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Pressupostos Processuais

Resumo

Casos práticos resolvidos

Noção de Pressupostos processuais são os elementos de cuja verificação depende o dever de o


juiz proferir decisão sobre o pedido formulado, concedendo ou indeferindo a providência
requerida. Trata-se das condições mínimas consideradas indispensáveis para, à partida,
garantir uma decisão idónea e uma decisão útil da causa.
1 Não se verificando algum desses requisitos, como a legitimidade das partes, a capacidade
judiciária de uma delas ou de ambas, o juiz terá, em princípio, que abster-se de apreciar a
procedência ou improcedência do pedido, por falta de um pressuposto essencial para o efeito.
Se a falta de um dos pressupostos não for sanada, o juiz deverá reconhecer a existência de uma
exceção dilatória e proferir uma decisão de absolvição da instância (art.ºs 278.º e 577.º).

A doutrina distingue pressupostos positivos de pressupostos negativos. Os primeiros são os


requisitos cuja existência é essencial para que o juiz se deva pronunciar sobre a procedência ou
improcedência da ação, tais como a personalidade judiciária, a capacidade judiciária, a
legitimidade, o interesse processual, a competência do tribunal e o patrocínio judiciário. Os
outros são os factos cuja verificação impede o juiz de entrar na apreciação do mérito do pedido,
dos quais se destacam a litispendência e o compromisso arbitral. É costume distinguir-se os
diversos tipos de pressupostos processuais: • Pressupostos relativos às partes: a personalidade
judiciária; a capacidade judiciária; a legitimidade; o patrocínio judiciário, quando obrigatório e o
interesse processual; • Pressupostos relativos ao tribunal: a competência internacional e a
competência interna; • Pressupostos relativos ao objeto do processo: existência de objeto
processual e não verificação de litispendência ou de caso jugado; admissibilidade da cumulação
de pedidos. Vamos agora estudar brevemente alguns destes pressupostos, nomeadamente
aqueles que requerem a intervenção do oficial de justiça.

Personalidade judiciária e capacidade judiciária

A personalidade judiciária consiste na faculdade de ser parte e adquire-se no momento do


nascimento, com vida (art.ºs 11.º do CPC e 66.º do C. Civil). A capacidade judiciária consiste na
suscetibilidade de a parte estar, por si, em juízo, tendo por base e por medida a capacidade do
exercício de direitos – art.º 15.º Por exemplo, os menores têm personalidade judiciária, mas, no
entanto, não têm capacidade judiciária. Os menores sujeitos ao poder paternal dos pais,
enquanto réus, são citados nas pessoas de ambos os pais (art.º 16.º).

Competência do tribunal

Designa-se por competência do tribunal a medida do respetivo poder jurisdicional1. A


competência fixa-se no momento em que a ação se propõe, sendo irrelevantes as modificações

1
Poder Jurisdicional – Poder de julgar, de proferir uma decisão acerca de um litígio submetido pelas
partes à apreciação do órgão de jurisdição. “Proferida a sentença, fica imediatamente esgotado o poder
jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa”, pelo que a partir daí, já só lhe é lícito “retificar erros
materiais, suprir nulidades, esclarecer dúvidas existentes na sentença e reformá-la quanto a custas e
multa”, mas não alterar a decisão, ainda que venha a convencer-se de que ela não foi a mais adequada
de facto que ocorram posteriormente, como também são irrelevantes as modificações de
direito, exceto se for suprimido o órgão a que a causa estava afeta ou lhe for atribuída
competência de que inicialmente carecesse para o conhecimento da causa (art.º 38.º da LOSJ2)
Os tribunais portugueses têm competência internacional e competência interna ou nacional.
***

A Competência internacional

As questões a dirimir em tribunal podem estar em contacto com mais do que uma ordem
jurídica, caso em que se torna necessário determinar os limites da competência internacional
dos tribunais de cada um dos Estados. A cada Estado corresponde, quer em matéria de
2 legislação, quer em matéria de jurisdição, uma área de intervenção relativamente restrita.
Nestas circunstâncias importa, antes de verificar qual é o tribunal português (competência
interna) competente para julgar uma causa, determinar se os próprios tribunais portugueses
têm competência internacional em face dos estrangeiros.

O primeiro passo consiste então em fixar a competência internacional dos tribunais portugueses
e o passo seguinte será apurar o tribunal internamente competente. Nos termos do art.º 59.º
“os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando se verifique algum dos
elementos de conexão referidos nos artigos 62.º e 63.º ou quando as partes lhe tenham
atribuído competência nos termos do art.º 94.º”. De realçar a ressalva feita neste preceito ao
que “se encontre estabelecido em regulamentos europeus e em outros instrumentos
internacionais”, casos em que prevalece o neles consagrado3.

A Competência interna (art.º 60.º n.º 2) pode ser atribuída em razão:

- da matéria - do valor e da forma de processo aplicável - da hierarquia - do território

• Competência em razão da matéria

São da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem
jurisdicional – art.º 64.º do C.P.C. e art.º 40.º n.º 1 da LOSJ.

Os tribunais e juízos de competência especializada encontram-se designados no art.º 81.º da


mesma lei (cfr. art.º 65.º CPC).

A infração das regras da competência em razão da matéria determina a incompetência


absoluta do tribunal.

A incompetência absoluta é uma exceção dilatória, que pode ser suscitada pelas partes e deve
ser conhecida oficiosamente pelo tribunal em qualquer momento do processo, enquanto não

ou a mais justa. O mesmo princípio se aplica, “até onde seja possível”, aos despachos. - Ana Prata,
Dicionário Jurídico, 3.ª edição, pág. 741.
2
LOSJ-Lei da Organização do Sistema Judiciário, Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto, regulamentada pelo
Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março (ROFTJ)
3
Destacamos, em matéria de regulamentos, o Regulamento (EU) n.º 1215/2012 do Parlamento Europeu
e do Conselho, de 12 de Dezembro de 2012, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à
execução de decisões em matéria civil e comercial (revogou no seu art.º 66.º (Disposições transitórias) o
Regulamento (CE) n.º 44/2001 do Conselho, de 22.12.2000, relativo à competência judiciária, ao
reconhecimento e à execução de decisões em matéria civil e comercial), e o Regulamento (CE) n.º
2201/2003 do Conselho, de 27.11.2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de
decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental.
houver sentença transitada em julgado sobre o mérito da causa (art.ºs 96.º a 101.º, 576.º, 577.º,
al. a) e 578.º).

• Competência em razão do valor

A LOFTJ estabelece quais as causas que, em razão do valor, competem aos juízos centrais e aos
juízos locais (art.º 66.º CPC – cfr. art.ºs 41.º e 117.º a 130.º da LOSJ).

A infração das regras de competência do tribunal em razão do valor tem como consequência a
incompetência relativa do tribunal e é sempre de conhecimento oficioso, seja qual for a ação
em que se suscite (art.ºs 102.º e 104.º, n.º 2).

3 • Competência em razão da hierarquia

Os tribunais judiciais encontram-se hierarquizados para efeitos de recurso das suas decisões –
art.º 42.º da LOSJ.

As normas de competência em razão da hierarquia dizem respeito fundamentalmente a


recursos ordinários, a conflitos de competência e a ações de indemnização propostas contra
magistrados judiciais ou do Ministério Público, em virtude do exercício das suas funções

De um modo geral, o princípio que norteia tais normas é o de que o recurso ordinário deve ser
interposto para o tribunal imediatamente superior àquele que proferiu a decisão recorrida,
sendo também o tribunal imediatamente superior àquele onde exercem funções o competente
para conhecer das ações de indemnização contra magistrados, e igualmente o tribunal
imediatamente superior ao tribunal ou tribunais em conflito que deve conhecer dos respetivos
conflitos de competência (art.ºs 67.º a 69.º e 110.º).

A infração das regras da competência em razão da hierarquia determina a incompetência


absoluta do tribunal, que pode ser suscitada pelas partes e deve ser conhecida oficiosamente
pelo tribunal em qualquer momento do processo, enquanto não houver sentença transitada em
julgado sobre o mérito da causa (art.ºs 96.º a 101.º, 576.º, 577.º, al. a) e 578.º)

• Competência em razão do território

O art.º 43.º da LOSJ dispõe que o Supremo Tribunal de Justiça tem competência em todo o
território e os tribunais da Relação assim como os tribunais de 1.ª instância, na área das
respetivas circunscrições. Os art.ºs 70.º a 90.º estabelecem quais os tribunais territorialmente
competentes para a propositura de ações, procedimentos cautelares, recursos, execuções e
requerimento de notificações avulsas.

A regra geral, quando a lei não determina especialmente em contrário, é a de que o tribunal
competente para a ação é o do domicílio do réu, e para a execução é o tribunal do domicílio do
executado, podendo o exequente optar pelo tribunal em que a obrigação deva ser cumprida
quando o executado seja pessoa coletiva ou quando, situando-se o domicílio do exequente na
área metropolitana de Lisboa ou do Porto, o executado tenha domicílio na mesma área
metropolitana (art.ºs 80.º, n.º 1 e 89.º, n.º 1)4.

4
Cfr. Lei n.º 75/2013, de 12 de setembro. A Área Metropolitana de LISBOA integra os seguintes
municípios: Alcochete, Almada, Amadora, Barreiro, Cascais, Lisboa, Loures, Mafra, Moita, Montijo,
Odivelas, Oeiras, Palmela, Sesimbra, Setúbal, Seixal, Sintra e Vila Franca de Xira (www.aml.pt). A Área
Metropolitana do PORTO integra os seguintes municípios: Arouca, Espinho, Gondomar, Maia,
Matosinhos, Porto, Póvoa de Varzim, Santa Maria da Feira, Santo Tirso, S. João da Madeira, Trofa, Vale de
A infração às regras da competência em razão do território determina a incompetência
relativa do tribunal que pode ser arguida pelo réu no prazo fixado para a contestação, oposição
ou resposta ou, quando a estas não haja lugar, para outro meio de defesa que tenha a faculdade
de deduzir, ou oficiosamente pelo tribunal nos casos previstos no art.º 104.º, n.º 1 (art.º 102.º
e 103.º).

Julgada procedente a exceção e transitada a respetiva decisão, o processo é remetido para o


tribunal competente (art.º 105.º, n.º 3).

Patrocínio judiciário

A constituição de mandatário judicial é obrigatória nos casos previstos nos art.ºs 40.º e 58.º.
4 Com efeito, o conhecimento destas regras pelos oficiais de justiça assume particular
importância, na medida em que os réus, ao serem citados, deverão ser informados sobre a
obrigatoriedade ou não de patrocínio judiciário na ação respetiva – cfr. art.º 227.º.

Assim, é obrigatória a constituição de mandatário judicial nas seguintes situações:

▪ Nas causas de competência de tribunais com alçada em que seja admissível recurso
ordinário (v/art.º 44.º da LOSJ, e art.º 629.º do CPC.);
▪ Nas causas em que, independentemente do valor, seja sempre admissível recurso (por
exemplo, na ação de despejo urbano – cfr. art.ºs 629.º, n.º 3 e 647.º, n.º 2, alínea b))
com referência à Lei n.º 6/2006, de 27/2, que aprovou o Novo Regime do Arrendamento
Urbano;
▪ Nos recursos e nas causas interpostos nos tribunais superiores;
▪ Nas execuções  de valor superior à alçada da Relação;  de valor inferior, mas
excedente à alçada do tribunal de 1ª. Instância, quando seja deduzida oposição à
execução ou outro procedimento que siga a forma declarativa (ou seja, enquanto não
for deduzida oposição não é obrigatória a constituição);
▪ Nas reclamações de créditos, quando seja reclamado crédito de valor superior à alçada
do tribunal de comarca e apenas para apreciação deste crédito.

Em matéria cível a alçada dos Tribunais da Relação é de € 30 000,00 e a dos tribunais de


1.ª instância é de € 5 000,00 (cfr. art.º 44.º - n.º 1 da LOSJ).

Nos casos de constituição obrigatória, não tendo a parte constituído advogado, deve ser
notificada para o constituir, em prazo a fixar pelo juiz, sob pena de o réu ser absolvido da
instância, de não ter seguimento o recurso ou de ficar sem efeito a defesa. Esta notificação
pode ser requerida pela parte contrária ou ser oficiosamente ordenada pelo juiz e deve
conter expressamente a cominação supra referida (art.º 41.º)

Quando, no processo, seja requerida a renúncia ou a revogação de mandato, a secretaria,


independentemente de despacho5, notifica o facto ao mandante (renúncia) ou ao mandatário
(revogação) e em qualquer dos casos, também, à parte contrária, com os efeitos daí resultantes
a produzirem-se somente a partir das notificações.

Cambra, Valongo, Vila do Conde e Vila Nova de Gaia (www.amp.pt). A sede da sociedade é o seu domicílio,
sem prejuízo de no contrato se estipular domicílio particular para determinados negócios – art.º 12.º, n.º
2 do Código das Sociedades Comerciais integralmente republicado com o Dec. Lei n.º 76-A/2006, de 29
de Março
5
Esta notificação insere-se nas notificações oficiosas da secretaria previstas no n.º 2 do art.º 220.º.
A renúncia é pessoalmente notificada ao mandante (cfr. art.ºs 47.º, n.º 2 e 250.º) e se for
obrigatória a constituição de mandatário, será aquele advertido de que a não constituição de
novo mandatário no prazo de 20 dias implicará a suspensão da instância, sendo autor ou
exequente, ou o prosseguimento dos autos, no caso de ser réu, executado ou requerido,
aproveitando-se, embora, os atos anteriormente praticados pelo mandatário renunciante. No
que respeita à nomeação oficiosa de advogado, convém referir que, nos casos de urgência, se
aplica, com as necessárias adaptações, o disposto para as nomeações urgentes em processo
penal, conforme determina o n.º 3 do art.º 51.º (cfr. o art.º 39.º da Lei do Apoio Judiciário e os
art.ºs 62.º a 67.º do CPP).

5
Casos prático resolvido sobre competência do tribunal

[Legislação: CPC e LOSJ-Lei da Organização do Sistema Judiciário, Lei n.º 62/2013, de 26 de


agosto, regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 49/2014, de 27 de março (ROFTJ)]

A reside em Lisboa e vendeu a B um automóvel pelo valor de 25 mil euros. O contrato


foi celebrado em Coimbra. B recebeu o carro, mas não pagou o preço. O A tem de
pedir a condenação do B a pagar-lhe o preço.
Onde é que a ação vai ser proposta?
Qual é o tribunal, concretamente competente, para conhecer desta ação?
Justifique a sua resposta considerando todos os critérios (matéria, valor,
hierarquia e território).

Resolução

A irá intentar uma ação contra B no Tribunal da Comarca do Porto atendendo a que
em razão da:
Matéria: compete aos Tribunais Judicias de Primeira Instância.
Dentro dos Tribunais de Primeira Instância não é competente nenhum dos Tribunais
de competência territorial alargada, o que significa que a ação vai cair num Tribunal de
Comarca (hierarquia).
Valor: a ação pertence ao juízo local cível por ter um valor inferior a 50 mil euros.
Território: teria de ser num Tribunal de Comarca do Porto pelo art. 71º do CPC.

Caso prático resolvido sobre capacidade judiciária


António arrendou, em agosto de 2017, a Carla (hoje com 17 anos) um apartamento cito
em Faro. Carla deixou o apartamento referido e desde Janeiro de 2018 passou a residir
em Lisboa numa casa do pai (Daniel). Em Outubro de 2018, António intentou uma
ação declarativa contra Carla pedindo a condenação da ré a pagar 3.000€
correspondente às rendas que Carla se obrigou a pagar, mas que não pagou.
Carla contestou alegando que a ação deveria ser ter sido proposta contra Daniel devido
ao facto de ser menor. Concorda com a contestação apresentada?

Resolução: A Carla não tem razão porque ela é que é a parte (é inquilina), e é
assim que o autor configura a relação jurídica, a chamada relação material
controvertida. No entanto, sabemos que ela é menor, e sendo menor, regra geral,
os menores não têm capacidade de exercício, e como a capacidade judiciária tem por
base e por medida a capacidade de exercício, logo não tem capacidade judiciária não
podendo atuar por si mesma em juízo, necessita de estar representada. Sendo uma
menor a representação destes é feita pelos progenitores que exerçam o poder
paternal ou então subsidiariamente pelo tutor.

A incapacidade judiciária que diz respeito ao réu é sanada através da citação ou


intervenção (intervém sem ter sido citado) de quem representa o incapaz, nos termos
conjugados dos artigos (12.º,15.º,16.º, 17 e 18.º do CPC).
6 Se não houver intervenção, se tiver havido a citação do Daniel, mas o Daniel mesmo
após ter sido citado não compareceu, tem de ser citado o Ministério Público para
contestar. Se o Ministério Público não contestar, o processo segue à revelia, ou seja, o
processo segue como se o réu não tivesse contestado.

Se não se sanar a incapacidade porque o juiz não se apercebeu, a consequência é a


seguinte: uma vez que a incapacidade diz respeito ao réu, e devia o autor ter
intentado a ação pedindo a representação e não pediu, não tendo o juiz oficiosamente
sanado a incapacidade, vai acontecer a absolvição da instância em despacho saneador,
salvo se estivermos perante aquelas situações em que há despacho liminar e não se
fala em absolvição do réu, mas em indeferimento liminar.

Caso prático resolvido sobre interesse em agir

Abel, proprietário de uma oficina de reparação de automóveis, propôs uma ação


declarativa cível de condenação contra Bento alegando que, a pedido do réu,
proceder à reparação de um automóvel deste pelo preço de 5.000 euros e que o réu
não pagou. O autor concluía a petição inicial pedindo a condenação do réu no
pagamento dos 5.000 euros.
O réu contestou alegando que não conhece o autor, que não tem carro e que nunca
pediu qualquer reparação, pelo que não tem qualquer interesse em contradizer
devendo, por isso, ser absolvido da instância.
Quid Iuris?

Resolução: Bento é parte legitima porque estão em juízo os sujeitos da relação material
controvertida tal como o autor a configurou. Se no julgamento o réu vier a provar
aquilo que diz é absolvido do pedido. Estamos na análise dos pressupostos
processuais.

Caso prático sobre legitimidade processual

Carlos intentou contra Duarte uma ação judicial pedindo a condenação do réu no
pagamento de 1.000 euros correspondente ao preço de uma motorizada que havia
vendido a Duarte e a Ernesto.
Duarte contestou sustentando ser parte ilegítima por não estar igualmente em juízo
Ernesto.
Concorda com a contestação apresentada? Justifique.
Estamos no âmbito da legitimidade plural - litisconsórcio.
Pensem assim: será que se vier a ser proferida uma sentença no processo que opõe o
Carlos ao Duarte, a sentença que vier a ser proferida produz o seu efeito útil normal?

Vamos supor que o Carlos perdia a ação e ia propor outra ação só contra o
Ernesto e ganhava, sendo o Ernesto condenado a pagar os 1.000 euros. Esta sentença
que foi proferida nesta segunda ação não retira eficácia à primeira. Ora se não retira,
significa que relativamente ao pedido formulado entre Carlos e Duarte a situação ficou
7 definitivamente resolvida, ainda que elas sejam contraditórias.
O que se pretende evitar é que as sentenças sejam inconciliáveis e, portanto, evitar
que a segunda retire eficácia prática à primeira.
Se neste caso a decisão a obter produzia o seu efeito útil normal, embora não
vinculando o Ernesto, resolvida definitivamente a situação entre as partes quanto ao
pedido formulado não há litisconsórcio necessário, o que há é litisconsórcio voluntário.
E havendo litisconsórcio voluntário o que se pode perguntar agora é: aplicamos o nº1
ou o nº2 do artigo 32º do CPC?
Ou seja, o tribunal pode conhecer da totalidade do pedido feito pelo Carlos ou
conhece apenas a sua quota parte? E se estamos em litisconsórcio voluntário a falta
do Ernesto não provoca a ilegitimidade do Duarte.
Só se podia aplicar o nº2 se essa obrigação fosse solidária, porque quando a obrigação
é solidária é que o credor pode exigir de apenas um dos devedores a totalidade, mas a
solidariedade no direito civil é excecional, só existe solidariedade quando a lei o
determine ou quando as partes a convencionaram, fora disto a responsabilidade é
conjunta, o que significa que presume-se que cada um tem a sua quota parte e,
portanto, a sentença que poderia vir a ser proferida era de que o juiz apenas
condenava, se fosse esse o sentido da condenação, o Duarte a pagar 500 euros.

Caso resolvido sobre ilegitimidade processual

António intentou contra Bernardo uma ação judicial dizendo que:


a) Em janeiro de 2018 comprou ao réu um automóvel usado pelo preço de 15.000
euros;
b) Em fevereiro de 2018 o autor tomou conhecimento que o automóvel tinha
um grave defeito no motor;
c) Só adquiriu o automóvel por ter sido enganado pelo réu.
António concluía a petição inicial pedindo a anulação do contrato.
Bernardo contestou dizendo o seguinte: “Ser parte ilegítima, pois o automóvel em
causa era seu e de Carlos, seu irmão, que também assinou a declaração de venda
na qualidade de vendedor. “
Concorda com a contestação apresentada? Justifique.

Resolução: O autor configura a relação material controvertida dizendo que comprou


ao réu aquele automóvel e que foi enganado por ele e pede a anulação. O réu é
que vem dizer que é parte ilegítima porque o irmão também assinou a declaração de
venda, o automóvel não era só dele.
Nesta situação é óbvio que temos de atender à relação material controvertida tal como
ela é unilateralmente configurada pelo autor, e o autor diz que comprou o automóvel
ao Bernardo. Ora se é pelo modo como o autor configura a relação material
controvertida e se estão em juízo os sujeitos dessa relação, há uma coincidência entre
os sujeitos da relação material controvertida e os sujeitos da relação processual, logo o
Bernardo é parte legitima. Se se chegar à conclusão que o automóvel é mesmo do
Bernardo e do irmão (porque não sabemos), ele tem que ser absolvido do pedido,
porque se o automóvel é dos dois, a ação não pode ser intentada apenas contra o
Bernardo.
8

Caso resolvido relativo à legitimidade das partes

António casado com Fátima no regime de comunhão de adquiridos, ambos residentes


em Lisboa, comprou a Carla e Daniel, residentes em Coimbra, um imóvel cito na cidade
do Porto, pelo preço de 100.000 euros, convencido de que o mesmo imóvel se
encontrava desonerado e que assim sendo podia ser reabilitado e, posteriormente,
vendido livre e desocupado.
Após ter tomado conhecimento de que o imóvel estava arrendado a Ernesto,
António intentou uma ação judicial contra Carla pedindo a anulação do contrato com
fundamento em erro qualificado por dolo da vendedora, assim como a condenação da
ré a restituir a totalidade do preço que recebeu.
1. As partes são legítimas? Justifique.
2. Qual o tribunal concretamente competente?

Resolução: Sabendo que o litisconsórcio que é uma situação de pluralidade de partes


tem duas grandes modalidades, o necessário e o voluntário (é a regra). Mas
sabemos também que há certos fundamentos que exigem a necessidade de os vários
ingressados estarem em juízo: por razões da lei (litisconsórcio necessário legal), por
razões que se prendem com o acordo das partes (litisconsórcio necessário
convencional), ou então pela própria natureza da relação jurídica (litisconsórcio
necessário natural).

Começando pelo lado ativo da relação processual, verificamos que o António, que
é casado em comunhão de adquiridos com a Fátima, comprou esse imóvel a Carla e a
Daniel e que agora propõe uma ação com vista à anulabilidade desse contrato de
compra e venda. Pretendemos saber se o António pode propor essa ação tal como
propôs ou se a tem de propor com a esposa Fátima ou com o seu consentimento;
queremos saber se há litisconsórcio necessário legal conjugal (artigo 34º do CPC).
Nesta situação, uma vez que estamos no lado ativo, temos de analisar o número
1 do artigo 34º. Esse bem é um bem que só por ambos podia ser alienado ou não?

Temos que ir ao artigo 1682º A do CC. E reparem que isso é um bem comum
que foi adquirido na constância do matrimónio. E os bens comuns como é que eles
podem ser onerados ou alienados, quando vigoram o regime de comunhão de
adquiridos? Por ambos. Então significa que o direito de anulação é um direito que só
pode ser exercido por ambos. Ora, se assim é, significa que existe litisconsórcio
necessário legal conjugal. Se a ação foi proposta apenas pelo António e devia ter sido
proposta por ambos, ou por um com o consentimento do outro, o António sozinho
é parte ilegítima. Mas a ilegitimidade plural é sempre sanável nos termos do artigo 261º
do CPC.

O artigo 316º diz que “ocorrendo preterição de litisconsórcio necessário, qualquer das
partes pode chamar a juízo o interessado com legitimidade para intervir na causa, seja
como seu associado, seja como associado da parte contrária” - intervenção provocada:
aquele que já lá está provoca a intervenção, chama o outro.
9
Podíamos ainda aplicar, se fosse o cônjuge a intervir espontaneamente, o artigo
311º CPC, intervenção espontânea: aquele que está de fora, intervém espontaneamente
no processo. Se a Fátima tivesse intervenção espontânea, aí ficava logo imediatamente
sanada. Se não tiver, o marido António pode chamar.

Mas o António intentou a ação apenas contra a Carla, sabendo nós que o bem pertencia
a Carla e a Daniel. E agora o que se pretende é a anulação do contrato de compra e
venda. Sabemos que nessa relação existe mais um interessado que é o Daniel. O Daniel
tem de estar em juízo porque estamos perante um litisconsórcio necessário natural.
É uma daquelas situações que não dá lugar a dúvidas. Estamos perante a anulação de
um contrato com mais do que um vendedor e que, portanto, a anulabilidade do contrato
tem de produzir efeitos quanto aos dois porque a decisão a ser proferida nessa
primeira ação, se não houvesse esta possibilidade do litisconsórcio necessário
natural, não vinculando o Daniel, não produziria o seu efeito útil normal porque não
resolvia definitivamente o litígio entre as partes quanto ao pedido concretamente
formulado, porque numa segunda ação há o risco de a decisão a ser proferida ser
inconciliável, ser incompatível com a decisão proferida nesta primeira ação, retirando a
eficácia desta primeira ação.
E se lhe retira a eficácia não produz o seu efeito útil normal.
Se há um litisconsórcio necessário natural em que a presença de todos os
interessados é necessária para assegurar a legitimidade, não estando lá o Daniel, a Carla
é parte ilegítima.
Mas a legitimidade plural é sanável nos termos do artigo 261º do CPC.

As partes não são legítimas.


✓ Tribunal concretamente competente - Tribunal Judicial da Comarca de
Coimbra, juízo central cível de Coimbra.

Caso prático resolvido sobre interesse em agir


Carlos intentou contra Ernesto uma ação judicial pedindo a condenação do réu de
restituir o montante de 10.000 euros, invocando que lhe havia emprestado aquele valor
e que o réu, apesar de decorrido o prazo acordado de 6 meses, ainda não lhe havia
devolvido.
Ernesto contestou dizendo que o autor não tinha interesse processual, pois ainda não
tinha decorrido o prazo efetivamente acordado para a restituição que era de 1 ano.
1. Concorda com a contestação apresentada pelo réu?
2. Era obrigatória a constituição de advogado?
3. Quid Iuris se Carlos não constituir advogado e se a falta for do réu.

Resolução: 1. O interesse processual consiste numa situação de


carência/necessidade de recorrer aos meios jurisdicionais e, portanto, distingue-se,
desde logo, da legitimidade.
A legitimidade tem haver com o interesse direto em demandar e com o interesse direto
em contradizer e que esse interesse direto em demandar ou em contradizer se afere
pela utilidade tida pela procedência da ação ou pelo prejuízo que a procedência dessa
ação acarreta. Na falta de indicação da lei em contrário, se consideram titulares
10 dos interesses relevantes para efeitos de legitimidade os sujeitos da relação
material controvertida tal como o autor a configura, nos termos do artigo 30º, nº3 do
CPC.

Sabemos que o interesse em agir é um pressuposto processual positivo inominado,


e, se assim é, tem que se verificar para que o juiz possa entrar na apreciação do
mérito da causa. A questão de saber se o prazo para a restituição era de 6 meses ou 1
ano, se já decorreu ou não, não tem nada haver com os pressupostos processuais, isso
tem haver com o mérito da causa.

O autor diz que já decorreu o prazo e que o réu não restituiu. Ao dizer isto o autor está
a dizer que o réu lhe deve - o autor está a invocar a violação de um direito de crédito.
Nas ações de condenação, para questão referidas ao interesse processual do autor,
basta que o autor alegue a violação de um direito. Basta isso para que esteja
preenchido o interesse em agir.

Mas vamos supor agora que afinal se prova em julgamento que o prazo ainda
não tinha decorrido e que afinal, quando o autor propôs a ação, não tinha ainda
necessidade de recorrer aos tribunais. O réu é condenado a pagar, mas apenas sem
prejuízo do prazo, ou seja, é condenado a pagar no momento em que a obrigação se
vencer; e o autor tem de pagar as custas e os honorários do advogado do réu (art. 610º,
nº2 e 3 - CPC).

2. Era obrigatória a constituição de advogado pelo artigo 40º do CPC, mas temos de ir
ao artigo 629º porque é ele que nos diz quais são as causas em que é admissível recurso
ordinário.
Estamos no tribunal judicial de 1ª instância e a sua alçada é de 5.000 euros. A causa é
de 10.000 euros. Apenas é admissível recurso ordinário naquelas ações cujo valor
seja superior à alçada do tribunal de que se recorre. O valor da causa é superior.

3. Se o autor não constituir advogado estamos perante um pressuposto processual cuja


falta é sanável, portanto, o juiz deve notificar o autor para vir constituir advogado dentro
de um prazo certo (quando não diz prazo são 10 dias - prazo geral - art. 149º
CPC). Se dentro do prazo não constituir advogado, o réu é absolvido da instância.
Se o réu não constituir advogado, o juiz tem de notificar o réu para vir constituir
advogado.
dentro do prazo certo, e se não o fizer o processo segue à sua revelia (art. 41º - CPC).

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