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1 – Emagrecimento do currículo

PERALTA: A tendencia é sempre aumentar, aumentar, aumentar o espaço do programa, isto


por um lado mostra uma certa desconfiança nos professores: é preciso que tudo esteja no
currículo enunciado, para que o currículo ensinado esteja perfeitamente moldado e seja
previsível. Então há muito pouco espaço para aquilo que os professores sabem e devem fazer
que é ensinar, organizar, decidir sobre as estratégias de ensino.

Por outro lado, o emagrecimento do currículo é um enriquecimento, porque o currículo não é


apenas um enunciado de conteúdos declarativos, tão importante quanto os conteúdos
declarativos são os processos de aprendizagem. E o facto dos professores terem um excesso
de material nos programas acaba não dando importância para os processos de ensinar e de
aprender. Quando mais extensos são os programas em termo de número de itens a ensinar,
mais elementares são os processos cognitivos. A complexidade cognitiva é secundarizada ao
conhecimento declarativo.

Portanto, se tudo é importante, nada é importante. Se tudo é igualmente importante, então o


que é verdadeiramente relevante.

ROLDÃO: o engordamento (ou transbordamento – conceito do Nóvoa) curricular ocorre por


dois motivos: o currículo é conhecimento (de muitos tipos, mas é conhecimento) necessário
para os nossos aprendentes e, em algumas áreas científicas, o conhecimento triplica em cada 2
ou 3 anos e, portanto, se a lógica foi cumulativa, aditiva, daqui a cem – ou daqui a 10 – anos
não há espaço curricular para se colocar o todo novo conhecimento, portanto é necessário ser
seletivo.

Mas, também, o que tem havido é um fenómeno social de colocar sobre o currículo escolar
toda aquela fonte de conhecimento que vem da sociedade, das alterações sociais, de outras
necessidades que vão surgindo e que incham o currículo.

Este emagrecimento significa não pode ser olhado como o “corta”, como muitas vezes os
críticos fazem. O emagrecimento é retirar o que é supérfluo e manter e reforçar o que é
necessário.

PERALTA: De modo a enriquecer o processo de ensino. No fim é perceber não só o que os


alunos aprendem, mas também o grau de exigência cognitiva que envolvem as tarefas que os
alunos têm de realizar. E isto normalmente é posto de lado com a síndrome do
enciclopedismo.

2 – Conceito de Aprendizagem Essencial

ROLDÃO: a definição de aprendizagens essenciais articula-se com a lógica do emagrecimento


inteligente, benéfico para saúde. Não se trata de eliminar conhecimento, mas de enriquecer o
conhecimento. Nesse sentido, aquilo que é difícil de fazer nesse momento porque toda a
tradição curricular tem sido marcada pelo enciclopedismo, o essencial tem que ser olhado do
ponto de vista curricular. Ou seja, “para que os alunos aprendem aquilo que a escola nos
ensina” é a questão curricular central: ensino inglês porque…, ensino história porque…gosto?
Ou porque essas áreas do saber e outras, e suas ligações interdisciplinares devem estar a
serviço das finalidades formativas do cidadão que queremos realmente formar.

Há uma grande dificuldade em definir o que é essencial e em distinguir o essencial do


acessório, até porque, em muitas áreas do conhecimento, o essencial é aquilo que estrutura o
campo do saber, mas não dispensa determinados elementos que são mais acessórios. O
problema é que temos que colocar no centro o que é verdadeiramente essencial. Algumas
ideias para ajudar a perceber o modo como tem sido orientada e transformada a construção
das aprendizagens essenciais nas diferentes disciplinas e nas áreas de autonomia curricular
que hão de cruzar essas essencialidades. Porque não são duas coisas opostas, não é só na área
transversais ou de integração que vamos discutir a questão da essencialidade do currículo, é
também em cada disciplina para que juntas façam esse caminho.

O que deveríamos colocar como critérios: não é essencial aquilo que se desaparecer não faz
falta. Isto é, não faz falta para a compreensão. Essencial é aquilo que define e estrutura o
campo do saber. Se deve organizar o ensino tendo em vista o que é definidor e necessário para
aquele campo do conhecimento.

O conceito de essencial deve-se construir em torno dos conceitos que vivem nos conteúdos.
Temos que ter uma lógica que nos diferentes conteúdos que constituem aquilo que se
considera necessário se não deixe perder aquilo que é absolutamente conceito chave para
aquele tópico ou tema. Esse é outro critério de essencialidade: conhecimentos/conceitos (não
terminou a frase). Temos que ter uma clarificação dos processos cognitivos essenciais para o
acesso aquele conhecimento.

Por outro lado, o conhecimento é uma construção progressiva em todas as áreas do saber.
Então outro critério de essencial é aquilo que é preciso para que o indivíduo vai precisar para
progredir para aprendizagens mais complexas naquele campo científico. Muitas delas são
transversais e, portanto, esse entendimento sobre “o que eles não podem deixar de ficar a
saber para poderem continuar a sua progressão, a sua articulação vertical no currículo”.

É essencial o uso e a transferibilidade. Portanto, um conhecimento essencial, e isso na ciência


em geral, é sempre passível de ser usado. Isso não quer dizer que só pode ser usado de formas
práticas, que seja só aplicado, mas tem que ter a capacidade de poder ser revisitado para
adquirir outro conhecimento para resolver um problema, uma situação. Portanto o
conhecimento se define em larga medida pela possibilidade de uso que oferece. E também
tranferibilidade: aí entramos no interdisciplinar porque não são as disciplinas que são más, elas
são, como diz Michael Young, a essência do conhecimento a que se chegou. Portanto, são
lentes de saber. Elas têm que ser lentes que se põem de uma forma prismática a olhar para os
fenómenos para se interpretar. Portanto é a possibilidade de o conhecimento ser transferível
que também define o que é essencial.

3 – Relação íntima entre o perfil dos alunos da escolaridade obrigatória

PERALTA: Não há perfil de saída por um lado e aprendizagens essenciais por outro, ambos os
documentos integram o currículo dos ensinos básicos e secundários. Por isso o perfil não pode
ser considerado no fim da aprendizagem se ele não for cuidado ao longo de todo o processo.
Tem que ser desde o primeiro momento, desde o princípio da construção da aprendizagem. O
perfil do aluno tem que ser articulado de uma forma integrada, coerente e consistente, não
trabalhado em separado. O perfil não se “dá”, mas chega-se, porque vai se trabalhando o
perfil. Por isso que se vê nas aprendizagens essenciais uma coluna fundamental de referência
às estratégias de ensino que articulam o conteúdo disciplinar com os elementos fundamentais
do perfil. Isto é, prepara-se um aluno para ser comunicador, um pensador crítico não em
abstrato, a partir do nada, mas a partir dos conteúdos das disciplinas ou da relação entre várias
disciplinas.
ROLDÃO: A inclusão desta vertente das ações estratégicas é fundamental e se não for
trabalhada cai por terra tudo que é o perfil. O perfil de saída e os princípios são mais ou menos
consensuais. Isto leva a uma ação transformativa do modo como os professores e as escolas
relacionam as suas disciplinas e os espaços comuns no modo como trabalham com eles com
que tipo de aluno eu quero que saia daqui. Se o perfil diz que são indivíduos críticos e com
sentido de participação então o aluno tem que ter ocasião de ser participativo, ou seja, ações
que se desenvolvem e as ações estão nas estratégias. É por meio das estratégias que se faz a
ponte entre o conhecimento mais declarativo e mesmo processual que está nas disciplinas e
nas áreas de articulação curricular.

PERALTA: O currículo não tem que se adaptar à avaliação, mas, ao contrário, a avaliação é que
tem que se adaptar ao conjunto documental do currículo.

ROLDÃO: Com certeza que não é mantendo o modo de avaliação que fecham o círculo em que,
durante 2 meses ou 3 meses, o professor expos a matéria, os alunos ouviram e depois têm
testes ou outros instrumentos em que obtém uma nota e no dia que isso aconteceu, o círculo
fechou e o conhecimento morreu. Avaliar bem é avaliar o que se aprendeu e a capacidade de
usar o que se aprendeu.

4 – Disciplinas, interdisciplinaridade, disciplinaridade, etc

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