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FACULDADE ÚNICA

DE IPATINGA

1
José Tadeu de Almeida

Doutor em História Econômica (2015) pela Universidade de São Paulo (USP), mestre em
Desenvolvimento Econômico (2010) e graduado em Ciências Econômicas (2008) pela
Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Atualmente (2022), cursa o pós-doutorado
em Ciências da Religião pela Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), pós-graduação
lato sensu em Liturgia pelo Centro Universitário Católico de Santa Catarina, e graduação
em Teologia pela Universidade São Francisco (USF). É autor e revisor técnico de livros
didáticos para as áreas de Ciências Humanas, Ciências Exatas e Ciências Sociais
Aplicadas, no Ensino Básico e no Ensino Superior, com várias obras publicadas.

COSMOGONIAS E COSMOLOGIAS:
ORIGENS DAS TRADIÇÕES RELIGIOSAS

1ª edição
Ipatinga – MG
2022

2
FACULDADE ÚNICA EDITORIAL

Diretor Geral: Valdir Henrique Valério


Diretor Executivo: William José Ferreira
Ger. do Núcleo de Educação a Distância: Cristiane Lelis dos Santos
Coord. Pedag. da Equipe Multidisciplinar: Gilvânia Barcelos Dias Teixeira
Revisão Gramatical e Ortográfica: Izabel Cristina da Costa
Revisão/Diagramação/Estruturação: Bruna Luiza Mendes Leite
Fernanda Cristine Barbosa
Guilherme Prado Salles
Thaynara Eloisa da Silva
Design: Bárbara Carla Amorim O. Silva
Élen Cristina Teixeira Oliveira
Maria Eliza Perboyre Campos

© 2021, Faculdade Única.

Este livro ou parte dele não podem ser reproduzidos por qualquer meio sem Autorização
escrita do Editor.

Ficha catalográfica elaborada pela bibliotecária Melina Lacerda Vaz CRB – 6/2920.

NEaD – Núcleo de Educação a Distância FACULDADE ÚNICA


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Anexo 03 – Bairro Bethânia – CEP: 35164-779 – Ipatinga/MG
Tel (31) 2109 -2300 – 0800 724 2300
www.faculdadeunica.com.br

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Menu de Ícones
Com o intuito de facilitar o seu estudo e uma melhor compreensão do conteúdo
aplicado ao longo do livro didático, você irá encontrar ícones ao lado dos textos. Eles
são para chamar a sua atenção para determinado trecho do conteúdo, cada um
com uma função específica, mostradas a seguir:

São sugestões de links para vídeos, documentos


científicos (artigos, monografias, dissertações e teses),
sites ou links das Bibliotecas Virtuais (Minha Biblioteca e
Biblioteca Pearson) relacionados com o conteúdo
abordado.
Trata-se dos conceitos, definições ou afirmações
importantes nas quais você deve ter um maior grau de
atenção!

São exercícios de fixação do conteúdo abordado em


cada unidade do livro.

São para o esclarecimento do significado de


determinados termos/palavras mostradas ao longo do
livro.
Este espaço é destinado para a reflexão sobre
questões citadas em cada unidade, associando-o a
suas ações, seja no ambiente profissional ou em seu
cotidiano.

4
SUMÁRIO

UNIDADE COSMOGONIAS E COSMOLOGIAS: UMA INTRODUÇÃO ....................... 8

01
1.1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 8
1.2 A DEFINIÇÃO DE COSMOGONIA .......................................................................... 9
1.3 A COSMOLOGIA NA PERSPECTIVA DA RELIGIOSIDADE INDIVIDUAL ............... 12
1.4 COSMOLOGIAS, COSMOGONIAS E A ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO ........... 16
1.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 19
FIXANDO O CONTEÚDO ...................................................................................... 21

UNIDADE AS COSMOGONIAS FUNDADORAS DO MUNDO: MITOS E NARRATIVAS


DE ORIGEM .............................................................................................. 27

02
2.1 INTRODUÇÃO........................................................................................................ 27
2.2 O CAOS E O LUGAR DA DIVINDADE NOS MITOS DE CRIAÇÃO ........................ 27
2.2.1 Caos e Criação ..................................................................................................30
2.3 A COSMOGÊNESE NAS TRADIÇÕES RELIGIOSAS DO OCIDENTE....................... 32
2.4 UM OLHAR SOBRE AS COSMOGONIAS INDO-ASIÁTICAS ................................. 35
2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 36
FIXANDO O CONTEÚDO ...................................................................................... 38

UNIDADE O NASCIMENTO DO SER HUMANO SEGUNDO ALGUMAS


COSMOGONIAS ORIGINÁRIAS .............................................................. 44

03 3.1
3.2
3.3
3.4
3.5
INTRODUÇÃO........................................................................................................ 44
O SOPRO DA VIDA E O SURGIMENTO DO INDIVÍDUO ....................................... 44
A RELAÇÃO ENTRE SERES DIVINOS E SERES MORTAIS ........................................ 48
DEUSES, ANIMAIS REAIS E ANIMAIS FABULOSOS ............................................... 54
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 56
FIXANDO O CONTEÚDO ...................................................................................... 58

UNIDADE NARRATIVAS ORAIS COMO FORMAÇÕES RELIGIOSO-MITOLÓGICAS 64

04
4.1 INTRODUÇÃO........................................................................................................ 64
4.2 A IMPORTÂNCIA DA TRADIÇÃO ORAL NA EXPRESSÃO RELIGIOSA ................. 65
4.3 NARRATIVAS ORAIS, LITERATURA DE CORDEL E A RELIGIOSIDADE POPULAR NO
BRASIL .................................................................................................................... 70
4.4 AS VISÕES DO FIM E A NARRATIVA RELIGIOSA .................................................. 75
4.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 80
FIXANDO O CONTEÚDO ...................................................................................... 82

UNIDADE ELEMENTOS FUNDADORES DAS COSMOLOGIAS GRECO-ROMANAS .. 89

05
5.1 INTRODUÇÃO........................................................................................................ 89
5.2 OS FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS ....................................................................... 89
5.3 A RELIGIÃO ÓRFICA ............................................................................................. 93
5.4 O PITAGORISMO................................................................................................... 95
5.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ..................................................................................... 98
FIXANDO O CONTEÚDO .................................................................................... 100

UNIDADE COSMOGONIAS E A FILOSOFIA: UM PERCURSO HISTÓRICO ............. 106

06
6.1 INTRODUÇÃO...................................................................................................... 106
6.2 PLATÃO E O DUALISMO ALMA E CORPO .......................................................... 106
6.3 ARISTÓTELES E OS CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA METAFÍSICA ................... 110
6.4 A ESCOLÁSTICA E A LÓGICA ARISTOTÉLICA NO MUNDO MEDIEVAL ............ 113
6.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 117

5
FIXANDO O CONTEÚDO .................................................................................... 119

RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO ............................................. 125

REFERÊNCIAS ......................................................................................... 126

6
CONFIRA NO LIVRO

Nesta Unidade, você poderá obter uma visão abrangente a


respeito da importância das Cosmogonias e Cosmologias para o
pensamento religioso; Este estudo irá orientar-lhe para compreender
de que modo a Antropologia da Religião concebe a criação de
diferentes formas de culto a partir das compreensões dos indivíduos
sobre o Universo e sua própria realidade.

O objetivo principal desta Unidade é o de resgatar diferentes


tradições religiosas orientais e ocidentais, para criar uma
concepção ampla a respeito dos processos de desenvolvimento
destas matrizes de culto. Desta forma, você poderá avaliar como as
narrativas de origem apresentam uma convergência em relação à
dualidade entre a (s) divindade (s) e o ‘caos primitivo’.

Ao longo desta Unidade, você terá condições de analisar em maior


detalhe as concepções religiosas acerca do ser humano: os mitos
de criação associam o sagrado à realidade natural, criando uma
relação que contempla a transcendência e a imanência em
diferentes ritos e tradições culturais.

Esta Unidade integrará aspectos da Teologia, da Sociologia e da


Antropologia para fornecer um conjunto de observações a respeito
das tradições religiosas brasileiras e a produção de Cosmologias a
partir de narrativas orais e da literatura popular, as quais se
constituem como chaves interpretativas do campo religioso.

Esta Unidade pretende fornecer, em uma perspectiva


interdisciplinar, uma reflexão a respeito das Cosmogonias da
civilização greco-romana, a partir de mitos de criação e
concepções filosóficas que influenciaram objetivamente o
Cristianismo e a cultura ocidental.

O objetivo desta unidade é o de consolidar as abordagens


propostas ao longo do livro-texto, mediante o estudo das
referências da cultura greco-romana para compreender a
construção das interpretações religiosas cristãs no período
medieval, as quais são fundamentais para a compreensão da
cultura cristã e seu pensamento teológico e social.

7
COSMOGONIAS E COSMOLOGIAS: UNIDADE
UMA INTRODUÇÃO

1.1 INTRODUÇÃO
01
Prezado estudante, seja bem-vindo ao estudo desta disciplina. Por meio dos
conceitos e conteúdos que serão apresentados ao longo deste livro-texto, você
poderá observar de que modo as diferentes tradições religiosas conceberam
estruturas narrativas e contos que justificam e sintetizam o surgimento da vida
humana e da ordem natural, como parte de um programa preestabelecido que
concebe a influência da(s) divindade(s) em relação ao universo e às pessoas.
Desta forma, a importância destas tradições é observada a partir de um
conjunto de explicações objetivas a respeito da existência, como parte de uma
relação entre o mundo natural e as instâncias sobrenaturais. Desta forma, a
experiência religiosa se consolida para justificar ao ser humano as motivações
fundamentais da sua existência, e o fenômeno religioso desenvolve, por meio de
rituais elaborados, um processo de associação intrínseca e permanente entre a
pessoa e o sagrado.
Ou seja, estas narrativas a respeito de diferentes etapas e contextos do
universo permitem desenvolver razões que levam a pessoa religiosa a convencer-se
de sua importância como um elemento dentro da ordem estabelecida pelo sagrado.
Estas narrativas, quando observadas a partir de uma abordagem antropológica e
teológica, permitem revelar o modo de organização das civilizações e sociedades a
respeito de seu tempo e seu espaço, a partir de diferentes mitos e relatos associados
a fatos extraordinários que ocorreram em tempos imemoriais.
Deste modo, este livro-texto pretende apresentar, de uma forma bastante
objetiva, as diferentes concepções da tradição religiosa oriental e ocidental que
foram fundamentais para o desenvolvimento de compreensões a respeito do
universo e a aspectos correlatos à existência humana.
A criação do mundo, o surgimento do homem, a relação entre o divino e o
humano apresentam-se como contextos ilustrados por relatos cuja influência vai além

8
dos limites da religião, consolidando-se, portanto, como fatores que organizam e
sintetizam a vida em sociedade ao longo da história.
Enfim, está pronto para começar? Então, bons estudos!

1.2 A DEFINIÇÃO DE COSMOGONIA

Desde os primórdios da civilização – ou mais propriamente, do


desenvolvimento da racionalidade individual na Pré-História – os seres humanos
procuram compreender, de algum modo, as lógicas que estão contidas no universo
e no mundo natural. Deste modo, a preocupação sobre a origem das coisas, e de
todo o universo, motiva os indivíduos a diferentes perguntas cuja resposta nem
sempre pôde ser encontrada na natureza ou a partir do conhecimento que se
dispunha até aquele momento.
Assim sendo, questões fundamentais para a vida humana, tais como ‘de onde
viemos’ ou ‘Para onde vamos’ não fazem parte de uma série de indagações infantis
a respeito da vida: estas questões são essenciais para articular formas de convívio
entre indivíduos, gerando concepções e interpretações sobre a realidade que
utilizam, em muitos casos, o fenômeno religioso e os elementos de crença para
justificar, de alguma forma, o funcionamento do universo em suas diferentes
determinações (CORDI et al., 2003).
Em outras palavras, é possível perceber que as pessoas estão atentas a
entender um pouco mais a respeito de suas próprias origens: as instituições familiares,
as formas de vida social, a história contida em cada grupo ou população,
constituem-se como formas de inserir o ser humano em uma lógica de tempo: este
tempo, vale dizer, vai além de uma simples sequência cronológica, pautada por
datas de nascimento e morte: trata-se, na verdade, de localizar a pessoa em um
conjunto de relacionamentos que define o seu lugar no espaço.
Para entender melhor esta dinâmica, pode-se partir de um exemplo: você,
enquanto ser humano inserido em uma sociedade, certamente dispõe de laços
familiares, sociais, profissionais, religiosos, etc., que o conectam a uma sociedade,
real ou virtual (como ocorre no âmbito das redes sociais). Estes elos podem ajudá-lo
a entender o seu próprio sentido de vida: você descende de um grupo enorme de
pessoas (quatro avôs, oito bisavôs, dezesseis trisavôs etc) e está inserido em um
complexo de relações em sociedade, a partir da vida acadêmica, profissional,

9
religiosa, etc (ARANHA; MARTINS, 2005).
Assim, você pode explicar uma parcela de sua realidade a partir destas formas
de convívio em sociedade: é fortemente provável que você deva se lembrar da sua
escola, dos amigos de infância, etc. Mas, o ser humano precisa transcender esta
abordagem, isto é, necessita compreender a origem da sua existência e do mundo
no qual ele nasce, cresce, se reproduz... e por fim, morre.
Para viabilizar estas compreensões e concepções a respeito da natureza e da
existência, as civilizações construíram argumentos e análises que justificavam esta
ordem estabelecida a partir do discurso religioso. Ou seja, estes grupos
desenvolveram métodos e narrativas que conferem uma sustentação real à vida
humana a partir de suas questões existenciais (PHILIP, 1996).
Consequentemente, é possível pensar nestas narrativas como parte de um
conjunto de conceitos que procura compreender uma ‘linha do tempo’ na qual o
universo existe, se reproduz e, hipoteticamente, atinge a finitude – como ocorre, por
exemplo, nas concepções cristãs que associam a existência em um tempo bíblico
que decorre da criação (Gênesis) até o fim de todas as coisas (o Apocalipse).

Figura 1: Representação medieval para o Apocalipse bíblico

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3KFOtRC. Acesso em: 20 jan. 2022.

A partir desta síntese teórica, podemos delinear o conceito de Cosmogonia, o


qual remete a uma série de conceitos que conferem significado à vida humana a
partir de uma ordem natural. Este conceito deriva do grego, a partir da expressão

10
cosmos (‘ordem’, ‘harmonia’) e gónos, isto é, ‘criar’ ou ‘conceber’. Portanto, uma
Cosmogonia é criada a partir da necessidade de compreensão das ordenações e
lógicas do espaço natural, e em particular, para explicar a criação de todas estas
coisas (STEINER, 2006).
As Cosmogonias associam-se, via de regra, ao conhecimento religioso e às
diferentes expressões doutrinárias que definem os cultos em uma sociedade: ou seja,
uma Cosmogonia se estrutura como parte de uma crença, que pode estar ligada a
relatos primitivos (mitos) a respeito de acontecimentos fabulosos em épocas remotas,
nas quais a ordem – isto é, a harmonia, o espaço – substitui um vazio (caos) no qual
nada existe com exceção da(s) própria(s) divindade(s) – como o Deus dos cristãos, o
único ser existente antes de todos os tempos (para além, inclusive, do Bem e do Mal,
de acordo com o relato bíblico).
Portanto, uma Cosmogonia é criada com o objetivo de elucidar dúvidas
humanas a respeito do surgimento do universo e da vida nas suas diferentes
expressões (MOZENA, 2018).

A história, as lendas e a religião formam um núcleo sobre o qual as civilizações


estruturam seus padrões culturais e reforçam suas crenças, ordenando a realidade e
conferindo significado à realidade imanente (material) do ser humano, frente à
necessidade de justificativa ao seu próprio existir (RODRIGUES, 2007).
Estas Cosmogonias, existentes em grande número, se multiplicaram à medida
que os seres humanos estruturaram-se em grupos sociais distintos, e, com o
aprimoramento do conhecimento científico, novas concepções foram criadas,
dando margem ao surgimento de importantes Cosmologias, de acordo com o
conteúdo a ser apresentado na próxima seção.

11
1.3 A COSMOLOGIA NA PERSPECTIVA DA RELIGIOSIDADE INDIVIDUAL

O conceito de Cosmologia associa a ideia de ordem (cosmos) a um estudo,


análise ou discussão a respeito de um determinado assunto (logos). Portanto, uma
Cosmologia representa um processo de refinamento do conhecimento gerado no
âmbito das sociedades, de modo a utilizar a racionalidade como elemento
interpretativo dos processos comuns à vida natural (MOZENA, 2018).
Ou seja, uma Cosmologia se desenvolve no momento em que o
conhecimento religioso é complementado (e em larga metida substituído) pelo
conhecimento científico, cujo método analítico confere menor significação à
necessidade de inserção do divino como fator explicativo da vida natural.
Você pode, portanto, verificar que a Cosmologia é desenvolvida a partir de
diferentes expressões do saber humano, os quais são elaborados visando,
essencialmente, explicar a origem do universo e a sua evolução a partir de narrativas
estruturadas de acordo com gêneros literários e concepções do pensamento
racional de cada momento e tempo histórico. Estas Cosmologias, inclusive, possuem
um estilo próprio e são codificadas de modo a serem compreendidas, avaliadas e
absorvidas pelos povos em conformidade com os saberes práticos e as teorias de seu
próprio contexto social (STEINER, 2006).
Assim, observe que a elaboração de uma Cosmologia apresenta elementos
comuns a uma Cosmogonia, pois ambos têm o mesmo objeto de interesse – a ordem
estabelecida no universo – e se dedicam a oferecer motivações e fatores explicativos
para o surgimento desta ordem. Entretanto, há conceitos importantes que
diferenciam as Cosmogonias e as Cosmologias: as primeiras se associam
intrinsecamente aos mitos de criação e ao conjunto de crenças de uma
determinada sociedade, ainda que seja admissível a presença de elucidações
racionais para a compreensão da ordem natural.
Em uma Cosmologia, por sua vez, há um esforço maior em desenvolver
narrativas codificadas sobre suportes específicos, como a escrita por exemplo; assim,
este gênero narrativo fixa-se no tempo e se estabelece como referencial para as
demais expressões objetivas (racionais e científicas) destas civilizações, por meio da
Arquitetura, da Música, da Oratória, etc (CORDI et al., 2003).

12
Por exemplo, ao observar os saberes contidos nas poesias do poeta grego
Homero (928 – 898 a.C), o pesquisador terá condições de observar não apenas uma
série de poesias escritas com o objetivo de entreter o seu público, mas sim, um
conjunto de observações historicamente determinadas a respeito da vocação dos
gregos para a superação de grandes desafios, como o de vencer os troianos em uma
guerra prolongada.
Nesta narrativa, Homero absorve conceitos de seu tempo a respeito das
Cosmogonias religiosas que enfatizavam o convívio primitivo entre deuses e homens,
gerando heróis que se destacavam em batalhas e momentos épicos, tais como o
guerreiro Aquiles, o rei Ulisses (Odisseu) com sua sabedoria, a experiência do rei idoso
Nestor, etc. Assim, as poesias de Homero, descritas na Ilíada e na Odisseia, elaboram
uma Cosmologia importante a respeito da civilização grega, descrevendo saberes e
ações que eram adotadas por este povo nas especificidades de seu contexto
histórico e social (BULLFINCH, 2000).

13
Figura 2: Representação contemporânea do cavalo de Troia (Turquia)

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3rkoQ0S. Acesso em: 20 jan. 2022.

A compreensão dos gregos associava a Terra como um espaço onde a Grécia


assumia uma posição central, e seus deuses, no alto do Monte Olimpo, regiam não
apenas o planeta, mas todo o universo no qual os gregos estavam inseridos e
assumiam um protagonismo relevante. Estes saberes serão mobilizados ao longo
deste livro-texto para descrever as concepções religiosas que orientaram a
civilização grega em seu percurso histórico, gerando a civilização greco-romana,
cuja Cosmologia influenciou diretamente o Cristianismo e as expressões filosóficas e
teológicas no Ocidente (PHILIP, 1996).

De toda forma, é importante destacar que as Cosmologias se constituem


como narrativas historicamente estruturadas que dialogam com o conhecimento
gerado em seu tempo histórico, em uma perspectiva inclusiva, e normalmente

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possuem uma autoria que confere credibilidade à obra e relevância social aos
objetos e conceitos descritos por esta Cosmologia.
Observando o contexto histórico e social do povo hebreu no Antigo
Testamento, por exemplo, você poderá observar que a criação dos cinco primeiros
livros bíblicos (o Pentateuco) é atribuída ao profeta Moisés. Assim sendo, a escrita da
Torah (a tradução judaica para os livros mencionados) ocorre por inspiração divina,
e contém saberes estruturados a partir de Sua palavra (de Yahweh), organizando a
sociedade e imprimindo formas de comportamento que se associam ao saber da
religião e ao conhecimento de mundo que era disponível a esta civilização em seu
contexto histórico de referência. A religião, portanto, pode absorver o conhecimento
presente e utilizá-la para favorecer o desenvolvimento da fé e dos elementos de
crença (RODRIGUES, 2007).

Figura 3: Judeus estudando os rolos da Torah

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3rkdpXl. Acesso em: 20 jan. 2022.

Deste modo, é importante ter em mente que as Cosmologias convivem com


as Cosmogonias: cada um destes conceitos relaciona-se a origens e finalidades
específicas, mas que convergem a um mesmo objeto: a existência humana e a
ordem vigente no universo. Por meio do resgate da Cosmologia grega e das
tradições do povo hebreu, por exemplo, você pode verificar que os povos e as
religiões apresentam concepções distintas a respeito de sua própria vocação
histórica e seu sentido de vida em um mundo regido pela dor e pelo sofrimento: os
hebreus consideram-se como o povo escolhido por Deus, enquanto os gregos
atribuem a si a centralidade em relação ao cosmos: a religião assume uma dimensão

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fundamental, mas não é a única instituição capaz de interpretar a realidade, muito
embora o sagrado faça parte do universo e o influencie diretamente (HELLERN;
NOTAKER; GAARDER, 2000).
Assim, ocorre um paralelismo importante entre as Cosmologias e a
religiosidade individual, pois a partir delas, o conhecimento humano se desenvolve e
se articula com os saberes religiosos e formas de culto, de acordo com o conteúdo
que será destacado com maior detalhe a seguir.

1.4 COSMOLOGIAS, COSMOGONIAS E A ANTROPOLOGIA DA RELIGIÃO

Ao tratar da temática das Cosmogonias e das Cosmologias, é razoavelmente


esperado pensar que existe uma relação hierárquica entre estes conceitos, como se
uma Cosmogonia fosse inferior a uma Cosmologia por ser baseada apenas em mitos
e no conhecimento religioso.
No entanto, a proximidade semântica e o objeto de estudo destas duas
categorias analíticas (o universo, a natureza e o ser humano) não implica em uma
relação de subordinação: cada um destes conceitos (a cosmogonia e a cosmologia)
procura entender e/ou explicar, à sua maneira, os elementos fundamentais que
condicionaram e viabilizaram o desenvolvimento do cosmos, da vida humana e das
diferentes civilizações.
Vale dizer, o fato de algumas Cosmogonias e Cosmologias terem sobrevivido
ao tempo, mantendo-se na tradição religiosa (como a Cosmogonia do povo hebreu
descrita na Bíblia), não implica igualmente no fato destas abordagens serem mais
importantes do que outras que ‘ficaram pelo tempo’: em outras palavras, é preciso
observar, a partir da Antropologia da Religião, que os saberes dos povos são únicos
e especiais na sua singularidade, e a Cosmogonia judaico-cristã, por exemplo,
observa as suas particularidades, assim como a Cosmologia greco-romana, a
Cosmogonia céltica ou a Cosmogonia nórdica (BULLFINCH, 2000).

16
No entanto, o discurso cristão prevaleceu no Ocidente, e as demais
concepções religiosas e racionais das antigas civilizações foram relegadas a segundo
plano, descritas como mitologias que narram fábulas sobre personagens heroicos e
inexistentes: a mobilização destes conhecimentos para a preservação da tradição
religiosa, inclusive, poderia ser compreendida como bruxaria por parte da Igreja, em
particular, durante o período medieval (SUFFERT, 2001).
O estudo das tradições religiosas, portanto, deve ser estabelecido com a
isenção e a neutralidade que são fundamentais ao método científico: a análise
comparativa das Cosmogonias e das Cosmologias revela, acima de tudo, uma
lógica que é subjacente a todos estes povos.
Isto é, cada civilização construiu princípios sobre as suas origens e seu próprio
destino, gerando proposições que se desdobram em outros conceitos. Esta relação
entre proposições gera, portanto, uma lógica que associa o conhecimento a um
sentido para a existência. Por exemplo, ao compreender a vida humana a partir do
exílio do Jardim do Éden, a Cosmogonia cristã associa a necessidade do trabalho
como elemento de sobrevivência após a perda do paraíso primitivo (CONE, 2021).

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Ao compreender estas Cosmologias, assim como as Cosmogonias, você
deverá observá-las não apenas como narrativas mitológicas, tal como se costuma
observar nas histórias em quadrinhos, onde heróis lutam entre si para salvar a
humanidade ou fazer valer sua força.
Na verdade, estas categorias analíticas definem modos de construção das
sociedades desde o início da civilização humana. Todas estas sociedades, desde os
indígenas mais isolados na Amazônia (que se organizavam em sociedade muito
antes de Abraão e dos hebreus) até a realidade atual, onde a ciência se impõe
como Cosmologia, compreendem a sua existência a partir da racionalidade
científica, da vontade dos deuses ou a partir de quaisquer elementos que sejam
capazes de sustentar uma narrativa coerente, gerando, assim, um significado à vida
humana em seu espaço natural (WRIGHT, 2004).
Ao viver no Brasil, um país moldado pela tradição cristã, é fortemente
provável que você tenha conhecimento a respeito de temas bíblicos
teologicamente relevantes, como as narrativas do Antigo Testamento que tratam da
criação do mundo, ou dos primeiros seres cuja duração de vida seria muito superior
à dos humanos, ou ainda, da destruição do mundo conhecido e do recomeço dos
tempos com a narrativa da arca de Noé.

18
Figura 4: Representação do século XVI para a narrativa da Arca de Noé

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3val9w5. Acesso em: 20 jan. 2022.

Todas estas passagens, a seu modo, remetem a tempos primitivos, onde a


existência de Deus antecede a todas as coisas, e seu papel ordenador da desordem
existente permitiu gerar tudo que há no universo, desde o Sol até Adão, o primeiro
homem (CONE, 2021).
Esta construção revela, portanto, uma Cosmogonia cuja influência estende-se
dos primórdios da organização social dos hebreus até a realidade do século XXI, em
debates que procuram, por exemplo, associar a criação da Terra ao desejo divino
há algumas dezenas de séculos, contrapondo-se à Cosmologia embasada no
discurso científico que insere o planeta em uma sequência de eventos
cientificamente determinados que remonta há bilhões de anos.

1.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Prezado estudante, ao longo desta Unidade, você teve condições de analisar


alguns conceitos teóricos que revertem para uma compreensão importante do
campo religioso e social na atualidade, e em particular, sobre as tradições religiosas

19
que moldaram o desenvolvimento das civilizações desde a Pré-história: ao associar a
vida humana e o universo à inspiração de um ser superior, cuja força suprema seria
capaz de organizar todo o caos, estes grupos e populações desenvolveram
concepções importantes para justificar a vida humana em um mundo hostil e sujeito
a diferentes formas de sofrimento.
Desta maneira, estas Cosmogonias e Cosmologias estão associadas a
narrativas que conferem não apenas um significado para todas as coisas (materiais
e imateriais) que existam na terra: por meio destas categorias analíticas, a pessoa
pode obter uma interpretação objetiva para a sua própria existência, revelando uma
vocação à vida que confere uma lógica para o convívio comum e para a vida em
sociedade.
À medida que estas sociedades evoluíram e se impuseram umas sobre as
outras, as visões e concepções racionais e religiosas acompanharam esta ‘marcha
da vitória’ e tornaram-se igualmente dominantes em relação a outras tradições: por
exemplo, o Cristianismo sobrepujou o Mitraísmo como elemento de vida e salvação
para os soldados do exército romano. Deste modo, o culto ao deus Mitra (uma
divindade persa a qual os romanos prestavam culto e sacrifícios) praticamente se
extinguiu, enquanto os cristãos representam, hoje, uma parcela significativa da
população mundial.
Existem, portanto, muitas (certamente milhares) de Cosmogonias e
Cosmologias que procuram observar, compreender e justificar a existência do
cosmos e do ser humano. O estudo destes conceitos, realizado a partir de um
percurso antropológico que observe fatores culturais nos mitos de criação, nas
narrativas sobre o ser humano e o fim da vida no planeta, permite analisar de que
modo os povos concebiam a si próprios em relação ao meio em que viviam e a outros
povos associados a narrativas fabulosas.
Portanto, neste momento, realizamos apenas uma breve delimitação teórica:
a avaliação objetiva das narrativas cosmogônicas e cosmológicas das civilizações
será parte fundamental dos objetos de estudo nas próximas Unidades.

20
FIXANDO O CONTEÚDO

1. A análise sobre as diferentes expressões do fenômeno religioso deve, a seu modo,


considerar a importância das Cosmogonias para a constituição de saberes
específicos que moldam as doutrinas e formas de culto que são inerentes ao
desenvolvimento das civilizações.

Desta forma, considerando os conceitos mencionados pelo livro-texto a respeito


das Cosmogonias e sua conceituação, analise as seguintes afirmações:

I. Uma Cosmogonia é necessariamente desarticulada de uma abordagem


baseada em mitos, pois revela a influência da racionalidade humana sobre
um determinado espaço.
II. Por meio das Cosmogonias, o ser humano pôde desenvolver compreensões
estratégicas sobre a ordem natural e a sua própria origem, codificando
conhecimentos históricos.
III. A chave interpretativa de uma Cosmogonia é a existência de uma narrativa
fabulosa sobre fatos extraordinários; desta forma, o conhecimento científico é
excluído desta concepção mítica.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

2. Considerando a dinâmica proposta pelo texto-base, analise as seguintes


afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

I. ( ) A existência de uma Cosmogonia implica na construção de uma síntese sobre


os aspectos fundamentais da existência humana.

21
II. ( ) As Cosmogonias são tacitamente compreendidas e assimiladas pelas pessoas
e pelas sociedades como elementos ordenadores da realidade.
III. ( ) Por meio de uma Cosmogonia, é possível superar a imanência da vida humana,
de modo que o homem passa a abandonar suas crenças primitivas.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.
e) F – V – F.

3. O conceito de ‘Cosmologia’, na perspectiva da religião e seus diferentes


fenômenos, considera a importância das concepções das sociedades e
civilizações a respeito de suas próprias características. Deste modo, os elementos
religiosos são fundamentais para a compreensão destas Cosmologias em seus
diferentes aspectos formativos.

Neste sentido, de acordo com as colocações efetivadas pelo livro-texto, é correto


afirmar que o conceito de ‘Cosmologia’, a partir do contexto religioso, tem o
significado de:

a) uma abordagem que transfere o conhecimento sobre a realidade natural para


a(s) divindade(s).
b) uma forma de discussão teológica que torna o divino semelhante ao humano a
partir da ciência.
c) um método de estudo sobre o desenvolvimento histórico das civilizações e suas
formas de compreensão sobre a vida.
d) um conjunto de saberes historicamente elaborados sobre as origens,
desenvolvimento e finitude do universo.
e) um conjunto de práticas religiosas e ritos que se destinam a promover o contato
com o divino em ambientes específicos.

22
4. Ao refletir sobre o conceito de ‘Cosmologia’ de um modo mais abrangente, torna-
se possível destacar os modos pelos quais as sociedades conceberam a si próprias
e a seus respectivos espaços. Portanto, este conceito tem uma relevância
importante no contexto das Ciências Humanas, notadamente, na Filosofia e na
História.

Desta forma, a partir do conteúdo apontado pelo texto-base, analise as seguintes


afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) O desenvolvimento de um saber associado a uma determinada Cosmologia


implica na necessidade de uma instituição religiosa que interprete este saber para
o povo.
( ) As Cosmologias relativas à realidade contemporânea consideram a importância
da ciência como fator organizador da realidade e da existência humana.
( ) Por meio das Cosmologias, as instituições religiosas têm condições objetivas de
controlar o desenvolvimento da sociedade, inibindo o saber científico em prol da
Teologia.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.
e) F – V – F.

5. As Cosmologias constituem-se a partir de relatos e descrições estabelecidas sobre


o funcionamento da natureza e da sociedade; estes relatos, portanto, são
fundamentais para a compreensão do desenvolvimento histórico das diferentes
civilizações ao redor do mundo.

Assim sendo, mediante o contexto apresentado, analise as seguintes afirmações:

I. O desenvolvimento de uma Cosmologia religiosa se inviabiliza pelo fato do

23
conhecimento religioso necessariamente contestar e dispensar a ciência
como elemento interpretativo.
II. Os saberes desenvolvidos por meio das Cosmologias implicam na necessidade
de exclusão do conhecimento religioso, uma vez que este se associa a
doutrinas inobserváveis.
III. A dinâmica das Cosmologias religiosas envolve a presença de relatos e
concepções doutrinárias acerca da realidade, muito embora o debate com
a ciência seja possível e mesmo aceitável.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

6. A construção de uma síntese interpretativa a respeito dos diferentes movimentos


religiosos e suas características implica na necessidade de estruturar os conceitos
de Cosmologia e Cosmogonia na perspectiva analítica destas matrizes de culto.
Assim, o pesquisador tem condições efetivas de compreender o modo pelo qual
se constituíram as diferentes civilizações.

Desta forma, de acordo com as colocações efetivadas pelo texto-base, é correto


mencionar, com base nos conceitos da Antropologia da Religião, que

a) a existência do mito prejudica, ou mesmo limita, o desenvolvimento de uma


Cosmogonia religiosa.
b) o fenômeno religioso concebe Cosmologias religiosas que estendem a influência
do sagrado sobre o universo.
c) uma Cosmologia religiosa associa a criação do universo à ação do sagrado,
embora o fim do universo seja um domínio da ciência.
d) a Cosmogonia cristã associa a importância do embate entre divindades rivais
como elemento-chave para a criação do universo.

24
e) o desenvolvimento das Cosmogonias religiosas ocorreu a partir das religiões
abraâmicas e suas interpretações sobre a vida humana.

7. Ao investigar a importância das instituições religiosas para o desenvolvimento das


civilizações, é imprescindível que o pesquisador verifique, também, o modo pelo
qual estas instituições desenvolveram concepções próprias a respeito das
características fundamentais da existência humana, em um plano histórico-
teológico.

Deste modo, para consolidar seus conhecimentos sobre o tema das Cosmogonias
e das Cosmologias no contexto do fenômeno religioso, leia o trecho com lacunas
que se segue:

O desenvolvimento de uma __________ religiosa tem um propósito essencialmente


__________, à medida que permite estabelecer uma atitude de __________em
relação ao saber pautado no conhecimento __________.

Agora, assinale a opção que contempla a sequência correta para o texto


apresentado:

a) Cosmogonia – excludente – diálogo – científico.


b) Cosmogonia – excludente – afastamento – religioso.
c) Cosmologia – inclusivo – diálogo – científico.
d) Cosmologia – excludente – afastamento – religioso.
e) Cosmogonia – inclusivo – diálogo – científico.

8. ENADE 2017 (Adaptada) Leia o texto a seguir:

Como é que os indivíduos fazem para processar mentalmente algumas


informações e obter conclusões a partir dos elementos considerados? Isso é o que
os lógicos usualmente denominam o estudo das inferências.
FEITOSA, H.; PAULOVICH, L. Um prelúdio à Lógica. São Paulo: Unesp, 2005.

25
A Lógica é a ciência que estuda princípios e métodos de inferência, e tem como
objetivo principal:

a) criar e classificar conceitos a partir de uma tradição cultural e religiosa.


b) estabelecer critérios de verdade, que são determinados pelos líderes políticos.
c) distinguir premissas de conclusões, estabelecendo regras imutáveis.
d) proporcionar o exercício da mente, associando cultura e lazer.
e) verificar de que modo certas proposições se associam a outras proposições

26
AS COSMOGONIAS FUNDADORAS UNIDADE
DO MUNDO: MITOS E NARRATIVAS
DE ORIGEM
02
2.1 INTRODUÇÃO

Nesta Unidade, você poderá realizar um processo de análise comparativa


entre diferentes Cosmogonias religiosas, observando as suas características narrativas
em relação ao lugar do divino e do ser humano no processo criador do universo.
Ou seja, será possível compreender de que modo as civilizações desenvolveram
explicações, por meio de diferentes tradições e gêneros literários, para justificar a
criação do universo, da natureza e toda uma ordem de coisas (fauna e flora e outros
elementos naturais) que circunda o ser humano e sustenta o seu ímpeto de vida.
Deste modo, as discussões propostas para esta Unidade pretendem
demonstrar as convergências entre os principais mitos de fundação, que
demonstram a existência de uma condição primitiva de vazio e/ou desordem, a qual
passa a ser progressivamente moldada pelo sagrado (um único deus ou um grupo
de deuses) para gerar o mundo no qual os homens desenvolvem o seu ciclo vital. As
compreensões sobre a vida e a morte passam, portanto, pela criação do ser humano
como fruto direto do trabalho do sagrado nas diferentes Cosmogonias ocidentais e
orientais.
Portanto, neste momento ,você irá adentrar em um conjunto de concepções
religiosas e tradições mitológicas que organizou não apenas o funcionamento e a
reprodução social de muitas civilizações; na verdade, estes relatos extraordinários
levaram os seres humanos a compreender a sua importância no mundo, como
criaturas inspiradas pelos deuses. Assim, observe que um mito pode ser visto apenas
como uma ‘descrição fabulosa de fatos extraordinários’ por muitas pessoas, mas
para outras, este relato representou uma verdade incontestável, como parte de sua
própria espiritualidade.
Enfim, vamos em frente? Então, bons estudos!

2.2 O CAOS E O LUGAR DA DIVINDADE NOS MITOS DE CRIAÇÃO

27
Para dar início a uma reflexão sobre os relatos de criação do mundo e do ser
humano em diferentes tradições e Cosmogonias, é preciso realizar um resgate de
alguns conceitos teóricos.
O principal destes conceitos refere-se ao mito. Uma consulta rápida a um
dicionário permitirá observar a seguinte explicação para esta expressão: ‘História
fantástica de transmissão oral, cujos protagonistas são deuses, semideuses, seres
sobrenaturais e heróis que representam simbolicamente fenômenos da natureza,
fatos históricos ou aspectos da condição humana’ (MICHAELIS, 2021).
Na perspectiva do pensamento histórico, portanto, um mito apresenta uma
forma distinta – eventualmente ingênua por sua limitação científica – de explicar a
realidade e a origem do mundo, recorrendo, assim, a alegorias e relatos de
comprovação impossível a respeito de fatos importantes que ocorreram em tempos
imemoriais, e que se colocam como verdades de fé e dão sustentação a crenças e
tradições religiosas (CORDI et al., 2003).

Figura 5: Odin, o deus supremo na Cosmogonia nórdica

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3xiwdKh. Acesso em: 20 jan. 2022.

Entretanto, para as reflexões deste livro-texto, é possível adotar uma


significação mais objetiva para os mitos: estes relatos evocam histórias de deuses,
heróis e seres humanos, narrando as etapas de desenvolvimento da vida e do
universo, desde o seu início e até o seu momento final. Os mitos (do grego mythós,

28
isto é, ‘fábula’ ou ‘palavra’) descrevem as etapas de criação e destruição do mundo,
a existência humana e a finitude do existir com a morte. Assim, o mito oferece um
porquê, uma motivação para a vida, garantindo-lhe um significado frente à angústia
de sobreviver a um ambiente repleto de perigos e dificuldades para quaisquer
civilizações (PHILIP, 1996).
Lembre-se, neste sentido, que estes mitos normalmente fazem parte de relatos
primitivos de diferentes sociedades e grupos tribais que, a seu modo, procuraram
compreender a criação e a ordem natural: os desafios de sobrevivência em um
planeta cercado de perigos e mistérios fazia com que as pessoas não se
preocupassem apenas com um abrigo, ou com o que comer, ou com o que vestir
para se abrigar contra as intempéries.
O ser humano não é apenas senciente (sensível ou capaz de assimilar
impressões sobre o meio em que está); na verdade, sua consciência gera uma
capacidade interpretativa e crítica a respeito de seu espaço, dando-lhe aptidões
para moldá-lo de acordo com a sua própria vontade e os interesses de seu grupo,
promovendo a fertilidade da terra e obtendo os recursos de que necessita para
sobreviver.
Não obstante, há uma necessidade de compreensão para questões
aparentemente infantis, porém extremamente complexas – ‘Como o mundo
começou?’ ‘Como as pessoas foram criadas?’ ‘Porque foram criadas’? ‘Por que
temos de morrer?’. Estas questões, a seu modo, são respondidas pelas diferentes
narrativas mitológicas ao redor do mundo, que revelam Cosmogonias fundamentais
para o desenvolvimento das civilizações (ARANHA; MARTINS, 2005).

Ao falar em ‘mitologia’, portanto, você analisará um conjunto de mitos que


pode ser organizado e analisado (logos) como parte de uma tradição culturalmente
estabelecida. Naturalmente, você poderá lembrar-se primeiramente da mitologia
grega; entretanto, conforme enfatiza este livro-texto, há um grande número de

29
Cosmogonias que recorrem a narrativas fabulosas para compreender e exemplificar
a existência destas sociedades – como por exemplo, a Cosmogonia bíblica, a qual é
referência para um estudo do Cristianismo e sua influência cultural.

2.2.1 Caos e criação

Ao recorrer ao texto bíblico, no primeiro capítulo do livro do Gênesis, você


poderá ler: ‘No princípio, Deus criou o céu e a terra. A terra estava sem forma e vazia;
as trevas cobriam sobre o abismo e um vento impetuoso soprava sobre as águas’ (A
BÍBLIA, 1990, p. 14).

Ocorre, assim, uma narrativa na qual há uma ausência importante de ordem,


de espaço e de tempo: ocorre apenas um vazio, no qual apenas as divindades
existem, ou ao menos, há traços e ‘sementes’ de sua existência. Por exemplo, na
abordagem do texto bíblico, há um ‘céu’ e uma ‘terra’, e mais nada: nem luz, nem
vida, apenas algo que emerge de um ‘nada’, um estado de confusão ou
desequilíbrio que precede a existência do universo.
Em outras culturas e civilizações, ocorrem soluções e narrativas diferentes para
este mesmo problema fundamental: ‘o que havia antes do universo, e como ele foi
criado?’ Estas narrativas, no entanto, estão frequentemente baseadas em histórias
com um padrão interpretativo bastante semelhante: no limite do tempo, isto é, no
seu princípio, há um mundo mergulhado no caos, inundado, congelado ou seco, mas

30
sempre vazio.
Neste momento, uma divindade criadora (que precede a existência do tempo
e, em geral, precede também ao caos) surge e, com sua força suprema, começa a
realizar o seu ofício, usando a sua força criadora para ordenar o caos, dividindo o
céu e a terra, separando as águas em mares e organizando o universo – em volta
deste planeta. Assim, a divindade impõe uma lógica sobre o que antes era caótico,
por meio de uma capacidade imperativa, isto é, de obediência irrestrita por todas as
coisas criadas (BULLFINCH, 2000).

As narrativas nórdicas, por exemplo, referem à existência de um grande vazio,


conhecido como Ginnungagap, no qual havia apenas ar. Ao norte deste vazio,
havia o fogo da região de Muspell, e ao sul, o gelo de Niflheim. Quando estes dois
espaços se aproximaram, o gelo começou a derreter e tomar a forma de dois seres,
o gigante Ymir, e a vaca Audhumla, a qual se nutria do gelo congelado e fazia fluir
leite que alimentava Ymir em seu sono, evocando, assim, a fertilidade como
elemento de criação. A partir deste gigante adormecido, nasceram os primeiros
gigantes que dariam surgimento aos deuses nórdicos, liderados por Odin, o deus do
trovão, que reinava sobre Asgard, a morada sagrada de onde a divindade se
comunicava com os homens (PHILIP, 1996).

31
Figura 6: Audhumla alimenta Ymir

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3O6HHq1. Acesso em: 20 jan. 2022.

Na Cosmogonia egípcia, por sua vez, este momento de caos refere-se a um


‘amanhecer do tempo’, no qual o deus mais importante, Ra (o sol), gera a si próprio.
A partir dele, surgem os deuses Shu (o ar) e Tefnut (a umidade), a partir da saliva de
Ra. Esta união entre Shu e Tefnut criou Geb (o deus da terra) e Nut, a deusa dos céus
que engole Ra a cada noite, momento em que ele luta com a serpente Apep, que
é a portadora do caos (BULLFINCH, 2000).
As tradições mencionadas destacam, portanto, uma condição de desordem
que se contrapõe à função do sagrado como elemento criador e organizador. Esta
ordem criada pelos deuses viabilizou o surgimento da vida humana a partir de
imensos vazios ou estados de perturbação nos quais havia apenas os elementos
básicos – água, fogo, terra e ar. A partir destes elementos, as divindades atuaram
para criar a natureza e os primeiros seres humanos.

2.3 A COSMOGÊNESE NAS TRADIÇÕES RELIGIOSAS DO OCIDENTE

Ao tratar da temática da religião no Ocidente, é comum recorrer ao estudo


das religiões abraâmicas, que agrupam judeus, cristãos e muçulmanos em relação a
uma Cosmogonia original onde Deus (Yahweh, Allah) é a única e suprema força
criadora, que sempre existiu e que, por meio de sua ordem ‘faça-se’ (fiat) foi capaz
de criar todas as coisas.
A partir deste Deus único, o universo recebe um ordenamento, e após um

32
conjunto de dias, desenvolve-se o paraíso terrestre, o qual, mesmo não sendo
cientificamente passível de comprovação, coloca-se como uma verdade de fé para
todos os seguidores destas tradições religiosas.
O Novo Testamento, por sua vez, traz igualmente o conceito de ‘Reino dos
Céus’ como um elemento expresso não como uma alegoria mitológica, mas como
uma realidade vívida na Cosmogonia cristã (HELLERN; NOTAKER; GAARDER, 2000).
No entanto, ao tratar destas tradições ocidentais, é incorreto pensar apenas
nas religiões abraâmicas, haja visto que outras crenças e tradições – em geral,
politeístas – se estabeleceram antes e durante o desenvolvimento da espiritualidade
do povo hebreu. De fato, a Cosmogonia egípcia precede a Cosmogonia dos
hebreus em uma perspectiva cronológica.

Assim, é imprescindível pensar em outras Cosmogonias e tradições que se


desenvolveram no tempo, ainda que possam ter perdido força diante do avanço da
cultura abraâmica. A cultura greco-romana, por exemplo, concebe a criação do
mundo a partir de um embate entre figuras míticas, os Titãs, que dominavam um
planeta ainda vazio, e os seres que formariam o panteão dos deuses.

Neste embate, o titã Cronos (a figura paterna que devorava seus filhos) foi

33
morto, e Zeus e os demais deuses assumiram o comando de toda a criação, e
também dos homens, que no início dos tempos tinham uma convivência próxima
com os deuses, de modo que a vontade ou os sentimentos do sagrado eram
expressos por meio de fenômenos naturais diversos, como o trovão (Zeus) ou os
maremotos (Poseidon) (BULLFINCH, 2000).

Figura 7: Poseidon, o deus grego dos mares

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3jwBW73. Acesso em: 20 jan. 2022.

Esta narrativa apresenta pontos comuns com a Cosmogonia nórdica, onde a


morte do gigante Ymir pelo deus Odin e seus irmãos tornou possível a criação dos
primeiros seres.
Entre os nativos americanos, há Cosmogonias que igualmente referem-se a
uma condição de caos antes do início dos tempos. Os índios Maidu dos Estados
Unidos, por exemplo, mencionam a existência do Fazedor-da-Terra, um espírito que
pairava sobre as águas, juntamente com o Coiote, que se colocava como uma
entidade contrária, que impunha sofrimentos às coisas criadas – trazendo, por
exemplo, a morte às pessoas.
Por fim, as tribos finlandesas possuem uma tradição associada ao mito da

34
Moça-do-Ar, um espírito que vagava pelos céus e mares vazios e tormentosos. O
vento e as ondas fecundaram a Moça-do-Ar, cuja gravidez durou mais de setecentos
e trinta anos. Neste intervalo, um pato pousou em seu joelho, construindo um ninho,
no qual sete ovos foram chocados, dando origem à terra, aos céus, ao sol, à lua, às
nuvens e às estrelas. Por fim, a Moça-do-Ar gerou Vainamoinen, um herói mitológico
associado a outros relatos míticos, em embates com vários seres sobrenaturais (PHILIP,
1996).

2.4 UM OLHAR SOBRE AS COSMOGONIAS INDO-ASIÁTICAS

Ao analisar a tradição religiosa e as narrativas cosmogônicas ocidentais, é


necessário complementar esta abordagem mediante o estudo das Cosmogonias
orientais, focando em particular os relatos dos antigos persas, do Extremo Oriente e
das civilizações aborígenes da Oceania. Nestas Cosmogonias, você poderá observar
que também está presente o relato do caos como instante inicial da existência do
universo, frente à existência de divindades que promovem o início dos tempos e a
criação mediante a sua força criadora.
Nestas culturas religiosas, há uma ênfase no processo de transformação da
alma, a qual se regenera mediante o exercício do bem e do altruísmo em diferentes
existências; deste modo, o culto aos mortos se coloca como um instrumento de
proteção e iluminação para vivos e mortos. A abordagem animista destes cultos,
ainda, acaba referindo-se à importância de todos os seres como portadores de
fragmentos da força divina, que confere, assim, uma significação sagrada não
apenas à vida humana, mas a todos os seres criados (RODRIGUES, 2007).
Entre os persas, que ocupavam o território atualmente pertencente ao Irã e
Iraque, o início dos tempos é marcado pela existência de divindades gêmeas,
separadas apenas pelo ar; na verdade, estes deuses existiam antes dos tempos, pois
o tempo é marcado pela criação do mundo por Ahura Mazda, o senhor da luz e do
bom pensamento. Seu irmão Ahriman, por sua vez, rejeitou a beleza da criação, e
castigou-a com toda sorte de malefícios, como a morte, a luxúria, a fome e a
doença, os quais afligem os homens desde a criação (PHILIP, 1996).

35
Figura 8: Representação pictográfica de Ahura Mazda

Fonte: A. Davey

Os aborígenes australianos, por sua vez, referem-se ao caos como um


momento conhecido como o ‘Tempo dos Sonhos’: neste período, havia apenas a
terra seca e a escuridão sem vida; todos os seres, inclusive o sol e as estrelas, ‘dormiam
sob a terra’, isso é, não existiam e não tinham materialidade. Deste estado de coisas,
surgiram os Ungambikula, que eram seres disformes, sem membros ou mesmo sem
rosto, que vagavam próximos a lagos e mares. Os Ungambikula passaram a dar forma
a si mesmos com facas de pedra, e depois, moldaram os primeiros seres humanos
(PHILIP, 1996).
A tradição japonesa do Xintoísmo, por sua vez, associa o poder sagrado dos
deuses a um conjunto de objetos legados pelos mesmos à humanidade: as relíquias
imperiais são formadas pelo espelho Yata-no-Kagami, a espada Kusanagi-no-Tsurugi
e a joia Yasakani-no-Magatama, as quais foram oferecidas pelos deuses aos seres
humanos, e representam em sua materialidade, até os dias atuais, o poder religioso
(embora não mais divino) do imperador do Japão sobre os seus súditos (RAVERI,
2005).

2.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo desta Unidade, você pôde efetivar um resgate histórico e uma


interpretação antropológica e teológica sobre diferentes tradições religiosas, a fim
de desenvolver uma capacidade de síntese a respeito da importância destes

36
fenômenos para a existência humana. As Cosmogonias e cosmovisões religiosas,
neste sentido, estão associadas diretamente a narrativas de períodos imemoriais e
além do tempo, nos quais o caos reinante era um espaço eventualmente material,
formado por águas e ares, mas sempre sem vida, havendo apenas a(s) divindade(s)
criadora(s) da terra e do ser humano.
Estas tradições religiosas, portanto, apresentam um padrão muito interessante
de convergência entre seus discursos e interpretações: o início dos tempos é pautado
por um ambiente hostil e inóspito – como a terra seca ou os mares agitados – nos
quais apenas o divino sobrevive; a partir de sua vontade, o universo assume forma e
ordem, tornando possível o surgimento da vida e dos seres humanos como parte de
uma complexa atividade de criação.
Desta forma, estas Cosmogonias inserem o caos e a cosmogênese em seu
conjunto de narrativas e histórias que são transmitidas entre gerações,
complementando a sabedoria e o conhecimento religioso em diferentes civilizações.
A criação do mundo representa, portanto, uma situação na qual o divino se impõe
sobre o caos, possibilitando criar uma estrutura material e objetiva, que abre espaço
para o surgimento da vida e da etapa mais importante da criação: o ser humano.

37
FIXANDO O CONTEÚDO

1. A avaliação objetiva das diferentes Cosmogonias religiosas na história das


civilizações permite apontar a importância do ‘caos’ como conceito analítico e
chave interpretativa do desenvolvimento de concepções de espiritualidade que
levam à formação de relatos extraordinários.

Desta forma, considerando os conceitos mencionados pelo livro-texto a respeito


dos mitos de criação e as suas divindades, analise as seguintes afirmações:

I. A presença do caos é um elemento recorrente nas Cosmogonias religiosas, e


enfatiza a importância da divindade como uma força suprema.
II. Por meio dos mitos, compreende-se na Cosmogonia religiosa que o sagrado é
capaz de canalizar sua energia criadora para ordenar este caos.
III. A chave interpretativa para a compreensão do caos enquanto força criadora
reside na ideia de que o nada (vazio) precede a existência do divino.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

2. As Cosmogonias religiosas podem ser descritas e analisadas a partir da importância


dos elementos de criação, pois estes elementos dão margem a uma compreensão
efetiva do papel da(s) divindade(s) nos mitos geradores do universo e da
humanidade.

Considerando a dinâmica proposta pelo texto-base, analise as seguintes


afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) A análise comparada entre doutrinas religiosas permite observar a presença de

38
um momento inicial de desordem que precede a criação.
( ) Nas Cosmogonias religiosas, há um entendimento de que o caos se sobrepõe ao
divino, pois sua força é superior à ordem existente.
( ) Ao ordenar o caos, a divindade utiliza sua capacidade imperativa para inserir
uma lógica em relação ao vazio e/ou à desordem absoluta.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.
e) F – V – F.

3 . Os relatos da cosmogênese nas diferentes doutrinas do Ocidente – em particular,


nas religiões abraâmicas – podem ser compreendidos a partir da relação profunda
entre a divindade e o ser humano, condicionando mitos de criação baseados na
relação oportuna entre o sagrado e a realidade material.

Neste sentido, de acordo com as colocações efetivadas pelo livro-texto, é correto


afirmar que um elemento-chave na Cosmogonia das doutrinas abraâmicas é
expresso por:

a) um combate persistente, desde antes da história, entre o Bem e o Mal.


b) uma concepção que coloca o homem como a força criadora do mundo.
c) um paraíso terrestre que surge após o ordenamento do universo.
d) um relato cientificamente comprovável em relação à origem das espécies.
e) uma articulação entre divindades supremas para a criação do mundo.

4. As tradições religiosas consagram uma importância significativa aos relatos de


criação; por meio deles, é possível conceber os modos pelos quais as civilizações
se estruturaram e se desenvolveram em relação aos seus espaços e no contato
com outros grupos populacionais.

39
Desta forma, a partir do conteúdo apontado pelo texto-base, analise as seguintes
afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) A Cosmogonia greco-romana apresenta pontos comuns com as simbologias


religiosas ao redor do mundo que associam a morte da figura paterna como um
momento-chave para a criação.
( ) No ambiente greco-romano, a convivência entre deuses e homens permitiu
desenvolver interpretações sobre a realidade material como expressões da
vontade do sagrado sobre a natureza.
( ) Uma diferença importante entre a Cosmologia das sociedades nórdicas em
relação às civilizações mediterrâneas reside no fato de os nórdicos
compreenderem a criação a partir de um único deus (Odin).

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.
e) F – V – F.

5. Para analisar efetivamente o desenvolvimento das diferentes tradições religiosas e


suas concepções a respeito da criação e do desenvolvimento das civilizações, é
imprescindível compreender a importância de personagens míticos, cujos feitos
extraordinários condicionam a possibilidade de converter o caos em uma força
criadora.

Assim sendo, mediante o contexto apresentado, analise as seguintes afirmações:

I. As Cosmogonias orientais concebem a importância da tradição monoteísta


como chave interpretativa da existência humana; deste modo, esta força
criadora se expressa a partir da vontade de um deus supremo.
II. Um elemento comum nas tradições religiosas é a existência de narrativas de
fertilidade, a partir das quais os homens se desenvolvem como seres

40
conscientes e dominadores do seu espaço.
III. A presença de elementos naturais nos mitos de criação, como a água, a terra
e o ar, molda as tradições religiosas, pois a capacidade criadora da divindade
se manifesta a partir destes elementos.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

6. A construção de uma síntese interpretativa a respeito da cosmogênese e dos mitos


de criação nas diferentes tradições religiosas indo-asiáticas pode ser efetivado
com base em reflexões que associam a importância da relação entre deuses e
homens na passagem entre o caos e a existência material.

Desta forma, de acordo com as colocações efetivadas pelo texto-base, é correto


mencionar que

a) estas tradições pautam-se na crença da ressurreição após uma única existência


terrestre, determinando convergências com a tradição abraâmica.
b) dentre estas concepções religiosas, o homem é compreendido como sendo o
único ser que é capaz de trazer uma força divina dentro de si.
c) a concepção animista, comum às expressões religiosas indianas, atribui um
significado religioso e ritual à existência humana e ao mundo natural.
d) nestas tradições religiosas, o culto aos mortos é vedado sob o argumento de que
sua memória deve ser apagada juntamente com o corpo físico.
e) o desenvolvimento dos mitos de criação nas tradições asiáticas, como o Xintoísmo,
é baseado apenas em fábulas desprovidas de materialidade.

7. As concepções religiosas a respeito dos mitos de criação associam figuras naturais


e sobrenaturais para a compreensão de processos de desenvolvimento do

41
universo e da realidade humana. Deste modo, tais figuras devem ser observadas
na perspectiva das Cosmogonias e suas características.

Assim sendo, para consolidar seus conhecimentos sobre o tema da cosmogênese


no contexto da tradição religiosa, leia o trecho com lacunas que se segue:

O mito de Audhumla, cuja narrativa está expressa na Cosmogonia __________,


permite observar de que modo os __________estão presentes nos relatos de origem
das tradições religiosas: por meio destes seres, a __________ se expressa como um
elemento de __________.

Agora, assinale a opção que contempla a sequência correta para o texto


apresentado:

a) Hindu – seres humanos – guerra – destruição.


b) Greco-romana – seres humanos – força física – destruição.
c) Hindu – animais – fertilidade – destruição.
d) Nórdica – animais – fertilidade – criação.
e) Inuit – seres humanos – força física – criação.

8. Leia o texto a seguir:

O mito é o relato de um acontecimento originário, no qual os deuses agem e cuja


finalidade é dar sentido a uma realidade significativa. Ao relatar um
acontecimento, o mito situa-se em um lugar e em um tempo e,
consequentemente, apresenta-se como uma história.

CROATTO, J. S. As linguagens da experiência religiosa: uma introdução à fenomenologia da religião. 2. ed. São Paulo: Paulinas,
2004 (adaptado).

Considerando essa definição de mito, analise os seguintes textos bíblicos.

Texto 1

42
No princípio, criou Deus os céus e a terra. A terra, porém, estava sem forma e vazia;
havia trevas sobre a face do abismo, e o Espírito de Deus pairava por sobre as
águas. Disse Deus: Haja luz; e houve luz (Gênesis 1,1-3).

Texto 2
O reino dos céus é também semelhante a um [homem] que negocia e procura
boas pérolas; e tendo achado uma pérola de grande valor, vende tudo o que
possui e a compra (Mateus 13,45-46).

Com base na definição de mito apresentada e nas passagens bíblicas transcritas,


avalie as afirmações a seguir:

I. O Texto 1 não se enquadra na definição de linguagem mitológica, pois a Bíblia,


por ser a palavra de Deus, não emprega essa linguagem.
II. O Texto 1 narra a Cosmogonia por meio de uma linguagem religiosa
significativa, no sentido de dar sentido à vida humana.
III. O Texto 2 transmite ao ser humano angustiado uma realidade significativa, por
meio da expressão mitológica "Reino dos céus".

É correto o que se afirma em

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) II e III, apenas.
e) I e III, apenas.

43
O NASCIMENTO DO SER HUMANO UNIDADE
SEGUNDO ALGUMAS
COSMOGONIAS ORIGINÁRIAS
03
3.1 INTRODUÇÃO

Ao longo desta Unidade, você poderá avaliar a importância das Cosmogonias


religiosas para a elucidação de questões relacionadas à existência humana em seu
ambiente natural e, no limite, dentro de uma ordem instaurada no universo. Após
receberem um ânimo de vida, os seres humanos precisavam ser instruídos em
diferentes processos e situações comuns à sua existência, para poderem sobreviver
à fúria dos elementos naturais e ao risco de morte por grandes predadores.
Desta forma, as tradições religiosas e culturais, nas diferentes civilizações,
compreenderam o desenvolvimento do intelecto do Homo sapiens a partir da ação
de seus mestres imortais, que eram deuses, semideuses e outros heróis e figuras
lendárias que poderiam ceder parte de sua sabedoria e conhecimento aos homens.
Estes seres se destacavam por sua astúcia e, em muitos casos, por sua crueldade, em
particular, quando as pessoas não obedeciam às suas regras. Neste momento, o
preço pelo desrespeito poderia ser extremamente alto, levando, inclusive, ao
extermínio de praticamente todos os seres humanos.
Entretanto, os deuses podiam se vingar, mas não destruíram todos os seres
humanos: a esperança era constantemente renovada por meio da sobrevivência de
pessoas cuja piedade, respeito ao sagrado e espirito altruísta permitia renovar a
criação humana em um mundo onde a(s) divindade(s) ordenava(m) o caos anterior
ao próprio início dos tempos.
Enfim, neste momento, serão apresentadas mais algumas cosmovisões
religiosas, do Oriente e do Ocidente, que relatam e interpretam o surgimento da vida
humana e a sua relação com os deuses em diferentes eras.

3.2 O SOPRO DA VIDA E O SURGIMENTO DO INDIVÍDUO

44
A Cosmogonia bíblica refere-se ao surgimento do ser humano a partir de uma
iniciativa de Deus, na qual o primeiro homem, Adão, foi moldado da argila e recebeu
a imagem e semelhança de seu criador: ‘Então Yahweh Deus modelou o homem
com a argila do solo, soprou-lhe nas narinas um sopro de vida, e o homem tornou-se
um ser vivente’ (BÍBLIA, 1990, p. 15).
Esta cosmovisão, referencial para o estudo bíblico, é destacada a partir das
tradições dos povos semíticos do século X a.C, contemporâneos ao reinado de
Salomão. A elaboração desta narrativa, no segundo capítulo do Gênesis, refere-se à
criação do homem ocorrida em um espaço físico – a terra – já existente, porém
desolada, seca e sem vida: não havia chuvas nem ervas sobre o solo.

Esta interpretação do texto bíblico destaca a relação entre a divindade e o


ser humano no instante da criação: o surgimento do primeiro homem não ocorre
como uma resultante de uma evolução contínua, como prevê a teoria biológica de
Darwin; na verdade, esta criação é um ato de vontade do sagrado, o qual se dedica
a uma tarefa de legar à humanidade a obra que por Ele foi criada.
Esta Cosmogonia, de acordo com o conteúdo apresentado até o momento,
não é a única referência para a compreensão religiosa e cultural para o surgimento
dos seres humanos. Na verdade, as narrativas tradicionais de criação referem-se
objetivamente à ação divina e à instilação (aplicação) de uma energia vital que
confere a vida ao ser humano, e o distingue dos outros animais que, como criaturas,
devem servir ao homem em seus desejos e necessidades mais importantes
(RODRIGUES, 2007).
Seja a partir de um único deus, ou por iniciativa de diferentes divindades, o
homem é referenciado na Cosmogonia religiosa como um ser criado, à diferença
dos deuses que são gerados e/ou existem antes de todos os tempos, como na
mitologia greco-romana, quando Zeus gera outros filhos deuses.

45
Consequentemente, a importância da criação do ser humano se estabelece
como a síntese, ou o objetivo final, de um esforço de desenvolver um sistema
geocêntrico, no qual a terra centraliza o universo e, ao redor dela, localiza-se o ser
humano como reflexo direto da ação de seu criador.

Figura 9: Ruínas do templo de Zeus em Atenas (Grécia)

Fonte: Disponível em https://bit.ly/37bhypq. Acesso em: 20 jan. 2022.

É necessário, portanto, observar de que modo outras Cosmogonias e tradições


religiosas/culturais inseriram este processo de gênese humana dentro de uma ordem
que não se estabelece necessariamente por padrões cronológicos, mas sim, por eras
nas quais o homem conviveu proximamente a seus deuses e com heróis que os
defendiam ou atuavam diretamente na sua destruição (BULLFINCH, 2000).
Em primeiro lugar, é importante observar o lugar da criação do ser humano no
contexto destas tradições. Como destacado anteriormente, o homem é geralmente
fruto de uma ação divina, com o intuito de povoar a terra que é criada pelos deuses.
Entretanto, a Cosmogonia bíblica não é a única que se refere à ação de um Deus
único ao criar o homem.
Entre os sérvios – uma civilização da região dos Bálcãs, na Europa Central – há
um relato que enfatiza o surgimento da humanidade a partir do suor da testa de
Deus, ao contrário do relato bíblico que apresenta o sopro de vida (ruah) sobre as
narinas do primeiro homem. Na Cosmogonia sérvia, Deus teria despertado um dia,
após um período longo de sono. Ao caminhar pela terra vazia, o suor escorreu de sua
testa e, ao misturar-se com os elementos naturais, gerou o primeiro ser humano. Assim,
a presença do suor ‘condenou’ o homem a uma vida de trabalho e labuta para o

46
seu sustento (PHILIP, 1996).
Os nórdicos, por sua vez, apresentam o relato da criação de Ask e Embla, um
homem e uma mulher criados pelos deuses liderados por Odin, a divindade maioral,
a partir de troncos de árvores encontrados às margens do grande oceano (o lugar
do caos e da desordem). A partir de Ask e Embla, a humanidade se desenvolveu
(BULLFINCH, 2000).
Na Cosmogonia chinesa, por fim, há a narrativa de P’an-ku, o primeiro ser, um
humanoide cujo corpo era coberto de pelos, com chifres e presas. P’an-ku nasceu
do caos, que tinha a forma de um ovo de galinha cujas metades formavam o Yin e
o Yang, as forças opositoras que regem o universo. Entre estas forças, estava P’an-ku,
e de suas pulgas, nasceu a humanidade, que foi instruída pelo primeiro ser a respeito
das ciências e de todo o conhecimento a respeito do sol, da lua e dos mares. Ao
completar a sua obra de criar e instruir a humanidade, P’an-ku desapareceu (PHILIP,
1996).
Perceba, assim, a importância da presença da divindade junto aos homens
nos instantes iniciais da criação: há uma proximidade relevante com os primeiros
humanos que, em sua fragilidade, precisam não apenas de proteção, mas de
instrução sobre os mistérios do mundo, desenvolvendo-se, assim, as narrativas que
sustentam as Cosmogonias religiosas. Entre os gregos, por exemplo, há a presença de
Prometeu, um titã que instrui os humanos sobre a Astronomia, a Navegação e outras
ciências importantes para o desenvolvimento da humanidade (BULLFINCH, 2000).

Porém, no momento em que a humanidade já está suficientemente instruída,


ou atingiu um estado de maturidade e consciência capaz de fazer valer o exercício
de seu livre-arbítrio e autodeterminação, a divindade se retira ou se afasta: os
Ungambikula voltaram a dormir e a habitar o Tempo do Sonho; P’an-ku desaparece,
assim como o Deus da Cosmogonia abraâmica vê que ‘tudo era muito bom’ e

47
descansa da obra de sua criação, conforme o relato do primeiro capítulo do Gênesis
(A BÍBLIA, 1990).
Este afastamento pode ocorrer, ainda, no momento em que os homens se
afastam dos desígnios de seu(s) criador(es). Neste momento, a intervenção divina
gera narrativas de destruição e recomeços, pautando uma relação eventualmente
tormentosa entre o sagrado e os seres humanos, conforme a discussão a ser realizada
no próximo tópico.

3.3 A RELAÇÃO ENTRE SERES DIVINOS E SERES MORTAIS

Leia o texto a seguir:

O deus disse ‘Vamos soltar as águas do mundo e afogar essa plebe


que perturba nosso descanso’. E o vento nos juncos murmurou em meu
sono: ‘Homem, derrube sua casa e construa um barco’. Obediente ao
deus, construí um barco, comprido e largo, e coloquei nele um teto, e
levei para o barco sementes de todas as coisas vivas. Levei minha
família e minhas posses, e um macho e uma fêmea de todas as
criaturas vivas do mundo, tanto as domesticadas quanto as selvagens.
Durante dias e noites a tempestade açoitou, afogando o mundo em
uma fúria de vento e chuva. Olhei do barco para fora, e não havia
nada mais além da água na superfície da terra. Então eu chorei, mas
isso foi apenas mais água. Finalmente, o barco encalhou no topo de
um monte. Ansioso para saber se a enchente estava baixando, soltei
uma pomba, depois uma andorinha e depois um corvo. A pomba e a
andorinha retornaram, exaustas, mas o corvo não – tinha encontrado
um lugar onde descansar. Alegre, fiz um sacrifício aos deuses” (PHILIP,
1996, p. 47-48).

É fortemente provável que, a partir deste texto, você tenha realizado uma
associação com a narrativa bíblica do dilúvio, entre os capítulos 6 e 9 do livro do
Gênesis. No entanto, o texto apresentado nesta seção pertence aos relatos de
criação dos sumérios, e relata o conto de Uthnapishtim, isto é, ‘Aquele que descobriu
a vida’. Este conto narra a história de Gilgamesh, um herói lendário que teria vivido
em Uruk (nome que dá origem ao atual Iraque), e que foi criado pelos deuses para
governar os homens. Gilgamesh escapou à fúria dos deuses ao criar um barco que
sobrevivesse ao dilúvio, e preservou assim a história dos primeiros tempos (PHILIP,
1996).

48
Ocorre nas Cosmogonias, portanto, uma relação intrincada entre deuses e
mortais como parte de um processo de criação e renovação constante da
humanidade. Em diversos momentos, o sagrado fez valer-se de sua capacidade
suprema e força infinita para reestruturar o mundo de acordo com o seu desejo.
Nestes momentos, o mundo conhecido é destruído, pela água ou pelo fogo, como
ocorreu no relato de Sodoma e Gomorra, por exemplo.

Figura 10: Gilgamesh

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3jBjDNW. Acesso em: 20 jan. 2022.

Assim, você pode verificar uma recorrência do relato da renovação da

49
humanidade após um período inicial de rebelião e desobediência. A(s) divindade(s)
se lançam, neste momento, em um processo de purificação da humanidade
decaída, salvando um grupo pequeno de eleitos que dará continuidade à obra da
criação.
Há, portanto, um processo regenerador da natureza após eventos trágicos e
grandes holocaustos; no entanto, diferentemente dos dinossauros que pereceram
pela ação de um asteroide errante, na Cosmogonia religiosa é a raiva dos deuses
que libera a força dos elementos naturais sobre a fragilidade humana, como
destaca, por exemplo, a Cosmogonia dos gregos com a destruição de Atlântida, a
cidade criada por Poseidon como uma morada perfeita para os homens de sua
descendência (BULLFINCH, 2000).
A narrativa do dilúvio está presente em inúmeras Cosmogonias. Retomando as
concepções dos povos balcânicos, é possível observar que a vida terrena é destruída
após uma grande enchente, pois os homens estavam insultando a Deus com a
ignorância de Sua vontade, perdendo, assim, o direito a viver no mundo que Ele
havia criado.
Neste momento, a narrativa sérvia se afasta do relato bíblico para revelar a
renovação da humanidade a partir de um semideus chamado Kurent. Este indivíduo
foi o único a sobreviver à enchente, juntamente com o gigante Kraynatz, no cume
de uma montanha. Kraynatz passou nove anos agarrado em um tronco de parreira
na montanha, alimentando-se das uvas e de seu suco, sem saber que o tronco era,
na verdade, a bengala de Kurent.
Estes dois seres disputaram o domínio do mundo quando as águas refluíram.
Kraynatz sobrepujou Kurent, e este teve de servi-lo. No entanto, Kurent conseguiu,
com sua esperteza, embebedar Kraynatz com vinho misturado com seu sangue e
com heléboro negro (uma planta alucinógena), fazendo o gigante subir à montanha
de Deus e comer de sua comida. Enraivecido, Deus atinge Kraynatz, que rola pelas
montanhas. Ferido, Kraynatz perde para sempre a sua força perante Kurent, que
passa a governar o mundo e a humanidade (PHILIP, 1996).

50
A benevolência e a maldição, como uma relação ‘agridoce’ entre Bem e Mal,
são fatores constantes das Cosmogonias religiosas a respeito do contato entre o
sagrado e o ser humano. Estas relações são proporcionalmente benéficas ou
prejudiciais à vida humana à medida que os homens afastam-se dos desígnios da(s)
divindade(s) para fazer valer sua própria vontade ou ceder a outros instintos.
Nestas circunstâncias, o ser humano geralmente perde o direito e a primazia
de desfrutar das coisas boas que o divino havia criado e oferecido às pessoas desde
os primeiros tempos. Assim, a punição pode ocorrer de uma forma objetiva – pela
destruição do mundo conhecido por eventos naturais importantes – ou pela
condenação do homem a uma vida de rigor e severidade, na qual a alegria do
paraíso primitivo é substituída pela angústia da morte futura e pelas dores de parto
que antecedem a todos os nascimentos (BULLFINCH, 2000).
Em relação a esta segunda forma de castigo, o texto bíblico refere-se à
importância da expulsão do Éden após a traição de Adão e Eva. Neste momento, o
ser humano assume a sua mortalidade e a sua condição frágil, devendo sofrer para
obter sua sobrevivência frente aos males do mundo.

51
Figura 11: A expulsão de Adão e Eva do Paraíso, por Eugene Delacroix

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3LVDVxW. Acesso em: 20 jan. 2022.

Esta narrativa tem um paralelismo importante com a Cosmogonia greco-


romana, que enfatiza o castigo de Zeus aos homens por haverem dominado o fogo
com a ajuda do titã Prometeu. Zeus e os outros deuses enviam Pandora a Epimeteu,
irmão de Prometeu: Pandora era uma mulher criada com muitas qualidades e
atributos, e, em um momento de curiosidade, abre uma caixa na qual estavam
guardados todos os males que afligem a humanidade – doenças, fome, dor, morte
e sofrimento (PHILIP, 1996).

52
Figura 12: Pandora abre a caixa, por Walter Crane

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3uxVXjR. Acesso em: 20 jan. 2022.

Atente-se para um fato interessante: as Figuras 11 e 12 referem-se a situações


de duas Cosmogonias distintas, nas quais a mulher, por aparente ingenuidade,
inocência, ou curiosidade, torna-se responsável pelo sofrimento entre os seres
humanos: o homem é representado, por sua vez, com uma certa vergonha ou
espanto vitimizado perante o momento no qual ele toma consciência do erro
causado.
Vale dizer, este conjunto de imagens ajuda a pensar objetivamente no lugar
histórico da mulher nas Cosmogonias e, inclusive, na própria filosofia: ainda que
fossem dotadas de atributos especiais (como no caso de Pandora) e descendessem
da divindade (Eva), a supremacia do homem se colocou também em relação ao
espaço da Filosofia: mesmo que esta ciência seja neutra e plural, nem sempre os seus
autores seguiram esta pluralidade, de modo que o protagonismo masculino acabou
sendo imposto sistematicamente ao longo da história (JOHANSON, 2020).
De toda forma, você pode observar que, nas Cosmogonias religiosas, este
relacionamento entre deuses e homens ocorre de um modo bastante objetivo: com
a presença relevante de símbolos religiosos e outros elementos de culto, os seres
humanos relacionam-se diretamente com o sagrado, confiando em sua proteção ao

53
mesmo tempo que temem o julgamento destas entidades, o qual pode condená-los
à morte e à destruição, exatamente por haverem traído a vontade do sagrado em
tempos imemoriais.

3.4 DEUSES, ANIMAIS REAIS E ANIMAIS FABULOSOS

Nas Cosmogonias religiosas, os animais surgem sempre como criaturas, mas


em diferentes graus de associação com os homens e com os deuses. Em geral, sua
condição é colocada em subordinação em relação ao homem, como seres que
devem servi-lo, porém, sua importância na ordem natural é tamanha que, em
diferentes Cosmogonias do Oriente, determinadas espécies são colocadas em
relevância e mesmo consideradas como sagradas, a exemplo da vaca entre os
seguidores da tradição hindu, que associam este animal à fertilidade e à criação,
devotando grande respeito a ele (RAVERI, 2005).
Da mesma forma, a Cosmogonia dos taoístas (uma doutrina religiosa da China
Imperial) menciona um relato no qual o Imperador dos Céus usou um boi para
transmitir uma mensagem aos primeiros humanos: caso eles trabalhassem duro,
poderiam comer bem a cada três dias. O boi, porém, confundiu-se e acabou
dizendo que as pessoas poderiam comer três vezes a cada dia.
Para não desonrar sua palavra, o Imperador dos Céus prendeu o boi ao arado
para que as pessoas conseguissem produzir mais, e assim, pudessem comer de
acordo com o que foi determinado pela divindade (PHILIP, 1996).

54
Figura 13: Vaca nas ruas de Délhi (Índia)

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3E8bBFZ. Acesso em: 20 jan. 2022.

Os animais se colocam, neste contexto, como auxiliares importantes dos


homens, assim como, em outros casos, são referidos como criaturas prediletas dos
deuses, aos quais prestam-lhe serviços extremamente importantes. As aves, em geral,
são compreendidas como mensageiras dos deuses nas tradições africanas e
polinésias, pois realizam esta ponte entre céu e terra, e seus atos permitem antecipar
eventos importantes, como as chuvas ou a chegada da primavera (BULLFINCH, 2000).
Da mesma forma, os animais auxiliam os deuses em seus projetos, podendo ser
resultantes do relacionamento entre deuses e outros seres, como ocorreu com
Sleipnir, o cavalo de Odin na Cosmogonia nórdica, o qual, tendo oito patas, resulta
da relação do deus Loki, disfarçado em égua, com o cavalo de um gigante.
Da mesma forma, há o relato do cavalo alado Pégaso (Pegasus), que nasceu
da Medusa (uma criatura terrível que petrificava aqueles que a vissem); Perseu
decepa a cabeça da Medusa e, a partir do corpo sem vida, surge Pégaso, o qual
será montado posteriormente pelo herói Belerofonte para matar a poderosa
Quimera, um monstro em forma de leão com uma pele parecida com uma couraça
de ferro (PHILIP, 1996).
Os animais ‘reais’, isto é, as espécies comuns ao planeta, apresentavam
também a sua relevância nas Cosmogonias religiosas. Na concepção dos povos
semitas (hebreus), anualmente um bode era levado ao deserto e ali solto, para servir
como expiação aos pecados cometidos pelos israelitas. O oferecimento deste bode

55
a Azazel (um anjo que habita o deserto e que é responsável por contar os pecados
dos homens perante Deus) faria com que as pessoas pudessem ser redimidas de seus
pecados (CONE, 2021). Assim, você pode observar que estes animais também
apresentam uma função cerimonial (e de sacrifício) relevante entre as tradições da
Antiguidade.

Figura 14: Sacrifício ritual de animais na Cosmologia bíblica

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3xncyJe. Acesso em: 20 jan. 2022.

Por fim, é importante destacar que os animais também fundem-se a seres


humanos, e acabam apresentando algumas de suas características: o relato do
Minotauro (um ser com corpo de homem e cabeça de touro) está ligado à relação
mantida entre Pasífae, uma mulher, e um touro. Pasífae se escondia dentro de uma
vaca de madeira criada pelo artesão Dédalo, e por esta relação, os deuses fizeram
com que a jovem desse à luz a um ser monstruoso, o qual foi escondido dentro de
um labirinto (PHILIP, 1996).

3.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta Unidade, foi possível observar, com maior atenção, os relatos e


narrativas históricas que permitem compreender as relações entre homens e deuses
no âmbito das Cosmogonias religiosas. Por este conteúdo, você pôde perceber que,
nestes relatos, é evidente a proximidade entre sagrado e profano, a qual se

56
estabelece não apenas por meio de rituais, mas pelo convívio direto entre estes seres.
Em muitos momentos, os deuses aproximam-se dos humanos para transmitir
conhecimento, receber culto ou mesmo para manterem relacionamentos íntimos,
nos quais os criadores e criaturas (ou apenas as próprias criaturas) se unem
sexualmente e geram heróis fabulosos ou criaturas aberrantes, a partir de bênçãos e
maldições que pairam sobre estas criaturas – os exemplos de Hércules (gerado a
partir da relação entre Zeus e a mortal Alcmena) e do Minotauro destacam
objetivamente estas relações entre deuses, humanos e animais.
Da mesma forma, é importante destacar o lugar dos animais nestes relatos de
criação: estes seres podem assumir um intelecto típico dos seres humanos,
transmitindo a mensagem dos deuses ou interagindo com eles, ao mesmo tempo em
que possuem papéis bem definidos nas diferentes tradições: seja como ofertas de
sacrifício, ou como mensageiros dos deuses, ou como sustento para a vida humana,
estas criaturas se integram à tradição religiosa como parte de uma ação divina que
interfere em um caos que precede a existência do universo.

57
FIXANDO O CONTEÚDO

1. As Cosmogonias religiosas viabilizaram o desenvolvimento de concepções


importantes acerca dos processos de criação da humanidade, configurando
relacionamentos específicos (e especiais entre deuses e homens. Desta forma, é
essencial conhecer um pouco mais a respeito destas entidades nas diferentes
tradições culturais.

Assim sendo, para consolidar seus conhecimentos sobre o tema da criação em


diferentes tradições e civilizações, leia o trecho com lacunas que se segue:

Os relatos de criação apresentam __________ importantes entre diferentes


Cosmogonias religiosas, como se pode observar, por exemplo, por meio dos relatos
de __________ relacionados a eventos importantes, como no caso de um
__________ que viabiliza a __________ total da humanidade então decadente.

Agora, assinale a opção que contempla a sequência correta para o texto


apresentado:

a) Divergências – criação – terremoto – destruição.


b) Convergências – criação – dilúvio – renovação.
c) Convergências – destruição – dilúvio – renovação.
d) Disparidades – destruição – anjo – restauração.
e) Associações – criação – anjo – renovação.

2. A tradição cultural e religiosa está intrinsecamente associada à ação e


à presença de figuras míticas, deuses e semideuses que foram essenciais para o
desenvolvimento de todas as civilizações humanas. Portanto, estas figuras devem
ser relembradas para permitir uma avaliação objetiva de seu papel em diferentes
Cosmogonias.

Neste sentido, considerando os elementos destacados pelo livro-texto a respeito


dos relatos de criação nas Cosmogonias religiosas, associe as colunas a seguir:

58
1. Azazel
2. Quimera
3. Prometeu
4. Gilgamesh

( ) Trata-se do anjo ao qual era oferecido um bode para a expiação dos pecados
dos hebreus.
( ) Configura-se como uma criatura em forma de leão que foi morta pelo herói grego
Belerofonte.
( ) É um personagem central na Cosmogonia suméria, e que está presente nos relatos
de seus primeiros tempos.
( ) Trata-se de um titã que despertou a ira de Zeus, o líder dos deuses gregos, ao
revelar conhecimentos à humanidade.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) 3 – 4 – 1 – 2
b) 2 – 3 – 1 – 4.
c) 4 – 1 – 3 – 2.
d) 1 – 2 – 4 – 3.
e) 4 – 3 – 2 – 1.

3. As narrativas de criação inserem o ser humano em uma dimensão diferenciada em


relação aos outros animais. Desta forma, é preciso compreender de que modo
esta diferença se coloca na relação entre deuses e criaturas dentro de uma ordem
natural estabelecida diretamente pela(s) divindade(s).

Desta forma, observando o conteúdo mencionado pelo livro-texto a respeito da


criação humana nas Cosmogonias religiosas, analise as seguintes afirmações:

I. O ser humano surge como finalidade última do processo criador, em um


espaço onde o caos já foi previamente ordenado pela(s) divindade(s).
II. No contexto da criação do ser humano, atribui-se a ele a capacidade de
interpretar e dominar o caos reinante por meio do conhecimento.

59
III. As Cosmogonias religiosas antigas compreendem que a divindade é um
resultado direto do pensamento humano, sendo isenta de materialidade.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

4. Nos relatos de criação, é possível observar um conjunto de características


importantes das Cosmogonias religiosas a respeito do surgimento dos seres
humanos, de modo a ilustrar teológica e mitologicamente o lugar da criação em
meio à ordem natural.

Assim sendo, mediante os elementos e conceitos apresentados pelo texto-base,


avalie as seguintes afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) A Cosmogonia grega apresenta a origem do ser humano a partir da vontade dos


deuses, que moldaram os homens a partir de troncos de árvores, demonstrando
sua força suprema.
( ) Entre os relatos de criação dos nórdicos, observa-se que Ask e Embla, os primeiros
seres, surgem a partir da ação direta das divindades em um mundo inabitado.
( ) As Cosmogonias aborígenes referem-se aos Ungambikula, que permaneceram
eternamente juntos aos seres humanos após a sua criação, para transmitir-lhes o
conhecimento sobre todas as coisas.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.

60
e) F – V – F.

5. relação entre homens e deuses se estabelece, nas Cosmogonias ocidentais e


orientais, a partir de contextos e situações nas quais a vida humana é criada,
destruída ou de algum modo ameaçada. Em todas estas circunstâncias, o
sagrado assume presença e, a rigor, uma certa materialidade junto aos seres
humanos.

Desta forma, conforme as considerações apresentadas pelo livro-texto, é correto


afirmar que

a) a Cosmogonia bíblica destaca o fim da humanidade e sua renovação após a


morte de Noé.
b) na Cosmogonia chinesa, a humanidade se desenvolve a partir de P’an-ku, o
primeiro ser.
c) a Cosmologia dos povos indianos refere-se à importância de Gilgamesh como o
primeiro ser criado.
d) o surgimento do homem a partir da lágrima divina demonstra, para os sérvios, a
vida de sofrimento do homem mortal.
e) a Cosmogonia grega, que se refere ao conto de Kurent, destaca a importância
do ser humano como superior aos outros animais.

6. Os animais estão presentes, de forma recorrente, nas Cosmogonias religiosas e nas


tradições culturais das civilizações. Deste modo, é essencial que o pesquisador
observe as funções e os papéis assumidos por estes seres dentro de narrativas de
criação e concepções que articulam a relevância destas criaturas em relação à
ordem natural.

Assim sendo, mediante o exame dos conceitos apresentados pelo texto-base,


analise as seguintes afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) Os animais podem ser usados para ações rituais nas quais o povo deposita a sua
confiança na divindade, a exemplo das tradições que se referem o sacrifício de
um bode ao anjo Azazel.

61
( ) Na Cosmogonia religiosa, o animal é colocado sempre em posição de
inferioridade em relação aos seres humanos, como ocorre, por exemplo, na
narrativa chinesa do Imperador dos Céus.
( ) O relato do Minotauro é útil para observar de que modo os homens são
eventualmente apresentados com características de animais, como resultado de
relações diretas com os deuses.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.
e) F – V – F.

7. Uma síntese interpretativa a respeito das tradições religiosas permite observar


aspectos importantes de nascimento e morte que se entrecruzam em relatos
históricos que definem as Cosmogonias e Cosmologias de diferentes civilizações.
Desta forma, as relações entre criador(es) e criaturas devem ser consideradas
como parte fundamental destas tradições historicamente estabelecidas.

Neste sentido, de acordo com os conceitos apresentados pelo livro-texto, avalie


as afirmações a seguir:

I. O relato de Sleipnir, na Cosmologia nórdica, permite observar a geração de


criaturas fabulosas a partir da união entre homens e deuses, as quais são
capazes de realizar feitos extraordinários.
II. A narrativa bíblica de Noé apresenta paralelismos importantes entre as
Cosmogonias dos povos hebreus e sumérios, denotando um padrão de
convivência cultural.
III. A narrativa de Kraynatz permite observar que as Cosmogonias religiosas
monoteístas também observam a criação de criaturas lendárias que
conviviam com seres humanos.

62
É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

8. O desenvolvimento de um saber filosófico implica na necessidade de observar a


presença de relações de gênero que demonstram a importância dos quesitos
sociais na formação do conhecimento e dos referenciais da Lógica que
conhecemos nos tempos atuais.

Assim sendo, mediante o conteúdo apontado pelo texto-base, avalie as asserções


a seguir e a relação proposta entre elas.

I. A ausência de mulheres na história da filosofia mostra que o discurso proferido pela


mulher foi omitido por muito tempo, por meio de uma violenta dominação
masculina.
PORQUE
II. A neutralidade da filosofia e o seu compromisso com a verdade anulam o caráter
dominador do protagonismo masculino presente em todos os campos da
sociedade e da história.

A respeito dessas asserções, assinale a opção correta.

a) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da


I.
b) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa
correta da I.
c) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) As asserções I e II são proposições falsas.

63
NARRATIVAS ORAIS COMO UNIDADE
FORMAÇÕES RELIGIOSO-
MITOLÓGICAS
04
4.1 INTRODUÇÃO

Nesta Unidade, você irá compreender um pouco mais a respeito das


Cosmogonias religiosas, observando, em particular, o campo religioso brasileiro. Para
isto, será realizado um resgate histórico das narrativas comuns à dinâmica da
sociedade brasileira, enfocando diferentes suportes para a construção de
interpretações literárias sobre o fenômeno religioso e as concepções populares sobre
a natureza e o ser humano dentro de seu espaço e sua realidade.
Será possível observar, desta forma, os modos pelos quais a tradição oral e os
gêneros literários ‘consagram’ e eternizam conceitos e cosmovisões que são
assimiladas pelas pessoas em diferentes gerações. Estas cosmovisões são ligadas ao
universo religioso dos indivíduos, e determinam comportamentos e normas a serem
seguidas pela sociedade, como parte de um padrão ético e moral que pode
repercutir, inclusive, em aparatos legais ou, ao menos, em formas de relacionamento
entre pessoas em diferentes momentos e situações históricas.
Assim, mediante o estudo dos saberes e conhecimentos contidos nas
trajetórias e narrativas orais e nos gêneros populares de literatura – tais como a
literatura de cordel, de apelo muito intenso na região Nordeste – será possível avaliar
de que modo estas narrativas são transmitidas ao longo dos tempos, percebendo,
ainda, de que modo as situações-limite na vida humana são descritas como parte
de um cenário que a Cosmogonia bíblica interpreta como ‘apocalíptico’: as
narrativas sobre o fim dos tempos são recorrentes nas tradições culturais e religiosas,
destacando um período de importante purificação na humanidade decaída após
um número inespecífico de séculos.
Esta purificação ocorreria por meio de um período de sofrimentos que leva ao
fim do mundo tal como o mesmo é conhecido e concebido, seja por ação direta
da(s) divindade(s) eterna(s), ou mesmo pela morte e desaparecimento destas
entidades em uma grande luta entre forças universais que, embora seja esperada

64
desde o alvorecer dos tempos, gera a possibilidade de extinção de toda a
humanidade, ou seja, dos indivíduos fiéis e infiéis.
Deste modo, está pronto para começar? Então, bons estudos!

4.2 A IMPORTÂNCIA DA TRADIÇÃO ORAL NA EXPRESSÃO RELIGIOSA

Em sua infância e adolescência, o autor deste livro aprendeu, com seus pais,
a recorrer aos préstimos de uma senhora especializada na realização de benzeções
que teriam a capacidade de retirar os quebrantes e influências negativas da vida
das pessoas. Assim, por intermédio da benzedeira, tornava-se possível realizar um
trabalho de limpeza espiritual que abrisse caminhos em relação a eventuais
demandas que trouxessem algum tipo de problema ao corpo físico.
Desta forma, expressões diferentes de sentimentos considerados negativos na
realidade humana, como a inveja, o mau olhado, o olho gordo e o ciúme poderiam
ser efetivamente retirados por meio de um ritual que combinava orações e alguns
tipos de somatização (especialmente bocejos e lacrimações) que demonstravam
que o quebrante estava sendo retirado: em um ciclo de três dias de orações, o
primeiro dia gerava vários bocejos, e no terceiro dia, a frequência era menor.
Com isto, havia uma indicação clara de que os caminhos espirituais estavam
abertos, e os objetivos no plano físico – como a aprovação em concorridos
vestibulares, por exemplo – teriam melhores condições de serem alcançados
(OLIVEIRA, 1985).

65
Ao retomar esta memória sobre a benzeção, há um interesse em demonstrar
não apenas a sua influência em relação a um grupo ou uma população; para os
objetivos deste livro, é mais importante destacar que estes rituais, que são comuns
à realidade brasileira e ocorrem de diferentes formas, geralmente são transmitidos
por meio de relatos não-codificados (WRIGHT, 2004).

Figura 15: Sacerdote católico aplicando bênçãos sobre a garganta dos fiéis

Fonte: Disponível em https://bit.ly/37JBYFV. Acesso em: 20 jan. 2022.

Ou seja, estes relatos e ações nem sempre estão disponíveis em suporte físico,
e remetem a tradições que são repassadas oralmente entre gerações. O benzedor,
via de regra, herda esta capacidade de algum antepassado ou de alguma pessoa
piedosa que mantinha este hábito – no caso destacado, a filha da senhora
responsável pelas benzeções deu prosseguimento ao seu trabalho.

66
Assim, estas pessoas herdam e transmitem diferentes carismas que geram
concepções importantes acerca da vida humana: a crença na bênção como um
ritual capaz de limpar energias espirituais da pessoa e promover diferentes tipos de
alívio ao sofrimento psíquico faz com que as pessoas consolidem a busca pelo(a)
benzedeiro(a), ou pelo líder espiritual, em seus momentos de dificuldade (OLIVEIRA,
1985).
Portanto, as narrativas estabelecidas por estes agentes, como representantes
e intermediários do sagrado, as narrativas geram uma proximidade maior com as
pessoas, em detrimento do presbítero (padre), o qual desconhece e/ou desaprova
estas práticas de religiosidade popular.
Para a constituição do benzedeiro/benzedor, esta figura de representação e
intermediação de carismas espirituais, é necessário absorver conhecimentos
eventualmente seculares e/ou milenares a respeito das doenças e problemas físicos
e emocionais do ser humano.
Estes conhecimentos, portanto, estão disponíveis na memória afetiva das
pessoas (ainda no tempo presente) como sendo capazes de promover a cura física
e espiritual por meio de ações e objetos específicos, como as benzeções, os
trabalhos, o uso de garrafadas, etc (CORRAL, 2010).

Você pode, consequentemente, observar que as tradições orais apresentam


uma relação extremamente importante com o fenômeno religioso e, por sua vez,
com o estabelecimento de diferentes Cosmogonias e concepções religiosas. A
tradição oral apresenta, efetivamente, a capacidade de complementar o
conhecimento religioso da sociedade por meio de saberes repassados a partir de

67
tempos imemoriais, e que podem ser mais ou menos herméticos (exclusivos) a
depender das características do ato e da mística subjacente às práticas
apresentadas.
Por exemplo, uma simpatia para curar soluço, aplicando um pedaço de
barbante vermelho à testa da criança, constitui-se em um gesto popular e que é
reproduzido em diferentes espaços e situações; entretanto, outros saberes mais
profundos, que relacionam a prática da benzeção, por exemplo, são reservados
apenas àqueles que irão desempenhar esta atividade junto aos demais fiéis,
preservando assim uma identidade e uma herança cultural que se perpetua e se
amolda a diferentes realidades e circunstâncias (OLIVEIRA, 1985).

Figura 16: Ervas e garrafadas à venda em um mercado

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3vjKJPs. Acesso em: 20 jan. 2022.

Da mesma forma, a tradição oral pode ser mais que um mero complemento
ao fenômeno religioso; em muitos casos, esta tradição é a essência deste fenômeno,
relembrando fatos extraordinários de tempos antigos; este suporte de conhecimento
está presente, em particular, para sociedades e grupos que não dispõem de meios
eficientes de registro da doutrina, dos pensamentos de seus criadores, etc (MELLO,
2003).
Nestes casos, a recitação de trechos e situações armazenadas na memória
dos primeiros seguidores constitui-se como uma sabedoria institucional que, aos
poucos, molda as formas de culto e as expressões rituais. Vale dizer, se inexiste um
suporte literário e uma forma de comunicação escrita, o registro da história e dos
conhecimentos de cada sociedade torna-se possível por outros meios, como por
exemplo, o registro em pinturas rupestres, comuns aos povos indígenas brasileiros

68
(CAMPOS; MIRANDA, 2000).
Esta realidade, portanto, é comum às Cosmogonias orientais e ocidentais, em
quaisquer circunstâncias onde o registro dos saberes contidos na expressão religiosa
seja transmitido entre pessoas, consolidando diferentes padrões de memória e
história. Como referência desta discussão, leia um trecho do Evangelho de Lucas, em
seu primeiro capítulo, como se segue:

Muitas pessoas já tentaram escrever a história dos acontecimentos


que se passaram entre nós. Elas começaram do que nos foi transmitido
por aqueles que, desde o princípio, foram testemunhas oculares e
ministros da palavra. Assim sendo, após fazer um estudo cuidadoso de
tudo o que aconteceu desde o princípio, também eu decidi escrever
para você uma narração bem ordenada, excelentíssimo Teófilo. Desse
modo, você poderá verificar a solidez dos ensinamentos que recebeu
(A BÍBLIA, 1990, p. 1309).

No trecho destacado, o evangelista menciona um esforço de pesquisa que


tinha o objetivo de escrever, de um modo ordenado e coerente, o conjunto de
informações e saberes sobre a doutrina cristã que os primeiros fiéis estavam
transmitindo, uns aos outros, por meio da catequese e dos rituais. Inexistem registros
sobre quais eram exatamente as pessoas que faziam esta transmissão, pois o texto
bíblico relembra apenas os apóstolos e mais alguns poucos cristãos recém-
convertidos à nova fé. Porém, as suas tradições permaneceram e se consolidaram
nos textos que compõem o cânone bíblico (CONE, 2021).
Portanto, observe que a instituição cristã, com todas as suas referências
políticas e sociais que foram desenvolvidas ao longo dos séculos, tem início a partir
da transmissão de tradições orais e relatos visuais de indivíduos que teriam convivido
com Jesus e apreendido seus ensinamentos. A Cosmogonia bíblica, portanto,
também apresenta uma dependência relevante em relação às narrativas orais e às
transformações e diferenças literárias que são apresentadas em diferentes momentos
e realidades sociais.

69
No contexto da religiosidade brasileira, a tradição oral se consolida, portanto,
como um relevante suporte para as Cosmogonias religiosas. No entanto, outros
métodos são igualmente importantes para o registro de concepções historicamente
estabelecidas em nossa sociedade: dentre estes suportes e estilos literários, cabe
mencionar o caso da literatura de cordel.

4.3 NARRATIVAS ORAIS, LITERATURA DE CORDEL E A RELIGIOSIDADE POPULAR


NO BRASIL

Os gêneros literários desempenham um papel importante na compreensão


das cosmovisões permeadas pela religião em diferentes culturas e sociedades: as
novelas de cavalaria do período medieval, por exemplo, destacavam a constante
luta do homem entre o Bem e o Mal, por meio de torneios e conflitos nos quais os
homens e heróis disputavam o poder, o amor feminino e a fama a partir de suas
orientações religiosas e convicções morais (PHILIP, 1996).
A herança cultural lusófona, por sua vez, permitiu uma introdução destes
romances e contos portugueses na sociedade brasileira desde o período colonial;
por meio destas narrativas, as pessoas elaboraram contos e relatos a respeito de
heróis, figuras lendárias e seres de característica sobrenatural que fazem parte, a seu
modo, das referências do folclore brasileiro, como a Mula-sem-cabeça, o Saci-
pererê, o Currupira, etc.
Muitas destas tradições, oralmente transmitidas, são elaboradas a partir de
associações visuais e comportamentos induzidos, como ocorre, por exemplo, com a
crença de que o Saci-pererê é capaz de fazer tranças em crinas de cavalos, quando,

70
na verdade, tal ação ocorre a partir da ação de morcegos hematófagos que, muito
raramente, atacam animais domésticos para se alimentar.
De toda forma, estes saberes vão sendo incorporados à cultura popular e se
codificam na forma de conhecimentos e instruções que devem ser apreendidas
como parte da realidade cotidiana. Deste modo, mesmo quadros emocionais e
físicos importantes, como a paralisia do sono (um estado de rigidez muscular
involuntária que ocorre em algumas pessoas na passagem entre o dormir e o
acordar), também passam a ser explicados por meio da ação de figuras
extraordinárias, como o Pesador, um ser sobrenatural que prende as pessoas e
impede o seu movimento durante o sono (CRISPIM et al., 2007).

Figura 17: Caipora, um personagem da Cosmogonia indígena brasileira

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3juC9rg. Acesso em: 20 jan. 2022.

Esta dinâmica transpassa a sabedoria popular e abrange, particularmente, o


domínio religioso. Com efeito, este segmento é particularmente sensível às tradições
orais, que se consolidam no tempo e determinam as diferentes formas de exercício e
de ação ritual (MELLO, 2003).

71
Assim, é importante perceber que as tradições orais e os relatos consolidados
na cultura popular são, em muitos momentos, absorvidos por diferentes gêneros
literários que dão suporte a estes relatos e os eternizam no tempo. Mais do que isto,
esta expressão literária condensa as visões do povo a respeito de seus heróis e
bandidos e suas obras boas e más, bem como os seus mitos e suas visões religiosas,
transportando fatos que ocorreram em regiões delimitadas para outros lugares e
comunidades, permitindo, assim, a expansão do mito e do conhecimento gerado ao
redor de tais personagens.
No Brasil, este gênero é particularmente vinculado à literatura de cordel, cujo
nome está associado aos varais onde são pendurados os livros de pequenas
dimensões, impressos artesanalmente, e que relatam histórias comuns aos sertanejos
da Região Nordeste, onde este estilo é mais difundido, relacionando estes fatos a
outros eventos extraordinários que relacionam personagens reais e/ou imaginários e
seus feitos, transpondo-os ao conhecimento popular (COSTA, 2018).

Figura 18: Folhetos de cordel em banca no Rio de Janeiro

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3M258Po. Acesso em: 20 jan. 2022.

72
O cordel é uma forma importante de consolidação de diferentes relatos e
narrativas que sustentam a cultura religiosa desta parcela da sociedade, em um estilo
e formato de escrita que remonta à colonização portuguesa. Neste perfil de texto,
temas sagrados e profanos coexistem com naturalidade, inspirando autores
(anônimos, em muitos casos) a desenvolver textos curtos e romanceados que
destacam fatos historicamente comprovados ou situações heroicas onde o ser
humano vai além do senso comum e toca as raias do extraordinário, aproximando-
se, inclusive, da Cosmogonia bíblica ao evocar relatos de curas e milagres obtidos
pela intercessão de diferentes pessoas, que são consideradas santas pelo povo fiel
(COSTA, 2020).

A construção da Cosmogonia religiosa pelo cordel é feita por meio de uma


estrutura de texto formal e articulada de modo a caracterizar um gênero literário,
mediante o emprego de recursos poéticos que dão ênfase à narrativa e sustentam
o relato do autor, que se coloca muitas vezes como repórter, espectador interessado
e mesmo como alguém que assume categoricamente as crenças apresentadas em
sua obra.
Como referência desta discussão, você pode observar o folheto A vida do
padre Antônio (O milagroso de Urucânia).
Este folheto faz referência aos propalados milagres de Pe. Antônio Ribeiro Pinto
(1879 – 1962) no distrito de Urucânia, pertencente à Zona da Mata mineira. Padre
Antônio se destacava na sociedade local, e ganhou projeção nacional e
internacional, pelos relatos de cura que se associavam às bênçãos que ele ministrava
por intercessão de Nossa Senhora das Graças. Por conta destes rituais, milhares de
pessoas rumaram para Urucânia entre 1947 e 1948, buscando o alívio de seus males
mediante a ação deste sacerdote (ASSIS, 2004).
No folheto, o autor apresenta os feitos deste sacerdote com uma linguagem

73
objetiva e popular, sem deixar de lado um estilo poético e romanceado que
caracteriza a escrita do cordel e prende a atenção do público a que se destina
(COSTA, 2018, pp. 151-52):

Padre Antonio sempre


Mensageiro da verdade
Interpreta os Evangelhos
Com mais pura Santidade
Não ataca o inimigo
Antes se faz um amigo
Praticando a caridade

O sorrir do Padre Antônio


Nos conforta o coração
Os seus conselhos leitores
É o mais belo sermão
A sua fé que é sem par
Tem o poder de curar
A todo e qualquer cristão

Desta forma, você pode avaliar que, no campo religioso brasileiro, a


construção da religiosidade popular associa os ensinamentos e a doutrina
institucional das diferentes igrejas a práticas públicas e particulares de culto que
escapam ao controle das religiões.

Figura 19: Romeiros no santuário católico de Urucânia (MG)

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3JBDtn5. Acesso em: 20 jan. 2022.

Estas expressões de espiritualidade estão fortemente associadas a


concepções e cosmovisões que atribuem significados especiais à ação de pessoas
cujo grau de piedade, superior à dos demais fiéis, condiciona um contato mais íntimo
com o sagrado, permitindo que o mesmo também possa ser vivenciado pelos demais

74
fiéis. Esta Cosmogonia religiosa na realidade brasileira, portanto, destaca a existência
de figuras reais com capacidades extraordinárias ou taumatúrgicas, ou seja, que
canalizam o poder do sagrado para o alívio do sofrimento das pessoas.
As bênçãos de Padre Antônio, neste sentido, passam a ser cantadas em verso
por meio do cordel, e o conhecimento ao redor de sua pessoa permite desenvolver
devoções e uma fama de santidade que não aguarda pelo aval da Igreja para se
manifestar: ao contrário, o povo consagra estas pessoas como seus heróis e
intercessores, e agrega-os à sua cosmovisão, mesmo depois de sua morte, como
‘santos’ que, estando mais próximos a Deus, podem ainda continuar a distribuir suas
bênçãos sobre a terra (ASSIS, 2004).

4.4 AS VISÕES DO FIM E A NARRATIVA RELIGIOSA

Ao discutir a importância das tradições orais para a construção da


Cosmogonia religiosa, é possível compreender a sua importância como base
interpretativa de saberes historicamente determinados que são, a seu tempo,
elaborados em relatos escritos que sustentam as formas de culto e as concepções
humanas acerca do universo e da história.
Ou seja, a narrativa oral sustenta a criação das doutrinas e do conhecimento
sobre o mundo que está associado à espiritualidade individual; deste modo, estes
saberes transmitidos ao longo dos tempos fundem-se com outros saberes para criar
doutrinas e panteões (grupos de deuses) nos quais o divino se relaciona com os seres
humanos e determina as condições de seu surgimento e sua existência no espaço
natural (MELLO, 2003).
Neste sentido, é importante destacar que, até o presente momento, foi
possível observar como as tradições religiosas associam a importância da criação e
do surgimento do homem como elementos fundamentais para a construção do
saber aliado à espiritualidade. Entretanto, o tempo passado e o tempo presente não
são as únicas preocupações do pensamento e da cosmovisão religiosa: é preciso
que o fiel reflita, inclusive, a respeito do tempo futuro, e não apenas do seu futuro,
onde a morte inexoravelmente o aguarda como um momento final.
O fim da humanidade, portanto, é também pensado e aguardado pelas
religiões, que constroem conceitos e visões a respeito deste momento-chave da
existência humana, em que um grande confronto deve não apenas extinguir todas

75
as pessoas, ou ao menos a sua maioria. Deste modo, há uma construção importante
e recorrente nas civilizações a respeito das forças envolvidas neste combate, o modo
pelo qual a humanidade irá perecer, e de que modo um ‘outro mundo’ surgirá após
este grande conflito cósmico (BULLFINCH, 2000).
Para compreender esta recorrência das ‘visões do fim’ em relação às
Cosmogonias religiosas, é possível recorrer a exemplos em diferentes continentes e
civilizações, a fim de observar de que modo estas sociedades compreenderam a
viabilidade da existência humana em um cenário futuro onde a distopia e o terror da
aniquilação podem ser substituídos por uma esperança na renovação e na
continuidade da vida para um grupo de pessoas eleitas.
Inicialmente, é possível referenciar esta discussão a partir da Cosmogonia
bíblica; o livro do Apocalipse (‘Revelação’) complementa os ensinamentos do Novo
Testamento ao descrever representações de situações que os cristãos enfrentariam
em tempos futuros: perseguições, mortes e destruição trariam terror à terra, embora
aqueles que testemunhassem sua fé teriam assegurada a sua salvação pelo martírio,
desfrutando da convivência com Deus no paraíso (A BÍBLIA, 1990).

Figura 20: Recorte do Juízo Final, de Lucas van Leyden

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3JBUMV4. Acesso em: 20 jan. 2022.

Há, portanto, um relato importante que destaca este processo (de angústia,
sofrimento, morte, purificação, renovação) a partir de uma Cosmogonia associada
intimamente ao povo de Israel, cuja convivência com civilizações próximas permitiu
uma associação importante com outras Cosmogonias.
Entre os iranianos seguidores de Ahura Mazda, por exemplo, há uma dinâmica

76
razoavelmente semelhante: de acordo com esta narrativa, o grande sábio Saoshyant
virá dos céus, no fim dos tempos, para renovar a criação e o planeta, e auxiliar Ahura
Mazda (a divindade criadora, suprema e benevolente) a destruir Ahriman, a deidade
negativa desta religião. Neste momento, os primeiros humanos, Mashya e Mashyoi,
irão ressuscitar dos mortos, e a humanidade junto com eles (PHILIP, 1996).
Enfim, haverá a purificação dos pecados humanos, no qual as pessoas serão
mergulhadas em torrentes de lava: o metal derretido será como água morna para os
justos, e um tormento para os infiéis. Por fim, resgatados da condição mortal, as
pessoas irão cruzar a Ponte Cinvat, a ponte simbólica que liga o novo mundo ao céu
e ao inferno – sendo que o inferno possui características próximas aos rios de fogo
descritos pela religiosidade cristã, principalmente no período medieval (PHILIP, 1996).

Na civilização greco-romana, há diferentes relatos de morte e destruição que


se seguem a atos humanos de desobediência à vontade dos deuses, como ocorreu,
por exemplo, na destruição da cidade de Atlântida por Poseidon, o deus dos mares.
Nesta concepção religiosa, as almas dos injustos são enviadas para o Hades, um
mundo inferior e um espaço de sofrimento que pertence ao deus de mesmo nome.
Ali, as almas eram guardadas pelo cão Cérbero, que vigiava os portões do Hades
para que os mortais não entrassem no mundo inferior.

77
Figura 21: Hades e Perséfone, divindades greco-romanas

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3vcGtBd. Acesso em: 20 jan. 2022.

Ainda assim, deuses e mortais, eventualmente, procuravam esta região para


buscar por seus entes queridos que haviam morrido, como o deus grego Orfeu, que
desceu ao Hades para buscar sua amada Eurídice; e ainda Eneias, o pastor de Troia
que, tendo sobrevivido à guerra, fugiu com seu pai Anquises e partiu para uma região
distante onde seus descendentes, os bebês Rômulo e Remo, dariam origem à
civilização romana (BULLFINCH, 2000).
No âmbito da Cosmogonia nórdica, há o relato de Ragnarok, uma grande
batalha entre deuses e criaturas lendárias: esta batalha se inicia com o toque de
alvorada por Heimdall, o deus que guarda as portas de Asgard, a morada dos
deuses. Neste momento, as divindades irão morrer sob o ataque destas criaturas, em
um ‘crepúsculo dos deuses’ que levará muitas entidades à aniquilação (exceto aos
jovens deuses Balder e Hoder); no entanto, os seres humanos não pereceriam em sua
totalidade: um casal, Lif e Lifthrasir, irá sobreviver ao se esconder sob a Árvore da
Vida, e assim a humanidade poderá recomeçar.

78
Figura 22: Ragnarok, a batalha final dos deuses nórdicos

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3773uxr. Acesso em: 20 jan. 2022.

Por sua vez, a Cosmogonia asteca enfatiza a esperança dos indígenas em


relação ao retorno de Quetzalcoatl, uma das principais divindades que, após auxiliar
os astecas a se consolidarem em seu território, partiu pelo mar na direção leste,
navegado em seu barco conduzido por serpentes (o próprio deus é também
representado como uma serpente emplumada).
A crença em seu retorno fez com que muitos indígenas associassem os
espanhóis como enviados de Quetzalcoatl ou como o próprio deus, estabelecendo
culto a eles em uma atitude que acabou precipitando sua destruição posterior
(CAMPOS; MIRANDA, 2000).

79
Figura 23: Quetzalcoatl navega em seu barco de serpentes

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3xmBH6J. Acesso em: 20 jan. 2022.

Por fim, entre os inuits, uma civilização que habita o Alasca e o círculo polar
ártico, há o relato dos pais fundadores desta sociedade, que percorreram toda a
Terra para descobrir as suas dimensões e o que havia no planeta: os inuits começam
a se desenvolver quando estes dois homens, ao cruzarem o planeta e formarem suas
famílias, retornam ao seu ponto de origem, morrendo ao se reencontrarem – neste
caso, não são os deuses que revelaram o conhecimento indispensável para os
humanos, sendo eles mesmos os responsáveis por haver conhecido o mundo (PHILIP,
1996).

4.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Prezado estudante, ao longo desta Unidade foi possível averiguar de que


modo as Cosmogonias religiosas se associam e são construídas por relatos orais
distintos, que auxiliam as pessoas, nas diferentes civilizações, a conceber formas de
compreensão do mundo e, em particular, de eventos futuros que pudessem anunciar
o fim da vida tal como estas pessoas a conheciam e concebiam.
Desta forma, o estudo dos conceitos apresentados permitiu observar a
recorrência de uma concepção cosmogônica que avalia a esperança na
renovação da humanidade: apesar de seus pecados, erros e culpas, há sempre a
oportunidade para uma regeneração das pessoas após o evento destruidor, com a

80
sobrevivência de pessoas justas que permitirão que a civilização reinicie seu ciclo de
existência sob o olhar da(s) divindade(s).
As ‘visões do fim’, portanto, são parte essencial do fenômeno religioso: tais
concepções orientam as pessoas na direção da contemplação do sagrado, e
formam uma consciência de temor e esperança na ação dos deuses para evitar os
males e sofrimentos decorrentes destes tempos finais. Estes eventos estão no limite da
história das civilizações, e revelam embates importantes entre o Bem o Mal, como
categorias ontológicas, isto é, como essências de uma forma de ser que caracteriza
os seres humanos e a sua existência.

81
FIXANDO O CONTEÚDO

1. As Cosmogonias religiosas destacam narrativas e conceitos importantes em


relação às formas de apresentação dos relatos popularmente estabelecidos em
relação à cultura das civilizações. Assim sendo, é essencial reforçar a
compreensão e a avaliação destes conceitos a partir de uma perspectiva histórica
e sociológica.

Deste modo, considerando o conteúdo apresentado pelo livro-texto a respeito das


narrativas e Cosmogonias entre as civilizações, associe as colunas a seguir:

1. Cordel
2. Ragnarok
3. Atlântida
4. Cinvat

( ) Trata-se de uma cidade desaparecida sob um grande evento climático, de


acordo com a Cosmogonia grega.
( ) O conceito destaca a ponte pela qual as pessoas salvas irão passar ao fim do
mundo, segundo a Cosmogonia iraniana.
( ) Trata-se de um suporte de produção literária por meio de folhetos de projeção
popular, bastante comuns na realidade brasileira.
( ) O conceito menciona um evento-chave na Cosmogonia nórdica, no qual
ocorrerá o fim do mundo conhecido.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) 3 – 4 – 1 – 2
b) 2 – 3 – 1 – 4.
c) 4 – 1 – 3 – 2.
d) 1 – 2 – 4 – 3.
e) 4 – 3 – 2 – 1.

82
2. As tradições orais refletem um conjunto de significações históricas que as
civilizações atribuem aos fenômenos naturais e a diferentes situações que se
configuram como especiais em suas Cosmogonias. Assim, tais narrativas podem
ser analisadas a partir de suas articulações culturais e sociais.

Desta forma, considerando os conceitos mencionados pelo livro-texto a respeito


das tradições culturais no discurso religioso, analise as seguintes afirmações:

I. As tradições orais são características da Cosmogonia oriental, pois nas


concepções ocidentais há um enfoque da narrativa escrita.
II. Na tradição religiosa, é comum estabelecer valor crítico e cultural apenas às
tradições orais estabelecidas a partir de autores conhecidos.
III. A tradição oral destaca, em geral, os feitos extraordinários de diferentes
indivíduos ao longo da história das civilizações.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

3. Para entender a importância e a abrangência das tradições orais no discurso


religioso e nas Cosmogonias relativas às civilizações, é importante referenciar de
que modo estas tradições estão construídas e como elas se articulam em
diferentes gerações e períodos cronológicos.

Considerando a dinâmica proposta pelo texto-base, analise as seguintes


afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) A tradição oral permite estabelecer vínculos importantes entre as gerações, por


meio da transmissão de conhecimentos dos antepassados que reforçam a
identidade cultural de um povo.

83
( ) As tradições orais são intrínsecas a sociedades ‘atrasadas’ do ponto de vista
tecnológico, pois subsistem em períodos onde não há o desenvolvimento da
escrita.
( ) A tradição oral firma-se como uma Cosmogonia religiosa no momento em que
agrega narrativas históricas que remontam a eras onde ocorriam fatos
extraordinários.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.
e) F – V – F.

4. Por meio da Literatura de Cordel, desenvolveram-se diferentes tradições históricas


que apontam para a variedade cultural da população brasileira. Estas tradições
inserem-se, portanto, em um espaço que articula História e Literatura para a
construção de identidades na sociedade.

Neste sentido, de acordo com as colocações efetivadas pelo livro-texto, é correto


afirmar que

a) a principal característica deste gênero literário é a construção de narrações que


abrangem apenas personagens reais, referindo-se assim a uma espécie de
biografia romanceada.
b) a necessidade de autoria comprovada é essencial para o desenvolvimento deste
gênero literário, uma vez que o mesmo é pautado sobre evidências históricas que
estão na memória popular.
c) um dos fundamentos deste gênero na formação de Cosmogonias religiosas e
concepções culturais é o destaque conferido apenas a figuras que, de acordo
com o apelo popular, tenham praticado boas obras.

84
d) este gênero literário ampara-se em diferentes perfis de narrativa que podem
abranger tanto os fatos históricos quanto as narrativas de heroísmo em diferentes
momentos.
e) este gênero literário realiza a adaptação de situações do cotidiano das pessoas,
embora mantenha distanciamento em relação à Cosmogonia bíblica, a qual é
considerada como sagrada.

5. As concepções das diferentes Cosmogonias religiosas a respeito do fim dos tempos


podem ser elencadas a partir de narrativas e relatos cuja importância histórica
atesta a sua influência entre as diferentes sociedades e civilizações. Assim, a
fixação de conceitos relativos a estas narrativas permite perceber questões sociais
e teológicas que se relacionam a estes povos ao longo da história.

Desta forma, a partir do conteúdo apontado pelo texto-base, analise as seguintes


afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) Na Cosmogonia greco-romana, o relato do Hades demonstra um espaço de


bem-aventurança semelhante ao paraíso, o que demonstra as aproximações
com os textos bíblicos.
( ) A narrativa de Ragnarok enfatiza que todos os seres humanos perecerão no
evento que diz respeito ao fim dos tempos, entretanto, há uma esperança na
renovação com a sobrevivência de Lif e Lifthrasir.
( ) De acordo com as concepções da Cosmogonia nórdica, o ‘crepúsculo dos
deuses’ irá ocorrer no contexto de uma batalha definitiva entre forças do Bem e
do Mal na qual as próprias divindades enfrentam a aniquilação.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – F.
e) F – V – V.

85
6. Para compreender a importância dos eventos relativos aos ‘tempos finais’ nas
diferentes concepções religiosas e culturais, é fundamental sedimentar conceitos
que lhes dizem respeito, pois estes conceitos unificam perspectivas históricas e
teológicas acerca das cosmovisões individuais.

Assim sendo, mediante o contexto apresentado, analise as seguintes afirmações:

I. O relato da travessia da Ponte Cinvat na Cosmogonia iraniana demonstra que


somente as pessoas pecadoras irão cruzar esta ponte em direção ao inferno,
nos tempos finais.
II. De acordo com os relatos da Cosmogonia iraniana, há um perecimento
importante das almas impuras em rios de lava que recordam, de certo modo,
o inferno da Cosmogonia cristã.
III. Os relatos do fim dos tempos em relação à civilização inuit referem-se à
importância da divindade como elemento revelador de conhecimentos
fundamentais sobre o planeta e suas características.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

7. A construção de uma síntese interpretativa a respeito das vertentes culturais e das


Cosmogonias ocidentais e orientais demonstra a relevância de uma discussão
sobre as narrativas orais e sua influência no contexto das civilizações.

Desta forma, de acordo com as colocações efetivadas pelo texto-base, é correto


mencionar que

86
a) a tradição oral é destacada na Cosmogonia bíblica particularmente para os
textos do Antigo Testamento, pois no Novo Testamento há destaque apenas para os
relatos que podem ser comprovados.
b) as narrativas do fim dos tempos relacionam, de forma recorrente, os ciclos de
morte, ressurreição e renovação que compõem a continuidade histórica de todas as
civilizações.
c) as civilizações onde o padrão de escrita é ausente, sem um alfabeto definido,
dependem apenas da tradição oral para a transmissão de conhecimentos
historicamente estabelecidos.
d) a Cosmogonia greco-romana destaca, na narrativa de Eneias e Anquises, a
supremacia dos gregos, pois estes, ao sobreviver à Guerra de Troia, iriam gerar a
civilização romana.
e) entre os relatos do fim dos tempos para a Cosmogonia asteca, é importante
destacar a morte de Quetzalcoatl como um evento que marca o momento de
renovação desta civilização.

8. Leia o texto a seguir:

“Na literatura de cordel, o texto narrativo funciona como um recurso de


sociabilização dos “causos” populares. Nos cordéis, observamos situações que
podem levar tanto à reflexão quanto ao riso, objetivando a transformação da
percepção humana acerca de determinada situação, como demonstra o
exemplo a seguir:

O poeta é um repórter
De pensamento ligado
Ouvindo o que o povo diz
Fazendo todo apanhado
E sai contando na rua
Tudo quanto foi passado

SILVA, M.C. Manoel Caboclo. São Paulo: Hedra, 2000.

Avalie as afirmações a seguir, tomando como base o que foi apresentado:

87
I. A literatura de cordel apresenta estrutura formal bem articulada.
II. No trecho, o poeta de cordel é comparado ao repórter por trazer informações
sobre os fatos cotidianos.
III. Por apresentar elementos narrativos, os recursos poéticos são pouco utilizados
na literatura de cordel.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

88
ELEMENTOS FUNDADORES DAS UNIDADE
COSMOLOGIAS GRECO-
ROMANAS
05
5.1 INTRODUÇÃO

Nesta Unidade, serão apresentados alguns parâmetros relacionados à Filosofia


grega que estruturaram as concepções desta civilização – e também as de outras
sociedades, como as sociedades helenistas e as romanas – a respeito dos processos
de organização do universo e das características primordiais da natureza e do ser
humano. Desta forma, será possível analisar de que modo os gregos compreenderam
este processo de criação, convertendo e reestruturando Cosmogonias baseadas na
visão religiosa em Cosmologias que podem ser diretamente associadas a autores e
intelectuais a serviço do saber e da construção do conhecimento em seus
respectivos tempos históricos.
Desta forma, esta Unidade irá resgatar concepções de diferentes autores,
como Pitágoras (570 – 495 a.C), Anaximandro (610 – 546 a.C) e Demócrito (460 – 370
a.C), a fim de avaliar as suas abordagens sobre os elementos criadores da ordem e
da natureza a partir do universo, relacionando e, eventualmente, contrapondo
ciência e religião por meio de concepções criadores de Cosmologias cujos princípios
básicos são ainda coerentes e observados na realidade contemporânea.
Enfim, está pronto para começar? Então, bons estudos!

5.2 OS FILÓSOFOS PRÉ-SOCRÁTICOS

Na história da Filosofia, é comum destacar a existência de um grupo de


filósofos e pensadores que precedeu o surgimento e o pensamento de Sócrates (470
– 399 d.C.), em particular, a respeito dos elementos e fatos geradores do universo de
acordo com algumas Cosmologias intrinsecamente elaboradas por estes
pensadores.
Portanto, é coerente pensar em uma filosofia pré-socrática como uma
corrente nesta área do conhecimento que se dedicou objetivamente a

89
compreender as questões mais existenciais do ser humano, enfocando a sua origem
em uma ordem universal pré-estabelecida, bem como sobre sua função neste
universo e os objetivos mais básicos do ser em um grupo ou uma sociedade (CORDI
et al., 2003).
Estes pensadores e filósofos também são denominados como cosmólogos, pois
buscaram desenvolver formas coerentes de interpretação do universo que fossem
além do senso religioso ou das Cosmogonias que associavam relatos fabulosos e
narrativas mitológicas à compreensão do processo de desenvolvimento da ordem
natural.

Figura 24: A Escola de Atenas, de Rafael

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3KBdNrP. Acesso em: 20 jan. 2022.

Assim, o enfoque primordial destes pensadores, ao entender a origem das


coisas e dos tempos, era o de desenvolver compreensões sobre a natureza destes
mesmos elementos e dimensões. Seria possível compreender, desta forma, as
características essenciais do tempo e do espaço a partir de relações de causa e
efeito e articulações entre explicações efetivas sobre a natureza e seus processos
formadores (CHAUÍ, 2010).
Há, portanto, uma preocupação importante para estes filósofos em associar
conceitos de acordo com o conhecimento vigente para ampliar as concepções a
respeito da vida humana, procurando um sentido e uma lógica nestas concepções.
Ou seja, a atribuição da vida e da natureza sujeita apenas à vontade dos deuses
passava a ser de algum modo uma explicação ineficiente ou incompleta: seria

90
preciso avançar na construção de conceitos que fossem realmente passíveis de
explicação, embora pudessem eventualmente admitir algumas abstrações de
acordo com as circunstâncias históricas e técnicas que estivessem disponíveis para a
investigação cosmológica.
Como exemplo de tais abstrações, pode-se destacar que a construção de
linhas teóricas sobre o átomo – a unidade básica da matéria, essencial para a
formação de moléculas e a difusão de energia – remonta à Antiguidade, sendo
discutida no Oriente entre a filosofia hindu, e no Ocidente a partir de Demócrito, que
enfatizou a existência de uma estrutura ‘única e indivisível’ que dava origem a todas
as coisas. Evidentemente, tal suposição estava baseada em uma abstração
científica, uma vez que as primeiras observações do átomo ocorreram apenas no
século XX (CORDI et al., 2003).

A partir desta contextualização inicial, é importante ressaltar algumas


concepções teóricas e seus autores, os quais proporcionaram a criação de
importantes Cosmologias explicativas da ordem natural, como nos exemplifica Chauí
(2010):
Tales de Mileto (624 – 546 a.C) desenvolveu uma Cosmologia na qual a água
era o elemento original, isto é, o elemento ambiente sobre o qual todas as outras
coisas foram criadas. Esta concepção estava, de certo modo, associada aos mitos
fundadores da sociedade grega, que afirmavam a existência de grandes
inundações que destruíam e restauravam a humanidade. Assim, Tales admite a
existência de uma substância que fosse primordial, isto é, que fosse ligada à origem
de todas as coisas.

91
Já Anaximandro (610 – 546 a.C) era discípulo e aluno de Tales, e dá
prosseguimento à obra de seu mestre ao cogitar a existência de uma substância
conhecida como ápeiron. Embora não pudesse ser demonstrada ou apresentada
de um modo objetivo, esta substância consistia em um elemento presente de forma
infinita no universo, e a partir deste elemento, todas as outras coisas teriam sido
criadas.
O filósofo Demócrito de Abdera (460 – 370 a.C) desenvolveu uma Cosmologia
que associava o átomo (athomos, ‘indivísível’) como um elemento maciço e único,
a partir do qual era criado o universo e todas as criaturas nele existentes: o universo
apresentava uma ordem estabelecida a partir destes átomos, não desconsiderando,
inclusive, a hipótese de haver outros mundos semelhantes à Terra, no qual as demais
partículas (átomos) também coexistiam. Assim, a natureza apresentava uma origem
intrinsecamente material, na qual os átomos eram formadores de todas as coisas, as
quais eram geradas pelo acaso, e não pela vontade dos deuses.
E, por fim, Heráclito de Éfeso (500 – 450 a.C) articulou o conceito do movimento
perpétuo, no qual se compreende que o universo está associado a oposições
conceituais que geram um dinamismo constante à matéria. Por exemplo, ao
compreender a vida humana como um processo de nascimento, crescimento e
morte, observa-se que ocorre uma convivência contínua entre forças contrárias: o
que nasce irá morrer, e a dor atesta a existência e a importância do prazer. Deste
modo, Heráclito enfatiza que o universo está sujeito a uma mudança constante como
resultado de oposições que divergem e lutam entre si.

Figura 25: Heráclito de Éfeso na Escola de Atenas, de Rafael

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3xnWjf1. Acesso em: 20 jan. 2022.

É possível observar, portanto, que os filósofos pré-socráticos já concebiam a

92
criação a partir de uma racionalidade objetiva, e não a partir da ação de deuses e
titãs, cuja luta determinava o surgimento e o fim da natureza tal como estes
pensadores a conheciam. Entretanto, suas concepções eram contemporâneas à
religião e à Cosmogonia religiosa dos gregos, na qual a relação entre corpo e alma
estava presente de modo a favorecer uma reflexão sobre as relações entre o ser
humano e as divindades; as características desta reflexão serão apresentadas na
próxima seção.

5.3 A RELIGIÃO ÓRFICA

Uma das principais preocupações dos filósofos da civilização grega, como


você pôde observar na seção anterior, destaca a importância de compreender não
apenas a origem de todas as coisas de modo a desligá-las, tanto quanto possível, de
uma hipotética vontade dos deuses; na verdade, estes filósofos preocuparam-se
com a essência das coisas e dos seres, isto é, com a existência de uma força criadora
e de um impulso de vida que caracteriza o ser humano e o torna diferente dos outros
animais.
Ora, de acordo com a Cosmogonia bíblica, a explicação para esta diferença
é objetiva e direta: os seres humanos diferem dos outros animais por terem sido
criados à imagem e semelhança de Deus, que lhes deu o sopro de vida a partir de
Adão, o primeiro homem (A BÍBLIA, 1990).
Tal concepção guarda algumas semelhanças com a Cosmogonia dos gregos,
uma vez que os deuses tinham aparência humana e inclusive se relacionavam com
os humanos, embora houvesse alguns deuses que destoavam deste padrão, como
Pã, que tocava uma flauta de junco e tinha um corpo de bode em sua metade
inferior, ou Príapo, filho de Dioniso e Afrodite, que possuía um membro sexual de
dimensões desproporcionais (BULLFINCH, 2000).
De todo modo, este convívio entre deuses, humanos e seres sobrenaturais
conferiu à Cosmogonia grega um conjunto de tradições religiosas que se pautava,
em parte, sobre o mistério como chave interpretativa da relação do homem com o
sagrado. Neste sentido, é necessário destacar que a população geral cultuava os
deuses olímpicos, ou seja, que vivam no Monte Olimpo, como Zeus, Afrodite, Ares e
outros; no entanto, a aristocracia grega (que acreditava ser descendente direta dos
deuses) mantinha cultos herméticos, secretos, baseados em antigas concepções e

93
narrativas ligadas a Orfeu, um poeta que, acreditava-se, era filho da musa Calíope
com o deus Apolo (PHILIP, 1996).

Figura 26: Orfeu e Eurídice, por Jacques-Louis David (1817)

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3jyeINP. Acesso em: 20 jan. 2022.

Orfeu teria deixado um conjunto de narrativas poéticas que estabelecia uma


importante Cosmogonia religiosa, a qual foi absorvida em alguns círculos mais
privilegiados da sociedade grega. A religião órfica, portanto, está associada a
conhecimentos secretos e/ou cabalísticos, cujo ar de mistério preservava conceitos
e discussões, reservando-os a uma pequena elite iniciada.
Nestes círculos, havia uma concepção teológica que relacionava a existência
humana a partir de uma relação dupla entre corpo e alma. Isto é, os gregos da
religião pública (olímpica) acreditavam no Hades, um local de abandono onde se
localizavam os mortos, que ali se consumiam pela eternidade (CASORETTI, 2014).
Para os adeptos do orfismo, no entanto, a passagem pelo Hades era
meramente transitória, pois a alma humana era destinada ao convívio com os
deuses, de modo que as sucessivas encarnações, ou transmigrações da alma,
destinavam-se a promover um processo purificador e de elevação espiritual.

94
A religião órfica, portanto, realiza uma distinção importante entre a
mortalidade do corpo e a imortalidade da alma. A ressonância destas concepções,
vale dizer, será observada em autores clássicos da filosofia grega, como Platão e
Aristóteles (BERNABÉ, 2011).

Assim, o orfismo associa uma concepção religiosa e filosófica para a


elucidação de importantes questões humanas, como a existência da alma e sua
importância para estabelecer uma relação objetiva entre as divindades e os seres
humanos. Ainda que fosse uma prática religiosa baseada no mistério e no hermetismo
teológico, esta tradição influenciou objetivamente as Cosmologias dos filósofos
gregos, tais como as elaborações de Pitágoras de Samos (570 – 495 a.C), de acordo
com o conteúdo a ser apresentado na seção seguinte.

5.4 O PITAGORISMO

A contribuição mais conhecida de Pitágoras de Samos para a ciência, em


geral, associa conceitos da Geometria e, em particular, da Trigonometria,
enfatizando o ‘Triângulo de Pitágoras’ e as suas categorias explicativas. No entanto,
as proposições de Pitágoras para a construção de uma Cosmologia também devem

95
ser compreendidas no âmbito da Filosofia pré-socrática, dando origem, inclusive, ao
surgimento de uma importante tradição religiosa e cultural entre os gregos na
Antiguidade.
De acordo com os seus biógrafos, Pitágoras foi um pensador de capacidades
destacadas, e que teve condições de desenvolver suas habilidades matemáticas
mediante o contato com outras civilizações, em particular os egípcios
(conhecedores exímios da Geometria) e os caldeus (que se destacavam no mundo
antigo por seu conhecimento astronômico).
A partir destes contatos, Pitágoras absorveu não apenas uma ciência exata
importante (e que auxiliou no desenvolvimento de suas próprias teorias), mas sim, um
saber hermético e associado a conceitos religiosos quer permitiu-lhe destacar-se pela
capacidade psíquica e interpretativa das questões existenciais de seu tempo, de
acordo com suas referências sociais (CASORETTI, 2014).
Ao articular conceitos do orfismo (enfocando a dupla dimensão humana em
corpo e alma) com suas próprias concepções teocêntricas que destacavam a
origem divina dos seres, Pitágoras desenvolve uma cultura religiosa que atribui ao
conhecimento a chave interpretativa para a existência de todas as coisas. Ou seja,
o saber e a matemática que está contida em todos os seres e objetos permite
determinar uma centelha, isto é, uma iluminação divina nestes elementos.

Figura 27: Pitágoras (escrevendo) em A Escola de Atenas, de Rafael

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3E5lzYy. Acesso em: 20 jan. 2022.

96
Consequentemente, a instrução e a difusão das ideias acabariam por
favorecer o desenvolvimento não apenas de capacidades cognitivas, mas de
pensamento crítico; este pensamento seria diretamente responsável pela libertação
da pessoa em relação aos ciclos potencialmente eternos de libertação, de acordo
com as crenças do orfismo.
Assim, o Pitagorismo apresenta uma convergência com a religião órfica à
medida que baseia-se em tradições orais e conhecimentos que são restritos a círculos
limitados de membros destacados e iniciados na tradição religiosa. Entretanto, há
cortes importantes com o orfismo conforme há um enfoque científico e a construção
de uma Cosmologia intrinsecamente associada aos números e sua capacidade de
organizar o universo (KAHN, 2007).

Esta ciência exata subjacente aos números, portanto, seria o elemento


essencial para a existência da natureza e do homem: ao relacionar a famosa frase
‘tudo são números’, Pitágoras procura enfatizar como essas combinações estão
presentes em todas as coisas e conduzem a natureza à absoluta perfeição.
Entre os adeptos do Pitagorismo, por exemplo, havia uma busca importante
pelos elementos que compunham a ‘razão áurea’, isto é, uma relação entre padrões
de crescimento dos objetos e seres que gera um valor constante dado por Φ (letra
grega phi, com pronúncia ‘fi’), sendo igual a aproximadamente 1,618.
Deste modo, as coisas que seguiam esta ‘razão áurea’ entre suas proporções
e seu crescimento eram consideradas harmônicas e ideais do ponto de vista
científico e estético, tal como ocorre no padrão de crescimento das conchas dos
caracóis (CASORETTI, 2014).

97
Figura 28: Razão áurea no crescimento da concha de um caracol

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3NZofvo. Acesso em: 20 jan. 2022.

Deste modo, a aritmética que está presente nas coisas, e se destaca como um
elemento ordenador, é um fator que determina a presença divina no universo; estes
conceitos atuam como pilares da escola pitagórica, muito embora a ênfase na
tradição oral e na ausência de codificação dos saberes religiosos limite a
compreensão desta tradição religiosa até os dias atuais (KAHN, 2007).

5.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Prezado estudante, ao longo desta Unidade você pôde conhecer um pouco


mais sobre as concepções filosóficas que orientaram o desenvolvimento das
Cosmologias no âmbito da Antiguidade, observando em particular as tradições
culturais e religiosas da civilização grega e suas contribuições para a elaboração de
saberes e conhecimentos baseados na observação científica dos fatos contidos na
realidade.
Mediante este estudo sistemático do universo e de suas características, estes
filósofos propuseram temáticas e desenvolveram conceitos que, embora abstratos,
tiveram uma repercussão importante na construção da ciência, inclusive, até o
momento contemporâneo: atualmente, a Cosmologia utiliza instrumentos
extremamente precisos e sensíveis para observar e descrever a realidade, com o uso
de softwares dedicados e processadores avançados. O uso destes recursos, por sua
vez, auxilia na compreensão e na descrição de fatos contidos no universo, como por
exemplo, a sua própria origem com a teoria do Big Bang. Deste modo, é possível
perceber que o conhecimento destes povos da Antiguidade constituiu-se como uma
base interpretativa fundamental para a geração de conhecimento nos séculos

98
seguintes.

99
FIXANDO O CONTEÚDO

1. Os primórdios da Filosofia na Antiguidade são marcados por uma discussão


importante a respeito da natureza humana e do universo; os estudos e reflexões
que sobreviveram até o tempo presente destacam, portanto, uma recorrência
relevante deste debate entre os intelectuais daquele tempo histórico.

Assim sendo, para consolidar seus conhecimentos sobre o tema da Cosmologia


grega, leia o trecho com lacunas que se segue:

Os filósofos conhecidos como __________ realizaram uma reflexão sistemática sobre


a realidade, com o objetivo de atualizar o conhecimento então vigente e
complementar as __________ associadas intrinsecamente aos relatos mitológicos e
às narrativas fabulosas daquele tempo histórico. Deste período resulta, inclusive, a
criação de tradições religiosas, como a religião __________.

Agora, assinale a opção que contempla a sequência correta para o texto


apresentado:

a) Socráticos – Cosmogonias – órfica.


b) Platônicos – Cosmologias – pitagórica.
c) Pré-aristotélicos – Cosmogonias – dionisíaca.
d) Pré-platônicos – Cosmologias – olímpica.
e) Pré-socráticos – Cosmogonias – órfica.

2. A corrente dos filósofos pré-socráticos apresenta características importantes em


relação às suas concepções gerais a respeito da compreensão própria da
natureza e do ser humano. Deste modo, tais características devem ser retomadas
no contexto de uma reflexão sobre as Cosmogonias e Cosmologias da
Antiguidade.

Desta forma, observando o conteúdo mencionado pelo livro-texto de acordo com


o tema proposto, analise as seguintes afirmações:

100
I. Os filósofos pré-socráticos se destacam por oferecer uma abordagem
alternativa às interpretações cosmogônicas de seu tempo histórico.
II. O principal aspecto desta corrente filosófica é a livre aceitação da vontade
dos deuses como fator-chave no processo de criação das civilizações.
III. Por meio desta corrente, iniciada a partir de Demócrito, há um enfoque no
conhecimento como uma chave interpretativa da realidade e do universo.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

3. A corrente pré-socrática é formada por importantes filósofos que se sobressaem no


desenvolvimento de uma Cosmologia associada a estes pensadores. Assim, é
necessário destacar as suas contribuições dentro de cada contexto histórico

Assim, mediante os elementos e conceitos apresentados pelo texto-base, avalie


as seguintes afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) A abordagem de Tales de Mileto acentua uma concepção na qual a fé consiste


em um elemento criador de todas as coisas.
( ) O método proposto por Anaximandro destaca a existência do ápeiron, uma
substância que está na base de todas as coisas criadas.
( ) O modelo de Heráclito de Éfeso contesta objetivamente a ideia de que o universo
é um elemento estático.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.

101
d) F – V – V.
e) F – V – F.

4. A reflexão a respeito dos filósofos pré-socráticos permite observar aspectos


adicionais quanto à construção de conceitos interpretativos sobre o universo.
Assim, é conveniente reforçar a compreensão objetiva a respeito destes
pensadores sobre as características essenciais da vida humana no espaço e no
tempo.

Desta forma, conforme as considerações apresentadas pelo livro-texto, é correto


afirmar que o filósofo responsável pelo desenvolvimento da teoria atomista como
elemento criador e base para todas as coisas criadas é:

a) Anaximandro (610 – 546 a.C)


b) Heráclito de Éfeso (500 – 450 a.C)
c) Demócrito de Abdera (460 – 370 a.C)
d) Pitágoras de Samos (570 – 495 a.C)
e) Tales de Mileto (624 – 546 a.C)

5. A religião órfica pode ser concebida e compreendida como uma tradição


relevante na sociedade grega da Antiguidade, definindo concepções
importantes de acordo com a realidade daquele tempo histórico e suas
contemplações sobre ordem expressa no universo.

Neste sentido, mediante o exame dos conceitos apresentados pelo texto-base,


analise as seguintes afirmações, julgando-as como (V) Verdadeiras ou (F) Falsas:

( ) Esta doutrina apresentava um caráter hermético, isto é, mantinha-se como um


referencial religioso reservado a pequenos grupos.
( ) A religião órfica era semelhante à religião olímpica, haja visto que abrangia o
público geral da sociedade grega.
( ) As concepções da religião órfica enfatizavam a alma como parte da existência
humana, a qual estava ligada ao corpo.

102
Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) V – V – F.
b) V – F – V.
c) V – F – F.
d) F – V – V.
e) F – V – F.

6. As concepções gerais do Pitagorismo, enquanto escola de pensamento e


abordagem filosófica, devem ser discutidas como parte de um conjunto de
conhecimentos relevantes que demonstra as tradições culturais e religiosas na
Antiguidade.

Neste sentido, de acordo com os conceitos apresentados pelo livro-texto, avalie


as afirmações a seguir:

I. Nesta tradição, surge o conceito de ápeiron como a atitude do ser humano


perante a contemplação do universo.
II. Esta tradição religiosa está associada à morte sacrifical de Pitágoras de Samos
como um evento fundador.
III. A principal característica desta tradição é o enfoque no conhecimento
contido nos números para a interpretação do universo.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas

7. O desenvolvimento de uma síntese interpretativa a respeito das Cosmologias na


Antiguidade precisa considerar a importância da Filosofia dos gregos como um
fator-chave no processo de articulação de concepções históricas e teológicas

103
para a formação de um conjunto de observações sobre a realidade, o surgimento
e a consolidação do universo.

Desta forma, conforme as considerações apresentadas pelo livro-texto, é correto


afirmar que

a) o pitagorismo, enquanto movimento associado intrinsecamente ao


desenvolvimento das ciências, enfatiza o homem apenas como um corpo.
b) a abordagem de Tales de Mileto resgatou a Cosmogonia dos caldeus a respeito
do ápeiron como uma força criadora no universo.
c) os filósofos pré-socráticos associaram a criação do mundo e a sua existência à
ação dos titãs, para contrapor a Cosmogonia grega e seus deuses.
d) a Cosmologia associada aos filósofos pitagóricos enfatiza o conhecimento como
um elemento de superação das limitações da alma individual.
e) a religião olímpica apresentava um aspecto hermético que contrastava com a
religião órfica, a qual tinha uma aceitação ampla entre os cidadãos atenienses.

8 . Leia o texto a seguir:

Os primeiros princípios do universo são os átomos e o vazio; tudo o mais apenas se


pensa que existe. Os mundos são infinitos, sujeitos à geração e ao perecimento.
Nada é gerado pelo não-ser e nada perece no não ser. Os átomos são infinitos em
tamanho e número; movem-se como num vórtice e geram assim todas as coisas
compostas – fogo, água, ar e terra – porque esses elementos também são uniões
de determinados átomos, que, por sua solidez, são passíveis e imutáveis.

LAÊRTIOS, D. Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres. Cap. 7, § 44. Tradução do grego, introdução e notas de Mário da Gama
Kury. 2. ed. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2008 (adaptado).

Considerando o texto apresentado, avalie as asserções a seguir e a relação


proposta entre elas.

I. O atomismo de Demócrito é uma escola de pensamento que atribui à natureza


uma origem material.

104
PORQUE

II. Segundo Demócrito, tudo é formado por átomos e é o acaso – e não a vontade
dos deuses – que determina tanto o movimento dos átomos quanto o ser que eles
formam ao se juntarem.

A respeito dessas asserções, assinale a opção correta.

a) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da


I.
b) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa
correta da I.
c) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) As asserções I e II são proposições falsas.

105
COSMOGONIAS E A FILOSOFIA: UNIDADE
UM PERCURSO HISTÓRICO

6.1 INTRODUÇÃO
06
O objetivo principal desta Unidade é o de oferecer um breve percurso pelas
concepções filosóficas da Antiguidade e do período medieval, a fim de observar
como os importantes pensadores destes períodos históricos conceberam as relações
fundamentais entre a existência das coisas e a sua percepção objetiva, pelo
exercício da razão. Assim, será possível conectar a reflexão filosófica ao conteúdo
proposto para esta disciplina, enfatizando os modos pelos quais as pessoas
apreendem a realidade material e objetiva em seu respectivo espaço, definindo,
assim, uma relação de natureza metafísica com seu próprio ambiente e os seus
processos de reprodução e existência.
A conexão entre a racionalidade e o fenômeno religioso passa,
consequentemente, pela observação de conceitos elaborados desde a
Antiguidade a respeito do ser humano e da sua interpretação objetiva da realidade.
Desta forma, dinamismo do debate entre espiritualidade e racionalidade atravessa
os séculos e encontra uma importante ressonância no período medieval, onde
pensadores cristãos e islâmicos recuperam uma parte importante dos estudos
filosóficos da civilização grega e os reinterpretam de acordo com o perfil religioso e
social de seu próprio tempo.
Portanto, ao longo desta Unidade, você deverá mobilizar conhecimentos e
obter maiores referências sobre o desenvolvimento das Cosmogonias e Cosmologias
a partir dos preceitos filosóficos clássicos.
Enfim, está pronto para começar? Então, bons estudos!

6.2 PLATÃO E O DUALISMO ALMA E CORPO

A História afirma que Sócrates, um dos mais importantes filósofos da cultura


grega, foi acusado por um grupo de atenienses por corromper a juventude com seus
ensinamentos, difundindo doutrinas contrárias à Cosmogonia relativa àquela

106
sociedade. Obrigado a escolher entre o exílio e a morte, Sócrates aceita o suicídio
em vez de ter de deixar de ensinar (CORDI et al., 2003).
Na pintura A Morte de Sócrates, de Jacques-Louis David (1748 – 1825), o
discípulo de Sócrates, Platão (428 – 348 a.C) é representado ao pé de Sócrates, em
silêncio contemplativo frente ao sofrimento que se abateria sobre seu mestre.
Entretanto, este teria afirmado que não temia a morte: seus discípulos estranharam,
inclusive, o seu contentamento perante o veneno que teria de ingerir.
Sócrates responde, no entanto, que somente com a morte ele seria capaz de
atingir a verdade, pois somente com a separação definitiva entre a alma e o corpo
seria possível obter o pleno conhecimento sobre as coisas.

Figura 29: A morte de Sócrates, de David

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3viWbui. Acesso em: 20 jan. 2022.

O relato da morte de Sócrates é um referencial importante para as discussões


a serem propostas nesta Unidade: este filósofo define a importância da compreensão
de uma dupla dimensão do ser humano, que apresenta um corpo físico e uma alma
imortal, a qual pode absorver a sabedoria contida nas coisas e no espaço; porém, o
conhecimento absoluto somente pode ser atingido com a morte, pois a vida física
implica em limitações (fisiológicas, inclusive) a esta plena sabedoria (ARAÚJO, 2009).
Há, portanto, uma aparente dualidade entre o corpo e a alma, e este debate
será retomado de forma intensa por Platão. A reflexão sobre a alma, aliás, vai além
de uma concepção simplificada que a refere como uma dimensão espiritual da

107
pessoa: de acordo com Platão, cada indivíduo apresenta em si uma dupla
dimensão. A primeira destas dimensões é o corpo físico, o qual é limitado
temporalmente e sujeito à morte, sendo, assim, transitório perante a imortalidade da
alma.
Esta, sim, representa a verdadeira essência do indivíduo, e estando ligada ao
corpo, também passará pelos mesmos sofrimentos ligados à dimensão física, e que
podem ser tratados por meio de um esforço terapêutico que seja capaz de
proporcionar não apenas o alívio de sintomas do corpo, mas a superação dos
sofrimentos da alma (WARBURTON, 2012).

A alma, portanto, é um sujeito do conhecimento, isto é, um agente


responsável pela mobilização e apreensão dos saberes e das verdades que estão
contidos em todas as coisas.

A contribuição do debate relativo ao dualismo alma e corpo é essencial para


o desenvolvimento das Cosmogonias: à medida que define a alma como um espaço
sensível e de apreensão do conhecimento, abre-se espaço para a compreensão de
um mundo, ou uma dimensão, que é distinta da realidade material e imanente do
ser humano: neste mundo de ideias, as verdades sobre os objetos podem ser
apreendidas ao mesmo tempo que os deuses e divindades também podem se

108
manifestar (ARAÚJO, 2009).
Ou seja, o ato de atingir o conhecimento não implica em uma rejeição à
hipótese de existência dos deuses, ao contrário, permite inclusive legitimar a sua
existência não a partir do mistério, mas a partir de uma verdade que se afirme e
possa, assim, ser explicada.
Para entender esta afirmação, é possível recorrer a um exemplo: a
Cosmogonia grega refere-se à narrativa de Ícaro, um moço vaidoso que estava
preso com seu pai, o artesão Dédalo, após a morte do Minotauro, por Teseu, dentro
do labirinto que Dédalo havia criado. Dédalo idealiza a fuga da prisão ao criar dois
conjuntos de asas, para si e seu filho, com penas coladas com cera. Ambos logram
êxito no seu intento e escapam da cadeia, No entanto, Ícaro deixa-se levar pela
sensação de voar, e sobe em direção ao sol; a cera se aquece e derrete, quebrando
as asas e precipitando o jovem no mar (PHILIP, 1996).

Figura 30: A queda de Ícaro (Museu do Louvre, França)

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3EcyaZX. Acesso em: 20 jan. 2022.

A narrativa de Ícaro pode ser útil para a compreensão do modelo dualista de


Platão: ao ser concebida como parte de um mundo sensível, a alma se conecta ao
sagrado e dele igualmente depende. Assim, no momento em que a pessoa observa

109
a narrativa de Ícaro, pode perceber, a partir desta dualidade, que o jovem não
morreu pelo simples desprendimento de suas asas (coisa que, por si, já seria impossível
naquele tempo), mas sim, por dar vazão à sua vaidade e ao orgulho de querer imitar
as aves, rejeitando a sua natureza (BULLFINCH, 2000).

Sua morte, portanto, não é um acidente ou um mistério, mas uma punição


contida no fato de haver desrespeitado aos deuses: pelo corpo, Ícaro cede às suas
paixões, e não atende as virtudes que estão contidas na alma: a falta de humildade
em aceitar o conselho do pai para não se aproximar do sol acaba levando-o à
própria destruição. Ou seja, a racionalidade de Dédalo produziu um conhecimento
útil, mas a sensação vaidosa de Ícaro não foi capaz de consolidar este
conhecimento, colocando-o a perder.

6.3 ARISTÓTELES E OS CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA METAFÍSICA

Aristóteles (384 – 322 a.C) é um dos filósofos que dá prosseguimento às


discussões sobre ‘alma’ e ‘corpo’ comuns à obra de seu mestre Platão. Aristóteles
terá uma participação fundamental neste debate ao inserir novas reflexões a
respeito da natureza das coisas, em uma abordagem que irá definir os elementos
básicos da Metafísica.
Ou seja, de acordo com Aristóteles, há a necessidade de tratar sobre as coisas
não apenas a partir de suas aparências e funções, mas sim, a partir do que elas
realmente são, como uma essência que está presente no ser. A semântica do
conceito de Metafísica, neste sentido, enfatiza (de acordo com o prefixo meta, isto
é, ‘além’) uma reflexão sobre a geração de conhecimento não apenas a partir da
física e dos aspectos gerais contidos na pessoa e nos objetos (formas, imagens e
outras dimensões captadas pela razão), mas sim, a partir dos princípios da essência

110
destas coisas, que se articulam com o conhecimento gerado no plano físico
(WARBURTON, 2012).
Em outras palavras, a Metafísica se ocupa em organizar e sistematizar os
conhecimentos agregados e acumulados pelo ser humano a partir da observação
de sua realidade. Estes conhecimentos estão implícitos na realidade e devem ser
absorvidos por meio da razão, mas há também diferentes saberes e verdades
contidas em espaços em que a racionalidade do corpo não pode alcançar.
Nestes casos, a Metafísica atua para apreender a verdade contida na
realidade sensível, e que não é captada pela dimensão física. Vale dizer, a Metafisica
permite aplicar este exercício da razão a todos os contextos comuns a uma
determinada situação recorrente. Ou seja, um elemento ‘universal’ surge quando ele
pode ser observado em quaisquer outras circunstâncias semelhantes – como ocorre,
por exemplo, no fenômeno religioso (GIACOIA JUNIOR, 2010).
Para compreender este recorte, pode-se recorrer a um breve exemplo da
Cosmogonia nórdica, que se refere ao autossacrifício de Odin para obter o
conhecimento de todas as coisas: para isto, este deus ficou pendurado durante dias
na árvore da vida, Yggdrasil, tendo ainda que entregar um de seus olhos a Mimir, o
gigante que controlava o acesso à fonte de onde emanava o conhecimento (PHILIP,
1996).
Neste relato, transparece a importância do sacrifício para que o elemento
metafísico – a busca do conhecimento pela sensibilidade – possa se manifestar. Aliás,
a renúncia a um dos olhos por Odin destaca exatamente a ideia de renunciar à
racionalidade física (o olho é um órgão dos sentidos, por meio do qual se apreende
a realidade visível) para atingir um fim maior, contido nas verdades até então
inalcançáveis.
A Cosmogonia bíblica apresenta um sentido semelhante na narrativa da
crucificação de Jesus: a Igreja é clara ao enfatizar que este sacrifício apresentou uma
dimensão redentora, isto é, a morte de Cristo é o evento-chave para a remissão dos
pecados da humanidade (CONE, 2021).
Assim, como se refere Paulo em relação à ‘loucura da cruz’, a racionalidade
não é capaz de captar o sentido da morte do Filho do Homem, que ao seu tempo
foi vista pela cultura greco-romana como um algo vergonhoso e desonroso
(havendo, inclusive, grafites do século I d.C. que figuravam Jesus com uma cabeça
de burro), mas que viabilizou, para os cristãos, o triunfo de Deus sobre o Mal e os

111
pecados dos homens (A BÍBLIA, 1990).

Figura 31: Reprodução de grafite em Roma com sátira aos cristãos, século I d.C.

Fonte: Disponível em https://bit.ly/38CHKcW. Acesso em: 20 jan. 2022.

Desta forma, você pode perceber a existência de elementos ‘universais’ nas


Cosmogonias religiosas: o sacrifício, a redenção, o sofrimento e a libertação
constituem-se como conceitos recorrentes que determinam a relação entre o
sagrado e o humano nas diferentes civilizações.
Assim, a Metafísica de Aristóteles se desenvolve no sentido de extrapolar os
conceitos e fatos que são percebidos na experiência momentânea, de acordo com
as possibilidades racionais e cognitivas do indivíduo, para atingir o estágio de
sensibilidade que só pode ser alcançado por meio da alma, gerando relações
importantes entre a matéria visível e o intelecto manifesto na sensibilidade e na razão
humana (GIACOIA JUNIOR, 2010).

112
Portanto, Aristóteles refina o ensinamento platônico ao se referir à existência
de uma função inerente a todos os seres humanos, ou seja, à existência humana em
si: a capacidade do homem para pensar e utilizar a razão gera um distanciamento
dos animais e em relação a todas as outras coisas criadas.

6.4 A ESCOLÁSTICA E A LÓGICA ARISTOTÉLICA NO MUNDO MEDIEVAL

O pensamento de Aristóteles foi, de certa forma, relegado a um segundo


plano com a derrocada da civilização greco-romana e a consolidação do
Cristianismo nascente. Neste contexto histórico dos primeiros séculos da era cristã, a
relação entre a Filosofia grega e os cultos ‘pagãos’ determinava um certo
afastamento da espiritualidade cristã em relação a estes autores clássicos, em um
processo de ortodoxia doutrinária que se estendeu até o início do segundo milênio
(SUFFERT, 2001).
No entanto, a Antiguidade jamais foi apagada das expressões sociais e
culturais da Europa, mesmo no período medieval sob o domínio importante da Igreja
Católica: as construções gregas e romanas mantinham-se em pé, e os ensinamentos
de seus líderes haviam sido perpetuados em livros, escritos e discursos que
atualizavam conceitos importantes sobre a dinâmica da fé e razão que poderiam ser
retomadas em outros momentos e circunstâncias históricas.
Este enfoque dos intelectuais medievais em um retorno à Antiguidade e à
cultura greco-romana não ocorreu por acaso, como uma descoberta arqueológica
que ocorre fora de um momento ou contexto. Na verdade, este apelo ao esplendor
da Idade Antiga foi uma constante ao longo da Idade Média. Com efeito, as
profundas ligações sociais (arquitetônicas, literárias, artísticas, e de um modo geral,

113
culturais) entre o mundo greco-romano e o mundo medieval ainda se faziam
materialmente presentes, nos antigos templos dos deuses romanos que foram
convertidos em igrejas, nas ruínas e demais monumentos (CAMPOS; MIRANDA, 2000).

Figura 32: Fachada do Parthenon (Atenas, Grécia)

Fonte: Disponível em https://bit.ly/37GSJ4K. Acesso em: 20 jan. 2022.

Deste modo, o homem do período medieval não esqueceu as suas raízes


antigas, ainda que estas tivessem se fundido com as culturas dos povos que estavam
além dos limites do Império e, por muitos séculos, foram considerados como
‘bárbaros’. A filosofia patrística, com Santo Agostinho, por exemplo, realiza este
diálogo com os filósofos da Antiguidade; Carlos Magno, por sua vez, estrutura suas
relações de poder na Europa com a conquista de territórios que criariam o Sacro
Império Romano Germânico.
Por fim, a própria Igreja Católica se organiza institucionalmente a partir das
reformas de Constantino, e várias de suas construções são baseadas no estilo romano
(românico), muito em voga entre o primeiro e o segundo milênios para a construção
dos grandes monastérios e abadias da Europa Ocidental (MOCZAR, 2013).
No entanto, esta relação intrínseca com o passado na Antiguidade não evoca
um desejo de retornar aos valores morais e conceitos filosóficos criados naquele
momento, pois como vimos, estes eram considerados como sendo costumes pagãos,
cuja cultura contrastava com o espírito ascético do cristianismo naquele tempo
histórico.
O apelo à Antiguidade representava, na verdade, um desejo ou busca pelo

114
passado e pela experiência da criação, representada pelas escrituras bíblicas. O
retorno a este ‘paraíso perdido’ implicava em uma busca pela espiritualidade e pela
construção de postulados filosóficos que auxiliassem o homem na busca por Deus.
Ao constatarem as suas diferenças em relação aos autores da Antiguidade, os
autores medievais procuravam uma adaptação, para aquele tempo presente, dos
conceitos científicos, artísticos e filosóficos dos tempos antigos. Tais instrumentos, na
verdade, poderiam conferir poder aos seus detentores, recriando uma cosmovisão a
partir do mundo antigo, ao invés de, necessariamente, retornar a ele – vem daí o
conceito de um Renascimento, focado em uma produção intelectual cujas
aplicações eram contemplativas e ligadas à Teologia daquele período (ARANHA;
MARTINS, 2013).
Conforme a discussão anteriormente realizada, a filosofia escolástica já
representou uma destas formas de ‘revisitar’ a Antiguidade, aproximadamente três
séculos antes da fase áurea do Renascimento: o processo de adequação e
aplicação dos conceitos propostos por Aristóteles à religião consistia, certamente,
em uma forma de gerar uma coerente explicação e um esclarecimento dos
diferentes ensinamentos cristãos, utilizando, para isto, os princípios da lógica
aristotélica.
Para filósofos como Tomás de Aquino (1225 – 1274) e seus sucessores, a Fé não
se provava contrária ao exercício da razão, muito embora a razão não fosse criadora
da fé. Consequentemente, por meio da razão seria possível que estes autores
pudessem comprovar o que eles já consideravam como verdade, revelada por meio
da fé. Assim, este exercício interpretativo permitia desenvolver uma nova forma de
sintetizar a filosofia grega ao pensamento cristão (WARBURTON, 2012).
Este método, consequentemente, acaba por modificar em boa parcela a
tradição filosófica medieval, ligada a Agostinho de Hipona: este concebeu o mundo
natural, e o conhecimento das coisas (verdades) ligadas a este mundo como
obstáculos materiais ao pleno conhecimento, que era aquele associado à graça de
Deus mediada pela fé.
Deste modo, os escolásticos acreditavam que a ‘Cidade dos Homens’ não era
um local de pecado, ao qual o ser humano devia evitar ou fugir para adentrar a
‘Cidade de Deus’: o mundo natural era digno de ser investigado e compreendido,
estabelecendo uma relação entre a realidade superior (a graça) e o mundo natural,
inferior porque criatura, e imperfeito porque maculado pelo pecado. Este desejo de

115
investigação, portanto, impulsionaria o trabalho e a ação dos filósofos ao final da
Idade Média (MOCZAR, 2012).
Há, ainda, um ponto importante a ser tratado a respeito da lógica aristotélica
e sua retomada no período medieval: trata-se da relação entre realismo e
nominalismo. Este debate surge em um contexto hermenêutico acerca da realidade
sensível e seus objetos: os nominalistas, como Guilherme de Ockham (1285 – 1347),
sustentavam a posição que os conceitos ‘universais’, isto é, aplicáveis a todas as
circunstâncias e contextos, não são de fato reais.

Figura 33: Guilherme de Ockham

Fonte: Disponível em https://bit.ly/3xpG7d5. Acesso em: 20 jan. 2022.

Deste modo, é impossível tratar de conceitos abrangentes como ‘um todo’,


negando a possibilidade dos mesmos serem compostos por situações particulares
que contrastam, ou mesmo contestam, um postulado científico.
Por exemplo, seria inconcebível tratar da violência como um problema ‘da
humanidade’. Ora, a humanidade é composta por bilhões de indivíduos, cujas
realidades específicas podem ser contrárias a toda forma de violência. Cada
individualidade, portanto, constitui uma particularidade na qual a criação de um
conceito universal pode ser colocada em xeque (DE LIBERA, 2011).
Assim sendo, os ‘universais’ podem ser compreendidos apenas como

116
expressões verbais que geram interpretações coletivas a respeito de temas
semelhantes entre si, em um processo de abstração – a mente humana reagiria à
semelhança das coisas, criando categorias analíticas que geram conceitos
teoricamente aplicáveis a todas as situações, quando na verdade não o são.
Esta discussão é a base da chamada ‘controvérsia dos universais’, que opõe
os nominalistas aos realistas. Os realistas (entre os quais se destacava Tomás de
Aquino) partiam de uma lógica aristotélica na qual a realidade é cognoscível pela
Razão e, portanto, concebe-se como possível a criação de categorias analíticas
aplicáveis a todas as circunstâncias para a construção do conhecimento. Ou seja,
os realistas defendiam a existência dos ‘universais’, enquanto os nominalistas
rejeitavam os ‘universais’ e a possibilidade de compreensão única de um elemento
sob quaisquer situações (REALE; ANTISERI, 2019).

6.5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No livro O Conde de Monte Cristo, de Alexandre Dumas (1802 – 1870), o Abade


Faria, um dos protagonistas da narrativa, expressa-se do seguinte modo: ‘A Filosofia
é a reunião das ciências adquiridas pelo gênio que as aplica; a Filosofia é a nuvem
reluzente em que o Cristo pôs o pé para subir aos céus’ (DUMAS, 2009, p. 215)
Esta observação poética de Alexandre Dumas é bastante útil para
estabelecer algumas linhas conclusivas sobre o conteúdo apresentado nesta
Unidade, na qual você pôde avaliar as importantes relações entre o pensamento e
as expressões da Filosofia para a constituição de Cosmogonias religiosas.
Com efeito, o relacionamento entre razão e espiritualidade perpassa uma
parte fundamental da reflexão dos filósofos da Grécia antiga, e a importância deste
debate pode ajudá-lo a perceber de que modo as pessoas utilizam da sua própria
sensibilidade para desenvolver cosmovisões que dependem de justificações e
explicações que podem ir além da interpretação dos sentidos ou da racionalidade
objetiva.
Desta forma, as Cosmogonias religiosas se estruturam não ao largo do
pensamento, isto é, externamente à capacidade cognitiva do ser humano; pelo
contrário, esta dimensão do fenômeno religioso pode ser captada pela sensibilidade
contida na alma, cujo dualismo com o corpo perecível faz com que a alma,
compreendida como imortal, possua a condição de assimilar o sagrado e

117
transformá-lo em uma realidade acessível aos sentidos humanos. Assim, no momento
em que a pessoa religiosa assume para si o fenômeno religioso, mobilizará a
racionalidade de seus sentidos e a sensibilidade contida em sua alma para
desenvolver um relacionamento de proximidade com a(s) divindade(s).

118
FIXANDO O CONTEÚDO

1. Há uma relação importante entre os conceitos da Filosofia e a construção de


conceitos essenciais às diferentes Cosmogonias e Cosmologias que ordenaram o
desenvolvimento das civilizações. Desta forma, estes conceitos devem ser
retomados para facilitar a compreensão estratégica destas Cosmogonias em
relação à dinâmica cultural da humanidade.

Para consolidar seus conhecimentos sobre o tema do ‘percurso histórico e filosófico


das Cosmogonias humanas’, leia o trecho com lacunas a seguir:

A relação entre ‘alma’ e ‘corpo’ é proposta, em particular, por autores como


__________, que afirmam, no contexto da civilização __________, a importância de
uma __________ entre estas categorias, evocando associações entre sensibilidade
e racionalidade.

Agora, assinale a opção que contempla a sequência correta para o texto


apresentado:

a) Aristóteles – greco-romana – igualdade.


b) Baldur – nórdica – divergência.
c) Lifthrasir – nórdica – dualidade.
d) Xenofonte – suméria – convergência.
e) Platão – greco-romana – dualidade.

2. Os conceitos da Filosofia foram sistematicamente interpretados ao longo dos


tempos a partir de categorias analíticas que definem esta área do conhecimento
no contexto das demais ciências. Desta forma, é fundamental compreender o
espaço da Filosofia em um contexto de produção de conhecimentos e saberes
ao longo da história.

Neste sentido, considerando os elementos destacados pelo livro-texto a respeito


da Filosofia e sua relação com as temáticas da ciência no Ocidente, associe as
colunas a seguir:

119
1. Metafísica
2. Mimir
3. Tomás de Aquino
4. Escolástica

( ) Trata-se de uma escola de pensamento filosófico e teológico desenvolvida no


contexto da Idade Média a partir do pensamento de Aristóteles.
( ) Este conceito evoca um conjunto de concepções desenvolvidas na Antiguidade
a respeito das relações entre intelecto e matéria.
( ) Trata-se de um autor associado à Igreja Católica, o qual realizou uma atualização
importante da lógica aristotélica ao seu tempo histórico.
( ) Trata-se de uma figura lendária da Cosmogonia nórdica, que se colocava como
guardião do conhecimento contido no mundo.

Agora, assinale a opção que corresponde à sequência correta:

a) 3 – 4 – 1 – 2
b) 2 – 3 – 1 – 4.
c) 4 – 1 – 3 – 2.
d) 1 – 2 – 4 – 3.
e) 4 – 3 – 2 – 1.

3. A articulação de uma síntese histórica e filosófica a respeito da temática da


Filosofia no âmbito das Cosmogonias permite revelar discussões importantes – em
particular no Ocidente – sobre os espaços de produção do conhecimento
religioso. Deste modo, autores e obras se relacionam em um percurso temático
que sintetiza reflexões sobre o lugar do ser humano no seu meio e seu espaço.

A partir do conteúdo mencionado pelo livro-texto a respeito do tema destacado


neste texto-base, analise as seguintes afirmações:

I. É possível observar que a metafísica de Aristóteles se conecta às Cosmogonias


religiosas a partir do conceito de ‘universal’, pois estas Cosmogonias referem-
se a diferentes contextos e circunstâncias sociais que dizem respeito a várias

120
civilizações.
II. As reflexões propostas por Tomás de Aquino para a reformulação do
pensamento filosófico no período medieval realizam uma concordância direta
com as propostas de Agostinho de Hipona, cuja escola era dominante entre
os católicos.
III. No contexto de desenvolvimento da corrente escolástica, ocorre um aumento
importante das tensões intelectuais entre árabes e cristãos, uma vez que se
compreendia que a lógica aristotélica era pagã, e consequentemente,
incompatível com a Cosmogonia cristã.

É correto o que se afirma em:

a) I, apenas.
b) II, apenas.
c) III, apenas.
d) I e II, apenas.
e) II e III, apenas.

4. As construções filosóficas da Antiguidade foram, a seu modo, retomadas no


contexto da Idade Média, trazendo interpretações importantes a respeito da
espiritualidade humana e suas características, em uma sociedade intensamente
permeada pelo discurso religioso.

Para recordar este período histórico e os seus aspectos gerais, avalie as asserções
a seguir e a relação proposta entre elas.

I. Os filósofos escolásticos, liderados por Tomás de Aquino, se destacaram por um


resgate histórico das contribuições de Aristóteles em relação a conceitos
metafísicos importantes.

PORQUE

121
II. No contexto do movimento escolástico, inexiste a distinção ou subordinação entre
razão e espiritualidade, viabilizando, assim, uma compreensão mais abrangente
dos elementos comuns à existência humana.

A respeito dessas asserções, assinale a opção correta:

a) As asserções I e II são proposições verdadeiras, e a II é uma justificativa correta da


I.
b) As asserções I e II são proposições verdadeiras, mas a II não é uma justificativa
correta da I.
c) A asserção I é uma proposição verdadeira, e a II é uma proposição falsa.
d) A asserção I é uma proposição falsa, e a II é uma proposição verdadeira.
e) As asserções I e II são proposições falsas.

5. O período conhecido como Renascimento deve ser observado pelo pesquisador


como parte de um recorte histórico no qual ocorre uma série de relações
importantes entre a Filosofia e a Teologia, determinando, assim, novos olhares a
respeito do ser humano em uma sociedade ocidental em constante renovação.

Desta forma, para contextualizar o tema proposto, avalie as opções a seguir e


assinale a correta:

a) Este período é marcado por um processo de retomada das experiências filosóficas


da Antiguidade, mobilizando postulados que fossem capazes de auxiliar o homem
na busca pela própria espiritualidade.
b) Neste contexto histórico, há um padrão nitidamente iconoclasta, a fim de
desconstruir as referências estilísticas da Idade Antiga que são consideradas
atrasadas e pagãs.
c) O Renascimento antecede o surgimento da filosofia escolástica, à medida que
gerou conceitos importantes para a reinterpretação da existência humana a partir
dos preceitos religiosos.
d) A abordagem de filósofos medievais como Agostinho de Hipona é diretamente
questionada, pois os escolásticos rejeitam o conceito de 'Cidade dos Homens'
como uma categoria analítica.

122
e) Ao final da Idade Média, ocorre um processo de ortodoxia e radicalização do
discurso filosófico, à medida que a influência da Igreja inibia a possibilidade de
investigação de postulados alternativos.

6. As expressões do pensamento filosófico medieval, especialmente no segundo


milênio, associam conceitos importantes aos seus autores, definindo algumas
escolas de pensamento que foram fundamentais para a construção de novas
teorias para a absorção do conhecimento e observação da realidade política e
social.

A partir do conteúdo apresentado pelo texto-base, analise o texto com lacunas


que se segue:

A ‘__________’ marcou uma parte importante das discussões que levaram à


construção do pensamento filosófico no segundo milênio, mobilizando intelectuais
de seu tempo em um debate sobre as categorias analíticas de __________ e
__________.

Agora, assinale a opção que contempla as lacunas do texto apresentado:

a) Controvérsia das Investiduras – Realismo – Nominalismo.


b) Controvérsia Iconoclasta – Realidade – Representação.
c) Controvérsia dos Universais – Existência – Essência.
d) Controvérsia das Investiduras – Espiritualidade – Realidade.
e) Controvérsia dos Universais – Realeza – Nominalismo.

7. Entre os séculos XIII e XV, uma geração de pensadores iria causar uma mudança
significativa nas bases da filosofia cristã na Europa. A partir desta mudança,
desenvolveram-se conceitos e temas de discussão que aliavam elementos
históricos, teológicos e sociais.
De acordo com as ponderações efetivadas pelo texto, analise as opções a seguir
e assinale a correta:

123
a) Este período é marcado pela reunificação do pensamento filosófico católico, após
o Cisma do Ocidente, no século XI (1054), que havia dividido o controle da Igreja.
b) Neste período histórico, surge a ‘controvérsia dos universais’, que faz um
contraponto entre o realismo e o nominalismo.
c) O período destacado está associado a uma fase de desenvolvimento econômico
e social importante na Europa, com o surgimento das universidades.
d) O desenvolvimento da filosofia cristã neste período histórico está atrelado ao
surgimento de pensadores que contestavam a Igreja, como Tomás de Aquino.
e) As principais discussões propostas neste período histórico revelavam a importância
das Cruzadas e das Grandes Navegações para a expansão do conhecimento.

8. Leia o texto a seguir:

Para Platão, o que havia de verdadeiro em Parmênides era que o objeto de


conhecimento é um objeto de razão e não de sensação, e era preciso estabelecer
uma relação entre objeto racional e objeto sensível ou material que privilegiasse o
primeiro em detrimento do segundo. Lenta, mas irresistivelmente, a Doutrina das
Ideias formava-se em sua mente.
ZINGANO, M.. Platão e Aristóteles: o fascínio da filosofia. São Paulo: Odysseus, 2012 (adaptado).

O texto faz referência à relação entre razão e sensação, um aspecto essencial da


Doutrina das Ideias de Platão (427 a.C.-346 a.C.).

De acordo com o texto, Platão se situa diante dessa relação:

a) estabelecendo um abismo intransponível entre as duas.


b) privilegiando os sentidos e subordinando o conhecimento a eles.
c) atendo-se à posição de Parmênides de que razão e sensação são inseparáveis.
d) afirmando que a razão é capaz de gerar conhecimento, mas a sensação não.
e) rejeitando a posição de Parmênides de que a sensação é superior à razão.

124
RESPOSTAS DO FIXANDO O CONTEÚDO

UNIDADE 01 UNIDADE 02

QUESTÃO 1 B QUESTÃO 1 D
QUESTÃO 2 A QUESTÃO 2 B
QUESTÃO 3 D QUESTÃO 3 C
QUESTÃO 4 E QUESTÃO 4 A
QUESTÃO 5 C QUESTÃO 5 E
QUESTÃO 6 B QUESTÃO 6 C
QUESTÃO 7 C QUESTÃO 7 D
QUESTÃO 8 E QUESTÃO 8 B

UNIDADE 03 UNIDADE 04

QUESTÃO 1 C QUESTÃO 1 A
QUESTÃO 2 D QUESTÃO 2 C
QUESTÃO 3 A QUESTÃO 3 B
QUESTÃO 4 E QUESTÃO 4 D
QUESTÃO 5 B QUESTÃO 5 E
QUESTÃO 6 B QUESTÃO 6 B
QUESTÃO 7 E QUESTÃO 7 B
QUESTÃO 8 C QUESTÃO 8 D

UNIDADE 05 UNIDADE 06

QUESTÃO 1 E QUESTÃO 1 E
QUESTÃO 2 A QUESTÃO 2 C
QUESTÃO 3 D QUESTÃO 3 A
QUESTÃO 4 C QUESTÃO 4 A
QUESTÃO 5 B QUESTÃO 5 A
QUESTÃO 6 C QUESTÃO 6 C
QUESTÃO 7 D QUESTÃO 7 B
QUESTÃO 8 A QUESTÃO 8 D

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REFERÊNCIAS

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