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MEIO AMBIENTE DO TRABALHO

O meio ambiente do trabalho (MAT) é o local onde as pessoas desempenham suas


atividades laborais, remuneradas ou não, cujo equilíbrio está baseado na salubridade do
meio e na ausência de agentes que comprometam a incolumidade físico-psíquica dos
trabalhadores, independentemente da condição que ostentem.

O marco histórico mais relevante do nascimento do Direito Ambiental foi a


Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente Humano, ocorrida em Estocolmo,
na Suécia, no ano de 1972. Como fruto da conferência, firmou-se o documento conhecido
como Declaração sobre o Meio Ambiente Humano (ou Declaração de Estocolmo),
consubstanciado em vinte e seis princípios que possuem, no dizer de Valerio de Oliveira
Mazzuoli, “a mesma relevância para os Estados que tiveram a Declaração Universal dos
Direitos Humanos” (MAZZUOLI, Valerio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. 4
ed. Rev., ampl. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, p. 889).

Não obstante, frise-se que a Declaração Universal dos Direitos do Homem


(aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948) já
estabelecia a seguinte disposição:

Art. 23 – 1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de


emprego, às condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o
desemprego.

Com efeito, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 acolheu as


aspirações ideológicas da época em que foi promulgada e consagrou o direito social à
saúde, à segurança e à previdência social insculpido no artigo 6º em norma de observância
obrigatória, de caráter cogente, como consequência direta da dicção de seu artigo 1º, inciso
V, que consagra o valor social do trabalho. Mais adiante, o artigo 193, igualmente da Carta
Política, estabelece que “A ordem social tem como base o primado do trabalho e como
objetivo o bem-estar e a justiça sociais”.

Nesse contexto, o meio ambiente (natural, artificial, cultural e do trabalho) higido


passou a integrar rol dos direitos fundamentais e ser condição de existência das gerações
presentes e futuras da humanidade, tendo por objetivo o respeito à dignidade da pessoa
humana (art. 1º, III da CRFB/88).

À luz do artigo 3º, I, da Lei nº 6.938/81 (Lei de Política Nacional do Meio Ambiente),
define-se o meio ambiente do trabalho como o conjunto de condições, leis, influências e
interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas
as suas formas.

Conforme se observa da Lei Maior de 1988, garante-se ao trabalhador o direito à


redução dos riscos ao trabalho, por meios de normas de saúde, higiene e segurança:

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que
visem à melhoria de sua condição social:
[...]

XXII - redução dos riscos inerentes ao trabalho, por meio de normas de


saúde, higiene e segurança;

No mesmo seguimento, o art. 225, caput, da Maior, estatui que “Todos têm direito ao
meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia
qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e
preservá- lo para as presentes e futuras gerações”.

Os artigos 196 ao 200 da Carta Constitucional consignam que a saúde é direito de


todos e dever do Estado em garantir e promover a sua efetividade, mediante políticas,
ações e serviços públicos de saúde, organizados em um sistema único, que podem ser
complementados por outros serviços de assistência à saúde prestados por instituições
privadas. Tais ações e serviços são de relevância pública, cabendo ao Poder Público dispor,
nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua
execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou
jurídica de direito privado.

Nessa toada, vale destacar o artigo 200, VIII, da CRFB/88, in verbis:

Art. 200. Ao sistema único de saúde compete, além de outras atribuições,


nos termos da lei:

[...]

VIII - colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do


trabalho.

Com base na fundamentação constitucional supra, resta cristalino que o meio


ambiente laboral adequado e seguro é direito fundamental do cidadão trabalhador, o qual,
quando desrespeitado, provoca agressões a toda a sociedade. Esta, no final das contas, é
quem custeia a Previdência Social (art. 194, da CRFB/88), ora responsável pelo SUS (art.
196 e ss, da CRFB/88).

O fato é que o comportamento empresarial de redução dos custos de produção por


meio da relativização de normas de meio ambiental laboral traz prejuízos à seguridade
social (art. 194, da CRFB/88), pois aumenta gastos públicos com o Sistema Único de Saúde
propriamente dito e com Aposentadoria por Invalidez (Código 92); Auxílio-Doença
Acidentário (Código 91) – inclusive com a estabilidade correspondente (art. 118, da Lei nº
8213/91; e Súmula 378 do TST) –; e Benefícios de Prestação Continuada (arts. 201, I e
203, V, da CRFB/88; arts. 42 e ss e arts 59 e ss, da Lei nº 8213/91; e art. 20 e ss, da Lei nº
8742/93).

No que tange às normas insculpidas na Consolidação das Leis do Trabalho, que


tratam do assunto, podemos destacar:
A Consolidação das Leis do Trabalho, por sua vez, trata da segurança e medicina do
trabalho trazendo importantes disposições de caráter preventivo, dentre as quais, dada sua
importância, destacam-se:

a) o art. 156, que trata da competência das DRTs sobre a orientação,


fiscalização, adoção de medidas de proteção ao meio ambiente do trabalho e
aplicação de penalidades no caso de descumprimento de normas atinentes;

b) o art. 157, que determina às empresas a obrigação de cumprir e fazer


cumprir as normas de segurança e medicina do trabalho, fornecendo
equipamentos necessários e orientando os trabalhadores;

c) o art. 158, que obriga os empregados a cumprir as normas ambientais


laborais, seguindo as orientações da empresa, sob pena de incorrer em ato
faltoso punível proporcionalmente à sua gravidade;

d) o art. 161, que assegura ao DRT, ante a existência de risco grave e


iminente para o trabalhador, interditar estabelecimento, setor de serviço,
máquina ou equipamento ou embargar obra, o que representa um dos mais
efetivos e ágeis instrumentos de prevenção do meio ambiente e de
eliminação de risco de vida para os trabalhadores;

Igualmente, o artigo 154 da CLT, preceitua que “a observância, em todos os locais


de trabalho, do disposto neste Capítulo, não desobriga as empresas do cumprimento de
outras disposições que, com relação à matéria, sejam incluídas em códigos de obras ou
regulamentos sanitários dos Estados ou Municípios em que se situem os respectivos
estabelecimentos, bem como daquelas oriundas de convenções coletivas de trabalho”.

Da mesma forma, o artigo 200 da CLT delegou competência normativa ao Ministério


do Trabalho e Emprego (MTE) para regulamentar e estabelecer disposições
complementares às normas de saúde e segurança laboral, tendo em vista as peculiaridades
de cada atividade ou setor de trabalho. Em cumprimento a esse comando legal, o MTE
editou a Portaria no 3.214/78, aprovando as Normas Regulamentadoras (NR) relativas à
saúde e segurança do trabalho.

Tais normas sobre Segurança e Medicina do Trabalho são de importância crucial nas
relações de trabalho, já que estabelecem condutas em benefício da saúde, do bem-estar e
da segurança do trabalhador, concretizando, nos planos legal e regulamentar, o comando
constitucional de redução dos riscos inerentes ao trabalho.

As normas regulamentadoras consubstanciam o mínimo a ser observado nas


relações de trabalho em matéria de saúde e segurança do trabalho, sendo que sua
transgressão implica violação ao direito constitucional ao meio ambiente hígido, no qual
está inserido o meio ambiente laboral.

Além disso, acrescenta o parágrafo 1º, do artigo 19, da Lei nº 8.213/91, que “A
empresa é responsável pela adoção e uso das medidas coletivas e individuais de proteção
e segurança da saúde do trabalhador”.
Também, não se pode olvidar do amparo da Lei nº 9605/98 (Lei de Crimes
Ambientais) que visa não apenas punir e coibir condutas criminosas em relação ao meio
ambiente, como também promover a preservação e reparação das áreas que sofreram
danos.

Ainda, vale registrar o Decreto nº 9.571/2018 que estabelece as Diretrizes Nacionais


Sobre Empresas e Direitos Humanos, preceituando que empresas deverão respeitar os
direitos humanos protegidos nos tratados internacionais e os direitos e as garantias
fundamentais previstas na Constituição, cabendo a estas monitorar a sua aplicação e
orientar e educar seus empregados sobre as normas internacionais e nacionais
relacionadas ao tema, inclusive comprometendo-se a cumprir os direitos humanos nas suas
relações internas e externas com os empregados, fornecedores e a sociedade em geral.

Em âmbito internacional, o meio ambiente do trabalho está tutelado por intermédio


das seguintes normas:

a) Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH), de 1948 - arts. 3º e


23;

b) Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais


(PIDESC), de 1966 e em vigor desde 1976 - arts. 7º e 12;

c) Declaração de Estocolmo sobre o Meio Ambiente Humano, de 1972;

d) Declaração do Rio de Janeiro sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento,


de 1992;

e) Convenções da OIT (destaca-se as de nº 155 e nº 161);

f) Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da


Costa Rica), de 1969 - arts. 1 e 26;

f.1) Recomendações 364/2021 e 123/2023 do CNJ;

g) Protocolo de San Salvador, de 1988 - arts. 6º, 7º, 10 e 11;

h) Princípios Orientadores da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos


(Princípio de Ruggie), de 2011;

i) Declaração Sociolaboral do MERCOSUL, de 2015 - arts. 17º e 18º;

j) Agenda 2030 da ONU - ODS 8 (Trabalho Decente e Crescimento


Econômico).

Por fim, convém elucidar acerca dos princípios constitucionais do direito ambiental
do trabalho, quais sejam:
a) o princípio do desenvolvimento sustentável ora estatuído no inciso VIII, do artigo 170
da CRFB/88, tendo em vista que a expressão “pleno emprego”, rechaça, por completo,
qualquer iniciativa, estatal ou privada, de precarização das relações de trabalho, enquanto o
desenvolvimento sustentável perpassa, necessariamente, pela garantia de um meio
ambiente laboral equilibrado, livre de fatores que comprometam a saúde física, mental e
emocional do trabalhador.

b) o princípio da prevenção que está no artigo 7º, XXII, da CRFB/88, uma vez que a
identificação de riscos inerentes ao trabalho permite a adoção de medidas inibitórias para a
proteção da saúde dos trabalhadores;

c) o princípio da precaução que também consta do inciso XXII do artigo 7º, da CRFB/88,
pois a postura de cautela perante os possíveis riscos não identificados irá também contribuir
para a redução de danos à saúde do trabalhador;

d) o princípio do poluidor-pagador igualmente respaldado no inciso XXII do artigo 7º da


CRFB/88, cujo sentido ético aponta para a justa distribuição das externalidades ambientais,
de sorte que o poluidor arque com o ônus da prevenção e da precaução (pagando para não
poluir) e dos danos gerados pela sua atividade (pagando porque poluiu).

e) o princípio do trabalho sem adjetivos decorre do caput do artigo 7º que, ao prever


direitos para os “trabalhadores”, tem potencial para alcançar, em certas situações, as mais
variadas espécies de trabalhadores (seja servidor estatutário, servidor comissionado,
autônomo, eventual, estagiário, voluntário, cooperado e entre outros), e, na matéria em
análise, em virtude do meio ambiente não ser cindível, os riscos para a saúde não
diferenciam trabalhadores em razão do regime jurídico de trabalho de cada um, de maneira
que a proteção ambiental destina-se em favor de todos os que estão sujeitos ao mesmo tipo
de risco.

f) o princípio da monetização do risco, previsto nos incisos XXIII e XXVIII, do artigo 7º da


CFRB/88, completa o sistema ao estipular medidas remuneratórias e indenizatórias em
favor daqueles em relação aos quais o risco transformou-se em dano concreto à vida ou à
saúde, o que não pode ser indiferente para um sistema jurídico que se proclama fundado na
dignidade humana.

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