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DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO

5º OFÍCIO CRIMINAL DO NÚCLEO DO RIO DE JANEIRO

EXCELENTÍSSIMOS DESEMBARGADORES FEDERAIS DA EGRÉGIA 1ª SEÇÃO


ESPECIALIZADA DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 2ª REGIÃO

Processo originário nº 2003.51.01.502846-9

ARLEIDE MARIA DO NASCIMENTO CRUZ, brasileira, filha de


Aurélio Sérgio do Nascimento e Tereza Maria de Jesus, nascida em 29/09/1949, RG n°
3557452-4 IFP/RJ, CPF n° 627.842.267-00, residente e domiciliada à Rua Olimpia
Esteves, n° 558, Padre Miguel – Rio de Janeiro/RJ, vem perante este Tribunal,
assistida pela DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO, com fulcro no arts. 621, III, e 622
do Código de Processo Penal, e nos termos do art. 12, I, “a”, do RITRF2, apresentar
pedido de

REVISÃO CRIMINAL

em face da sentença condenatória prolatada pelo ilustre Juízo da


7ª Vara Federal Criminal da Seção Judiciária do Rio de Janeiro no processo originário
em epígrafe, confirmado por acórdão prolatado pela 1ª Turma Especializada desta
Egrégia Corte, nos termos a seguir aduzidos.

I – DOS FATOS

Rua da Alfândega, n° 70 , Centro – Rio de Janeiro/RJ – CEP: 20.070-004 – Tels.: (21) 2517-3301/ 2220-1708
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ARLEIDE MARIA DO NASCIMENTO CRUZ fora denunciada


pelo Ministério Público Federal em 25/03/2003 (doc. 1), juntamente com os co-réus
SEBASTIÃO DE PAIVA REGO, JORGE JACKSON DA CRUZ e MARIA ZÉLIA
SILVA DOS SANTOS, em virtude de suposta participação em esquema de fraudes a
benefícios da Previdência Social.

Segundo a inicial acusatória, ARLEIDE, atuando como


preposta do advogado JORGE JACKSON, auxiliava os clientes destes, SEBASTIÃO
e MARIA ZÉLIA, a sacar seus benefícios previdenciários, os quais foram
fraudulentamente obtidos por JORGE junto a funcionários do INSS. Salientou que
ARLEIDE chegou a ser presa quando tentava efetuar o saque da aposentadoria de
SEBASTIÃO. Por essas condutas, foi-lhe imputada os crimes do art. 171, § 3° (por
duas vezes) e art. 171, § 3° c/c art. 14, II, todos do CP.

Além disso, a requerente também foi acusada de ter obtido


para si benefício previdenciário fraudulento, de NB 42/123.085.125-6, por meio da
inclusão de vínculos empregatícios não confirmados pela auditoria do INSS, junto às
empresas PIRAQUE, PRODUTOS ARIA e CARDOSO CHARQUE (sic). Assim,
ARLEIDE teria incorrido novamente no crime do art. 171, § 3° do CP.

Na ocasião da prolação da sentença monocrática (doc. 4),


ocorrida em 15/12/2003, ARLEIDE fora condenada pelas condutas imputadas na
denúncia, nos seguintes termos:

1. Pelo crime descrito no art. 171, § 3° c/c art. 14, II,


todos do Código Penal, resultante da prisão em flagrante
com o acusado SEBASTIÃO: 6 (seis) meses e 18
(dezoito) dias de reclusão e 6 (seis) dias-multa;

2. Pelo crime descrito no art. 171, § 3°, do CP, resultante


do auxílio no saque fraudulento com SEBASTIÃO em
31/10/2002: 8 (oito) meses de reclusão e 9 (nove) dias-
multa;

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3. Pelo crime descrito no art. 171, § 3°, do CP, resultante


da obtenção de seu próprio benefício, na forma do art. 71
do CP: 2 (dois) anos de reclusão e 19 (dezenove) dias-
multa;

4. Pelo crime descrito no art. 171, § 3° c/c/ 14, II, todos do


CP, resultante do saque fraudulento do benefício de
MARIA ZÉLIA: 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão
e 13 (treze) dias-multa.

No entanto, o Juízo afastou-se do entendimento ministerial


quanto à caracterização de concurso formal entre as duas primeiras condutas, para
reconhecer o concurso material (art. 69 do CP) entre todos os crimes. Assim, fixou a
pena total da acusada em 4 (quatro) anos e 6 (seis) meses de reclusão e 59
(cinquenta e nove) dias-multa.

Irresignada, ARLEIDE interpôs apelação contra o decreto


condenatório em 04/02/2004 (doc. 5), requerendo sua reforma para minorar a pena
aplicada, afastando a continuidade delitiva no recebimento ilegal de benefícios do
INSS e a consideração de condutas não descritas na denúncia.

Julgando o aludido recurso em 11/01/2006 (doc. 6), a 1ª Turma


Especializada do TRF da 2ª Região seguiu à unanimidade o voto do Relator, que
entendeu que o conjunto probatório fora sólido em desfavor dos acusados.
Particularmente ao benefício recebido por ARLEIDE, reportou-se às informações
prestadas pela auditoria do INSS. Por fim, atento à jurisprudência, que entende que
a obtenção de vantagem ilícita em prejuízo ao patrimônio público renova-se mês a
mês, manteve a Turma a incidência do art. 71 do CP quanto ao recebimento de sua
aposentadoria. Em conclusão, negou provimento ao recurso.

Dada a ausência de interposição de recurso em face desse


acórdão pelas partes, ocorreu o trânsito em julgado do decisum em 23/03/2006
(doc. 7), tendo sido determinada a baixa à Vara de Origem, onde se encontra até a
presente data.

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É o relato do necessário.

II – DO MÉRITO

Como será demonstrado, novos elementos surgiram em favor


de ARLEIDE MARIA DO NASCIMENTO CRUZ, os quais vieram para obstar todo o
arcabouço probatório de sua condenação de 2 (dois) anos de reclusão e 19
(dezenove) dias-multa pelo suposto recebimento indevido de sua aposentadoria NB
42/123.085.125-6, tipificada no art. 171, § 3° c/c art. 71, ambos do CP.

Da leitura das principais peças dos autos, vê-se que a


irregularidade apontada pelo Parquet e pelas Autoridade Judiciais quanto à
aposentadoria por tempo de contribuição da requerente foram extraídas
exclusivamente do relatório produzido pelo Grupo de Trabalho instaurado no âmbito
da Previdência Social (fls. 146/147 dos autos originários – doc. 2), notadamente dos
trechos adiante destacados:

“Na busca de informações sobre a vida laborativa da


interessada, acessamos às informações do Cadastro
Nacional de Informações Sociais – CNIS, e, através da tela,
Consulta Dados Cadastrais e Vínculos Empregatícios do
Trabalhador, onde para obtenção do que se deseja
necessário se faz informar o número do PIS, obtivemos
como resposta que o mesmo foi cadastrado em 01/04/1975
e que não constam vínculos empregatícios suficientes
para a concessão do benefício em destaque, vide
documentos que constitui às fls. 19/20.
(...)
Ressaltamos que não consta no CNIS (CADASTRO
NACIONAL DE INFORMAÇÕES SOCIAIS) vínculo
empregatício com os empregadores PIRAQUE período
03/08/1965 a 03/08/1967, PRODUTOS ADRIA período
11/09/1967 a 31/07/1969 e CARDOSO CHARQUE período
29/08/1969 a 05/09/1970, sugerimos que seja solicitado a
titular do benefício os documentos que embasaram a
concessão da aposentadoria em destaque, chamando
atenção para os mencionados vínculos.” (g.n.)

De fato, podemos fazer essa constatação do simples recorte


das argumentações lançadas nas peças acusatórias e condenatórias:

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“O benefício de Arleide n° 42/123.085.125-6 é fraudulento,


pois não foram confirmados os vínculos apresentados
com as empresas PIRAQUE, PRODUTOS ADRIA e
CARDOSO CHARQUE, e vinha sendo sacado por Arleide e
Jorge Jackson desde julho de 2002, tendo gerado, pelo
menos, seis pagamentos indevidos no valor de R$ 1324,98,
conforme discriminado no histórico de créditos em anexo.”
(denúncia – fl. 06 dos autos originários) (g.n.)
“Os benefícios previdenciários dos réus SEBASTIÃO DE
PAIVA REGO, MARIA ZÉLIA SILVA DOS SANTOS,
ARLEIDE MARIA DO NASCIMENTO CRUZ e JORGE
JACKSON DA CRUZ foram concedidos fraudulentamente,
conforme comprovam os Processos de Reavaliação de
Concessão de Benefícios acostados em fl. 44/72, fl.
91/118, fl. 120/149, fl. 507/567, respectivamente.”
(alegações finais do MP , doc. 3 – fl. 707 dos autos
originários) (g.n.)
“Fosse pouco, o INSS informou que os benefícios dos
acusados foram concedidos irregularmente: Sebastião às
fls. 71/72, Maria Zélia às fls. 117/118, Arleide às fls.
146/147 e Jorge Jackson às fls. 563/567.” (sentença – fl.
816 dos autos originários) (g.n.)
“Também restou provado ter a própria Arleide benefício
fraudulento, conforme as informações do INSS de fls.
146/147.” (voto do relator da apelação – fl. 945 dos autos
originários) (g.n.)

Assim, podemos concluir com segurança que a condenação se


sustenta unicamente no fato de que os vínculos empregatícios supostamente
mantidos por ARLEIDE com as empresas PIRAQUE (03/08/1965 a 03/08/1967),
PRODUTOS ADRIA (11/09/1967 a 31/07/1969) e CARDOSO CHARQUE
(29/08/1969 a 05/09/1970), utilizados como tempo de serviço para a obtenção da
aposentadoria, não foram confirmados pelo INSS, em consulta ao CNIS.

No entanto, após o trânsito em julgado da sentença advieram


provas até então desconhecidas pela instância julgadora, que vêm a demonstrar de
forma contundente a necessidade da revisão do decisum.

De início, a apenada logrou reaver junto ao INSS as Carteiras


de Trabalho e Previdência Social apresentadas na ocasião da solicitação do
benefício em questão, cujas cópias, extraídas nesta Defensoria, encontram-se
anexadas ao recurso.

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Analisando a primeira CTPS (doc. 9), vê-se que ARLEIDE


efetivamente trabalhou como aprendiz no período de 03/08/1965 a 03/08/1967, junto
à empresa MASSAS ALIMENTÍCIAS AYMORÉ LIMITADA FÁBRICA DE MASSAS.
Assim, e muito embora o vínculo tenha sido mantido com empresa diversa da
constante nos cadastros do INSS, é evidente a ausência de fraude, posto que o
tempo de serviço computado para fins de aposentadoria fora efetivamente prestado
pela recorrente.

Da mesma forma, consta na CTPS n° 45083, série 206 (doc.


10), o vínculo empregatício mantido por ARLEIDE com a empresa PRODUTOS
ALIMENTÍCIOS ADRIA S/A no período de 11/09/1967 a 31/07/1969.

Lembramos, outrossim, que a anotação em carteira de trabalho


tem presunção juris tantum de veracidade, e mesmo em confronto com dados do
CNIS, de conhecida falibilidade1, devem prevalecer como prova dos vínculos
empregatícios. Neste sentido:

“1. Os registros constantes no Cadastro Nacional de


Informações Sociais (CNIS), por força da nova redação do
art.19 do Decreto 3048/99, tem valor probatório equivalente às
anotações em CTPS.
2. Quando os dados presentes naquele banco de dados vão
de encontro aos apontamentos presentes na carteira de
trabalho, deve-se preferir a interpretação mais favorável ao
segurado, dada a sua condição de hipossuficiente.”
(TRF 4ª Região – AC 200270000707039/PR. 5ª Turma. Rel.
Juiz Victor Luiz dos Santos Laus. DJU 16/11/2005, p. 902)

“No caso, as suspeitas do INSS quanto à irregularidade dos


vínculos empregatícios não registrados no CNIS devem ser
afastadas, porque todos eles estão devidamente comprovados
com a respectiva anotação na carteira de trabalho e
previdência social do apelado: (...)“
(JEF - RECURSO CÍVEL 200239007033145. 1ª Turma
Recursal/PA. Rel. Juiz Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves.
Data 12/03/2003)

Por fim, é ainda mais flagrante a incorreção do julgado quanto


à suposta fraude referente ao período trabalhado entre 29/08/1969 a 05/09/1970,
senão vejamos.
1 “Consulta ao CNIS não tem valor de prova, para o cancelamento do benefício deve haver a comprovação da irregularidade
na sua concessão.” (TRF 2ª Região - AMS 200351015121305/RJ. 2ª Turma Esp. Rel. Juiz Marcello Ferreira de Souza
Granado. DJU 13/06/2005, p. 131)
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Voltando à CTPS n° 45083, série 206, consta a sua folha 8


registro de contrato de trabalho firmado entre ARLEIDE e a empresa CASAS DO
CHARQUE durante o período de 29/08/1969 a 05/09/1970, o que, até prova o
contrário, demonstraria a regularidade do cômputo para fins de aposentadoria.

Contudo, tal anotação foi posteriormente questionada pelo


INSS por suspeita de adulteração na data de saída (doc. 13), o que chegou a dar
ensejo à instauração de nova ação penal contra ARLEIDE, de n°
2006.51.01.525598-0, perante a 6ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro.

Mesmo assim, a própria Junta Recursal da Autarquia acabou


por reconhecer a regularidade da anotação (doc. 12), face a soma dos períodos em
que estava afastada do serviço recebendo auxílio-doença (fl. 34 da CTPS) e
natalidade (certidão de nascimento em anexo – doc. 8). Por esse motivo, fora
restabelecido seu benefício, com o pagamento de todas as parcelas vencidas (doc.
11).

Seguindo o entendimento administrativo, a Exma. Juíza da 6ª


VFC também entendeu pela regularidade do período computado, absolvendo
ARLEIDE por atipicidade do fato (doc. 14), decisão esta já transitada em julgado.

Em conclusão, temos que as provas colacionadas no presente


pedido de revisão criminal estão a demonstrar que ARLEIDE MARIA DA
CONCEIÇÃO CRUZ de fato trabalhou nos períodos de 03/08/1965 a 03/08/1967,
11/09/1967 a 31/07/1969 e 29/08/1969 a 05/09/1970, não havendo qualquer fraude
no requerimento do benefício NB 42/123.085.125-6.

Portanto, a condenação ora guerreada, de 2 (dois) anos de


reclusão e 19 (dezenove) dias-multa pelo suposto recebimento indevido de sua
aposentadoria, tipificada no art. 171, § 3° c/c art. 71, ambos do CP, não mais se
sustenta, impondo-se sua revisão para absolver a requerente nos termos do art.
386, III, do CPP.

III – DO PEDIDO

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Ante o todo exposto, requer-se o recebimento e o provimento


da presente revisão criminal, de forma que a condenação de ARLEIDE MARIA DO
NASCIMENTO CRUZ à pena de 2 (dois) anos de reclusão e 19 (dezenove) dias-
multa pelo crime do art. 171, § 3° c/c art. 71, ambos do CP, exarada no processo n°
2003.51.01.502846-9 seja revista, para fins de absolvê-la da acusação, com fulcro
no art. 386, III, do Código de Processo Penal.

Nestes termos, pede deferimento.

Rio de Janeiro, 5 de dezembro de 2007.

EDUARDO NUNES DE QUEIROZ


Defensor Público da União

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