASTON

52
SCOUT

EPÍLOGO
5 ANOS DEPOIS

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ALLBOOK EDITORA
SCOUT

O QUE EU ACABEI DE FAZER?


Minhas mãos tremem.
Não fiz apenas com Easton, mas comigo também.
Eu fecho as mãos para esconder o tremor dos homens que estão
na minha frente.
Com a promessa que fiz ao meu pai.
Calafrios me atingem no couro cabeludo. Puxam meu cabelo.
Torcem meu coração. O estômago se agita e a bile sobe pela
garganta.
O relógio. Os ponteiros continuam se movendo. Minutos passam.
Mas sinto como se o tempo tivesse parado quando digo essas
palavras.
Easton não está cem por cento pronto para retornar e ser
reintegrado à equipe. Ele não vai cumprir o prazo.
As expressões de choque. Os olhos arregalados. O movimento
repentino da cadeira de Cory quando ele saiu da sala, os dedos no
celular, me deixando com nada além de esperança de ter feito a
coisa certa quando cada parte de mim se irritou contra isso. Disse
que eu estava errada. Que interpretei mal o que vi.
Mesmo assim eu sabia o que tinha visto.
Então as perguntas começaram.
Cada minuto que passa faz com que mais dúvidas surjam para
quebrar minha certeza.
As malditas perguntas intermináveis.
A lista de pessoas que estou decepcionando cresce a cada
momento.
Ter de falar sobre Easton quando tudo que eu quero fazer é ir até
ele.
Vê-lo. Explicar tudo. Tocar nele para que eu possa acalmar sua
raiva.
Ter de explicar por que falhei. Porque a equipe de Doc Dalton
falhou.
Os ponteiros do relógio continuam a funcionar. Segundos se
transformam em minutos. Minutos que eu quero pegar de volta.
Minutos que não consigo recuperar.
Cory, de volta à sala agora, sussurra com o homem ao lado dele
enquanto os outros ao redor da mesa me encaram.
Esperando.
Especulando.
Imaginando.
A porta se abre. O som dela batendo contra a parede ricocheteia
pela sala, mas não tem nada a ver com o meu coração batendo
contra minhas costelas.
Ele já sabe.
Por uma fração de segundos nossos olhos se encontram. Eu
vejo a dor. A raiva. As perguntas.
E ele nem sabe que fui eu quem causou isso.
— Easton. — Seu nome é um apelo chocado pedindo perdão
quando minha consciência culpada grita com ele que é minha culpa.
Mas assim que nossos olhares se cruzam, ele balança a cabeça.
— Não faça isso. — É tudo o que ele diz, o aviso é tão claro
quanto a repulsa em sua expressão.
Estou em estado de choque. Por tudo que aconteceu. De vê-lo.
Por ter de enfrentar as consequências do que acabei de fazer. E
antes que eu possa processar o que dizer a ele na frente desses
homens, Easton fala.
— Uma troca? A porra de uma troca? — Sua voz reverbera no
pequeno espaço e comanda a atenção dos homens sentados à
mesa. Ele está parado lá, o equipamento de jogo ainda colocado, a
expressão uma máscara de descrença. — Eu dei minha carreira a
esta organização. Eu recusei contratos maiores e mais chamativos
para ir para outras equipes, e é assim que você retribui minha
lealdade? — Sua risada contém qualquer coisa, menos diversão. —
Bem, vá se foder, Cory. Foda-se você e tudo que está tentando
fazer aqui.
— Estou apenas tentando gerenciar uma equipe, sr. Wylder. — A
voz de Cory é calma, com até mesmo uma sugestão de
condescendência que arranha minha pele.
— Gerenciar uma equipe… ou arruinar uma equipe? — Easton
dá um passo para mais perto, ombros retos, postura ameaçadora.
Seu dedo bate na mesa a cada palavra que pronuncia: — Você
acha que é assim que se trata os jogadores para que eles ganhem
uma World Series e para que você possa ganhar seu pequeno
bônus? Pense outra vez.
— Boa sorte com o seu futuro time. — Cory lhe dá uma dispensa
com um aceno de cabeça.
Easton ferve. Compreensível. Sua raiva é tão palpável, que
sufoca a sala.
Eu espero com sangue nas mãos e culpa em meu coração.
— Você é um filho da puta sem coração, sabia disso? — Easton
o despreza enquanto suas mãos se fecham ao lado do corpo.
— Então você ficará feliz por não ter que trabalhar mais para
mim. Tenha um bom dia, sr. Wylder.
Ninguém na sala se mexe enquanto os dois homens se encaram.
Um, a imagem da arrogância e calma, e o outro, uma massa de
fúria contida.
Vários segundos tensos se passam quando questiono se Easton
vai liberar essa fúria em Cory. Quando estou convencida de que ele
fará isso, Easton balança a cabeça bem lentamente enquanto
encontra os olhos de todos os outros na sala, exceto os meus, antes
de virar as costas e sair da sala.
Meu coração vai embora com ele.
Meus pés também querem sair desesperadamente. Eu luto
contra a vontade de fazer apenas isso — me levantar, correr atrás
dele, explicar tudo —, mas não posso. Eu tenho de ser profissional
— aquela que é o rosto de uma empresa, e não uma mulher que
teme ter acabado de ferrar com o homem que ama.
Ama?
Ama.
Puta merda. Eu realmente o amo.
— Desculpe pela interrupção, sra. Dalton — diz Cory, me
distraindo da minha revelação e puxando minha atenção de volta
para o assunto em questão. Aos olhos deles, eu não cumpri meu
contrato e, portanto, deixei de realizar o desejo final do meu pai.
Cory continua falando, mas eu não o ouço.
Eu vejo a dor nos olhos de Easton.
Eu ouço sua voz em meus ouvidos.
O. Que. Você. Faria. Scout?
A resposta, Easton?
Eu me sacrificaria para te salvar.
Eu apenas fiz isso.
Só espero que ele pense da mesma maneira.
EASTON

AS NOTAS DE ABERTURA DO GUNS N’ ROSES ENCHEM O ESTÁDIO ACIMA


introdução da música — música que sempre ouvi cada vez que
entrava em campo durante minha carreira — é como sal na ferida.
Welcome to the jungle…
O que diabos está acontecendo?
Eu preciso dar o fora daqui.
Eu não consigo respirar.
Eu quero socar alguma coisa.
Eu não consigo pensar com a música me lembrando onde eu
deveria estar bem agora — no campo — com a camisa do time que
uso desde criança e que agora não usarei mais.
Ando pelos corredores vazios, desesperado para me livrar do
que de repente parece uma prisão de concreto tentando me segurar
e me tirar as coisas que amo.
— É verdade então.
Suas palavras me param no meio do caminho.
— Você sabia?
A acusação enche minha voz, e eu não dou a mínima, porque
cada parte de mim está implorando para ele dizer “não” e para eu
acreditar nisso.
— Não.
Eu obtenho a resposta que queria. Fico olhando para ele,
querendo acreditar.
Precisando saber que pela primeira vez eu sou mais importante
do que o jogo para ele; ainda assim pergunto a ele novamente.
— Não?
— Você não acredita em mim? — O tom de sua voz aumenta.
— Sim. Não. Porra. — Eu ando alguns metros para longe dele,
levanto o boné para passar a mão pelo cabelo e expiro pelo que
parece ser a primeira vez na última hora. Eu me viro para encará-lo,
mãos estendidas, olhos suplicantes. — Que porra é essa, pai?
É uma pergunta vaga, para indagar como isso aconteceu. Eu sei,
e ainda assim quero que ele responda, porque estou perdido e
porque nem comecei a processar minha nova realidade ainda.
O hino nacional começa a tocar, e pela primeira vez na minha
vida como um jogador, não tiro o boné nem coloco a mão sobre o
coração. Eu simplesmente não tenho forças para fazer isso.
— Qual time? — Sua voz soa tão solene quanto a minha.
— Nenhuma pista. Finn está a caminho para obter respostas. —
Eu rio, mas parece uma risada vazia.
— Por que Finn não estava lá? — Seus olhos se estreitam,
combinando com a confusão em sua voz.
— Sei tanto quanto você. — Caminho por alguns metros e depois
viro de volta para encará-lo. — Eles me negociaram, mas não temos
pista para qual equipe ainda… Então, o que isso te diz?
Sua sobrancelha franze, e ele continua a me observar, a mente
percorrendo o mesmo lamaçal que o meu em um loop infinito.
— Que Cory não esperava iniciar uma negociação.
— Bingo! — grito, batendo as mãos. — Então que porra está
acontecendo, pai?
— Vai ficar tudo bem, Easton. — Sua voz parece menos
convincente.
Eu olho para ele com muito a dizer, mas com a cabeça bastante
confusa.
Não consigo encontrar palavras para me expressar.
A multidão ruge acima de nós, e o grito ecoa até o buraco
infernal onde estou atualmente. A parede parece muito tentadora
para se socar.
Mesmo sendo feita de blocos de concreto.
Eu caminho para frente e para trás enquanto a trilha sonora da
minha vida toca no estádio ao meu redor. Um lugar ao qual não
pertenço mais.
Eu preciso dar o fora daqui antes de fazer algo do qual vou me
arrepender.
Foda-se isso tudo.
— Estou caindo fora.
SCOUT

“PRECISAMOS DE TEMPO PARA CONSIDERAR EM QUE PONTO SEU C


encaixano esquema após esta reviravolta inesperada. Vamos nos
reunir amanhã de manhã às oito, depois de eu ter conferido tudo
com meus colegas.”
Estou entorpecida.
Isso é tudo que eu senti durante a inquisição de uma hora de
Cory sobre o motivo de Easton não estar cem por cento. Mentiras.
Minhas respostas foram todas mentirosas, mas foram as únicas
coisas que pude dizer para apoiar minhas descobertas.
Vazio total.
Estou vomitando no banheiro. Os nervos finalmente me
venceram. Luto para manter o almoço que compartilhei com Easton
mais cedo em vez de simplesmente jogar tudo para fora.
Absolutamente cansada.
Corro pelo labirinto de corredores do estádio.
Em algum lugar acima da massa de concreto, um jogo acontece.
Menininhos com seus pais. Famílias em passeio. Primeiros
encontros. Momentos felizes.
O jogo em que ele deveria fazer seu retorno.
Só consigo pensar em Easton.
Chegar perto dele.
Falar com ele.
Preciso de sua aprovação, preciso que ele me diga que fiz a
coisa certa.
Eu aperto na rediscagem novamente. Seu nome pisca na tela,
mas é a caixa-postal que atende. Não ele.
Eu pensei que iria virar nossas vidas de cabeça para baixo hoje,
mas de uma forma totalmente diferente. Ele viajaria com a equipe
por todo o estado.
Eu estaria aqui, reabilitando os caras machucados. A rotina diária
a que nos acostumamos se tornaria definitiva. Nós teríamos que
descobrir uma nova forma de fazer tudo dar certo, mas pelo menos
estaríamos no mesmo lugar, trabalhando para a mesma equipe.
Nem em um milhão de anos imaginei que estaríamos fazendo
isso em diferentes cidades.
Eu me surpreendo com a luz do sol quando saio dos túneis para
o estacionamento exclusivo para jogadores e funcionários. Estou tão
exausta, tão desorientada emocionalmente, que para mim já é meia-
noite. Assim que chego ao meu carro, meu telefone toca.
Desesperada para falar com ele, respondo sem olhar.
— Easton! — Seu nome é uma lufada de ar.
— O que diabos aconteceu lá, Scout?
Ele sabe.
— Pai. — Cada parte de mim desmorona em derrota. Enquanto
meu pai é a única pessoa com quem eu deveria estar mais
preocupada, tenho ligado furiosamente para Easton em vez de ligar
para ele para explicar o que aconteceu.
— Estou ouvindo rumores. O que diabos aconteceu lá?
Meus pés e palavras vacilam sabendo o que tenho de dizer a ele,
mas nem eu tenho certeza do que contar. Parece surreal para mim.
— É uma longa história… — Começo a subir no carro e continuo
contando a ele a versão resumida, sabendo quão ridículo isso soa
até para os meus próprios ouvidos.
Quando termino, a linha cai em um silêncio opressor que pesa
tanto em mim quanto o calor de Austin batendo no para-brisa do
carro.
— Estou desapontado. — Seu tom de barítono profundo ressoa
pela linha, seguido pelo frágil chiado de sua respiração.
Força cobrindo a fraqueza devastadora por baixo.
Mais ou menos como eu me sinto.
— Eu fiz o que achei certo. — Minha voz é quase um sussurro
quando falo, e lágrimas ameaçam cair depois de ouvir essas duas
palavras que toda criança odeia que seus pais digam: Estou
desapontado.
— O certo? — ele pergunta. — Certo para você ou certo para
Easton?
— Pai…
— As pessoas, principalmente os homens, vêm e vão em sua
vida, mas a família sempre estará por perto. Você precisa cuidar do
que é seu primeiro. Sempre.
O ardor de suas palavras é brutal, e agora eu o odeio por ter dito
isso. Eu o odeio por me fazer questionar minha escolha. Questionar
minha lealdade aos dois homens da minha vida.
Meu estômago embrulha, mas não digo uma palavra.
— Mentir é uma das maneiras mais rápidas de arruinar um
relacionamento — diz ele, e não tem ideia do quanto essas palavras
apertam meu coração, porque temo ter arruinado dois
relacionamentos: com Easton e com os Ace.
— Não foi o…
— Eu te pedi uma coisa, Scout. Não me ligue de volta até que
você possa me dizer que conseguiu.
— O quê? — eu grito quando o pânico se instala. — Espere! Não
desligue. Como? Quer dizer, o quê…?
— Você vai voltar lá amanhã e conseguir a droga do contrato.
Você tem que lutar pelo que é nosso, e não os deixe pressioná-la —
ele diz com convicção antes de ser vencido por um violento acesso
de tosse.
— Você está be…?
— Você misturou negócios com prazer, Scout. Você arriscou o
contrato ao permitir que suas emoções a atrapalhassem. Corrija isso
e consiga o contrato de um ano. Não me ligue até que o tenha
assinado.
A linha fica muda, e eu fico sentada no meu carro com o telefone
preso à orelha, lágrimas escorrendo pelo rosto e dúvidas enchendo
minha alma.
Não tenho ideia de como processar as últimas duas horas.
Eu realmente acabei de arriscar cumprir o último desejo do meu
pai ao colocar Easton antes dele?
— O que eu fiz? — sussurro enquanto aperto os olhos fechados;
deixo a cabeça cair para trás, no encosto do banco, para tentar
deixar tudo assentar.
É inútil. A expressão no rosto de Easton quando invadiu a sala
de conferências e o eco das palavras do meu pai estão gravados na
mente.
E se os rumores já estão circulando, preciso chegar a Easton e
explicar a ele o que fiz e o motivo antes que a informação errada
seja jogada em seu colo. A adrenalina do momento acabou. O medo
toma seu lugar, medo de ter estragado tudo absolutamente e de
ninguém me perdoar.
Mantenha-se firme, Scout.
Uma batida na janela do motorista me assusta para caralho.
Eu levanto a cabeça e olho para o homem parado ali — camisa
branca imaculada e gravata, boca em linha reta, olhos castanhos
sérios que exigem respostas —, curvado e me gesticulando para
abaixar a janela.
— Quem é você? — grito através do vidro enquanto, sem muito
entusiasmo, tento limpar as lágrimas do meu rosto.
— Abra a droga da janela. É melhor você começar a explicar que
inferno aconteceu lá — diz ele com os dentes cerrados.
— Perdão? — De jeito nenhum vou abrir a janela para alguém
assim.
Ele se afasta da janela, com as mãos para cima, como se
acabasse de perceber o quão ameaçador parece, e as enfia nos
bolsos.
— O segurança está bem ali — diz ele levantando o queixo para
Arnie nos observando da cabine de guarda. Eu olho para ter certeza
de que ele está lá e depois de volta para o homem exigindo
respostas. Lentamente abro a porta do meu carro, porque eu sei
que tem a ver com Easton.
Parece que tudo que acontece hoje em dia tem a ver com ele.
Os cabelos da minha nuca se arrepiam — a guarda erguida, um
portão de aço para o desconhecido — quando saio do carro para
conversar com ele. Minhas sinapses falham enquanto tento conectar
os pensamentos e me localizar.
— Você não é uma Dalton. — Ele balança a cabeça. — Você
disse a Easton que ele estava bem, e então eu recebo uma ligação
informando que ele foi negociado? Você está brincando comigo,
porra? Doc sempre protegeu seus jogadores a qualquer custo. É
óbvio que você não fez isso. Que tipo de jogada está arquitetando?
O “vai se foder” que está na ponta da língua afunda na boca e
morre com o soco em forma de palavras que recebo.
— Finn? — O agente de Easton me encara e balança a cabeça.
— Por que você não estava lá?
É uma pergunta simples, mas o homem que eu desejei que
estivesse comigo há uma hora para me ajudar a entender aqueles
papéis está agora na minha frente. Eu não confiava nele. Ele
deveria ter estado lá. Ele nunca deveria ter permitido que Easton
assinasse o que vi. Um bom agente protege seu cliente por qualquer
meio necessário.
— Esta é uma boa pergunta.
Eu dou um passo para trás.
— E o que isso significa?
Ele não me respondeu.
— Por que você não me conta o que aconteceu lá, Scout?
Ele fazia parte disso?
— Havia papéis… — eu começo, mas paro. Minha pulsação bate
nos ouvidos.
Ele sabia?
— Quais papéis? — ele insiste.
A paranoia assume o controle. Lágrimas queimam no fundo dos
meus olhos enquanto questiono minha própria sanidade. Por que
não confio na única pessoa que deveria ser capaz quando se trata
de Easton?
Mas ele não estava lá.
— Eu preciso falar com Easton. — É a única coisa que me resta
dizer.
Eu fico olhando para ele por um momento — mais tempo perdido
que precisa ser gasto tentando encontrar Easton.
— Não tenho tempo para isso agora. Eu preciso de respostas.
Eu sou o agente dele, Scout. Você pode confiar em mim.
Eu penso nos papéis. A assinatura rabiscada que concordava
com tais termos ridículos. Qualquer agente que diga ao seu cliente
para assinar algo assim não deve ser confiável.
— Confiar em você? — Eu rio com um aceno de cabeça.
Ele me encara, os punhos cerrados e os músculos pulsando na
mandíbula.
— O que aconteceu naquela sala, Dalton? — ele exige e dá um
passo para mais perto, a frustração é evidente, e a postura,
ameaçadora.
— Se você estivesse lá, já saberia, e então talvez nós não
estivéssemos nesta posição, não é? — digo antes de virar e entrar
no meu carro. Minhas mãos tremem tão violentamente, que estou
feliz por ter o volante para segurar.
Ele ainda está olhando para mim enquanto eu saio do
estacionamento e rumo para o apartamento de Easton. Atravesso o
estacionamento do estádio cheio de torcedores terminando suas
bebidas antes de entrar para assistir ao jogo depois de vários
innings.
As lágrimas molham meu rosto enquanto dirijo. Eu não tenho
nada mais do que a esperança de que poderei consertar isso com
Easton, mas a dúvida que sinto é tão devastadora quanto a
expressão que estava em seu rosto. Isso toma conta da minha
alma.
EASTON

SCOUT DISSE A ELES QUE VOCÊ NÃO ESTAVA CEM POR CENTO.
As palavras de Finn ressoam em meus ouvidos. O mesmo
acontece com a risada que dei, que sumiu quando percebi que ele
estava falando sério.
Eu faço um movimento com o taco. Madeira encontra couro e
costuras vermelhas. Meu grunhido ecoa nas paredes de concreto, e
a vibração de bater na bola sobe pelos meus braços.
É por isso que ela tinha aquele olhar no rosto quando invadi a
sala de conferência. Chocada. Culpada. Para caralho.
Meu celular toca. Não para. Os repórteres são implacáveis. Mas
não tenho vontade de andar os seis metros para desligá-lo. Ou
despedaçá-lo.
Easton. A maneira como sua voz disse meu nome ecoa na minha
cabeça. Isso afoga a maneira como ela gemeu ontem de manhã.
Isso é que é jogar sal sobre a ferida.
Eu faço o movimento com o taco novamente. Outro acerto. Mas
não sinto nada além de raiva. Eu não sei de nada além da raiva.
Estou me sentindo magoado, ferido.
É tudo besteira.
Merda estúpida.
Nada disso faz sentido, exceto pela expressão dela quando fui
enfrentar Tillman. Agora isso? A culpa chocada e os olhos
arregalados.
Isso faz todo o sentido agora.
Eu dou a tacada e erro.
A TV está ligada. Os locutores discutem a velocidade da tacada
de Drew. Eu liguei a droga do aparelho, mas não consigo desligar. É
como se eu precisasse assistir Santiago atrás da minha base para
saber o que realmente está acontecendo.
É demais, porra.
Eu saio do boxe e pego a garrafa de Jameson que coloquei no
nicho atrás de mim. A ardência do uísque não tem nada a ver com o
buraco queimando meu estômago.
Eu olho para a garrafa: o pessimismo — está meio vazia. O lado
bom: pelo menos há mais anestesia líquida para me entorpecer; e
Deus, como eu preciso entorpecer a dor.
Como ela pôde?
A máquina arremessa a bola e acerta o fundo da gaiola com um
baque ao mesmo tempo em que meu celular começa a tocar
novamente. Ou talvez nunca tenha parado. Eu não consigo lembrar
porque tudo que eu fico pensando é em Scout assustada.
Eu disse a ela que estava me apaixonando — pedi a ela para
morar comigo, pelo amor de Deus, quando eu nunca ofereci isso a
ninguém antes — e ela está assustada e fugindo, caralho. Em vez
de ter a coragem de me dizer que não poderia fazer nada disso, ela
foi pelo caminho mais fácil.
Scout se livrou de mim de uma maneira diferente.
Meu peito dói para cacete. Outro gole na garrafa. Uma torção do
bastão em minhas mãos machuca e estoura as bolhas nas minhas
palmas. Eu aprecio a dor, então faço de novo enquanto volto para a
gaiola.
O lance vem. Desta vez, estou tão zangado, tão sem foco, que
erro completamente a bola. O som de bater no ar — aquele sopro —
é ensurdecedor, e me parabenizo com o alívio temporário do
barulho reverberando na cabeça.
Ela me vendeu para me afastar.
Longe da minha casa.
Longe da minha equipe.
Longe da minha família.
Longe dela.
Estou parado aqui, esperando para ver qual porra de casa nova
terei quando essa é a minha casa. Com minha gaiola de rebatidas
aqui e minha parede de janelas com vista para o estádio no andar
de cima.
Onde pensei que jogaria para sempre. Esta é a minha casa. Eu
não posso ir lá em cima, onde vou ver o que não quero. Onde o
perfume de Scout está nos lençóis da minha cama e seu batom
manchou a fronha que beijou anteontem à noite por causa de uma
piada. Agora é como um farol me fazendo questionar se isso foi
realmente um adeus.
Como se ela soubesse.
— Porra! — grito ao dar a próxima tacada, e, em seguida, ando
para longe da base com o bastão apoiado sobre os ombros, o cheiro
da máquina ainda lançando bolas a cada vinte segundos.
Como vou cuidar da minha mãe agora?
Eu tomo outro gole de Jameson. Minhas mãos doem, e o toque
do telefone é um lembrete constante de que Scout está em algum
lugar do outro lado da linha. Preciso de toda a força mental que
tenho para não pegar o bastão e destruir o telefone até que sobre
um milhão de pedaços. Não apenas para não ter que ouvir o toque
constante, mas também porque estou desesperadamente tentado a
pegá-lo e ouvir a voz dela.
Wif. Tump.
Agora eu preciso de alguém que me entenda, e porra, ela me
entende.
Quão fodido isso me torna? Minha risada salta pelas paredes de
concreto e minha própria histeria ecoa de volta para mim.
Wif. Tump.
O toque começa novamente, e eu faço a única coisa que sei
fazer para me afastar de tudo. Ignorando a pontada das bolhas nas
mãos, entro na gaiola e dou a tacada com tudo que tenho.
Grunhido. Rebatida. Na mosca.
Mais, e mais, até que meus braços pareçam de borracha e
estejam exaustos além do aceitável — mas eu ainda os sinto; então
eu bato novamente.
— Não é culpa da bola, você sabe.
Wif.
A porra do Finn.
— Me deixe em paz.
— Você já atendeu ao telefone?
— Se eu quisesse falar com você, teria atendido. Mas eu não
atendi. — Eu dou uma rebatida péssima e quase não acerto a bola.
— Vá embora.
— Era eu ou seu pai pedindo para o gerente do prédio nos deixar
entrar, e então eu percebi que você preferiria que fosse eu.
Wif. Tump. Rebatida certeira.
— Eu disse que não queria falar com você até que você tivesse
as respostas que preciso, então é melhor começar a falar ou pode
dar o fora — resmungo enquanto balanço o taco, desta vez estou
tão cansado, que poderia desmaiar aqui, mas o uísque é muito mais
tentador do que dormir.
— Estou em contato com a equipe.
Eu largo o taco e me viro para agarrar a garrafa.
— Estou em contato com a equipe — imito seu tom formal antes
de tomar outro gole. — É da minha vida que estamos falando, Finn,
não de uma droga de negociação. Então me diga, você sabe para
onde diabos eu fui mandado?
Wif. Tump. Bola no alvo.
— Nova York? Flórida? Minnesota? — Meu tom piora diante de
cada cidade. Meu humor também. — Hein, Finn? Você já tem
alguma resposta para mim? — Eu me viro para encará-lo.
Wif. Tump. Acerto.
— Você vai desligar essa merda para que eu possa me
concentrar? — ele grita.
Olhamos um para o outro através da rede da gaiola de rebatidas.
A memória de fazer amor com Scout contra essa gaiola é como
outra porra de faca nas minhas costas.
Então eu mudo o foco de volta para Finn. Ele parece exausto —
cabelos espetados, camisa amassada e desabotoada no colarinho,
olhos cansados — quando ele normalmente é sempre a imagem da
perfeição. Bom. Pelo menos eu não sou o único que parece estar no
inferno.
Wif. Tump. Acerto.
— Por que você não estava lá hoje? — pergunto a ele a mesma
coisa que já perguntei três outras vezes, precisando ver seu rosto
desta vez quando ele responder.
— Você não confia em mim? — Sua voz é fria, mas que se foda.
— Estou descobrindo que confiança e lealdade não têm muito
valor nos dias de hoje — digo com um balançar de ombros que
significa um “foda-se” bem grande.
Ele dá um passo e se aproxima, agarra a rede para deixar os
braços acima da cabeça enquanto me encara através da barreira.
— Me disseram que a reunião começaria duas horas depois do
horário normal. Eu verifiquei duas vezes todas as minhas
anotações. Minhas mensagens de voz. Disseram três da tarde. Você
tinha um jogo começando às duas, então por que a reunião seria
depois de o jogo ter começado? Eu deveria ter entendido que
estava acontecendo alguma coisa, porra. Tillman é um babaca muito
escorregadio. Eu deveria ter questionado o porquê — diz ele com
uma sacudida de cabeça, em seguida passa a mão pelo cabelo. —
E Wylder, se você me insultar novamente e questionar minha
lealdade, você pode encontrar a porra de um novo agente.
A agressividade em seu tom me surpreende e me diz
exatamente o que eu precisava saber: ele está do meu lado.
— Sim, bem, algo estava definitivamente acontecendo — digo,
ignorando sua ameaça, minha risada segue carregada de sarcasmo.
Wif. Tump. Acerto.
— Easton, por favor, desliga essa merda para que a gente possa
conversar.
Eu mantenho seus olhos nos meus por mais um segundo antes
de virar para desligar o interruptor atrás de mim. O giro suave da
máquina desacelerando preenche o espaço enquanto caminho para
silenciar o toque do celular.
A tela é preenchida por chamadas não atendidas conforme eu
passo os dedos por ela. Repórteres. Colegas de equipe. Finn. Meu
pai. Para cada ligação deles, parece haver cerca de cinco de Scout.
Caixa-postal. Mensagens de texto. A visão disso faz meu peito doer,
porque uma coisa ainda permanece viva: ela me entregou.
Eu pego a garrafa para aliviar a dor, mas deixo o celular quando
saio da gaiola de rebatidas pela primeira vez em mais de três horas.
Eu vou direto para o banheiro sem dizer uma palavra a Finn.
Quando saio, ele parece me olhar mais de perto.
— Você está um trapo.
— Sim, estou, e a culpa é minha? — Encolho os ombros,
olhando para a parede com minhas camisetas da liga infantil. É
muito mais fácil olhar para lá do que para ele. — Só estou tentando
dar sentido a uma merda que não tem sentido algum… Então
parece coerente que eu esteja dessa maneira.
— Tillman, aquele fodido.
— Isso é um elogio para ele.
— O idiota não vai falar comigo até amanhã de manhã. Eu tenho
uma reunião às nove. Uma porra de reunião às nove! — ele grita. —
Como se você fosse algum jogador medíocre em vez do jogador
que é a cara do time.
— Isso é o que eu não entendo — digo e tomo um gole. — É
como se eles não tivessem nada arranjado. Como se eles nem
esperassem me trocar.
— Isso é o que estou tendo dificuldade para compreender. Tem
que haver uma pegadinha aqui que estamos perdendo — diz
enquanto dobra os braços e inclina os quadris contra a parede. —
Em todos os meus anos, quando uma troca é feita, dizem
imediatamente para fazer as malas e seguir para a próxima equipe.
Tudo o que eles me disseram foi para você limpar seu armário por
volta das dez de amanhã.
— Antes que os caras entrem — bufo. — Que jogada de merda,
bando de covardes. Que Deus me impeça de estar lá quando a
equipe chegar para ver quão desleal a porra do seu clube é com
seus jogadores. E quanto ao Boseman? Onde diabos ele estava
nisso tudo? — pergunto sobre o dono da equipe. O homem que tem
sido como um tio para mim e não está presente quando eu mais
preciso dele.
— Ainda naquela viagem à Amazônia, se reinventando ou
alguma merda típica de bilionários. Eu deixei mais de uma dúzia de
mensagens quando soube que não vou conseguir ficar cara a cara
com aquele idiota do Tillman até amanhã.
— Merda de uruca, cara — digo enquanto arranco a garrafa de
seu alcance quando ele vai tirá-la de mim.
— Caso você não saiba, são apenas seis horas, East — diz ele,
apontando para a sala sem janelas. — Você já bebeu uma garrafa
inteira hoje. Eu preciso que você se controle. Diminua um pouco.
— Ah, é por isso que você está aqui… Para estragar toda a
minha diversão?
Eu reviro os olhos.
— Eu preciso de você um pouco sóbrio de manhã.
Eu fico olhando para sua mão estendida, depois, com meus
olhos nos dele, lentamente levanto a garrafa até os lábios num ato
de rebeldia e sorrio.
— Não é como se eu tivesse que ir trabalhar ou fazer alguma
coisa do tipo.
— Nunca se sabe. Eles poderiam fazer você entrar em um avião
logo de manhã e te mandar para Deus sabe onde…
— Essa é a porra da questão aqui, Finn. Deus. Sabe. Onde.
Você sabe? — grito com ele, os braços estendidos para os lados, a
paciência, e o que parece ser minha sanidade, se foi horas atrás. —
Porque eu não sei merda nenhuma. E você também não. Quer
dizer, isso é tão fodido de tantas maneiras, e…
— Olha, eu sei que você está chateado, mas temos que fazer o
melhor…
— Chateado? — grito com toda a força dos meus pulmões. A
tentação de jogar a garrafa é mais forte do que a vontade de beber.
— Eu dei a porra da minha alma e a porra do meu coração aos
Aces, e para quê? Para quê? — É como se um tornado de raiva
estivesse passando por mim. — Para ser negociado?
— Eu sei, cara. Eu sei. Também não faz sentido para mim. Eu
estou com seu pai colado na minha bunda, a imprensa respirando
no meu pescoço e Scout se recusando a falar com qualquer pessoa
além de você. E enquanto isso, a porra da administração do clube
está aproveitando esse tempo para soltar os detalhes de sua troca.
Nunca vi nada assim.
Meus pés param quando ouço seu nome. A traição ainda é
recente e confusa, e não sei o que diabos pensar sobre isso, então
eu me levanto, depois sento e fico em pé novamente, incapaz de
permanecer parado.
O sorriso e o beijo que me deu quando saiu da minha casa mais
cedo está queimado na mente. Por que ela mentiria?
Mudo de assunto, porque não consigo mais pensar nela.
— E quanto à minha mãe? Como vou cuidar dela se vou…
— Nós vamos descobrir uma forma.
— E encontrar um lugar para morar…
— A maioria das equipes tem um bairro onde os caras em
transição ficam…
— E tem a… — E tem a porra da Scout.
Ou melhor, tinha a Scout.
Eu preciso me mexer para tentar diminuir o tamanho da revolta
no peito, sabendo que, independentemente do que tenha acontecido
entre nós, acabou. Finn me deixa em paz até que eu paro, deixo a
cabeça cair para frente e tento controlar tudo.
Sua mão está no meu ombro, apertando-o num gesto de apoio.
— Vamos lá para cima. Vou pegar algo para você enquanto toma
banho. Então nós podemos conversar um pouco mais se quiser. Ou
não.
— Nah. Estou bem.
Não tenho estômago para subir nas próximas horas. As luzes do
estádio estarão acesas para a equipe de limpeza. A última coisa que
eu preciso ver é como iluminam o céu, me lembrando do jogo que
perdi. O jogo que deveria ser o do meu retorno ao campo. Some
isso ao fato de eu não estar nem perto da condição ideal para
enfrentar as muitas peças de roupa e outras coisas que Scout
espalhou pela minha casa.
Afastando sua mão, começo a me mexer novamente.
— Vamos, me deixa pedir comida para você. Eu vou pegar um
pouco de sushi do seu restaurante favo…
— Não! — Mais drogas de memórias vêm à mente.
Scout no sofá experimentando sushi pela primeira vez. Scout
sentada entre minhas pernas assistindo a um filme. Scout lendo os
papéis dos biscoitos da sorte com a real probabilidade da minha
troca ser um pesadelo.
— Eu não estou com fome.
— Vamos, me deixa ajudar com alguma coisa, East — ele
implora.
— Descubra o que está acontecendo.
— Estou tentando…
— Eu sei, eu sei. Eu simplesmente não entendo por que ela
mentiu e disse que eu não estava cem por cento quando ontem à
noite, Jesus Cristo, hoje de manhã, porra… — eu falo mais para
mim do que para qualquer outra pessoa, perdendo a noção do
tempo nesta tumba de concreto. — Ela me disse que mal podia
esperar para me ver em campo novamente.
— Você dormiu com ela? — Finn pergunta enquanto começa a
juntar as peças através das minhas palavras. Acho que acabei
dando mole. Eu paro de andar por um momento e ignoro sua
pergunta.
— E se eles mudaram os termos do contrato dela? — Desvio
quando alcanço a base de lançamento e me viro. — E se eles
contaram a ela que Doc Dalton não conseguiria o contrato da
equipe?
— Eu pensei que você a tolerava apenas. — Ele vai mais a
fundo, ignorando minhas perguntas. — Eu pensei que você fosse
colocar aqueles seus fones de ouvido e escutar um dos seus
malditos audiolivros para passar o tempo para que não tivesse que
lidar com ela. O que diabos aconteceu, Easton?
Finn bloqueia meu caminho, e eu passo ao seu redor, mas não
antes que estenda a mão para agarrar meu bíceps. Meu braço
oposto está inclinado para trás, em um segundo o punho está pronto
para um soco. Meu humor está cansado de ser posto à prova.
Finn não vacila, embora eu precise muito obter algum tipo de
reação dele. Em vez disso, ele apenas mantém seu olhar no meu
por um momento antes de olhar para o meu punho, e depois de
volta para os meus olhos, levantando as sobrancelhas.
— Por favor, me diga que você não foi regiamente sacaneado
por sua fisioterapeuta por causa de algum tipo de vingança de
amante desprezada.
Eu abaixo o braço lentamente e esfrego o rosto, mas não
respondo.
— Você está brincando comigo? — pergunta com uma risada
incrédula enquanto viro as costas para ele e olho para uma foto do
meu pai e eu, ambos em nossas camisas dos Aces, no último dia
em que dividimos o campo juntos antes de ele se aposentar. Finn
geme, e eu posso segui-lo através do som que faz. — O que
aconteceu? Você se divertiu e depois acabou com tudo enquanto
ela esperava ir para algum lugar além do arco-íris com você?
— Não exatamente. — A visão de Scout em pé no meu quarto,
empurrando uma chapinha de cabelo em sua bolsa, com aqueles
sapatos sensuais e aquele sorriso tímido nos lábios, que ficaram
chocados e formaram um perfeito “O” quando eu pedi que morasse
comigo, preenche minha mente.
— Então o quê? Me dá a porra de uma pista, East, para que eu
saiba com o que estou lidando.
— Deixe pra lá.
— Não. Eu não vou deixar pra lá — diz ele, chegando na minha
cara e arrancando a garrafa da minha mão. — Este é o meu
trabalho. Revirar toda essa merda, para que eu possa descobrir o
próximo passo enquanto você entra em campo onde diabos
mandarem você. É assim que funciona. Então que porra aconteceu
aqui, Easton? Porque eu preciso saber por onde começar.
Com a mandíbula cerrada, balanço a cabeça, não querendo
admitir a derrota em voz alta. Posso ver as engrenagens de sua
mente girando, imaginando, tomando partido das coisas.
Finn dá outro palpite.
— Ela disse que te amava, você disse “nem fodendo”, e então
essa é a maneira dela de se vingar por você não querer se
comprometer com ela?
Meu orgulho está em guerra com a necessidade de dizer a ele a
verdade que prefiro não admitir.
— Na verdade, foi o contrário. — Minha voz é um sussurro, mas
o arregalar de seus olhos e a surpresa em sua expressão me dizem
que ele me ouviu de maneira alta e clara.
— Ah, merda — diz ele com compaixão.
— Sim — eu digo enquanto encolho os ombros e me afasto dele.
— Perdi meu time e a minha garota me fodeu no mesmo dia, então
me deixa em paz e me devolve a garrafa, beleza?
— Sinto muito, cara. Isso é foda pra caralho. — Ele me entrega a
garrafa e fica quieto, pensando tanto, que eu juro que quase posso
ouvir. Mas pode ser a bebida falando. — Ainda não faz sentido. Se
você não está cem por cento e não pode ser reintegrado, então os
Dalton não conseguem o contrato… Ou seja, a menos que aqueles
termos tenham mudado, ela se fodeu também.
— Exatamente — digo em um rosnado frustrado. — É por isso
que estou perdido.
— Há uma maneira de descobrir. — Ele aponta para o celular.
— Eu não quero falar com ela agora. — Eu luto, tentando me
fazer acreditar nisso.
— Puxa de uma vez o Band-Aid. É mais fácil saber do que ficar
imaginando.
— Não. — Sou inflexível. Ou pelo menos meu tom é, porque com
certeza eu quero afastá-la e puxá-la para perto, tudo ao mesmo
tempo.
Isso tem de ser o álcool falando.
— Eu vou te dar esta noite, mas vamos precisar que alguém diga
alguma coisa, já que Deus sabe que não vou confiar em uma só
palavra vinda da boca de Tillman pela manhã.
Eu resmungo em resposta:
— Podemos conversar amanhã, antes que eu entre na reunião.
— Finn dá alguns passos. — Você vai ficar bem?
— Sim. Vou fazer mais algumas rodadas com a máquina. — E
mesmo isso não parece mais uma fuga.
— Ok. Vou mandar alguma comida para você em breve. — Ele
olha para o relógio e depois volta para mim. — Vou tentar ver que
horas as luzes do estádio vão ser apagadas.
Ele sabe. Entende. E não acha que sou estúpido por isso.
— Obrigado, Finn.
— Descanse um pouco.
Eu vejo as portas do elevador se fechando atrás dele quando
esvazio o restante da garrafa. Minhas mãos doem pra cacete, mas
caminho para a gaiola mesmo assim. Posso lidar com esse tipo de
dor.
Estou acostumado com isso.
— Deve ser a porra dos papéis — a voz de Finn me assusta
assim que pego um novo taco para verificar se há alguma farpa. —
Eles têm que ter alguma pegadinha.
— O quê?
— Eu sabia que Tillman estava aprontando alguma. Eu sabia
disso no fundo quando peguei aqueles papéis que você assinou. Eu
queria ir direto a Boseman, mas você me disse para deixar isso para
lá… Mas, East, acho que essa é a chave de tudo.
— O quê? — Fala na minha língua, por favor.
Ele atravessa o espaço uma ênfase que me diz que descobriu
alguma coisa, mas não há muito para ficar animado, mesmo que
Finn esteja. Eu ainda estou sendo trocado. Ainda estou sendo
removido da minha vida aqui.
— Eu preciso que você pense muito sobre isso — diz ele, a voz
séria, os olhos intensos, tudo o que dou a ele em resposta é uma
risada.
— A garrafa está vazia. — Jogo para cima, e ela cai com um
baque na grama sintética. — Você acha que eu consigo me lembrar
de alguma merda agora?
— Estou falando sério, E. Quando você se machucou, me disse
que assinou alguns papéis. O clube enviou cópias para mim. Era um
documento de duas páginas com sua assinatura concordando com
tudo na segunda página.
— Não vem com essa merda de novo — eu gemo. — Chega de
chutar cachorro morto, Finn. Eu estraguei tudo. Assinei na linha
pontilhada, e agora estou sofrendo as porras das consequências
disso.
— É exatamente isso. Você assinou na linha pontilhada. Mas
quantas delas você assinou? Você sempre chamou de papéis, no
plural, e presumi que você se referia às duas folhas que recebi…
Mas isso me bateu agora… A forma como Scout disse “os papéis”,
como se fossem o começo e o fim de tudo. Você se lembra quantas
vezes assinou seu nome?
Minha cabeça está girando — do álcool e do que ele acabou de
perguntar. Eu penso naquele momento mais uma vez, e tudo que
me lembro é da dor, de ter apagado e, em seguida, de voltar ao
vestiário com papéis na minha frente; depois uma caneta foi enfiada
na minha mão e vi pontos brancos dançando na minha visão.
— Dane-se, Finn…
— É importante, Easton.
As palavras nas páginas estavam borradas. Minha necessidade
de remédio para entorpecer a dor superava a necessidade de
compreensão.
— Duas… Talvez três… Mas duas com certeza.
— Puta merda! — Fin bate palma, e o som ecoa pela sala. — O
merda do Tillman está por trás disso. Ele armou alguma coisa pra
você. Eu sei disso. Aposto seu rabo que Scout descobriu.
— E você não estava lá. — As palavras são acusatórias, embora
ele já tenha explicado o motivo. Estou farto de desculpas quando
meu mundo está virado de cabeça para baixo, primeiro por uma
jogada suja e agora pelo que parece ser um negócio sujo.
— Vou consertar isso — diz ele, mas eu fico só olhando,
sabendo que Finn não tem esse poder. — Se você não vai falar com
Scout, eu vou.
— Faça como quiser. Não vai mudar nada — resmungo.
— Mas terei munição quando for lá amanhã. — Ele pega o
telefone. — Qual é o endereço dela?
— Você não pode simplesmente ir embora?
— Ok. Certo. Estou no caminho certo. Eu posso sentir. Vou
conversar com ela, East, e investigar a fundo isso. — Seu sorriso
desaparece quando percebe que eu não estou tão animado por ele
ter descoberto alguma pista.
Eu não estou.
Estou arrasado para caralho.
Lágrimas queimam meus olhos, todavia afasto essa merda para
longe o mais rápido que posso, não vale a pena chorar.
As mulheres vêm e vão.
Equipes são equipes em qualquer lugar. Eu posso jogar mesmo
em outro lugar.
Porém não é apenas uma mulher qualquer. É Scout. E ela me
fisgou.
E não é apenas uma equipe. São os Aces. Aqueles cujo sangue
eu tenho dado desde antes de nascer.
O que diabos está acontecendo?
SCOUT

SINTO MUITO, SCOUT. ELE NÃO ESTÁ RECEBENDO NENHUM VISITANTE AG


É a mesma resposta que recebi quando corri para cá depois que
saí da reunião e a mesma que continuo recebendo cada uma das
vezes que tento obter acesso ao prédio.
O olhar no rosto de Easton continua a assombrar minha certeza
enquanto permaneço do outro lado da rua e observo Alec, o porteiro
do prédio de Easton, em seu lugar de sempre. O mesmo homem
que esta manhã brincou comigo quando saí para o estádio agora
está afastando as pessoas a torto e direito. Repórteres, colegas de
equipe… Eu.
Olho para o celular novamente, apenas para o caso de Easton
ter me enviado uma mensagem de volta. Eu sei que ele não enviou,
porque o aparelho está colado na minha mão, mas olho mesmo
assim.
No entanto, tocou várias vezes. Chamadas de Finn querendo
respostas. Ligações de repórteres tentando chegar a Easton. Uma
chamada de Tino me perguntando o que diabos aconteceu.
Ligações de todos os quais eu não quero ouvir a voz e nenhuma da
única pessoa que preciso conversar.
Então, eu recorri a isso — sentar no escuro do outro lado da rua
do seu prédio, com um estômago nauseado, o sal das minhas
lágrimas nas bochechas e a esperança diminuindo — enquanto
espero o turno de Alec terminar e o de Simon começar.
Cada segundo parece uma hora. Cada pensamento é
exacerbado pela dúvida e arrastado pela lama dos meus
sentimentos enquanto espero para conseguir ver Easton. Explicar
para ele. Implorar que me perdoe. Porque quanto mais tempo eu
fico aqui sentada, mais questiono tudo: se eu vi o que penso que vi,
se tomei a decisão certa, como não poderia ter percebido antes que
o amo.
Porque, sim, eu o amo.
Seu sorriso capaz de iluminar a cidade e seus gestos tão doces
que falam mais que palavras. O jeito como precisa tomar café de
manhã antes de se tornar um ser humano ligeiramente tolerável de
novo e como odeia que mexam na comida em seu prato. O jeito
como ama a mãe e respeita o pai, apesar de tudo que eles o fizeram
passar. A maneira como parece saber exatamente do que preciso,
quando preciso, mesmo quando eu mesma não saiba. Nossa dança
no bar country. Nossa aventura com os cães. Um piquenique no
campo de beisebol.
E, claro, com a epifania vem o pânico sufocante.
E não porque tenho medo de Easton me deixar, mas porque
acabei de garantir que isso aconteça… Quando eu nem sabia.
Nada como uma pequena dose de realidade para esclarecer as
coisas.
Desesperada por uma conexão com Easton, verifico o telefone
novamente.
Nada. Mas quando olho para cima, Alec está dando a Simon
uma rápida recomendação na porta antes de descer a calçada
oposta a mim, entrar em seu carro e ir embora.
É agora ou nunca, Scout.
Mente limpa.
Coração aberto.
É a única maneira de consertar isso.
Eu saio para a calçada e corro, dando de cara no entregador de
sushi que acabei conhecendo por ficar na casa de Easton.
— Riku!
— Senhora Scout — diz ele com uma pronúncia ruim enquanto
tenta reequilibrar a entrega.
— Eu sinto muito. Eu não queria… Eu só… Você está bem? —
Tropeço nas palavras enquanto tento ajudá-lo a firmar os pacotes.
— Sim. Sinto muito. Eu não estava olhando. Uma noite muito
ocupada. Muitas entregas — ele explica.
— Dá para imaginar. — Eu sorrio com força, querendo ser
cordial, mas realmente precisando chegar a Easton. Meu cérebro
está tão esgotado, mas… — Esse é o pedido do senhor Wylder?
Estou indo para lá agora e posso entregar para você.
— Sim — diz ele com um aceno ansioso, mas então seu sorriso
desaparece. — Mas meu pai ficará muito bravo se eu não tiver
certeza de…
— Não vamos contar a ele — digo enquanto puxo uma nota de
vinte da carteira e coloco em seu bolso. — Aí está sua gorjeta, é só
me dizer qual embalagem é a dele.
— Tem certeza de que não se importa em levar para ele? — Ele
se anima com a ideia, e tenho certeza de que a gorjeta de vinte
dólares também não fez mal.
— Claro que não. Eu estava indo para lá de qualquer maneira,
então por que não te dar essa força?!
Ele me olha de novo, o medo de se meter em encrenca com o
pai lutando contra a entrega mais rápida para os outros pedidos e
mais gorjetas. Posso ver o minuto em que a última ideia vence.
— Muito obrigado.
Ele me entrega uma sacola cheia de recipientes de isopor
empilhados.
— O prazer é meu.
Com um grande suspiro, vejo Riku seguir pela calçada antes de
correr pela rua para me aproximar de Simon.
— Ei, Simon, entrega de sushi para Easton. — Eu seguro a
sacola com o nome do restaurante nele.
Os repórteres me chamam enquanto ele me olha com cansaço,
me fazendo me perguntar se Alec disse a ele para não permitir
visitantes ao apartamento de Easton, como deveria ter feito.
— Eu preciso ligar para ele e verificar primeiro — diz ele,
trazendo o telefone ao ouvido.
Meu sorriso permanece enquanto morro lentamente por dentro,
sabendo que isso não vai funcionar.
— Senhor Wylder, é Simon da portaria… Desculpe incomodá-lo,
senhor, mas eu só queria ter certeza de que você pediu sushi para
entrega… Certo. — Simon olha algumas pessoas do outro lado da
rua com câmeras e acena com a cabeça. — Sim. Eu vou me
assegurar disso… De nada.
Eu engulo o nervosismo lentamente, fechando a garganta
enquanto espero que ele desligue e me diga para deixar a comida
com ele em vez de entregar eu mesma.
— Alguém ferrou com ele — Simon diz com um aceno de cabeça
enquanto empurra a porta e me deixa entrar no prédio.
— Com certeza… — murmuro enquanto corro para passar por
ele.
Se eu achei que estava nervosa antes — pensando e
repensando demais no que diria, como diria, e o que não posso
esquecer de dizer —, estou uma pilha de nervos agora, enquanto o
elevador sobe lentamente andar por andar até a casa de Easton.
O elevador apita.
As portas se abrem.
O apartamento está banhado pela escuridão, exceto pela luz da
entrada, muito parecida com a primeira vez em que Easton me
trouxe aqui. As memórias daquela noite — nossa primeira vez juntos
— passam pela minha cabeça, mas dessa vez as borboletas se
agitam no estômago muito mais do que quando pensei na
possibilidade de transar com ele pela primeira vez.
Desta vez, essa sensação está indicando a possibilidade de
perdê-lo.
— Obrigado, Riku. É só deixar na mesa. Sua gorjeta está aí. — A
voz de Easton é um estrondo profundo na escuridão, e a dor
misturada com álcool parte meu coração.
Eu congelo. Planos e discursos ensaiados desaparecem, porque
agora tenho de enfrentá-lo e não sei o que fazer.
— Riku? Está tudo…? — Easton diz segundos antes de entrar no
hall, as palavras morrendo em seus lábios quando me vê.
Ele está horrível. E lindo. Tudo ao mesmo tempo. O cabelo está
uma bagunça, seu rosto está marcado pelo estresse, a mandíbula
com uma sombra de barba por fazer, o peito nu. Easton ainda está
com a calça do uniforme, mas está desabotoada na cintura. Mas
são seus olhos que me devastam. Sim, eles estão embaçados de
bebida, e o lampejo de dor que eu flagro antes que seja substituído
pela raiva.
Perturbada e sem saber o que dizer, levanto a sacola de comida
para ele ver. Easton olha para o pacote e depois de volta para mim
por um breve segundo antes de girar nos calcanhares e voltar para
a escuridão.
— Estou sem fome.
— Easton. — Seu nome é um apelo desesperado.
— Se eu quisesse falar com você, teria te ligado de volta. Mas eu
não liguei, e ainda não mudei de ideia. Você sabe onde fica a porta.
Meu estômago se contorce quando ele desaparece da minha
vista.
Momentaneamente atordoada, não me mexo enquanto a fantasia
que alimentei em minha cabeça — aquela em que Easton precisava
tanto de mim que me puxaria para os seus braços e tudo ficaria bem
— queima com o gelo da sua voz.
Eu corro atrás dele, desespero em minha voz e medo de estragar
tudo em meu coração.
— Eles iam se livrar de você.
— Bem, você se certificou disso. Salve sua dignidade, Scout, e
apenas vá embora. Não há mais nada a dizer… Suas ações, suas
mentiras, dizem tudo.
— Não. Por favor. Ouça.
— Para quê? — Ele se vira para me encarar, mas vejo uma
silhueta no escuro contra o céu noturno com a janela panorâmica
em suas costas. — Você quer que eu ouça como você me fodeu?
Minha carreira? Minha família? Como você teve a porra da certeza
de que não precisava ter medo de que eu fosse embora, e aí você
fez isso acontecer? Depois de todo o trabalho juntos? Sério? Estava
com tanto medo, que ajudou na minha troca? — A raiva em sua voz
não tem nada a ver com a angústia que tinge seu tom. Suas
palavras são profundas e devastadoras.
Ele acha que eu estava com medo?
— Você realmente acha isso? Que sou tão egoísta, tão covarde,
que ajudei a te negociarem propositalmente para o meu benefício?
— Nada me surpreende hoje. Nem um pouco, porra. Bem,
exceto a parte do “você foi negociado”… Isso com certeza me
chocou para caralho.
— Easton, não é…
— Você mentiu? — Há firmeza em sua voz, como se doesse
confirmar o que ele já sabe. Eu abro a boca e em seguida fecho, a
admissão é difícil agora, que estou diante da pessoa que enfrenta
as consequências das minhas ações.
Quando ele dá um passo à frente, seu rosto parcialmente sob a
luz, sombras ainda dominando o resto, encontra meus olhos através
do espaço entre nós, as palavras em meus lábios carregam uma
morte indigna.
— Apenas me diga uma coisa, Scout. Você sabia que ia mentir
quando me beijou hoje de manhã? Foi tudo planejado? Você
esperava que a troca fosse uma daquelas coisas rápidas de “pegue
suas malas, seu voo está prestes a sair para levá-lo para sua nova
equipe”, para que você não tivesse que me ver novamente e
enfrentar o que você fez? Presta atenção, querida, porque é isso
que parece. — Easton dá mais um passo à frente para que seu
rosto seja banhado pela luz. — É isso que parece ser fodido por
alguém em quem você confia. Não é bonito, né?! Obrigado por sua
preocupação, mas eu sei que é apenas para que você possa aliviar
sua culpa. Não pense que vou te ajudar com isso, porque sou eu
que tenho que viver com o que você fez.
— Eu sei, e é por isso que estou tentando falar com você para
que eu possa explicar! — grito enquanto dou um passo à frente,
mas o olhar que Easton me lança me avisa para ficar onde estou. —
Finn não estava lá, e então…
— Eu nunca pedi a alguém para morar comigo. — Sua voz é
suave e dolorida, e a mudança repentina dos gritos de antes para a
suavidade de agora suga todo o ar da sala.
— Não é por isso que eu…
— Diz logo.
— Os papéis…
— Eu sabia que você ia fugir ou me afastar e…
— Isso não é…
— E você se certificou de que fossem me afastar para obter o
maldito contrato.
— Não! Só escuta.
— Saia!
— Não.
— Está tudo acabado.
— Eu estou apaixonada por você!
— Não — ele grita, a mão batendo na mesa ao seu lado, gesto
que condiz com o seu temperamento explosivo.
Eu pulo com o som que ecoa através da sala, mas isso não é
nada comparado com as batidas do meu coração contra minhas
costelas.
— Você não pode dizer isso para tentar consertar as coisas.
Você não entende que suas palavras não significam nada para mim
agora? Você me disse que eu estava cem por cento, e então você
disse a eles que não estava. Você acha que vou acreditar quando
você disser essas três palavras para mim? Muito conveniente,
Scout. Você nem consegue lidar com meu pedido para morar
comigo, mas ainda assim você me diz que me ama para tentar
arrumar tudo? Você está completamente…
Eu perco o controle.
— Você assinou a droga dos papéis! — eu grito com todo o ar
dos meus pulmões, finalmente capaz de dizer uma palavra. Easton
me machucou profundamente com suas palavras, propositalmente,
e é a minha vez de atacar. Eu tenho me culpado o dia todo pelo que
fiz, mas no final, não é tudo por minha culpa. — Você fez isso. Não
eu. Era isso ou te enviar para uma equipe da liga principal no Maine
ou para o outro lado da cidade, para os Wranglers, então eu fiz o
que tinha que fazer.
A sala fica em silêncio enquanto as partículas de poeira dançam
na faixa de luz do hall de entrada, e eu sei, pela primeira vez desde
que botei os pés aqui, que ele está me ouvindo. O embolar de seus
pés quando anda para trás. O ar chocado que seus lábios assumem
enquanto se abrem e fecham. O estreitamento de suas
sobrancelhas.
— O que você disse? — Easton bêbado encontra Easton sóbrio.
— Do que diabos você está falando?
— Os papéis — digo em um soluço enquanto as emoções me
atingem de uma vez só. Sentindo uma chance de redenção na
ponta dos dedos, dou um passo em sua direção. — Eles caíram da
mesa. Foi uma bagunça. Derramaram café, e papéis foram jogados
no chão, e quando eu tentei ajudar a recolher, sua assinatura estava
neles, e eu não sabia o que fazer e…
— Então você decidiu assumir a situação e…
— Um desses papéis era um acordo, que se você não estivesse
cem por cento recuperado, eles poderiam negociar você — eu
gaguejo. Há muito para explicar, muitas palavras para dizer de uma
só vez, e a pressão de fazer isso direito deixa minha cabeça toda
confusa.
— Estou bem ciente do que foi dito e da parte da troca. — Ele
encolhe os ombros com uma risada condescendente. — Você com
certeza garantiu que isso acontecesse, não foi?
— Mas o outro… Por que diabos você concordaria com isto?
— Que outro? Concordar com o quê? — Ele dá um passo à
frente, com raiva e acusação em seu rosto.
— Você deu seu consentimento para enviá-lo para outra equipe
da liga principal.
— Que diabos você está falando? — Easton está na minha frente
em um segundo, cheirando a uísque e raiva, com as mãos nos
meus bíceps, me dando uma pequena sacudida antes de perceber o
que está fazendo e pular para trás como se tivesse sido queimado.
— Dizia algo sobre você dar consentimento aos Aces para enviar
você para outra equipe pelo período de um ano com um corte no
salário, ao retornar do banco por ferimentos, e…
— Que mentira da porra! — ele grita.
— Eu vi com meus próprios olhos. Você assinou. No lado
esquerdo, na parte inferior.
Easton começa a falar, e então para, seus olhos perfuram os
meus, mas há uma expressão que lentamente surge em seu rosto.
É uma que eu acho que jamais conseguirei esquecer; não a
compreendo, mas está lá, e é real. Dentro da intensidade do
momento em que o pensamento passa pela minha mente: uma
expressão como essa nunca deveria estar naquele rosto bonito.
E antes que eu possa identificar o que significa, ela se vai. Seu
rosto está totalmente vazio e substituído por uma expressão
endurecida que eu conhecia ao assistir na TV Easton jogar antes de
conhecê-lo. Eu me esforço para explicar melhor.
— Havia esses papéis. Os que você assinou. E mais alguns das
pastas que Cory tinha com ele. Notas. Rabiscos. Eles estavam por
toda parte, e eu estava tentando empilhá-los e… Havia opções
formalizadas para trocas. Pedidos para você ser enviado para outra
equipe. Havia correspondência com Dallas sobre negociar seu
passe. Havia um e-mail para o gerente do Portland Surge dizendo a
eles para rebaixar Gonzo para uma liga inferior porque você iria
jogar para eles. Eu só tive alguns segundos, Easton. Segundos.
Para ler, e decifrar, e descobrir o…
— Scout. — Seriedade. Preocupação. Confusão.
Petrificada com seu silêncio repentino, acrescento:
— Era trocá-lo ou rebaixá-lo, e eu escolhi trocá-lo.
— Você escolheu? — Sua voz é uma mistura de fúria e
descrença enquanto caminha de volta para onde estou.
Easton caminha de um lado para o outro, apoiando as mãos
contra a nuca enquanto seu humor se manifesta fisicamente em sua
postura. Congelada no lugar, vejo quando ele pega a garrafa na
mesa de café e a joga longe, o mais forte que pode. O som do
choque com a parede é ensurdecedor — uma garrafa de vidro
contra uma parede de vidro — seguido pelos sons dos cacos
batendo no chão. É chocante, e levo um minuto para me recuperar
da explosão repentina.
— East…
— Essa é a porra da minha vida! — ele troveja. A raiva vibra em
sua voz. — Quem te deu as rédeas para decidir por mim? Eu com
certeza não fui, não é? Você tem alguma ideia do que fez?
A dúvida que carreguei comigo o dia todo lentamente desliza
para pavor e preenche cada grama do meu ser. Quando eu
respondo a ele, é a primeira vez que pareço insegura, e me odeio
por isso.
— Mas era Dallas. Sua mãe está no meio do caminho entre aqui
e Dallas e…
— É minha mãe, porra. Essa escolha é minha, porra. Quem você
acha que está escolhendo o que é melhor para mim? São muitas
decisões para alguém que não conseguia nem suportar o fato de
saber que eu estava me apaixonando, você não acha?
— Foi uma fração de segundos. Maine ou Dallas.
Por favor, veja pela minha perspectiva.
— Que besteirada. — Ele joga as mãos na minha direção como
se tivesse terminado de falar, e embora eu saiba que fiz a escolha
por ele, Easton também tem sua parcela de participação.
— Por que você assinou os papéis? Por que Finn deixou você
concordar com isso? Por que ele não estava lá hoje? — Minha voz
soa mais estável do que quando entrei aqui. Dou um passo em sua
direção, precisando saber a resposta, visto que essa assinatura é o
motivo pelo qual achei necessário tomar uma decisão.
— Foda-se — ele diz com escárnio. — Não vira isso na minha
direção. Você não conseguiu lidar com nada disso, não é?
— Não. Sim. Quer dizer, eu fiz o que achei ser o melhor…
— Melhor? Melhor? Você está brincando comigo?
Eu nem consigo compreender o que está acontecendo agora.
Quer dizer, eu consigo, mas pensei que uma vez que tivesse
explicado… Eu pensei que Easton ficaria… Não agradecido, mas
pelo menos seria compreensivo. Foi uma escolha entre a
humilhação de ser rebaixado e enviado para o outro lado do país ou
ser negociado para uma equipe a duas horas de distância de carro
de onde sua mãe está.
Minha cabeça está girando. A luta não faz nenhum sentido e ao
mesmo tempo faz total sentido. Eu tento de novo.
— Mas é Dallas.
— Não é lugar nenhum, Scout, porque a troca ainda não foi
efetuada.
Meu coração despenca com suas palavras.
— O que você quer dizer? Eu não…
— Você é a primeira pessoa a pronunciar o nome de Dallas… De
modo que isso significa que a negociação ainda está em aberto e
não foi concluída. Você pode ter visto esses papéis, Scout, mas com
certeza havia mais do que só eles. Outros e-mails cheios de
conversas com equipes como Orioles ou Tampa ou até mesmo os
Mariners.
Ah, meu Deus. O que eu fiz? Pânico, descrença, choque. Todos
três se tornam um redemoinho de emoção me rasgando e levando
mais destruição do que eu jamais pensei ser possível.
— Seu rosto diz tudo. Então, sim, obrigado por nada. Você
ganhou, Scout. Estou fora.
— Eu não ganhei merda nenhuma, Easton — grito, tentando
argumentar enquanto quando o redemoinho de emoções se
transforma em um tornado dentro de mim. — Você acha que isso
me fez algum favor? Você acha que consegui o contrato? Eu não
tenho ideia de nada. Eu tenho que voltar pela manhã para
descobrir…
— Você e seu precioso contratinho. Sempre foi sobre o contrato,
não é? Não sobre mim? Só você. — Nojo é o que ouço em seu tom.
— Não. Não. — Dou um passo para trás, para tentar acalmar a
situação. Seu temperamento. Meu choro. Suas acusações. Minhas
negações. — Por favor. Apenas ouça. A única razão pela qual me
importo remotamente com o contrato é por causa do meu pai.
— Conveniente. — Ele bufa, vira as costas para mim e tropeça
quando caminha em direção às janelas, me deixando confusa.
— Você não vê que sou eu que posso perder tudo?
— Coitadinha dela. Perdoe-me se não estou sentindo muita
compaixão por você e…
— Não, não é isso que eu quis dizer…
Eu corto minhas próprias palavras quando não consigo mais
segurar o soluço. Não tem sentido. Esta conversa, tentar raciocinar
com Easton enquanto ele está bêbado. Lutando para explicar
minhas ações, minhas decisões, a mim mesma, quando ele tem
razão. Não era meu trabalho tomar uma decisão sobre sua vida,
independentemente das circunstâncias ou minhas intenções
altruístas.
Eu fico olhando para Easton — os ombros largos e a postura
orgulhosa — e penso na primeira vez que o vi assim e para onde
isso nos levou.
Meu coração dói por ele. Pela estrada que percorreu, pelo quão
duro lutou para voltar, apenas para ser pego de surpresa por Cory.
Muito parecido com a forma como lutou por mim. Por que isso
está acontecendo agora quando posso finalmente admitir para mim
mesma que estou apaixonada por ele que vou perdê-lo? Literal e
figurativamente.
— Easton…
Eu cometi um erro.
Eu deveria ter ganhado algum tempo.
Eu deveria ter…
Eu te amo.
— Talvez você não devesse ter mentido. — O escárnio em seu
tom apenas serve para reforçar o que já sei.
— Você não está me ouvindo. Se você realmente me ouvir, verá
que…
— Acredite em mim, estou te ouvindo, agora mais do que nunca.
São suas ações, não suas palavras que falam, porra.
— Eu fiz o que pensei ser…
— Para. Para de dizer isso. Não significa nada para mim. — Ele
caminha para a cozinha.
Copos balançam antes que ele tire outra garrafa de uísque do
armário de bebidas; em seguida toma um longo gole enquanto eu
silenciosamente imploro a Easton para parar. Eu nunca o vi assim
— indefeso, sem esperança, descuidado —, e saber que contribuí
para isso está me matando.
Quando ele termina de beber, bate a garrafa para dar ênfase.
— O que você fez foi se colocar em uma posição privilegiada
com aquele filho da puta do Tillman. Eu estaria fora de cena, sem
estresse, sem distrações, sem dormir com o jogador para estragar o
contrato que paira sobre sua cabeça, e sem se preocupar com um
cara que vai te deixar. Obrigado por garantir que isso não tenha
chegado a lugar nenhum. E obrigado por pensar que você sabe o
que eu quero para a minha carreira e tomar uma decisão que você
não é qualificada para fazer. Obrigado por nada, Scout. Vá para sua
reunião amanhã. Aceite tudo que os Aces lhe derem. Fique feliz
com o resultado. Você me ferrou para satisfazer o desejo de seu pai.
E ao mesmo tempo que entendo, não entendo. — Ele afunda em
uma cadeira de frente para a vista, de costas para mim. — Nós
terminamos, mas, na verdade, acho que nunca começamos nada,
de acordo com você… Então, hm… Vejo você por aí, Scout. Ou não.
Você sabe onde fica a porta.
Ele faz um show levantando a garrafa no ar e em seguida a leva
aos lábios. Quando termina sua bebida, se afasta mais na cadeira e
continua a olhar para a escuridão.
Easton não diz mais uma palavra.
Não há mais nada a dizer.
EASTON

EU DEVERIA PEGÁ-LOS.
Os pequenos cacos de vidro verde espalhados pelo chão.
Lembretes de Scout. Das explicações que ela deu. As palavras que
lancei. De tudo que está quebrado.
Eu deveria pegá-los.
Mas eu não faço.
Eu fico no mesmo lugar em que estive sentado a noite toda. E
agora acho que a manhã toda também. Cabeça latejando.
Estômago revirando. Olhos encarando.
O estádio vazio. Aquele que não aguentei ver iluminado na noite
passada está vazio agora. Um mausoléu de memórias da minha
carreira. Eu alcanço a nova garrafa de uísque, mas apenas passo
os dedos pela borda, sabendo que não preciso de mais nada.
Mesmo assim tomo um gole. Inclino a garrafa nos lábios para
afogar a voz na minha cabeça.
Opções de troca formalizadas. Correspondência com Dallas
sobre negociar seu passe.
Para bloquear a expressão em seu rosto e a esperança que
lentamente se desvaneceu de sua voz com cada acusação que eu
joguei contra ela.
Pedidos para trocarem você. Havia um e-mail para o gerente…
Você iria jogar para eles.
Posso culpá-la o quanto quiser, mas eu fiz isso. Eu soube que
isso aconteceria um dia. Que meu segredo arruinaria algo que eu
amava.
Mas não assim.
Não com esse tipo de consequência.
Eu só tive alguns segundos, Easton. Segundos.
O céu está cinza, sombrio e miserável.
Eu estou apaixonada por você.
Outro gole. Então mais um.
Há muito barulho. Em minha mente, no coração.
Por que você assinou os papéis? Por que Finn deixaria você
concordar com isso? Por que ele não estava lá hoje?
Não há sol para iluminar o céu como normalmente acontece. Os
tons de rosa e laranja que encheram o horizonte ontem enquanto
fazíamos amor lento e doce se foram.
Eu esfrego a mão no rosto. Tento apagar a memória, porque dói
pra cacete. Os suspiros suaves. Os gemidos guturais. O cheiro de
sua pele. A sensação de seus lábios.
Eu estou apaixonada por você.
— Puta que pariu, Wylder — digo a ninguém, sabendo que
deveria pensar no jogo.
Sobre para onde estou indo. Sobre o que vou sentir quando
limpar meu armário. Sobre o que vou dizer para minha mãe quando
vou dirigir até lá para vê-la e prepará-la para minha partida.
Mas estou sentado aqui pensando em Scout. Sobre a posição
em que a coloquei. Sobre a decisão que ela tomou. Sobre como eu
a culpei porque é muito mais fácil do que dizer a verdade.
A garrafa parece pesada em minha mão. É tão tentador, mas
opto por beber ao invés de jogá-la longe como fiz com a outra.
A luta em mim acabou.
Terminou quando Scout saiu.
Quando eu a mandei para longe.
Quando eu a forcei a assumir a culpa.
Eu estou apaixonada por você.
Ela realmente quis dizer isso
O que importa agora?
Scout ainda me traiu. Ela não lutou por mim.
Então por que devo lutar por ela?
Levante-se, Easton. Tome um banho. Vai se limpar. Comece a
empacotar suas coisas.
Pare de me machucar.
Meu celular toca novamente. É a terceira vez em uma hora.
Eu desisto. Cedo. Paro de lutar.
— Finn.
— Acabei de receber a papelada. O que ela disse a você ontem
à noite está certo. É Dallas. Os repórteres estão loucos por uma
explicação, então Tillman vai participar de uma entrevista coletiva às
oito e meia para anunciar a negociação. Eu estarei lá, e então vou
persegui-lo durante a porra da nossa reunião e exigir ver toda a
documentação. Eu quero ver o que aquele babaca mandou você
assinar e…
Ele continua divagando, mas tudo que ouço é Dallas. Eu deveria
sentir alívio.
Devo ser capaz de respirar um pouco mais tranquilo sabendo
para onde estou indo. Ela estava certa. É perto o suficiente para que
eu ainda possa cuidar da minha mãe. Está perto o suficiente para
que eu possa voltar para casa. É a segunda melhor opção para
estar em Austin… E ainda assim não serei mais um Ace.
A única certeza em minha vida não está mais lá.
— … e vou avisá-lo quando Boseman voltar, vou colocá-lo a par
de toda a merda obscura que ele jogou para cima de você. Eu quero
as bolas do Tillman pregadas numa parede por…
— Cancele a reunião, Finn.
— O quê?
— Não há necessidade de lutar contra isso. Quando e onde devo
me reportar aos Wranglers?
— Eu não estou entendendo. O que está acontecendo?
A mesma coisa que fiz durante toda a minha vida. Desviar.
Evitar. Distrair.
— Terminou. Acabou. Aceite os termos. Reserve um voo para
mim. Ou eu vou dirigindo até lá. Qualquer que seja a merda que
eles escolherem. Apenas me diga quando eu preciso me reportar ao
time, e eu estarei lá.
— Mas Cory precisa ser…
— Sem reunião, Finn — eu digo com firmeza enquanto os dedos
de uma mão apertam o gargalo da garrafa e os da outra encerram a
ligação.
O céu ainda está cinza.
Tenho a sensação de que vai ficar assim por um tempo.
Mas isso é por minha conta.
Não por Cory.
Não por Finn.
Não por Scout.
Tudo por minha conta.
A culpa é pior do que o medo.
Mas não há necessidade de discutir mais.
Eu posso lidar com isso.
Afinal, eu mesmo provoquei essa situação.
SCOUT

USEI TODA A MINHA FORÇA DE VONTADE PARA NÃO PARAR NO PRÉDIO


caminho para o estádio. Ir até lá e esperar que ele estivesse um
pouco sóbrio; dizer a ele que é um idiota pelo que disse para mim e
admitir que sou uma idiota por presumir que sei o que é melhor para
ele e por ter tomado a decisão em seu lugar. Poderíamos gritar, e
brigar, e colocar tudo para fora, e então eu poderia me sentar com
Easton enquanto esperava para ouvir sobre a troca. Eu o ajudaria a
ganhar tempo, para tentar consertar nossa relação, e então quando
tudo acontecesse, assegurá-lo de que tudo ficaria bem.
Mas eu não parei.
Porque um Easton de ressaca pode ser tão ruim quanto um
Easton bêbado. E porque ele deixou claro que sou a última pessoa
que ele quer ver.
Eu vou deixá-lo ganhar essa.
Vou dar a Easton algum tempo.
Mas se pensa que vou deixar acabar nossa relação tão
facilmente, Easton está louco.
Ele lutou por mim. Lutou para ganhar minha confiança. Para me
fazer querer mais com ele. Para me fazer ver que nem todo mundo
vai embora. Para garantir que eu me apaixonasse por ele.
E agora é a minha vez de fazer isso por ele.
Só não tenho certeza de como fazer quando talvez estivermos
morando em cidades diferentes.
Easton vale a pena. Eu preciso descobrir como fazer dar certo,
vou colocar cada grama de esforço nisso.
Deus, sim, eu estava magoada ontem à noite e ainda estou por
algumas das coisas que ele disse. Mas depois de repetir nossa
briga na minha cabeça indefinidamente enquanto olhava para o teto
em uma cama menos familiar para mim do que a de Easton, percebi
que faltou uma peça no quebra-cabeça. Foi o olhar em seus olhos
que ficava piscando em minha mente. Ele está me dizendo algo, e
eu não consigo descobrir o que é.
Estou petrificada por não ser capaz de consertar tudo isso; nos
consertar. Meu estômago está se revirando enquanto eu penso por
onde começar.
Além disso, tem o meu pai e a droga do seu contrato. Ele é a
razão de eu estar sentada nesta sala de espera, sendo obrigada a
encontrar o homem responsável por essa confusão, aquele em
quem eu não confio nem um pouco.
O dever de uma filha versus os desejos de uma mulher.
— Vai demorar mais alguns minutos, sra. Dalton — diz a
recepcionista apontando para a porta fechada da sala de
conferências com o logotipo dos Ace.
— Obrigada. Vou usar o banheiro.
O espelho do banheiro só serve para refletir a noite merda de
sono que tive e como me saí mal tentando cobri-la com maquiagem.
E o triste é que me odeio por estar aqui. Por escolher o contrato
acima de tentar consertar as coisas entre nós.
Família em primeiro lugar.
E enquanto estou escolhendo o contrato, optando por fazer algo
pelo meu pai, faço uma promessa a mim mesma de cuidar de mim
logo em seguida.
Com uma respiração profunda e uma certeza que mal sinto, saio
do banheiro e fico cara a cara com Cal. Nós dois congelamos.
— Espero que você tenha tido sucesso em tudo o que estava
tentando realizar, sra. Dalton, considerando que você fez isso à
custa do futuro do meu filho. — Desdém goteja de sua voz. — Sua
pequena mentira teve algumas consequências sérias.
— Custou mais do que você pode imaginar — digo baixinho, a
voz falhando, enquanto tento manter a compostura.
— Mesmo? — ele zomba quando vem em minha direção. —
Você não tem ideia do que isso custou a Easton. Você me diz para
protegê-lo, elogiá-lo e então você ferra com ele? É meu filho cuja
vida mudou totalmente. Ele recebeu menos durante anos para ficar
aqui e ter uma vida em vez das mudanças constantes que a maioria
dos jogadores passam. Para ser leal… Mas, pelo visto, parece que
você não sabe nada sobre lealdade, não é? Sua máscara caiu,
Dalton.
— Há mais coisas nesta história do…
— Sra. Dalton, Cory está pronto para te receber — a
recepcionista interrompe da porta, e me pergunto o quanto ela
ouviu.
— Obrigada — murmuro com um sorriso tenso.
— Imbecil — Cal murmura baixinho.
Eu viro a cabeça em sua direção esperando por mais um
segundo para explicar o que posso, mas ele já está caminhando
para o outro lado.
A única coisa que não sei é se ele estava se referindo a Cory ou
a mim.

— … e é por isso que eu acredito que os serviços da Dalton


Fisioterapia beneficiariam a equipe dos Ace com um contrato a
longo prazo — eu digo, completando meu discurso com convicção,
o tempo todo olhando para o homem do outro lado da mesa e me
perguntando como me meti nesta posição. E por que estou lutando
por um contrato com uma equipe em que não posso confiar — ou
suportar — no homem que seria meu chefe.
— E ainda assim você não conseguiu que Easton Wylder fosse
trazido de volta ao jogo no período estipulado — ele rebate.
— Correto. — Cada parte do meu corpo se revolta com a
mentira. — Como eu disse quando fui chamada para estabelecer
seu tratamento, discordei de dar a ele um prazo. Cada corpo se
recupera de uma forma diferente de uma lesão.
— Mas acredito que suas outras palavras foram “posso fazer
com que ele esteja pronto até meados de agosto.”
Imbecil.
— Sim, está correto.
— Hmm — ele murmura enquanto se recosta na cadeira e me
encara com um olhar implacável, como se estivesse tentando me
intimidar. Eu encontro seus olhos e não recuo. — E o que devo fazer
sobre você ter violado nos parâmetros do seu contrato?
— No que diz respeito a?
— Ter um relacionamento com o jogador a quem você foi
colocada a cargo de reabilitar.
É disso que se trata?
Cory me queria aqui apenas para uma competição de macho e
para bater no peito para me lembrar de que ele está no controle?
Usar isso como sua vantagem e para justificar por que ele negociou
Easton?
Mas, mesmo assim, não explica por que a assinatura de Easton
estava nesses contratos desgraçados. Ou porque Finn o deixou
assiná-los.
— Se bem me lembro, sra. Dalton, estou me referindo à sua
violação da seção D, parte cinco, do seu contrato.
Cada parte de mim se apega à tentativa de civilidade quando
tudo que eu quero fazer é dizer a ele onde pode enfiar o referido
contrato.
— Bem, como minha vida pessoal não é da sua conta…
— É problema meu quando você é contratada pela equipe.
— Certo — digo com tanta cortesia quanto possível, enquanto
tento recuperar um pouco do meu equilíbrio. — Mas vendo como o
“relacionamento” com o sr. Wylder não influenciou minhas opiniões
sobre sua recuperação, nosso “relacionamento” não deve ser levado
em consideração. Você achou que eu daria a ele um tratamento
preferencial. Que eu seria influenciada para considerá-lo cem por
cento, para que ele pudesse retornar às suas atividades. E de uma
forma ou de outra, porque eu não mostrei esse favoritismo, ele foi
negociado, o que me leva a me sentir parcialmente responsável pela
situação. — É a minha vez de olhar para ele com as sobrancelhas
arqueadas em conjunto com meu comentário.
— A troca do sr. Wylder não tem nada a ver com você. Havia
acordos em vigor antes de você ser contratada.
— Acordos? Como curar em um determinado período ou ser
negociado? Eu trabalhei em muitos clubes, mas nunca vi cláusulas
como essas serem feitas durante a reabilitação de um jogador. —
Estou forçando a barra, eu sei, mas não consigo evitar. Só consigo
pensar na devastação no rosto de Easton na noite passada.
— É uma prática padrão que implemento para as equipes com as
quais trabalho.
— Prática padrão? Cortar custos é uma coisa, fazer um corpo se
curar dentro de um prazo determinado… Não consigo imaginar por
que um proprietário permitiria tal política.
Ele suspira como se já estivesse entediado com essa conversa.
— Esses foram os termos acordados pelo sr. Wylder. Assim
como os termos que você concordou e quebrou do seu contrato.
— Sim — digo as palavras com uma calma intencional, não
perdendo sua mudança repentina de assunto.
— Minha preocupação, sra. Dalton, é como posso ter certeza de
que, se fecharmos o contrato da equipe com você, essa situação
não voltaria a acontecer.
— Diga-me uma coisa, sr. Tillman — digo, me mexendo na
cadeira e me inclinando para frente com as mãos cruzadas na
mesa. — Essa cláusula de não confraternização era uma parte
padrão do seu contrato ou foi feita apenas para mim? Se for esse o
caso, eu odiaria pensar que primeiro, a administração do time foi
sexista, e segundo, que essa mesma administração teria a mente
estreita o suficiente para não pensar que os homens não poderiam
ter relacionamentos com outros homens.
Ele franze a testa, e por uma fração de segundo, temo ter
passado bastante do ponto. Talvez ele seja um daqueles homens
que não conseguem lidar com o fato de ser desafiado por uma
mulher. No meu ramo de trabalho, aprendi desde cedo que as
mulheres assertivas costumam assustar os homens.
Ele mastiga o interior da bochecha por um momento, e eu juro
que vejo uma pitada de diversão em seus olhos, apesar do silêncio
sufocar a sala.
— Seu ponto foi levado em consideração… Mas isso não é
resposta.
— Para qual pergunta?
— Como posso saber que não vai acontecer de novo?
É uma pergunta traiçoeira, e sei que preciso levá-la
cuidadosamente em consideração.
— Considerando que você está negociando meu namorado,
então é um ponto discutível. Eu estarei aqui, e ele estará onde quer
que você o envie…
— Eu posso ver por que os caras da equipe gostam de você —
Tillman reflete, me deixando pensar momentaneamente se isso é
um elogio ou não. Ele se levanta da mesa e caminha até a janela da
sala de conferências para olhar para o estádio vazio além da janela.
Quando não termina seu pensamento imediatamente, opto por
permanecer em silêncio e esperar que conclua o que ia dizer. — Eu
vim aqui hoje com a intenção de dispensar você. Existem regras.
Você as quebrou. Havia termos em seu contrato, e eu sou um
defensor de seguir à risca esses termos. Mais importante, você não
cumpriu satisfatoriamente nosso acordo. Mas entre a reputação da
sua empresa e sua capacidade de lidar com seja lá o que for
lançado contra você, você me fez parar para pensar melhor sobre
isso. — Ele se vira para olhar na minha direção, e eu o encontro de
cabeça erguida.
— Você já passou da metade da temporada, sr. Tillman. O último
dia do seu fisioterapeuta atual é na próxima semana, e a maioria
dos outros profissionais da área qualificados para lidar com um
clube e suas expectativas rigorosas já estão empregados.
Ele balança a cabeça e ri do meu discurso.
— Com certeza é verdade, então é por isso que eu gostaria de
dar a vocês até o final da temporada para me mostrarem o que
podem oferecer. Um período de experiência, se quiser chamar
assim. Você pode usar o pessoal que já temos ou trazer seus
próprios profissionais, mas você tem os próximos cinquenta,
esperançosamente, setenta dias, se chegarmos aos playoffs, para
provar que pode lidar com as necessidades desta equipe.
Eu engulo o nervosismo que de repente me bate e permito o
alívio inundar meu corpo. Talvez eu tenha conseguido não
decepcionar meu pai.
Espero que ele aguente por tempo suficiente para ver tudo isso.
Mais ou menos setenta dias de espera, quando você está grato por
ter o próximo minuto, a próxima respiração, pode parecer uma
eternidade.
— Vou redigir o contrato agora.
EASTON

— EASTON, COMO VOCÊ SE SENTE TENDO QUE MUDAR DE TIME PELA P


em sua carreira?
Câmeras piscam e aumentam as batidas na minha cabeça
enquanto os repórteres me cercam.
— Como está o seu ombro? Você está pronto para jogar pelo
Dallas?
Uma câmera bate no meu ombro. As perguntas são gritadas.
Mãos nas minhas costas tentando me guiar. Microfones enfiados no
meu rosto.
— Easton, na conferência de imprensa de hoje de manhã, Cory
Tillman afirmou que está se despedindo da equipe em bons termos.
Adoraríamos ouvir sua opinião sobre essa declaração.
Eu olho para cima e fico cego por outra enxurrada de flashes,
enquanto tento abrir caminho no meio da multidão de repórteres.
Todas as perguntas que eu não quero responder. Outra pitada de
sal na minha ferida aberta.
— Easton, você tem algo a dizer aos fãs dos Austin Aces, que
têm seguido você desde que começou no time?
Essa pergunta me faz parar, e é algo que não posso ignorar. Eu
faço uma pausa, os olhos para baixo, escondidos sob a aba do boné
enquanto tento descobrir o que dizer.
Um tapa nas costas, do qual tento eu me afastar, me atinge.
— Precisa de ajuda?
Eu olho para o meu pai, surpreso para diabo por vê-lo aqui. Alívio
me preenche quando o som das câmeras enche meus ouvidos,
todos desesperados para capturar a oportunidade de uma foto. Pai
e filho. O fim de um legado. Não há mais Wylders em campo pelos
Aces.
— Vá em frente — ele incentiva com outro aperto no meu ombro
e um aceno com a cabeça.
Limpo a garganta e me dirijo aos repórteres.
— Austin sempre vai ser minha casa, independentemente de
onde eu jogar. As pessoas, a cidade e a atmosfera estão em meu
sangue, e eu fui um dos poucos afortunados que tiveram a chance
de ficar por todo esse tempo em uma única equipe. Vou sentir
saudades dos meus colegas. Vou sentir falta dos fãs incríveis daqui.
Mas, mais do que tudo, vou sentir falta de ser um Ace. Eu usei a
camisa quando era menino, querendo ser igual ao meu pai… —
Minhas palavras enfraquecem quando olho para minha esquerda e
noto Santiago parado ali perto, as mãos enfiadas nos bolsos e o
ombro encostado na parede, me observando. Nossos olhos se
encontram no mais breve dos momentos, e odeio que ele esteja
aqui, ouvindo o que considero um momento íntimo com a cidade
que jurei que nunca iria deixar.
— East… — meu pai pede, me forçando a voltar minha atenção
para a grande quantidade de repórteres ao meu redor e esperando
que eu termine.
— … e eu fui um dos sortudos que cresceram e conseguiram ser
exatamente o que queriam ser. Então, sim, eu vou sentir falta de
Austin. Dos fãs. Da equipe. Até de vocês, repórteres intrometidos,
fotografando todos os meus movimentos. — Eu ganho a risada para
a qual me esforcei e aceno com a cabeça. Desta vez, quando tento
ir embora, eles me deixam, enquanto meu pai fica e responde a
perguntas.
Olhando para trás, eu o observo em seu habitat natural – com a
atenção sobre ele, respondendo como se sente, sabendo que fui
negociado pela equipe a qual ele sempre foi leal. Eu não posso
deixar de me perguntar se a sua aparição repentina foi uma
demonstração sincera de apoio a mim como meu pai ou se deu
como um representante dos Aces querendo garantir que eu diga o
que a empresa deseja.
Dúvida do caralho.
É como um câncer que você não pode esquecer, que cresce, e
cresce, até que consuma cada parte de você. Eu olho para onde
Santiago está, e então de volta para o meu pai ainda conversando
amigavelmente com os repórteres, antes de ir para a sede do clube,
uma última vez.

— Então, Dallas, hein?!


Eu deveria saber que ele estaria aqui. Assim como ele sempre
esteve ao longo da minha vida. Não há nenhuma brincadeira
“Manny-man” ou “Easy-E” como temos feito ao longo dos anos.
Agora é diferente, e eu sei que ele sente o mesmo.
— Você consegue acreditar nessa merda? — murmuro para
tentar melhorar o humor. Balanço a cabeça, mas meus olhos não
desgrudam da placa de identificação adornando o armário. Isso é
obra dele. Deixá-la aqui para mim, em vez de remover no minuto em
que a negociação foi feita, é um protocolo típico.
— Eu vivi a vida inteira pensando que ter um rebatedor
designado é pura trapaça, e agora estou indo para um time que joga
com um.
— Traidor.
— Vamos guardar essa palavra para Tillman.
— Concordo. — Sua risada me faz sorrir, embora eu esteja
desconfortável por estar aqui. — Você está bem?
Eu suspiro e balanço a cabeça enquanto olho para as marcas no
fundo do meu armário. A contagem que mantive no ano de estreia
de quantos home runs fiz, e mesmo depois da reforma no vestiário,
ele manteve essa parte para mim.
Quando não respondo, ele começa a rir, no puro estilo Manny.
— Quero dizer, nós dois sabemos que você tá um cocô e cheira
a eau de uísque, mas — ele coloca a mão no meu ombro e aperta
— você está bem?
— O que eu posso fazer, cara? Isso não faz parte do jogo?
Eu me viro para olhar para ele por um segundo, encontro seus
olhos por baixo da aba do meu boné, antes de olhar para minha
caixa cheia com as tranqueiras que guardei durante anos. Amuletos
e objetos da sorte de fãs que me sensibilizaram. Uma medalha de
São Cristóvão que ganhei de presente de Dex, o garotinho da
Fundação Make-A-Wish que passou um dia incrível comigo, cujo
funeral participei três meses depois. O bilhete esfarrapado que
minha mãe me deu na primeira vez que vesti um uniforme dos Aces
para entrar em campo. Tantas memórias. Tanta história.
— Para a maioria, é parte do jogo, sim, mas não para você. Esta
equipe é tudo que você conhece.
Quero agradecer a ele por declarar o óbvio, mas nem mesmo me
esforço para reunir o sarcasmo necessário. Além do mais, ele não
merece meu humor de merda sendo atirado nele. Manny está do
meu lado.
— Não faz sentido, Manny. Nada disso faz. Então estou apenas
tentando fazer o meu melhor para me manter sobre controle em
relação a esse momento e ao fato de que amanhã posso estar em
um uniforme dos Wranglers.
— Pode estar?
— Sim. Finn organizou para que eu seja avaliado por seu chefe
de fisioterapia. Vou fazer o necessário e, se for aprovado, vou
começar a jogar.
— Você será aprovado — diz ele com uma certeza inabalável.
— Eu vou? Nunca se sabe, cada profissional de saúde tem uma
opinião — digo, perpetuando a mentira de Scout.
— Qual é a distância de Dallas até Temple? — ele pergunta,
sabendo que minha indignação está concentrada em mais do que
apenas mudar de equipe. Manny sabe da minha mãe.
Fico olhando para ele por um momento antes de responder.
— Dirigindo? Um pouco menos de duas horas. — Eu aceno,
pensando em como isso complica as coisas. — Uma reta pela I-35,
mas duas horas são duas horas, sabe?
— Sim… Mas é melhor do que do outro lado do país — ele
pondera enquanto se senta ao meu lado, de frente para o lado
oposto dos armários. Manny não diz mais nada, mesmo que eu
saiba que ele quer dizer. E conforme o silêncio se instala, ele diz o
que quer com palavras mínimas, como de costume.
Poderia ser bem pior. Isso é o que está insinuando. E mesmo
que ele possa estar certo, tudo sobre esta situação ainda dói pra
cacete.
— Verdade — eu finalmente digo, mas não sinto isso realmente.
— Você vai se dar bem lá. O Fuente é diferente. Vai ser divertido
pegar seus arremessos. E um desafio. Sua bola curva é de matar. E
tem McAvoy. Ele tem um lançamento alto…
— Eu agradeço, Manny. Você está tentando fazer com que eu
me sinta melhor, então digo isso sem nenhum desrespeito… Não
perca seu tempo.
— Já percebi — ele diz com um aceno de cabeça suave. — Você
vai se sentir melhor se eu te disser que você foi enganado?
Minha risada desta vez é real e desencadeia o latejar na minha
cabeça.
— Foi a única coisa que eu concluí. O que os caras estão
dizendo? — pergunto, curioso sobre como Tillman está lidando com
isso.
— Eles estão chateados. Confusos. O boato é que Scout jogou
você aos lobos. Se salvou de alguma ferrando com você no
caminho.
— Você está me perguntando?
— Só se você achar que eu estou. — E lá vai Manny novamente
com suas declarações enigmáticas. Eu sabia que ele voltaria ao
assunto mais cedo ou mais tarde.
O vestiário fica em silêncio. Esfrego a medalha de São Cristóvão
entre os dedos enquanto ele me dá o tempo que preciso para
descobrir o que dizer. Eu poderia jogá-la aos lobos. Distrair. Divergir.
Impedir as pessoas com suas perguntas que não quero que sejam
feitas. Fazer dela a vilã de toda essa história. E, ainda assim,
mesmo eu não sou tão idiota.
— Ela não me fez nenhum favor, com certeza — digo finalmente.
Ele assobia baixinho.
— Ferrado por sua garota e sua equipe. Isso é duro. Lamento,
filho.
— É, bem, acho que um rompimento limpo é melhor do que
deixar as coisas ruírem aos poucos. — Mas que inferno, essas
rupturas estão me atingindo pra valer.
— Lembre-se de que nem tudo é o que parece — diz ele, ficando
de pé.
— O que você quer dizer? — pergunto, olhando para cima para
encontrar seus olhos.
— Isso significa que ela estava lutando por você. Mas, se os
rumores forem verdadeiros, ela não estava.
— Como você sabe disso? Do que você está falando? Você
estava lá?
— Só quando o caos estava reinando. Café derramado em tudo.
Papéis por todos os lugares. As roupas de Tillman estavam
salpicadas de café. Pessoas lutando, tentando salvar os
documentos e limpar a bagunça.
— O que isso tem a ver, Manny? — eu pergunto quando ele vai
para seu escritório e levanta um dedo antes de desaparecer por
alguns segundos e depois voltar com algo na mão.
— Eu ajudei a limpar o café — diz ele parando a poucos metros
de mim. — Eu estava lá quando o assistente de Tillman saiu
correndo da sala de conferência precisando de papel-toalha, e eu,
sendo quem sou, ajudei. Eu nem percebi que Scout estava lá até
sair e ouvir sua voz. Suponho que ela estava embaixo da mesa
pegando os papéis que estavam espalhados no chão… Mas não
pensei muito sobre o assunto. Quer dizer, eu sabia sobre o que era
a reunião, mas não me preocupei porque era você. E era ela. Eu
estava mais preocupado em voltar lá embaixo para desejar boa
sorte e para avisar que eu estaria na arquibancada. Mas então a
ligação veio, e você saiu correndo daqui. Quando eu descobri o que
tinha acontecido, fiquei fora de mim, East.
— Nós dois ficamos.
— É uma palhaçada só. Fiquei tão perturbado com tudo, que
demorei boa parte do jogo para lembrar onde coloquei minhas
chaves. Depois de procurar em todos os lugares, as encontrei no
aparador da sala de cópias. Então, quando eu estava prestes a sair,
notei uma folha de papel no chão, de cabeça para baixo. Eu não
pensei em nada além de colocar de volta em cima da mesa para
quem a deixou cair… Mas quando eu peguei, era essa aqui. É muito
diferente do que dizem os boatos, então não queria deixá-la lá e
colocar Scout em apuros.
— Que diabos é isso, Manny? — Toda essa conversa, e ele
ainda está segurando a folha de papel.
— Você tem um temperamento explosivo às vezes. Eu só posso
imaginar quanto tempo ficou naquela gaiola de rebatidas na noite
passada, quebrando tacos e esmagando bolas para tentar se
acalmar um pouco. — Eu rio e mostro minhas mãos com as palmas
para cima para que ele possa ver como está correto. As bolhas
estão rachadas e inchadas. — Eu te conheço mais do que você
pensa, Wylder.
— Verdade. — E me entristece o quanto ele me faz bem e o
quanto vou sentir falta de ver sua cara feia todos os dias. — Mas o
que está no papel?
— Talvez você não devesse ser tão duro com ela, hein?
É a vez dele de rir e levantar as sobrancelhas para mim. Sua
expressão diz “eu te conheço mais do que você pensa”. Eu rolo os
olhos enquanto ele olha para a porta fechada do vestiário antes de
segurar o papel e pigarrear.
— Obrigado, senhores, por seu tempo. Eu gostaria de apresentar
um resumo do progresso do sr. Wylder até o momento… — Manny
continua lendo o discurso preparado de Scout para Cory, e com
cada palavra, cada frase, as coisas horríveis que eu disse a ela na
última noite voltam correndo para mim. Sim, eu estava bêbado. Sim,
eu estava com raiva. Mas sou realmente tão estúpido de pensar que
se eu a afastasse ela não iria atrás e encontraria a verdade?
De jeito nenhum.
É Scout. Ela me pegou. Estou com os quatro pneus arriados por
ela.
— … E então é minha opinião profissional que o sr. Wylder está
mais do que pronto para retornar às suas atividades. Não só acho
que ele superou seu medo de voltar a se machucar, mas sua
dedicação ao seu bem-estar físico é incomparável a qualquer outro
jogador que já reabilitei até agora em minha carreira. — Manny
levanta os olhos do papel e encontra os meus. Ele não diz qualquer
outra coisa, apenas entrega para mim e acena com a cabeça antes
de dar um tapinha no meu ombro.
Eu olho para o papel preenchido com a caligrafia de Scout. As
letras de forma todas maiúsculas que me acostumei a ver em suas
anotações.
— Será a primeira vez na minha carreira que não terei um
“Wylder” em um desses — ele diz com uma tristeza que sinto em
cada osso do meu corpo. Ele desliza a placa de identificação acima
do meu armário e a entrega para mim. — Vai ser estranho.
Não brinca.
E sem dizer mais nada, Manny sai do vestiário e me deixa
sozinho. Eu estudo a placa com meu nome, viro na minha mão
algumas vezes e, em seguida, olho para o papel.
Eu fico olhando para as palavras na página até que elas se
misturem e meus olhos queimem.
O que diabos eu fiz?
SCOUT

EU FIZ UM ACORDO COM O DIABO.


É a única coisa que se repete sem parar na minha cabeça.
Cada passo na calçada ressoa no cérebro. Eu comprometi minha
moral, desisti de um pedaço de mim e assinei um contrato provisório
com os Austin Aces e Cory Tillman.
Um homem em quem não confio, nem nele nem na equipe que
acabou de ferrar com Easton.
Tudo pelo meu pai. Para cumprir seu desejo de encerrar sua
carreira com um contrato em cada clube da liga principal.
Mas e quanto a mim?
Quando foi fazer algo por mim? Quando enfrento a dura
realidade de que sou eu quem vai ficar aqui sozinha, percebo que,
por lealdade familiar ou não, ainda tenho de viver minha vida. E ele
ainda vai morrer.
A cada passo, a cada pensamento, me sinto cada vez mais
sozinha. Minhas emoções giram em um caleidoscópio de
pensamentos frenéticos. Eu me sinto fraca.
Traída. Conivente. E não há nada que eu odeie mais do que uma
mulher que não se defende… E ainda assim foi exatamente assim
que me saí. Eu vendi minha alma, e meu coração não está de
acordo com isso, mesmo quando eu sei que é necessário. Família
em primeiro lugar.
Adicione a isso ao fato de eu não ter ideia de como consertar as
coisas com Easton. Não tenho mãe ou amigas para pedir conselhos,
e tudo o que sei sobre relacionamentos aprendi por uma perspectiva
masculina.
Infelizmente isso não me dá mais nenhuma ideia além de ignorar
a pessoa, ir beber uma cerveja e jogar a culpa em alguém que não
seja eu mesma. É meio difícil lutar por alguém quando ele está
trancado em sua torre protegida e prestes a deixar a cidade.
Mas ele matou dragões por você.
E esse pensamento por si só faz as lágrimas que estou lutando
para não derramar queimarem quando destranco a porta da frente
da minha casa.
Para piorar a situação, quando entro, tudo no meu apartamento
me lembra Easton. Mais precisamente, a camada de poeira e a
geladeira vazia são lembretes gritantes do quanto eu tenho vivido
com ele, embora nenhum de nós tenha oficialmente reconhecido
isso.
Jogo a bolsa no sofá e me pergunto como vou aceitar o resultado
das últimas vinte e quatro horas. Eu não posso apenas voltar atrás?
Vivê-los novamente? Eu receberia de bom grado o pânico que senti
quando Easton me pediu para morar com ele, em vez dessa
sensação frenética de tudo estar fora de controle.
O toque do meu celular quebra minha linha de pensamento.
Tenho um vislumbre ridículo de esperança que possa ser Easton,
que ele esteja ligando para me dizer que deseja me ver antes de
partir, mas o pensamento morre rapidamente quando lembro das
coisas que ele me disse ontem à noite.
É o nome da pessoa que aparece no telefone que me assusta, e
eu respondo o mais rápido possível.
— Pai? — Estou sem fôlego, arrepios percorrem minha pele,
como uma bola de demolição, de medo de que algo tenha
acontecido com ele.
— Então? — É tudo o que diz, e a repentina onda de pânico que
tive se transforma em cócegas de irritação na parte detrás do meu
pescoço.
— Então? — repito com uma boa dose de desdém. Por que ele
está me ligando? Ontem foi pura encenação? Ele não iria deixar de
falar comigo até eu conseguir o contrato e tudo mais?
— Você conseguiu o contrato?
— Um provisório até…
— Isso não é um contrato.
Sério? Isso é tudo que tem a dizer? Eu cerro os dentes e engulo
a observação sarcástica na ponta da língua.
— Eu estarei no comando da preparação física dos Aces até o
final da temporada, e então a organização determinará se eles
querem me dar o contrato do próximo ano. Lamento se isso não é
bom o suficiente para você.
Há um tom mordaz inesperado em minha voz, mas os últimos
dias foram realmente difíceis, e meu pai está sendo um idiota
tentando me fazer acreditar que não cumpri com minhas
responsabilidades.
Ele faz um som evasivo do outro lado da linha que só serve para
atiçar as chamas da raiva que guardei no caminho para casa.
— O que esse som quer dizer?
— Apenas desapontado, só isso.
E lá está a palavra de novo.
— E daí? Você vai desligar na minha cara agora? Não vai falar
comigo até o final de outubro para ver se consigo o contrato? —
Sarcasmo amarra meu tom, mas todo o restante é cem por cento
raiva. E mágoa. Estou tão cansada dos jogos mentais. Superei o
sentimento de culpa. Tão cansada de nunca me sentir boa o
suficiente.
— Você não lutou o bastante.
Meu humor explode.
— Lutar o bastante? — grito. — Acabei de fazer um trato com o
diabo, pai. Você vai realizar o seu desejo. Não se preocupe. Você
vai conseguir o seu contrato, mas quando você se for, sou eu que
vou ter que conviver com isso. Não você. Sou eu que vou ter que
trabalhar para um idiota completo que joga sujo em cada decisão
que toma. Então você pode ganhar, mas sou eu quem está se
ferrando.
— Ah, então isso é sobre o jogador, afinal.
— Pode ter certeza que sim. E o nome dele é Easton, não o
jogador. Como é que ele se ferrou duas vezes na mesma situação?
— Ele é um menino crescido, Scout. Pode cuidar de si mesmo.
Além disso, trocas fazem parte do beisebol.
— Fazem parte do beisebol? — grito, erguendo minha mão livre
como se ele pudesse ver. — Essa é a linha que você vai seguir
quando interferir com seu maldito contrato? Porque esse não é o
beisebol que eu conheço. Trocar jogadores de uma franquia porque
não se recuperaram a tempo não é correto. É maldoso. E esse não
é o jogo que você me ensinou. É desagradável e injusto. Isto…
— Você sabe o que dizem sobre a vida ser justa. — Ele dá
risada, mas tudo que ouço é condescendência. Tudo que eu sinto é
sua zombaria.
— É de uma pessoa que estamos falando. Da vida de alguém.
Não de algum jogo.
— Mas é um jogo. Mente limpa. Coração de ferro, menina
Scouty.
E há algo sobre o mantra que ouvi a vida inteira — aquele
repetido para me fortalecer, a garotinha sem mãe em um mundo
cheio de meninos — que não cai bem pela primeira vez desde que
consigo me lembrar.
— E se eu não quiser um coração de ferro, pai? E se eu quiser
um coração completo? — Eu deixo minha pergunta pairar na linha, o
barulho da sua respiração sendo o único som. — Isso pode ter
funcionado para você. E pode ter funcionado enquanto eu crescia,
para ajudar a lidar com a falta de uma mãe. E, novamente, quando
Ford morreu, mas agora… Agora eu quero sentir. Eu quero amar.
Então você pode ficar com seu coração de ferro. Você pode afastar
sua filha para que você não tenha que vê-la chateada com o fato de
que você está morrendo, e você é tudo que ela tem, mas isso é uma
palhaçada. Você está nos negando tempo, momentos, memórias e
risadas. É uma palhaçada completa. Isso é tão egoísta da sua parte,
que não consigo mais manter minha boca fechada sobre isso por
mais tempo. — Minha voz falha enquanto tento recuperar o fôlego.
— Não é isso que eu…
— Não. Você não pode discordar disso! — grito para ele como
nunca fiz antes. Minhas mãos tremem, e eu ando de um lado da
sala para o outro, perguntando a mim mesma o que diabos estou
fazendo. Mas a dor é real e crua, e não consigo mais segurar. —
Você é quem está me roubando esse tempo para que não tenha que
sentir nada. Para que não se sinta culpado. Dane-se isso. Eu não
vou mais aceitar isso de você. A morte é egoísta. E você também
está sendo. Eu te amo com todo o meu coração. Tudo o que eu
tenho é por sua causa. Tudo o que sou devo a você… Mas quer
saber? Vai se ferrar.
— Scout. — É um aviso cauteloso que não me importo.
O que ele vai fazer? Desligar na minha cara? Provavelmente.
Então luto com o controle para não piorar a situação. É muita coisa,
muito rápido, muito fora de controle, então quando respiro fundo e
digo a mim mesma para me desculpar e deixar as coisas se
acalmarem, faço exatamente o oposto.
— Eu não entendo o que está acontecendo com você. Você
nunca teve uma célula de egoísmo no corpo, e aí agora, quando eu
mais preciso, você está sendo egoísta. Então, quem você quer ser,
pai? O cara de quem me lembro ou de quem me ressinto porque
você estava tão ocupado se preocupando com seu império e com o
maldito legado, que nem uma vez parou para pensar que eu sou o
seu legado. Eu. Seu sangue. Eu sou o que mais importa, porra.
Então talvez você deva pensar sobre isso antes de me dizer que o
que eu fiz não foi bom o suficiente ou que não coloquei minha
família em primeiro lugar. Eu sou apenas uma pessoa, e estou bem
exausta tentando fazer todos felizes. Eu preciso parar por um
momento e pensar sobre o que me fará feliz pela primeira vez. Eu! A
única que vai sobrar.
Eu encerro a ligação e jogo o telefone no balcão da cozinha sem
pensar duas vezes. Estou tão zangada, tão magoada, tão oprimida,
que antes que eu perceba, as lágrimas escorrendo pelo meu rosto
se transformam em enormes soluços intensos que não consigo
controlar. É como se tudo o que tenho guardado fosse liberado e as
comportas fossem abertas.
A pior parte? Eu me sinto culpada pelo que disse, mas não vou
retirar nada, porque é verdade. E isso não me torna egoísta assim
como o acusei? Por precisar botar isso tudo para fora a fim de que
eu possa me sentir melhor?
Eu quero Easton. A admissão me faz chorar ainda mais, porque
eu nunca precisei de ninguém, e agora que preciso, não sei como o
ter de volta. Reconquistá-lo. E se eu não conseguir nos consertar?
Então choro mais e deixo toda a emoção reprimida lentamente
escapar com cada lágrima. O tempo passa. As lágrimas diminuem,
mas não param.
— Abra, Scout!
A voz de Easton ressoa pela porta fechada, e embora cada parte
de mim ganhe vida ao som de sua voz, só consigo fazer os soluços
ressurgirem.
Ele bate mais forte, e eu hesitantemente faço meu caminho até a
porta. Não quero que ele me veja assim e ao mesmo tempo tudo
que eu quero é vê-lo.
Quando abro a porta e o vejo parado, tudo que consigo fazer é
chorar mais. Easton parece tão cansado, tão esgotado, e a tristeza
absoluta que vejo em seus olhos provavelmente rivaliza com a
minha.
— Ea-Ea-ston, eu sinto muito… — Soluço tentando me
desculpar.
Eu sei que não posso, a sorte já foi lançada.
— Não — ele diz. Eu não entendo a razão, mas não preciso,
porque em um piscar de olhos, Easton passa os braços ao meu
redor e está me puxando contra si. — Não. Não. Não — ele
continua a murmurar enquanto as lágrimas vêm com mais força.
Eu não posso pará-las. Eu tento, realmente tento. Eu me
aconchego mais a ele.
Memorizo a sensação de seus braços, o estrondo de sua voz
através de seu peito, o calor de sua respiração no topo da minha
cabeça, o som de seus batimentos cardíacos sob minha orelha e o
cheiro de seu sabonete. E saber que eu, de alguma forma, afastei
essas coisas tão banais do dia a dia só mantém a angústia
ressoando.
— Eu sinto muito — repito várias vezes enquanto ele apenas me
segura com mais força e continua me dizendo “não”.
Quando os soluços agitados finalmente diminuem um pouco,
Easton dá um passo para trás e envolve meu rosto com as mãos.
Balançando a cabeça sempre sutilmente, ele me olha com olhos
profundamente tristes e esfrega os polegares para frente e para trás
em minhas bochechas. O músculo pulsa em sua mandíbula. Seus
lábios se abrem, e depois fecham, como se estivesse tentando
descobrir como dizer o que precisa. Em vez de dizer qualquer coisa,
ele se inclina para frente e pressiona seus lábios nos meus.
Easton me beija com uma paixão que eu nunca senti antes. É
delicado e doce, mas há muito mais nesse gesto.
É um olá.
É um adeus.
É um pedido de desculpas.
É uma declaração.
E eu faço a única coisa que já fui capaz de fazer quando se trata
de Easton. Eu concordo. Dou a ele tudo o que tenho. Cada pedaço
de mim. Cada parte do meu coração.
Mas desta vez não há pânico. Não há medo de que ele vá
embora, porque nós dois sabemos que ele vai, mas estou
começando a me sentir segura de que vai voltar.
É como se nessa loucura toda, eu encontrasse a calma.
Eu o encontrei.
Eu o beijo de volta enquanto as lágrimas deslizam
constantemente pelo meu rosto, o motivo por trás delas mudando
lentamente da tristeza por tudo que aconteceu com meu pai para
aceitação e desejo por mais com Easton.
Nossas mãos deslizam sobre o corpo um do outro enquanto
nossas línguas dançam.
As pontas dos meus dedos sobre sua pele me tranquilizam. O
roçar do polegar ao longo do meu queixo me conforta. O calor de
seu corpo contra o meu me acalma. O sabor de seu beijo me relaxa.
É como todos os beijos que já trocamos antes e nada parecido ao
mesmo tempo.
E como se não estivéssemos perto o suficiente, Easton passa o
braço bom em volta da minha cintura e tenta me levantar, para que
eu fique da sua altura sem quebrar nosso beijo. Eu passo as pernas
ao redor de seus quadris e me deleito com essa sensação. Com ele.
Com o momento em que estamos despejando tudo o que passamos
nos últimos dias neste beijo em vez de usar palavras que podem
machucar, cicatrizar e ferir.
Quando o beijo termina, Easton descansa a testa contra a minha,
e nós ficamos assim — conectados, mas em silêncio —, com
minhas pernas ao redor de seu corpo e minha expiração sendo sua
próxima inspiração.
— East…
— Não. Shh. — Ele balança a cabeça, a testa se movendo muito
ligeiramente contra a minha. — Sem desculpas. Sem conversa. Eu
preciso de você, Scout. Agora, eu só preciso de você.
Eu respondo da única maneira que posso, me inclinando para
frente e pressionando meus lábios nos seus. E eu não tenho certeza
de por que esperava que houvesse urgência entre nós, mas não há.
Não quando ele me leva até minha cama e me deita no colchão.
Não quando tiramos nossas roupas preguiçosamente, enquanto a
doce sedução de nossos lábios um no outro continua sem parar.
Não quando ele separa minhas coxas e desliza para dentro de mim.
O quarto se enche de gemidos suaves e elogios doces, enquanto
nossos corpos se juntam e nossos corações se conectam. Minhas
mãos deslizam pelas linhas duras de seu torso, para que eu possa
sentir os músculos de suas costas enquanto ele se move para
dentro e para fora de mim.
Não. Não há urgência. Eu o deixo tomar o que quiser de mim.
Prazer. Satisfação. Uma reivindicação. Um bote salva-vidas para
assegurar que há um lugar para onde voltar. Um lar. Algo
permanente.
Então, aproveitamos esse momento de felicidade em que o
prazer queima em êxtase e a luxúria dá lugar ao amor. Com um
braço apoiado ao meu lado, Easton se inclina para trás e me olha
nos olhos pela segunda vez desde que abri a porta.
— Eu preciso te ver — ele murmura, e então desliza em mim de
uma forma tão boa, que meu suspiro se transforma em um gemido.
Seus olhos, nebulosos com a luxúria, escurecem ainda mais. —
Goze para mim, Scout. — Outro movimento de seus quadris. Outra
onda de prazer. — Eu preciso ver o que faço com você. — Desta
vez ele penetra o mais fundo que pode e se mexe, para que a
cabeça de seu pau esfregue bem onde eu mais preciso.
Minhas unhas fincam em sua bunda enquanto a outra aperta seu
antebraço. Meu orgasmo se constrói lentamente, suavemente, até
que eu não consiga segurá-lo. Então, com os olhos nos meus, meu
corpo se rende ao dele, e eu gozo em ondas. Uma após a outra, até
que tudo o que resta é o efeito cascata do formigamento nos dedos
das mãos e dos pés.
Quando Easton segue logo em seguida, não há nenhum gemido
selvagem ao qual me acostumei. Não há a sacudida louca de seus
quadris. Ele mantém os olhos nos meus enquanto pode, até que
não consegue mais lutar contra isso. Seus olhos se fecham. Seu
rosto fica tenso. Meu nome é um gemido estremecido em seus
lábios.
E quando o orgasmo diminui, e ele rola de costas, me puxando e
me aconchegando contra seu corpo, tudo o que posso pensar é que
enquanto pega o que precisa de mim, ele não tem ideia de que
acabou de me dar mais do que ele jamais poderia imaginar. Eu
precisava disso.
Dele.
De segurança.
De amor.
Da perspectiva de ter um futuro com alguém.
Ficamos deitados, nossos batimentos cardíacos diminuindo,
enquanto tento descobrir como abordar o elefante na sala que o
sexo não apagou.
— Eu vi suas declarações para os repórteres — digo finalmente
para facilitar a conversa que precisamos ter, mas não queremos.
— E…
— Eu acho que foram inteligentes. Você definiu o tom, e mesmo
que Cory tenha falado com a imprensa, são as suas palavras que
serão mais ouvidas. Você negará qualquer boato se apresentando
como um profissional completo, apaixonado pela cidade que sempre
chamou de lar.
Easton ri.
— Bem, fico feliz que você ache que foi premeditado, mas estava
apenas reagindo à pergunta. Esta cidade significa muito para mim, e
vai ser estranho não usar o uniforme dos Aces.
E, claro, há aquele punhal silencioso no meu coração.
— Eu não posso dizer o quanto sinto muito, Easton. Eu não
deveria ter…
— Não se desculpe. Você fez o que achou melhor.
Ele não diz mais nada, mas minha atenção está voltada para
essas palavras, porque ele nunca diz que algo foi a melhor decisão.
— Sim, mas você ainda foi trocado.
Ele esfrega as mãos no rosto, o som da fricção contra a barba
por fazer enchendo o quarto.
— Pedir desculpas não é algo em que sou bom, mas quando
erro, eu falo. Eu disse algumas merdas maldosas para você ontem à
noite. Coisas que você não merecia, independentemente de ter sido
colocada em uma posição como aquela ou não… Então, eu sinto
muito, Scout. Por te culpar. Por te acusar. Por ser um idiota.
— Obrigada — murmuro enquanto sua mão me puxa para mais
perto, mesmo que já estejamos pele a pele. — Mas eu não
entendo… Como isso aconteceu? Como Finn poderia aconselhá-lo
a assinar aquele acordo?
— Há muito mais do que isso. Eu não posso… — Sua voz
enfraquece, mas a angústia é mais do que evidente. — Assinei
depois de me machucar e… Depois de dez anos juntos, eu assino
onde ele diz para assinar.
— Como você pode confiar nele assim, Easton? Novos
contratos? Negociações? Alguma coisa? Quer dizer, ele…
— Estou cuidando disso — diz secamente, seguido por um
suspiro pesado que oprime tudo na atmosfera. — Jesus. Só… Já
estou cuidando disso, ok?
— Aham — murmuro, ainda insatisfeita com a resposta, mas
abandono o assunto porque sei que Easton tem muito o que fazer.
— Meu voo sai pela manhã.
Essas palavras fazem meu peito se contrair.
— Eu imaginei. — Levanto sua mão e deixo um beijo na palma
enquanto as lágrimas ameaçam cair, mas por uma razão
completamente diferente.
Não vá.
Fique aqui.
Comigo.
Eu não digo nada para Easton, no entanto. Eu não posso fazê-lo
se sentir culpado por partir quando eu fui a catalisadora disso, então
limpo a garganta e tento engolir o nó. Mente limpa. Coração
completo.
— Há tanta coisa que preciso fazer, mas não há tempo
suficiente.
Sua voz está baixa, resignada, e tudo que eu quero fazer é
consertar isso, consertar tudo.
— O que eu posso fazer para te ajudar?
— Se eu pudesse, ficaria aqui. Com você. Assim. — Easton me
beija o no topo da minha cabeça enquanto diz isso, e tão ridículo
quanto parece, faz com que borboletas voem pelo meu estômago.
Ele não me odeia. Eu não percebi o quanto temia isso até esse
momento. — Mas eu tenho que ir ver minha mãe.
Por mais que eu queira ser egoísta e mantê-lo só para mim, eu
sei que não posso. Eu nunca interferiria em sua necessidade de
cuidar da mãe, assim como sei que ele nunca faria o mesmo ao se
tratar do meu pai.
— Quer que eu vá com você?
SCOUT

— EU DEVERIA AVISAR VOCÊ QUE, ÀS VEZES, QUANDO APAREÇO, EL


começa enquanto desliza para fora do lado do motorista da
caminhonete, tirando minha atenção do chão de cascalho e dos
outros motorhomes à nossa volta.
— Não há necessidade — digo baixinho quando encontro seus
olhos, notando que Easton não se mexeu. Sua mão ainda está na
porta do lado do motorista, como se não pudesse decidir se quer
fechá-la ou subir de volta no carro e ir embora. Easton está
desconfortável. Incerto. Agora que estamos aqui, ele não tem
certeza se foi uma boa ideia me apresentar a este lado de sua vida.
Vejo isso na maneira como morde o interior de sua bochecha e na
hesitação das suas ações, quando é geralmente tão seguro de si.
Então, eu faço isso por ele.
Em vez de esperar que abra a porta para mim como ele
normalmente faz, eu abro, saio e encontro-o na frente do carro,
onde Easton me espera.
Ele olha para a porta da frente e depois de volta para mim.
— Eu só preciso vê-la antes de ir — diz ele, com resignação, não
sei se é porque não me quer aqui ou por não saber o que está indo
enfrentar.
— Estou ansiosa para conhecê-la. — Eu o alcanço e entrelaço
meus dedos nos seus em um reforço silencioso. Easton já me
preparou para a mãe e para sua doença, e esta conexão é meu
lembrete de que não estou aqui para julgá-la ou à forma como ele a
trata.
Além disso, quero aproveitar cada minuto que resta com Easton.
Ele está louco se pensa que vai me deixar de lado.
Easton me beija na têmpora, seus lábios demorando alguns
momentos a mais do que o normal antes de suspirar e descer o
caminho para a frente da casa. Plantas penduradas adornam a área
frontal junto ao parapeito, com bugigangas coloridas de jardim
adicionando personalidade ao espaço, o que me faz sorrir.
E o mais engraçado é que quando subimos os três degraus até
um dos melhores trailers do parque, de repente me sinto um pouco
nervosa. Eu vou conhecer a mãe dele. E eu realmente quero que
ela goste de mim, porque eu sei o quanto ela significa para Easton.
Easton bate na porta e aperta minha mão enquanto uma voz
feminina grita:
— Estou indo. — Quando a porta se abre, a mulher no outro lado
emite o suspiro mais doce. — Easton! — Ela ultrapassa a soleira da
porta e em segundos está em seus braços, agarrando-se
firmemente a ele, e ele a ela. — Você veio me ver. — Sua voz dela
está abafada por estar pressionada contra o peito de Easton, mas o
amor transbordante é inegável.
— Oi, mamãe. — Sua afeição é igualmente cativante.
— Olha só você. — Ela se inclina para trás e olha para ele, o
sorriso amplo, as mãos alcançando as laterais de seu rosto; os
olhos dela focados apenas nele. — Tão bonito. Você está bem? Eu
estava tão brava quando vi a coletiva de imprensa esta manhã. Eu
estava no bar e…
— Às oito e meia da manhã?
— Não me venha com essa. Eu só estava parando lá para tomar
um Bloody Mary ou dois e dizer “oi” para todo mundo, foi só isso. —
Ela dá um tapinha na bochecha dele enquanto eu silenciosamente
observo-o cerrar os dentes e conter sua resposta. — Mas e se eu
precisar de você quando estiver fora? E se…
— Trouxe alguém que quero que você conheça.
Ela se assusta, as mãos indo imediatamente arrumar o cabelo.
— Mas eu não estou arrumada… — Sua voz enfraquece quando
me nota parada ali, sem dúvida parecendo pior por estar com os
olhos vermelhos da minha crise de choro anterior.
Ela se vira na minha direção e pela primeira vez eu tenho uma
visão completa da mãe de Easton. A semelhança entre os dois é
incrível: olhos escuros e amendoados, mesma estrutura facial, com
as maçãs do rosto salientes, mesmo sorriso um pouco torto. Os
olhos parecem cansados, as linhas gravadas em seu rosto contam
uma história própria, mas seu sorriso é gentil e acolhedor.
— Olá, sra. Wylder. É tão bom conhecê-la. — Eu estendo a mão,
e ela a agarra de pronto, sacudindo-a calorosamente.
— É muito bom conhecer você também. — O sorriso se alarga
quando olha para Easton, minha mão ainda está na dela. — Ela é
tão bonita.
Eu coro imediatamente e Easton ri.
— Sim, ela é. Mamãe, esta é Scout Dalton. Scout, esta é minha
mãe, Meg. — Ele olha para mim, e pela primeira vez posso ver a
apreensão se desvanecer.
Meg me encara por um segundo a mais do que o normal, os
olhos se estreitando enquanto me estuda rápida e descaradamente.
— Oh, eu sinto muito, onde estão minhas maneiras? Por favor,
entrem.
Num instante, ela se torna uma bola de energia com mãos
nervosas quando se vira para entrar, batendo o quadril contra o
batente da porta, se desculpando. A mão de Easton está de volta na
minha, e por um breve segundo ele me puxa contra si, pressiona o
mais suave dos beijos na minha têmpora e murmura “obrigado”
antes de me conduzir pela porta.
O interior é limpo, mas é possível ver que alguém mora aqui. As
almofadas do sofá estão amassadas em alguns pontos, a sala à
nossa frente está cheia de caixas de produtos e aparelhos que
parecem nunca terem sido abertos, e a televisão está ligada, um
jogo de beisebol passando na tela. É um jogo dos Aces, isso é
óbvio, mas estou um pouco assustada quando vejo Easton, seu
número 44 visível quando ele se vira e caminha de volta ao monte
do arremessador. Eu encontro o olhar de Easton brevemente, e ele
apenas balança a cabeça como se isso fosse normal — o fato de
sua mãe viver no passado e assistir a reprises de seus jogos
antigos.
— Easton nunca trouxe uma garota para casa antes — ela
murmura enquanto endireita as revistas. — Quer uma bebida?
Vamos tomar uma bebida — ela diz, apesar da minha recusa
educada.
Eu ouço Easton suspirar suavemente enquanto seu olhar segue
Meg indo para a cozinha. O som de garrafas tilintando preenche o
pequeno espaço, seguido por sua reclamação murmurada. Ouve-se
mais tilintar.
Easton aperta a mandíbula e balança a cabeça antes de olhar
para mim.
— Me dá um minuto, ok?
— É claro.
Tento chamar sua atenção para dizer que está tudo bem, que ela
está apenas nervosa, mas tenho certeza de que Easton inventou as
mesmas desculpas para a doença dela mais vezes do que pode
contar. Além disso, ele já deu três passos para a cozinha, sua voz
um murmúrio calmante antes de as garrafas de vidro fazerem
barulho mais uma vez. Permitindo que eles tenham privacidade, eu
vou para a parte mais distante da sala, para estudar as fotografias
que se amontoam em cada centímetro da parede.
E cada uma delas é de Easton.
Muito parecido com as camisetas de Easton em seu campo
particular, essas fotos mostram a história de sua vida, e com muito
mais detalhes. Uma criança sentada no colo da mãe enquanto ela
olha com adoração para o marido. Um garotinho de pé ao lado do
pai, com uma vara de pescar na mão e um peixe se debatendo no
anzol. Um Easton um pouco mais velho, com um chapéu de caubói
muito grande para sua cabeça, entre a mãe e o pai — ambos
impressionantes à sua própria maneira. Momentos de uma infância
que ele não fala muito.
E então as fotos começaram a mudar. Cal se torna ausente
enquanto muitas delas são de Easton em vários uniformes de
beisebol. A transição do menino para o homem é visível em cada
uma. Existem algumas outras, e suponho que sejam de seu baile do
colégio, formatura e encontros familiares.
Eu poderia ficar olhando para elas para sempre, mas o murmúrio
soando através da sala chama minha atenção. Easton está curvado
para baixo, pareando os olhos com sua mãe, suas imagens
espelhadas de perfil; ele está falando baixinho com ela, tentando
acalmá-la. Ela pega um copo do balcão que está cheio de um
líquido âmbar e entrega a ela, suas mãos em forma de concha antes
que ela o leve aos lábios e dê um gole.
Os olhos de ambos se fecham enquanto ela bebe — os dela
quando consegue a droga que precisa, e os dele por reconhecer
que seu amor não basta para quebrar o ciclo. E quando ele olha na
minha direção, a derrota está em seus olhos, mas também o amor
pela mãe. Ele odeia o vício dela — isso é óbvio — então faz a única
coisa que pode: Easton ama a mãe. É comovente saber como isso é
difícil para ele e ver isso em primeira mão.

— O que você está pensando? — Seus dedos enrolam uma mecha


do meu cabelo à medida que os vaga-lumes se movem ao nosso
redor e os grilos e sapos contribuem para a trilha sonora da noite.
— Um monte de coisas — murmuro contra o calor de seu peito
nu.
— Como o quê?
— Como por que nós dois temos camas perfeitamente
agradáveis e ainda assim sempre acabamos fazendo sexo em outro
lugar.
Sua risada ressoa no peito.
— Você está dizendo que não gosta da atmosfera?
Eu levanto a cabeça na direção de onde a luz da lua está
refletida na água no lago e ouço o farfalhar das árvores com a brisa
ao nosso redor, sabendo que não há outro lugar onde eu preferiria
estar que não seja bem aqui, agora.
— Sem confusão, sem frescuras.
— Exatamente. Você é o tipo de garota sem complicações e sem
frescuras. — Easton beija o topo da minha cabeça. — E isso é
romântico. Você pode dizer que não, mas eu sei que você é uma
romântica incurável.
— Parece que alguém pode ter ouvido um ou outro livro de
romance enquanto dirigia.
— Ah, por favor. — Ele dá um tapinha na minha bunda com a
mão livre. — Eu sabia que não haveria distrações aqui e eu
precisava de uma. Com você.
— Concordo. Além disso, quem poderia dizer não a uma parada
repentina no caminho de casa para nadar nu e fazer amor ao luar?
— Eu o beijo no meio do peito e amo a forma como seus dedos
apertam meu cabelo momentaneamente. Um reconhecimento sutil
do quanto eu o afeto.
— Eu, não. — Easton fica em silêncio e então diz: — Você disse
que estava pensando em muitas coisas. O que mais?
— Vamos ver — digo enquanto descanso meu queixo em seu
peito e olho para ele. — Eu estava pensando em como deve ser
legal ter dois pais que te amam tanto, que fariam qualquer coisa por
você. Eu nunca tive isso.
— Sou um cara de sorte. — Seu suspiro preenche a noite ao
nosso redor. — Mesmo com tudo da minha mãe e com meu pai
exigente, sei que sou sortudo.
— Você é bom para ela, sabe?
A risada que Easton emite é autodepreciativa.
— Eu sinto que estou apenas alimentando seu vício às vezes,
mas, ao mesmo tempo, sei que tenho feito tudo que posso para
ajudá-la, então o que mais devo fazer? Afastá-la de mim? Mantê-la
trancada a sete chaves? Ela não vai deixar a droga do parque de
trailers. Eu tentei comprar uma casa para ela, trazê-la para mais
perto… Mas ela não vai se mudar. Como você pode ver pelo jogo de
beisebol gravado, minha mãe está presa no passado. Ela diz que o
amor da sua vida vai voltar para ela algum dia, e só Deus sabe
quem é. Às vezes, acho que não é ninguém, apenas uma invenção
de sua imaginação que o álcool incentiva na maioria dos dias.
Outras vezes, acho que é uma pessoa real.
— Talvez seja seu pai. — As palavras saem sem pensar, e
Easton encolhe os ombros para elas.
— Agora você está apelando para o menino de dez anos que
mora em mim que costumava rezar para que os pais voltassem a
ficar juntos e ele pudesse ter uma vida normal. Desisti dessa
esperança há muito tempo.
— Deve ter sido difícil.
— Não é mais difícil do que aquilo com que você teve que lidar
— diz ele. Eu amo o fato de Easton dizer isso tão casualmente e eu
não ter levantado nenhuma das minhas defesas habituais.
Depois de refletir sobre o comentário, volto o assunto para ele.
— Você é bom para ela. Você é doce e amoroso, e acima de
tudo, paciente. Muitas pessoas a teriam afastado, mas não você.
Você é o mundo inteiro dela, e isso é evidente.
— Sim, bem, vamos esperar que ela fique bem nos próximos
meses enquanto eu estiver fora. Então, na baixa temporada, posso
pensar em um plano a longo prazo de como vou cuidar dela.
— Ela parecia estar lidando bem com a notícia. Parecia saber
que sua ida é uma coisa temporária.
— Ela escondeu bem, mas eu percebi que ela estava pirando.
— Como eu disse a você quando saímos, se ela precisar de
ajuda, posso ir quando estiver na cidade.
— Eu não posso pedir isso a você, Scout. É sempre uma
incógnita com ela. Eu nunca sei o que vou enfrentar quando
apareço. Hoje foi bom. Ela sabia que eu estava vindo, então não
estava ocupando sua cadeira cativa no bar. Outros dias, sou
deixado para limpar o rastro que o álcool deixou pelo caminho.
— Você é um bom filho, Easton. E a oferta ainda está de pé.
— Obrigado. — Seu dedo traça uma linha para cima e para baixo
ao longo da minha coluna e me arrepia, apesar do ar quente da
noite. — Você quer conversar sobre por que você estava tão
chateada quando eu apareci mais cedo? Eu posso imaginar que era
porque brigamos, mas não sou um idiota arrogante para fazer essa
suposição.
— Tive uma discussão unilateral com meu pai — finalmente
admito, e então fico em silêncio, não querendo estragar este tempo
que tenho com Easton.
— Você não conseguiu o contrato, não é?
As palavras duras que disse ao meu pai voltam à tona.
— Esse é o problema, eu consegui o contrato. Cory me
concedeu um contrato de experiência até o final da temporada.
Quando chegar ao fim, Cory decidirá se eles querem me contratar
para a próxima temporada.
— Você não parece feliz.
— Por que você está surpreso com isso? Eu sinto que estou te
traindo por aceitar isso. Ter que trabalhar para Cory, para a equipe,
apenas para cumprir os desejos do meu pai… Faz minha pele se
arrepiar.
— Todos nós às vezes fazemos coisas por nossos pais que nem
sempre nos fazem bem — ele reflete em um tom que me diz que
está falando sobre si mesmo também. Sobre a mãe, sobre o pai.
— Eu disse isso ao meu pai. Eu disse algumas coisas que
provavelmente não deveria, mas… Eu não pude evitar. Teve o que
você me disse ontem à noite e então tive que lidar com Cory e sentir
que estava comprometendo minha moral. Eu não consegui mais
segurar.
Easton me puxa com mais força e me segura junto ao seu corpo
por um momento. Eu agradeço por ele não tentar dar conselhos ou
consertar nada e apenas me deixar falar.
— Eu entendo por que é importante para ele… O contrato, digo,
mas é realmente tão importante assim? Não deveria gastar o tempo
que lhe resta com aqueles que ama e são mais importantes?
— E eu creio que foi isso que você disse a ele?
Eu rio.
— Em termos muito menos educados.
— Sim, bem… — diz ele. — Sempre há aquele momento em que
você precisa enfrentá-los. Não é fácil, mas você sempre se
arrepende das coisas que não falou.
— Espero não me arrepender das coisas que falei.
Deixa de lado o que eu não falei.
Nossa conversa acaba ao som de grilos e sapos, além do
ocasional som dos carros na rodovia a alguns quilômetros a leste. E
quanto mais ficamos deitados aqui e curtimos um ao outro, mais eu
penso sobre as últimas vinte e quatro horas. As coisas que disse a
Easton. As coisas que não disse. O fato de que disse a ele que o
amava e ele não aceitou. Que Easton pensou que era um apelo
desesperado para pedir perdão quando foi provavelmente a coisa
mais verdadeira que eu disse em toda aquela discussão.
Eu preciso dizer de novo.
— Easton, há algo que quero esclarecer sobre a noite passada.
Eu disse algo que…
— Não — diz ele enquanto se apoia em seu cotovelo, meu corpo
se movendo até nos encararmos. Ele coloca um dedo sob meu
queixo e inclina para cima. — Eu não quero falar sobre a noite
passada. Ou sobre nossa discussão. Ou sobre beisebol. — Ele se
inclina para frente, roçando os lábios nos meus, sua língua é um
toque provocador. — Eu quero deitar aqui na grama alta com você…
— Outro roçar de seus lábios. — Ouvir sua risada. — Dessa vez o
beijo dura um pouco mais. — Provar sua pele. — Um beijo de boca
aberta na parte inferior da minha mandíbula. — E fazer amor com
você até vermos o sol nascer. — Se Easton aceitar um suspiro
como resposta, então conseguiu o que queria. E quando ele se
inclina para trás para olhar nos meus olhos, posso ver que já sabe
disso. — Eu quero me afogar em você esta noite, Scout. Quero
esquecer o mundo, esquecer o que vai acontecer amanhã e me
afogar profundamente em você, começando agora.
Com meu coração em suas mãos, seus lábios nos meus, Easton
me deita no chão e faz exatamente o que promete.
Não há mais necessidade de conversa. Não é necessário
mencionar o óbvio sobre o que acontecerá amanhã de manhã.
Não há como assegurar ao outro que podemos sobreviver a
isso… Porque, por algum motivo, nós simplesmente sabemos.
Eu sei disso.
E essa é a sensação mais estranha de todas.
EASTON

— EI. — DOU UM BEIJO EM SUA TÊMPORA.


— Mmmm.
— Eu tenho que ir — sussurro, mas tudo o que quero é voltar
para a cama ao lado de seu corpo quente e muito tentador e fingir
que não tenho que sair.
Seu corpo estremece quando acorda e percebe que, embora
meu quarto ainda esteja escuro, é hora de ir. Minha mochila no
balcão da cozinha e meu pai esperando no carro para me levar ao
aeroporto confirmam isso.
— East. — Sua voz está rouca e sonolenta, e seu cabelo uma
bagunça selvagem que tenho certeza de ainda conter folhas da
noite passada. Ambos imploram para cada parte de mim continuar
aqui com ela. E quando a consciência a atinge, Scout se senta na
cama, olhos alerta, mas movimentos ainda lentos. — Me deixa
escovar os dentes. Levantar. Eu preciso te acompanhar. Eu só…
— Shhh — eu digo enquanto me abaixo na cama. — Não se
levante. Fique na cama e durma um pouco.
Eu a puxo para mim e a seguro em meus braços. Inspiro seu
cheiro. Seu perfume. Seu shampoo. Nosso sexo ainda está em sua
pele.
— Vou sentir sua falta — ela murmura contra meu peito, e sinto
seu queixo estremecer enquanto ela luta contra as lágrimas.
— Eu também, mas nos veremos em breve. Vamos conversar
todos os dias. Nós vamos fazer isso dar certo, Scout. Não lutei tanto
para perder você.
Scout se agarra a mim, e posso sentir seus ombros
estremecerem. Eu odeio estar fazendo isso com ela — ir embora —
quando prometi que não faria.
— Eu falei sério — ela finalmente diz.
— O quê? — pergunto, minha mão alisando seu cabelo.
— Eu amo você.
E bem aí — a merda das três simples palavras —, eu morri.
Estou totalmente perdido por esta mulher, que é uma confusão de
contradições e que inesperadamente roubou meu coração.
Sim, ela disse isso na outra noite. Scout jogou a declaração em
mim durante a porra de uma discussão, mas não foi a primeira vez
que uma mulher desesperada o suficiente jogou seu amor por mim
no meio de tudo para tentar me manter na linha. Então eu deixei
para lá, não trouxe isso à tona. Eu percebi que se ela quisesse dizer
isso, diria novamente.
E Scout simplesmente disse.
Então isso, bem aqui, agora é real. Ela está falando sério. E
foda-se, é uma sensação muito boa.
— Demorou muito. — Eu rio com meu queixo apoiado em sua
cabeça e a puxo um pouco mais perto enquanto Scout luta para se
afastar de mim.
— Você é um idiota arrogante — diz enquanto dá um tapa de
brincadeira no meu peito.
— Sim, bem, esse idiota arrogante está apaixonado por você
também. — Eu trago minhas mãos para suas bochechas, para que
eu possa olhar em seus olhos através da luz difusa. Eu quero que
ela veja que eu realmente quero dizer isso.
— Oh. — Seu sorriso é instável, e seus olhos brilham com
lágrimas.
— Sim. Oh. Mas é verdade — murmuro antes de grudar meus
lábios nos seus, hálito matinal e tudo, porque eu não vou perder
uma última chance de beijá-la.
E quando saio da minha casa em direção ao desconhecido, sinto
como se talvez tudo isso possa dar certo.
Eu não a deixei debater sobre como vamos administrar.
Eu não a deixo ter a chance de se assustar.
Eu apenas digo a ela como será. Eu indo para o trabalho. Ela
indo ao trabalho. E nós dois fazendo isso aqui funcionar.
Além disso, Scout me ama.
A mim.
Bem quando eu senti que tudo estava desmoronando, estou
começando a pensar que talvez as coisas possam finalmente estar
se encaixando.
SCOUT

ELE DISSE QUE ME AMA.


Claro que eu estava nua, meio dormindo, e Easton estava indo
embora, mas ele disse que me ama. Que está apaixonado por mim.
Quão perfeito foi isso, mesmo que estejamos longe de ser
perfeitos?
Ele disse que me ama, e eu não me assustei.
Para uma garota que evitou essas emoções a vida toda, ouvir
essas três palavras e sentir que estou flutuando, em vez de pânico,
é uma coisa bem louca.
Mas estou em sua cama, cercada por seu cheiro, e eu sei que
vou precisar de tudo de mim para deixar esse lugar, já que não o
verei de novo por algum tempo. Eu rolo e encontro meu celular ao
meu lado.
Estranho. Eu sei que de jeito nenhum o deixei aí. Quando eu o
alcanço, há um Post-it na tela. Tudo que diz é: Ouça-me.
Eu me esforço para me sentar, ansiosa para ouvir a mensagem,
como uma colegial ridícula esperando a paixão adolescente ligar.
— Bom dia — a voz grave e áspera de Easton vem diretamente
do alto-falante e me faz fechar os olhos e já sentir sua falta, embora
tenham se passado apenas algumas horas desde que ele partiu. —
Pegue minha camisa. Coloque-a. E então ouça sua próxima
mensagem.
Com um sorriso nos lábios, freneticamente olho ao redor do
quarto buscando por sua camisa, apenas para perceber que está no
travesseiro ao lado da minha cabeça.
Eu rio para o quarto vazio enquanto a pego, levo em direção ao
nariz e inspiro antes de vesti-la.
— Primeiro as coisas mais importantes, Kitty. Eu deixei algo para
você no meu lugar favorito na cozinha.
Saio da cama, correndo pelo corredor até a ilha da cozinha,
minha mente pensando na semana passada, quando Easton fez
queijo-quente para o jantar. Como eu pulei no balcão para que
pudesse observá-lo, e antes que eu me desse conta, minhas coxas
estavam separadas e sua língua estava me deixando em um
frenesi; os sanduíches acabaram queimados como carvão.
O melhor queijo-quente que nunca comi.
Quando chego à cozinha, há um calendário em cima do balcão.
Demoro um minuto para descobrir o que significa. No seu garrancho
típico, Easton marcou os dias do mês até o final da temporada com
um D para os jogos dos Wranglers e um A para os jogos dos Aces.
— Veja os círculos laranja — diz ele na mensagem. — Esses são
os dias em que nos veremos, quer estejamos em cidades distintas
ou tenhamos um ou dois dias de folga. Estou reivindicando todos
eles para que você não marque nada com seus outros namorados
nessas datas. — Eu sei que Easton está brincando, mas minha
cabeça está balançando para os lados como se ele estivesse louco.
— Próxima pista: a primeira vez que você veio ao meu apartamento,
como foi que eu consegui que você finalmente viesse até aqui?
Eu fico com as mãos nos quadris por um segundo enquanto olho
para a parede de vidro das janelas da sala, em seguida, entendo o
que ele está dizendo: o banheiro. Eu corro para o banheiro de
hóspedes no saguão e rio do que vejo lá. No balcão está uma caixa
de CD. É um audiolivro. O Último Pistoleiro, de Stephen King.
— Se eu vou ficar preso ouvindo qualquer romance que você
baixar no meu iPod, então você terá que ouvir o meu tipo de livro
também. Além disso, os voos de avião podem ser enfadonhos, e a
última coisa que você quer é conversar com Tino e Drew. Eu vou
apelar para a quinta emenda por qualquer coisa que eles disserem
sobre mim… Então ouça este livro. Eu vou fazer um quiz, e você vai
querer ganhar a recompensa por acertar todas as perguntas. —
Meu sorriso não poderia crescer mais nem se eu tentasse. Eu
recolho a caixa com o CD e ouço o restante da mensagem. — Qual
é o lugar que você mal podia esperar para ver? Eu acredito que tive
que lutar para te beijar, porque você não iria calar a boca sobre isso.
Agora eu vou beijar você até desmaiar, Scout, e quero me divertir
pra caralho fazendo isso. Então, pelo amor de Deus, mulher, use
esses seus lábios em mim e não falando.
Estou no elevador em um piscar de olhos, descendo para o
campo privado no porão. Quando as portas se abrem, fico hesitante
ao sair. Parece estranho estar aqui sem Easton. Esse é o lugar dele.
Seu refúgio.
E ainda assim a curiosidade me vence.
Eu acendo as luzes e começo a andar, procurando pelo próximo
item. Demoro um segundo para ver o pote de vidro em cima da
home plate.
Quando eu pego, tudo que posso fazer é balançar a cabeça para
as dezenas de pastilhas de menta dentro dele.
— Há uma para cada dia até o fim da temporada. Nossa própria
pequena contagem regressiva. Além disso, joguei algumas extras aí
também, no caso de um dos nossos times chegar aos playoffs.
Quando você chupar uma delas, pense em mim. — Sua risada é
profunda e sugestiva. — E, finalmente, qual é o único lugar onde eu
estive, olhei para você com as luzes do estádio em seu cabelo e
sabia que não havia como voltar atrás quando se tratava de nós? —
Eu faço uma careta para o telefone. — Não revire os olhos, Kitty.
Pense sobre quando você ficou lá e me arrebatou como ninguém
antes.
Empolgada, entro no elevador para ir até a janela panorâmica
onde Easton e eu percebemos que poderia haver mais entre nós do
que apenas luxúria passageira. Quando chego lá, não tenho certeza
do que estou procurando. Eu fico olhando para o estádio vazio
abaixo, hipnotizada por um momento, enquanto me lembro daquela
primeira noite: nossos dedos mindinhos se juntando; o apartamento
escuro e o céu iluminado por um estádio; a sensação de ser
compreendida.
Demoro um momento para ver um chaveiro com uma chave na
base da janela. Não tenho certeza de como me sinto com isso; eu
olho para ele por um momento enquanto tento compreender o que
Easton está me oferecendo. O que ele está me dizendo. Porque
sim, Easton ofereceu isso outro dia… Mas foi antes de tudo
acontecer, e agora aí está — uma chave nova, brilhante e prateada
de sua casa presa a um chaveiro dos Austin Aces.
Pego o telefone e rio de mim mesma e dos meus dedos trêmulos
enquanto clico para ouvir a próxima mensagem.
— Eu sei que agora você provavelmente está parada aí, se
perguntando se deveria estar assustada ou não. Pensando que
você pode ter dito as palavras, mas isso torna as coisas reais, isso
nos torna reais, e essa parte te faz pirar. Eu não fui para a cama
noite passada, Scout. Eu me sentei e te observei dormir e me
perguntei como fazer para isso dar certo. Como, com duas agendas
malucas e em cidades diferentes, pode funcionar para a gente…
Mas vai. Então pegue esta chave. Use-a. Ou não. Mas saiba que
está aí para você. O armário está com a metade vazia para você
ocupar. As gavetas…. Tudo. E enquanto você está hiperventilando,
saiba disso… Eu nunca conheci ninguém como você, Scout. Você
me desafia. Você me faz rir. Você me encoraja. Mas mais do que
qualquer coisa, você me entende. Minha necessidade por esse jogo
que tanto amo quanto odeio. Como amo meus pais, mesmo quando
me sinto como se a corda ainda amarrada aos dois estivesse me
estrangulando. Como um piquenique em uma colina, assistindo a
um jogo da Liga Infantil, onde torcemos por desconhecidos, é o que
preciso às vezes. Então, quando você ficar com medo, quando se
perguntar como isso vai funcionar, lembre-se de que deixei uma
chave porque pretendo voltar para casa, para você. Você ouviu
isso? Estou pensando em voltar para casa…
Cada parte do meu corpo fica coberta de calafrios quando a
mensagem termina. Eu só fico parada, olhando para a chave no
chaveiro idiota, com lágrimas borrando meus olhos, até que aperto o
play novamente.
E de novo.
SCOUT

— EI. — SUA VOZ É EXATAMENTE O QUE PRECISO OUVIR. DEPOIS DE ME


sido teimoso e se recusado a falar comigo. Depois de lidar com Cory
e suas besteiras.
Este telefonema inesperado de Easton é o que preciso para me
realinhar.
— Ei, garanhão. — Tento me acalmar e não me sentir boba por
ser uma bagunça de hormônios femininos, os quais não quero usar
como desculpa, sendo que faz apenas algumas horas que Easton
viajou.
— O que você está fazendo?
— Ficando vesga enquanto trabalho com planos, cronogramas e
arrumo pessoal para a equipe. O último dia de Sam é quarta-feira,
então estou tentando descobrir quem devo manter, quem devo
chamar, esse tipo de coisa.
Eu olho para a minha mesa coberta de papéis e, em seguida,
para fora da janela, para o vestiário, e meio que esperava ver
Easton lá, me ligando e fingindo não estar falando comigo como fez
antes.
— Parece emocionante.
Eu rio, o arranhar em sua voz sexy como o pecado.
— É, sim. Para mim, pelo menos. Acho que a equipe chegou
bem até aqui, certo? Como está Chicago?
— Está abafado como o inferno. Mas bom.
— É uma ótima cidade. Eu trabalhei lá ano passado por um
tempo, mas com o Cubs, não com o Sox. Como os outros jogadores
estão te tratando até agora?
— Bem. Como sendo parte da equipe. Eles estão todos um
pouco chocados com a troca e estão sendo solidários. Alguns deles
ouviram, algum tempo atrás, um boato de que esta não é a primeira
vez que Cory ferra com um jogador, então eles estão me
perguntando um monte de coisas. Pelo que sei, são rumores, então
não estou comentando nada… É só diferente, sabe? — Há um tom
de tristeza que Easton limpa rapidamente. — Mas adivinha?
— Diga.
— Estou liberado para jogar esta noite. — A empolgação em sua
voz corresponde à onda repentina que sinto.
— Sério?
— Mathers não conseguia acreditar que os Aces não haviam me
liberado.
— Mathers é um profissional competente. Achei que ele veria a
verdade em vez de minha mentira e te reintegraria — acrescento,
me perguntando o que Mathers deve estar pensando sobre a minha
competência, considerando que avaliei Easton como inadequado
para jogar. — Estou feliz por você, mas, como disse antes, eu já
sabia disso. — Minha voz vacila na última palavra enquanto tento
manter as emoções sob controle.
— Você vai assistir?
Eu rio e chamo a atenção de alguns dos caras que estão
passeando e saindo após seus treinos.
— Eu não perderia por nada no mundo.
— Ok. Obrigado. Preciso desligar, mas queria ligar, conversar…
ouvir sua voz.
E meu coração amolecido continua a derreter.
— Ei, Wylder?
— Sim?
— Arregaça.
Ele ri.
— É tipo “arrebenta”?
— Sim. Arregaça o jogo… Mas arregaça mesmo, porque estou
contando os pontos.
— Pontos? São como os pontos de brownie que ganhei antes?
— ele pergunta brincando.
Droga, isso foi divertido.
— Algo assim. — Eu rio, e seu nome é chamado ao fundo.
— Te ligo mais tarde?
— Divirta-se, Easton.
A ligação termina.
Eu amo você.
Eu testo dizer isso em pensamento, os malditos hormônios
assumindo o controle novamente, mas quando você não está
acostumada a dizer as palavras, não sabe com que frequência é
exagero. Porque é quase como se, agora que eu cheguei à
conclusão, eu soubesse que senti isso o tempo todo.
Eu nunca o teria deixado entrar se não fosse por isso.
EASTON

— VOCÊ FICA MUITO BEM DE AZUL, WYLDER.


Eu rio enquanto olho para Stidwell e bato o punho no dele.
— Obrigado, cara.
— Estamos felizes por ter você, mas, porra, cara, você pegou um
negócio ruim.
— Bem… — Eu levanto as sobrancelhas e rio. A pontada ainda
está aqui, mas meu novo equipamento azul no banco ao meu lado
embaça o sentimento um pouco.
— Entendo. Você não pode falar sobre isso — diz ele. — De
qualquer forma, todo mundo está falando sobre o Tillman. Sobre a
merda esquisita em que ele colocou em você, e agora por causa do
seu alto nível, as pessoas estão ouvindo as reclamações de Reagan
sobre o que Cory fez com ele em Baltimore no ano passado. Como
ele fez a mesma merda lá. Cortar custos a qualquer preço não é
uma boa maneira de ganhar um troféu…
— Verdade — digo, mas encolho os ombros. Agora eu tenho um
jogo para jogar, meu primeiro jogo no retorno, e, caralho, estou
preparado para cruzar a linha e sujar minhas chuteiras. Eu olho para
cima, e mais alguns caras se reuniram. Alguns eu conheço de
passagem. Outros, nunca vi. Alguns com os quais já joguei antes,
quando eram dos Aces. Bem ciente de que qualquer coisa que eu
diga pode ser citada, vou pelo seguro. — Carma é uma merda.
— É — Stidwell diz enquanto me entrega meu boné. — Como eu
disse, estamos felizes por ter você aqui.
— Obrigado, gente.
E quando coloco meu boné na cabeça, uma chuva de purpurina
azul cai sobre mim. No cabelo, rosto, roupas, chão. Em toda porra
de lugar. Os caras estão se dobrando de tanto rir enquanto Stidwell
tenta manter um rosto sério.
— Tino disse que precisávamos recebê-lo adequadamente na
equipe. Além disso, ele disse que azul é a sua cor.
Filho da puta.
Eu não posso deixar de rir, o maldito glitter caindo na minha boca
quando dou risada.
Sim, porque meus amigos — a brigada anti-Santiago —
conheciam a maneira perfeita de me fazer relaxar antes de entrar
em campo pela primeira vez no que parece ser uma eternidade.
Eles fizeram com que eu me sentisse em casa.
SCOUT

— AH, VAMOS LÁ. VOCÊ PODE FAZER MELHOR DO QUE ISSO — ENCORAJ
pressiono a perna de Dillinger, sua panturrilha repousando no meu
ombro.
Ele faz uma careta e sibila um longo suspiro baixo enquanto
estico os tendões contraídos que ele trabalhou demais na semana
passada.
Eu ouço os comentários sussurrados de alguns dos rapazes. Eu
precisaria ser surda para não os ouvir. Estou mais do que ciente do
que parece para eles a posição do meu corpo com Dillinger — como
se eu estivesse tentando montá-lo —, mas ainda assim não me
importo. Este é o meu trabalho. Fazer com que ele melhore antes de
ir lançar nesta noite. Cada vitória conta para os Aces manterem a
posição, e com a temporada lentamente terminando…
— Posso ser o próximo? — Eu olho para onde Santiago está, e
então volto minha atenção para Dillinger, enquanto eu alivio a
pressão e desço sua perna.
Movendo-me da minha posição entre suas coxas, eu olho para
trás para Santiago.
— Eu não sabia que você estava machucado.
— Eu não estou, mas se você está distribuindo um alongamento
de graça como esse, pode me colocar na fila. — Ele sorri, e tudo
nesse comentário faz minha pele arrepiar.
— Há uma fila muito longa e bem distinta à sua frente, Santiago.
Caras que realmente precisam de mim. Então sugiro que você vá
para o final da fila. Se eu tiver tempo, veremos como resolver seus
problemas, mas tenho certeza de que dar um jeito nisso aí está
acima do meu nível salarial. — Eu levanto as sobrancelhas e
apenas olho para ele, para que saiba que não vou levar desaforo de
ninguém.
Dillinger assobia baixo e suave enquanto Santiago estreita os
olhos, até que se vira e vai embora.
— Nem todo mundo aqui é idiota — diz ele, chamando minha
atenção. — Mas parece que muitos deles estão agindo como tal
ultimamente.
— Já estou acostumada — eu digo e dou um aceno de cabeça,
tentando manter a fachada profissional de garota durona. Ao mesmo
tempo, estou aliviada por saber que não estou vendo coisas que
não existem. A superabundância de toalhas sendo acidentalmente
deixadas cair quando entro no vestiário. Os comentários sugestivos
e sarcásticos aqui e ali. As ofertas para encontros, apesar das
minhas recusas constantes. Coisas que nunca aconteceram quando
Easton estava aqui, com seu compromisso comigo claro, embora
pensássemos que estávamos sendo discretos. — Você está bem e
totalmente alongado? Pronto para rebater esta noite?
Arregaçar o jogo. Eu sorrio e penso em Easton.
— Sempre. — Ele me oferece um grande sorriso antes de ir para
a parte principal do vestiário.
— Você está bem? — Drew pergunta ao mesmo tempo em que
encosta no batente da porta.
— Sim — digo enquanto solto um suspiro, mas o olhar em seu
rosto diz que não está acreditando.
— Tem certeza?
— Sim. Obrigada. Posso te ajudar com alguma coisa? —
pergunto, esta pequena visita é fora do comum para ele.
— Easton está com boa aparência. Forte. Só aquele filho da puta
sortudo voltaria a campo em um novo time após tanto tempo
ferrado, acertaria três homers e chutaria todas as pessoas que
tentaram sacanear ele em sua primeira semana de retorno. É como
se ele fosse um super-herói ou algo assim. — Ele ri com um aceno
de cabeça.
— Não diga isso a ele, ou nunca conseguiremos que seu ego
passe pela porta.
— Não é? Você está acompanhando os jogos dele?
— Claro. — Ofereço um sorriso malicioso. — Vocês jogam lá
fora, e eu sento aqui e o vejo pelo telefone.
— Traidora. — Desta vez sua risada é alta e chama mais a
atenção dos caras.
— O mesmo pode ser dito da gestão desta equipe e o que
fizeram com ele.
— Sim. O pessoal ainda não aceitou isso. Todo mundo está
nervoso. Se eles podem fazer isso com Easton, o próprio sr. Ace,
então podem e vão fazer isso com qualquer pessoa. Isso não
contribui para o moral da equipe.
— Como poderia?
— Há rumores de que Cory está na mira. Acho que Finn
finalmente conseguiu falar com Boseman, e ele está chateado com
o que Cory fez a East. Parece que ele nunca aprovou a troca. A
porra da mão esquerda não sabe o que a mão direita está fazendo,
e ainda assim alguém foi punido.
— Tão eloquente — digo revirando os olhos, mas estou mais
intrigada do que nunca. Finn está tentando tirar o seu da reta? Ao
aconselhar Easton a assinar aquele adendo, ele foi o único
responsável por permitir que o clube tomasse uma decisão como
essa. E o fato de que ele ainda representa Easton faz meu
estômago doer.
Mas não é por isso que Drew está aqui para falar comigo. Dá
para notar que há mais coisas, e estou curiosa para saber sobre o
que se trata, então converso um pouco até que ele solte.
— Eu sei que tem sido difícil para você. Os caras estão sendo
idiotas, fazendo merda constantemente e andando igual pavões nus
por aí.
— Não é nada que eu não possa suportar — digo. — Vou fazer
algumas piadas sobre quão pequenos são seus paus, e antes que
você perceba, as toalhas vão ficar no lugar e tudo vai parar.
— Sim, mas você não deveria ter que lidar com isso. Você está
sendo profissional, e eles estão agindo como babacas sexistas.
Pelo menos Drew é preciso em sua descrição.
— Vamos torcer para aqueles babacas sexistas nunca se
machucarem, porque eu não serei tão gentil com eles como eu serei
com você.
Mas eu preciso controlar isso. E o mais rápido possível. Ou então
Cory vai pensar que sou incapaz de realizar o programa de
fisioterapia.
— Eu gosto do jeito que você pensa. — Drew me encara e
morde o lábio inferior por um momento antes de chegar ao seu
ponto. — Eles sabiam que você estava dormindo com East, então
simplesmente presumiram que você tem uma queda por jogadores
de beisebol. Eu acho que eles estão pensando que podem ter uma
chance com você também.
Eu bufo diante de quão ridícula essa ideia é, mas então percebo
que ele não está brincando.
— Não há nenhuma chance disso. Eu ainda estou com Easton.
— Hum. — É tudo o que ele diz.
A desgraça do som faz meu estômago bater na ponta dos pés e
permite que a dúvida surja, quando não houve nenhuma desde que
ele saiu.
Claro, eu sinto falta dele. Claro que odeio saber que Easton pode
estar em um bar com seus novos companheiros de equipe e que
uma mulher pode estar dando em cima dele… Mas isso pode
acontecer aqui também. Aquele pequeno “hum” na garganta de
Drew faz cócegas na minha e traz à tona as inseguranças
adormecidas.
— Há algo que você não me contou? — Eu me odeio por
perguntar isso, e estou bem ciente de que esse movimento
prejudica meu profissionalismo; ainda assim, mantenho o silêncio e
aguardo sua resposta.
— Nah. Easton é um cara legal. É que nunca o vi assim por uma
mulher.
— Então… O quê? Você queria sondar um pouco e ver se eu
aceitaria alguma oferta de um dos caras? Para se certificar de que
sou fiel a Easton? Eu aprecio sua lealdade, mas as coisas entre nós
estão bem resolvidas.
O toque do meu telefone interrompe a conversa. Eu não faria
nada além de silenciar e enviar a chamada para o correio de voz,
mas quando vejo o número de Sally no telefone, sinto medo e
respondo o mais rápido possível.
SCOUT

AS PAREDES BRANCAS ME DÃO A SENSAÇÃO DE ESTAREM CONSUMINDO


da minha coragem enquanto corro pelos corredores da clínica.
— As unhas dele estavam azuis. Eu devia ter notado. — Sally
torce as mãos enquanto se mantém ao meu lado, em direção a sei
lá onde neste labirinto dos infernos.
— Como podia saber? — pergunto, mas realmente não presto
atenção ao que estou dizendo, estar aqui me transporta de volta
para três anos atrás. De volta ao momento em que o médico me
disse que meu irmão, Ford, havia morrido. Depois de ouvir essas
palavras, senti que cada gota de sangue foi drenada do meu corpo e
todo o oxigênio foi sugado da sala. A tristeza era nada menos do
que incapacitante. O vazio por dentro parecia não ter fim.
Sai dessa, Scout. É o papai, não o Ford. Ele vai aguentar. Tem
que aguentar.
— Encontrei alguns lenços com sangue. Ele disse que foi porque
se cortou, mas… Eu deveria saber que ele tinha tossido. — Uma
lágrima desliza pelo seu rosto, e eu sei que ela se preocupa com
meu pai. A vizinha de porta, que virou melhor amiga e depois algo
como nós-nunca-discutimos-o-relacionamento-deles. No fundo, sei
que tem amor envolvido e, neste momento, me pergunto por que
nunca o pressionei a me dar mais informações.
O tipo de coisa que você escolhe pensar quando não quer
pensar no que está acontecendo no presente.
— Você não poderia saber, Sally. Isso não é culpa sua.
Os códigos de atendimento de emergência são anunciados no
sistema de alto-falantes, e os sapatos rangem no chão enquanto
enfermeiras e médicos correm para salvar outra pessoa, outra vida.
E, no entanto, sei que meu pai não pode ser salvo.
— O fluido se acumulou nos pulmões. Eles chamam isso de
embolia…
— Pulmonar — eu termino por ela. Eu pesquisei essa doença e
todas as suas ramificações desde que ele foi diagnosticado,
conheço os sinais de alerta, sintomas e o caminho até o final.
— A cardiologista mudou a medicação da pressão para ajudar a
limpar o fluido. Ela disse que assim que diminuir, será capaz de
voltar para casa.
Um grito de “Não, por favor, não” flutua para fora de uma sala do
outro lado do corredor, e cada parte do meu corpo se contorce em
desespero. Eu sei como é sentir esse nível de desamparo.
— Eu não deveria ter ligado para você no estado de pânico que
estou. Mas a ambulância chegou, e eu estava com medo de que
fosse…
— Nunca se desculpe por me ligar, Sally. — Eu a puxo em minha
direção, e nós nos abraçamos no meio do corredor, tentando
encontrar consolo uma na outra, mesmo quando sabemos que o
homem que ambas amamos está perdendo a batalha.
Dia a dia.
Hora a hora.
Aos poucos.
E quando nos soltamos, ambas com os olhos cheios de lágrimas,
descubro que chegamos ao lugar certo, quarto 412. Medo,
esperança, desespero, culpa — todos os quatro sentimentos fazem
um discurso tirânico dentro de mim enquanto me preparo para o ver
com meus próprios olhos. Para me desculpar pessoalmente pelas
palavras raivosas que disse a ele na semana passada.
Quando eu reúno coragem, entro no quarto, com a mão de Sally
no meu ombro em um gesto de apoio e com o coração preso na
garganta. Meu pai está deitado na cama, fios colocados por todo o
peito, parece ligado a um exército de máquinas. Seu rosto está
pálido, e os olhos estão fechados. Eu noto como seu cabelo parece
desgrenhado — mais longo, despenteado —, e sou imediatamente
levada para quando eu era mais jovem e ele usava o cabelo mais
comprido, como era a moda da época.
Quando ele estava saudável. Invencível.
Não querendo incomodá-lo, me aproximo e me sento na cadeira
ao seu lado quando Sally sai e me dá um pouco de privacidade. Eu
coloco a mão sobre a dele, estudando as unhas ainda ligeiramente
azuis e agradecendo ao fato de que sua pele ainda está quente, não
fria como da última vez em que segurei a mão de Ford. Eu fico
olhando para ele, memorizando as novas linhas gravadas em seu
rosto, e me pergunto se é assim que tudo vai acabar. Em um
hospital com paredes e cômodos desconhecidos. Ou será em casa,
enquanto dorme, com a vista para o campo que ele ama, cheio de
memórias que construímos juntos?
As lágrimas vêm. A tristeza me envolve num manto agridoce.
Sua mão se move sob a minha, e quando levanto os olhos,
encontro os seus cansados.
— Oi.
Ele acena com a cabeça levemente e fecha os olhos por um
momento, piscando lentamente antes de os abrir e olhar para mim.
— Sem choro — ele exige em voz baixa.
Inacreditável.
— Não me diga o que fazer.
— Você vai ter que ir embora se chorar.
Eu rio, surpresa quando não deveria. Meu pai nunca vai mudar,
mesmo quando está desse jeito.
— Você não está em posição de me dizer o que fazer, precisa
apenas descansar, enquanto eu me preocupo. Ou choro. É assim
que vai ser, pai, goste ou não. Entendeu?
Ele me encara por um momento, olhos como aço endurecido,
mas não tem força suficiente para mantê-los assim por muito tempo.
Eles começam a amolecer à medida que a doença esgota sua força
e o faz ceder.
Ele concorda suavemente e fecha os olhos.
— Obrigado por ter vindo, menina Scouty.
E com essas palavras, sei que estamos bem. Ele me perdoou
pelas coisas que eu disse a ele.
Eu aperto sua mão suavemente.
— Eu sempre estarei aqui, pai. Descanse um pouco.
SCOUT

— VOCÊ ESTÁ BEM? EU NÃO CONSEGUI FALAR COM VOCÊ O DIA TODO. —
me afundar no som de sua voz e fingir que são seus braços me
envolvendo. E saber que ele está presente faz as lágrimas que
ameaçaram cair o dia todo queimarem meus olhos novamente.
— Sim. — É tudo que consigo dizer além de balançar a cabeça
sem entregar o quanto eu preciso de Easton agora.
Seus olhos castanhos se estreitam e se enchem de preocupação
através da chamada pelo FaceTime.
— Scout?
— Foi apenas um dia difícil. — Coloco um sorriso no rosto e
limpo a garganta. — Meu pai foi levado para o hospital, então passei
a maior parte do dia lá, sentada e olhando para ele enquanto
dormia… — Eu continuo a explicação de tudo que aconteceu.
— Lamento não poder estar aí com você. — Seu sorriso é suave
e sincero, e eu sinto falta de tudo nesses lábios. — Mas ele vai ficar
bem? Quer dizer… Por enquanto.
— Sim. Meu pai vai voltar para casa em um ou dois dias. Assim
que os pulmões estiverem um pouco mais limpos… Mas o médico
disse que provavelmente acontecerá novamente. E então mais uma
vez. Cada vez será pior, até que…
Easton apenas balança a cabeça para me mostrar que entende.
— Eu sinto muito.
— Tudo bem. Foi apenas um dia daqueles.
Ele me encara através do silêncio da conexão, vendo quão
cansada me sinto, sem saber que está me oferecendo tudo que eu
preciso bem agora. Easton. Só Easton. Parece que é tudo que
preciso hoje em dia.
— Ai, meu Deus — eu digo com um aceno de cabeça e me
afasto do meu estado de tristeza. — Você fez outro home run esta
noite. Você está indo muito bem.
— Shh — diz ele rapidamente, de forma quase infantil, os olhos
mostrando um aviso que me faz rir mais do que eu deveria.
Eu levanto as mãos em sinal de rendição.
— Desculpa. Como eu pude esquecer das superstições do
beisebol? Se você falar sobre isso pode azarar.
— Tipo isso. — Seu sorriso é contagiante.
Eu sinto falta da sensação dele contra meus lábios.
Sinto falta da fricção de sua barba por fazer contra minha pele.
Sinto falta dele.
— Você assistiu ao jogo?
— É claro. Eu assisti a todos os jogos. Este assisti com meu pai.
Contra todas as ordens da enfermeira, fiquei ao lado dele em sua
cama e nós assistimos juntos. Ele criticou tudo que você fez, você
sabe, né?
— Claro que criticou. — Easton ri. — Como me saí na Escala
Dalton?
— Ele acha que você está bem. A rotação do braço. A força nos
lançamentos. Tudo. Quer dizer, como ele pode não achar isso
quando você tirou Jenkins tentando roubar…?
— Venha me visitar neste fim de semana. — O jeito que Easton
fala interrompe toda a minha linha de pensamento.
— Mas eu pensei que o plano era…
— Mudança de planos. E eu sinto sua falta.
Fique calmo, meu coração saltitante.
— Eu vou estar em Nova York. Os Aces têm uma pausa de dois
dias, e sua próxima parada é Nova York, então você chegará mais
cedo. Passe o fim de semana comigo. Eu preciso ver você.
Meu coração dispara, e minha resposta é automática.
— Sim.
Sua risada é sonolenta.
— Melhor trazer aqueles brownies de pontos junto.
Eu rio pelo que parece ser a primeira vez em todo o dia.
— Você ganhou tantos deles, Wylder, que pode começar a me
chamar de Betty Crocker, a personagem cozinheira.
Melhor ainda, Betty Paucker.
EASTON

DROGA!
É realmente tão patético que no minuto em que Scout entra no
saguão do hotel cada parte de mim ganha vida? Meu coração. Meu
pau. A droga da minha respiração.
A saia e as botas de caubói que está usando apenas encorajam
todas as fantasias que já tive. As mesmas que estão se repetindo na
cabeça desde que saí de casa.
Já se passaram dez longos dias. Alguns, cheios pela emoção de
retornar a campo em minha melhor forma e outros, de decepção por
dormir em uma cama vazia todas as noites.
Olhando em volta, ela ajusta sua bolsa no ombro. Um homem
passa e vira a cabeça para dar uma segunda olhada.
Cai fora, babaca. Ela é minha.
Pego meu telefone e digito: Ei, Betty Crocker, vire para a direita.
Estou na cabine dos fundos.
Ela sorri quando a mensagem chega em seu telefone antes de
seguir em direção ao bar chique. Leva um segundo para seus olhos
se ajustarem à iluminação mais escura, mas assim que me vê, seus
lábios se curvam naquele sorriso tímido antes de seguir em minha
direção.
Eu vejo seus quadris balançarem. O formato das suas pernas. O
movimento de seus peitos. E cada parte de mim exige que eu me
levante e não perca tempo para tirar vantagem disso e muito mais,
mas, puta merda, eu quero saboreá-la também.
— Este assento está ocupado? — ela pergunta, os olhos me
devorando, apesar do tímido sorriso em seus lábios.
Então é assim que vai ser? Manda ver, Kitty.
— Depende. Está? — Meus olhos percorrem todo o comprimento
de seu corpo, meu pau endurece com a dimensão de quão viciante
é tudo aquilo que está coberto pelas roupas.
Scout inclina a cabeça para o lado e me encara por um instante.
Seus olhos cinza me dizem muito mais do que seus lábios.
— Depende do que você tem em mente.
Minha risada é rica, mas tensa.
— Ah, eu tenho um monte de coisas na cabeça, querida, mas
sou um homem de ação. Prefiro fazer em vez de simplesmente falar
sobre elas.
— E que tipo de coisas você… gosta de fazer? — A voz sai
entrecortada, sem fôlego. Seus mamilos endureceram contra o
tecido da camisa.
— Por que você não se senta e descobre?
Ela olha para onde eu dou um tapinha, no assento ao meu lado,
e depois volta o olhar para o meu rosto.
— Meu pai me ensinou a nunca falar com estranhos.
Eu rio enquanto levanto o conhaque até os lábios, os olhos fixos
nos dela através da borda do copo.
— E o meu sempre me disse quão importante é fazer novos
amigos.
Ela sai do personagem por um momento — o sorriso cada vez
maior, a cabeça balançando — antes de estender a mão e continuar
a farsa.
— Kitty. Prazer em conhecê-lo.
— Easton. Acredite em mim, Kitty, o prazer é todo meu.
Ela desliza para a poltrona ao meu lado, e nós nos encaramos
por alguns segundos, os olhos dizendo o que nossos corpos
imploram.
— Oi — ela finalmente diz.
— Oi.
— O que o traz à cidade?
— Eu jogo beisebol.
— Com os grandes tacos e bolas, esse tipo de beisebol? —
Finge inocência, e é adorável para caralho.
— Algo assim. — Mordo a bochecha, gostando desse jogo.
— Você sempre bebe antes de jogar? — Ela aponta para o meu
copo.
— Só quando estou comemorando.
— E o que exatamente você está comemorando, Easton?
Juro por Deus, o tom sem fôlego em sua voz se assemelha a
unhas arranhando levemente minhas bolas. É tão sexy.
— Nós chegaremos a isso em um momento — murmuro,
apoiando o cotovelo no encosto. Eu passo meu dedo sobre o lábio
inferior. Preciso de algo para ocupar as mãos, pois tudo o que elas
querem fazer é tocá-la. — E você? O que te traz à cidade?
— Eu sou confeiteira.
Minha risada é alta, mas ela mantém o personagem.
— O que você cozinha, Kitty?
— Brownies.
— Brownies?
— Aham.
— Você sabia que, por acaso, eu amo brownies? — digo
enquanto me rendo à tentação de tocá-la. Minha mão em sua coxa,
e caralho, tocá-la me faz querer acelerar este jogo, apesar de ter
prometido para mim mesmo que iria devagar.
— Mesmo? O que exatamente você ama neles? — Eu fico
olhando para seus lábios enquanto ela fala e os imagino em volta do
meu pau.
O batom vermelho deixando sua marca.
— Eu gosto da massa — digo e olho ao redor do restaurante
para ter certeza de que estamos fora das vistas de alguém, porque
não posso mais me conter. Scout está aqui, ao meu lado, bancando
a tímida, e caramba, é claro vou fazer algo sobre isso.
Que homem não faria?
— A massa? — Ela se mexe um pouco, assim como fez na
cabine da minha caminhonete, com o joelho dobrado no assento, o
corpo inclinado para o meu.
E é claro que olho para baixo. Preciso. As coxas bronzeadas e
tonificadas me cumprimentam. Minha boca enche d’água. Meu pau
endurece. Meu controle está sendo testado.
— Aham — murmuro enquanto coloco a mão exatamente onde
quero passar a língua, subindo pela parte interna de sua coxa e
deslizando para cima, a saia se amontoando enquanto eu movo a
mão.
Seu corpo fica tenso, e eu adoro que Scout me quer tanto quanto
eu a quero. Sexo pelo Skype é divertido. Me masturbar vendo-a
gozar é quente. Mas não é a mesma coisa. Não é como isso. O
toque. O perfume. A reação. Não chega nem perto.
— Eu gosto de enfiar meu dedo nela.
Puta. Merda. Meus dedos passam muito suavemente sobre sua
boceta, e tudo que sinto é o calor de sua pele.
Scout não está usando calcinha. Sua respiração fica presa. Seus
dedos apertam a toalha da mesa. Suas pernas se abrem um pouco
mais.
— Então passo o dedo nas bordas da tigela para que fiquem
cobertos de massa. — Deslizo o dedo entre os lábios e gemo
quando a encontro molhada. Sua boca se abre. Suas coxas se
apertam quando mergulho o dedo mais profundamente. — E então
eu gosto de colocar na boca. Chupar tudo. — Eu levo o dedo para
cima de novo, para acertar o clitóris. Suas mãos se fecham agora.
Os quadris se levantam levemente, as coxas batem na parte de
baixo da mesa e imploram por mais, pois faço exatamente o que
disse. Afasto a mão e coloco o dedo na boca.
Puta que pariu.
Seu sabor. É o suficiente para levar um homem são à loucura.
Adicione a isso o olhar em seu rosto — sexo puro —, e eu sei
que nossa farsa acabou.
Eu me inclino para frente e pressiono meus lábios nos dela. Uma
provocação em forma de beijo, que me dá uma dica do que estou
perdendo e reafirma que preciso do restante. Agora mesmo.
— Eu acredito que quero mais dessa massa, linda Kitty —
murmuro contra seus lábios.
— Sendo você um homem de ação, sugiro que faça o que quiser.
— Não aqui — eu digo, amando como seus cílios se agitam. —
Esse lugar é muito respeitável para as coisas que pretendo fazer
com você.
— Oh.
— Você perguntou o que eu estava comemorando, agora é a
hora de mostrar a você.
Eu jogo algumas notas sobre a mesa, pego sua bagagem de
mão do assento, e com sua mão na minha, tento andar tão
discretamente quanto possível com uma ereção do tamanho do
Texas.
Entramos em um elevador, e no minuto em que as portas se
fecham, estou em cima dela. Lábios, língua, mãos e corpo. Somos
uma massa de desejos e necessidade misturados com puro querer.
Pressionando-a contra a parede, é como se eu não pudesse me
aproximar o suficiente. Minha mão está sob sua saia. Minha língua
está entre seus lábios. Sua mão está segurando meu pau. O
elevador diminui a velocidade no meu andar. Soa o apito. Nós nos
separamos como se alguém fosse nos flagrar. Felizmente, quando
as portas se abrem, não há ninguém por perto. Com a sua mão na
minha, vamos para o meu quarto. Não falamos nada. Movimentos
rotineiros parecem difíceis quando estou nas alturas com a
sensação do seu gosto na minha boca.
Eu penso em ações. Uma por vez.
Um pé na frente do outro.
Cartão-chave. Luz verde.
Maçaneta. Girar.
E no minuto em que a porta se fecha atrás de nós, continuamos
o que começamos. Estamos em um frenesi de roupas saindo e
lábios tentando se encontrar.
Somos uma ladainha de frases quebradas. Meu Deus. Senti
saudade. Depressa. Eu não posso esperar mais. Isso é bom. Oh,
Deus. Agora. Já.
Foda-se essa merda lenta.
Não estou nem aí mais.
Meus dedos estão em sua boceta. Suas unhas, cravadas em
meus ombros.
Seu orgasmo é meu objetivo final.
Minha língua desliza sobre ela. Provocando o clitóris. Indo ao seu
centro de prazer. Então deslizando para dentro dela. O gosto dela é
minha própria dose.
As marcas de arranhões nas minhas costas são o único troféu
que preciso.
Meu pau deslizando entre seus seios. Em seguida, seus lábios o
envolvendo. Chupando. Para cima e para baixo. Suas unhas
provocando minhas bolas.
Um vale-tudo.
Empurrando suas coxas para trás. Enterrando meu pau. Até seus
músculos ficarem tensos. Sua boceta pulsando. O gemido
preenchendo o quarto.
Uma corrida até o final.
A onda de prazer. A onda que vai das minhas bolas até o pau.
Minha visão fica turva. A cabeça fica tonta.
Seu nome em meus lábios.
E então, quando nos recuperarmos, começamos tudo de novo.
Talvez aí eu possa ir devagar. Talvez eu não me sinta tão fora de
controle. Talvez eu fique saciado de Scout.
Então, quem sabe, talvez não.
Afinal, é a Scout.
SCOUT

— ESTAMOS TENDO TODO O TIPO DE PRIMEIRAS VEZES HOJE — PROVOC


caminhamos, de mãos dadas, pelo interior do estádio dos Yankees.
— Estamos. — Ele ri. — Sexo no hotel para começar.
Eu bato nele.
— Não foi isso que eu quis dizer, seu pervertido.
— Mas é verdade.
— É, mas eu estava me referindo mais a isso. — Eu aperto sua
mão e paro no meio do caminho, forçando-o a fazer o mesmo,
nossas mãos estendidas entre nós. — Poder te ver antes de um
jogo e desejar boa sorte.
Seu sorriso é tímido e convidativo, me pergunto se vai haver
algum dia em que Easton vai me olhar assim, e as borboletas não
farão cócegas em cada parte de mim. Ele puxa minha mão e
pressiona contra si.
— É uma primeira vez muito boa — diz ele, pegando uma mecha
de cabelo da minha testa e prendendo-a atrás da orelha. Mas é o
jeito que olha para mim, como se pudesse ver dentro da minha
alma, que me anima e me revigora de maneiras que eu nunca
imaginei serem possíveis. — Eu posso pensar em outra primeira
vez.
— Qual?
Easton se inclina e me beija. Um breve toque de línguas. Uma
perda de fôlego rápida, com um golpe de emoção que ele deposita
em seu beijo terno. Quando ele se inclina para trás e eu fico na
ponta dos pés, seu sorriso está na potência máxima.
— Eu posso te beijar. Em público. Sem nos preocuparmos com
quem vai ver ou qual cláusula contratual vamos violar…
— Adora quebrar as regras, não é? — provoco, mas, percebendo
que ele está certo, eu o beijo dessa vez.
— Só quando se trata de você. — Nós nos encaramos por um
momento, com sorrisos vertiginosos, e um tanto ridículos, mas não
podemos evitar.
— Você vai ficar bem? — Easton pergunta, referindo-se ao fato
de assistir ao jogo sozinha.
— Quem, eu? — Eu rio, fazendo um gesto com as mãos. —
Estádios são minha segunda casa.
— Foi mal. Como eu pude esquecer?
Eu dou alguns passos para trás, os dentes cravados no lábio
inferior enquanto olhamos um para o outro antes de Easton acenar
com a cabeça e se virar para seguir pelo corredor do vestiário.
— Ei, garanhão. — Ele se vira e olha para mim. — Arregaça o
jogo, viu?
O sorriso volta com força total.
— Sempre.

Os últimos acordes do hino nacional terminam, e de alguma forma


através da multidão, Easton me encontra no assento que arrumou
do lado do time visitante, em frente à home plate.
“O mais próximo que você pode possivelmente chegar de mim
sem estar em campo comigo”, ele disse. E quando eu ri, sua
resposta foi “Você é minha por apenas 48 horas, eu não vou
desperdiçar nem um único minuto longe de você”. Para um homem
que não lê romances, Easton com certeza sabe como fazer com que
eu me sinta flutuando.
Nossos olhos se encontram, ele tira o boné e acena com a
cabeça, um leve sorriso nos lábios antes de correr para fora do
campo até o banco.
— Ele é uma pessoa diferente com você, sabe?
Assustada, eu me viro para a esquerda para encontrar Finn
sentado. Minhas costas enrijecem imediatamente, o
descontentamento e falta de confiança nele vindo à tona pela
simples percepção de sua presença.
— Ninguém te perguntou nada.
Ele ri, e isso atinge cada nervo que tenho.
— Estou vendo que você está emocionada por eu estar aqui.
— Não é da minha conta se você está aqui ou não. — Eu me viro
para assistir ao jogo. O primeiro arremesso é lançado. Um golpe
baixo e questionável, e Johnson, o Wrangler com o bastão, sente a
mesma coisa pela maneira como olha de volta para o árbitro
principal.
— Bons lugares, hein?
Droga. Isso significa que ele os comprou para Easton em vez de
me fazer sentar na seção familiar que normalmente são lugares
aceitáveis. Eu engulo de volta minha resposta, substituo-a pela
réplica educada.
— Obrigada. Sim, são bons.
A multidão aplaude quando Johnson faz strikeout e corre de volta
para o banco. Eu mantenho meus olhos lá, estudo Easton sentado
no banco, com seus protetores de perna diante dele, enquanto ri de
algo que um dos companheiros de equipe diz. É emocionante vê-lo
em seu habitat natural e ver como ele está bem por isso.
As próximas duas saídas acontecem rapidamente, e o inning
muda. Easton corre para a home plate, todo focado, e eu preciso
dizer que é sexy para cacete ver um homem fazer o que ele faz de
melhor.
Especialmente quando se agacha e me dá uma visão de sua
bela bunda.
— Posso perguntar o que há em mim que te irrita tanto? — Finn
finalmente pergunta depois de receber minha recepção nem um
pouco calorosa.
— Só se você quiser que eu seja honesta.
— Não é fingimento, é? Você realmente não gosta de mim.
Eu me viro para olhar para ele e balanço a cabeça. Ele não
vacila diante do meu olhar, apenas o sustenta.
— Eu não confio em você. Qualquer agente que diz ao cliente
para assinar um acordo como você fez com Easton não está a favor
dos interesses do cliente, mas sim dos seus próprios. A questão é: o
que exatamente você ganhou com isso? Você recebe sua comissão
de dez por cento, independentemente de onde Easton joga, então
por que dar a ele um conselho ruim? A menos que você e Tillman
estejam tramando alguma coisa juntos.
Ele levanta as sobrancelhas e toma um gole lento de sua
cerveja, então olha de volta ao jogo, que se desenrola diante de
nós. Ele assiste Easton jogando até a primeira base e quase acertar
o corredor, fazendo uma curva generosa até seu lugar.
— Entendo. — É tudo o que ele diz, mas sua expressão diz
muito mais além do que consigo decifrar.
— Você está tentando me dizer que algo diferente aconteceu?
Este é o momento em que Finn se vira para mim, seus olhos
estão mais duros, há uma certa firmeza em sua voz.
— Só para esclarecer, Tillman é um filho da puta, e eu espero
que ele consiga o que eu acho que está vindo para ele. No que diz
respeito a Easton, ele é como um irmão para mim. Eu nunca faria
nada para prejudicá-lo intencionalmente ou à sua carreira. Você não
tem que gostar de mim. Você não tem que confiar em mim. Tudo o
que importa é que Easton o faça. Contanto que nós dois estejamos
torcendo pela mesma coisa, que é ele ter sucesso, saúde, uma
longa carreira, felicidade, isso é tudo o que importa. — A emoção
em sua voz me surpreende, não há realmente nada que eu possa
dizer para refutar suas palavras.
Porque é verdade.
Eu não preciso gostar de Finn para amar Easton.

Meu joelho sobe e desce sem parar. Minhas mãos estão


entrelaçadas. Finn está sentado na ponta da cadeira. A tensão
enche as arquibancadas.
O placar está empatado, com apenas um out e o arremessador
dos Wranglers estragou tudo no início do inning. Seus arremessos
não atingiram os pontos que precisavam acertar, e agora, dois
rebatedores depois, há corredores na primeira e na terceira bases.
Isso significa que o corredor na primeira base vai roubar.
Com menos de dois outs, nenhum receptor corre o risco de jogar
para a segunda base para tirar o corredor, porque isso significa que
o corredor na terceira pode tentar marcar. É muito arriscado.
Nenhum apanhador, exceto Easton Wylder.
Finn também sabe disso.
Isso é o que o diferencia dos bons apanhadores e o torna um
ótimo. Sua ousadia. A crença justificada em suas habilidades. Sua
confiança em seu corpo.
Eu estudo Easton. Sua postura atrás da base, com uma mão
dobrada atrás das costas, dedos se contorcendo em ansiedade,
esperando pela bola ser lançada, para que ele possa fazer o que faz
de melhor.
O arremessador verifica os dois corredores nas bases para tentar
pará-los de ficar muito longe do saco. Ele se prepara. Arremessa.
Com reflexos extremamente rápidos, Easton lança a bola com
precisão para a segunda base. O ponto está feito. O corredor está
fora.
E antes que o árbitro termine de erguer o polegar na clássica
pose de “você está fora”, o shortstop está jogando de volta para a
base onde o corredor da terceira base está disparando pela linha
em direção a Easton.
Ele pega a bola uma fração de segundo antes do corredor bater
nele com força total. Easton é jogado no chão com o corredor em
cima de si, mas com a bola bem segura.
O árbitro sinaliza, e eu pulo da cadeira torcendo como uma
maníaca em um estádio cheio de gente torcendo pelos Yankees. Eu
cumprimento Finn. Ele assobia em comemoração.
Mas quando olho de volta em direção à home plate, meu coração
afunda.
Easton ainda está sentado lá. Seu protetor de tórax está sendo
retirado.
O rosto é a máscara de dor que eu já vi antes.
— Não. Não. Não. — Eu me levanto do meu assento e voo pelo
corredor, precisando chegar até ele, só que não tenho ideia de para
onde ir. Tudo que eu sei é que preciso chegar lá agora. — Finn,
onde? Me diga onde? Me leva até ele.
Ele corre na minha frente, passando pelos fãs, enquanto cada
parte do meu corpo rejeita o que acabei de ver.
Parece uma eternidade, mas são apenas alguns minutos para
estarmos fora da parte aberta ao público e descermos em um
elevador. Quando a porta abre, um segurança está lá.
— Eu sou o agente de Easton Wylder. Ela é a fisioterapeuta dele.
Precisamos obter acesso a ele agora.
Ele nos olha enquanto minhas mãos tremem, tentando pegar o
passe que Easton me deu mais cedo dentro da bolsa.
Isso não pode estar acontecendo.
— Achei! — quase grito quando o encontro e o seguro. Antes
que ele tenha chance de responder, estou correndo junto de Finn
em direção ao vestiário.
Seu ombro está bem. Forte. Não pode estar acontecendo de
novo.
Por favor, não deixe que isso aconteça novamente.
Eu posso ouvi-lo antes de vê-lo. Seu grito de dor. Seu gemido de
“porra”. E quando eu passo pela porta, meu coração cai aos meus
pés. Easton está em uma maca, o rosto distorcido em agonia
enquanto o médico da equipe avalia o ombro.
— Easton. — É a única coisa que digo enquanto corro para o seu
lado.
— Quando eu joguei… senti rasgar — diz ele, um homem adulto
reduzido às lágrimas.
Mas essas lágrimas não são de dor.
Elas vêm de um homem valente com medo de perder a única
coisa que sempre foi sua.
EASTON

A DOR.
É brutal para caralho.
Eu tomo um comprimido de oxicodona.
Isso a afasta temporariamente.
A cirurgia foi um sucesso.
A voz do doutor Kimble ressoa em meus ouvidos. O olhar de
esperança no rosto de Scout fresco em minha mente. Mas já passou
uma semana, e a dor ainda é perversamente grande.
Os aplausos do estádio do lado de fora do meu apartamento são
uma porra de um tapa na cara toda vez que os ouço. As notas de
abertura de “Welcome to the Jungle” ecoando até onde estou
sentado. Os fogos de artifício do campo depois de uma vitória.
Todos são lembretes do que estou perdendo. Daquilo que posso
estar perdendo.
— Tem certeza de que está bem?
Olho para o meu pai, que está agindo como uma babá. Como se
não fosse humilhante. Mas Scout está trabalhando — com os Aces
—, e eu estou aqui.
Quebrado.
Ferido.
Completamente fodido e sentindo pena de mim mesmo.
— Tenho algumas notícias que podem animá-lo — diz ele,
tentando soar otimista.
— Nada vai me animar a menos que você me diga que Santiago
foi atropelado por um ônibus. Ele é a razão de tudo isso. Ele iniciou
essa reação em cadeia. O filho da puta. — Sua cabeça gira com
minha honestidade, mas eu não me importo.
Não estou bem. Eu vim para o fundo do poço, e se eu continuar
tomando oxicodona como estou, posso querer ficar lá.
— Não foi assim que te criei. — O aviso é dado, e eu preciso me
conter para não dizer que não foi ele que me criou, mamãe, sim.
Mas estou lúcido o suficiente para saber que é estúpido, então
mordo a língua e resisto ao desejo de descontar minha infelicidade
nele.
Quando não digo mais nada, ele continua:
— Eu acho que Boseman vai demitir Tillman.
Eu deveria estar feliz com esse anúncio, me sentir vingado, mas
tudo que sinto é despeito.
— Um pouco tarde demais para mim. Não vai ajudar de qualquer
maneira. Além disso, ele é outra pessoa que precisa ser atropelada
por um ônibus — digo sem remorso, as pílulas começaram a fazer
efeito, começaram a me relaxar, embora tudo o que eu sinta seja
raiva.
— Filho.
— Não venha com essa de “filho” pra cima de mim. Não fode
comigo. Você está me ouvindo? Sua vida estava girando tanto em
torno do seu próprio umbigo, que estou surpreso que você não
esteja enxergando somente as coisas que te interessam. Você não
tem o direito de me julgar.
— Eu vou te dar uma colher de chá. Só desta vez — ele retruca.
— E atribuir isso às drogas e à dor. Mas você precisa se lembrar de
com quem está falando, seja você um homem adulto ou não.
Nós nos encaramos, meu pai com aquela expressão calma e
passiva, e isso é tudo menos a discussão que estou buscando.
— Desculpe, não consigo ser tão perfeito como você.
Sua risada é tingida de um sarcasmo que não entendo.
— Eu sou tudo menos perfeito, Easton. Quanto mais velho fico,
mais aparente isso se torna.
Um rugido abafado de gritos atravessa a janela vindo da direção
do estádio. Eu cerro os dentes e aperto os olhos por um momento
enquanto tento encontrar uma dose de civilidade.
Não tem sido uma tarefa fácil nesses últimos dias.
— Pai, estou bem. Scout estará de volta em breve. Você pode ir.
— Eu não acho…
— Eu só vou dormir. Por favor.
Todo mundo precisa me deixar sozinho, caralho.
— Tem certeza?
— Sim.
Ele enrola um pouco, tenta protelar, mas finalmente o elevador
fecha as portas.
Silêncio. Finalmente.
Eu tomo outro comprimido de oxicodona. Fecho os olhos e
espero que a calma chegue até mim.
O lado bom é que estou de volta a Austin. Estou com Scout.
Consigo dormir em minha própria cama.
O lado ruim é que não consigo nem a abraçar. Eu a vejo sair
para trabalhar todo dia para o filho da puta que me ferrou. E eu não
vou poder jogar o jogo que adoro até a próxima temporada.
Frustrado. Temperamental. Puto. Eu mudo para a cadeira perto
da janela e vejo o que não posso ter.
A única boa notícia do dia é que o carma acordou.
Espero que ele encontre Tillman com força total.
E talvez faça um pequeno desvio e acerte as contas com
Santiago no processo.
SCOUT

ELE ESTÁ SENTADO NO MESMO LUGAR ONDE O DEIXEI.


Com as mesmas roupas de ontem.
Eu tenho que fazer alguma coisa para tirá-lo desse humor. Já
passaram duas semanas, e todo dia parece que Easton está mais e
mais deprimido.
— Ei. — Eu jogo minhas chaves no balcão e pego o frasco de
oxicodona, discretamente contando quantos comprimidos ainda
restam para ter certeza de que Easton não está exagerando nas
doses.
— Ei. — Sem emoção. Sem nada.
Faltam três comprimidos. Eu sei lidar com esse número. Uma
coisa a menos para me preocupar em relação a Easton.
— O que você fez hoje?
— A mesma merda. Em um dia diferente — ele responde, o
sarcasmo tingindo seu tom.
Eu me aproximo de onde ele está sentado, em sua cadeira de
frente para a janela, e passo a mão por seu cabelo, meus dedos
arranhando suavemente seu couro cabeludo.
— Que tal se vestir e ir buscar algo para comer? — sugiro, assim
como fiz dois dias atrás.
— Não estou com fome — ele resmunga.
— Que tal assistirmos a um filme?
— Estou cansado de ver televisão.
Eu caminho na sua frente, com as mãos nos quadris, e olho para
ele.
Easton não levanta a cabeça. Ele não encontra meus olhos. É
como se eu não estivesse aqui.
Frustrada, preocupada com ele e precisando me sentir perto dele
de alguma forma, tento a única coisa que me resta e que consigo
imaginar.
— Tive uma ideia — digo, o sorriso brincando em meus lábios e
a sugestão em meu tom. Colocando as mãos em ambos os braços
da cadeira, mergulho para lhe dar um beijo.
— Não. — A mão de seu braço bom se ergue e me empurra.
Eu dou alguns passos hesitantes para trás. O constrangimento
mancha minhas bochechas, assim como lágrimas queimam meus
olhos. Meu queixo treme enquanto luto contra a humilhação, luto
para lembrar que ele não é ele mesmo, e isso não significa nada.
Mas ainda dói.
— Eu sei que você está lutando com isso, Easton. Eu sei que
você está chateado com o mundo e com seu corpo… mas estou
aqui. Eu não tenho ideia do que mais posso fazer para ajudá-lo. —
Ele finalmente levanta os olhos para encontrar os meus. Eles estão
vazios e sem qualquer emoção. — Eu posso ajudar a curar seu
corpo… — Seu riso é alto e condescendente. — Mas sua cabeça?
Eu não posso te ajudar com isso se você não me disser do que
precisa.
— Eu não preciso de nada de você. — E essas palavras só
servem para me cortar mais fundo.
— Você se recusa a ir a qualquer lugar perto das janelas quando
estou em casa. Você diz que não quer ser lembrado do que está
perdendo, e ainda assim toda vez que volto para casa, você está
sentado aí, olhando exatamente para essa janela. Você não sai.
Você não fala comigo. Você não faz nada. Já se passaram duas
semanas desde a cirurgia, e ainda estou dormindo no quarto de
hóspedes. — Eu estou reclamando demais. Eu sei que estou, mas é
apenas porque estou preocupada, e sinto desesperadamente falta
dele, me sinto completamente impotente.
— Você não entende — Easton finalmente diz, o olhar ainda fixo
para além das janelas.
— Você está certo — eu digo, caindo de joelhos na sua frente. —
Eu não entendo. Então me ajude a entender. Por favor, Easton.
Apenas me deixe participar.
— Eu disse que não preciso de nada e falei sério.
Suas palavras doem independentemente de quantas vezes ele
as diga.
— Eu acho que você deveria falar com Finn e considerar a oferta
— digo, tentando fazer com que ele se concentre em algo diferente
do que perdeu.
— Você também acha que dar um passeio lá fora vai tornar tudo
melhor. Por que você simplesmente não beija meus dodóis
enquanto está aqui? Tenho certeza de que isso fará milagres e me
deixará curado. Certo?
— Não seja babaca.
— Então não aja como minha mãe. — Seus olhos encontram os
meus.
Eles estão duros, zangados e implacáveis.
— Acho que vou dormir na minha casa esta noite. — Sufoco o
soluço que ameaça sair.
— Boa ideia — ele retruca e, em seguida, olha para trás, em
direção à janela, efetivamente me dispensando.
Eu fico parada por um momento, esperando, com alguma
esperança, que Easton venha se desculpar por ser um idiota, que
venha me pedir para ficar, mas ele não faz isso, e então eu vou
embora.
Quando saio do prédio, paro, indecisa, mas, no final das contas,
decido percorrer os vários quarteirões até minha casa caminhando,
para limpar minha cabeça e entorpecer a mágoa. Embora eu saiba
que ele está tendo dificuldade em aceitar o fato de que deu tudo de
si para voltar ao jogo que acabou de mandá-lo de volta para o banco
no momento em que estava fazendo seu retorno triunfal, eu não sei
como mostrar a ele o lado bom das coisas.
Eu preciso tirá-lo dessa espiral.
A cada passo, percebo que posso ter uma ideia de como ajudá-
lo. Eu pego o celular e faço uma chamada.
— Scout?
— Ei, Drew.
— Como está o babaca?
Eu rio, porque ele não tem ideia de como está certo.
— Se você quer saber a verdade, agora ele foi promovido ao
status de babaca fodido.
— Ah. Tá tão ruim assim, é?
— Sim — eu digo, sabendo que pareço estar brincando. A dor
ainda é real, no entanto. — Acho que ele precisa de alguma
intervenção com testosterona.
— A gente tentou. Liguei para ele ontem para convencê-lo a nos
encontrar depois do jogo. Até ofereci meus serviços de motorista,
mas Easton recusou.
— Talvez porque você dirija como um maníaco. — Eu rio.
— Todo homem tem que ter uma veia selvagem.
— Ah, vai. — Eu olho ao redor enquanto me aproximo dos
fundos do estádio, a marca intermediária entre nossas duas casas.
— E se você levar a festa até ele? Easton não vai sair de casa. Eu
não tenho certeza se ele não quer que as pessoas o vejam com a
tipoia ou se ele está realmente chateado com o mundo… Mas ele
continua me afastando e… — Minhas palavras enfraquecem
enquanto tento lutar contra as lágrimas. Tenho certeza de que Drew
pode ouvi-las no vacilar da minha voz.
— Você está bem, Scout? — A preocupação invade sua voz.
— Sim. Vou ficar. Nós tivemos uma briga, e eu só preciso de um
tempo essa noite.
— Tem certeza?
— Sim. — Limpo a garganta. — Sim. Estou bem.
— Vá para casa. Saia com alguns amigos. Faça algo e deixe o
filho da puta com a gente. Vou ligar para o Tino e J.P. e reunir mais
gente. Nós vamos até lá. Ele não vai ser capaz de recusar um
bando como o nosso. Além disso, temos uma longa viagem de avião
amanhã em que poderemos dormir.
Estou distraída com algo à minha esquerda através da abertura
estreita da parede externa. Por um instante, acho que vejo Cal e
Santiago conversando no estacionamento do estádio.
— Obrigada, Drew — eu digo, distraída, enquanto dou um passo
para trás para olhar novamente.
Mas quando olho de novo, apenas Cal está lá com as mãos nos
quadris e uma expressão que não consigo distinguir à distância.

Eu dou um salto, já acordada. Estou desorientada. No sofá. Meu


sofá. Não no de Easton. Minha pulsação acelera enquanto tento
descobrir sobre o que estava sonhando.
E assim que meu coração começa a se acalmar, ouço um
barulho na minha janela. Isso me assusta para caralho, mas
também me faz pensar se eu não estava tendo um pesadelo e que
foi esse barulho que me acordou. Eu olho para o relógio — são três
da manhã — e pego o celular na mesa de centro, pronta para
chamar a polícia. Estou exagerando? É a minha cara ligar para a
polícia por um galho batendo na janela ou algo tão inofensivo
quanto isso.
Assim que levanto essa teoria, o ruído acontece de novo — um
“tinc” — mas desta vez são vários de uma vez, quase como se…
Que diabos?
Eu me levanto do sofá, me agacho e me arrasto até a janela.
Provavelmente pareço ridícula, mas não mais ridícula do que
pensar que há alguém jogando pedras na minha janela no meio da
madrugada. Quando puxo as cortinas para olhar lá fora, o barulho
acontece novamente. Fico surpresa com isso e mais ainda quando
vejo Easton em pé no meu jardim.
Abro a janela em um piscar de olhos.
— Easton. O que você…? São… São três da manhã.
Sua risada flutua até onde estou, e mesmo estando brava com
ele, o som dela é muito bem-vindo para mim.
— Você sabe quão patético eu sou? — ele pergunta, mas
termina rindo enquanto tropeça e confirma minha suposição de que
está mais do que um pouco bêbado. — Eu nem consigo ser um
Romeu decente. Você está no primeiro andar, e eu não consigo nem
jogar pedras direito, porque tenho que fazer isso com a mão
esquerda. Como você pode ver, minha mira com a esquerda é uma
merda.
Estou no segundo andar, mas acho que ele se divertiu bastante
com os caras esta noite para esquecer de como fazer contas. Eu
luto contra o sorriso puxando o canto dos meus lábios da mesma
forma que Easton estar aqui puxa as cordas do meu coração.
— Adivinha? — ele pergunta, baixando a voz para um sussurro,
como se tivesse um segredo.
— O quê?
— Estou bêbado para caralho. — Sua risada ecoa até mim. —
Mas eu precisava vir aqui. Para te ver. Você sabia que mora longe
de mim? Muito longe. Longe demais. É por isso que você precisa
largar esse apartamento, porque é muito longe andar até aqui
quando se está bêbado. E eu estou bêbado. Espera, onde eu parei?
— Easton coça a cabeça com o braço bom e parece uma criança
que acabou de acordar de um sono pesado: o cabelo está uma
bagunça, as roupas estão amarrotadas, e um sorriso tímido
estampa seus lábios. — Ah, sim, explicando. Eu precisava vir aqui
para me desculpar. Me desculpar… É assim mesmo que fala? Sim.
Eu acho que sim.
Eu não posso deixar de rir. Easton está adorável, e eu juro que
está sorrindo pela primeira vez desde que se machucou em Nova
York.
— E então você decidiu andar até aqui. Você poderia ter ligado,
sabia?
— Não. Não é o suficiente. — Ele balança a cabeça com um
pouco de força, e então basicamente ri quando o mundo ao seu
redor gira em virtude de todo álcool que bebeu. — Eu queria tentar
ser como um personagem dos seus livros de romance, então decidi
vir e olhar para você em sua sacada.
— Mas eu não tenho sacada. — Isso é muito divertido, Easton é
muito divertido, se eu for admitir.
— Onde está sua imaginação? Finja, ok?
— Ok. O que devo fingir além de que estou em uma sacada
agora?
— Que eu pareço com o Fabio. — Ele faz uma ótima imitação de
jogar seu cabelo comprido com a mão.
— Ecaaa. — Eu rio.
— Você está arruinando a cena que estou construindo — ele
repreende.
— Sim. Desculpa. — Tento manter uma cara séria, mas é
incrivelmente difícil de fazer isso quando Easton é tão cativante. —
Continue. Por favor.
— Como eu estava dizendo, pensei que deveria vir até aqui e
dizer: Scout, eu fui um bundão. Um grande, gordo e peludo bundão.
Não do tipo que apara os pelos da região, mas do tipo que você faz
com que você fique com pentelhos presos nos dentes e não consiga
tirar.
Ai. Meu. Deus. Eu me dobro de tanto rir. Lágrimas brotam nos
meus olhos de tanto rir e por tentar entender o que ele acabou de
dizer. É uma bagunça hilária, e tudo que eu fico pensando é que
espero que meus vizinhos não estejam ouvindo nada disso.
Quando paro de rir e consigo manter uma cara séria, Easton está
de pé com as mãos nos quadris e as sobrancelhas levantadas,
silenciosamente perguntando se já terminei.
— Eu sinto muito. Eu não queria rir de você. — Eu dou uma
risadinha. — Mas como exatamente você sabe sobre pentelhos de
homens presos nos dentes?
— Ah. Deus. Não. — E então seus olhos se arregalam quando
ele percebe o que suas palavras dão a entender. — Eu só estava
mantendo o fluxo da conversa. Não é experiência própria. Isso é
só… Estou tentando fazer algo aqui. Estou me desculpando, ok?
Ele é muito adorável.
— Há apenas um problema com seu pedido de desculpas,
garanhão.
— O que é?
— Romeu e Julieta se matam no final.
— Ah. — Seu rosto é uma imagem de choque, e
independentemente de quão difícil seja conter sua própria risada,
ela o atinge em cheio. — Eu acho que isso mostra que eu não sei
ler porra nenhuma.
— Digamos que os detalhes não são o seu ponto forte.
Easton encolhe os ombros.
— Ei, Scout. — Sua voz está mais séria agora e retém minha
atenção.
— Ei, Easton.
— Eu amo você.
E lá vai ele roubando meu coração de novo.
— Você está perdoado.
— Que bom — diz ele animadamente enquanto se divide entre
correr e tropeçar pelos degraus da entrada. — Porque quando esse
álcool todo for embora, meu braço vai doer para caralho e vou
precisar de suas habilidades de enfermeira.
— Ah, é?
— Sim. — Ele olha de volta para mim. — De preferência o tipo
que usa um vestido branco apertado bem pequeno com zíper na
frente e um grande decote. Ah, e ligas. Ligas me deixam doido.
Saio da janela enquanto ele divaga e corro em direção à porta.
Quando abro, Easton está olhando para mim — bambeando com o
vento —, mas ele ainda é a melhor coisa que eu vi o dia todo.
SCOUT

— SÓ LIGANDO PARA VER COMO VOCÊ ESTÁ.


— Estou bem, menina Scouty. Bem.
— Mentiroso.
— Talvez. — Sua risada é interrompida por um acesso de tosse.
— Como o programa de treinamento está indo?
Eu olho para os gráficos e quadros que revestem meu escritório
e sorrio.
— Bem. — Acho. — Ramos está viajando com a equipe, e eu
fiquei para trabalhar com Dillinger e Wiseman. — E para estar em
casa no caso de você precisar.
— O joelho e o cotovelo.
— Sim. — Eu balanço a cabeça ao ouvir nossas formas
abreviadas de conversar. — Eu quero evitar que eles precisem de
uma cirurgia.
— E tenho certeza de que você mandar Ramos na viagem não
teve absolutamente nada a ver com Easton ainda estar na cidade.
Eu sorrio. Suspiro. E então minto.
— De jeito nenhum.
— Vou começar a acreditar quando você acreditar que eu estou
bem.
SCOUT

— NÃO ESQUEÇA DE NOS AVISAR QUANDO PRECISAR DE OUTRA FOLGA D


grita do vestiário enquanto saio de lá.
— Nós nos divertimos muito — J.P. adiciona.
— Eu não quero saber — digo, mãos para o alto em rendição.
Eu tenho acompanhado times por tempo suficiente para não ficar
chocada com seja lá o eles estejam falando. Além disso, a
ignorância é uma bênção.
Ainda assim, quando eu abro a porta, não posso evitar o sorriso
automático ao lembrar como aquela noite terminou. Com Easton na
cama comigo pela primeira vez em duas semanas. Claro que ele
estava apoiado em todos os tipos de travesseiro para aliviar
qualquer tensão em seus músculos que atrapalhasse a recuperação
dos tendões, mas ele ainda estava na cama ao meu lado, os dedos
ligados aos meus.
— O privilégio não garante que você possa lidar com o esporte.
— Eu ouço a voz de Cal antes de vê-lo. E quando viro a esquina,
estou assustada ao ver Santiago na sua frente. Ambos os homens
se assustam quando veem que estou de pé aqui, mas não há como
apagar a tensão vibrando no ar entre os dois.
— Tudo bem? — pergunto quando eu sei muito bem que a
conversa não é da minha conta.
— Sim. Tudo bem — Cal diz, dando um passo em minha direção.
— Estamos só discutindo uma questão da equipe.
— Ah. — Meus olhos voam de Cal para Santiago, e depois de
volta para Cal, incerta se acredito. — Ok.
Que diabos foi isso?
A conversa ainda está na minha cabeça enquanto vou para casa,
mas provavelmente estou vendo mais nisso do que realmente era.
Talvez Cal estivesse defendendo Easton. Talvez estivesse dizendo a
Santigo que nunca será capaz de se igualar ao seu filho. E talvez os
porcos saibam voar.
Eu rio com o pensamento enquanto espero educadamente a
garota da fraternidade sair do elevador, acenando para ela um breve
“olá” antes de entrar, girando minha chave no painel para me dar
acesso à cobertura.
Só quando entro no apartamento é que percebo quão exausta
estou.
Quando encontro Easton lendo alguns papéis no sofá, deixo cair
minha bolsa no balcão e vou em direção a ele. Ele joga os papéis na
mesa no minuto em que me vê e sorri.
— Oi.
— Oi. — Ele parece tão aberto e convidativo, que me sento e me
enrolo próxima a ele o melhor que posso sem machucar seu ombro.
— O que tá lendo?
— É, hm… nada. Estou apenas examinando alguns dos novos
panfletos para os próximos projetos da ONG. — Ele beija o topo da
minha cabeça. — Acho que posso muito bem fazer alguma coisa
enquanto estou machucado.
— Isso é muito honrado de sua parte, sr. Wylder. E muito sexy.
Ele ri.
— Sexy, é?
— Incrivelmente.
— Quão sexy?
— Valendo pontos de brownie.
— Terei que manter isso em mente e usar essa informação a
meu favor no futuro. — Ele ri e me puxa com mais força, e como o
silêncio confortável se instala sobre nós, tudo que posso pensar é
que Easton cheira a casa. Parece estranho, mas depois de viajar
tanto na vida, nunca tendo nada permanente, esse é um
pensamento bem-vindo. — Eu conversei com Finn hoje.
Prossiga com cuidado. Esse é o meu primeiro pensamento
considerando que a última vez que ele falou com Finn sobre uma
oferta para ser comentarista convidado para um jogo na Fox Sports
terminou em uma briga.
— Conversou? — pergunto inocentemente.
— Sim. — Ele fica em silêncio enquanto pega em uma mecha do
meu cabelo. — Eu ainda não decidi o que fazer. Sinto que vai
parecer que estou desistindo. A visão do público é sempre dura…
Num minuto eles estão fofocando que aceitei a posição porque
estou acabado e logo em seguida, você sabe, os Wranglers
acreditam e me dispensam… E então estou acabado.
— Você está exagerando. — Bufo, sabendo quão frágil é o ego
de um homem, mas também pensando que essas luvas de pelica
precisam ser retiradas para que Easton possa enfrentar a realidade.
— As pessoas vão pensar exatamente o contrário. Você não está
acabado e vai voltar. Em vez disso, eles vão pensar que você é
inteligente por fazer um trabalho paralelo enquanto está se
recuperando para a próxima temporada.
— Acho que você está subestimando quão cruel a imprensa
pode ser.
— Quem se importa com o que a imprensa pensa? Você nunca
se importou, então por que começar agora?
— Não é tão fácil, Scout. Você olha para o mundo de forma muito
otimista.
— E daí? Talvez eu goste de ser otimista. — Eu encolho os
ombros, não me ofendo enquanto mantenho minha perspectiva. —
E é fácil. Você falou sobre beisebol toda a sua vida. Você vai na
frente da câmera, fala sobre a única coisa que você sabe de cabo a
rabo. Faça comentários e dê suas opiniões durante o jogo, e é isso.
Eu vi você fazendo isso inúmeras vezes com a emissora local dos
Aces, você tem um talento natural.
— Essa não é a única coisa que sei fazer de cabo a rabo. — Ele
ri, a voz cheia de sugestão, enquanto sua mão encontra a curva da
minha bunda e aperta.
— Verdade — murmuro, os sentimentos calorosos e vibrantes
voltando com força total, porque Easton definitivamente me conhece
de cabo a rabo. — Mas não haverá câmeras ou comentários em
nosso quarto.
— Você é uma desmancha-prazeres — diz ele, brincando.
— E você está mudando de assunto.
— Você percebeu?
Eu rolo os olhos.
— Você tem medo de que isso te faça parecer um jogador
deixado de lado… Que tal você olhar para isso da perspectiva do
copo meio cheio? É visibilidade. É manter seu nome em relevância
no jogo quando você não pode estar no campo. Quem sabe? Talvez
isso leve a algo que você possa fazer fora do campo quando o
beisebol acabar algum dia.
— Depois do beisebol é a morte.
— Pare de ser tão dramático. Você sabe que isso não é verdade.
Haverá um dia em que você não poderá mais jogar. Por que não
começar a tentar descobrir uma maneira de permanecer no jogo,
mas sem estar propriamente no jogo?
Ele fica em silêncio, e eu sei que despertei seu interesse.
— Beisebol é tudo o que sei. — Sua ansiedade é palpável, e juro
que não sei como Easton não consegue entender o que estou
tentando dizer a ele.
— Esse é meu ponto. Se é o que você sabe, tente capitalizar
sobre isso e planejar o futuro.
— É assustador pensar no depois. Sobre o que acontecerá
quando meu braço ceder para sempre ou meus joelhos não
aguentarem mais o impacto. Sobre quando esse jogo acabar, sabe?
— Sua voz é crua e carrega uma vulnerabilidade que eu nunca
esperei.
— Eu sei — eu digo e dou um beijo no centro de seu peito antes
de me mexer para que eu possa ver seu rosto. Noto as linhas de
expressão, preocupação que eu gostaria de impedir que estraguem
seus traços bonitos. — Easton, não há nenhum outro esporte no
planeta onde você jogue cento e oitenta e seis jogos em uma
temporada. Nenhum. Isso é muito desgaste para seu corpo. Em
algum momento, em um futuro distante, não valerá mais a pena.
Você tem que aceitar que existe vida depois do beisebol. A questão
é se você quer que a vida seja limpinha, para não ser lembrado do
que você está perdendo diariamente, ou se você quer fazer parte
disso de alguma forma porque sempre estará em seu sangue.
Eu odeio ver as lágrimas brilhando em seus olhos. Eu odeio
saber que Easton está chateado com a simples menção ao
momento em que não puder mais jogar. Mas ele está neste estado
desde o ano passado, com breves momentos de glória entre
lesões… Então talvez ele saiba muito bem o que a dor de não jogar
vai causar a ele. O vazio que permanecerá.
— Você acha que eu consigo? — Eu odeio que para um homem
sempre tão confiante em si mesmo, ele pareça agora um garotinho.
— Eu sei que consegue.
SCOUT

— ELE ESTÁ DORMINDO AGORA. VOCÊ QUER QUE EU O ACORDE?


Sim.
— Não. Está tudo bem, Sally. Como ele está?
Eu odeio que ela faça uma pausa antes de responder.
— Ele está dormindo mais e mais a cada dia. Eu odeio isso, mas
ao mesmo tempo sei que é o único momento em que ele realmente
consegue um descanso. O médico disse que isso é basicamente o
que podemos esperar; as horas de sono aumentando cada vez mais
à medida que seu coração enfraquece e cansa.
Fecho os olhos com força. Respiro fundo para tentar conter as
lágrimas. Sei a verdade, independentemente de quão duro eu me
apegue à esperança.
Eu não quero que ele morra.
— Como você está, Sally? Tem certeza de que não precisa que
eu contrate uma enfermeira para te dar algum descanso? Você tem
vida também.
— Eu já disse que estou bem. Além disso, você sabe quão
teimoso ele é. É até um milagre que ele me deixe estar aqui para
ajudá-lo — diz ela.
— Eu agradeço. Realmente agradeço tudo que está fazendo. Se
houvesse uma maneira de obter esse contrato e cuidar dele, eu faria
tudo sozinha.
— Eu também o amo, Scout. Você não precisa me agradecer.
E há algo na maneira como diz essas palavras que faz a primeira
lágrima cair. É estúpido não pensar neles como um casal, mas
encontro consolo em saber que meu pai foi capaz de experimentar o
amor novamente, depois de devotar toda a sua vida a amar a mim e
a Ford.
— Estou feliz por ele ter você. — Minha voz é quase um sussurro
quando finalmente encontro forças para falar.
— E você? Como está? Eu sei que deve estar sob muita pressão
para ganhar aquele contrato para o seu pai. Apenas saiba que ele te
ama independente disso.
Eu concordo com a cabeça enquanto olho para onde Easton está
se barbeando na pia do banheiro; sei que o que Sally diz é verdade,
mas ainda gostaria de poder ouvir isso do meu pai.
— Você… Você pode simplesmente dizer a ele que liguei? Não é
nada importante. Eu só queria ouvir a voz dele.
— É o seguinte: que tal eu ir até o quarto e deixar o telefone lá
com ele? Eu sei que parece bobo, mas às vezes quando preciso
saber se ele está bem, me sento ao lado dele e ouço sua
respiração. Talvez se você ouvir também, isso vai acalmar seja lá o
que está na sua cabeça.
Ela está certa. Parece bobo, mas me pego dizendo:
— Obrigada. Seria muito bom se fizesse isso.
— Imaginei. Desligue quando você se sentir melhor.
Há barulho no telefone enquanto ela caminha até ele, algum
farfalhar até ela pousar o aparelho.
Então há o som da respiração do meu pai. O chiado está um
pouco mais alto do que da última vez em que conversamos, mas
ainda está presente. Eu precisava disso. Para saber que ele ainda
está comigo. Saber que seu coração ainda bate.
E assim como eu fazia quando era uma garotinha com medo dos
monstros debaixo da cama, eu me aconchego mais sob as cobertas
e ouço sua respiração para acalmar meus medos.
Posso não estar aconchegada contra ele, com sua grande mão
segurando a minha como ele fez naquela época, mas ainda parece
a mesma coisa.
Saber que meu pai ainda está aqui me acalma.
Ele me salva mais uma vez das coisas que não quero enfrentar.
SCOUT

— EI, SCOUT.
Minhas costas enrijecem imediatamente ao som de sua voz.
— O que posso fazer por você, Santiago? — pergunto enquanto
me viro para encará-lo, nunca ficando de costas para ele mais do
que alguns segundos.
— Ouvi dizer que é uma grande noite para aquele seu namorado.
Ele vai tentar se tornar útil.
Pela visão periférica, vejo alguns dos outros caras parando o que
estão fazendo em seus armários e virando em nossa direção.
— Você não precisa de nada? — pergunto, de forma inocente.
Não vou dar a esse babaca o que ele quer — a chance de me
irritar.
— Aposto que papai armou isso para ele. Não é? Com todas
essas conexões, aposto que ele armou para que seu filho
maravilhoso mantenha o precioso nome Wylder no centro das
atenções.
— Tenha uma boa noite. — Eu dou a ele um doce e enjoativo
sorriso enquanto me viro e sigo em direção ao meu escritório.
Quando paro na minha mesa, Tino aparece e fica parado na porta.
— Você está bem?
— Por Deus, não sei como você consegue compartilhar o mesmo
uniforme com ele todas as noites, ainda mais na mesma porra de
campo — digo.
— É um trabalho. — Ele encolhe os ombros. — Sempre haverá
colegas de trabalho que você odeia, apenas temos que lidar com
isso. Não há mais nada que se possa fazer.
— Isso é que é levantar o moral da equipe. Vai, Aces! — Com
sarcasmo em meu tom, levanto o punho em um gesto de zombaria.
— Acredite em mim, a maioria sente o mesmo. Nossa única
esperança é que Boseman expulse Tillman e, em seguida, jogue
Santiago para fora junto com ele.
— Dedos cruzados esperando que ele realmente faça isso,
porque com certeza isso deixaria o meu trabalho muito mais fácil.
Tino olha por cima do ombro quando um dos caras ri alto antes
de olhar para mim.
— Como ele está? — ele pergunta, a voz baixa.
— Não vai admitir, mas acho que está nervoso.
— Por quê? Ele já fez isso centenas de vezes antes com o canal
local.
— Eu sei. — Eu me lembro das palavras murmuradas de
encorajamento que dei a Easton quando ele me deu um beijo de
despedida antes de ele ir pegar seu voo esta manhã. — Mas,
mesmo assim, ele está nervoso.
— Muitos de nós estamos indo para o Slugger’s para assistir a
transmissão e beber um pouco em apoio silencioso a Easton antes
de irmos esta noite. Você é bem-vinda se quiser vir.
Meu sorriso é automático.
— Obrigada, mas tenho trabalho a fazer aqui, então
provavelmente vou ver de casa.
— Não consegue lidar com toda essa testosterona, hein? —
provoca.
— Em alguns dias, não.
Meu joelho sobe e desce quando ouço as notas familiares do jingle
da Fox Sports. Não é sempre que realmente assisto a um jogo na
televisão. Normalmente, estou estudando um jogador que estou
reabilitando para ver como ele está se saindo e o que preciso fazer
no tratamento. Eu nunca ligo a televisão apenas para assistir aos
canais e programas esportivos.
Mas hoje é diferente.
Hoje Easton está dando um grande passo para fora de sua zona
de conforto, e como disse na mensagem que enviei há uma hora,
estou muito orgulhosa por ele fazer isso.
A câmera faz uma panorâmica pelo campo — a grama verde, as
linhas brancas e os jogadores circulando — antes que o âncora
principal comece a falar.
— Bem-vindo a mais uma noite de verão com beisebol aqui na
Fox, senhoras e senhores. O céu está claro, a pipoca está
estourando, e os bastões estão balançando aqui no Amco Park para
o passatempo nacional favorito dos Estados Unidos — diz ele
enquanto a câmera muda para os dois sentados em uma cabine de
transmissão. Eu grito como uma colegial quando vejo Easton.
Eu sei que sou tendenciosa, mas ele está tão bonito com o fone
de ouvido e um sorriso que apenas as pessoas mais próximas a ele
podem perceber que contém traços de seu nervosismo.
— Obrigado por sintonizar com a gente. Eu sou Bud Richman e
esta noite tenho um convidado especial, Easton Wylder, dos Austin
Aces e, mais recentemente, dos Dallas Wranglers, para conversar
conosco durante o show antes do jogo. Obrigado por se juntar a
nós. Como está o ombro?
— Bom. Sarando — diz ele, os olhos indo e voltando da câmera
para Bud.
— Você está pronto para uma boa batalha de tacos esta noite?
Easton sorri.
— Isso é, com certeza, o que se esperaria do confronto de hoje à
noite.
— Diga-nos, Easton, como jogador, como você avaliaria qualquer
equipe se fosse jogar com eles?
Easton fala por alguns minutos sobre o arremesso e o campo, e
posso vê-lo começar a relaxar fisicamente. Há camaradagem entre
ele e Bud, e isso é agradável e não exagerado.
Easton soa carismático e experiente, e tenho certeza de que
seus comentários são bons para os espectadores masculinos,
enquanto sua aparência é mais do que agradável para as
espectadoras do sexo feminino.
— Estamos a poucos minutos do primeiro arremesso, senhoras e
senhores, então, sem mais delongas, vou deixar Easton ter a honra
de anunciar as escalações iniciais.
A câmera gira de Bud para Easton, e há um silêncio total
enquanto o rosto de Easton parece congelado como um animal no
meio da rua. Seus olhos se arregalam e entram em pânico quando
ele diz “ahn” algumas vezes antes de olhar para Bud em busca de
ajuda.
São apenas alguns segundos, mas meu coração pula na
garganta com o olhar no rosto de Easton.
— Opa, desculpe por isso, Easton. Parece que esquecemos de
mostrar ao novato como operar os controles aqui na cabine. Eu
odeio quando fazemos isso. — Ele ri como um profissional
experiente enquanto eu grito para a TV sobre como eles puderam
colocar Easton na cabine de imprensa sem mostrar os malditos
controles. — Nesse ínterim, começando para os Colorados Rockies
esta noite, rebatendo primeiro e jogando no campo central…
Bud continua passando por ambas as escalações, enquanto eu
vou para a sala de estar. Tenho certeza de que Easton está lívido e
envergonhado, e tudo que eu quero fazer é consertar isso para ele.
Isso é uma grande confusão da parte da Fox, e eu tenho certeza de
que Finn vai dar a eles suas opiniões sobre isso se ele já não estiver
no telefone fazendo isso.
A transmissão vai para um intervalo comercial sem a câmera
focar em Easton novamente, e uso todo o autocontrole que tenho
para não pegar o telefone e ligar para ele, para tranquilizá-lo e lhe
dar apoio.
Quando o intervalo acaba, a câmera passa a maior parte do
tempo no campo antes de finalmente se concentrar no lugar de
Easton, ali ao lado de Bud, sua postura um pouco mais rígida do
que antes, as feições um pouco mais estoicas. Bud continua a falar,
e desta vez quando Easton responde, suas falas não têm a energia
de antes. É quase como se ele estivesse se segurando ou com
medo de elaborar suas respostas. O desconforto dele chega em alto
e bom som até o espectador.
Eles falam sobre os arremessadores e o que esperar de cada
equipe para a noite, e então Bud encerra o bloco.
— Quando voltarmos, fãs de beisebol, veremos o primeiro
arremesso com os dois times que pode acabar sendo uma prévia
para os playoffs da Liga Nacional. Easton, por que você não puxa
uma pausa e conta para a galera de casa tudo sobre os nossos
patrocinadores?
E quando a atenção volta para Easton, ele está congelado
novamente.
Quase como se uma vez que a câmera focasse nele, não
pudesse falar. Bud olha em sua direção e ri baixinho.
— Sinto muito, Easton. Parece que a cabine não quer funcionar
para você hoje. Estou dando instruções a Easton aqui para ele ler o
teleprompter e não está funcionando. Nós vamos fazer esta pausa,
e eu farei o contato com nossos patrocinadores quando voltarmos.
Fiquem ligados para uma noite emocionante de beisebol, pessoal.
E quando eles passam para o comercial, eu me forço a respirar.
Isso não é bom.
Não é bom mesmo.
Eu espero ansiosamente que eles voltem do intervalo, e quando
eles voltam, o jogo começa.
Bud começa a narração. Ele fala sem parar, e qualquer
comentário adicional de Easton só é adicionado quando Bud
pergunta a ele.
Sua personalidade não aparece. Sua participação é forçada.
É um desastre.
Quando o nono inning chega ao fim, e esse desastre acaba, tudo
que eu continuo a pensar é: eu o forcei a fazer isso.
Eu deveria ter recuado? Eu não deveria ter falado com Easton
sobre isso quando ele já não estava confortável antes?

— Ei — eu digo com cuidado quando ele atende ao telefone.


— Agora não, Scout. Eu não quero falar agora. — Sua voz nada
mais é do que pura frustração.
— Você pode me dizer se está bem?
— Amanhã eu te vejo quando chegar em casa.
E a linha fica muda.
EASTON

— POSSO PEGAR OUTRO PARA VOCÊ?


— Um duplo, por favor. — Eu puxo meu boné para cobrir mais
meus olhos e agradeço pela meia luz nesse buraco que chamam de
bar perto dos limites de Austin.
Ele desliza o líquido âmbar pelo balcão cheio de marcas.
— Obrigado.
— Indo para algum lugar especial? — pergunta, tentando iniciar
uma conversa que eu não quero que comece.
— Casa.
— Isso não parece bom. — Ele ri.
— Não, esta noite, não é — murmuro enquanto tomo um longo
gole e deixo a queimadura seguir seu curso.
— Você irritou a patroa?
— Algo do tipo.
Olho para o celular enquanto outra mensagem de Scout chega, e
depois de olhar por um tempo e me perguntar como vou encará-la,
desligo o telefone.
Não estou pronto para falar com ela ainda.
Para desapontá-la novamente.
Para deixá-la saber que este homem que ela ama não é quem
ela pensa.

— Easton? Você está bem, filho?


A porra da pergunta do dia, e eu nem tenho forças para
responder mais. Apenas vinte e quatro horas desde a minha
transmissão de merda, e eu ainda estou me escondendo. Mas
Manny apenas espera, antes de calmamente se sentar na fileira
atrás de mim enquanto continuo olhando para os lugares vazios ao
meu redor. A grama imaculada na minha frente. A terra batida até a
perfeição.
— Obrigado por me deixar entrar.
— É claro. Sempre que quiser. Este lugar ainda é sua casa. Você
sempre vai ser um Ace para mim.
Eu reflito sobre suas palavras. Isso pode ser verdade, mas agora
eu não sinto que pertenço a qualquer lugar.
— Sinto falta da magia — digo finalmente.
Minha confissão surpreende, mas nunca disse palavras mais
verdadeiras.
— Você teve um ano difícil — diz ele suavemente.
— Eu costumava sentar aqui quando era criança. Antes que os
assentos se esgotassem para o jogo e os caras fossem para o
campo para o treino de rebatidas. Eu costumava sentar aqui e sentir
a magia no ar. Era como se eu soubesse que algo especial iria
acontecer naquela noite.
— Eu me lembro bem de encontrar você aqui. Eu costumava me
perguntar no que você estava pensando.
— E se eu nunca conseguir voltar, Manny? — Estou coçando por
outra bebida.
Qualquer coisa que possa entorpecer o medo que me trouxe aqui
em vez de me levar para casa… Onde eu deveria estar. É mais fácil
continuar fugindo… me escondendo, do que enfrentar a verdade
que finalmente me alcançou.
— Às vezes acontecem coisas na vida que, no momento,
parecem ser de um jeito, mas na realidade é a magia sendo
recarregada para que você possa encontrá-la novamente.
— Não dessa vez.
Ele faz um som evasivo, mas não diz nada. Nós nos sentamos
em silêncio no reino mágico da minha infância enquanto tento
imaginar como dar os próximos passos.
— Scout está te procurando. Ela ligou para cá, preocupada.
— Sim.
— Ela é uma das boas.
— Ela é, com certeza — suspiro.
É uma pena que eu não seja.
SCOUT

— ONDE VOCÊ ESTEVE? JÁ PASSARAM QUATRO HORAS DESDE QUE


pousou, eu estava preocupada.
Eu corro para o hall de entrada bem a tempo de vê-lo passar por
mim sem encontrar meus olhos ou dizer uma palavra. Há alívio em o
ver são e salvo, mas isso acerta em cheio a raiva quando sinto o
cheiro rançoso de álcool. Eu estava me preocupando enquanto
Easton estava em um bar em algum lugar bebendo?
— Easton? — Eu o sigo para o quarto, onde ele deixa cair a
bolsa no chão e depois passa direto por mim novamente, saindo
sem falar.
Isso é ruim.
Ele deve ter visto o comentário online. A tempestade do Twitter
de idiotas usando hashtags de merda como #EastonEngasgouLegal
e #AlertaAtletaBurro, os memes já circulando com seu olhar
arregalado em direção à câmera. Os idiotas deram opinião por trás
de teclados, e dizer que foram duros é pouco.
Eu corro atrás dele, apesar do seu desejo óbvio de ser deixado
sozinho, porque é isso que você faz quando ama alguém. Você
tenta ajudar.
— Por favor. Fale comigo — eu digo enquanto ele para na janela
panorâmica e olha fixamente para a vista além. Eu estendo a mão,
querendo oferecer conforto, mas hesito.
— Não faça isso. — É um aviso. Uma ameaça. Um reflexo de
sua mente.
Easton quer uma briga. Vejo isso em seus ombros. O aperto de
seus punhos. A agressão em sua postura.
O silêncio se estende, sua raiva e descontentamento sugando o
ar ao nosso redor até que comece a me consumir também. Por
estar preocupada quando ele não se incomodou em ser cortês e me
dizer que estava bem. Porque ele está se fechando, me fechando
em vez de se voltar para mim como se deve fazer em um
relacionamento.
— Você sabe o que é viver toda a sua vida como uma mentira?
— Quando fala, as palavras são quase inaudíveis, mas a resignação
misturada com ressentimento é o que soa mais alto.
— O que você quer dizer?
— Me fala, Scout, rainha do copo meio cheio, como exatamente
você avaliaria meu desempenho na noite passada? — A pergunta é
tão carregada, que não tenho como respondê-la e satisfazer o que
quer que ele esteja procurando.
— Isso não é justo…
— Tão ruim assim, hein? — Sua risada é autodepreciativa, na
melhor das hipóteses. — Tão ruim que você não pode nem mentir
para mim e me dizer que não foi horrível e que não sou o motivo de
chacota nacional do beisebol agora? O atleta burro que não
consegue juntar duas frases?
— Mas você… — eu digo, tentando descobrir que palavras usar
de modo que eu não acenda um fósforo que fará explodir seu
humor, que já está fervendo sob sua pele. — Você começou bem.
Fez um trabalho incrível dando uma visão sobre o jogo e seus
comentários. Você tem um talento natural. E então o teleprompter
não funcionou, e Bud não te mostrou os controles…
— Você sabe o que é ser comparado a Cal Wylder minha vida
inteira?
— Ninguém está comparando você a ele nesta situação. —
Estou desesperadamente tentando seguir sua mudança repentina
de pensamentos. — Você não é seu pai, Easton.
— Você está certa, eu não sou — ele troveja, cada sílaba uma
agressão verbal. — Eu nunca poderia ser como ele. A porra do
homem perfeito que não faz nada de errado e transforma tudo que
toca em ouro, como Midas.
A campainha toca, nos alertando que alguém está chegando no
elevador.
— Ah, olha só. Tenho certeza de que é o bom e velho Cal agora
vindo para me dar um tapinha nas costas e me agradecer por ser a
porra do filho que manchou sua reputação perfeita.
— Easton. — É um apelo para ele pensar antes de abrir a porta e
descarregar seu mau humor no pai.
Ele aperta o botão para abrir as portas e diz:
— Bem-vindo à festa da porra do Easton!
Mas não é Cal que está ali.
É a garota dos moletons da fraternidade.
Seu rosto suaviza quando ela vê Easton, enquanto cada parte de
mim tenta entender por que a garota do saguão tem acesso à
cobertura.
Acesso que apenas Easton pode conceder.
— Easton. — Sua voz é suave, simpática. — Eu queria ter
certeza de que você estava bem e não precisava de mim… — Suas
palavras desaparecem quando ela percebe que estou parada ali.
— Agora não, Helen — diz ele com uma gentileza que não me
ofereceu desde que passou por essas portas. Ele olha por cima do
ombro para mim, olhos arregalados de pânico, e então vira de volta
para ela. — Eu não posso… só… Agora não. — Suas mãos se
fecham em punhos, e ele bate suavemente na parede ao seu lado,
como se não tivesse certeza do que mais dizer.
— Me desculpe. Eu não tive a intenção… — Ela diz algo mais, e
ele responde alguma coisa, murmúrios baixos que não consigo ouvir
de onde estou, que dão a entender que eles se conhecem e se
sentem confortáveis um com o outro.
Em seguida, ela volta para o elevador, olhando rapidamente na
minha direção com preocupação nos olhos antes de desviar o olhar
quando as portas se fecham.
Eu fico em silêncio, atordoada e confusa, sem saber como eles
se conhecem quando basicamente morei aqui nos últimos três
meses e nenhuma “Helen” foi mencionada uma vez sequer. Mas eu
com certeza tenho passado por ela lá embaixo mais vezes do que
posso contar. No meu estado emocional desgovernado, pulo para a
pior conclusão, e mesmo que eu saiba que não pode ser verdade —
que Easton esteja me traindo com a doce menina do lobby —, meu
estômago se revolta.
— Quem era aquela? — A acusação está carregada nessas três
palavras.
— Deixa para lá, Scout. — Easton sacode a cabeça e continua a
encarar o punho encostado na parede.
— Não. Eu não vou simplesmente deixar para lá. Quem diabos
era aquela garota? — Eu insisto mais à medida que os segundos
passam. Meu coração dispara, e isso se mistura ainda mais com a
descrença profunda e o medo que começa a reverberar dentro de
mim. Estou certa? Easton me enganou o tempo todo?
Todo jogador é realmente um jogador?
— Scout. — É um aviso que não dou nenhuma atenção.
— Não venha com essa de Scout. Eu amo você, Easton. Eu te
amo quando nunca pensei que poderia amar alguém, mas não
mereço receber essa merda de você só porque sou eu que estou
aqui. Estou confusa agora. Você teve uma experiência difícil ontem.
Entendo. Você quer ficar puto e ir tomar uns dez drinques antes de
voltar para casa. Ok, mas da próxima vez, lembre-se de que há
alguém aqui esperando por você. Alguém preocupado com você. E
isso significa que você tem que pensar nesse alguém mesmo
quando está no seu pior momento. Você tem que pegar um telefone
e dizer que precisa de tempo e espaço, que tem consideração, para
que ninguém entre em um frenesi de preocupação por você poder,
possivelmente, estar deitado em uma vala em algum lugar quando
estiver desaparecido por quatro horas. Isso é o que você faz quando
está em um relacionamento, Easton. A menos que esta seja sua
maneira de me dizer que não estamos em um. — Eu me engasgo
com as palavras, o pensamento sendo absorvido. — Se for esse o
caso, a visita de Helen faz muito mais sentido para mim.
— Você está delirando — ele retruca, e apenas fica lá, piscando
algumas vezes como se estivesse lutando contra o que eu acabei
de dizer. Então pela primeira vez desde que entrou pela porta, ele
finalmente encontra meus olhos. Eu vejo derrota neles. Eu vejo
tristeza. Mas, acima de tudo, agora vejo medo, e isso agrava o
pânico que sinto. — Você realmente acha que ela é…? Que eu
estou…? Porra!
— O quê? — imploro. — Só me diz.
— Droga! — ele diz, jogando as mãos para cima, enquanto
começa um caminhar agitado para frente e para trás. — Ela veio por
causa de ontem à noite.
— Ontem à noite? — Minha cabeça gira para entender como
Helen está conectada à transmissão na noite passada, e sua
incapacidade de explicar me assusta. — Sobre o que na noite
passada? Você nem falou comigo sobre a noite passada, mas já
conversou com ela? Quem diabos é ela?
Easton emite um rosnado frustrado, nada parecido com algo que
eu já tenha ouvido dele antes. Parece um homem à beira do
colapso, e eu não entendo e estou assustada com isso.
— O teleprompter não estava quebrado. Eles não se
esqueceram de me ensinar merda nenhuma.
— Ok. — Eu estendo a palavra enquanto tento fazer a correlação
entre isso, Helen e tudo o que está acontecendo aqui. — Easton, eu
não entendo o que está…
— Você quer a verdade? — Easton grita, se virando para me
encarar.
Eu sempre quis.
— Achei que você estava me dizendo a verdade.
A risadinha que emite faz tudo menos me tranquilizar.
— Ah, puta merda… Eu não posso mais fazer isso.
Meu coração desaba e sinto que não consigo respirar.
— Não consegue mais fazer o quê? — eu sussurro, com medo
da resposta.
Nós.
Isso.
O quê?
Easton anda de novo. Ele está agitado. Posso sentir sua
hesitação.
Cada passo que dá me assusta ainda mais. Eu o perdi? Eu
silenciosamente o espero dizer isso. Espero que me diga que não
pode mais fazer isso comigo. Que acabamos.
Estou enjoada.
Depois de um minuto, ele para alguns metros à minha frente, seu
rosto uma imagem de desespero.
— Eu estraguei tudo ontem à noite.
Lágrimas escorrem em seu rosto. Meu pulso dispara. Minha
mente gira.
— Você dormiu com Helen? — Eu mal consigo pronunciar as
palavras, e quando o faço, encontro sua risada. Alta. Histérica.
Incrédula. E cada parte de mim se revolta por ser ridicularizada.
Estou na frente dele em dois segundos, minha raiva me vencendo.
— Seu cuzão!
Easton pega minha mão antes que meu tapa acerte sua
bochecha. Eu luto para ficar longe dele enquanto minhas emoções
fogem do controle, em um redemoinho de sentimentos me
chicoteando.
— Não, Scout. Você não entendeu — Easton finalmente diz,
como se estivesse com dor. Juro por Deus que é melhor começar a
explicar, porque suas palavras estão dando a entender uma coisa e
suas ações estão dizendo outra. — Eu não estou traindo você.
— Então o que é? O que é tão secreto, que você não consegue
falar comigo sobre isso? — Eu ando de um lado para o outro da
sala, a adrenalina em alta e as emoções desgastadas. — Você
tentou ser um locutor esportivo. Não foi bem. Grande coisa, porra.
Você segue em frente. Você encontra outra coisa. Você deixa para
lá. Quão difícil é isso?
— Não é tão fácil — diz, suavizando a expressão, as
sobrancelhas se estreitando.
— Sim, na verdade é.
— Não, quando você vive uma mentira. Não é assim.
Esse sentimento de pavor volta, mas por razões completamente
diferentes. O homem diante de mim agora parece completamente
derrotado, e isso é dez vezes mais enervante para mim do que seu
temperamento.
— Easton? O que é?
— Helen é minha tutora.
Sua explicação é tão inesperada, que não consigo evitar a risada
que sai dos meus lábios, mas ela logo tem uma morte rápida
quando seu rosto permanece mortalmente sério.
— Tutora?
— Eu não consigo ler, Scout. É isso que você quer saber? Que
meu cérebro não consegue ler melhor do que uma criança de oito
anos? Que as palavras sobre as páginas mudam e mudam cada vez
que eu olho para elas e que eu passei toda a droga da minha vida
escondendo esse segredo de todos? — Sua voz aumenta à medida
que seu medo se manifesta em cada palavra que ele fala. Meu
coração se parte em pequenos pedaços por Easton enquanto ele
está aqui, no meio do seu apartamento, com as lágrimas brotando
em seus olhos. — Esse é o meu segredo. Está feliz agora?
— Não. — É uma resposta sussurrada que reflete quão chocada
estou enquanto Easton me encara, um homem quebrado pelo
manto da vergonha que ele envolveu em si mesmo por toda a vida.
E é apenas por uma fração de segundos, mas vejo o minuto em
que ele sente o peso do que acabou de confessar. Easton se
engasga e cambaleia para trás, alguns passos antes de virar,
apertando o botão do elevador, e entrar nele.
Eu o chamo quando as portas começam a se fechar, mas Easton
não as impede. Ele apenas abaixa a cabeça e deixa que as portas
se fechem.
E eu fico olhando para elas em estado de choque, com uma
pancada tão violenta, que meu cérebro ainda não conseguiu
entender a magnitude do que ele claramente lutou por anos.
Eu deveria correr atrás dele.
Eu o deveria impedir de sair e depois deveria dizer que vai ficar
tudo bem.
Mas acho que nós dois precisamos de um pouco de tempo para
botar nossas cabeças no lugar pelo que ele acabou de revelar.
Estou atordoada.
Completamente, totalmente atordoada.
SCOUT

— ELE NÃO ESTÁ AQUI! — MANNY GRITA E ME ASSUSTA ENQUANTO C


dependências do estádio. — Esteve aqui cerca de duas horas atrás,
mas estava indo para casa. — Ele aparece, a preocupação
estampada em seu rosto. Deve saber quão chateado Easton estava
com a transmissão.
— Ele voltou para casa, mas depois foi embora de novo. Eu
realmente preciso encontrá-lo.
— Ele finalmente te contou, não foi?
Meus pés vacilam com suas palavras, e eu fico olhando para
Manny e me perguntando se ele está falando sobre a mesma coisa
com a qual estou preocupada. E ainda assim ele não pode estar.
Mas a expressão em seu rosto, a preocupação e empatia que
está emitindo me dizem que ele está.
— Não se preocupe — diz ele, depois de nos encararmos por
alguns minutos. — Você não precisa dizer nada para mim e trair a
confiança dele. Eu gostava de você antes, mas gosto mais de você
agora por causa disso… Mas eu sei do que se trata. Easton não
sabe que eu sei, mas eu sei. Quando ele era pequeno, fui eu que
sentei e o ajudei com o dever de casa. A regra do pai era que tinha
que terminar tudo antes que pudesse sentar no banco de reservas
para assistir ao jogo. Eu era o único por perto para ajudá-lo quando
ele lutava para terminar.
Meus olhos se enchem de lágrimas quando penso no garotinho
frustrado escondendo seu problema do mundo.
— Manny, não sei o que dizer.
— Você não tem que dizer nada, Scout. Eu sabia que ele não
podia guardar esse segredo para sempre, mas nunca foi meu papel
dizer nada. É um problema do Easton. Ele é como um filho para
mim, e meu coração se partiu ontem à noite, quando assisti à
transmissão. Ele estava tão incrível, e no minuto seguinte, não
estava mais. Eu sabia o motivo e me odiava por não o ter procurado
nem ter tentado ajudá-lo de alguma forma.
— Não é sua culpa — eu digo, mas sua expressão diz que não
acredita nisso. Acho que Manny está tão chateado por assistir à
humilhação de Easton quanto eu.
— Só saiba que acho que ele nunca contou a ninguém. Para um
homem, é algo difícil de aceitar ter que admitir suas deficiências
para a mulher que ama e depois pensar que ela o olhará como
menos do que realmente é.
— Eu nunca pensaria menos dele. Na verdade, penso mais de
Easton por finalmente admitir isso.
Manny funga um pouco e limpa a umidade que se acumula no
canto dos olhos, apesar do seu sorriso silencioso.
— Eu sabia que você pensaria assim. E só para constar, eu não
sei nada sobre nada. — Ele balança a cabeça. — Eu tenho que
voltar ao trabalho, e você precisa sair daqui, já que é seu dia de
folga. — Mas eu não me movo, permaneço no lugar enquanto
contemplo meu próximo movimento. — Tente o campo da liga
infantil — ele aconselha antes de se virar e descer pelo corredor.
É claro. O lugar para onde ele vai a fim de limpar a cabeça.
A cada passo que dou em direção ao parque, repasso os fatos e
números que pesquisei quando Easton foi embora. Os que me
mantiveram certa de não o perseguir e negar o tempo que ele
provavelmente precisava para se acalmar, para lidar com a ideia de
que outra pessoa sabe de seu segredo.
Depois de uma vida inteira protegendo esse segredo, é difícil de
processar a mudança.
Cada parte de mim suspira de alívio e desespero ao mesmo
tempo quando chego ao parque e vejo a figura vestida de preto
sentada sozinha no declive do campo externo.
Easton.
Eu sigo até ele e me sento ao lado sem dizer uma palavra.
Nosso silêncio se estende enquanto retiro pedaços da grama.
Eu espero pacientemente, sabendo que Easton precisa dar o
primeiro passo nessa conversa. Eu o procurei para mostrar que não
estava indo embora, mas não posso forçar o passo seguinte. Deixá-
lo puxar essa conversa pode ajudá-lo a se sentir no controle de
algo, quando tudo o mais em seu mundo parece tão fora de
controle.
Enquanto espero que Easton descubra o quanto ele quer ou não
falar sobre isso, penso em minha pesquisa no Google depois que
ele saiu.
Artigo após artigo sobre atletas universitários renomados que
não conseguiam ler ou escrever com mais habilidade do que um
aluno da quarta série, e ainda assim eles receberam diplomas
porque eram o ponto forte de qualquer equipe em que jogaram. Eu
pesquisei sobre dislexia, tentando descobrir se era isso o que
Easton quis dizer sobre como as palavras mudavam. Eu me
empanturrei de informações, lendo o mais rápido possível para
tentar entender mais e ocupar meu tempo, a fim de me impedir de ir
imediatamente atrás dele.
E eu procurei por sinais perdidos em nosso tempo juntos, mas
realmente não encontrei muitos. Easton se tornou um mestre do
disfarce.
Ele tem uma instituição de caridade voltada para a alfabetização.
Eu pensava que ele estava tentando ajudar as crianças — ser um
cara bom, não cheguei à conclusão de que ele próprio sofreu com
isso. Eu penso nos papéis que ele estava lendo e jogou sobre a
mesa. Easton me disse que eram lições para as crianças. Pensando
bem, me pergunto se não eram as atividades de Helen para ele.
Ele adora audiolivros. Grande coisa. Muitas pessoas gostam.
Isso não significa que elas não saibam ler.
Eu tento pensar em qualquer momento que se destaque e que
fosse mais óbvio, mas não consigo. Easton tem tanta prática em
esconder, que até mesmo a mulher com quem ele mora não
percebeu.
E então entendo: o contrato. As assinaturas concordando com a
negociação ou com ser rebaixado para outra liga.
E como se estivesse lendo minha mente, ele finalmente fala.
— Não foi culpa do Finn, sabe?
— Eu entendi isso agora — digo suavemente.
— Ele nem estava lá. Eu assinei os papéis. Tudo aconteceu tão
rápido. Tillman empurrou os papéis na minha frente, e eu não tive
tempo de descobrir o que eles diziam. Eu não consegui entender
nenhum deles.
— Você estava com dor.
— Isso não é desculpa. — Sua risada é autodepreciativa. — Eu
te deixei assumir que era Finn, culpá-lo, e é uma cagada da minha
parte permitir que você pense mal de um cara que não fez nada
além de me proteger durante toda minha carreira. Eu sou a razão
pela qual fui negociado com os Wranglers. Porra, isso é difícil de
dizer em voz alta. — Ele faz uma pausa e se deita na grama,
olhando para o céu que está ficando laranja com o pôr do sol que se
aproxima. — Fui eu quem causou tudo isso. Eu sou aquele que se
colocou na posição com a qual ninguém jamais concordaria, e tudo
porque eu não consigo ler.
As palavras ficam presas em sua garganta, quase como se
fossem fisicamente duras para serem ditas em voz alta, e eu
entendo. Elas devem ser. Eu concordo sem saber o que dizer.
Quero mantê-lo falando como fiz da última vez que me sentei ao seu
lado na encosta do campo. Desta vez, porém, não há jogo para nos
distrair. É só ele. E eu. E tudo que não foi dito. O campo diante de
nós está vazio. As bases foram removidas. As linhas de giz foram
apagadas por pezinhos que passaram por cima delas. Prova de que
tudo pode ser feito de modo a parecer perfeito, se necessário.
Assim como Easton precisou fazer.
— Eu sempre fui capaz de esconder. Passar batido. O ensino
médio foi fácil: eu me tornei o mestre em colar. Notas escritas na
palma da minha mão. Trabalhos e provas escorregando para a
beirada da mesa da garota sentada ao meu lado. Um pouco de
flerte ajuda muito nessa idade. A faculdade era mais difícil, mas
quando descobri que poderia pagar às pessoas para escreverem
meus trabalhos ou que podia ficar convenientemente doente na
época das provas, tive mais liberdade para levar para casa as
coisas que os outros fizeram para mim… Diga um nome, e digo
atletas de renome como eu que fizeram isso. A administração não
se importa se você não consegue passar em uma disciplina: eles
vão dar um jeito para você desde que você ganhe a World Series da
faculdade e traga mais dinheiro para a faculdade. Dinheiro e
equipes de publicidade que podem custear uma quantidade enorme
de salários. E quando eu não conseguia ler um livro, eu arrumava
um e-book. Eles foram particularmente úteis já que eu podia ouvi-los
no aplicativo de voz do Kindle.
— Tipo o Whispersync?
— Às vezes, sim. — Eu olho de volta para Easton, e odeio que
ele não me olhe nos olhos. Ele não precisa ter medo do que estou
pensando dele. — Então quando fui convocado no meu segundo
ano, foi o maior alívio não ter que estar constantemente estressado
sobre como gerenciar tudo. Achei que tinha derrotado o sistema, e
não me saí mal. Eu era da liga principal de beisebol. Por que eu
preciso consertar o problema agora? Eu tinha Finn, em quem eu
confiava, e se realmente precisasse ler algo, daria uma desculpa
para que eu pudesse levar para casa e ter um tempo para decifrar.
— Seus pais não sabiam? Finn não sabe? — pergunto pensando
quão facilmente Manny descobriu; sei que não posso contar esse
segredo.
Easton se levanta da grama e anda alguns metros para frente e
para trás, a energia nervosa o consumindo.
— Eu sempre pensei que eles soubessem. Quer dizer, como eles
podiam não saber? Mas com meu pai viajando o tempo todo, e eu
tendo nota para ser aprovado, eles pensaram que de alguma forma
eu tinha melhorado na leitura que me incomodou tanto no primeiro e
segundo anos…
— Isso deve ter sido muito difícil para você.
— Difícil? — Easton ri. — Isso é um eufemismo. Eu me tornei o
mestre na distração quando tenho que ler algo. Quer dizer, me dê
tempo suficiente, e eu consigo descobrir as palavras. Eu posso ver
quais letras formam as sílabas e, em seguida, pronunciar a palavra.
Meu Deus, me sinto um perdedor dizendo isso para você. Eu sou
um adulto e tenho que estudar um parágrafo por hora como um
aluno da terceira série para que eu possa entendê-lo.
Easton para de se mover, fecha os olhos e aperta a ponte do
nariz enquanto tenta controlar a raiva e a vergonha antes de virar de
costas para mim. Seus ombros são fortes e orgulhosos, e eu não
consigo imaginar o efeito disso nele, de ter de explicar algo que a
maioria das pessoas interpretaria como uma falha.
Mas eu não.
— Easton… Você não tem que explicar nada — murmuro
baixinho.
Ele ri e respira fundo, mas permanece virado para longe.
— Eu sei que não… Mas eu quero. Você provavelmente já pensa
menos de mim por isso, então preciso colocar tudo para fora agora.
— Não. Eu não penso. Eu acho que você é corajoso, East…
— Corajoso? — Ele se vira, os braços estendidos ao lado do
corpo, o rosto uma máscara de confusão. — Como você pode
pensar que alguém que basicamente passou a vida inteira
enganando as pessoas, fazendo-as pensar que é inteligente, é
corajoso?
— É isso que você pensa que estava fazendo? Enganando as
pessoas? Eu chamo de sobreviver, Easton. Claro que não era uma
questão de vida ou morte, mas foi a sua luta. Sua batalha. — Eu me
levanto para que possa fazê-lo entender, palavra por palavra. — E
ninguém tem permissão para dizer que não é importante ou que
você é menos homem por causa disso. Então eu não quero ouvir
você falar isso de novo. Eu não penso isso. Estou aqui. Eu não vou
a lugar nenhum. Então você precisa descobrir como lidar com o fato
de que eu sei e não acho você inferior. Você entendeu?
Easton apenas me encara como se quisesse acreditar em mim,
mas tivesse medo. Eu odeio cada pedacinho de dúvida que vejo o
atormentando.
Nesse momento, ouvimos um grito no campo às suas costas, e
ele se vira para ver o que é. Um homem e dois meninos em idade
escolar correm para o campo. Nós observamos como eles começam
a organizar o que parece ser um treino de rebatidas: o balde de
bolas no monte com o pai, uma criança colocando um capacete na
home plate, a outra agarrando sua luva e correndo para o campo
esquerdo.
O pai nos olha por um momento, já que somos dois estranhos na
colina, antes de dar um toque em seu boné para nos avisar que ele
nos viu, em seguida vira-se para instruir seu filho na base.
Assistimos a essa dança tão antiga quanto o tempo entre pais e
filhos.
O pai arremessa, o filho rebate, e o pai o instrui antes de
começar o processo todo de novo. O único garoto no campo externo
perto de onde estamos olha na nossa direção de vez em quando,
nos momentos em que precisa pegar uma bola que veio para perto.
Ele tem as mesmas características de Easton, e por alguns breves
momentos, imagino Easton como um pai fazendo a mesma coisa
com os filhos algum dia.
O pensamento traz um sorriso aos meus lábios.
— O garoto tem uma boa batida — diz ele depois de um tempo,
voltando ao tópico mais leve da conversa.
— Você com certeza pode julgar isso — Eu balanço a cabeça, o
elogiando. — Me fala da Helen. Deve ter sido um grande passo para
você. — Só quando digo o nome dela me lembro daquele medo
fugaz que tive de que Easton tivesse me traído.
Eu odeio que ele ainda esteja hesitante, mas preciso que saiba
que pode conversar comigo sobre isso. Quanto mais falar, menos se
sentirá isolado no que deve ter sido um mundo muito paranoico e
solitário.
— Depois que assinei aquele contrato e Finn viu, eu sabia que
tinha ferrado com tudo. Ironicamente, eu nem sabia quão ruim era,
considerando que Cory apenas encaminhou o acordo comercial e
não o de rebaixamento. — Easton sacode a cabeça.
— Idiota.
Ele ri e concorda com a cabeça.
— Verdade. Finn ficou puto quando descobriu o que Tillman tinha
feito. Me fazendo assinar sem meu representante. A partir daí, ele
começou a questionar cada movimento que Cory fez quando era
relacionado a mim e tentou alertar Boseman sobre isso.
Eu assinto, muito feliz por estar errada sobre Finn.
— Mas quanto mais Finn pressionava, mais eu ficava com medo
de que ele descobrisse a verdade. Então tentei jogar junto. Eu disse
a ele para desistir de reclamar para Boseman sobre Cory ter me
obrigado a assinar aqueles papéis sob coação. Eu assegurei a ele
que de qualquer forma não importava, porque eu sairia da
reabilitação saudável e seria reintegrado. Mal sabia o que mais Cory
ia armar. — Easton balança a cabeça. — Foi minha culpa, Scout. Eu
te deixei culpar Finn, mas foi cem por cento minha culpa. Jesus, foi
a primeira vez que minha incapacidade de ler teve um efeito
monumental na minha vida.
— Você estava com muita dor. Não pode saber se teria agido
diferente.
— Eu dei a mesma desculpa para mim mesmo no início. Acredite
em mim, eu sou o rei de torcer a verdade para me sentir melhor…
Mas dessa vez teve repercussões graves. Eu sabia que precisava
fazer algo, então, coincidentemente, tive uma reunião com os
voluntários no Projeto de Alfabetização. Helen estava trabalhando lá
para conseguir horas de atividades extracurriculares para uma de
suas matérias… Ela está estudando para ser professora de ensino
fundamental pela Universidade do Texas. Ela é ótima com as
crianças, paciente, experiente. Eu sabia que ela estava lutando para
estudar e trabalhar em dois empregos para pagar a faculdade…
Então eu fiz uma oferta: eu pagaria suas mensalidades se ela fosse
tutora de alguém para mim. Depois de perceber que eu não estava
brincando, ela ficou emocionada com a chance. Pedi ao meu
advogado que redigisse acordos que a impedisse, de todas as
maneiras possíveis, de revelar para quem ela estava dando aulas
particulares. Uma vez que ela assinou tudo, contei que eu seria seu
aluno.
Eu fico imaginando quão surpresa Helen deve ter ficado,
enquanto observamos os dois meninos trocarem de lugar. Eles
param por um momento para conversar enquanto passavam um
pelo outro, ambos olhando em nossa direção brevemente antes de
se estabelecerem em suas novas posições.
— Fizemos alguns progressos. Eu me tornei mais rápido em
enganar os olhos para fazer as letras irem para o lado certo e
reposicioná-las, mas ainda tenho um longo caminho a percorrer.
— Mas pelo menos você está se esforçando para isso.
— Se esforçar não corrige o que aconteceu ontem à noite. Deus,
aquilo foi horrível. — Easton suspira a palavra e esfrega as mãos
sobre o rosto enquanto revive a noite. — Eu não sabia que teria que
ler qualquer coisa, Scout. Eu nunca teria concordado com isso se
soubesse. Eu pensei que era o mesmo de quando eu estive na
transmissão aqui. Você apenas conversa, fala alguma merda sobre
beisebol, e é isso. Agora eu sou a hashtag universal e garoto
propaganda dos atletas burros em tudo quanto é canto.
— Não foi tão ruim… — Começo, mas ele levanta a mão.
— Não faz isso. Eu não preciso ser adulado. Eu vi todos os posts
nas redes sociais e ouvi Jim Rome me criticar no rádio. Eu sei como
os comentários são ruins, e você quer saber? Eles estão certos.
Quando o teleprompter começou a rolar, estava se movendo muito
rápido. Eu não podia usar as estratégias que Helen está me
ensinando para enganar meu cérebro e dar sentido às letras. Eu
congelei. Simples assim. Eu fui pego tão fora de guarda, que tentar
encobrir só pioraria as coisas. Foi ruim. Eu sei disso. E os críticos e
guerreiros anônimos dos teclados com certeza sabem disso.
— Eles só sabem o que Bud disse. O teleprompter estava
quebrado, e eles não ensinaram a você os comandos da cabine.
— Em um mundo perfeito, sim. Mas este mundo está longe de
ser perfeito. Bud estava lá. A equipe de filmagem e os engenheiros
de som estavam lá. Eles sabem que não havia nada de errado… E
basta um deles ir tomar uma cerveja com um amigo, fazer um
comentário de passagem… depois você já sabe: Easton Wylder é
exatamente o que todas as crianças na escola costumavam me
chamar. Burro. Estúpido. Lento. Retardado.
— E?
— E o quê? — Ele se vira para me olhar como se eu fosse louca.
— Qualquer pessoa que já te ouviu falar ou esteve perto de você
sabe que não é verdade. E isso é muita gente, Easton. Só porque
você não consegue ler bem não significa que não seja inteligente.
Você com certeza foi educado de outras maneiras… Então qual é o
problema se as pessoas descobrirem? Não, me escuta — eu digo
quando Easton começa argumentar. — As pessoas não precisam
saber que você não sabe ler. Tudo o que eles sabem é que você
tem dislexia e que o teleprompter estava se movendo muito rápido
para você.
— Por que eu diria isso? — ele pergunta, as palavras um
sussurro abafado como se fosse incompreensível o motivo de eu
sugerir algo tão ridículo.
— Porque a dislexia não é algo para se envergonhar. Há tantos
outros por aí como você, Easton. Pessoas que têm vergonha porque
também têm dificuldades de aprendizagem e têm medo de que os
outros zombem delas. Como as crianças em seu projeto, por
exemplo. E se elas soubessem que o homem que idolatram é igual
a elas e ainda é bem-sucedido? — Easton balança a cabeça. —
Compartilhar suas deficiências com os outros é empoderador. Pode
te deixar vulnerável, mas pode permitir que outros superem seus
próprios obstáculos.
Sua mão sobe para a nuca enquanto ele se vira para observar os
meninos e o pai ainda treinando as rebatidas. Arremesso. Rebatida.
Instruções. Repita.
Concentrar-se neles é a única maneira de escapar da profusão
de inseguranças dentro de si.
O garoto na base dá uma boa rebatida que sai voando para o
campo esquerdo. O pop do bastão é inconfundível enquanto a bola
voa alto no céu. O pai dá um grito enorme enquanto o outro filho
corre em nossa direção. Quando a bola para a alguns metros à
nossa frente, Easton dá um passo à frente e pega no momento em
que a criança desacelera até parar.
— Acho que isso pertence a você — ele diz enquanto segura a
bola.
Quando o menino olha da bola para Easton e percebe quem está
parado na frente dele, sua expressão é absolutamente impagável.
— Cacete — diz e, em seguida, se assusta quando percebe que
xingou e leva a mão à boca. — Você é… Ele é, ah, meu Deus, não
diz para o meu pai que eu disse “cacete”. Pai!
A essa altura, o pai da criança está vindo até a gente, curioso
sobre o estranho conversando com seu filho. O outro menino não
está muito atrás. A reação deles não tem preço quando reconhecem
Easton.
Todos os três estão boquiabertos.
Assim que o pai se recompõe, ele estende a mão.
— Leo Tompkins. E estes são Ollie e Archie. Somos todos
grandes fãs. Como está a recuperação do ombro? E os Wranglers?
Sério? Como você…? Desculpe, estou tagarelando. Eu vou parar
agora.
Easton ri, e o som é muito bem-vindo após o desânimo em sua
voz.
— Easton Wylder. É um prazer, e o ombro está meio lento, mas
está se curando. — Eles apertam as mãos. — E esta é Scout
Dalton. — As apresentações são feitas, e então Easton se vira para
Ollie e Archie. — Vocês dois têm ótimas tacadas. Continuem
praticando com seu pai, e vão arremessar para fora do estádio
como se não fosse nada de mais.
Os dois meninos parecem maravilhados com seu elogio — olhos
arregalados e incrédulos —, e eu gostaria que Easton pudesse ver
que isso é o que as pessoas veem. Não suas deficiências ou o que
ele considera como falhas. Mas isso. O pacote completo. O herói
pessoal que meninos e meninas em Austin têm, além do desejo de
crescer e ser como ele um dia.
— Obrigado — diz Ollie. — Eu quero jogar igual a você quando
eu crescer.
— Você pode autografar uma bola de beisebol para a gente? —
Archie pergunta.
— Claro, mas eu não tenho uma caneta — diz Easton tanto para
as crianças quanto para o pai, que parece desanimado quando
percebe que ninguém tem uma. — O que acham de vocês irem ao
estádio amanhã antes do jogo? Perguntem por Manny Winfield na
bilheteria. Eu vou pedir a ele que os leve para uma visita ao vestiário
e ao banco durante o treino de rebatidas.
— Você está falando sério? — Ollie pergunta, a voz aumentando
a cada palavra, assim como Archie, que quase salta de seus tênis.
— Muito sério.
— Muito obrigado. Isso é muito generoso da sua parte — diz
Leo, colocando os braços nos ombros de ambos os meninos. —
Vamos deixar o sr. Wylder em paz agora. Já tomamos bastante do
seu tempo.
— Sem problema — Easton diz enquanto Leo vai orientando os
meninos a se virarem e começarem a andar na direção oposta. —
Ollie, tente manter as mãos firmes durante o arremesso. Isso
ajudará na velocidade da sua rebatida. E Archie, feche um pouco
sua postura, para que você possa alcançar o campo externo.
Ambos olham para Easton novamente e acenam com a cabeça,
ansiosos antes de caminharem em direção ao campo interno; a
conversa contagiante vem flutuando até nós dois.
— E se um daqueles meninos não conseguisse ler? Você acha
que eles pensariam menos de você se soubessem que você teve
problemas também ou você acha que eles ainda pensariam que
você é o herói deles? Eu sei em qual alternativa eu apostaria.
— Eu nunca pedi para ser o herói de ninguém, Scout, muito
menos o garoto propaganda do analfabetismo. Há muita
responsabilidade que vem com algo assim, quando eu já tenho
problemas suficientes para lidar.
— Ok — murmuro.
Easton está irritado, e eu estou pressionando-o quando não
deveria estar, mas sei que isso o ajudaria. Não só daria a este
homem altruísta um tipo diferente de motivação para vencer seus
demônios, como também iria mostrar a ele que o público ainda o
ama independentemente do que ele considera ter de defeitos.
— Obrigado por ter vindo… Por falar comigo… mas eu meio que
quero ficar sozinho agora.
Eu fico olhando para Easton — para aqueles olhos castanhos em
conflito —, e mesmo que eu queira ficar, sentar com ele e ajudá-lo a
não se sentir tão sozinho, sei que preciso dar o tempo que ele está
pedindo.
Eu deixo um beijo na parte traseira de seu ombro.
— Ok. — A contragosto, começo a me afastar e então paro. —
Não há condições no meu amor por você, Easton. Não é o fato de
você jogar beisebol ou sua capacidade de ler ou sua persona
pública que me atrai. Essas coisas vêm e vão e mudam com o
tempo. É o seu coração que amo. É sua capacidade de se abrir para
mim, mesmo quando você não quer. O homem que você é também
me faz querer ser uma mulher melhor. Então vou te dar tempo para
pensar e ficar sozinho, quando eu realmente não quero, contanto
que você entenda que eu quero você. Você inteiro. Com suas
falhas. Seus erros. Suas conquistas. Suas dificuldades. Seu amor.
Easton se vira para mim, e o olhar em seus olhos me diz que ele
entende.
Isso me diz que está voltando para casa, para mim.
Diz que sabe que eu o amo por quem ele é.
E me diz que Easton me ama também.
EASTON

— OI, MAMÃE. — DESLIZO NO ASSENTO AO SEU LADO.


— Easton. Por que você está aqui? — Ela olha em volta do bar
escurecido como um coelho assustado. — Foi o Marty que ligou
para você? Eu tenho me comportado. Eu juro que só bebi alguns
drinques hoje.
Eu me ergo em sua direção e dou um abraço nela. Ela ainda usa
o mesmo perfume de quando eu era pequeno, e agora isso é
reconfortante.
Claro, há fumaça de cigarro grudada em suas roupas e álcool em
seu hálito, mas esse perfume faz com que eu me sinta com oito
anos de novo. Quando ela colocava curativos nos meus joelhos
ralados depois de cair da minha bicicleta de BMX enquanto tentava
saltar na rampa de casa. Sempre que algo acontecia, ela me puxava
para perto, beijava o topo da minha cabeça e me dizia que tudo
ficaria bem.
É por isso que vim aqui quando saí do campo da liga infantil? É
por isso que dirigi por uma hora com as palavras de despedida de
Scout passando pela minha mente e me fazendo questionar como
eu mereço alguém como ela? Só para ter minha mãe me dizendo
que tudo vai dar certo no final.
— Easton?
— Sim, estou bem — digo enquanto a solto e me sento para
olhar para ela. — Eu precisava dar uma volta para limpar a cabeça.
— Há algo de errado? Aconteceu alguma coisa?
Eu fico olhando para minha mãe e sorrio, desejando poder viver
neste esquecimento, nesse mundo de faz de conta induzido pelo
álcool em que ela às vezes vive. As coisas seriam muito mais fáceis.
— Não. Tudo está bem agora.
— Ah, que bom. Eu estava preocupada que talvez algo tivesse
acontecido com aquela boa moça que você trouxe aqui outro dia. —
Ela toma um gole de sua bebida enquanto alguém muda a música
na Jukebox. Johnny Cash começa a cantar sobre cair em um círculo
de fogo, e eu olho ao redor deste triste bar antes de olhar de volta
para minha mãe.
— Não, ela está bem.
— Bem, isso é bom. Eu gosto dela. — Seu sorriso se alarga. —
E ela com certeza é bonita.
— Eu gosto dela também. E ela é bonita. — Eu balanço a
cabeça. — De jeito nenhum eu a mereço.
— Eu discordo — diz, inclinando o copo para mim e perguntando
se eu quero um gole. Eu recuso. — Todo mundo merece alguém.
— É? — Eu não sei por que esse comentário atinge um ponto
sensível. A mulher está falando sobre merecer amor, mas ela está
esperando por anos o dela aparecer. — Seu amor verdadeiro
merece você, mãe? Como ele te deixou sozinha esse tempo todo,
eu realmente não acho que ele te mereça.
— Shhh. Não diga isso. Ele vai voltar. Prometeu consertar as
coisas, para aí tudo ficar bem.
— Fazer o que ficar bem? E se ele não voltou até agora, por que
ainda acha que ele vai voltar? — reclamo, jogando minha própria
frustração sobre sua devoção enlouquecedora a um amante que
provavelmente nem existe.
— Porque ele é o cara certo. — Ela encolhe os ombros como se
fosse um fato comprovado, e sobre isso não há o que contestar.
— Quem é ele?
— Uma senhora nunca expõe suas intimidades, Easton. Você
deveria saber disso.
— Você é muito frustrante, sabia? Você espera por um homem
que não voltou e ainda acha que ele é o cara certo?
— Você vai entender com o tempo. — Minha mãe aperta minha
mão, um sorriso suave erguendo os lábios, um olhar distante nos
olhos, como se estivesse se lembrando de algo. — Haverá um dia,
filho, que alguém amará as suas partes que ninguém mais sabe
como amar. Nesse momento, você vai saber que essa pessoa será
a certa para você.
Depois de toda a merda que aconteceu hoje, não posso fazer
nada além de olhar para ela e absorver a sabedoria que chega perto
demais do meu coração.
— Você vai ficar comigo esta noite? Uma capa de sofá novinha
chegou do canal de compras, e eu comprei só para você. — A
esperança preenche sua voz, mas não tem nada a ver com a
esperança que ela inconscientemente deu ao meu coração.
— Eu sinto muito, mas preciso voltar.

Haverá um dia, filho, que alguém amará as suas partes que


ninguém mais sabe como amar.
— Você ainda está acordada.
— Mm-hmm. Eu queria ter certeza de que você estava bem. —
Sua voz está rouca de sono, e isso mexe com todo o meu ser. Eu
preciso dela.
O apartamento está escuro, exceto pelas luzes da cozinha acima
da ilha e pelo brilho do horizonte além. Deixo dessa maneira
enquanto me encaminho até a silhueta de Scout sentada na minha
cadeira e olhando para o mundo lá fora.
— Você está bem? — pergunta enquanto eu passo por ela e vou
até as janelas. Fico olhando para a cidade abaixo, o fantasma
escuro de um estádio.
Outras pessoas estão enfrentando coisas muito piores do que
eu, mas ainda assim o medo ainda está aqui, me segurando como
seu refém. Depois de um tempo, viro para enfrentá-la. Scout está
com uma das minhas camisetas, suas pernas nuas estão enroladas
debaixo do corpo, e ela tem uma taça de vinho na mão. Não consigo
ver seus olhos, mas a compaixão em sua voz ressoa em meus
ouvidos — o som de alguém amando as minhas partes que ninguém
mais soube como amar — e eu sei quão sortudo sou por Doc não
ter aparecido aquele dia para tentar o contrato de fisioterapia com
os Aces há cinco meses.
Posso ter pensado que ela era parte de uma pegadinha dos
meus amigos, mas agora tenho certeza de que a piada era comigo.
Como eu podia saber?
— Eu tinha muito para pensar, então dei uma volta para limpar a
cabeça — digo enquanto me inclino contra a parede.
— Algum lugar digno de nota?
Eu penso na minha mãe. Nos seus abraços, no seu conselho
inesperado.
— Na verdade, não.
— Você teve sucesso em limpar a cabeça?
— Sim e não.
Scout faz um som evasivo enquanto toma um gole de vinho. Nós
nos encaramos na escuridão por alguns minutos enquanto crio
coragem para dizer o que preciso.
— E se meu ombro não cicatrizar? — pergunto, seu rosto
enrijece com minha pergunta inesperada. — A cirurgia pode ter
corrido muito bem, e eu tenho a melhor fisioterapeuta ao meu lado,
mas e se meu ombro não cooperar? E se eu não conseguir voltar?
— Então cruzaremos essa ponte se e quando chegarmos a ela
— diz Scout com cautela.
— Tem um momento antes de um jogo começar. Às vezes é
quando estou colocando meu equipamento sentado no banco,
outras vezes é aquele momento logo antes do primeiro arremesso,
quando o estádio fica em silêncio por uma fração de segundos
esperando por isso… É parte pressa, parte adrenalina… É
indescritível.
Lutando para colocar algo tão real, mas nada concreto, em
palavras, eu me viro para olhar a sombra do estádio, tentando
conseguir algum tipo de ajuda.
— É a magia — Scout murmura enquanto caminha ao meu lado,
me deixando espantado, porque mais uma vez ela entendeu, me
entendeu, quando ninguém mais o fez.
— Lá vai você colocando meus pensamentos em palavras
novamente.
— Acho que isso significa que somos uma boa equipe.
— Uma equipe boa para cacete. — Engancho meu dedo
mindinho no dela, precisando de algo para me aterrar enquanto
permanecemos ao redor de todas as coisas não ditas. Eu sinto que
posso respirar pela primeira vez desde que saí do avião esta
manhã. — Eu senti isso ontem à noite.
Seu dedo enrijece no meu, e eu sei que ela está seguindo minha
linha de raciocínio, porque é Scout; mesmo assim ela deixa meu
comentário assentar antes de perguntar.
— Sentiu o quê?
Eu limpo a garganta e me questiono, mas a mesma resposta que
recebi ao voltar da casa da minha mãe aparece.
— Houve um momento antes de as câmeras serem ligadas,
quando eu estava sentado naquela cabine olhando para o campo
diante de mim. A energia no ar… E aquela magia, a sensação que
pensei acontecer por estar no campo como um jogador antes de
uma partida começar… Eu senti isso, Scout.
— A magia — ela sussurra enquanto chega mais perto de mim e
desliza os braços em volta da minha cintura.
E depois do dia que tive, ter Scout é o que preciso. A forma como
me entende. O jeito que não me pressiona, mas ao mesmo tempo
me instiga. O silêncio tranquilizador. Ficamos assim por um
momento. Eu respirando seu perfume e aceitando o fato de que ela
é um mulherão, e eu a mereço.
— Tem mais — ela murmura e pressiona um beijo no meu
ombro. — O que você não me contou?
E lá vai ela de novo. Roubando meus pensamentos quando
acreditei que tinha sido apenas meu coração que tinha sido
roubado.
— E se eu destruí minha única chance, Scout? Eu nunca pensei
na vida depois do beisebol, sempre foi o foco de tudo, mas quando
terminar, você tem ideia do que eu daria para ter uma carreira em
que ainda possa sentir essa magia? Ter a oportunidade de continuar
jogando beisebol? E se ser locutor esportivo for essa chance e eu
simplesmente tiver estragado tudo porque não consigo ler? —
Frustrado por não estar me explicando muito bem, me afasto de
Scout e ando para o outro lado da sala antes de me virar e encará-
la. — Deus, isso parece patético, mas…
— Não, não parece — ela diz enquanto dá um passo em minha
direção. — Parece maduro e inteligente.
— Você está me fazendo parecer um velho. — Eu rio, de repente
desconfortável. Uma coisa é pensar sobre a vida depois do
beisebol, mas outra é considerar isso verdadeiramente. Quando não
houver mais escalação para os jogos. Sem mais brincadeiras de
vestiário com os caras. Sem correr para o campo com a sensação
do meu equipamento tilintando na altura dos joelhos. Sem tentar
descobrir como tirar meu adversário da base.
— Acho que é brilhante, na verdade.
Esse comentário me faz parar de passar a mão pelo meu cabelo.
— O que você quer dizer?
— A Fox Sports ainda está procurando por seu comentarista de
pós-temporada. E se você pedisse outra chance?
Desta vez, minha risada é longa e rica.
— Você realmente acha que eles me dariam outra chance? Você
viu as consequências nas redes sociais, não viu?
— Sim, eu vi. Mas e se Finn for até eles e contar a verdade ou,
se você se sentir desconfortável com isso, dar uma desculpa
razoável e pedir por uma segunda chance?
O pensamento de ter de dizer a verdade a Finn ou aos
poderosos da Fox Sports, me faz quase engasgar com o ar. Eu
posso ficar em um estádio cheio com sessenta mil fãs e não vacilar,
mas isso, pessoas sabendo da minha verdade, faz meu estômago
embrulhar.
— Você está perdendo o ponto mais importante aqui.
— E qual é?
— Ainda não consigo ler. Eu ainda não consigo juntar as letras
tão rápido quanto o teleprompter roda, e simplesmente acabaria…
— Jesus Cristo. Só o pensamento disso me leva a entrar na cozinha
e pegar uma cerveja na geladeira.
— Então Helen e eu podemos passar o dobro de tempo te
ensinando. Tentando treinar o seu cérebro para ver as palavras
corretamente. — Ela me segue na cozinha, sua voz insistente e
tingida de otimismo. — Nós praticamos, pedimos o roteiro com
antecedência e faremos funcionar, Easton. Porque você estava
escondendo isso antes, você estudava apenas o mínimo, mas
agora, comigo a par de tudo e com você tendo um tempo de
inatividade para sua recuperação, não tem que se esconder mais
em sua própria casa. E então uma vez que você conseguir, porque
eu tenho fé que você vai conseguir, poderá escolher se quer explicar
a verdade para as pessoas sobre o que aconteceu na primeira
rodada. Essas crianças, aquelas que estão morrendo de medo de
serem ridicularizadas, vão perceber que vai ficar tudo bem. Seu
herói é exatamente como elas.
— Scout, não sei…
— Eu sei. E você pode não ver por agora… Eu nem consigo
imaginar a pressão que você sentiu, tendo que esconder isso por
tanto tempo. Você pode imaginar como seria se não tivesse que se
esconder mais? A pressão para ser algo que você não é
desapareceria.
Eu odeio que a ideia ao mesmo tempo me excite e me assuste
para caralho. Eu aprecio a fé inabalável de Scout em mim. Mas mais
do que qualquer coisa, odeio ouvir a esperança em sua voz quando
sei que provavelmente trarei uma nova decepção. Mas… Scout ama
as minhas partes que ninguém mais soube como amar. Isso é
suficiente?
Olhando para seus olhos em expectativa, o pânico que vivi
durante toda a vida ressurge com força. Eu sei que ela vê, porque
sorri suavemente e me beija suavemente nos lábios.
— Eu sinto muito. Eu sei quão capaz e incrível você é. Eu sei
que seus medos são reais e válidos, mas a possibilidade também.
Isso é tudo que vou dizer. E não vou tocar no assunto de novo.
Deus, eu amo essa mulher e seu copo meio cheio.
Mesmo diante do que tenho de pior, ela ainda vê o melhor em
mim.
EASTON

QUE MERDA ELE ESTÁ FAZENDO AQUI?


Eu termino a ligação com Alec na recepção do prédio e espero
na entrada do apartamento o elevador subir e as portas se abrirem.
Quando elas se abrem, sou saudado pela figura enorme. O
homem por quem fui intimidado quando criança quando ia para o
trabalho com meu pai. O homem que aprendi a respeitar como
adulto ao jogar em seu time.
— Senhor Boseman — eu digo enquanto ele sai do elevador e
dá uma olhada rápida ao redor antes de apertar minha mão
estendida.
— Easton. Bom te ver.
— Igualmente. — Eu odeio que minhas esperanças surjam
momentaneamente por causa da sua visita domiciliar sem
precedentes, mas sei que não há chance alguma de que ele venha
para me oferecer meu emprego de volta. — A que devo este
prazer?
— Posso entrar por um momento? — pergunta, já entrando no
espaço aberto, um homem desacostumado a esperar pelos outros.
— Sim, por favor. — Eu o sigo e me pergunto o que está
acontecendo.
Boseman caminha em direção à janela panorâmica e passa um
momento apreciando a vista, assim como a maioria que vem aqui.
Suas mãos estão nos bolsos, o paletó bem apertado sobre os
ombros, botas de cowboy nos pés. Ele é a própria figura do
magnata do petróleo, o que realmente é, só escapa da imagem
exata pela marca que o chapéu de caubói deixou em seu cabelo
grisalho, um chapéu que não veio com ele hoje.
— Uma bela vista — diz com um aceno de cabeça enquanto se
vira e me encara. Olhamos um para o outro por um momento antes
de Boseman falar: — Eu fiz muitos negócios na minha época,
Easton. Alguns tenho orgulho. Em outros, tenho sido extremamente
bem-sucedido. Alguns não caíram bem para mim.
— Ok. — Eu alongo a palavra, sabendo que Ted Boseman gosta
de montar o cenário enquanto começa a esclarecer seu ponto de
vista.
— Há quanto tempo eu te conheço? — Ele me faz outra
pergunta. — Quase toda a sua vida?
— Por aí.
— Eu penso em você como família. Eu penso em todos os meus
jogadores como uma família, mas você especialmente. Ao dizer
isso, espero que você me ouça quando digo que o que Tillman fez
com você foi uma daquelas coisas que não caem bem comigo.
— Obrigado, senhor.
O que mais eu posso dizer?
— Eu estava fora, fingindo estar em um “No Limite” na Amazônia
e tentando evitar uma segunda crise de meia-idade, e ele estava
aqui tentando ferrar minha organização. — Boseman limpa a
garganta e olha para trás em direção ao estádio abaixo de nós. —
Eu o contratei por causa da reputação. Andei preocupado com as
coisas nos últimos dois anos e em como elas saíram um pouco de
mão em relação à administração. Conversei com alguns outros
proprietários e ouvi falar de Cory Tillman e de como ele foi capaz de
cortar custos e otimizar outros times. Cortar a gordura, se quiser
chamar assim, conforme a necessidade de cada empresa. Eu
ignorei os jogadores irritados que ele tinha negociado, umas
conversas sobre ele ser antiético, e atribuí isso a raiva por terem
sido trocados.
— Compreensível — digo, sentindo que preciso participar dessa
conversa unilateral.
— Como você sabe, eu o contratei. Eu dei a ele um orçamento
que eu queria que mantivesse e cortasse onde pensasse que as
coisas precisavam ser cortadas para acertar tudo. Eu até ofereci um
bônus do tamanho do Texas se ele conseguisse atingir meu
orçamento no final da temporada. Mas veja, aí foi onde me antecipei
e me preocupei com o que não devia. Você não dá a um homem
carta branca e fica surpreso que ele corte seu principal jogador para
tornar mais fácil atingir esse orçamento de uma só vez. Seu salário
é… foi um dos nossos maiores pagamentos. Nossos bolsos não são
tão fundos como, digamos, os dos Yankees, e ainda trocando você
e trazendo um apanhador pela metade do preço, o orçamento torna-
se menor, e aquele bônus fica muito mais acessível para Tillman.
— Agradeço por me dizer — digo, mas não entendo por que ele
está vindo aqui agora e dizendo tudo isso. O que mudou?
— Quando voltei e ouvi as inúmeras mensagens do seu agente,
abri os olhos para muitas coisas que Tillman fez em minha ausência.
Coisas que meus outros gerentes deveriam ter percebido, mas não
o fizeram. Coisas eticamente questionáveis. Liguei para outras
equipes para as quais ele trabalhou, falei com os jogadores que
foram negociados, e suas respostas, aquelas que eu deveria ter
ouvido desde o início, me irritaram muito. — Ele passa a mão pelo
cabelo antes de se sentar na borda do sofá. — Por que você não
veio até mim depois que ele fez você assinar aqueles papéis
quando se machucou da primeira vez?
Desconfortável, balanço em meus pés. Eu digo a verdade a ele?
Admito que não consigo ler e então eu peguei o Finn para fazer isso
por mim? Isso não me faz parecer muito brilhante.
— Você o contratou, então achei que você sabia o que estava
acontecendo. Não parece exatamente profissional reclamar com o
proprietário quando você não gosta do novo chefe.
Quando me viro, seus lábios estão franzidos, e ele está sentado
com os cotovelos sobre os joelhos.
— Eu dispensei Tillman hoje. Eu tive que pagar um bom dinheiro
para contratá-lo, mas não podia deixá-lo arruinar minha equipe mais
do que já arruinou.
Sua admissão me surpreende, mas é tarde demais. Para mim,
de qualquer forma.
— Não posso dizer que discordo da sua decisão — digo
finalmente.
Sua risada ressoa enquanto ele balança a cabeça.
— Eu não pensei que você iria, filho. Eu sei que isso não muda o
fato de que você ainda é um Wrangler. — Ele cospe a palavra como
se fosse quase difícil mencionar nosso rival. — E eu peço desculpas
a você por isso. Mas é importante para mim que você saiba que se
eu algum dia tiver a chance de corrigir essa confusão e te trazer de
volta para casa, eu vou.
Ele se levanta e dá um passo em minha direção, com a mão
estendida para mim. Eu a aperto.
— Obrigado.
— O que eu não daria para ter você de volta e Santiago fora —
ele murmura enquanto caminha até a porta. — Mas contratos são
contratos, e não posso forçar outras equipes a rescindir seus
acordos também. Eu não acho que os Wranglers seriam muito
gentis comigo tentando roubá-lo de volta, mas Deus sabe que vou
tentar no futuro. — Ele se vira para me olhar uma última vez. —
Desculpe pela visita inesperada, mas achei que você merecia este
pedido de desculpas em pessoa.
Já disse obrigado tantas vezes, que me sinto como um disco
quebrado, então não digo mais nada. Em vez disso, balançou a
cabeça e aceito um pedido de desculpas que nunca esperei receber.
É muito difícil para um homem enfrentar seus erros de frente.
Eu que sei.
SCOUT

PUTA MERDA!
Boseman realmente fez isso. Esse é o pensamento recorrente
enquanto me inclino contra a parede do lado de fora do vestiário
para organizar a cabeça após o telefonema que recebi. Claro que
preciso ligar para Easton — contar para ele, caso Boseman não
tenha dito pessoalmente —, mas primeiro preciso de alguns
segundos para processar as ramificações disso.
O que isso pode significar para mim e o que significa para
Easton.
Um vestiário lotado não é exatamente o lugar onde posso fazer
isso. E só de pensar nisso, assovios e gritos soam através da porta
fechada enquanto ela faz um movimento de vai e vem. O som me
coloca em ação. Eu preciso pegar minhas coisas e ir para casa,
para que eu possa comemorar com Easton este momento que foi
um presente do carma.
Bem quando pego a maçaneta para abrir a porta do vestiário, me
surpreendo ao ver dois pares de ombros curvados conversando
sobre algo em tons baixos. Cal e Santiago. Que merda é essa? Cal
me vê primeiro — olhos arregalados e boca aberta em um perfeito
O. Antes que ele possa dizer alguma coisa, eu saio para o vestiário,
desconfortável e confusa sobre o que estão falando. Novamente.
Não é da sua conta. Basta pegar sua bolsa e telefone e ir para
casa.
Mas não consigo parar de pensar nos dois e no que poderiam
estar discutindo. Mas, até aí, Cal trabalha para os Aces. Ele poderia
estar dando a Santiago a mesma notícia que acabei de receber.
Tillman se foi, e é melhor ele se cuidar.
Mas o pensamento não me cai bem.
Cal não iria esperar e deixar Santiago descobrir sozinho quando
Boseman fizesse o anúncio oficial?
— Rapazes, vamos torcer para que a pontuação de Tampa
permaneça onde está, porque aí é um negócio fechado — J.P.
comemora, tirando sarro dos caras e assustando, me fazendo sair
de uma espiral de pensamentos sobre algo que provavelmente não
é nada. Querer saber dos hábitos sociais de Santiago não merece
ocupar um segundo do meu tempo.
— Playoffs, aqui vamos nós — grita Riddell em um conjunto
estridente de comemorações.
— Grande jogo esta noite, pessoal — acrescento à conversa
quando entro em meu escritório, pego minha mochila e saio tão
rapidamente quanto entrei.
— Você vai assistir ao restante do jogo de Tampa com a gente no
Slugger’s? Vamos ligar para East para nos encontrar lá, e podemos
comemorar.
— Eu não tenho certeza de quais são os planos dele — eu digo,
embora saiba muito bem que Easton não está pronto para enfrentar
o público, ainda mais depois do desastre da Fox. Mas talvez ele
queira comemorar com seus ex-companheiros de equipe depois que
eu contar a ele as boas notícias. — Vou ver quando chegar em
casa.
— Você sabe que quando ela fala assim — brinca Drew —
significa que vai rolar um pouco de mambo horizontal.
— Ah, pelo amor de Deus — Eu rolo os olhos e rio.
— Nah. Eu duvido. — A voz de Santiago soa alta e clara. Ele
deve ter entrado no vestiário quando eu estava na minha sala. Eu
continuo caminhando para a saída, determinada a não o deixar
estragar meu bom humor. — Easton está muito ocupado lambendo
as feridas depois de fazer papel de idiota na TV na outra noite. Uh.
Uh. Duh. Uh — ele gagueja, zombando de Easton.
Que escroto. Meus pés vacilam. Minha raiva cresce.
— Vaza, Santiago. — Acho que é Tino ou talvez J.P quem diz.
Não tenho certeza porque estou muito ocupada vendo tudo em tons
de vermelho.
— Você não pode esconder a burrice. — Ele segue o comentário
sarcástico com uma risada que irrita todos os meus nervos. — Isso
diz muito sobre seus padrões, Scout.
— Não faça isso! — grito para Drew e seus punhos cerrados. A
última coisa que ele precisa, com os playoffs ali na esquina, é de
uma suspensão da equipe por bater a merda fora de Santiago.
Mas eu cansei disso. Estou farta desses comentários de merda
de Santiago. Ainda bem que a advertência de suspensão não se
aplica a mim.
— Ei, Santiago — eu digo alto o suficiente para chamar a
atenção e chocar os caras todos. As toalhas param de secar, e as
camisas são arrancadas sobre as cabeças enquanto subo no banco.
— Esse truque realmente funciona para você? Essa forma sua de
ficar falando mal do cara que esteve aqui antes para distrair os
outros do fato de que suas estatísticas nunca serão iguais às dele?
Você só pode sonhar em atingir números como aqueles. Quer dizer,
tem uma razão pela qual seu contrato vale a metade do valor do que
Easton tinha. Isso te consome por dentro? Você e seu ego enorme?
Quanto tempo mais você acha que isso vai durar? Você acha que
quando Boseman encontrar um novo gerente geral ele vai tolerar
isso? — Eu amei o olhar chocado em seu rosto. Os olhares
assustados dos caras ao meu redor. Eu acho que acabei de fazer o
anúncio eu mesma. — Ah, você não sabia disso? Foi mal. Pensei
que era sobre isso que Cal estava conversando com você no
corredor. Sim. Seu tempo é limitado aqui. Boseman demitiu Tillman.
Isso mesmo. Apenas a única pessoa do seu lado nessa organização
se foi. — Meu sorriso é presunçoso enquanto balanço a cabeça em
desgosto. — Então se você quiser falar sobre estupidez, você pode
querer se olhar no espelho, considerando que se esforçou para não
fazer um amigo aqui. E, opa, o único amigo que você tinha se foi.
Ele dá alguns passos em minha direção, os ombros orgulhosos,
o corpo mostrando uma linguagem defensiva; seu rosto é uma
máscara de indiferença. Eu sei muito bem, eu atingi Santiago e seu
ego sensível.
— Você é uma vadia, sabia?
Os caras vieram para perto, ao meu redor, com os punhos
cerrados. Eu não preciso de uma distribuição gratuita de socos por
aqui quando os repórteres estão do lado de fora. Não no meu turno.
Eu pulo do banco e me aproximo dele. Claro que Santiago é
mais alto que eu e pesa uns vinte quilos a mais, mas estou tão farta
de sua babaquice, que eu não me importo.
— Eu posso ser uma vadia, mas você é invejoso — digo. —
Deve ser de foder querer ser igual ao homem que você nunca vai
ser. Você tentou afastá-lo, você tentou tomar seu lugar, e eis que ele
ainda é melhor do que você. Isso realmente deve te deixar puto. O
talento de Easton supera sua mediocridade todo dia.
O músculo em sua mandíbula estala, e cada parte dele se eriça
com minhas palavras que atingem um pouco perto demais a
verdade. Ele dá um passo em minha direção, me ameaçando com
seu tamanho. Os caras dão um passo para mais perto, mas eu não
me movo. Apenas fico olhando para Santiago, me recusando a
recuar.
Existem vantagens em ser criada entre um monte de homens, no
final das contas.
— Encosta um dedo em mim. Por favor, estou implorando. Eu te
desafio a tentar, porque aposto que Boseman vai perdoar cada um
deles por arrebentar você inteiro caso você coloque a mão em mim.
Ele é cavalheiro nesse nível.
Santiago apenas fica olhando, o pomo-de-adão balançando
enquanto ele tenta se controlar apesar das feridas que eu cutuquei
propositalmente.
— Covarde — murmuro. Uma última ferida. O idiota merece.
Ele arruinou meu bom humor.

— Scout? — Ele já sabe. A emoção e a falta de tensão em sua voz


me dizem. — Você soube?
Easton me encontra com uma taça de vinho e me dá um beijo
rápido quando entro na cozinha. Eu rio enquanto sua mão boa tenta
vagar livremente sobre minha bunda.
— Eu soube. Recebi uma ligação antes de sair.
— O filho da puta merece.
— Com certeza. — Tomo um gole, escondendo minhas próprias
preocupações. — E o castigo chegou.
Estamos revisando algumas atitudes que o sr. Tillman teve
durante seu tempo ocupando a posição de gerente geral. Ele
dispensou muitas pessoas e abriu o clube para processos judiciais,
srta. Dalton. Sua posição e contrato probatório também estarão sob
revisão.
— Boseman veio me ver.
— Veio aqui? Aqui em casa? — pergunto, surpresa por ele ter
feito isso, mas é aquilo: se trata de Easton. E Boseman disse que
temia ações judiciais.
— Sim. Me chocou para caralho, mas ele explicou tudo. Já que
Tillman fez o que fez, ele se desculpou pelo que aconteceu comigo.
— Isso é bom, não é?
— Não muda nada para mim. A troca já foi feita. Eu ainda sou
um Wrangler. Ele até disse que vai se esforçar para tentar me trazer
de volta, de qualquer forma já alivia um pouco da dor desse
processo.
— Fico feliz então — digo enquanto me aproximo de Easton e
aceito o beijo de boas-vindas. O clima está muito melhor do que na
noite passada.
Sua risada. Seu humor otimista. O clima de um homem que teve
sua vingança.
Aceito isso tudo a qualquer hora do dia.
E mais tarde vou me preocupar em como a situação me afeta.
Com o fato de que posso ficar desempregada.
SCOUT

EU PRESSIONO OS DEDOS NOS OLHOS POR UM MOMENTO E RESPIRO FUN


olhar para a papelada do hospital. O médico disse que era por
precaução, mas depois de outra passagem pela emergência essa
semana, me entregou uma pasta com os papéis de alta do meu pai
e me disse que eu precisava dar uma olhada em tudo. A saúde do
meu pai só vai piorar cada vez mais rápido, então preciso me
preparar mentalmente para as próximas etapas.
Eu folheio as páginas para aprender sobre o que fazer e o que
não fazer, saber identificar quando é hora de pedir por cuidados
paliativos. Porém isso é muito para mim agora. Eu não quero
aceitar. Eu não deveria passar por isso.
E ainda assim o médico os deu para mim.
Fecho a pasta e a afasto. O que os olhos não veem… Será que
eu realmente quero algum estranho lá conosco em suas horas
finais? Não seria melhor se fôssemos apenas Sally e eu? Mas a
morte é uma coisa assustadora, que não tenho certeza se posso
enfrentar sozinha. Estou petrificada por admitir, mas quando chegar
a hora, serei capaz de segurar sua mão e falar com meu pai
enquanto ele dá seus últimos suspiros ou eu vou querer correr e me
esconder e fingir que não está acontecendo?
Ambas as possibilidades me apavoram.
A risada de Easton ecoa pelo apartamento. É um som bem-vindo
— o som da esperança cortando meu desespero silencioso —, que
ouvi nas últimas horas, desde que Helen chegou para trabalhar com
Easton.
— Estou saindo — Helen diz para mim enquanto enfia a cabeça
dentro do meu escritório.
— Já está na hora? — Verifico meu relógio e não posso acreditar
que estive sentada aqui procrastinando e evitando ler o material do
hospital por duas horas inteiras.
— Sim. — Ela abaixa a voz, mas o sorriso permanece. — Ele
está diferente agora com as aulas. Queria aprender antes, mas
agora é como se ele tivesse algo a provar. Quando fica frustrado,
enfrenta o desafio, em vez de querer acabar com a aula. Tenho
certeza de que é por sua causa.
— Obrigada por me dizer isso — agradeço, e Helen acena com a
cabeça e segue para a porta. É exatamente o que eu precisava
ouvir. Lágrimas brotam dos meus olhos, e um caroço se forma na
garganta. Suas palavras significam mais para mim do que ela jamais
poderia imaginar. Passei horas lidando com algo que não tenho
absolutamente nenhum controle ou que não posso influenciar de
forma alguma o destino, a saúde do meu pai, então ouvir que meu
apoio deu a Easton novas forças me faz bem.
— Olá. — Braços deslizam em volta da minha cintura e me
puxam contra o comprimento duro de seu corpo.
— Uma boa aula?
— Aham — Easton murmura e me dá um beijo na nuca. — Não
vou te aborrecer com os detalhes, mas foi além de boa. Um avanço
em direção ao melhor.
A felicidade em sua voz aquece muitas partes em mim.
— Que bom ouvir isso.
— Alguma notícia de Boseman?
— Não. — Entrelaço meus dedos com os dele, que estão na
minha cintura, e tento não pensar sobre meu próximo encontro com
o dono dos Aces.
Atualmente, eles estão revisando todos os contratos que Cory
Tillman iniciou, na tentativa de descobrir se querem mantê-los ou
anulá-los. E, claro, isso inclui o meu.
— Ei. — Easton vira meus ombros, então sou forçada a encará-
lo. — Boseman é um bom homem. É só ver que assim que ele
descobriu que Tillman era um bastardo o demitiu, embora houvesse
um contrato sólido. Eu estou certo de que lhe custou uma fortuna,
mas ele sabia que era a coisa certa a fazer… Assim como tenho
certeza de que saberá que dar a você o contrato da equipe é a coisa
certa a ser feita.
— Eu sei. Só sinto que a terra está continuamente se movendo
sob meus pés hoje em dia, e só vai piorar com tudo que está por vir.
— Eu penso no meu pai, na papelada dos cuidados paliativos em
cima da mesa, e odeio saber que esta sensação ruim não vai se
comparar com o que sentirei em breve. Mais cedo do que gostaria.
— Vá colocar algumas roupas elegantes — diz Easton, me
chocando e me fazendo olhá-lo. Eu sou recebida por um largo
sorriso e olhos travessos. — Vamos sair.
— Mas eu pensei que você ainda estivesse…
— Dane-se a imprensa — diz, acenando com a mão com
indiferença. — Sempre vai haver um idiota em algum lugar com uma
boca grande me chamando de atleta burro. Eu sou um menino
crescido, me viro sozinho. Além disso, desde que os Aces chegaram
aos playoffs, o foco mudou.
Eu amo como esse pouco de confiança que Easton ganhou hoje
o faz se preocupar menos.
— Para onde estamos indo?
— Não sei, Scout, mas vamos nos divertir um pouco.
E no minuto que eu embarco em seu bom humor contagiante e
começo a ir em direção ao quarto para me trocar, a campainha da
porta toca.
— Estraga-prazeres — diz ele com uma risada enquanto se
dirige para lá. — Vá se vestir. Vou me livrar de quem quer que seja
rapidamente.
Mas, por algum motivo, eu não me mexo. Há poucas pessoas
que têm acesso ao elevador para a cobertura. A segurança não
ligou para nos avisar que há um visitante, então deve ser alguém
dessa lista.
— Pai. Quanto tempo não te vejo, Derek. Quanto tempo faz,
cara? O que vocês estão fazendo aqui?
Cal sai do elevador e dá um tapinha nas costas de Easton, em
seu ombro bom, e os três trocam saudações. Eu fico olhando de
onde estou, na cozinha, para a lenda do beisebol, Derek Penbrooke.
O homem conhecido por suas rebatidas em situações impossíveis,
suas mais de três mil rebatidas de sucesso e seus dez prêmios Gold
Glove.
— Derek estava na cidade, então almoçamos juntos para
podermos conversar. Falamos sobre o clube, sobre aquele idiota do
Tillman, e então ele perguntou como estava seu braço, então pensei
em parar e ver como você está. — Cal parece muito com um pai
orgulhoso. Eu odeio me perguntar se é encenação ou se é verdade.
Easton olha na minha direção, um pedido de desculpas escrito
em seu rosto, e eu apenas dou de ombros. Não é exatamente como
eu pensei que nossa noite iria se desenrolar, mas o sorriso em seu
rosto é sincero e adoro vê-lo ali.
— Ah, Scout, eu não vi você aí. — Cal se aproxima de mim, a
voz aumentando, peito estufado. — Derek, você já ouviu falar de
Doc Dalton?
— É claro. — Ele sorri. O sorriso é caloroso e genuíno e me
convida a dar um passo em direção. — Ele cuidou do meu ombro há
muito tempo quando eu jogava.
— Você quer dizer durante a Idade da Pedra? — Cal pergunta.
— Se eu estava jogando, então você também estava, Wylder —
diz Derek com um sorriso.
— Está é Scout — interrompe Easton. — Filha do Doc.
Derek estreita os olhos enquanto me encara por um momento
estranho.
— Bem, o que dizer? É você mesma. Da última vez que te vi,
você tinha mais ou menos esta altura — diz ele, a mão a cerca de
um metro do chão. — Você estava mascando um chiclete grande
demais para sua boca, tinha um monte de sardas no nariz, e estava
rindo como louca com aquele seu irmão. Scout Dalton. Como você
cresceu.
— É bom ver você de novo, Derek — eu digo com um sorriso e
um caloroso aperto de mão.
— Como está aquele seu velho? Alguns boatos dizem que ele
não está trabalhando muito ultimamente. O vírus da aposentadoria o
pegou?
— Algo do tipo.
— Scout vai assumir o negócio se e quando ele decidir se
aposentar. — Easton diz, me salvando de ter que adicionar mais
uma mentira leve à montanha que estou criando.
— Entrem, cavalheiros — eu digo com um sorriso. — Posso
pegar uma bebida para vocês?

— Então havia um propósito em sua pequena parada. — Easton ri


antes de levar a garrafa de cerveja aos lábios.
— Seu velho tinha segundas intenções — Derek diz com um
encolher de ombros descarado. — Como se isso fosse uma
surpresa. Duas cirurgias nesse ombro, Easton, e a segunda foi
definitivamente mais difícil de recuperar, mas depois que eu fiz, uau,
estava perfeitamente bom. Ganhei um Gold Glove e marquei
quarenta e poucos homers na temporada seguinte.
— Esta é a sua maneira de tentar me dizer que vai ficar tudo
bem, pai? — Easton pergunta com um revirar de olhos enquanto ele
bate o gargalo de sua garrafa contra a de Derek.
— Só tentando dar a você um pequeno incentivo, isso é tudo. Te
deixar ver que se você fizer o que deve, retornará para a próxima
temporada e chutará algumas bundas.
— Filho da puta insistente — Easton diz, mas seus lábios estão
sorrindo.
— Alguém tem que ser.
Eu fico na cozinha e os ouço falar sem parar. O riso é farto e
contínuo enquanto os três homens conversam sobre beisebol,
política de clube e as próximas partidas para os playoffs. É o mais à
vontade que já vi Easton com o pai, e é o máximo que eu já o ouvi
falando de beisebol sem ser com seus companheiros de equipe.
Sirvo mais vinho na minha taça, e quando me viro, Cal está
parado do outro lado da ilha, me estudando descaradamente.
— Você quer mais uma cerveja? — pergunto, de repente nervosa
sob o seu escrutínio.
— Não. Obrigado. — Ele olha de volta para onde Easton e Derek
estão rindo de alguma coisa e depois de volta para mim. — Então,
Scout, você está morando aqui agora?
Eu franzo os lábios enquanto penso em como responder, porque
por algum motivo sinto que estou sendo julgada.
— Eu ainda tenho a minha casa, se é o que você está
perguntando.
— Mas essa coisa entre vocês dois é séria, então?
Por que tantas perguntas?
— Eu diria que sim. — Observo e espero por uma reação, mas
sua expressão permanece estoica.
— Isso é bom. Estou muito feliz que ele tenha alguém como você
para ajudá-lo a passar por este momento difícil. Entre o ombro
sendo lesionado novamente e o maldito erro da transmissão, ele
precisa de alguém que o apoie.
Exatamente. Não é como se Easton pudesse contar com você,
Cal, para ser esse apoio.
Eu fico olhando para Cal por um momento, ouvindo as palavras
que está dizendo. No entanto, tenho a sensação de que ele quer
dizer outra coisa.
— Ele é um bom homem — eu finalmente respondo, seguindo o
olhar de Cal para a sala, onde Easton ouve atentamente uma
história que Derek está contando.
Cada parte do sorriso de Easton vale uma noite com ele que eu
possa perder.
— Sei que os próximos meses serão difíceis. Com ele querendo
começar a fisioterapia o quanto antes. Preparando-se mentalmente
para não ter medo de machucar o ombro novamente. — Ele toma
um gole de cerveja. — E o que mais a vida quiser jogar em seu
caminho.
Murmuro um som evasivo, me perguntando o que isso significa.
Não pode haver mais nada que a vida possa lançar em Easton
que possa chocá-lo mais do que esse ano já chocou.
SCOUT

— DESCULPA NOVAMENTE.
— Não precisa se desculpar.
Eu desvio o olhar de meu iPad, na cama, e encaro Easton. Ele
acabou de sair do banho, calças de pijama muito baixas em seus
quadris — tão baixas, que deveria ser ilegal — e o cabelo ainda
molhado.
Definitivamente não se desculpe se esta é a visão que recebo
como um prêmio de consolação.
— Sou eu que devo pedir desculpas. Eu sei que isso tem sido
difícil para você, tudo isso, mas até eu ouvir vocês três conversando
esta noite, não acho que tenha entendido exatamente quão difícil. —
Franzo o rosto porque sei que parece estúpido. — Quer dizer, é
claro que entendi, mas depois de ouvir Derek descrever as lesões e
a recuperação, continuei pensando em você e em como deve se
sentir passando por isso uma segunda vez em menos de um ano.
Deve ser enlouquecedor.
— Isso é pouco — Easton diz e torce os lábios enquanto pensa.
— Mas desta vez é diferente. Não me sinto tão isolado como da
primeira vez.
— Por quê? — Eu achei que seria exatamente o oposto. A
temporada mudou. As equipes seguiram em frente. A pós-
temporada está logo ali.
E Easton basicamente perdeu tudo isso.
— É claro que me sinto deixado de lado. É como se eu estivesse
com as crianças populares e então, de repente, fosse deixado de
fora de tudo, olhando para uma vida que costumava viver.
— Mas você estará de volta na próxima temporada.
Easton encolhe os ombros.
— Esperançosamente. Mas, como eu disse, é diferente desta
vez.
— Por quê?
— Porque eu tenho você. — As palavras fazem meu coração
perder uma batida, a naturalidade com que Easton diz me faz
derreter de uma forma que nunca imaginei ser possível.
Eu fico olhando para Easton, nossos olhos se fixam um nos
outros, e eu gaguejo quando tento responder corretamente a um
comentário como esse, tentando não soar como uma idiota, porque
é assim que me sinto agora. Ele já tinha dito que me ama — e nada
pode tirar o que essas palavras significam — e ainda assim, por
algum motivo, essas palavras simbolizam mais para mim. Talvez
seja a situação, talvez o momento, mas independentemente de
tudo, não acho que já o amei mais do que agora.
— Obrigada — eu finalmente respondo, tocada além das
palavras.
— Não precisa me agradecer se é verdade. — Esse sorriso
presunçoso está de volta. — Me conta, o que mais você descobriu
esta noite?
— O quanto você realmente ama esse jogo.
Easton franze as sobrancelhas e ri.
— Eu pensei que você já soubesse disso.
— Eu sabia… Mas esta noite. Eu não sei, ouvindo você falar…
Eu podia ouvir na sua voz. Na sua risada. Seu amor por todas as
coisas do beisebol estava mais do que óbvio.
— Nós conversamos sobre beisebol o tempo todo. — Easton
encolhe os ombros.
— Verdade, mas não desse jeito. — Eu balanço a cabeça e olho
para fora da janela por um momento antes de olhar de volta para
ele. — Sua voz, nessa noite, a paixão pelo jogo estava presente…
Você demonstrou o mesmo carinho naquela noite na cabine de
transmissão antes de tudo mais acontecer.
— Hum. — Ele dá alguns passos e para na minha frente, com as
mãos nos quadris e olhos nos meus. — Não me lembro da última
vez que meu pai parou apenas para conversar. Não houve crítica.
Questionamentos. E, bem, Derek. Há muito o que aprender com a
experiência dele. Então muito que posso aprender com ele.
Eu sorrio.
— Só você para pegar uma conversa simples e transformá-la em
uma chance de se tornar um jogador melhor.
— O minuto em que você se contenta é o minuto em que perde a
vantagem.
— Isso se aplica a todas as coisas, sr. Wylder? — Meu tom é
sugestivo, meu sorriso, tímido. Easton observa meu dedo trilhando o
interior da minha coxa.
Sua língua escapa para molhar o lábio inferior.
— Você está me dizendo que estou perdendo minha vantagem,
Kitty?
— Mmm. — Eu olho para baixo, para onde seu pau está
endurecendo contra o tecido solto da calça antes de passar os olhos
por seu corpo de dar água na boca. A vista nunca me cansa.
Quando encontro a diversão em seus olhos, preciso de todo meu
esforço para bancar a sedutora quando minha paciência é quase
inexistente. — Não tenho certeza. Eu posso precisar que você
demonstre seu conjunto de habilidades para que eu possa julgar por
mim mesma.
— Eu tenho um conjunto de habilidades muito bom.
— Isso ainda precisa ser analisado, sr. Wylder.
Sua risada desliza sobre minha pele e me faz pensar em como
sua língua me faz sentir quando faz exatamente a mesma coisa. Ele
dá outro passo para frente e sem aviso deixa cair as calças no chão.
O pau dele ganha vida, e vê-lo — e ter o conhecimento do que ele
pode fazer em mim — causa arrepios na minha pele.
— Mostre seus seios, Kitty. — Sua voz é como um afrodisíaco.
Eu propositadamente faço um show ao morder meu lábio inferior
enquanto alcanço a bainha da camisa e a tirar por cima. O gemido
dele é tudo que preciso ouvir para saber que ele aprecia o fato de
eu estar sem sutiã e minha calcinha não ser nada além de tiras
segurando um pedaço de renda no lugar.
— Isso aí deveria ser ilegal — diz ele.
— Eu? — eu pergunto, fingindo inocência enquanto abro mais as
pernas. — Ou minha calcinha?
— Tudo isso — ele murmura enquanto caminha entre elas e
passa um dedo muito suavemente sobre o calor do meu sexo.
Meu suspiro é audível, a sensação de seu toque viciante quando
olho para ele.
— Você está querendo ser preso, então?
— Qualquer homem que se preze não hesitaria em ser preso se
significa que ele poderia provar você.
— Devo levar isso como um aviso, então? — Eu gemo quando
ele desliza um dedo por baixo da minha calcinha e para cima e para
baixo na minha fenda antes de entrar.
— Você pode levar da maneira que quiser, desde que você
entenda que quando digo qualquer homem, quero dizer eu. — Ele
adiciona outro dedo e os usa em mim, movendo-os e, em seguida,
deslizando-os novamente para fora. Ele pega minha excitação e a
esfrega ao longo de todo o comprimento do seu pênis antes de se
acariciar. — Só eu.
Deus, ele é sexy. Sua cabeça está jogada para trás, seu bíceps
saliente enquanto ele bombeia sua mão sobre seu eixo e geme de
prazer.
— Ei, Easton. Você precisa me foder para me mostrar seu
conjunto de habilidades. Não sua mão.
E tão rápido quanto digo, ele agarra meus tornozelos, me puxa
em direção a ele, e então faz algum movimento complicado onde ele
me vira de barriga para baixo na beira da cama antes que eu possa
gritar de surpresa. É só quando a palma da sua mão pousa
firmemente na minha bunda que faço um som. E desta vez é um
grito quando a emoção de prazer versus dor corre pelo meu sangue
e incendeia cada parte de mim.
Sua mão se fecha em meu cabelo enquanto a barba por fazer
em seu queixo passa por cima do meu ombro.
— Você quer ser fodida?
— Deus, sim. — Minha resposta é um apelo sem fôlego. Este
lado dominante dele é tão diferente do que estou acostumada. É tão
quente.
Ele esfrega a cabeça de seu pênis para cima e para baixo em
minha fenda e eu me aperto para que ele saiba o quanto eu o quero.
E oh, como eu quero.
Sua risada é profunda e ressoa pelo quarto antes de se
transformar num gemido de contenção enquanto ele lentamente
entra em mim.
— Tudo bem? — ele murmura, calor na minha orelha, uma vez
que ele está todo dentro de mim.
— Aham.
Essa risada novamente.
— Bom, porque é a última vez que vou perguntar. Não estou no
clima para uma noite suave e lenta, Scout. Eu quero você. Simples
assim. E eu vou pegar você. Você entendeu?
Eu esfrego minha bunda contra ele em resposta e
conscientemente acendo um fogo que queima todo seu controle.
E quando ele se move, não há nada de gentil nisso. Ele define
um ritmo acelerado que eu não consigo acompanhar, mesmo se eu
quisesse. Estou tão perdida na felicidade de ter seu pênis e sentir o
que ele faz comigo, que é preciso todo o meu esforço para evitar
que minhas pernas se transformem em gelatina.
Graças a Deus estou deitada, ou eu entraria em colapso.
Ele me leva ao meu clímax e, em vez de se retirar —
desacelerando para que eu possa surfar nas ondas suaves —,
continua, mantém o movimento, então antes que eu perceba, já
estou preparada para outro orgasmo.
Eu deslizo meus dedos entre minhas pernas e esfrego o clitóris
para me ajudar a gozar. Eu sei que ele está perto também. Ele tira a
mão do meu cabelo e a leva ao meu ombro para me segurar no
lugar enquanto mete por trás.
Ele promove um ataque total aos meus sentidos.
O som de seu gemido. O barulho da pele contra pele. Meus
choramingos de prazer. É tão bom, que beira a dor.
A sensação de seu pênis. Sua cabeça desliza sobre todos os
pontos certos dentro de mim. O aperto possessivo de sua mão. O
cheiro de seu shampoo. O cheiro de sexo. Isso me cerca.
Me consome.
Meu nome é repetido a cada investida sua. Cada vez soando
mais tenso, mais como se seu controle estivesse prestes a se
romper.
E quando isso acontecer, estarei pronta. Pronta para ele. Ele
move os quadris, e seus dedos marcam minha pele com seu aperto.
— Jesus Cristo — diz ele enquanto se inclina para frente e deita
o peito em cima das minhas costas, seu queixo no meu ombro, sua
boca perto da minha orelha. — Scout… Você… Droga… — Ele
ofega e dá um beijo na minha nuca.
— Mmm. — Eu me deleito com o calor de seu corpo e a
sensação de sua pele na minha.
— Viu? Mesmo com apenas um braço bom, eu não perdi minha
vantagem — ele diz com uma risada, uma vez que recupera o
fôlego.
— Um conjunto de habilidades como esse tem que ser ilegal —
provoco.
— Bem, se vamos para a cadeia, podemos muito bem infringir a
lei de novo e de novo, para que possamos garantir nosso lugar.
— Isso significa que da próxima vez usaremos algemas?
— Gosto da maneira como você pensa, Kitty. — Eu grito quando
ele se endireita e bate na minha bunda. — Trabalho em equipe na
sua melhor forma.
SCOUT

EU OLHO O MEU APARTAMENTO UMA ÚLTIMA VEZ.


Nada aqui faz com que eu me sinta em casa. A cama. O sofá.
Nem mesmo o armário do banheiro.
Não da maneira que a casa de Easton faz.
Então chegou a hora.
Para me afastar disso — um ambiente formal onde nunca
realmente me senti confortável — e pular de cabeça no que vem a
seguir.
Oficialmente morar juntos.
Eu rio. Não é como se Easton e eu ainda não estivéssemos
fazendo isso, mas esta próxima etapa tornará tudo oficial.
Eu vim para Austin — para este apartamento mobiliado — e não
pretendia fazer mais nada além de cumprir os desejos do meu pai
antes de seguir para a próxima cidade.
O próximo clube. Para continuar vivendo a vida transitória a qual
me acostumei.
Eu olho para última caixa que tenho de levar para meu carro.
Não há nada de importante aqui. Sem lembranças que me segurem.
Sem memórias para recordar de uma ocasião especial. Tudo o que
tenho de significativo já está na casa de Easton ou na de meu pai.
É engraçado como me mudei para cá, há seis meses, contente
com a minha vida. Com as viagens constantes. Com falta de rotina e
permanência. E agora tudo em que consigo pensar é em ficar em
Austin por um longo tempo. Vencendo a batalha com o contrato com
os Aces para satisfazer o desejo final do meu pai, e, enquanto isso
for possível, ficar no único lugar além da minha casa de infância em
que eu realmente senti como se fosse um lar: a casa de Easton.
Demoro um segundo para remover minha chave do meu
chaveiro antes de colocá-la no balcão da cozinha e ir em direção à
porta.
Eu vim aqui isolada do mundo, e vou sair aberta para as
possibilidades do futuro.
Eu dou uma última olhada ao redor. Dou um adeus indiferente à
vida de solteira antes de fechar voluntariamente a porta.
Estou abrindo uma porta diferente agora. Uma para uma nova
vida.
Para chances.
Para possibilidades.
Para Easton.
EASTON

— E AÍ, O QUE ME DIZ, DOUTOR? — MEUS NERVOS ESTÃO ME VENCENDO


Dr. Kimble continua a mexer no meu ombro sem falar nada.
Os pequenos barulhos que ele faz para si mesmo enquanto
move meu braço para lá e para cá apenas aumentam o grau da
minha ansiedade.
Depois que seu exame termina, ele se senta à minha frente. E
sinto de repente vontade de vomitar. Um médico sentando à sua
frente nunca é coisa boa. Essa necessidade de ficar ao nível dos
olhos para dar as más notícias é pura besteira.
— Não tenho certeza, Easton.
— O que isso significa? — Meu coração parece que vai pular
para fora do meu peito.
— Está curando como eu esperava em relação à quantidade de
dias que você fez a cirurgia… Mas eu seria negligente se não
dissesse que seu ombro sofreu danos significativos.
— Achei que você tivesse consertado tudo durante a cirurgia.
— Sim, mas às vezes o que acontece na cirurgia nem sempre é
como o corpo quer se curar.
Há um zumbido em meus ouvidos. Eu fico tonto.
— O que você está dizendo, doutor?
— Estou dizendo que o reparo está feito, Easton. Estou dizendo
que com a reabilitação adequada, você poderia se apresentar ao
treinamento de primavera do próximo ano e se manter sozinho. Mas
a cada bola que joga, você corre o risco de obter danos
permanentes.
— Eu não…
— Deixe-me terminar. — Eu assinto e tento engolir o que parece
ser uma bola de beisebol que se alojou na minha garganta. — Como
eu disse, você pode voltar. Você pode ter uma temporada de
arrasar… Mas a questão é quanto tempo mais seu ombro vai
resistir? Você precisa pensar a longo prazo aqui sobre sua saúde e
sua vida.
— Beisebol é a minha vida. — Eu posso ouvir o desespero em
minha voz.
Ele acena com a cabeça e a deliberação disso me diz que é um
movimento praticado. Paciência.
— Eu entendo isso, filho. Mas você precisa pensar daqui a dez
anos, talvez. Você terá trinta e poucos anos. Você precisa se
perguntar agora se você está bem com a ideia de viver com um
braço que não corresponde às suas expectativas. Abraçar sua
esposa. Brincar com seus filhos. Carregar as compras. Isso significa
ter que lidar com um ombro permanentemente danificado por uns
bons quarenta anos.
— Que palhaçada. — Eu rejeito suas palavras imediatamente e
afasto a mesa de instrumentos médicos e caminho de um lado para
o outro da sala muito pequena e, em seguida, volto. — Você está
dizendo isso para me assustar. Para ter certeza de que eu serei
cuidadoso. Eu me sinto igual quando fiz a primeira cirurgia.
— E olhe o que aconteceu depois disso.
— Vai ficar tudo bem. — Precisa ficar. E mesmo que eu diga
essas palavras, a quebra da minha voz trai a convicção em meu
tom.
— Não estou tentando assustar você. Estou te avisando das
verdadeiras ramificações de um ombro que foi ferido duas vezes.
— Mas não é definitivo.
— Não. — Ele mastiga as palavras. — Mas é meu trabalho
avisar você das possibilidades já que você joga em uma posição
que usa mais seu braço do que qualquer outra pessoa em campo.
Você joga um jogo completo. Joga a bola de volta após cada
arremesso e mesmo que os arremessadores mudem, três,
possivelmente quatro vezes por jogo, você permanece atrás da
base. Seu ombro carrega mais peso do que qualquer outro jogador
lá fora.
— E se eu não pegar mais? — O simples pensamento causa um
pânico que quase fecha minha garganta. É a única posição em que
joguei. É a minha posição. É aquela que controla o jogo. — E se eu
jogasse como primeira base para que não tivesse que me mover
tanto?
— Isso seria com você. — Seu tom apaziguador tem o mesmo
som que unhas em um quadro negro. Quero tapar meus ouvidos e
impedi-lo de continuar falando.
— Eu ainda poderia jogar por dez anos e meu braço poderia ficar
perfeitamente bem.
— Sim, e isso possivelmente poderia acontecer. — Seus olhos
dizem muito mais do que sua boca, no entanto.
— Então por que você está me dizendo isso?
— Porque é meu trabalho dizer a verdade.
Eu fico olhando para ele enquanto a descrença e a raiva batem
dentro de mim enquanto eu rejeito cada coisa que ele está me
dizendo.
— Foda-se, doutor. Vou jogar. Eu não nadei tanto para voltar,
com unhas e dentes, fazendo duas cirurgias no ombro, para apenas
morrer na praia.
— Ok. — Ele estica a palavra, o que serve apenas para me irritar
mais. — Você tem muito em que pensar durante os próximos
meses.
— Terminamos aqui?
— Pelo visto.

Foda-se isso.
Foda-se o médico.
Vou jogar. Nenhum médico vai me dizer como meu braço deve
ficar quando fui eu quem jogou com ele durante toda a minha vida.
Eu conheço meu corpo melhor do que ninguém. Eu sou o melhor
juiz para saber se posso ou não continuar jogando.
Mas a cada passo, cada esquina que viro enquanto caminho pela
cidade para clarear minha cabeça, a raiva se transforma em
descrença.
Chego ao complexo esportivo, os campos da liga infantil ao meu
redor.
Equipes de todas as idades estão treinando no calor da tarde.
Ouve-se o tilintar do bastão de alumínio. O riso das crianças. As
instruções e reprimendas dos treinadores.
A descrença começa a se transformar em compreensão.
E eu não quero isso.
Meus pés diminuem a velocidade, e começo a observar os
arredores. Eu tenho estado aqui dezenas de vezes. Eu me sentei na
minha colina gramada no campo esquerdo e assisti a jogos e treinos
enquanto limpava a cabeça, mas, pela primeira vez, eu realmente
presto atenção.
À minha esquerda, um pai faz algum tipo de dança boba para
fazer sua filha rir antes de jogar a bola para ela. Ela erra a rebatida,
se confunde um pouco depois e então, quando joga a bola de volta,
a envia para longe dele. Mas enquanto ele corre atrás da bola, diz
um monte de elogios. Quão forte está o braço dela. Como ela será
uma grande jogadora da terceira base algum dia com esse tipo de
força.
Não há pressão. Sem expectativas para cumprir. Apenas um pai
e uma filha jogando bola. Criando um vínculo. Passando tempo
juntos.
À minha direita está um time de meninos mais velhos, do ensino
fundamental. Três pais estão coordenando a prática. Suas
instruções são um pouco mais duras do que as do pai com sua filha,
mas cada palavra é positiva. Eu continuo a observá-los enquanto
eles praticam as jogadas em duplas. De novo e de novo.
Meus pés pararam de se mover. Eu não quero sentar no campo
externo hoje. Eu quero sentar bem aqui, no meio disso. Coisas que
não lembro de ter experimentado com meu pai, mas sei que quero
experimentar com meus filhos algum dia.
Meus filhos?
O que diabos estou pensando? Eu nunca quis filhos.
Você nunca quis Scout também.
Mas quanto mais eu fico no ponto central dos quatro campos ao
meu redor, mais eu percebo que há vida depois do beisebol.
Há coisas que quero ser capaz de fazer.
É o começo do último tempo.
— Você tem uma grande decisão a tomar nos próximos meses,
sr. Wylder.
Contagem cheia.
Eu quero arriscar?
Bases com seus jogadores prontos.
Ou quero um futuro em que possa participar plenamente? Jogar
meus filhos para o ar. Fazer amor com minha esposa em qualquer
posição que eu quiser, com dois braços saudáveis. Trabalhar no
jardim. Jogar bola com meu filho. Ou filha.
O arremesso é feito.
Eu olho para tudo ao meu redor. Tantas coisas fora de foco antes
e que agora estão ficando claras para caralho.
O que você vai fazer, Easton?
Estou me cagando de medo. Tenho meses para decidir. Nada é
concreto. O amor da minha vida pode ter mudado de um esporte
para uma possibilidade.
Strikeout?
Estou sendo medroso?
Ou jogar para a grade?
Então, novamente, eu posso não ser nada disso.
E acertar um home run.
Eu puxo meu boné para baixo e olho em volta novamente.
Absorvo tudo. A amargura que senti antes no consultório do dr.
Kimble ainda está aqui. A sensação de pânico fazendo cócegas
constantemente na parte de trás do meu pescoço.
Pego meu telefone e fico olhando para ele por alguns minutos,
morrendo de medo de fazer essa ligação.
Eu clico no botão para fazer a chamada.
SCOUT

— EASTON. O QUE VOCÊ ESTÁ FAZENDO AQUI?


Eu dobro o arquivo de Adler — um joelho estourado — e estou
surpresa ao ver Easton aqui, no vestiário, quando pensei que ele
nunca pisaria nesse lugar novamente.
— Eu queria levar minha namorada para almoçar.
Eu olho para ele com desconfiança, porque isso não soa como o
homem que eu conheço.
— Isso é o disfarce de alguma pegadinha que você está
armando para um dos caras quando eles chegarem de viagem?
— Quem, eu? — Ele pisca inocentemente, e ainda há aquele
menino travesso por baixo de tudo, em quem eu não confio, mas
amo saber que ele ainda está lá. — Sério, eu sei que você já
terminou com as sessões de hoje, acabei de falar com Adler quando
ele estava saindo, então vamos lá. Vamos almoçar.
— Para onde raios você está me levando? — Eu bebo meu
milkshake de chocolate enquanto ele balança nossas mãos unidas.
O sol está brilhando, a umidade não está muito ruim e eu estou de
barriga cheia com todos os tipos de junk food que Easton insistiu
que comêssemos.
— Então você é o tipo de garota que precisa de pistas, hein?
Você simplesmente não pode ir direto para uma surpresa, você tem
que se preparar para isso?
— Não há nada de errado com isso. Você fala como se fosse
uma coisa ruim.
— Não é esse o objetivo de uma surpresa? O fato de não saber
o que vai acontecer? — Ele pergunta e se inclina e beija minha
têmpora.
— Sim, mas você me disse que havia uma, então agora eu sei
que vai acontecer alguma coisa. — Eu rio. Essa linha de conversa é
ridícula e divertida.
— E se eu te dissesse que não precisa mais esperar por nada
porque já chegamos?
Assustada, eu olho para a vegetação exuberante ao nosso redor
e vejo fileiras de paredes de blocos de concreto cobertas de
pichações. Desenhos bonitos, artísticos, mesmo assim grafites.
— É estranhamente bonito — eu digo enquanto me movo em
direção aos murais. Os desenhos são incríveis e profundos em toda
a sua singularidade colorida. Enquanto eu caminho por eles, não
consigo resistir e estendo a mão para tocar alguns e, em seguida,
recuar, tentando descobrir o que os outros querem dizer.
Easton me segue, e sua observação silenciosa me deixa
nervosa.
— Chamava-se HOPE Outdoor Gallery.
— HOPE?
— “Helping Other People Everywhere”, ou seja, “ajudando outras
pessoas em todos os lugares”.
— Mas são grafites. Como isso ajuda as pessoas?
— Começou como um movimento para aumentar a consciência
acerca de questões sociais. Na verdade, é apenas um grupo de
artistas e músicos que se reúnem para serem ativos e doar seus
rendimentos para certas causas. — Eu ando alguns metros
enquanto reflito sobre sua explicação, mas não entendo o que isso
tem a ver com essas paredes cobertas de tinta. Ele deve ter lido
minha expressão, porque começa a explicar. — Estes são murais
feitos por alguns dos artistas. Todos eles lidam com diferentes
questões às quais se identificam mais.
— Eles são fascinantes.
— Você está pronta para adicionar sua marca a um deles?
— O quê? — Eu viro minha cabeça em direção a ele, olhos
estreitos e nariz repuxado.
— Temos uma pequena seção aqui que é nossa, podemos fazer
o que quisermos.
Ele começa a caminhar até os fundos de uma parede.
— Mas, espera… como…? Eu não sei pintar merda nenhuma.
Sua risada ressoa e ecoa nas paredes ao nosso redor.
— É arte. Não é para ser subjetivo?
— Subjetivo é o cacete.. — Eu fico com as mãos nos quadris,
tentando descobrir o que fazer. — Mas eu não entendo…
— Fiz um evento com o fundador há alguns anos. Eu pensei que
aqui era um lugar muito legal, e desde então tenho sido um
colaborador silencioso de algumas causas. Então, por isso, tenho
uma pequena seção que posso usar. Na parte de trás de uma
parede. Na esquina…
— Para que ninguém veja — eu termino por ele com uma risada.
— Exatamente. Portanto, não importa quão horrível fique, o que
importa é que a gente faça algo — diz ele enquanto pega um balde
cheio de tinta em spray que parece se materializar do nada.
— Eles sabiam que estávamos chegando. — Ele pisca, mas eu
apenas balanço a cabeça e mantenho minha posição.
Eu olho para as muitas paredes ao meu redor. Eu admiro sua
beleza e criatividade e sinto que poderia estudá-las por horas e
ainda não decifrar todos os seus significados ocultos. E quando eu
olho de volta para Easton, tudo sobre ele chama minha atenção. Ele
fica de pé na grama alta em meio a paredes pintadas em todas as
cores imagináveis, e no entanto, é seu verdadeiro eu que brilha
mais intensamente, aqui e ali, e rouba cada droga de pedaço do
meu coração.
Ele abre aquele sorriso torto enquanto segura uma lata de tinta
para mim.
— Vamos lá, Scout, você sabe que quer experimentar.
— Sim — digo, os dedos coçando. — Mas minhas habilidades
estão em falta no departamento criativo.
— Estamos de novo testando habilidades, é?
Eu rolo meus olhos e pego a lata dele.
— Então podemos pintar o que quisermos?
— Qualquer coisa.
— Desafio aceito.

— Está horrível. — Minhas bochechas doem de tanto rir, e meus


dedos estão com cãibras e cobertos de uma infinidade de tintas
coloridas.
— Horrível ainda é bom demais para isso.
— Ei, isso não é legal. — Eu bato nele, mas ele agarra minha
mão e me puxa contra si. Seus lábios estão nos meus sem
hesitação. A brisa sopra ao nosso redor. A grama faz cócegas em
minhas pernas nuas. Sentimos o cheiro distinto da tinta. Mas o
gosto de seu beijo é a cereja no topo deste dia perfeito.
— Isso é legal o suficiente? — ele pergunta quando termina o
beijo.
— Com certeza. Eu gosto de legal. Talvez possamos ser ainda
mais legais mais tarde.
Ele revira os olhos e balança a cabeça.
— Pervertida.
— E qual é o problema? — eu pergunto timidamente.
— Nenhum. Você é perfeita como é. — Seu sorriso é imenso, e
seus olhos deixam os meus enquanto focam em nosso grafite
combinado. — Assim como nossa arte.
Eu me viro para encarar nossa parede. É bruto, na melhor das
hipóteses, em comparação com os outros murais encharcados de
habilidade ao nosso redor, mas é totalmente a nossa cara.
“Arrebenta” está escrito no topo da parede. Gotas de tinta onde
segurei a lata muito perto escorrem das letras. Há um livro aberto na
parede. Uma página cheia de letras indo para várias direções. A
outra página está preenchida com a foto de um campo de beisebol.
Há uma horrível mancha marrom que foi a tentativa de Easton de
fazer um biscoito da sorte. Só de olhar para ele, eu sorrio pensando
no quanto nós rimos enquanto tentávamos fazer com que parecesse
melhor, mas deu o efeito contrário. O mesmo acontece com minha
tentativa de desenhar um cachorro. Pelo menos as orelhas e a
cauda são reconhecíveis. Então há uma pintura grosseira de um
gatinho em um canto com o número quarenta e quatro como nossa
assinatura.
É horrível na melhor das hipóteses, mas cada coisa nele — tudo,
até os círculos que supostamente são pastilhas de menta —
refletem algo significativo para nós.
Eu estendo a mão e enlaço meus dedos com os dele, muito grata
por essa mudança de ritmo e por esse lembrete do que realmente é
importante.
— Obrigada por me trazer aqui.
— De nada. — Ele me encara por um momento antes de olhar
de volta para a parede, hesitando em dizer as palavras que vejo que
estão em seus lábios. — Eu liguei para Finn mais cedo.
— Ok. — Eu alongo a palavra. Ele sempre liga para Finn. Qual é
a grande coisa nisso?
— Pedi a ele que me conseguisse uma segunda chance na
transmissão da World Series.
— Você o quê? — Assustada, me viro para olhar para ele, mas
ele continua olhando para o desenho à nossa frente. Eu aperto seus
dedos para que ele saiba que entendo como isso é assustador para
ele. Como ele está se abrindo para tudo que ele teme… E fazendo
isso publicamente. — Estou orgulhosa de você, Easton.
SCOUT

— OS CARAS ESTÃO NA PRIMEIRA E NA TERCEIRA BASES — EASTON MUR


mesmo enquanto olha para fora da janela em direção ao estádio. As
luzes iluminam o céu, quase como se o fato de os Aces terem
chegado aos playoffs trouxesse vida à cidade.
Eu olho para a TV, vejo que Easton está certo, e sei que Tino é o
mais rápido da equipe. Uma bola longa, e ele pode marcar para dar
aos Aces a liderança nesse jogo sem pontos.
— Ainda podemos descer e assistir ao jogo, você sabe — digo,
checando meu celular para ter certeza de que não recebi nenhuma
mensagem da equipe. Depois de trabalhar sem parar nos últimos
oito dias, decidi deixar Scott assumir a liderança esta noite para que
eu pudesse respirar antes da loucura dos Aces indo para a World
Series, que é o que parece que vai acontecer.
— Eu sei, mas preciso acertar isso — diz ele ao sair da janela e
se sentar à mesa atulhada de papéis. Papéis esses que Finn
conseguiu obter da Fox antes da transmissão, para que Easton
pudesse estudá-los. As informações de patrocínio. Os comentários
ensaiados. Qualquer coisa que precise ser lida em um teleprompter.
— Eu só estava dando um tempo. Meus olhos ardem de olhar para
isso por tanto tempo.
Ele olha para a TV quando J.P. está fora, e eu sei que ele daria
qualquer coisa para estar jogando agora. Para fazer parte de seu
antigo time e conquistar o título da Liga Nacional com eles.
E talvez seja por isso que ele não queira estar lá embaixo no
estádio. Já é algo difícil de engolir estando aqui, mas quando a vista
e os cheiros de tudo o cercam, isso torna sua realidade ainda mais
difícil de aceitar.
— Você e Helen trabalharam nisso sem parar durante toda a
semana. Eu sei que você tem tudo sob controle, mas se você quiser
repassar mais uma vez, ficaria mais do que feliz em ajudar.
Ele inclina a cabeça para o lado e me encara. Ele parece
cansado — seus olhos estão vermelhos e injetados, seu cabelo está
todo bagunçado, sua camisa favorita já viu dias melhores —, mas
estou tão orgulhosa dele por quão duro ele está se esforçando. Por
estudar até cansar e conquistar seus medos e demônios.
— O quê? — eu pergunto, incapaz de ler o que ele está dizendo
em seu olhar.
— E se eu não puder mais jogar?
Bem, não era isso que eu esperava, então demoro alguns
segundos para tirar o olhar surpreso do meu rosto e respondê-lo.
— Então você não pode mais jogar beisebol.
— Te incomodaria se eu não pudesse?
— Que tipo de pergunta é essa? — O que ele quer dizer com
isso?
— Você está obviamente atraída por esse lado meu, o físico, o
competitivo, tudo sobre o jogo, então, se eu não estivesse mais
jogando, isso mudaria as coisas entre nós?
Encontro seus olhos e meu coração se parte pela incerteza que
vejo neles.
— Easton, eu te amo por você. Claro que todas essas coisas
fazem parte de você, mas para mim, há muito mais que compõe o
valor de um homem. Mais do que tudo, ficaria triste vendo você se
despedir de algo que você ama. Mas não querer mais você? — eu
pergunto enquanto me levanto e dou a volta na mesa, coloco meus
quadris na borda para que eu possa olhar para ele. — Nem fodendo
que isso ia acontecer.
Aquele sorriso tímido se abre em seu rosto e ilumina seus olhos
enquanto eles vagueiam por todo o meu corpo. Minha blusa fina não
esconde muito, e meu short de pijama não cobre muito mais.
— Obrigado por acreditar em mim.
— Não há necessidade de agradecer — eu digo enquanto ele
olha para cima de onde meus mamilos estão duros sob a minha
blusa e molha seu lábio inferior. — Você quer repassar mais uma
vez? — eu pergunto, tentando distraí-lo, sem entusiasmo, do que
seus olhos me dizem que ele realmente quer.
— Eu já te disse que sempre tive uma fantasia com professoras?
— ele pergunta enquanto puxa a camisa pela cabeça, tomando
cuidado com o ombro, e a joga para o lado.
— É mesmo?
— Ah, sim. Seus cabelos presos, todo arrumadas e apropriadas.
As saias lápis e blusas abotoadas que eu olhava fixamente e
imaginava o que estaria por baixo caso um desses botões se
abrisse quando ela se curvasse sobre a mesa na minha frente.
— Tesão por professora, hein?
— Seu cabelo está preso — ele murmura enquanto usa o braço
bom para deslizar minha bunda em direção a ele, então agora estou
empoleirada na mesa diretamente na sua frente. — E eu poderia
fingir que sua blusa tem botões.
— Você poderia, não é? — Minha risada enche a sala acima do
rugido baixo da multidão flutuando até o nosso apartamento vindo lá
de baixo do estádio.
— Com certeza.
— Mas eu não estou usando saia.
— Uma vez que eu a tirar de você, realmente importa o que você
estava vestindo?
— Bom ponto. — Eu sigo suas mãos enquanto elas deslizam
lentamente dos meus joelhos até as coxas. — Mas eu não te ensinei
nada.
É sua vez de rir.
— Não se preocupe, acho que vou deixar você me ensinar agora
mesmo.
Eu me inclino para frente e pressiono meus lábios nos dele,
encorajando seus dedos a fazer seu caminho por baixo do meu
short.
Nós fazemos amor.
Sob as luzes do estádio que ele jogou durante toda a sua
carreira.
Com o rugido da multidão lembrando-o do jogo que deveria estar
jogando.
Sob os holofotes que ele viveu toda a sua vida.
Nós criamos algo que é exclusivamente nosso.
Nossa própria magia.
SCOUT

AS PALAVRAS DE BOSEMAN RESSOAM NOS MEUS OUVIDOS.


— Contrato probatório é o cacete. Os caras te respeitam. Seu
trabalho fala por si. Você é um ótimo ajuste para o clube. Eu vou ter
o contrato com a equipe para a próxima temporada pronto amanhã
de manhã. Isso se você ainda quiser o trabalho com os Aces depois
da besteira que Tillman fez você passar.
Eu consegui o contrato.
Eu quero gritar enquanto ando pelos túneis do vestiário. Deixar o
som ricochetear nas paredes de concreto e ecoar por todo o
caminho até meu pai, para que ele saiba que eu consegui. Eu
realizei seu último desejo. Doc Dalton foi oficialmente contratado por
todos os clubes nas ligas principais.
Meu coração está acelerado e minha pulsação bate nos ouvidos
enquanto desço pelos corredores, tênis rangendo sobre o concreto,
para o meu escritório. Ainda é cedo e não temos hora marcada para
embarcar em nosso voo para Los Angeles para o primeiro jogo da
World Series até amanhã de manhã. Isso significa que tenho um dia
de folga.
Um dia com Easton. Minha calma em meio a essa loucura.
E o mais importante, significa que tenho tempo para ir à casa do
meu pai e contar a ele as boas novas pessoalmente.
No alto da minha animação, digo “oi” para alguns caras que
vieram para treinar ou praticar com algum treinador em algo que
estão tendo alguma dificuldade — seu arremesso, o backhand, você
escolhe, mas estou alheia à maioria deles como se um dos pesos
que esteve em meus ombros por sei lá quanto tempo tivesse sido
retirado.
Continuo alheia até que viro uma esquina e dou de cara em uma
conversa que eu não deveria ter ouvido.
— Um Wylder é um Wylder, certo? Eu me fodi longe disso minha
vida in… — Santiago para de falar no minuto em que me vê.
Cal vira a cabeça na minha direção, seu rosto empalidecendo
quando eu começo a recuar.
E quando bato em uma parede atrás de mim, me viro apesar dos
protestos de Cal e corro para a saída.
Não posso ter ouvido o que pensei ter ouvido.
Não pode ser verdade.
De jeito nenhum.
Minhas mãos estão tremendo e o coração batendo forte, mas
desta vez não tem nada a ver com ganhar o contrato. Não. É por
causa de algo que eu gostaria de nunca ter ouvido.
— Scout, espere. Não é o que você pensa.
Mas continuo correndo até chegar às portas que se abrem para o
estacionamento. Quando eu as abro, a luz do sol me cega
momentaneamente antes que eu veja Easton. Ele está encostado
em sua caminhonete, presumidamente esperando que eu lhe dê as
boas notícias sobre o contrato. O enorme sorriso em seu rosto
lentamente some em preocupação quando ele me vê aqui fora, sem
fôlego e um pouco agitada.
— Scout? O que aconteceu? Você está bem?
Eu luto com as palavras enquanto as portas se abrem atrás de
mim e Cal surge.
— Pai? — Easton dá alguns passos para frente, os olhos se
voltando para mim e para Cal e depois para mim de novo. — O que
está acontecendo?
É hora de lutar ou fugir, Scout. Diga a ele a verdade e descarrilhe
sua transmissão ou cale a boca e diga a ele depois.
O que. Você. Faria. Scout?
Nada de bom jamais saiu de uma mentira, menina Scouty. Eu
ouço a voz do meu pai dizendo isso, mas Easton está na minha
frente e Cal atrás de mim, ambos esperando minha resposta.
— Nada. Eu estou bem — eu digo enquanto respiro fundo. — Eu
consegui o contrato.
— Você conseguiu! — ele grita enquanto me puxa para um
abraço e me aperta firmemente contra ele.
Eu sei que Cal está assistindo. Esperando. Mas me recuso a
olhar para ele.
Recuso-me a reconhecer que menti por ele.
Porque eu só fiz isso por causa do filho dele.
Alguém tem que protegê-lo, e com certeza não vai ser Cal.
SCOUT

A CULPA É UMA FILHA DA PUTA CRUEL.


Especialmente quando é culpa por ter mentido para o homem
sentado ao seu lado.
Eu tento raciocinar sobre o que eu ouvi. Eu tento mentir para
mim mesma dizendo que realmente não ouvi o que eles disseram.
Eu me convenço de que eu entendi mal o significado daquilo tudo. E
ainda assim, quando eu penso sobre tudo — as várias vezes em
que vi Santiago, o inimigo de Easton, com Cal, pai de Easton — dois
mais dois são definitivamente quatro.
Então tudo faz sentido — o aviso de Cal na noite em que Derek
veio — quando ele me agradeceu por apoiar Easton em sua
reabilitação física e tudo mais que a vida jogasse em seu caminho.
Ele estava me dizendo que a merda ia bater no ventilador? Ele
estava me avisando?
Eu olho para Easton, e ele aperta meu joelho. Se minha
suposição for verdadeira, se Santiago for meio-irmão de Easton,
isso vai abalar seu mundo, e eu não posso deixar que isso aconteça
com tanta coisa acontecendo e ele indo para esse trabalho com a
Fox Sports.
— Não fique nervosa — diz ele ao estacionar o carro.
Mas estou nervosa, apenas por coisas completamente diferentes
do que ele pensa.
— Eu não estou nervosa. Eu só me preocupo em não ser capaz
de esconder minha reação quando vê-lo. E se ele parecer frágil ou
não for como o homem que eu conheço? Estou com medo que ele
veja em minha reação quão ruim ele está.
Easton se vira na minha direção e me olha direto nos olhos.
— Primeiro de tudo, ele já sabe quão ruim ele está, Scout.
Apenas seja você mesma com ele. E em segundo lugar, você está
trazendo a ele ótimas notícias, então isso vai ofuscar todo o resto
que está preocupando você.
Ele se inclina e me dá um beijo carinhoso nos lábios que afasta o
demônio da traição. Por enquanto, isso me aquece enquanto
chegamos à porta da frente, eu apresento Easton a Sally e, em
seguida, me preparo para ver meu pai.
— Você está segurando as visitas, Sally. Eu ouço vozes, e elas
não são de você falando sozinha.
— Que idiota teimoso — ela murmura, mas o calor em seus
olhos me diz que adora que ele ainda tenha energia para ser algo
assim.
— Sou eu — digo, me preparando para vê-lo antes de entrar na
sala. — E trago presentes.
— Presentes, hein? — ele pergunta enquanto se move em sua
cadeira para me encarar. Está muito mais magro agora, frágil, e sua
pele é quase de um tom amarelo-acinzentado.
Seus olhos se afundaram mais, mas o sorriso que ele tenta
colocar no lugar quando me vê é cem por cento o velho Doc Dalton.
— Eles são da categoria uísque e chocolate, já que Sally aqui me
faz comer todos os tipos de merda orgânica com gosto de papelão
em vez da porcaria que eu realmente quero? Deixe o cara que está
morrendo comer as coisas boas — ele diz alto o suficiente para
Sally ouvir.
Lágrimas brotam dos meus olhos quando me inclino para abraçá-
lo. É tão bom vê-lo. Olhar em olhos tão iguais aos meus e ouvir sua
voz ao vivo. Lidar com seus comentários teimosos.
— Sem chocolate. Sem uísque — eu digo enquanto dou um beijo
em sua testa e sento-me ao seu lado, mantendo sua mão na minha.
— Achei que eu fosse o seu favorito — ele brinca.
— Você é meu favorito. Sempre será. — Minha voz falha.
— Não vá chorar em cima de mim, menina Scouty — ele avisa.
Eu aperto sua mão.
— Se eu chorar é porque estou feliz em ver você, então cale a
boca, meu velho, e me deixa ser feliz, ok?
Seu sorriso volta, e ele estende a mão e enxuga uma lágrima da
minha bochecha.
Sinto que tenho seis anos de novo e estou chorando porque sinto
falta da minha mãe. Ele sempre se sentou ao meu lado na minha
cama, enxugou minhas lágrimas, e então me contou uma história
boba até que eu estivesse rindo e a tristeza fosse ofuscada por um
tempo.
— É bom ver você, papai — eu sussurro.
— É bom ver você, Scouty. — Eu descanso a cabeça em seu
ombro por um segundo e apenas aproveito esse momento, cheiro
de seu shampoo, a paz que ele me traz, grata à Easton, por me
deixar ter alguns minutos com meu pai antes que eu os apresente.
É tão estranho me sentar aqui com meu pai e sentir que ele está
tão inteiro e saudável, mas saber que abaixo da superfície seu
coração é como uma bomba-relógio pronta para detonar a qualquer
momento.
Ele limpa a garganta e interrompe o silêncio.
— Chega dessa merda piegas. Eu quero saber quais são meus
presentes — ele diz e então para quando nota algo por cima do meu
ombro. — Scout?
Eu me viro para ver Easton parado ali, seu corpo preenchendo a
porta. Ele esfrega as mãos na calça jeans e me olha como se
estivesse perguntando se não há problema em interromper.
— Pai, este é Easton Wylder. Easton, este é meu pai, Doc.
— O jogador — meu pai murmura baixinho enquanto puxa sua
mão da minha e se senta um pouco mais reto. Easton cruza a
distância e estende a mão para ele.
— É um prazer conhecê-lo, senhor. Eu ouvi muito sobre você de
Scout e de todos da liga… É bom finalmente apertar sua mão.
Meu pai olha para a mão de Easton e depois o estuda.
E por um breve segundo meus nervos ficam abalados,
perguntando-me se isso foi um grande erro. Levar para casa um
homem para conhecer meu pai pela primeira vez nessas condições.
Mas eu tinha de fazer isso. Queria que meu pai conhecesse o
homem que amo.
Meu pai estende lentamente a mão e aperta a de Easton, mas
não cede ao escrutínio.
— Olá, Easton. Prazer em te conhecer também. Eu acho. Por
favor, me diga que fugir e casar com minha filha não é o presente
que você está trazendo. Se for esse o caso, acho que devemos ir
para a garagem onde posso mostrar meu cofre cheio de armas. —
Ele engessou o sorriso mais cafona em seu rosto enquanto os olhos
de Easton se arregalam e ele muda um pouco o peso sobre os pés.
— Das grandes.
— Você pode relaxar e ser legal? Ele não é o presente. — Eu
bato em sua perna. — Eu sei que você está brincando, pai. Ele não
sabe. Sente-se, Easton, e ignore meu pai.
— Há um cofre cheio de armas, sim — meu pai diz com uma
piscadela.
Easton ri nervosamente e se senta enquanto eu volto para o meu
pai.
— Eu me encontrei com Boseman hoje.
— Pobre imbecil provavelmente está com todos os advogados
em sua folha de pagamento robusta vasculhando aquele escritório
para se proteger depois de tudo que Tillman fez. Esse é o problema
com o beisebol hoje em dia. Muita besteira corporativa envolvida
quando deveria ser sobre um homem e seu amor pelo jogo. — Ele
brevemente fecha os olhos e sorri como se estivesse se lembrando
de algo. — Sem ofensa, Wylder, mas os contratos estão uma
loucura. Nenhum homem merece 21 milhões para jogar uma
temporada. A pureza do jogo acabou. A simplicidade de um pai e
um filho… — Eu bato meu joelho contra o dele, e ele limpa a
garganta. — Ou filha, indo para um jogo. Os jogadores estão
amolecendo com a contagem de arremessos governando todos os
seus movimentos em campo. É pura besteira. Não posso nem
começar a falar sobre isso.
— Você já começou. — Eu rio. — Como você pode ver, meu pai
é um cara das antigas. Ele acha que os negócios arruinaram o
esporte.
— E arruinaram — Easton concorda e pelo balanço da cabeça
do meu pai, também o surpreende. — O problema é que nunca será
possível voltar ao que era antes, o jogo que eu lembro de assistir
quando criança, e isso é uma pena.
Meu pai o encara por um momento e acena com a cabeça como
se estivesse julgando se Easton está tentando impressioná-lo ou se
ele realmente falou a sério. Eu sei que ele acreditou quando deixa o
comentário passar e vira para mim.
— Então? Boseman? Sobre o que foi o encontro?
— Ele queria me dizer que está suspendendo o contrato
probatório. Ele disse que os contratos provisórios são uma merda e
um gerente geral deveria saber se quer alguém em sua equipe ou
não. — Eu não posso esconder meu sorriso por mais tempo. —
Conseguimos o contrato, pai. Boseman disse que será redigido
imediatamente.
Meu pai apenas me encara por um momento, mandíbula cerrada
e olhos duros, antes de me agarrar e me puxar para ele. Ele se
segura enquanto seu corpo estremece com as lágrimas contra as
quais ele está lutando.
Não tenho certeza do que esperava que acontecesse quando
disse a ele a boa notícia, mas definitivamente não era isso — afeto.
Depois de alguns momentos, ele se inclina para trás e encontra
meus olhos.
— Obrigado — ele sussurra. Uma palavra. É apenas uma
palavra, mas a gratidão e o amor embalados por trás delas apagam
o estresse interminável e ansiedade que suportei para que isso
acontecesse.
— Easton, por que você não me deixa mostrar a casa lá fora? —
Sally pergunta da porta, salvando Easton de sentir que está se
intrometendo.
— Eu estarei com Sally — diz ele, dando-me um sorriso suave
antes de sair.
Meu pai e eu o observamos sair da sala, ouvimos a porta de tela
fechar com força e continuamos a assistir Sally apontando coisas
para Easton através da grande janela. Mesmo que haja tantas
coisas a serem ditas, ficamos sentados em silêncio por alguns
minutos.
— Estou orgulhoso de você, Scout. — Ele faz uma pausa e
continua olhando para o longo campo gramado onde Easton está de
pé. — Mas você não tem que assinar o contrato, se você não quiser.
— O quê? — A palavra é uma lufada de ar chocada enquanto eu
olho para ele, mas ele continua olhando para frente. Confusão e
desorientação tumultuam dentro de mim. — O que você está
falando? Não era o que você queria? O ápice da sua carreira. Pai,
fale comigo. Por favor, me diga que não foi tudo por nada.
— Não tudo a troco de nada, não. Às vezes, conquistar algo é o
próprio sucesso — diz ele, estendendo a mão para agarrar a minha.
— Que diabos isso significa?
— Isso significa que eu precisava que você amasse algo mais do
que você me ama. Eu precisava que você fizesse algo que
parecesse impossível no começo e tivesse sucesso nisso para que
você soubesse que pode fazer isso por conta própria. Então, eu
saberia que você ficaria bem quando eu partir. — Eu balanço minha
cabeça enquanto eu tento entender o que ele está me dizendo. —
Eu sinto muito por te afastar, Scouty, mas toda a sua vida você me
procurou para ajudá-la quando as coisas ficavam difíceis. E não há
nada de errado com isso. — A voz dele falha junto com meu
coração. — Mas eu precisava que você soubesse que não precisa
de mim para consertar nada. Você é forte e capaz e tinha as
ferramentas para consertar tudo por si mesma. Eu precisava que
você percebesse que não precisa de mim.
— Mas eu preciso de você, pai. — Minha voz engasga enquanto
eu luto contra os soluços que ameaçam sair.
Ele olha para mim pela primeira vez, e eu vejo uma lágrima
deslizar por sua bochecha.
— Você tem alguma ideia de como foi difícil te afastar? Posso ser
durão, mas afastar minha garotinha foi a coisa mais difícil que eu já
tive que fazer. Eu queria ser egoísta. Te puxar para perto e mantê-la
nesta nossa bolha e nunca a deixar ir… Mas eu não poderia. Eu
empurrei, afastei você em direção ao contrato porque se você
pudesse lidar com aqueles homens durões, sexistas e teimosos,
então eu sabia que você teria sucesso em tudo que desejar fazer.
Eu não dou a mínima para o contrato, Scout. Eu não poderia me
importar menos se você continua com os negócios ou não. Eu só
precisava saber antes de ir que você vai ficar bem. Que você
acredita em si mesma o suficiente para saber que vai ficar bem
também.
Eu coloco meus braços em volta do meu pai, e ele me segura
enquanto eu choro.
— Eu sinto muito por ter que deixá-la.
Eu não posso parar os soluços enormes e fortes.
— Estou muito orgulhoso de você. Nunca duvide disso.
Eu me recuso a soltar enquanto ele passa a mão no meu cabelo
de novo e de novo e me diz coisas que preciso ouvir, mas gostaria
que ele não precisasse dizer.
— Você é meu coração, Scouty. Eu te amo mais do que tudo no
mundo, e eu não quero que você se esqueça disso, nunca.
Depois de algum tempo, quando as lágrimas se acabaram e o
vazio foi preenchido com seu amor inquestionável, eu inclino minha
cabeça sobre o ombro dele como eu fazia quando era pequena e
observava o mundo do lado de fora. A grama movendo-se com a
brisa. As nuvens deslizando pelo céu. A grande árvore que Ford e
eu costumávamos subir — onde meu pai já escolheu como seu local
de descanso final.
— Eu acho que devemos nos sentar na varanda e aproveitar
este bom tempo. O que você me diz?
Minha respiração ainda está irregular — um indício dos meus
soluços —, e eu com certeza estou com meus olhos inchados, mas
parece a melhor ideia do mundo.
Como costumávamos fazer quando eu era pequena.
— Eu adoraria.
— Você pode me ajudar a chegar lá? — ele pergunta.
— Claro. — Eu passo o braço em volta de sua cintura e me
levanto com ele. Ele está muito leve. Este homem corpulento da
minha infância foi reduzido a pele e ossos. — Você está bem?
— Eu me sentiria muito melhor se você servisse um pouco
daquele uísque que fica no armário em cima da geladeira no meu
copo. Sally nunca vai saber.
Eu rio.
— Verei o que posso fazer.
— Essa é minha garota.

O céu fica roxo e laranja quando o sol se põe, e meu pai e Easton
falam sobre todas as coisas imagináveis — minha infância, seu
ombro, beisebol —, até sobre o cofre de armas na garagem. Sally e
eu conversamos pela primeira vez, desde muito tempo, sobre
tópicos que não tem nada a ver com a doença do meu pai, e isso é
tão bom. Atrevo-me a dizer quase normal.
— Tem certeza que precisa ir? — Sally pergunta.
— Infelizmente. Tenho um voo cedo para Los Angeles amanhã
— eu digo olhando para meu pai novamente e vendo as olheiras de
exaustão.
— O primeiro jogo da World Series — murmura meu pai, e eu
adorei saber que ainda há esse olhar nostálgico em seus olhos
quando se trata dos jogos. Estou grata por sua doença não ter tirado
isso dele.
— Sim — eu concordo. — A única coisa que faria ser melhor é
se Easton estivesse jogando. — Olho para ele e sorrio, sabendo que
ele sente a mesma coisa.
— Lembre-se do que eu disse, Easton — meu pai diz com um
aceno de cabeça. — Seu corpo conhece suas limitações. Ouça o
que ele diz e você tomará a decisão certa.
— Sim, senhor — diz Easton, e me pergunto sobre o que
exatamente conversaram enquanto Sally e eu tínhamos entrado
para pegar mais bebidas.
Meu pai estava dando conselhos a Easton sobre seu ombro?
— Foi um prazer conhecer vocês dois. — Ele dá um passo à
frente e dá um grande abraço em Sally e então aperta a mão do
meu pai. Meu pai se inclina para frente e diz algo no ouvido de
Easton que não consigo ouvir. Easton encontra seus olhos em uma
troca de palavras não ditas. Ele o segura um pouco mais do que o
normal e sorri com um aceno de cabeça como se ele estivesse
agradecendo por coisas que só eles entendem.
— Talvez possamos fazer isso de novo em breve. Nos encontrar
novamente. Agora que a temporada acabou e vocês dois estarão
por perto.
— Eu adoraria — eu digo, meu coração esperando ter muito
mais desses momentos com eles agora que tudo está esclarecido.
— Vocês podem me dar um minuto com Scout? — meu pai
pergunta.
— Vou acompanhá-lo até o carro, Easton. Você pode ter
esquecido o caminho, considerando que o carro está bem à sua
frente — Sally brinca quando me viro para meu pai.
— Eu só queria lembrá-la de que você pode aceitar ou recusar o
contrato. Esse contrato era o meu sonho e meu objetivo, e quero
que você tenha os seus próprios. — Ele aperta minha mão.
— E se os meus forem iguais aos seus? E se eu quiser continuar
o seu legado?
— Eu adoraria isso — diz ele com um sorriso suave enquanto
seus olhos se fecham momentaneamente. Quando ele os abre, há
uma clareza que não espero. — Obrigado pelos meus presentes.
— Presentes? Mas eu só tinha um.
— Nah, você me deu dois dos maiores presentes que eu poderia
ter pedido: saber que você vai ficar bem… E ver você apaixonada.
Eu o abraço o mais forte que posso para que ele saiba que essas
palavras foram o maior presente que ele poderia ter me dado em
troca. Saber que ele tem a certeza de que vou ficar bem.
— Amo você, papai.
— Mente limpa. Coração completo, menina Scouty. Nunca
esqueça isso.
— Nunca.
SCOUT

QUANDO EU ENTRO NA CABINE DE IMPRENSA DO ESTÁDIO, EASTON ES


com a cabeça baixa, estudando os papéis espalhados por toda a
mesa na frente dele. Não querendo incomodá-lo e arruinar sua
concentração, eu me encosto no batente da porta e espero que ele
me note.
— Você terminou o trabalho? — ele pergunta, sem me olhar.
— Sim. Adler está progredindo e concluí meus relatórios para
Griswold — digo, me referindo ao gerente geral interino até que
Boseman possa encontrar um novo.
— Já está indo pra casa? Você esteve aqui o dia todo, deve estar
exausta.
— Estou, mas pensei em ficar aqui com você um pouco, se você
não se importar.
— Você não precisa.
— Eu sei — eu digo enquanto fecho a porta e me aproximo dele.
Ele permanece focado no que está trabalhando, então eu aprecio a
visão do campo de nossa posição. A grama está imaculada, os
logotipos da World Series foram pintados no campo interno, e
fileiras de bandeiras de plástico foram penduradas ao longo das
linhas do campo à esquerda e à direita. Alguns caras estão em
campo — parecem ser J.P., Guzman e Santiago, fazendo alguns
passes extras com a bola. Conseguindo um pouco de prática com
as rebatidas antes do próximo jogo amanhã.
Os Aces estão empatados com os Anaheim Angels, um jogo
para cada um, então a cidade está agitada por saber que eles
estarão na frente da multidão da torcida adversária nos próximos
três jogos.
— Você não poderia ter pedido um local melhor para sua
transmissão, hein? — Eu coloco a mão em suas costas e faço um
carinho suavemente.
— A segunda melhor coisa além de jogar durante a World Series
é transmiti-la. — Eu ouço a amargura e sarcasmo em sua voz, mas
não comento. Eu me se sentiria assim também se estivesse no lugar
dele. — Desculpa.
— Não precisa pedir desculpa. Entendo. Tudo que eu quis dizer
é que pelo menos você está familiarizado com essa cabine e seu
layout, já que você fez transmissões aqui antes. Além do mais, este
estádio é sua segunda casa, então isso pode ajudar a aliviar um
pouco o nervosismo.
Há uma batida de bastão abaixo. Alguns gritos quando a bola
bate na arquibancada do lado direito do campo.
Mas é Easton quem exige minha atenção quando ele estende a
mão para me puxar. Quando eu fico entre seus joelhos separados,
ele envolve seus braços nos meus quadris, me puxando para ele e
descansando sua cabeça no meu abdômen. Minhas mãos
automaticamente se enroscam em seu cabelo para tranquilizá-lo de
que estou aqui, ainda torcendo por ele, ainda sou aquela que deseja
o melhor para ele.
— Estou nervoso — ele admite depois de alguns minutos de
silêncio, o calor de sua respiração ultrapassando o tecido da minha
camisa e aquecendo minha pele.
— Eu sei que está — digo a ele, tentando imaginar como ele está
lidando com a pressão que colocou sobre si mesmo e o medo do
escrutínio do público se ele errar. Assim que foi anunciado como
parte integrante do time de comentaristas para a transmissão de
amanhã, os idiotas atrás de seus teclados começaram com a
palhaçada deles.
Ele me mantém por perto por alguns minutos enquanto os sons
do treino abaixo chegam até nós. Até que eu tenho uma ideia. Algo
para torná-lo um pouco mais à vontade. Algo para ele se lembrar
quando estiver nervoso durante o jogo e a transmissão.
— Ei, você sabe o que dizem para fazer quando você fica
nervoso, não sabe? — eu pergunto, me afastando dele e
caminhando em direção à porta. O estádio está longe de estar vazio
com o jogo de amanhã e a preparação da pós-temporada, mas
arrisco que ninguém venha bater na porta da cabine de imprensa.
— Imaginar todo mundo pelado — diz ele.
Eu tranco a porta e me viro para encará-lo, mais do que um
sorriso tímido em meus lábios.
— Você pode fazer isso. Eu dou um passo em direção a ele e
levanto uma sobrancelha — Ou você pode me imaginar pelada.
Um canto de sua boca se ergue em descrença enquanto seus
olhos se estreitam, a curiosidade tomando conta de sua expressão.
E assim eu cumpro meu comentário. Eu puxo minha blusa e top
sobre minha cabeça, meus seios fazendo peso quando estão livres
do tecido restritivo.
Seus olhos se arregalam.
— Ah, caralho
— Exatamente. Ah, caralho.
Eu tiro o tênis e puxo a calça de ginástica, então estou de pé na
cabine de imprensa dos Austin Aces, completamente nua, com uma
audiência composta de uma pessoa.
Ele molha os lábios e se mexe na cadeira.
— Você sabe o que é ainda melhor do que me imaginar nua?
— O quê? — Eu adoro que ele não consegue evitar que seus
olhos percorram todo o meu corpo como se fosse um mapa do
tesouro que ele mal pode esperar para explorar.
— Imaginar que estou chupando você na mesma cadeira em que
você estará participando da transmissão.
— Imaginar você fazendo isso ou lembrar de você fazendo isso
por experiência própria? — ele pergunta enquanto se mexe
novamente em seu assento, sua ereção esticando seu short.
— Isso depende — murmuro enquanto passo entre suas coxas
novamente, inclinando-me e pressionando meus lábios nos dele. Eu
o beijo suave e lentamente, então quando interrompo, ele se inclina
para frente para tentar continuar me beijando.
— Depende de quê? — Ele ri.
— De por que você ainda está usando short.
Em uma onda de movimento, ele empurra seu short para baixo
em direção aos tornozelos e tira uma perna de dentro dele.
Com meus olhos nos dele, caio de joelhos, abaixo a cabeça e
muito lentamente deslizo seu pau na minha boca. Eu pressiono a
língua na parte de baixo enquanto meus lábios sugam, e sou
recompensada com um gemido gutural quando ele atinge o fundo
da minha garganta.
Os olhos dele deixam os meus quando se fecham e a cabeça cai
para trás.
Eu não me apresso, deixando o calor da minha boca, a sucção
dos meus lábios, e a pressão da língua fazerem com que ele suba
em direção ao êxtase.
— Cacete — ele geme.
Música para meus ouvidos.
Segurando-o tão profundamente quanto consigo, coloco minhas
mãos na brincadeira. Primeiro com as unhas arranhando
suavemente suas bolas. As coxas dele se apertam. Seus pés
flexionam. E então, eu o deslizo para fora da minha boca, liberando
a sucção e fazendo um som de estalo que preenche a cabine.
Eu agarro seu eixo com a outra mão e o movo suavemente
quando começo a mexer ao longo de seu comprimento enquanto
minha boca dá prazer à cabeça..
As mãos de Easton estão por toda a parte. Primeiro nos apoios
de braço. Em seguida, suas coxas. Depois, um punho no meu
cabelo, segurando minha cabeça enquanto ele levanta os quadris e
fode minha boca.
É erótico para caralho.
O som de seu gemido. O barulho da sucção quando ele
escorrega dos meus lábios. A batida do taco lá embaixo. Saber que
as pessoas estão bem ali enquanto estamos fazendo isso.
Inebriante.
O gemido que ele emite. O aperto em seus dedos. Seu elogio
afetado entre respirações ofegantes.
Empoderador.
Saber que posso dar isso a ele. Não apenas o clímax, mas algo
para ele lembrar e para o deixar à vontade quando ele estiver aqui
amanhã à noite. Um pequeno momento privado para fazê-lo sorrir
um pouco antes de os nervos fazerem sua aparição quando o
teleprompter começar a rodar.
— Scout. — É um gemido indecente enquanto ele empurra seus
quadris para cima, e eu chupo com mais força. — Scout. — Seu pau
incha e seus músculos ficam tensos. — Scout. — E então ele se
perde enquanto eu chupo e engulo tudo o que ele tem para me dar.
— Oh. Deus. Scout.
Seu aperto afrouxa do meu cabelo, mas ele puxa para trás, então
sou forçada a olhar para ele. Eu ergo a mão para limpar meus lábios
quando ele escorrega da minha boca.
Seu sorriso incrédulo reafirma que o risco definitivamente valeu a
pena.
— Você é má.
— Você prefere que eu seja boa?
— Porra, claro que não. — Sua risada preenche a cabine
enquanto ele me ajuda a levantar dos meus joelhos. — Olhe para
você. Eu nem consegui aproveitar tudo isso. — Ele passa as mãos
para cima e para baixo nas laterais do meu torso e murmura em
apreciação.
Eu afasto suas mãos.
— Você pode aproveitar mais tarde. Eu tenho que me vestir
antes que alguém nos pegue.
Eu amo o som de sua risada.
— Não está tão corajosa agora, não é?
— Você conseguiu o que queria, não foi? — eu pergunto quando
começamos a nos vestir.
— É claro que consegui. — Ele parece um gato que brincou com
a presa. Presunçoso para cacete.
— Nunca diga que eu não jogo bem em equipe — provoco.
— Você com certeza levou uma pelo time. — Ele balança a
cabeça e olha para os muitos papéis na frente dele antes de olhar
de volta para mim. — E estou mais do que certo de que sua
generosidade para com a equipe ajudará a aliviar meus nervos
amanhã à noite.
— Bom saber.
O amor em seus olhos é avassalador e me deixa
inesperadamente desconfortável. Eu desvio os olhos e me
concentro em amarrar meus sapatos, mas quando olho para cima,
ele ainda está olhando para mim.
— Você já terminou? — eu pergunto.
— Nah. Eu quero repassar isso mais algumas vezes. Você vai
para casa?
— Você se importa se eu ficar aqui com você em vez disso? Eu
trouxe meu livro, então eu prometo que não vou incomodar.
Seu sorriso é suave.
— Adoraria isso.
EASTON

— HELEN VAI VOLTAR HOJE À NOITE? — SCOUT PERGUNTA ENQUANT


cabelo com uma toalha.
— Nah. — Eu olho para o relógio na cozinha e depois para os
papéis da transmissão que estou estudando. — Nós terminamos por
hoje.
Merda. Onde estão minhas anotações?
— Você deve estar exausto. Tem praticado na cabine o dia todo.
— Não o dia todo. — Puta. Merda. Ela me chupando mais cedo
foi inesperado, mas foi perfeito para caralho.
— Não vamos falar sobre isso. — Quando eu olho para ela
novamente, suas bochechas estão vermelhas de vergonha.
— Nem… — Eu reviro os olhos. — Eu conheço você, Scout
Dalton. Você não pode agir toda tímida e recatada comigo quando
eu conheço a mulher fatal que você é no privado.
Ela ri, e a imagem do topo da sua cabeça, o calor de sua boca, a
sucção de seus lábios… Eu sou um cara muito sortudo.
— O que você está procurando? — ela pergunta,
propositalmente mudando o tópico da conversa e me trazendo de
volta ao assunto em questão: encontrar minhas anotações para a
transmissão de amanhã.
— Eu acho que as deixei no estádio.
— Deixou o que no estádio?
— Minhas anotações. Eu tenho que correr lá e ir pegar.
— Ah… Justo quando eu ia deixar você se aproveitar de mim.
— Você ia? — Música para os meus ouvidos.
— Eu estarei na cama. — Seu sorriso me diz que ela está
falando sério. — Nua. E esperando.
— Não vou demorar.
Sim. Eu sou um filho da puta sortudo.

Com minhas anotações em mãos e pensamentos sobre exatamente


o que quero fazer para Scout quando chegar em casa, corro pelos
corredores do estádio sentindo-me muito bem com a vida em geral.
As coisas com Scout são incríveis.
Estou mais do que preparado para amanhã.
Meu ombro está evoluindo bem.
Os Aces estão na World Series. E porra, eu tecnicamente posso
ser um Wrangler, mas meu coração sempre estará com os Aces.
Pelo menos eu consigo participar do jogo. Não jogando, mas é
melhor do que nada.
Eu viro uma esquina.
E vejo.
Que porra é essa?
— Você tem que parar de falar sobre isso aqui. As pessoas vão
começar a perceber.
— Que falem. — Santiago levanta as mãos. — Eu não me
importo. É a sua imagem que você está tentando preservar
mantendo tudo isso em segredo. Não a minha.
— Fale baixo! — meu pai diz em uma resignação que nunca
ouvi.
Eu não consigo me mover, embora cada parte de mim diga que
eu não quero saber sobre o que eles estão falando.
— Onde você quer discutir isso então, Cal? Você se recusa a
falar comigo em sua casa. Não vai me encontrar em nenhum outro
lugar que Deus nos livre de alguém nos ver em público juntos, o pai
e o vilão, e começar a fazer perguntas. Aqui deveríamos conversar
um com o outro. Aqui, seremos esquecidos. Aqui a porra do seu
precioso filho pode não questionar nada.
Meus sapatos rangem, e os dois olham na minha direção.
Eu balanço a cabeça enquanto olho de Santiago para o meu pai.
Ai, meu Deus, caralho.
— Você está brincando comigo? — Eu acho que disse isso. Eu
não tenho certeza porque minha cabeça está cheia de tanto ruído
branco agora que nem consigo… Como diabos eu nunca percebi…?
Porra.
Santiago é filho do meu pai?
Meu meio-irmão?
— Eu posso explicar. — Meu pai dá um passo à frente, mas eu
dou um passo para trás, a cabeça balançando e a mente ainda não
querendo acreditar.
— Não. Só… — Eu pisco os olhos várias vezes, tentando não
ver o que estou vendo. O mesmo formato dos olhos, o mesmo
queixo. É quase imperceptível com a diferença nos tons de pele,
mas posso ver. E agora eu não consigo não ver isso. — É verdade?
— eu pergunto, minha voz um sussurro rouco.
A boca do meu pai se aperta quando ele encontra meus olhos. E
assente com a cabeça.
— Easton, deixe-me…
— Foda-se. — Eu dou uma meia volta para escapar enquanto
ele grita meu nome atrás de mim.
Um caminhar que vira correr, que se transforma numa corrida a
toda potência. Qualquer coisa para sair desse labirinto de concreto
que parece areia movediça me puxando para baixo.
Eu preciso de ar fresco.
Eu não consigo respirar.
Eu não consigo pensar.
Abro a porta para o estacionamento. Minhas mãos estão nos
meus joelhos enquanto eu sugo o ar.
Scout.
Eu preciso da Scout.
Eu corro para casa. Fico inquieto no elevador apertando o botão
da cobertura várias vezes como se isso fosse fazer com que subisse
mais rápido.
A porta se abre.
— Scout! Scout!
Ela sai correndo do quarto e para no meio do caminho quando
me vê.
— Easton. — Sua voz está calma, seus olhos estão cautelosos.
— Seu pai acabou de ligar. O que aconteceu?
— O que ele disse? — Ela dá um passo em minha direção e dou
um passo para trás. Eu só… Eu preciso de… O que está
acontecendo aqui?
— Ah, merda — ela diz, a voz embargada. Ela respira fundo e
olha para mim.
— Você sabia?
— Não tenho certeza. Eu ainda não sei ao certo — ela gagueja.
Meu peito se aperta com suas palavras. — Encontrei seu pai e
Santiago outro dia…
— O quê? Quando? Onde? Jesus. — Lembrei: Scout de olhos
arregalados e sem fôlego quando ela abriu as portas para o
estacionamento. — Foi quando meu pai te seguiu para fora do
estádio?
Ela acena com a cabeça.
Puta que pariu. Por que ela esconderia de mim se achou… A
raiva rasteja lentamente e se infiltra em cada parte de mim.
— Você sabia e não me disse?
Ela levanta as mãos.
— Eu os ouvi sussurrando algumas palavras e tirei minhas
próprias conclusões, mas eu não tinha certeza. E eu com certeza
não fiquei para perguntar.
— Por que não me contou? — Eu quero gritar com ela, sacudi-la,
obter algum tipo de reação, porque eu tenho tanta raiva e confusão
me corroendo de dentro para fora, que eu não sei o que fazer ou
dizer ou como me sentir.
Mas eu não posso. Isso não é culpa dela. Nem porra nenhuma
que está acontecendo. Não, Santiago não é culpa dela. É do meu
pai.
— Eu ia te dizer…
— Mas você não disse. Você… você ia me contar?
— Depois de amanhã à noite. — A voz dela é tão suave
comparada à minha aos berros. O dia da minha noite. Luz da minha
escuridão. Fodido para o meu fodido e meio.
— Eu não queria que isso afetasse você e a transmissão. Você
tem estudado tanto, e eu queria que você tivesse uma cabeça limpa
e…
— Sim, bem, isso foi por água abaixo agora, não é?
— Não tem que ser.
Meu pai tem outro filho. Há quanto tempo ele sabe sobre ele?
Há quanto tempo ele o mantém em segredo? Minha mãe…
Merda.
Minha mãe.
— A porra do Santiago. — Eu trago as duas mãos para os lados
da minha cabeça e caminho de um lado ao outro da sala. Muitos
pensamentos. Tantas perguntas.
— Easton. — Ela estende a mão para mim, e mesmo que eu
queira pegá-la, me encolher em um buraco e fingir que isso não está
acontecendo, eu não posso.
Ela é a única pessoa em quem confio agora, quando sinto que
não posso confiar em ninguém.
Até em mim mesmo.
— Eu sinto que estou me afogando. Como se eu não pudesse
respirar. Eu tenho que ir. Pensar. Fazer… não sei o quê.
Pego as chaves do meu carro no cesto e aperto o botão do
elevador.
— Fique. Converse comigo. Por favor. — A quebra em sua voz
quase me mata.
Implorando-me para ficar aqui quando agora sei que não posso.
Eu fecho meus olhos, respiro fundo e desejo que tudo isso
acabe.
Quando eu os abro, porém, nada mudou. Ela ainda está aqui, e
ele ainda é meu meio-irmão.
As duas coisas que eu tenho certeza.
— Eu não vou fazer nada estúpido — eu digo enquanto uma
lágrima desliza pelo seu rosto. — Eu só preciso de um tempo para
pensar.
Ela assente com a cabeça. Ela me entende. Ela entende.
E ainda assim eu não entendo nada.

— Abra. — A porta treme enquanto bato. — Vamos lá, mãe, abra a


porta.
Mentira sobre mais mentiras. Tantas mentiras.
Raiva. Confusão. Mágoa. Traição. Todos eles batem de frente
comigo.
— Mãe. Eu preciso que você atenda a porta. — Bang. Bang.
Bang.
Meu pai é a razão pela qual minha mãe está assim. Suas
mentiras a quebraram.
— Easton? Easton, você está bem? — Sua voz arrastada, mas
abafada passa pela porta antes que o som da fechadura seja
ouvido.
— Sim. Não. Eu não sei, porra — eu digo enquanto ela abre a
porta, seu rosto uma máscara de preocupação e confusão.
— O que houve?
Eu passo direto por ela para sua casa deprimente — presa de
volta no tempo com mais garrafas vazias bagunçando o balcão do
que eu já tinha visto antes — e tento conter minha raiva porque ela
não merece. Isso não é culpa dela.
— Mãe… — Eu nem sei como dizer isso. — Eu sei a verdade. Eu
sei por que você e papai terminaram.
Seu rosto empalidece e suas mãos ficam trêmulas enquanto ela
caminha vacilante para a cozinha e, sem culpa, toma um grande
gole de um copo de vidro. Ela está de costas para mim, mas posso
ver seus ombros se erguerem e caírem enquanto ela respira fundo.
Quando ela se vira para me encarar, de repente parece vinte anos
mais velha.
— Por que nós terminamos, East?
— Não. Não. — Eu me aproximo e pego o copo da mão dela e
jogo-o na pia. Ela chora com a perda, mas estou tão farto de seu
vício, que não me importo.
Eu preciso dela mais do que ela precisa do álcool agora, e eu
não acho que ela entenda isso. Ela nunca entendeu.
Eu me pergunto se algum dia ela vai entender.
— Nós éramos jovens.
— O cacete. Todo mundo era jovem naquela época. — Eu passo
a mão pelo meu cabelo e dou uma olhada em uma foto na parede
de nós três, e eu luto contra o desejo de esmagar meu punho contra
ela. — Ele te traiu, não foi? Ele estava em cidades diferentes todas
as noites com a equipe, e ele era tão egoísta pensando apenas em
si mesmo em vez de sua família, que ele não conseguia manter sua
calça fechada.
Seu queixo treme enquanto ela se apoia no balcão e lentamente
se abaixa em uma cadeira. Eu vejo muito bem as lágrimas. Observo
suas mãos tremendo. Ouço-a sussurrar: “Oh, Deus.”
— E então ele engravidou alguém.
— Não. Pare. — Minha mãe cobre os ouvidos, e um soluço
violento escapa do fundo de seu peito. Ela balança a cabeça,
repetindo a palavra “não” algumas vezes. Ela está desequilibrada,
assim como me sinto agora, mas eu preciso desesperadamente
dessa resposta. Eu preciso da confirmação.
Eu preciso ouvi-la dizer isso.
— Foi isso que aconteceu? É isso que você escondeu de mim?
Vocês me levaram a acreditar que ele é um bom homem quando na
realidade ele é um merda que amou mais a si mesmo do que a nós?
Ela começa a balançar no banco, seus olhos se voltando para a
garrafa meio vazia ao alcance da mão, e ela chora ainda mais.
— Não. Ele era… Ele vai…
— Não invente desculpas por ele. Não faça isso nunca mais.
Minhas palavras param quando meus pensamentos finalmente
se alinham e se encaixam.
Ele vai…
Tempo presente.
Eu estou do outro lado da sala num pulo e pego pelos ombros e
a sacudo para que ela saia dessa espiral. Preciso ver seu rosto
quando fizer a próxima pergunta.
A que, atualmente, está me deixando mal do estômago.
— Quem é o amor da sua vida, mãe? — Pânico é tudo que vejo
em seu rosto. — Quem? Papai é o verdadeiro amor que você estava
esperando? — Ela não responde. Seus lábios abrem e fecham. Ela
olha para a garrafa novamente e depois de volta para mim.
Necessidade contra dever. Vício contra o amor.
Tudo faz sentido agora.
— É por isso que você sempre manteve aquelas fotos de nós
três na parede, não é? Achei que você tivesse feito isso para que eu
pudesse ver que nossa família não esteve sempre quebrada. Para
que eu soubesse que fui amado por dois pais, mesmo quando muito
tempo depois eu só tivesse permissão para ver um de vocês por
vez.
— Você foi amado.
— Mas não foi nada disso, foi? Você as deixou porque ainda o
ama. Porque ele amava as suas partes que ninguém mais amava.
Seus olhos injetados de sangue estão vidrados, e seu sorriso,
torto, apesar de suas bochechas manchadas de lágrimas.
— Ele disse que resolveria tudo e voltaria para mim.
Eu fico olhando para ela. A descrença possui cada parte da
minha alma quando eu pensei que já tinha me chocado o suficiente
por um dia.
E pela primeira vez na minha vida, gostaria de poder ser como
ela. Viciado em algo que tem tanto poder sobre mim, que você
passa a viver no passado.
Acredita em coisas que não são verdadeiras.
Mantém mentiras que você disse a si mesmo apenas para que
possa aguentar até o próximo segundo.
O próximo minuto.
O próximo dia.
A próxima garrafa.
SCOUT

— ELE NÃO ESTÁ AQUI.


Cal está no saguão de entrada do apartamento, um homem
derrotado.
— Você não sabe onde ele foi? Eu preciso falar com ele.
— Acho que suas ações falaram alto o suficiente.
Ele cometeu um erro no passado? Obviamente. Eu sinto pena
dele? No nível “eu sou um ser humano”, sim. No nível “eu amo e
quero proteger Easton”, absolutamente não.
— O que você quer que eu diga, Scout? — Ele esfrega a mão
sobre o rosto.
— Quer saber? Ele tentou viver à altura da sua perfeição a vida
inteira. Ele tentou e falhou e odiava a si mesmo porque falhou em
mais maneiras do que você jamais poderia imaginar… E você o
deixou acreditar nisso. Você o deixou pensar que ele era menos do
que sua imaculada imagem.
— Eu não fiz nada disso. — Ele diz as palavras, mas não há
convicção nelas. Um homem orgulhoso que não sabe como ser
humilde.
— Você não tem onde se apoiar aqui, Cal. — Agitada e
preocupada sobre Easton, puxo a nuca com as duas mãos para
tentar me acalmar. — Você achou que esse seu segredinho nunca
seria revelado?
Ele abaixa a cabeça por um instante antes de olhar para mim.
— Você sabe as chances de alguém com quem eu tive um caso
há muito tempo ter um filho que também se tornaria um jogador da
liga principal de beisebol? As chances são muito pequenas de se
entrar, ainda mais duas crianças com o mesmo pai.
— Há quanto tempo você sabe? — eu pergunto. — Anos?
Meses? Quanto tempo você tem escondido isso de Easton?
— Santiago nunca soube que eu era o pai dele. — Ele balança a
cabeça como se ainda estivesse tentando compreender tudo isso.
— Depois que a mão dele morreu no ano passado, ele encontrou
alguns recortes de jornal sobre mim que ela guardou. Ele ligou os
pontos e me abordou em março.
Oito meses.
— Você teve vários meses. Você não ia contar a Easton, ia?
Meu tom não é tão amargo quanto sinto que estou agora.
— Eu não sei. — Ele faz uma pausa. — Sim. Em algum
momento.
Não tenho certeza se acredito nele ou não.
— Então, enquanto isso, você ia fazer o quê? Ficar de lado e
assistir Santiago continuar a sabotar a carreira de Easton?
Ele gagueja. As palavras que ele quer dizer não passam de seus
lábios.
— Eu estou… Ainda estou em choque.
— Em choque ou não, Cal, é Santiago! — grito, incapaz de
segurar as palavras rápido o suficiente. — O cara que
deliberadamente machucou seu filho. O cara que arruinou sua
carreira. Você não se importa? Você não pensou em protegê-lo
do…?
— Você não tem ideia do…
— Você sabia antes de ele ter machucado Easton? — Meu
estômago se revira com o pensamento.
— Não. Eu juro. Eu juro que não. Santiago estava sofrendo. Sua
mãe tinha acabado de morrer, pelo amor de Deus, e ele passou a
vida inteira sem pai. Então ele estava sozinho e foi largado para
concluir que o cara cuja carreira ele invejava era ninguém menos
que seu meio-irmão.
Ele estava sofrendo. A frase fica gravada na minha cabeça. A
familiaridade em seu tom. A desculpa para o indesculpável. Bem,
Easton estava ferido também — naquela época e agora — mais do
que acho que Cal jamais poderá imaginar.
Eu fico olhando para ele, boquiaberta, a cabeça balançando
como se eu estivesse tentando acreditar no que estou ouvindo.
— Por favor, me diga que você não está dando desculpas a
Santiago por machucar Easton. — Minha voz está fria como gelo.
— Eu não estou. É só que… Jesus Cristo. — Ele caminha para
um lado do apartamento e depois volta para onde estou. Ele precisa
saber que está em um beco sem saída nessa situação.
— Não há nada que você possa dizer para dignificar o que
Santiago fez. Como você pode deixá-lo entrar na sua vida sabendo
o que ele fez com Easton?
— Mas ele é meu filho. — Sua voz é sussurrada em descrença.
— Nos últimos vinte e cinco anos, Easton foi seu único filho.
Engraçado é que eu ainda não vi você pegar leve com ele como
com certeza está fazendo com Santiago.
Lágrimas brotam de seus olhos. Eu posso ver sua dor. Sua
incerteza sobre o que fazer. O caos dentro de sua alma.
E uma pequena parte de mim sente pena dele.
A outra parte de mim o despreza por destruir tantas vidas.
Sua esposa, lidando com sua infidelidade e, em seguida,
condenando seu filho a ser o cuidador dela ano após ano — vendo-
a sofrer e cair. Seu filho, constantemente fazendo com que ele sinta
que é menos do que realmente é, e então trazendo seu filho
bastardo para esfregar em sua cara.
EASTON

ESTÁ TARDE.
O estacionamento é uma cidade fantasma.
Não tenho certeza de quanto tempo fico sentado na caminhonete
olhando para as paredes de concreto cinza da garagem do meu
prédio, mas eu não posso subir para o apartamento ainda.
São tantas porras de mentiras, que não consigo entender todas
elas.
No que acreditar. No que não acreditar. Como minha mãe pode
ser tão fodida, que ela ainda acha que meu pai vai voltar para
buscá-la. Como eu compartilho o mesmo sangue com Santiago
quando eu o desprezo.
Eu saio do carro. Os olhares nos rostos do meu pai e de
Santiago gravados em minha mente. E então minha mãe. Seu amor
lamentável por um homem que nunca vai voltar por ela. E minha
esperança patética de que isso tudo seja um sonho.
— Easton.
Estou a meio caminho do elevador. Eu estou aqui, na terra de
ninguém — tão perto de casa —, e cerro os dentes.
Eu não quero fazer isso agora.
Eu não quero vê-lo.
Eu não quero enfrentar isso.
— Easton.
Eu perco o controle.
— Você não conseguiu manter o pau dentro da calça, não é? O
grande, malvado, o melhor jogador de beisebol do mundo tinha que
foder qualquer coisa com duas tetas, um buraco e um batimento
cardíaco para manter seu complexo de deus a toda velocidade.
— Não era assim. Podemos subir? Ir a algum lugar privado?
— Ah, claro. Você quer manter isso em segredo, então nós não
estragaremos a imagem que você tem de ser o sr. Perfeito… Bem,
parece que você não é tão perfeito assim, não é mesmo?
Ele dá um passo em minha direção.
— Precisamos conversar, filho.
— Não venha com essa de filho pra cima de mim! — Eu me viro
para encará-lo pela primeira vez, e, assim como minha mãe, ele
parece ter envelhecido cem anos esta noite. Ele parece velho.
Cansado. Quebrado. E o fato de eu me importar só me irrita ainda
mais e alimenta meu fogo. — Quantos outros irmãos eu tenho, pai?
Talvez eu tenha uma irmã em Dallas. E outro irmão em Nova York.
Porra, talvez haja um em cada cidade em que você já jogou. Que
sorte a minha.
— Não foi assim, Easton. A mãe dele nunca me disse nada além
do fato de estar grávida. Eu nem sabia que era um menino, para
começo de conversa.
— Deixa que eu adivinho. Ela disse que estava grávida, e você
queria se livrar do “pequeno problema”, então você desembolsou
algum dinheiro para que ela pudesse fazer um aborto. Qualquer
coisa para evitar arruinar sua reputação. E, vejam só, ela não fez o
que lhe disse que ia fazer.
— Easton. — Seus olhos se estreitam enquanto ele dá um passo
em minha direção. — Quem diabos você pensa que eu sou?
— Eu não sei mais. — As palavras são as mais calmas que
pronuncio, mas por sua careta, eu sei que elas machucam mais do
que qualquer outra coisa.
— Não foi desse jeito. Eu juro que não foi. — Ele passa a mão
pelo cabelo e olha em volta para se certificar de que ainda estamos
sozinhos. — Ela me disse que estava grávida, mas não queria que
eu tivesse qualquer participação na vida do bebê. Que não era justo
com minha família e não era justo com ela e com o bebê. Oferecer
apenas metade de mim para cada um de vocês.
— Quão conveniente.
— Estou falando sério. Eu nem sabia sobre ele até que ele me
procurou no início deste ano. — Ele sabe há meses e não me
contou, porra?
— E daí? Você disse à mamãe que tinha uma outra feliz mamãe
esperando por você e aí arruinou nossa família de qualquer
maneira?
— Não foi assim — ele repete pelo que parece ser a centésima
vez.
— Então como foi? Me esclareça. Por que você não me diz como
foi jogar fora uma vida normal ao lado do seu filho porque você foi
egoísta demais para o colocar na frente de tudo?
— Não estou orgulhoso do que fiz, mas…
— Muito nobre de sua parte assumir alguma responsabilidade,
Cal.
— Eu tentei esconder de você que sua mãe estava bebendo —
diz ele, falando por cima do meu sarcasmo.
— Ela não começou a beber até depois que você nos deixou.
— Você não sabia que ela bebia até então porque eu te poupei
disso. Escondi de você.
— Isso é uma porra de uma mentira, e você sabe disso! — grito
no topo dos meus pulmões.
Ele vai culpar minha mãe? Foda-se ele.
— Pense nisso, Easton. Lembre-se de quando você era criança,
mas olhe a cena com os olhos de um adulto.
Eu fico olhando para ele e rejeito as palavras que ele está
dizendo, apesar das memórias aleatórias que elas desencadeiam e
que nunca fizeram sentido. Ele ir me buscar na escola de surpresa
para que pudéssemos passar a noite em um hotel mesmo que fosse
dia de semana e eu tivesse aula. A lata de lixo que tilintava como se
estivesse cheia de garrafas de vidro e eu tinha de ajudar a arrastá-la
até a entrada da garagem. Sua única explicação era que eram
garrafas de cerveja dos caras que vinham jogar pôquer, só que
nunca me lembrava de ter visto ninguém vindo. Viagens de carro de
última hora com o time quando eu deveria ficar em casa porque já
tinha perdido muita aula.
Eu não quero acreditar em nenhuma das memórias porque isso
significa que ele está dizendo a verdade, e agora a verdade dele
não é algo que eu confie.
— Sua mãe tinha dois amores. Você e o álcool. Ela se casou
com a garrafa e não tinha lugar para mim. — Há dor em seus olhos
que me recuso a reconhecer. — Talvez eu seja o responsável por
isso. Talvez minhas viagens e deixá-la com um menino cheio de
energia eram demais para ela aguentar. Eu nunca vou saber,
Easton. Mas em um período de seis anos, passamos de uma família
amorosa a uma onde ela me excluiu. Eu não estou querendo
desculpar o que diz, mas eu estava sozinho. Meu caso teve a ver
com outras coisas além do sexo. Tinha a ver com companheirismo.
Era sobre ter alguém com quem conversar no final do dia. Era
errado? Sim. Havia maneiras melhores de lidar com isso? Com
certeza. Mas eu mantive nossa família unida o máximo de tempo
possível, e então Maria engravidou.
Então ela tem um nome.
— Maria — eu sussurro, odiando o jeito que soa na minha
cabeça.
— Sim — ele balança a cabeça. — Sua mãe encontrou a carta
que Maria havia escrito, me dizendo adeus e que ela não queria que
eu a procurasse mais ou o bebê depois que nascesse. Sua mãe e
eu brigamos por isso. Eu disse a ela que eu faria a coisa certa e
ganharia sua confiança novamente, e ela concordou em ficar sóbria.
Nós concordamos em passar algum tempo separados, mas eu
prometi que voltaria para ela. Lutaria por ela. Quando fiz isso, era
óbvio que nossa separação serviu apenas para fortalecer seu amor
pelo álcool.
— Mas ela te amava. Ela ainda ama.
— E eu sempre amarei a mulher que ela foi. A que eu escolhi ver
quando ia buscá-lo nas visitas agendadas. A sóbria que estaria toda
arrumada com seu batom vermelho para me avisar que ainda
estava interessada. Eu voltei algumas noites depois que você tinha
ido para a cama. Implorei para que ela fosse para a reabilitação.
Fizesse um tratamento. E ela tentou naquele verão que você viajou
comigo e com a equipe por dois meses, mas no fim o vício dela
venceu.
Tento digerir tudo o que ele está me dizendo.
— E quanto à Maria? Você apenas a deixou ir embora sem lutar?
— Não. Tentei encontrá-la, mas ela havia sumido. Arrumou suas
coisas e se mudou sem deixar um endereço.
Estou sem saber o que fazer aqui. Meu estômago se revira, e
meu peito dói pela raiva me comendo por inteiro. Preciso saber
muito mais, mas tenho muito medo de perguntar. Durante o trajeto
de uma hora até o trailer da minha mãe, muitas coisas passaram
pela minha cabeça.
— Eu tenho uma tonelada de perguntas. Tantas, que minha
cabeça está fodida, mas eu preciso de respostas. Você pode me dar
essas respostas? Você pode ser o homem que todo mundo pensa
que é e me responder tudo?
Ele se encolhe com minhas palavras, mas foda-se se vou me
conter.
— Sim. — A voz dele é apenas um sussurro, e sei que ele teme
o que vou perguntar a seguir.
— Você sabia que Santiago era seu filho antes de ele ter me
machucado? — Eu cerro minha mandíbula e espero pela resposta.
— Não.
Ele começa a dizer algo, e eu levanto a mão para detê-lo. Eu
preciso passar por isso para manter a calma e lutar contra a raiva.
— Ele está chantageando você?
Seus olhos piscam para os meus, a pergunta o assustando.
— Não exatamente.
— Sim ou não, Cal. Você não pode meio que chantagear alguém.
— Ele estava perturbado com a morte da mãe. Com raiva do
mundo porque ele viveu uma vida tentando sobreviver sem um pai.
Tudo foi uma luta para ele, e então ele descobriu que é meu filho. E
enquanto ele lutava diariamente, você, o cara cujas estatísticas ele
perseguiu por anos, tinha tudo. Ele se sentiu roubado. Ele
questionou por que você levou uma vida de privilégios quando ele
viveu uma vida na pobreza… Mesmo que os dois compartilhem meu
sangue.
— Isso não é culpa minha, porra.
— Você tem razão. Não é. E eu tentei dizer isso a ele, mas o
ressentimento é uma coisa difícil de abandonar.
Não é desculpa. Isso é tudo que penso continuamente enquanto
meu pai fala. Nada disso é uma desculpa válida para estragar minha
carreira.
— Chantagem, pai. Sim ou não?
— Tudo que ele queria eram os mesmos privilégios e
oportunidades que você teve.
— E tudo que você queria era manter o seu pequeno segredo
sórdido, não era? — O sarcasmo perde para a descrença quando
ele abaixa a cabeça momentaneamente, olhos fixos em seus pés.
Quem é esse homem? Eu nem o conheço mais. Quantas outras
mentiras existem?
— O que eu deveria fazer, Easton? O que? Negar a ele algo que
não tive nenhum controle durante toda a sua vida? Você não
pensaria menos de mim se eu me afastasse dele? Estou lutando
para descobrir como nós vamos seguir a partir daqui.
— Nós? Não há um nós aqui.
Ele balança a cabeça.
— Eu quis dizer eu e Mateo.
Mateo? Eu não quero pensar nele chamando aquele cara pelo
primeiro nome. E foda-se se essa correção não era o que eu queria,
mas ao mesmo tempo, só torna a dor um pouco mais forte.
— Você teve alguma influência, desempenhou algum papel em
trazê-lo para os Aces?
A queda repentina de seus ombros me faz dar um passo para
longe dele.
— Não era para ser assim.
Cada parte de mim implora para ele dizer não.
Mas ele não fala.
— Sim ou não? — eu grito.
— Sim. — Eu mal consigo ouvir a palavra. Ressoa em meus
ouvidos.
Ele sabia.
Ele organizou para que o idiota que arruinou minha carreira fosse
jogar pelos Aces. Com a porra do filho dele. Seu primeiro filho,
porra.
— Você nunca deveria ter sido negociado. Eu não tinha ideia do
que Tillman estava tramando. Nem uma porra de pista.
— Conveniente. — Eu bufo. — Você sentiu que os Aces
poderiam dar a ele a mesma coisa que eu tive? O que ele queria?
Apenas aliviar sua culpa? — E quanto a mim?
— Eu sei que você não tem nenhuma razão para acreditar em
mim agora, mas por favor, acredite, não foi intencional. Tillman
estava procurando um apanhador reserva, pelo menos foi o que ele
disse a todos. Ele disse que queria trazer alguém a bordo para
ajudar a facilitar sua transição de volta. De todos os apanhadores
disponíveis, Santiago tinha as melhores estatísticas do lote.
— Você pode adoçar a pílula da maneira que quiser para tornar
mais fácil para você engolir, mas vamos encarar a questão: você
convenceu o idiota do gerente geral a trazer o cara que fodeu o
braço do seu filho para o clube que ele joga para que você se isente
de culpa.
— Sim. Não. Eu estava desesperado, Easton.
Minha risada é tudo menos bem-humorada enquanto tento
absorver tudo o que foi dito. Enquanto tento me colocar no lugar do
meu pai, mas sei que isso é pura besteira.
— Tudo que ele queria era minha atenção, Easton. A chance de
conhecer o pai que ele nunca teve…
— Ele conseguiu um contrato que dobrou a droga do salário
dele. Você não pode me dizer que dinheiro não era um fator
motivador aqui, papai.
— Ele só quer…
— Poupe-me de suas desculpas, pai.
Nós nos encaramos. A fúria em mim, torna impossível ouvir mais.
— Quando você foi negociado — ele diz depois de um momento
—, eu fui até o Boseman e disse a ele o que Tillman fez. Eu contei a
ele sobre os rumores que circulavam sobre o que ele fazia a outros
jogadores. Fui eu quem ajudou a fazer com que ele fosse
demitido…
— Você espera que eu te agradeça por isso? — Puta que pariu.
— Ele é um Ace. E eu não sou. Ele assumiu minha posição. Meu
time. Então que se foda, pai. Você que se foda. Que se foda toda
essa situação de merda.
— Foi um monte de coincidências, do Tillman ao Santiago…
— Foi ele que fodeu meu ombro! — grito com a plena
capacidade dos meus pulmões para romper a névoa sob a qual ele
parece estar operando. A dor da traição é real, crua e indesejável.
— Por que você não assume isso? Santiago me tirou de propósito e
sozinho arruinou a porra da minha carreira.
— Está longe de estar arruinada, Easton.
— Não ouse defendê-lo! — Meu grito troveja pelo espaço de
concreto e ecoa de volta. — Ele queria o que eu tinha e você deu a
ele as chaves e abriu a porra da porta para ele pegar. — Eu rio
condescendentemente. Ele pode ter parado de jogar beisebol há
anos, mas ele ainda está jogando, só que agora é com a vida das
pessoas. — Vocês dois se merecem.
— Easton… — Ele dá um passo em minha direção.
— Não faça isso. Não. — Seus olhos me imploram para entendê-
lo, enquanto meu coração e minha cabeça se revoltam com a raiva
de sua traição.
Por que eu sempre quis ser como ele?
Foda-se isso.
Foda-se tudo.
Eu preciso ir para casa.
Eu preciso de Scout.
SCOUT

— EASTON? É VOCÊ?
Está tarde. O quarto está escuro.
— Shh.
Os lençóis levantam.
A cama afunda.
Ele desliza atrás de mim e me puxa para junto de seu corpo.
— Você está bem?
— Só me deixe abraçar você um pouco, ok?
Eu odeio a dor que posso ouvir em sua voz. A mágoa. Parte meu
coração.
— Serei o que você precisar — sussurro e deslizo as mãos por
cima das dele, descansando-as no meu abdômen.
— Você já é.
SCOUT

FICO ASSUSTADA QUANDO ACORDO NUMA CAMA VAZIA. O CÉU ESTÁ CIN
comecinho do amanhecer, ainda um pouco escuro.
Eu ouço o barulho das chaves. Sinto o cheiro de café. E eu me
pergunto como ele está.
— Easton?
— Aqui.
Encontro-o na cozinha, de tênis, short de corrida escurecido pelo
suor e pele ruborizada pelo exercício. Ele está ao fogão fazendo
ovos mexidos.
— Ei. — Minha voz está cautelosa, incerta sobre o que ele está
pensando depois de ontem e o que eu tenho certeza de que foram
fungadas silenciosas enquanto ele me abraçava com força noite
passada.
— Bom dia. — Sua voz é alegre, aparentemente inalterada, o
corpo ainda voltado para o fogão. — Acabei de descobrir que este
edifício tem um canil lá embaixo. Um lugar onde, se você tiver um
cachorro, você pode deixá-lo lá como uma creche, chamam de
creche de cães, para que quem desejar um cachorro possa ter um.
— Eu não sabia.
— Eu estava pensando, já que estou machucado e estamos
prestes a terminar a temporada… Pode ser uma boa hora para
adotar aquele vira-lata que você queria. O que você acha? — Ele se
vira para mim pela primeira vez desde que entrei na cozinha.
Eu estudo seu rosto antes que ele volte para os ovos. Não há
nada lá que sugere o drama da noite passada.
— Easton…
— Podemos ir no próximo final de semana, se você quiser.
Depois que a World Series acabar. Podemos adotar um daquele
local ou podemos ir a outro. Você deve começar a pensar sobre que
tipo de cachorro você quer.
— Você quer conversar sobre a noite passada?
Pela primeira vez, vejo uma rachadura em seu comportamento
alegre, mas é apenas um enrijecimento momentâneo de seus
ombros.
— E eu acho que devemos fazer uma viagem. Algum lugar
tropical. Ou Europa. Eu coloquei minha vida em suspensão por
muito tempo pelo beisebol, eu preciso parar de ser um escravo do
jogo e começar a viver, não acha? Eu estava conversando com seu
pai esta manhã e…
— Meu pai? Esta manhã? Não são nem sete horas.
Eu sinto que entrei em um universo alternativo.
— Eu mandei uma mensagem para ele, precisava de uma
opinião do que ele viu ao longo dos anos, e ele respondeu. Então
liguei e… — Ele encolhe os ombros. — Nós conversamos.
— Ok — eu digo, incerta. — Tem alguma coisa a ver com o que
ele sussurrou para você antes de sairmos naquela noite?
— Não.
Como estamos falantes hoje.
Eu o vejo servir os ovos em dois pratos e colocar um deles na
minha frente.
— Obrigada.
— Imagina — diz ele, andando ao meu redor e me dando um
beijo na cabeça antes de se sentar ao meu lado com seu prato.
— Easton — eu repito. — Você quer conversar sobre o que
aconteceu na noite passada?
Ele fica quieto enquanto mastiga a comida, e eu me pergunto se
ele vai dizer algo profundo.
— Não.
— Não? — Eu pergunto. — Mas…
— A que horas você vai para o estádio hoje? Eu não tenho que
me reportar até às cinco, mas provavelmente chegarei lá às quatro e
meia para mais um treino rápido na cabine. Podemos ir juntos se
você quiser.
Meu garfo fica parado no ar, os ovos precariamente presos nele,
mas tudo que posso fazer é olhar para Easton e me perguntar se ele
está em estado de negação.
A técnica clássica de evitar um assunto.
— Acho que devemos resolver tudo…
Seus ombros caem, e ele fecha os olhos momentaneamente. Ele
respira fundo como se fosse eu quem estivesse o frustrando.
— Eu não quero. Agora não. Só consigo lidar com uma coisa de
cada vez, Scout. E hoje eu estou lidando com a transmissão. Depois
disso, vou levar você para adotarmos um cachorro. Você se mudou
para minha casa, e ela continua tendo a mesma aparência… Então
se nós adotarmos um cachorro juntos será tipo criar algo nosso.
Talvez faça o apartamento parecer um pouco mais como seu
também.
Não tenho certeza se concordar com sua evasão é saudável ou
se forçá-lo a falar sobre tudo é melhor.
Mas pelo menos a cabeça dele está onde precisa estar, na
transmissão desta noite. Essa é metade da batalha.
E depois que a batalha estiver ganha, parece que vamos adotar
um cachorro.
Juntos.
Dando o próximo passo.
EASTON

É DIA DE JOGO.
Eu posso sentir isso no meu sangue, embora eu não vá tocar o
campo hoje.
Há empolgação, energia e magia.
Scout está ao meu lado conversando sobre quem ela precisa
alongar primeiro e sobre como ela está preocupada com o cotovelo
de Dungey.
— Tudo bem, Easy E?
— Manny-Man. — Eu me viro para encontrar o rosto que eu vi
mais vezes na minha carreira, além do meu pai, e pego o velho
safado e dou nele um abraço.
— Você ainda é bonito. — Ele sorri.
— E você ainda é feio — eu respondo, levantando as
sobrancelhas.
E assim, o pouco de nervosismo que tive ao atravessar esses
túneis hoje à noite desaparece.
— Alguém tem que ser. — Ele dá um passo para trás e olha para
mim. — Estou orgulhoso de você por tentar outra vez esta noite.
Tenho certeza de que os teleprompters vão estar em perfeitas
condições hoje. — Ele olha para Scout e sorri com um aceno de
cabeça antes de olhar para mim.
Eu engulo o nó na garganta, odiando o fato de estar mentindo
para Manny, o único cara que provavelmente não iria me julgar, mas
não é a hora nem lugar para explicar.
— Tenho certeza que sim. — Eu seguro minha pasta cheia de
anotações. — E se não estivessem, eu pediria folhas com as colas
com antecedência para saber o que dizer.
— Eu sempre soube que você era inteligente.
— É, é. — Eu rio. — Você vai ficar por aqui para assistir ao jogo?
Ele me olha por um segundo.
— Sim, acho que sim.
— Mesmo? Quais dos grandes você espera assistir esta noite?
— Você.
Eu fico olhando para ele por um momento, muitas emoções
girando ao redor depois de toda a merda da noite passada. Eu não
confio na minha voz para responder, então eu apenas balanço a
cabeça.
Scout se aproxima e lhe dá um abraço. Ele fica surpreso com
isso, mas quando ela diz algo em seu ouvido, seu sorriso se alarga
e ele ri enquanto ela volta para o meu lado.
— Nos vemos depois do jogo, Manny-Man.
— Nos vemos — ele diz enquanto caminhamos pelo corredor em
direção ao vestiário.
— Você não tem que me levar até lá — Scout me diz.
Eu sei que ela está nervosa porque eu vou ver Santiago.
— Que bobagem. Ele não existe para mim, Scout.
Entramos no vestiário, e eles estão todos lá, falando merda e
relaxando para que possam entrar na zona. A calmaria antes da
tempestade.
Eu dou um soco em alguns dos caras, desejo-lhes boa sorte e
brinco um pouco enquanto Scout vai para seu escritório.
E eu posso até ter escorregado alguns pacotes de chicletes de
pegadinha nas coisas de Drew.
Eu sinto falta disso.
E quanto mais fico aqui, mais difícil é saber que posso nunca
mais ter isso novamente.
Muita merda de uma vez.
— Ei — eu digo a Scout da porta de seu escritório. — Vou subir.
Seu sorriso é largo enquanto seus olhos passam por cima do
meu ombro para onde tenho certeza de que todos os filhos da puta
intrometidos estão nos observando, pensando se devem fazer
barulhos de beijo como crianças de oito anos, antes de voltar seu
olhar para mim.
— Arregaça, Wylder. — Seu sorriso diz tudo o que seu beijo
faria.
— Você também, Kitty.
Quando eu me viro, ele está bem ali. Parado na minha frente.
Sem sorrisos. Sem arrogância. Só ele. Uma dúzia de pares de olhos
esperam por um confronto. Eles não têm a menor ideia do quanto
tudo mudou.
Vá embora, Wylder.
Eles sabem que ele me fodeu, mas não tem ideia de quão ruim
foi tudo.
Você tem um jogo para transmitir.
Eu fico olhando para o filho da puta, de pé no meu vestiário, com
meu uniforme.
Não o deixe tomar mais de você do que ele já conseguiu.
Ele merece o que está vindo. Cada. Coisa. Fodida.
Vá. Embora.
E eu vou. Dou dois passos.
Isso é tudo que eu consigo.
Foda-se isso de o ignorar.
Foda-se. Ele.
Eu faço tudo que disse a mim mesmo que não faria. Meu punho
está para trás, e então voa para frente antes mesmo que eu possa
ter a chance de pensar nisso.
Ouço o grito de Scout. Eu ouço um dos caras dizendo para nos
deixar ter nosso momento.
— Seu idiota de merda! — eu digo, a mão ainda em punho
enquanto ele tropeça contra a parede atrás dele. — Você conseguiu
exatamente o que queria, não foi? Meu trabalho? Minha cidade? A
porra toda. O que eu fiz para você? Porra nenhuma. Se você quer
ficar puto com o mundo, foder com a vida de alguém, então faça
isso com ele. Ele é a razão de tudo isso ter acontecido, não eu.
Santiago me encara com um olhar muito diferente do que eu já vi
antes. Suas mãos estão cerradas, e seu sorriso me provoca.
— Por que você deveria ter tudo?
Meu sangue ruge na minha cabeça e bloqueia toda a razão.
Estamos em uma sala cheia de caras ouvindo tudo agora.
Adivinhando. Concluindo.
E eu não me importo.
Meu punho voa novamente e quase acerta sua bochecha. Sua
risada preenche meus ouvidos e acende uma raiva que nunca senti
antes.
— Você é um merda de um covarde! — grito.
— Como se eu me importasse com o que você pensa de mim.
— Você deveria, seu filho da puta. — Minhas mãos estão em
punhos em sua camisa, e eu o jogo contra a parede. — O quê? Não
vai lutar agora? — Eu torço as mãos com mais força em sua camisa
e o empurro novamente. Os caras se aproximam de nós. Minhas
mãos coçam para socá-lo mais uma vez.
Minha fúria bate dentro de mim.
— Não preciso. Eu consegui o que queria.
— Sim. Você conseguiu. Nosso papai com certeza notou você.
Primeiro me acertando e fodendo meu ombro. Que estratégia mais
escrota. E em seguida, pela besteira que você fez quando veio aqui.
— Eu me inclino mais perto. — Eu não deveria esperar menos de
um bastardo, não é?
— Seu filho da puta! — ele ruge enquanto seu punho vem em
minha direção.
Mal me atinge porque os caras vão para cima dele, segurando-o
antes que ele possa causar algum dano.
Eu fico olhando para ele, as mãos tremendo e o corpo tenso
como se cada parte de mim implorasse para socá-lo novamente.
Idiota.
— Você não vale a pena.
Ele não vale.
Eu preciso sair daqui.
Eu olho para Scout no caminho, mas não paro.
Os caras acenam com a cabeça enquanto eu passo por eles.
Mais do que chocados.
O segredo foi revelado.
Não ligo a mínima.
SCOUT

OS SONS DO JOGO CONTINUAM AO MEU REDOR. UM JOGADOR DE Ú


correndo por causa de um olho roxo. Manny recolhendo o lixo
deixado para trás. A voz nos alto-falantes ecoando pelo túnel direto
para o vestiário.
Mas estou grudada na tela do meu computador, onde tenho o
streaming da Fox Sports para que possa assistir ao jogo em tempo
real.
Meu joelho sobe e desce enquanto espero que o jingle termine e
rezo para que Easton se saia bem. Depois daquele confronto com
Santiago, eu preciso saber que ele está bem, mas as poucas vezes
em que fui até a cabine de imprensa, ele estava cercado por outras
pessoas, e eu não queria interromper.
Mas ele parecia bem. E depois da tempestade de merda das
últimas vinte e quatro horas, é isso que me preocupa mais do que
qualquer coisa.
— Boa noite, fãs de beisebol. Vocês estão prestes a ter uma
noite incrível aqui, no terceiro jogo da World Series. Os Austin Aces
contra os Anaheim Angels. A batalha das equipes A. Ambos têm
uma vitória cada para o jogo desta noite, mas isso pode mudar, os
Aces podem encerrar enquanto estamos em casa para os próximos
três jogos ou voltaremos para Anaheim sem um vencedor? O
homem ao meu lado pode ter algo a dizer sobre isso. Austin de
longa data, Easton Wylder senta-se ao meu lado na cabine esta
noite pronto para ajudar a comentar sobre o jogo.
— Boa noite, Bud. Obrigado a todos por se juntarem a nós.
Vocês podem sentir essa energia no ar? Essa é a magia do
beisebol, pessoal, e estamos prestes a vê-la ganhar vida com o
primeiro lançamento chegando em breve.
Eu solto a respiração presa e sinto como se aquele pequeno
comentário sobre a magia do beisebol tivesse sido a sua maneira de
me dizer que está com tudo sob controle.
E ele está.
Ele passa pelas escalações iniciais sem nem mesmo gaguejar.
Ele termina o segmento anunciando os patrocinadores antes dos
comerciais.
Tudo o que ele temia parece não existir desta vez.
Bud e Easton brincam sobre os pontos fortes e fracos de cada
equipe.
— Drew Minski está demais com seu taco agora — diz Easton.
— Ele está atingindo a marca de quinhentas rebatidas para os
primeiros dois jogos e quatrocentas na pós-temporada inteira. Tente
o tirar do jogo hoje à noite, acho que é possível que ele persiga o
lançador e o golpeie em vez de lançar a bola sobre a cerca e
adicionar outro RBI à sua contagem.
Bud ri enquanto a câmera dá um zoom em Drew terminando seu
aquecimento no campo externo. Seu rosto está enrugado e ele está
puxando o que parece ser uma bola preta de chiclete de sua boca.
Seus dentes e língua e parte de seus lábios também estão
manchados de preto.
— Parece que alguém foi vítima de uma pegadinha hoje.
— Nada como um pouco de diversão para acalmar. — Easton ri
quando Drew, na frente da câmera, balança o punho em direção à
cabine de imprensa.
E eu sei. Easton ataca novamente.
— Você não saberia nada sobre essa pegadinha, não é, Easton?
— Nadinha. De. Nada — diz ele, mas quem o conhece
reconhece esse tom de voz. E sabe que ele está mentindo.
A pegadinha boba não é nada no contexto geral, mas faz
maravilhas para mim. Ele vai ficar bem. Ele lutou contra seus
demônios, e ele vai ficar bem.
Não sei como ele está administrando tudo. E eu o aplaudo por
isso.
No momento em que o primeiro arremesso é lançado, Easton
mais do que se redimiu da última vez e provou que é um
especialista em fazer comentários brincalhões.
SCOUT

EU LUTO CONTRA A MULTIDÃO ENQUANTO ANDO EM DIREÇÃO À CABINE


O verdadeiro caos está instalado — estranhos cumprimentando uns
aos outros, pessoas assobiando, bêbados tropeçando, crianças nos
braços dos pais lutando para ficar acordadas — enquanto as
pessoas saem do estádio para comemorar a vitória decisiva dos
Aces sobre os Anaheim Angels.
Estou animada pelos Aces também, mas estou mais ansiosa
para comemorar com Easton o seu incrível sucesso esta noite. Ele
foi perfeito, engraçado, carismático e envolvente. Eu não poderia
estar mais orgulhosa.
Ao entrar na cabine de imprensa, eu rio, mas não fico surpresa
ao ver que o holofote se voltou para Easton. Ele não consegue
escapar disso.
Pelo menos desta vez, porém, é em uma luz positiva. As
câmeras estão posicionadas em sua direção e um repórter esportivo
está segurando um microfone na frente de Easton.
— Estamos muito entusiasmados por ter um momento com você,
Easton. Qual é a sensação de voltar a trabalhar, de certa forma, na
cidade de Austin? — A repórter pergunta.
— Austin sempre será minha casa, Chris, então é claro que é
ótimo estar aqui contribuindo de alguma forma para essa alegria.
Uma vez um Ace, sempre um Ace.
— Você pode nos dizer como está seu ombro?
— Está melhorando aos poucos, dia após dia. Paciência não é
exatamente meu ponto forte.
— Compreensível. É por isso que você quis comentar o jogo?
— Algo assim. — Easton abre seu sorriso premiado.
— Eu odeio trazer isso à tona, mas o que fez você tentar fazer de
novo? Sua tentativa no mês passado resultou em muitos
comentários depreciativos. Você mandou o nervosismo para longe e
quis outra chance? Por que decidir, por conta própria, se tornar algo
de potenciais críticas novamente?
Easton desvia o olhar de Chris por um segundo e, de alguma
forma, no meio da luz brilhante da câmera, ele me encontra. Há uma
confiança em seus olhos que eu não vejo há algum tempo. Também
há orgulho. Ele acena com a cabeça sutilmente antes de olhar de
volta para o repórter.
— Essa é uma boa pergunta, Chris, e uma pela qual tive
dificuldade em responder por um bom tempo. A maioria das
pessoas não sabe disso, mas sou disléxico, e até o mês passado,
tinha dificuldade para ler qualquer coisa. A prova disso foi quão ruim
eu fui durante minha primeira transmissão com a Fox. — Ele solta
um suspiro enquanto Chris apenas olha para ele, atordoado, e mais
do que disposto a deixá-lo falar, já que esta confissão surpreendente
provavelmente acabará como uma frase de efeito em todos os
canais de esporte e redes sociais. Tudo que posso fazer é olhar
para Easton, sentir um orgulho imenso e colocar a mão sobre meu
coração para mandar apoio silencioso. — Eu passei a minha vida
fugindo disso, dando desculpas, o que você preferir… E essa
transmissão foi um alerta para mim. O teleprompter estava
funcionando aquela noite. A culpa foi minha, não de algum técnico.
Eu estava muito envergonhado para pedir ajuda, mas aquela noite
foi a dose de realidade que eu precisava para ir buscar ajuda.
Então, pedi ao meu agente que abordasse a Fox e pedisse outra
chance. Compreensivelmente, eles estavam relutantes, mas no final
concordaram em me deixar tentar de novo.
— O que fez a diferença desta vez?
— Enfrentar o meu problema em vez de fugir dele. Com o apoio
da minha tutora e da minha namorada, estudei muito para provar
que eu conseguiria. Que eu poderia superar a única coisa a qual tive
vergonha durante toda a minha vida.
— Bem, essa definitivamente não era a resposta que eu
esperava quando fiz a pergunta — diz Chris.
— Nem eu. — Easton ri nervosamente. Eu posso dizer que ele
ficou desconfortável de repente, e eu o amo ainda mais por isso.
— Não é preciso dizer que você fez um ótimo trabalho esta noite.
— Obrigado. Foi divertido. Quem não gosta de falar sobre
beisebol?
— Verdade. Então, isso é algo que você gostaria de buscar em
algum momento, depois que seus dias no campo acabarem?
— Com o meu ombro do jeito que está esse ano, tenho certeza
que para alguns parece que já é o caso.
— Mas você está pensando em voltar, não é?
— Ninguém sabe o que o futuro reserva. Obrigado, Chris.
Easton termina a entrevista.
Mas não fornece uma resposta concreta para a pergunta.
EASTON

— POR QUE VOCÊ NÃO ME CONTOU? — FINN ESTÁ EM BUSCA DE RESPOS


traço de mágoa nela também.
— Não é exatamente algo do que se gabar.
— Sou eu, East. Quem te conhece melhor que todo mundo. — E
ele está certo. Ele realmente me conhece. — Eu poderia… Eu não
sei.
— Não há nada a dizer. Assinar aquele contrato e foder com tudo
foi um enorme sinal de alerta com graves consequências. Quer
dizer, aconteceu, mas apenas saiba que é um processo, e estou
trabalhando nisso.
— Com você tudo é um processo — ele brinca.
— Vai se foder. Eu sou o melhor cliente que você já teve.
— Falando em ser meu cliente… Por que você foi em rede
nacional e fez alusão ao fato de que talvez pendure suas chuteiras
quando nem me falou sobre isso, para mim, seu agente?
Eu encolho os ombros, embora ele não possa ver, e rio de quão
diferente esta mesma conversa foi ontem à noite com Scout, muito
depois de nossa celebração terminar, quando ela fez uma pergunta
muito semelhante.
— Há algo que você está me escondendo, Easton?
— Nada definido ainda.
— Que tal me falar mesmo assim? — A maneira como ela olhou
para mim. Com os olhos estreitos e uma inclinação de cabeça, disse
que ela sabia que eu estava pensando em me afastar dos campos.
Minha única resposta foi rir baixinho, puxá-la para mais perto de
mim e beijar aqueles lábios perfeitos.
— Foi o que pensei — ela respondeu no meu lugar. — Isso que
eu chamo de se dar bem.
— Easton. Você está aí? — Finn pergunta enquanto me lembro o
que aconteceu depois. Risos. Beijos. E então eu me dando bem.
Com ela. — Seu silêncio me diz que você está realmente
considerando isto.
— As pessoas vão ouvir o que querem ouvir, Finn. Você sabe
disso.
— Bem, a Fox ouviu muito bem — disse ele.
— Espero que sim, já que foi seu repórter que perguntou aquilo.
— Não seja espertinho.
— Não estou tentando ser — digo, mas não falo mais nada.
Eu vi os jornais esta manhã. As manchetes. A próxima maior
história do mundo do beisebol, além dos Aces vencendo o jogo
contra os Angels ontem, é se Easton Wylder vai ou não se
aposentar.
— Como eu disse, você com certeza fez uma declaração sem
dizer merda nenhuma. E a Fox ouviu você em alto e bom som, mas
eles não são os únicos.
— O que você quer dizer?
— Recebi dois telefonemas esta manhã. Um da Fox Sports
oferecendo a você um contrato como locutor esportivo regular em
suas transmissões. E outro do próprio Boseman. Pedindo que você
volte para casa, para os Aces, onde você pertence, palavras dele,
não minhas, mas desta vez como seu comentarista permanente
para todos os seus jogos.
— O quê? — Minha cabeça gira com a notícia.
— Você ouviu. Para um homem que ainda nem anunciou sua
aposentadoria, você tem duas ofertas incríveis, se quiser aceitar
alguma delas. Ofertas pelas quais qualquer um em sã consciência
mataria para receber.
— Uau. — É parte suspiro, parte puta merda.
— Parece que você tem uma decisão a tomar durante a baixa
temporada.
— Eu realmente tenho. — Sinto que pensar no meu futuro é tudo
o que venho fazendo recentemente.
É muito divertido e cheio de brincadeiras pensar em se
aposentar, mas quando isso pode se transformar em uma realidade,
é assustador para caralho.
Mas agora tenho opções.
Opções que me permitem continuar no jogo que amo. Manter
essa magia na minha vida. E me dá outras oportunidades que ainda
quero da vida.
Eu me lembro daquela garotinha brincando de lançar com o pai
no campo.
Isso é o que eu quero.
Com Scout. Eu definitivamente a quero lá também, sentada no
banco de reservas com um menino chamado Ford em seus braços.
Uma família.
Nossa família.
Uma pelo qual eu posso estar por perto.
Fazer parte dela.
Não perder momentos importantes porque estou sempre na
estrada.
Este jogo pode ser recompensador. Eu sei disso melhor do que
ninguém. Mas isso não é nada quando se tem uma família.
Eu desligo e olho para o mundo pelas janelas, e pela primeira
vez desde que conheci Scout, sei exatamente o que quero.
Engraçado como minha decisão esteve lá o tempo todo.
Eu só estava procurando nos lugares errados.
SCOUT

EASTON USA O CONTROLE PARA DESLIGAR A TV. A SALA É BANHADA PE


exceto pela luz no hall de entrada do apartamento.
Eu chamo isso de luzes de cinema para a comédia romântica
que acabamos de assistir.
Easton chama de iluminação perfeita para o sexo.
— Nós deveríamos ir para cama — murmuro, mas não faço
nenhuma tentativa de me mover de onde estou perfeitamente
aconchegada em seus braços. Ele não responde, mas eu sei que
não está dormindo porque seu dedo está se movendo para cima e
para baixo no meu bíceps.
— Ei. Você está bem? — eu pergunto, curiosa para saber a
quantas andam seus pensamentos.
— Sim. Estou bem.
— Tem certeza?
— Aham.
Ficamos em silêncio enquanto minha mente corre a um milhão
de quilômetros por hora para tentar descobrir o que o deixou tão
preocupado. Eu posso listar várias coisas — seu pai, sua mãe,
Santiago, se ele vai se aposentar ou não — mas permaneço quieta,
embalada lentamente para dormir por sua respiração regular e
braços quentes.
— Não sei como consertar.
— Consertar o quê?
— Minha família fodida.
— Oh. — Ele evitou falar sobre isso por mais de uma semana e
quando eu desisti de tentar fazer Easton falar, para que não guarde
tudo só para si mesmo, ele diz isso.
— O filme era sobre família e sobre como isso te deixa louco,
mas você meio que tem que seguir o fluxo, ou no final você vai
acabar sozinho. — Ele faz uma pausa enquanto entrelaça os dedos
nos meus. — E isso me fez pensar nas coisas. Sobre você e como
você está aceitando tudo com seu pai. Eu sei que é difícil e eu sei
que em algum momento você vai desmoronar enquanto eu fico
parado e seguro todos os seus pedaços, mas você aproveita cada
segundo que tem com ele. Você tem só um dos pais, e ele embora
em breve, e eu estou sentado aqui, com dois pais com quem nem
falo mais porque não sei como seguir em frente.
— São duas circunstâncias totalmente diferentes, Easton — digo
para tentar redirecionar a discórdia em sua voz. — Você não pode
compará-las.
— Eu sei, mas ao mesmo tempo me sinto egoísta… Mas eu não
sei para onde ir a partir daqui.
— Muita coisa foi jogada em você nas últimas semanas.
Infelizmente, não há um guia sobre como lidar com isso ou que
passos se deve dar a seguir.
— Eu sei. — Ele suspira e beija minha cabeça.
— Sua mãe — eu sugiro, na esperança de poder ajudar de
alguma forma. Embora eu seja a coisa mais distante que existe de
uma terapeuta, lido com a questão mais fácil primeiro. Não há
esperança para qualquer tipo de relacionamento com Santiago,
como não deveria mesmo, e seu pai vai ser difícil, algo que não
tenho certeza se ele está pronto para lidar ainda… Então sua mãe é
a minha escolha.
— O que tem ela?
— O que mudou para você em relação a ela?
— Nada realmente, eu acho. Ela ainda é ela. Ainda está
apaixonada pelo álcool e está mais convencida do que nunca de
que meu pai vai voltar para ela.
— Então você não a ama menos do que antes, certo?
Ele fica em silêncio enquanto medita sobre minha pergunta.
— Não… Mas estou com raiva dela. De acordo com meu pai, ela
beber foi o que o levou à traição. Foi o catalisador para ele olhar
para fora do casamento e, em última análise, para os separar. Ela é
uma alcoólatra, e isso nunca vai mudar. Eu tenho muito
ressentimento por ambos agora, e não tenho certeza de como lidar
com isso.
— Se ela ligasse para você agora e precisasse da sua ajuda,
você iria?
Eu sinto seu corpo ficar tenso e sei que ele está tentando
descobrir qual é meu ponto. Ele está hesitante em responder, mas
finalmente o faz.
— Sim, é claro.
— Então nada realmente mudou. Ela é sua mãe, Easton. É ela
que você ama e é o seu vício que você odeia. Dê a você mesmo um
pouco de tempo. Você acabou de descobrir um monte de coisas,
mas isso não muda nada entre vocês.
— O sangue é mais forte que o álcool — ele murmura com um
suspiro seguido por uma risada incrédula.
— É isso — digo, grata por ele ainda ter seu senso de humor.
— Minha mãe é a mais fácil. As coisas ficam um pouco mais
complicadas a partir daí.
É a minha vez de rir, sabendo que ele está falando sobre seu pai.
— Isso é uma verdadeira bagunça.
— Você está certa. — Ele respira fundo. — Como eu o perdoo?
— Ninguém disse que você precisava.
— Mas não é a única maneira de seguir em frente?
— Eu não sabia que você queria — digo, guiando-o.
— Eu não sei o que eu quero. Posso perdoá-lo parcialmente?
Posso ter um pouco de empatia pelo marido solitário que era casado
com uma alcoólatra? Nos últimos anos, fui eu que cuidei dela como
ele já fez antes. Eu sei em primeira mão que é um lugar solitário de
se estar.
— Esse é um grande primeiro passo — murmuro. — É muito
maduro da sua parte pensar assim.
— Bem, espera um pouco então, porque o meu lado imaturo vai
sair agora. Eu não sei como posso superar ele ser tão cego pela
necessidade de manter sua reputação intacta, que trouxe seu
problema até mim.
— Verdade, mas…
— Melhor ainda, não vamos falar sobre isso — diz ele enquanto
suas mãos sobem pelos lados do meu torso, polegares
estrategicamente passeando sobre meus mamilos.
— Mmm. Falar é superestimado às vezes — murmuro,
apreciando seu talento para mudar de assunto. É a maneira dele de
me dizer que não está pronto para descobrir o que fazer com seu
pai ainda. E tudo bem.
— Com certeza é — diz antes dos seus lábios encontrarem a
curva do meu pescoço.
— Então eu sugiro que você faça um bom uso de seus lábios, sr.
Wylder.
— Eu tenho muito mais coisas para usar do que meus lábios. —
Ele belisca minha orelha. — Mas eles com certeza são um bom
começo.
EASTON

— ESSA É TÃO FEIA. VOCÊ ESTÁ FALANDO SÉRIO? — EU ACHO QUE E


cabeça. Eu fico olhando para a foto no computador e apenas
balanço a cabeça. A cadela é uma bagunça só. Uma pit bull
resgatada, que era usada como isca para cães em rinhas ilegais.
Uma orelha está meio rasgada, a outra quase foi perdida; seu rosto
está coberto de cicatrizes, com um olho permanentemente fechado.
Ela é tão feia, que chega a ser adorável.
— Nós dois fomos machucados nesta vida, mas isso não
significa que não somos dignos de amor, não é? — ela pergunta
com lágrimas brotando em seus olhos, reforçando cada palavra.
Eu coloco meu braço em volta da sua cintura e a puxo para mim.
Ela vai precisar disso nos próximos meses. Algo que dê conforto e
que ela possa abraçar. Se aconchegar enquanto observa seu pai
lentamente ir embora.
Eu coloco um beijo na ponta do seu nariz.
— Ela é perfeita — eu digo, sabendo que nunca serei capaz de
resistir a dar o que ela quer. — Qual o nome dela?
— Margarida.
— Margarida? — Eu rio. — Ela não tem cara de Margarida.
— Todo mundo merece algo bonito em sua vida,
independentemente se carrega cicatrizes ou não.
Porra, mulher.
— Margarida então.
Ela grita e pula nos meus braços, as pernas em volta da minha
cintura.
Beijo seus lábios. Deus, esta mulher vai ser minha ruína, e dou
boas-vindas a isso.
A campainha toca e nós dois gememos.
— Só ignora — eu digo, então começo a beijá-la novamente.
— E se for importante? E se for Finn com algum contrato para
que você possa olhar e tomar a decisão final?
— Ele teria ligado. — Eu volto para outro beijo, mas ela deixa
suas pernas deslizarem dos meus quadris e dá alguns passos para
trás, apesar do meu braço bom tentar segurá-la perto.
— Você não atende, nós não fazemos sexo. Você atende, nós
fazemos sexo. — Meus braços caem. — Sexo bom. Sexo no estilo
tenho-tesão-pela-professora. — Agora ela está falando minha
língua. — Sexo na rede de beisebol. — Definitivamente falando o
que eu quero ouvir. — Ou talvez inventemos um tipo totalmente
novo de sexo.
— Que tipo? — eu digo enquanto dou um passo em direção ao
elevador.
— Hmm. Eu poderia ser sua garota do taco e ter certeza de lidar
do jeito certo com suas bolas.
Eu jogo minha cabeça para trás e rio.
— Oh, Kitty… — Minhas palavras morrem, assim como sua
risada, quando a porta se abre e eu vejo meu pai parado.
Oh, “como caíram os poderosos”.
— Cal — Scout diz com um aceno de cabeça. Eu não tenho
certeza de como me sinto ao vê-lo aqui. — Vou deixar vocês dois
conversarem.
Eu ouço seus pés batendo no corredor e odeio que eu não sei o
que fazer ou dizer, ou até mesmo como agir. A dor volta
instantaneamente. A confusão não está muito longe. A sensação de
ser sacrificado para salvá-lo.
— Posso entrar? — ele pergunta.
— Tudo bem. — Dou um para trás, mas não o convido a entrar.
Nós paramos e olhamos um para o outro. Ele parece cansado.
Velho.
— Eu vim aqui quase todos os dias nas últimas duas semanas.
Eu entrei no saguão, então sempre fiquei me perguntando se você
falaria comigo, se queria me ver e conversar, e aí ia embora de
novo. Hoje eu disse a mim mesmo que deveria falar com você, quer
você quisesse me ver ou não.
— Você está me vendo agora. Está satisfeito?
Seu rosto cai com o desinteresse na minha voz. E eu odeio que
me importo com isso. Além de falar brevemente sobre isso com
Scout, consegui afastar isso da minha mente por quase duas
semanas.
Eu tentei antes, e minhas corridas diárias pela cidade se
transformaram em corridas extremas para aliviar essa agonia
corroendo minhas entranhas.
— Você vai ao desfile da vitória hoje? — ele pergunta. O
movimento nervoso de seus pés me diz que ele está protelando,
precisando de algo simples para falar antes de chafurdar na merda.
— Sim. Scout faz parte da equipe, então ela estará lá. Vou poder
assistir do lado de fora. — Sim. Essa é uma indireta para você. Um
pequeno lembrete do porquê estarei do lado de fora.
— Nunca soube do seu problema de leitura, East. Por que você
não me disse?
Eu não deveria ter que dizer.
— Porque você não ficava por perto quando realmente
importava.
Ele balança a cabeça, aceitando meu comentário.
— Eu mereço isso. Eu poderia dar mais explicações do porquê
fiz isso e dizer que o seu bem-estar era minha maior preocupação,
mas não importa. Isso não importa. Eu sou seu pai, e eu deveria
saber disso. Eu deveria ter estado presente para você. Eu sinto
muito, filho.
Tudo o que faço é olhar para ele e odiar que minha garganta
pareça se fechar. As palavras que nunca pensei que o ouviria dizer
ele acabou de pronunciar.
— Como você…? Ensino médio, faculdade… Quer saber, não
importa por que ou como — diz ele. — Tudo que importa é que você
conseguiu. Eu estou orgulhoso de você por trabalhar com isso, por
tentar consertar, mas também estou orgulhoso por admitir seu
problema. As pessoas ainda estão falando sobre isso. Boseman
propôs que eu liderasse um projeto comunitário entre os Aces e sua
instituição de caridade…
— Chega, pai. É o suficiente. — Chega de conversa fiada. Chega
de “estou orgulhoso de você”. Ele não entende que costumava
implorar por sua aprovação, e agora eu não posso ligar menos para
o que ele pensa de mim?
Eu deveria convidá-lo a entrar, oferecer um lugar para sentar,
mas não posso. Ainda não. Então nós ficamos como estranhos, cara
a cara, a poucos metros de distância, na entrada da minha casa.
— E você se saiu muito bem na transmissão. Os rumores é que
eles podem oferecer a você a proposta de ser o convidado especial
na próxima temporada.
— Não como um convidado.
— Não?
— Não. Um comentarista permanente da equipe de transmissão.
— Eu espero por sua reação e odeio que uma pequena parte de
mim espera ver que ele está orgulhoso de mim. Ainda espera. A
outra parte observa para vê-lo ligar os pontos.
— Então os rumores são verdadeiros? — Ele parece surpreso.
— Eu não decidi nada ainda.
— Bem, é sempre bom ter opções. Bom para você.
Independentemente do que escolha, você vai se sair muito bem e…
— Não é sobre isso que você veio aqui conversar, não é, pai?
— Não. — Ele olha para baixo por um instante e respira fundo
antes de olhar para cima novamente. — Eu não posso mudar o
passado, filho. Eu não posso desfazer as coisas que fiz e não
espero que você me perdoe por elas, mas eu estou esperando que,
com o tempo, talvez possamos ficar bem de novo.
Há lágrimas em seus olhos, e não me lembro de ter visto ele
chorar. Isso me faz sentir como uma criança, se debatendo no
mundo dos adultos quando não tem ideia do que fazer. Quando eu
não falo, ele continua:
— Eu fui visitar sua mãe outro dia.
— O quê? Por quê? — Porra. Será que ela vai se afogar em
álcool agora que o amor da vida dela ressurgiu apenas para acabar
indo embora de novo?
— Eu senti que devia a ela isso, dizer tudo cara a cara. Sobre
Santiago me encontrar. Sobre toda a dor que isso causou a você.
Me desculpar novamente com ela. — Ele olha pela janela e depois
de volta para mim. — Ela ainda é linda.
— Ela sempre foi. — Minha voz é implacável, porque mesmo que
eu possa perdoá-lo pelos motivos que teve para deixá-la, não posso
perdoá-lo por me deixar. As velhas feridas são difíceis de curar
depois de terem sido abertas.
Ele olha por cima do ombro, na direção em que Scout foi. Ela
não vai te salvar.
— Eu não sei como consertar isso, East. Me diga o que você
precisa que eu faça, e eu farei — ele implora, o desespero
possuindo sua voz.
Eu pensei sobre o que dizer a ele enquanto corria. Como eu
queria gritar e berrar e culpá-lo por tudo, mas ao vê-lo aqui, assim, o
fogo se extinguiu.
— As coisas que você me disse, sobre mamãe estar doente
naquela época, eu nunca soube. E sabendo disso, eu ainda culpo
você, pai, mas ao mesmo tempo, não posso te culpar. Eu sei o que
é amá-la e se decepcionar por ela amar mais o álcool. É muito
solitário às vezes, eu não sei como me sentir, e essa é a parte mais
difícil.
— Eu entendo.
— Não, na verdade você não entende. Eu não tive uma saída
como você. Eu fui deixado de lado para lidar com tudo isso
enquanto você continuava sendo você. E agora… Agora tenho que
lidar com um tipo totalmente diferente de acontecimentos que, de
novo, não tenho nenhum controle e, ainda assim, controlam
completamente a minha vida. E mais uma vez, você continuará
sendo você.
— Não há nada mais que eu possa dizer do que sinto muito.
Estraguei tudo.
— Sim. Você estragou. Isso não pode ser corrigido com um
pedido de desculpas. Você ainda não entendeu? Ele arruinou minha
carreira, pai. — Minha voz aumenta a cada palavra. — Ele
machucou meu ombro porque me odiava por algo que eu não tive
nada a ver. Porque compartilhamos o mesmo sangue. Ele não foi
maltratado por minha causa. Ele é um merda até onde eu sei, mas
eu ainda não consigo entender por que você deu a ele a
oportunidade de me causar mais danos. Você abriu a porta. Você
viu de primeira mão o dano que ele causou e ainda assim o deixou
entrar. E… você ainda quer conhecê-lo. Este filho aqui se ferrou
nesse negócio todo. Não entendo como você pode me amar e ficar
bem com ele, sabendo o que ele fez. Isso é uma facada nas costas.
Então tenha um relacionamento com ele se você acha que precisa
para aliviar sua culpa e curiosidade. Descubra se existe qualquer
coisa redentora nele. Só que nunca venha falar comigo ou com
Scout sobre ele.
Sua expressão é estoica, mas seus olhos refletem uma
devastação resignada.
— Quanto a nós dois, vai levar tempo. Então, sim… — Eu
caminho ao redor do espaço para conter a raiva dentro de mim. —
Preciso de tempo.
— Ok. — Ele assente com a cabeça novamente, complacente,
quando ele nunca foi assim antes em sua vida. — Eu sei que não
parece agora, mas eu amo você, filho.
Sem dizer mais nada, meu pai caminha até o elevador e passa
para dentro. Quando a porta se fecha, eu preciso me esforçar muito
para não ir atrás dele enquanto os sentimentos familiares voltam.
Amor e ódio. Lado a lado.
Eu também te amo, pai, mas, agora, isso parece ódio.
Amor e ódio.
Agora em uma escala totalmente diferente.
SCOUT

— OLHE PARA ELA. ELA ESTÁ PERFEITAMENTE ACOMODADA. — EU FICO


Margarida sentada entre nós no assento da caminhonete de Easton;
as janelas estão abaixadas, e o que sobrou de suas orelhas com
cicatrizes estão voando com o vento.
— Depois da vida que ela teve, tenho certeza de que um assento
macio, os petiscos que você dá sem parar para ela e sua mão
fazendo carinho constante é como ganhar na loteria.
— Verdade. Eu pensei que ela poderia ficar triste por deixar o
abrigo, mas ela está indo bem.
— Foram só apenas trinta minutos. — Ele ri, mas passa a mão
em suas costas e descansa em cima da minha. — Não é tão fora do
caminho, acho que podemos passar na casa do seu pai e deixar
Margarida correr um pouquinho.
— Mesmo?
— Mesmo.
— O que vocês dois… três estão fazendo aqui? — Sally ri enquanto
sai da casa e fecha a porta antes de se abaixar e dar à Margarida,
que está sentada esperando pacientemente, um pouco de carinho.
— Quem é esse aqui?
— Essa é a Margarida. Acabamos de adotá-la e estávamos
voltando para casa. Easton sugeriu que parássemos para que eu
pudesse ver papai e deixar Margarida correr um pouco antes de
voltarmos para a cidade.
— Eu amei — diz Sally. — Parece que ela teve uma vida difícil.
Eu tenho certeza de que ela vai devorar qualquer atenção que
vocês deem a ela.
— Ela já está devorando. — Easton me cutuca. — Scout já deu a
ela uma caixa inteira de ossinhos de leite.
— E daí? — Eu rio. — Ela merece por sobreviver a tudo que
passou. — Eu olho por cima do ombro para a porta e então de volta
para Sally. — Podemos vê-lo?
— Ele está dormindo agora. — Ela torce os lábios ao colocar as
mãos nos quadris. — Vocês já almoçaram? Vou preparar alguma
coisa, e vocês podem ir comer no jardim. Tenho certeza de que ele
estará acordado até a hora que vocês terminarem.
— Sally, isso é muito generoso da sua parte, mas não podemos
abusar de você.
— Que nada. Me dê alguns minutos, vou trazer algo para vocês.

Easton enfia uma flor atrás da minha orelha para adicionar à dúzia
de outras que ele enfiado irritantemente no meu cabelo.
— Eu acho que Sally sabe como mimar você — ele diz.
— Acho que sim. — Eu rio enquanto olho para a cesta de
piquenique que ela nos entregou, cheia de mais comida do que
seríamos capazes de comer. — Ela está tão acostumada a
alimentar meu pai, que não come quase nada hoje em dia, que é
gratificante ter um homem grande e robusto como você para
alimentar.
— Homem grande e robusto? — ele pergunta enquanto se
inclina para frente e beija minha testa.
— Sim, não tenho certeza de quando ele vai chegar, mas
podemos sentar aqui por um tempo e esperar por ele. Tenho certeza
de que Margarida não vai se importar.
E antes que eu possa terminar as últimas palavras, Easton me
puxa para ele, então eu sento entre suas pernas, seus braços em
volta do meu corpo, me segurando contra ele.
— Vamos esperar por ele? — Ele rosna de brincadeira.
— Sim. — Tento me afastar.
— Você tem todo o homem que precisa bem aqui.
— Ah, pelo amor de Deus. — Eu reviro meus olhos.
— Você está discordando?
Eu paro de lutar.
— Não. Eu tenho tudo que preciso bem aqui.
Seus braços afrouxam um pouco, e ele me abraça
carinhosamente.
— É lindo aqui — ele murmura. — Quase como um cenário de
livro de romance.
— Cenário de livro de romance? — Reviro os olhos e balanço a
cabeça.
— Não me culpe por tentar. — Ele ri. — Sério, eu entendo por
que você gosta tanto daqui.
— É um dos meus lugares favoritos em todo o mundo. Eu ainda
posso ver Ford correndo até ali, pensando que poderia ser um
espantalho humano, mas falhando miseravelmente, já que não
conseguia ficar parado por mais de um minuto. Ou meu pai me
ensinando a rebater uma bola de beisebol do lado de lá. — Eu
aponto para a nossa esquerda, onde Margarida está perseguindo
uma borboleta que parece estar brincando com ela. — Tantas
memórias aqui. Tanta coisa boa aconteceu aqui.
— Eu fico feliz que você tenha isso tudo.
— Eu também.
A grama alta se mexe enquanto a brisa sopra pelo campo e as
memórias repletas de felicidade continuam a surgir em minha
mente.
E então eu me lembro de algo.
— Você vai me contar o que meu pai disse para você na varanda
quando viemos aqui há um tempo?
— Que curiosidade. Dois caras não podem guardar um segredo?
— ele provoca enquanto vira para que possa ver meu rosto.
— Não. Não de mim.
— Veremos — ele murmura enquanto eu o toco. Ele pega minha
mão em um movimento inesperado e me beija na palma. Quando
ele olha para mim, há uma intensidade em seus olhos que faz com
que as palavras brincalhonas morram em meus lábios. — Seu pai
me disse para cuidar de sua garotinha. Para deixá-la ser teimosa,
mas saber como dobrar sua vontade. Para deixá-la ser feminina,
mas me certificar de que ela coloque os dedos na lama de vez em
quando. Para deixá-la correr através de um campo com flores no
cabelo com tanta paixão quanto ela coloca na cura de seus
pacientes. E o mais importante, deixá-la amar com uma mente clara
e um coração completo.
Eu sou uma maçaroca de lágrimas. Eu nem consigo soluçar
enquanto Easton se inclina para frente e beija as lágrimas do meu
rosto. Cada emoção em mim é uma confusão de contradições.
— Eu prometi a ele que faria isso, SCOUT. Eu quero todas essas
coisas para você. As flores nos seus cabelos, a lama nos seus
dedos, a teimosia que me coloca no meu lugar, o doce, o sexy e
tudo que houver no meio. A primeira vez que fomos à minha casa,
você colocou uma marca no meu coração e então fugiu. E eu acho
que é o momento perfeito para passar para o próximo capítulo e
começar uma vida juntos. Eu te amo, Scout Dalton. Eu amo suas
partes que ninguém mais sabia como amar, assim como você faz
comigo. Então tem uma pergunta que eu quero fazer.
Meu coração está batendo forte, e as lágrimas estão caindo, e as
mãos estão tremendo, mas posso ouvir suas palavras. Eu posso ver
a caixa que ele abre, onde dentro repousa um anel de diamante
simples, que é o meu anel perfeito.
— Você quer se casar comigo?
— Sim — eu sussurro enquanto coloco minhas mãos em suas
bochechas e pressiono meus lábios nos dele repetidamente
enquanto digo sim várias vezes.
Ele passa os braços ao meu redor e me segura com força antes
de gritar:
— Ela disse sim!
Eu me assusto com o som de aplausos vindos da casa. Eu olho
para Easton e depois para onde papai e Sally estão olhando
ansiosamente em nossa direção.
— Eu não tinha certeza se ele ainda estaria aqui até o
casamento, então queria que ele estivesse para a segunda melhor
coisa, o pedido. Era importante para ele saber que eu cuidaria de
você já que ele não vai poder.
E então a ficha cai.
Ele planejou isso.
Meu pai não estava dormindo.
A cesta de piquenique estava pronta, nos esperando.
Eu olho para ele enquanto as lágrimas caem novamente.
— Obrigada. — Ele não tem ideia do quanto esse gesto simples
significa para mim. Eu acho que ele nunca saberá.
Mas estou de pé e correndo em direção à casa.
Com a Margarida latindo atrás de mim.
Através de um campo.
Com o coração completo.
E flores no meu cabelo.
Para abraçar meu pai.
5 anos depois

— FAZENDO O PRIMEIRO ARREMESSO DA NOITE, NÓS TEMOS A PRESENÇ


favoritos do público, Easton Wylder.
Eu assisto da beirada do campo enquanto Easton caminha em
direção ao monte do arremessador com Ford e Fenway em cada um
de seus braços.
A multidão presente assobia e grita enquanto ele atravessa o
campo, seu sorriso um reflexo do amor sendo derramado sobre ele.
O amor que ele merece e mais um pouco.
Quando ele chega ao monte, se agacha e coloca Ford com seu
pequeno uniforme dos Aces e, em seguida, Fenway com sua roupa
de líder de torcida dos Aces. Ele beija os dois no topo da cabeça e
pega a bola.
— Ok, senhoras e senhores, vamos ver se Easton ainda tem o
toque mágico.
Quando ele joga com uma mira perfeita para o receptor, a
multidão enlouquece e me faz pensar se isso é um momento
agridoce para ele.
— E ele ainda tem. Isso foi um strike. Mas, oh, espere. Parece
que o pequeno Ford também quer fazer um lançamento.
Não entendendo o que está acontecendo, e como ele está
acostumado a jogar com o papai, Ford corre em direção ao receptor
para pegar a bola. O receptor, Wingar, entrega a bola para Ford, que
então joga para Easton, a bola quicando algumas vezes antes de
Easton a pegar.
— E esse foi um grande lance do carinha. E, oh. — o locutor ri
junto com a multidão. — Lá vem Fenway para ter sua vez, e a julgar
pelas mãos nos quadris, ela não vai a lugar algum até que consiga
arremessar também.
Wingar se agacha atrás da home plate enquanto Easton coloca
Fenny um pouco mais perto. Ela joga a bola e, mesmo que pare
bem antes de onde está Wingar, ela joga os braços para o ar em
uma dança da vitória antes de acenar com entusiasmo para todas
as pessoas que a observavam.
— Ótimo trabalho, Wylders. Parece que pode haver outro, quem
sabe dois outros, no Hall da Fama da família.
Easton começa a voltar em minha direção, Fenny em uma mão e
Ford já correndo na frente. Meu pai teria adorado ver isso.
Seus dois netos — um com o nome de seu filho e o outro com o
nome de seu estádio favorito — assumirem o comando no campo
do Estádio dos Aces.
Sufocando as lágrimas, penso em como ele ficaria orgulhoso. Eu
olho em direção ao banco de reservas e imagino-o sentado ali, com
um enorme sorriso no rosto, levantando os polegares como ele
costumava fazer quando eu era uma garotinha.
E quando eu olho de volta para Fenny e Ford e depois para
Easton, eu não poderia estar mais orgulhosa desses três, embora
esse também seja um momento agridoce para mim. Quatro anos e
meio. Cinquenta e quatro meses desde que eu o perdi, e ainda sinto
falta dele todos os dias.
Eu noto Easton olhando para as arquibancadas, onde Cal está
sentado em seu papel oficial para a equipe. Seus olhos se
encontram brevemente, um rápido reconhecimento, antes que ele
olhe para um assento acima do lado oposto ao banco de reservas,
onde sua mãe se senta nervosamente em uma das raras ocasiões
em que sai de seu trailer.
Demorou muito para convencê-la a vir e sentar no meio da
multidão, mas o esforço valeu a pena, porque Easton merecia tê-la
aqui esta noite. Ter seus pais aqui, independentemente do status de
seu relacionamento, que ainda é um trabalho em andamento.
— Espere um segundo, Easton — diz Boseman enquanto se
dirige para o campo. Há uma expressão curiosa no rosto de Easton.
— Enquanto nós temos você aqui, pensamos que poderíamos fazer
algo por você.
Easton olha para mim, os olhos procurando para ver se eu sei o
que está acontecendo. Tudo o que faço é dar de ombros e dar a ele
um grande sorriso. Ford estende a mão e segura a minha enquanto
Boseman continua a falar.
— Tivemos você durante a maior parte de sua carreira. Mesmo
quando você nos deixou por um curto período, ainda te
considerávamos um Ace. E aí você voltou para jogar sua última
temporada conosco, e não poderíamos ter ficado mais felizes por
você ter decidido terminar onde começou há muito tempo. Quando
você se aposentou, nós sabíamos que você tinha feito isso por um
bom motivo, para que não perdesse um único dia da vida dos
gêmeos, mas a cidade de Austin ainda odiava ver você ir embora. E
agora que você é o principal analista de beisebol da Fox Sports, não
poderíamos estar mais orgulhosos. E para lembrá-lo de que você
sempre tem uma casa aqui, que você sempre será um Ace,
gostaríamos de aposentar oficialmente o número da sua camisa.
Eu amo o olhar chocado no rosto de Easton. Os olhos
arregalados e o sorriso tão grande, que é contagioso. Adoro o fato
de Ford e Fenny estarem aqui para fazer parte disso, embora eles
possam não se lembrar desse momento futuramente.
E então uma faixa verde na parede externa é puxada para baixo
e lá, ao lado do número vinte e dois de seu pai, está o número
quarenta e quatro de Easton.
— Vamos relembrar um pouco de sua incrível carreira. Parabéns,
Easton.
Boseman aperta a mão de Easton enquanto a multidão grita alto
e, em seguida, ele aponta para o telão, onde um vídeo com os
momentos marcantes da carreira de Easton está passando.
Mas eu não me viro para assistir. Em vez disso, vejo meu marido
enquanto ele encara a parede central do campo com lágrimas nos
olhos, verdadeiramente tocado por esse gesto de Boseman.
O vídeo acaba, e Fenny bate palmas, daquele jeito
descoordenado que as crianças de dois anos fazem, antes de dar
um beijo em sua bochecha.
Boseman entrega o microfone a Easton e dá um passo para trás.
— Obrigado. Isso foi totalmente inesperado. Estou um pouco
sem palavras, para ser honesto. — Ele balança a cabeça e respira
fundo. — Houve apenas uma coisa que amei mais do que o
beisebol e ser um Austin Ace, e essa coisa é minha família. Scout,
Fen e Ford. Eu sabia que seria difícil deixar o jogo. Eu sabia que
tinha ultrapassado os limites com meu ombro. E então, quando
esses carinhas aqui nasceram, eu queria ter certeza de que estaria
presente em todas as fases de sua infância. Eu queria estar em
casa para colocá-los para dormir todas as noites, em vez de viajar
de cidade em cidade, ir de jogo em jogo. Aquilo era importante para
mim. Então eu tomei a decisão de sair do jogo que amo antes do
tempo, de abandonar os números que persegui e ir embora
enquanto estava no auge para ser a única outra coisa que eu
deveria ser além de um jogador de beisebol: um pai. Eu pensei que
me arrependeria por sair. Achei que meus dias enquanto jogador
seriam esquecidos… Então isso é realmente uma surpresa. Estou
honrado por ter jogado a maior parte da minha carreira aqui, e agora
sempre farei parte dos Aces como eles sempre farão parte de mim.
Obrigado a todos pelo seu amor e apoio ao longo dos anos.
Obrigado.
Os fãs se levantam um por um. Os aplausos ficam mais altos.
Mais pessoas se levantam e, antes que eu perceba, todo o estádio
está de pé prestando homenagem a Easton.
Arrepios marcam minha pele, e fico com o coração
transbordando enquanto Easton tira seu boné e o inclina para a
multidão antes de colocá-lo na cabeça de Fenny. Seu rosto
desaparece sob a aba e tudo que você pode ver são seus cachos
saindo por trás do boné.
Com a mesma graça de quando jogou, Easton sai do campo,
mais uma vez. E quando ele me alcança, ainda há lágrimas em seus
olhos. Ele luta para detê-las.
— Surpresa.
— Você sabia?
— Claro que sim. Parabéns, garanhão.
Ele coloca Fenway no chão e me puxa para um abraço.
— Obrigado — ele sussurra um pouco acima do barulho da
multidão. — É por sua causa, Scout. Por sua causa, não me
arrependo de nada.
E quando eu me inclino para trás, seus lábios estão nos meus.
Ele não se importa com as milhares de pessoas ao nosso redor.
Ou as crianças de dois anos que se agarram às nossas pernas
querendo atenção.
Ou as câmeras clicando em cima da gente.
Ele me beija como se eu fosse a única pessoa no mundo.
Ele me beija com a mente clara e o coração completo.
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