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O Conteúdo Negativo dos Direitos Reais

1. O Conteúdo Negativo Imposto pelas Relações de Vizinhança


A proximidade entre coisas pode conduzir ao choque entre titulares de direitos reais,
na medida em que o gozo de uma coisa pode repercutir-se igualmente o
aproveitamento de outras coisas.
A situação passiva que é conteúdo de um direito subjetivo prevê deveres e outras
vinculações que diminuem a extensão de gozo da coisa, que surge justificada pela
finalidade de preservar o gozo de outros titulares de direitos reais.
Vem prevista no art.º 1344 ss. em relação aos proprietários e imóveis.
A violação de deveres de conduta pelo titular do direito, causando danos a terceiro,
sujeita-o a responsabilidade civil.
2. As Emissões
Art.º 1346
+ Regulamento Geral do Ruído: DL nº 292/2000, 14 de Novembro
Proprietário: titular do direito real
Proibição de todas as emissões:

 JAV: abrange potencialmente todas as emissões


 Henrique Mesquinha: não se aplica a todas as emissões, mas apenas as de
elementos que tenham natureza incorpórea e as de elementos incorpóreos de
tamanho ínfimo
Pressupostos:

 Prejuízo substancial para o uso do imóvel;


o Análise do fim a que o imóvel se encontra afeto
 Henrique Mesquinha: o prejuízo deve ser aferido pelo fim a que
esteja afetado o imóvel e não pelas condições especiais em que
se encontre o respetivo proprietário
o Constatação que a sua prossecução fica comprometida com as emissões
do prédio vizinho: danos ao titular do direito real
 Não resultem da utilização normal do prédio de que emanam.
o STJ: Utilizar um prédio numa zona habitacional como estábulo de gado,
pela ameaça que significa para a qualidade de vida dos habitantes dessa
zona  utilização disfuncional, atento ao destino socioeconómico que
lhe deveria ser dado
Cumulativos?:

 Sim:
o MC
 As emissões ilícitas provocam dano aos titulares
 Sem dano não haveria motivo para restringir o gozo
 Se não houvesse dano não deveriam ser consideradas ilícitas,
podendo ser proibidas
 Mesmo que não existisse um “prejuízo substancial” estas
emissões são ilícitas, podendo ser impedidas pelos titulares de
direitos de gozo sobre o prédio afetado, havendo lugar à
imputação dos danos, a título de responsabilidade civil
 Não
o Pires Lima
 O objetivo do preceito é salvaguardar o gozo da coisa pelos
titulares de direitos reais, pelo que, ainda que o uso desencadeie
as emissões seja um uso normal da coisa, as emissões são ilícitas
Abrange:

 Prédios contíguos
 Prédios com proximidade espacial
o STJ: “proximidade suficiente para ser afetado pelas emissões de cheiros
e ruídos”
o MC: Qualquer prédio que possa ser atingido pelas emissões de outro
prédio considera-se vizinho
 A proibição abrange:
o Qualquer imóvel licenciado por autoridade administrativa
 STJ: o direito de posição face a emissões de cheiros ou ruídos,
subsiste mesmo que os ruídos sejam inferiores à previsão legal
desde que seja considerada como agressão ambiental
 Mesmo que os trabalhos tenham sido autorizados pela Câmara
Municipal apenas o serão limitadamente
3. As instalações prejudiciais
Art.º 1347
STJ: amplia a lista de construção

 Quaisquer obras ou instalações suscetíveis de ter efeitos nocivos não


permitidos por lei sobre o prédio vizinho
o Todos os que afetem diretamente o prédio, desvalorizando-o, como os
que possam atingir a saúde e a tranquilidade das pessoas
Responsabilidade civil objetiva pelo art.º 483/2 CC
Titular do direito real pode:

 Proibir as obras, depósitos e outras instalações que encerrem perigo ou dano


sobre o seu prédio
 Caso sejam objeto de licenciamento pela autoridade administrativa:
o A remoção é apenas admitida após o dano ser consumado (art.º
1347/2)
4. Escavações
Art.º 1348
Abrange:

 Os danos causados com a falta de apoio decorrente dos trabalhos dos trabalhos
de escavação
 Os danos projetados pelas escavações nos prédios vizinhos
Responsabilidade objetiva do autor das escavações:

 OA: a conduta além de não culposa é ilícita, sem que tal inquine a
responsabilidade civil
 O proprietário não vê a sua responsabilidade a ser afastada por ter recorrido a
um empreiteiro para a realização da obra
4. Passagem Forçada Momentânea
Art.º 1349
O titular deve consentir na colocação de andaime, matérias e outras estruturas no seu
prédio se for imprescindível para a construção
O titular do direito lesado pode ser indemnizado (art.º 1349/3)
Art.º 1349/2:

 Direito de acesso de terceiro a imóvel sobre o qual não tem qualquer direito
para recuperar coisa sua que aí se encontre
 O titular do direito pode impedir o exercício do acesso, oferecendo a coisa que
se encontra no imóvel
5. O dever de conservação de imóvel
Art.º 1350
Art.º 492
Dever de conservar o direito real de gozo sobre edifício ou outra obra
Art.º 1472/1: o dever não é forçosamente do proprietário, pode ser do usufrutuário
Se por defeito de conservação o edifício causar danos a alguém, o titular do direito real
que construiu a obra é responsável civilmente, presumindo a sua culpa (art.º 492/1 e
483/1).
6. Escoamento natural das águas e obras defensivas das águas
Art.º 1351
Os titulares dos direitos sobre os prédios inferiores não podem impedir os escoamento
de água, sedimentos e detritos
Os titulares dos direitos sobre os prédios superiores não podem agravar o escoamento
tal como decorre da ação da natureza.
Obras defensivas das águas (art.º 1352)

 Está em causa:
o O interesse dos titulares de direitos reais de gozo sobre o prédio onde as
obras defensivas existam
o O dos titulares de prédios vizinhos que recebam proteção das águas por
via dessas obras
 Titular do direito real sobre o prédio onde exista a obra defensiva
o Posição jurídica bifacetada:
 Dever proceder às obras de conservação dessa obra
 Se não fica obrigado a tolerar que os titulares de direitos reais de
gozo sobre os prédios vizinhos beneficiados com as obras
defensivas as façam
 Nº3:
o Participação dos titulares de direitos reais nas despesas com as obras de
conservação ou de reparação
o Se houver um responsável civil pelas destruição de obras defensivas de
águas a este cabe suportar o valor da reparação
o Não havendo: as obras devem ser suportadas por casa titular do direito
real na proporção do seu interesse nas mesmas
7. Abertura de janelas, varandas, portas e semelhantes sobre prédio contíguo
Art.º 1360
Defesa da privacidade das pessoas contra a intrusão ou devassa que pode estar
associada a uma estreita proximidade espacial
Art.º 1361:

 Dever não existe se entre os prédios existe uma passagem do domínio público,
como estrada, caminho, rua, etc.
8. A desvinculação por meio de “servidões de vista”
Art.º 1362
Os deveres de não abertura de porta, janelas, etc. a menos de um metro e meio
possam ficar libertos deveres através da obtenção de uma servidão de vistas.
A posse do prédio em violação no art.º 1360 pode, por usucapião, extinguir estes
deveres.
Art.º 1362:
 Nº1: constituição de uma servidão de vistas por usucapião
o Alguns autores falam em servidões de desvinculação
 O usucapião tem uma eficácia constitutiva de direitos reais de
gozo
 Ora, o art.º 1362 não é de constituição de direito real, mas de
extinção de um particular dever
o O titular do direito real de gozo sobre o prédio que beneficia com a
extinção do dever não adquire qualquer direito
 A extinção de deveres não cria, em contrapartida, qualquer
constituição de direito real ou servidão
O art.º 1362 extingue deveres preceituados no art.º 1360:

 Quando os titulares de direitos de gozo que deles beneficiavam nada fizeram


para contrariar a violação dos mesmos durante o prazo correspondente
 Usucapião apenas quanto aos prazos
 Não existe propriamente uma extinção de deveres
o Apenas os titulares de direitos que estavam gravador por esse conteúdo
negativo deixam de estar obrigados aos deveres respetivos
9. Outras Aberturas
Art.º 1363

 Os titulares de direitos reais de gozo não estão sujeitos aos deveres do art.º
1360
 Nº2: 1.80 cm do solo
10. Estilicídio
Art.º 1365:

 Dever de impedir que as águas que escorrem do terrado ou de outra cobertura


não caiam no prédio do vizinho
 Deve haver um intervalo mínimo de 5 dm entre o prédio e a beira.
11. Plantação de árvores e de arbustos
Art.º 1366:

 Nº1: O titular do direito real de gozo pode plantar plantas ou arbustos até ao
limite do seu prédio
 Nº2: Situações de árvores ou plantas com efeitos nocivos para os prédios
vizinhos
 Consequência: o titular do prédio pode arrancá-las ou cortá-las, se o dono das
árvores ou plantas o não fizer no prazo de três dias
Art.º 1367:
 Se os frutos das árvores não puderem ser colhidos através do seu prédio o
titular do direito real de gozo do prédio vizinho está obrigado a facultar a
colheita
 Direito à indemnização pelos prejuízos sofridos
12. A tapagem do prédio
Art.º 1356:

 O proprietário do prédio pode erguer muro rodeando árvores ou plantas


 Este poder não se restringe ao proprietário, mas a qualquer proprietário de
direito real (usufruto, uso ou superfície)
o OA: apenas ao titular do direito real

Art.º 1359
13. O conteúdo negativo de vizinhança convencionado
As partes podem convencionar vinculações do titular do direito real de gozo.
14. O conteúdo negativo imposto pelo conflito com direitos intelectuais
A exteriorização de bens intelectuais em suportes corpóreos pode acarretar a
imposição de deveres ao titular do direito real de gozo sobre a coisa

 Sujeitando-o à impossibilidade de disposição lícia do direito a favor de terceiro


sem o consentimento do titular do direito real
14. Os conflitos de sobreposição não fazem parte do conteúdo do direto real
MC: engloba dos conflitos de sobreposição no conteúdo dos direitos reais
JAV: a comunhão de direitos reais representa uma situação de concurso de direitos
reais de direitos reais de espécie igual sobre a mesma coisa

 Havendo direitos iguais sobre a mesma coisa, a extensão de cada um surge


limitada pelo outro : deveres específicos

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