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DOCÊNCIA EM

SAÚDE
ENFERMAGEM EM DOAÇÃO E
TRANSPLANTE DE ÓRGÃOS
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Bibliotecário responsável: Rodrigo Pereira CRB 1/2167
Portal Educação

P842e Enfermagem em doação e transplante de órgãos / Portal Educação. -


Campo Grande: Portal Educação, 2012.

122p. : il.

Inclui bibliografia
ISBN 978-85-8241-265-7

1. Enfermagem - Transplante. 2. Doação de órgãos. I. Portal Educação. II.


Título.

CDD 610.736
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................4

2
2 HISTÓRIA DOS TRANSPLANTES ............................................................................................5

3 ASPECTOS LEGAIS DOS TRANSPLANTES NO BRASIL ......................................................9

4 POLÍTICAS PÚBLICAS EM TRANSPLANTES ........................................................................21

5 O DOADOR DE ÓRGÃOS - ASPECTOS GERAIS DOS TRANSPLANTES ...........................28

5.1 O Doador de Órgãos................................................................................................................28

5.2 A Família do Doador de Órgãos .............................................................................................41

5.3 Imunologia em transplante .....................................................................................................43

5.4 Imunossupressão ....................................................................................................................47

5.5 Infecções no Paciente Transplantado ...................................................................................50

6 AS DIFERENTES MODALIDADES DE TRANSPLANTE .........................................................54

6.1 Transplante Hepático .................................................................................................................54

6.2 Transplante Renal ......................................................................................................................56

6.3 Transplante Cardíaco ................................................................................................................58

6.4 Transplante de Pâncreas ...........................................................................................................60


6.5 Transplante de Pulmão ..............................................................................................................62

6.6 Transplante de Intestino ............................................................................................................64

6.7 Transplante de Pele ...................................................................................................................67

6.8 Transplante de Ossos ................................................................................................................71 3

6.9 Transplante de Córnea ..............................................................................................................73

6.10 Xenotransplantes .......................................................................................................................75

7 ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM EM DIFERENTES MODALIDADES DE

TRANSPLANTES ................................................................................................................................79

7.1 Assistência de Enfermagem em Transplantes......................................................................79

7.2 Transplante Hepático ..............................................................................................................80

7.3 Transplante Renal...................................................................................................................101

7.4 Transplante Cardíaco .............................................................................................................111

8 A EXPERIÊNCIA DO PACIENTE E DA FAMÍLIA DIANTE DO TRANSPLANTE ...................116

REFERÊNCIAS ..................................................................................................................................119
1 INTRODUÇÃO

O transplante de órgãos há tempos já não é mais considerado como um procedimento


experimental, mas sim como uma intervenção cirúrgica amplamente aceita e recomendada para
o tratamento de doenças degenerativas de órgãos vitais. Graças ao advento de técnicas
4
cirúrgicas e de medicações cada vez mais eficazes no combate à rejeição, os avanços na
Medicina dos transplantes têm crescido paulatinamente e aumentado de modo significativo a
sobrevida dos pacientes transplantados.
Os transplantes podem ser realizados a partir de doadores vivos (denominados
transplantes intervivos) ou doadores falecidos. Dentre os transplantes intervivos podem-se
realizar transplantes de fígado, rim, pulmão e também os de medula óssea, mais ligados ao
ramo da oncologia. Já os transplantes oriundos de doadores falecidos – os mais comumente
realizados – se subdividem em duas categorias: transplantes de doadores falecidos e com
coração parado, em que se doam os tecidos; e de doadores em morte encefálica, conceito que
discutiremos no decorrer do curso, a partir do qual se podem transplantar os órgãos vitais, como
coração, intestino, fígado, rins, etc.

A carência de doadores de órgãos é ainda um grande obstáculo para a efetivação de


transplantes no Brasil. Mesmo nos casos em que o órgão pode ser obtido de um doador vivo, a
quantidade de transplantes é pequena diante da demanda de pacientes que esperam pela
cirurgia. A falta de informação e o preconceito também acabam limitando o número de doações
obtidas de pacientes com morte encefálica. Com a conscientização efetiva da população, o
número de doações pode aumentar de forma significativa. A seguir, veremos um pouco da
história dos transplantes, como começaram e quais avanços foram os alicerces para o
desenvolvimento desta área da Medicina.
2 HISTÓRIA DOS TRANSPLANTES

Desde o início dos tempos, várias lendas e relatos sensacionalistas povoam o


imaginário da população em geral a respeito do transplante. Na Ilíada, de Homero, é descrito o
5
primeiro transplante de tecidos geneticamente diferentes, uma quimera criada pelos deuses. A
lenda de São Cosme e Damião diz que, após a amputação da perna de um velho,
transplantaram nele a perna de um soldado que havia falecido naquele mesmo dia. O termo
transplante foi utilizado pela primeira vez por John Hunter, em 1778, ao descrever seus
experimentos com enxertos ovarianos e testiculares em animais não relacionados.

Em 1902, Ullmann, da Escola de Medicina de Viena, realizou o primeiro


autotransplante de rim nos vasos do pescoço de um cão. Em 1906, Jaboulay, na França, fez
dois xenotransplantes (transplantes entre espécies diferentes), a partir de rins de porco e de
cabra, nos vasos do braço e da coxa de seres humanos, os quais funcionaram por uma hora. Em
1909, Unger, em Berlim, transplantou um rim de macaco para uma criança que sofria de
insuficiência renal aguda. Até este momento, embora demonstrassem que os transplantes de
órgãos sólidos eram possíveis, os diversos pesquisadores observavam que os órgãos muitas
vezes morriam. Tal questionamento ficou aparentemente sem solução até que Guthrier inferiu,
algum tempo mais tarde, que talvez estes fracassos pudessem estar relacionados com algum
tipo de resposta imunológica.

O primeiro alotransplante (transplante entre indivíduos da mesma espécie) renal no


homem foi realizado em 1933 por um cirurgião ucraniano, para tratar uma insuficiência renal
aguda causada por envenenamento por mercúrio. Infelizmente, o rim não funcionou, já que foi
retirado do doador seis horas após a parada cardíaca, e o receptor morreu 48 horas depois. No
início da década de 50, várias séries de transplantes renais em humanos foram realizadas em
Paris e Boston, mas nenhuma droga imunossupressora era utilizada para prevenir a rejeição, e
somente um paciente sobreviveu, por aproximadamente seis meses.

Em 1952, em Paris, Dausset descobriu os antígenos de histocompatibilidade, e em


1954, uma equipe em Boston iniciou o programa de transplante renal com gêmeos HLA
(complexo de histocompatibilidade) idênticos, com bastante sucesso. A partir daí, os avanços na
terapia imunossupressora começaram, culminando com a descoberta da azatioprina como
medicamento imunossupressor importante. Com a azatioprina o transplante renal tornou-se
gradualmente uma opção terapêutica aceitável para casos cuidadosamente selecionados. Com a
adição de esteroides à azatioprina em 1963, foi estabelecido um protocolo padrão de
imunossupressão, que permaneceu assim por quase 20 anos.

Durante este tempo, o aumento crescente da sobrevida dos pacientes transplantados 6


deveu-se principalmente aos seguintes fatores: aprimoramento da técnica cirúrgica; a
constatação de que baixas doses de esteroides são eficazes e mais seguras do que as
administradas anteriormente; e a descoberta de que a transfusão de sangue pré-transplante
reduz as possibilidades de rejeição. A partir daí, os avanços aceleraram gradativamente.

Em 1967, Barnard realizou o primeiro transplante cardíaco ortotópico (em que o


enxerto é colocado no mesmo lugar do órgão que é retirado) no homem, levando a um grande
número de transplantes, realizados geralmente em centros mal equipados para lidar com os
fenômenos da rejeição e cuidados pós-transplante. Consequentemente, os baixos índices de
sobrevida serviram para justificar os argumentos daqueles que se opunham a todos os
transplantes de órgãos.

Os resultados iniciais com os transplantes de fígado também foram desencorajadores.


Starzl e sua equipe, em 1960, desenvolveram técnicas para o transplante de fígado em cães,
mas o primeiro só foi realizado em 1963. Os índices de sobrevivência foram baixos nos primeiros
casos até que, em 1967, uma criança de 18 meses de idade viveu por mais 13 meses antes de
falecer por metástases de seu hepatoma original. No entanto, os resultados eram tão precários
que apenas dois centros persistiram com o transplante de fígado, e tais centros observavam que
os resultados com a imunossupressão utilizada ainda eram inferiores aos de transplantes renais
e cardíacos.

No Brasil, o primeiro transplante foi feito em 1985, no Hospital das Clínicas, em São
Paulo, por Raia e sua equipe, que também realizaram o primeiro transplante intervivos, em 1988.
O transplante de partes do pâncreas para o tratamento de pacientes diabéticos foi sugerido no
início de 1924, mas somente após o uso de uma imunossupressão efetiva é que se investiram
grandes esforços no sentido de tratar o diabetes mellitus por meio do transplante total de
pâncreas. Em 1966, Kelly e equipe fizeram um alotransplante de rim e pâncreas em um paciente
portador de uma nefropatia diabética em fase terminal. Desde então, centenas de transplantes
têm sido realizados com o pâncreas total, parcial ou com ilhotas pancreáticas.

Os problemas relacionados com a rejeição e as dificuldades cirúrgicas, particularmente


em assegurar uma drenagem efetiva das secreções exócrinas, têm desestimulado muitas
equipes em perseverar com o transplante pancreático, após uma má experiência inicial.
Ultimamente, o interesse tem aumentado em função dos melhores resultados obtidos e com o 7
advento de técnicas promissoras de transplante de ilhotas.

Os primeiros experimentos sobre transplante de pulmão foram relatados por Carrel em


1907, mas somente em 1950 foi publicado um trabalho, por Métras, descrevendo uma técnica
cirúrgica desenvolvida com cães. Apesar de vários grupos terem realizado alotransplantes
pulmonares, o sucesso era limitado pela imunossupressão inadequada. O primeiro quadro
clínico foi descrito por Hardy e equipe, em 1963, mas o paciente morreu 18 dias após. Antes de
1980, somente 38 pacientes receberam transplantes de pulmão, e a sobrevivência mais longa foi
de 10 meses. Além da rejeição, os principais problemas em transplantes de pulmão são
principalmente a seleção de doador adequado e a conservação do órgão.

Até 1978, o transplante renal tinha progredido para um estágio em que era evidente a
sua contribuição para o tratamento da insuficiência renal, mas havia dúvidas consideráveis sobre
o futuro dos transplantes de outros órgãos. Felizmente, naquele ano, surge uma nova droga
imunossupressora, a ciclosporina, que se revelou um agente imunossupressor tão potente no
homem quanto já havia sido demonstrado em animais. A ciclosporina revolucionou os
transplantes clínicos em todo o mundo, não somente em termos de aumentar o número de
transplantes e o índice de sobrevida, mas também ao encorajar a comunidade em relação aos
transplantes.

Na década de 80, as retiradas de múltiplos órgãos foram padronizadas, surgiram novos


imunossupressores, tais como os anticorpos monoclonais e o FK-506, e foi desenvolvida, por
Belzer, uma nova solução de conservação de órgãos, levando os resultados de rim, coração,
pulmão e fígado a atingirem uma sobrevida de 80% em dois anos. Esses resultados, já
excepcionais em se tratando de pacientes na maioria das vezes sem outra opção terapêutica,
tendem a melhorar na medida em que os fenômenos imunológicos forem desvendados e
controlados.
Atualmente, no entanto, já podemos dizer que o transplante de órgãos é considerado
uma terapêutica amplamente aceita e recomendada para o tratamento de doenças
degenerativas de órgãos vitais, graças aos avanços anteriormente descritos e aos contínuos
esforços de aprimorar a técnica cirúrgica e a terapia medicamentosa de controle.

8
3 ASPECTOS LEGAIS DOS TRANSPLANTES NO BRASIL

O primeiro transplante de coração no Brasil, realizado pelo professor Zerbini, resultou


na elaboração de um suporte legal para a realização dos futuros transplantes de órgãos no país. 9
Os objetivos básicos dessa legislação eram de resguardar os direitos das pessoas envolvidas,
principalmente do doador, tanto falecido quanto vivo, bem como de garantir a gratuidade da
doação, procurando evitar que órgãos e tecidos fossem vendidos ou que populações vulneráveis
ficassem expostas ao risco de serem coagidas a optar pela decisão de doar, baseadas em
algum benefício financeiro ou material.

Longas análises e reflexões discorreram sobre doadores, receptores e, principalmente,


quanto à definição do diagnóstico da realidade da morte, tendo como pilares resguardar os
direitos do doador e garantir a gratuidade do ato. Considerando que os múltiplos transplantes de
órgãos exigem a vitalidade dos tecidos transplantados, o primeiro grande desafio ético e legal,
apresentado na terapêutica dos transplantes de doadores falecidos, foi a definição do
diagnóstico de morte, uma vez que não mais se poderia firmar unicamente no critério de parada
irreversível dos batimentos cardíacos. Um novo conceito firmou-se: o de morte encefálica, do
qual trataremos em maiores detalhes adiante.

Em 1992, surge a Lei 8.489, de 18 de novembro de 1992, legislação vigente até 04 de


fevereiro de 1997 que, quando revogada, foi substituída pela lei 9.434, posteriormente atualizada
no ano de 2001, resultando na LEI N° 10.211, de 23 de março de 2001, em vigor atualmente. A
principal modificação foi referente à doação, que passou de presumida para consentida. As
alterações estão destacadas no decorrer do texto. Apresentaremos ambas a seguir. A leitura da
legislação em transplantes é de suma importância para compreensão de todo o processo que
envolve a doação de órgãos e tecidos no Brasil.
LEI 9.434, DE 04 DE FEVEREIRO DE 1997

Remoção de Órgãos, Tecidos e Partes do Corpo Humano para fins de Transplante e


Tratamento

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA faz saber que o Congresso Nacional decreta e eu


sanciono a seguinte Lei: 10

CAPÍTULO I - DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

Artigo 1 - A disposição gratuita de tecidos, órgãos e partes do corpo humano, em vida


ou post mortem, para fins de transplante e tratamento, é permitida na forma desta Lei.

Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, não estão compreendidos entre os tecidos a
que se refere este artigo o sangue, o esperma e o óvulo.

Artigo 2 - A realização de transplantes ou enxertos de tecidos, órgãos ou partes do


corpo humano só poderá ser realizada por estabelecimento de saúde, público ou privado, e por
equipes médico-cirúrgicas de remoção e transplante previamente autorizados pelo órgão de
gestão nacional do Sistema Único de Saúde.
Parágrafo único. A realização de transplantes ou enxertos de tecidos, órgãos ou partes do corpo
humano só poderá ser autorizada após a realização, no doador, de todos os testes de triagem
para diagnóstico de infecção e infestação exigidos para a triagem de sangue para doação,
segundo dispõem a Lei n° 7.649, de 25 de janeiro de 1988, e regulamentos do Poder Executivo.

CAPÍTULO II - DA DISPOSIÇÃO POST MORTEM DE TECIDOS, ÓRGÃOS E


PARTES DO CORPO HUMANO PARA FINS DE TRANSPLANTE

Artigo 3 - A retirada post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano


destinados a transplante ou tratamento deverá ser precedida de diagnóstico de morte encefálica,
constatada e registrada por dois médicos não participantes das equipes de remoção e
transplante, mediante a utilização de critérios clínicos e tecnológicos definidos por resolução do
Conselho Federal de Medicina.
1. Os prontuários médicos, contendo os resultados ou os laudos dos
exames referentes aos diagnósticos de morte encefálica e cópias dos documentos de
que tratam os artigos 2, parágrafo único; 4 e seus parágrafos; 5; 7; 9, 2, 4, 6 e 8; e 10,
quando couber, e detalhando os atos cirúrgicos relativos aos transplantes e enxertos,
serão mantidos nos arquivos das instituições referidas no artigo 2 por um período de, no
mínimo, cinco (5) anos.
11
2. As instituições referidas no artigo 2 enviarão anualmente um relatório contendo os
nomes dos pacientes receptores ao órgão gestor estadual do SUS.
3. Será admitida a presença de médico de confiança da família do falecido no ato da
comprovação e atestação da morte encefálica.

Artigo 4 - Salvo manifestação de vontade em contrário, nos termos desta Lei,


presume-se autorizada a doação de tecidos, órgãos ou partes do corpo humano, para
finalidade de transplantes ou terapêutica post mortem -DOAÇÃO PRESUMIDA

1. A expressão “não-doador de órgãos e tecidos” deverá ser gravada, de forma


indelével e inviolável, na Carteira de Identidade Civil e na Carteira Nacional de Habilitação
da pessoa que optar por essa condição.

2. A gravação de que trata este artigo será obrigatória em todo o território


nacional a todos os órgãos de identificação civil e departamentos de trânsito, decorridos
trinta dias da publicação desta Lei.

3. O portador de Carteira de Identidade Civil ou de Carteira Nacional de


Habilitação emitidas até a data a que se refere o parágrafo anterior poderá manifestar sua
vontade de não doar tecidos, órgãos ou partes do corpo após a morte, comparecendo ao
órgão oficial de identificação civil ou departamento de trânsito e procedendo à gravação
da expressão “não-doador de órgãos e tecidos”.

4. A manifestação de vontade feita na Carteira de Identidade Civil ou na Carteira


Nacional de Habilitação poderá ser reformulada a qualquer momento, registrando-se, no
documento, a nova declaração de vontade.
5. No caso de dois ou mais documentos legalmente válidos com opções
diferentes, quanto à condição de doador ou não, do morto, prevalecerá aquele cuja
emissão for mais recente.

6. Na ausência de manifestação de vontade do potencial doador, o pai, a mãe, o


filho ou o cônjuge poderá manifestar-se contrariamente à doação, o que será
obrigatoriamente acatado pelas equipes de transplante e remoção. (incluído pela Medida 12

Provisória 1.718, de 06 de outubro de 1998)

Artigo 5 - A remoção post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo de pessoa


juridicamente incapaz poderá ser feita desde que permitida expressamente por ambos os pais ou
por seus responsáveis legais.

Artigo 6 - É vedada a remoção post mortem de tecidos, órgãos ou partes do corpo de


pessoas não identificadas.

Artigo 7 – Vetado

Parágrafo único - No caso de morte sem assistência médica, de óbito em decorrência


de causa mal definida ou de outras situações nas quais houver indicação de verificação da
causa médica da morte, a remoção de tecidos, órgão ou partes de cadáver para fins de
transplante ou terapêutica somente poderá ser realizada após a autorização do patologista do
serviço de verificação de óbito responsável pela investigação e citada em relatório de necrópsia.

Artigo 8 - Após a retirada de partes do corpo, o cadáver será condignamente


recomposto e entregue aos parentes do morto ou seus responsáveis legais para sepultamento.

CAPÍTULO III - DA DISPOSIÇÃO DE TECIDOS, ÓRGÃOS E PARTES DO CORPO


HUMANO VIVO PARA FINS DE TRANSPLANTE OU TRATAMENTO

Artigo 9 - É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos,


órgãos ou partes do próprio corpo vivo para fins de transplante ou terapêuticos.

1. (VETADO)
2. (VETADO)

3. Só é permitida a doação referida neste artigo quando se tratar de órgãos duplos, de


partes de órgãos, tecidos ou partes do corpo cuja retirada não impeça o organismo do doador de
continuar vivendo sem risco para a sua integridade e não represente grave comprometimento de
suas aptidões vitais e saúde mental e não cause mutilação ou deformação inaceitável, e 13
corresponda a uma necessidade terapêutica comprovadamente indispensável à pessoa
receptora.

4. O doador deverá autorizar, preferencialmente por escrito e diante de testemunhas,


especificamente o tecido, órgão ou parte do corpo objeto da retirada.

5. A doação poderá ser revogada pelo doador ou pelos responsáveis legais a qualquer
momento antes de sua concretização.

6. O indivíduo juridicamente incapaz, com compatibilidade imunológica comprovada,


poderá fazer doação nos casos de transplante de medula óssea, desde que haja consentimento
de ambos os pais ou seus responsáveis legais e autorização judicial e o ato não oferecer risco
para a sua saúde.

7. É vedado à gestante dispor de tecidos, órgãos ou partes de seu corpo vivo, exceto
quando se tratar de doação de tecidos para ser utilizado em transplante de medula óssea e o ato
não oferecer risco à saúde ou ao feto.

8. O autotransplante depende apenas do consentimento do próprio indivíduo,


registrado em seu prontuário médico ou, se ele for juridicamente incapaz, de um de seus pais ou
responsáveis legais.

CAPÍTULO IV - DAS DISPOSIÇÕES COMPLEMENTARES

Artigo 10 - O transplante ou enxerto só se fará com o consentimento expresso do


receptor, após aconselhamento sobre a excepcionalidade e os riscos do procedimento.
Parágrafo único - Nos casos em que o receptor seja juridicamente incapaz ou cujas
condições de saúde impeçam ou comprometam a manifestação válida de sua vontade, o
consentimento de que trata este artigo será dado por um de seus pais ou responsáveis legais.

Artigo 11 - É proibida a veiculação, através de qualquer meio de comunicação social,


de anúncio que configure:
14
a) publicidade de estabelecimentos autorizados a realizar transplantes e enxertos,
relativa a estas atividades;

b) apelo público no sentido da doação de tecido, órgão ou parte do corpo humano para
pessoa determinada, identificada ou não, ressalvado o disposto no parágrafo único;

c) apelo público para a arrecadação de fundos para o financiamento de transplante ou


enxerto em benefício de particulares.

Parágrafo único - os órgãos de gestão nacional, regional e local do Sistema Único de


Saúde realizarão periodicamente, através dos meios adequados de comunicação social,
campanhas de esclarecimento público dos benefícios esperados a partir da vigência desta Lei e
de estímulo à doação de órgãos.

Artigo 12 - (VETADO)

Artigo 13 - É obrigatório, para todos os estabelecimentos de saúde, notificar, às


centrais de notificação, captação e distribuição de órgãos da unidade federada onde ocorrer, o
diagnóstico de morte encefálica feito em pacientes por eles atendidos.

CAPÍTULO V - DAS SANÇÕES PENAIS E ADMINISTRATIVAS

Seção I - Dos Crimes

Artigo 14 - Remover tecidos, órgãos ou partes do corpo de pessoa ou cadáver, em


desacordo com as disposições desta Lei:
Pena - reclusão, de dois a seis anos, e multa, de 100 a 360 dias-multa.
1. Se o crime é cometido mediante paga ou promessa de recompensa ou por outro
motivo torpe:

Pena - reclusão, de três a oito anos, e multa, de 100 a 150 dias-multa.

2. Se o crime é praticado em pessoa viva, e resulta para o ofendido:

15
I - incapacidade para as ocupações habituais, por mais de trinta dias;

II - perigo de vida;

III - debilidade permanente de membro, sentido ou função;

IV - aceleração de parto:

Pena - reclusão, de três a dez anos, e multa, de 100 a 200 dias-multa.

3. Se o crime é praticado em pessoa viva, e resulta para o ofendido:

I - incapacidade permanente para o trabalho;

II - enfermidade incurável;

III - perda ou inutilização de membro, sentido ou função;

IV - deformidade permanente;

V – aborto;

Pena - reclusão, de quatro a doze anos, e multa, de 150 a 300 dias-multa.

4. Se o crime é praticado em pessoa viva e resulta morte:

Pena - reclusão, de oito a vinte anos, e multa de 200 a 360 dias-multa.

Artigo 15 - Comprar ou vender tecidos, órgãos ou partes do corpo humano:


Pena - reclusão de três a oito anos, e multa, de 200 a 360 dias-multa.

Parágrafo único - Incorre na mesma pena quem promove, intermedeia, facilita ou


aufere qualquer vantagem com a transação.

Artigo 16 - Realizar transplante ou enxerto utilizando tecidos, órgãos ou partes do


corpo humano de que se tem ciência terem sido obtidos em desacordo com os dispositivos desta 16

Lei:

Pena - reclusão, de um a seis anos, e multa, de 150 a 300 dias-multa.

Artigo 17 - Recolher, transportar, guardar ou distribuir partes do corpo humano de que


se tem ciência terem sido obtidos em desacordo com os dispositivos desta Lei:

Pena - reclusão, de seis meses a dois anos, e multa de 100 a 250 dias-multa.

Artigo 18 - Realizar transplante ou enxerto em desacordo com o disposto no art. 10


desta Lei e seu parágrafo único:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos.

Artigo 19 - Deixar de recompor cadáver, devolvendo-lhe aspecto condigno, para


sepultamento ou deixar de entregar ou retardar sua entrega aos familiares ou interessados:

Pena - detenção, de seis meses a dois anos.

Artigo 20 - Publicar anúncio ou apelo público em desacordo com o disposto no artigo


11:

Pena - multa, de 100 a 200 dias-multa.

Seção II - Das Sanções Administrativas


Artigo 21 - No caso dos crimes previstos nos artigos 14, 15, 16 e 17, o
estabelecimento de saúde e as equipes médico-cirúrgicas envolvidas poderão ser
desautorizadas temporária ou permanentemente pelas autoridades competentes.

1. Se a instituição é particular, a autoridade competente poderá multá-la em 200 a 360 dias-


multa e, em caso de reincidência, poderá ter suas atividades suspensas temporária ou
17
definitivamente, sem direito a qualquer indenização ou compensação por investimentos
realizados.

2. Se a instituição é particular, é proibida de estabelecer contratos ou convênios com


entidades públicas, bem como se beneficiar de créditos oriundos de instituições governamentais
ou daquelas em que o Estado é acionista, pelo prazo de cinco anos.

Artigo 22 - As instituições que deixarem de manter em arquivo relatórios dos


transplantes realizados, conforme o disposto no artigo 3, 1., ou que não enviarem os relatórios
mencionados no artigo 3, 2., ao órgão de gestão estadual do Sistema Único de Saúde, estão
sujeitas a multa, de 100 a 200 dias-multa.

1. Incorre na mesma pena o estabelecimento de saúde que deixar de fazer as


notificações previstas no art. 13.

2. Em caso de reincidência, além de multa, o órgão de gestão estadual do Sistema


Único de Saúde poderá determinar a desautorização temporária ou permanente da instituição.

Artigo 23 - Sujeita-se às penas do artigo 59 da Lei n° 4.117, de 27 de agosto de 1962,


a empresa de comunicação social que veicular anúncio em desacordo com o disposto no artigo
11.

CAPÍTULO VI - DAS DISPOSIÇÕES FINAIS

Artigo 24 - (VETADO)

Artigo 25 - Revogam-se as disposições em contrário, particularmente a Lei n° 8.489,


de 18 de novembro de 1992, e o Decreto n° 879, de 22 de julho de 1993.
Brasília, 4 de fevereiro de 1997; 176° da Independência e 109° da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

Nelson A. Jobim

Carlos César de Albuquerque


18

LEI N° 10.211, DE 23 de março de 2001

Altera dispositivos da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, que "dispõe sobre a


remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento".

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA

Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

CAPÍTULO I

DAS DISPOSIÇÕES GERAIS

"Art. 1º Os dispositivos adiante indicados, da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de 1997,


passam a vigorar com a seguinte redação:

"Art. 2º ......................................................................

"Parágrafo único. A realização de transplantes ou enxertos de tecidos, órgãos e


partes do corpo humano só poderá ser autorizada após a realização, no doador, de todos
os testes de triagem para diagnóstico de infecção e infestação exigidos em normas
regulamentares expedidas pelo Ministério da Saúde." (NR)

"Art. 4º A retirada de tecidos, órgãos e partes do corpo de pessoas falecidas para


transplantes ou outra finalidade terapêutica, dependerá da autorização do cônjuge ou
parente, maior de idade, obedecida a linha sucessória, reta ou colateral, até o segundo
grau inclusive, firmada em documento subscrito por duas testemunhas presentes à
verificação da morte”. (NR) - DOAÇÃO CONSENTIDA

"Parágrafo único. (VETADO)"

"Art. 8º Após a retirada de tecidos, órgãos e partes, o cadáver será imediatamente


necropsiado, se verificada a hipótese do parágrafo único do art. 7º, e, em qualquer caso, 19
condignamente recomposto para ser entregue, em seguida, aos parentes do morto ou seus
responsáveis legais para sepultamento." (NR)

"Art. 9º É permitida à pessoa juridicamente capaz dispor gratuitamente de tecidos,


órgãos e partes do próprio corpo vivo, para fins terapêuticos ou para transplantes em cônjuge ou
parentes consanguíneos até o quarto grau, inclusive, na forma do §4º deste artigo, ou em
qualquer outra pessoa, mediante autorização judicial, dispensada esta em relação à medula
óssea.

........................................................................." (NR)

"Art. 10. O transplante ou enxerto só se fará com o consentimento expresso do


receptor, assim inscrito em lista única de espera, após aconselhamento sobre a
excepcionalidade e os riscos do procedimento." (NR)

"§ 1º Nos casos em que o receptor seja juridicamente incapaz ou cujas condições de
saúde impeçam ou comprometam a manifestação válida da sua vontade, o consentimento de
que trata este artigo será dado por um de seus pais ou responsáveis legais." (NR)

"§ 2º A inscrição em lista única de espera não confere ao pretenso receptor ou à sua
família direito subjetivo a indenização, se o transplante não se realizar em decorrência de
alteração do estado de órgãos, tecidos e partes, que lhe seriam destinados, provocado por
acidente ou incidente em seu transporte." (NR)

Art. 2º As manifestações de vontade relativas à retirada "post mortem" de tecidos,


órgãos e partes, constantes da Carteira de Identidade Civil e da Carteira Nacional de Habilitação,
perdem sua validade a partir de 22 de dezembro de 2000.
Art. 3º Ficam convalidados os atos praticados com base na Medida Provisória nº
2.083-32, de 22 de fevereiro de 2001.

Art. 4º Ficam revogados os §§ 1º a 5º do art. 4º da Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de


1997.

Art. 5º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. 20

Brasília, 23 de março de 2001; 180º da Independência e 113º da República.

FERNANDO HENRIQUE CARDOSO

José Gregori

José Serra
4 POLÍTICAS PÚBLICAS DE TRANSPLANTES

Para o desenvolvimento da Medicina de Transplantes no Brasil foi criado o Sistema


Nacional de Transplantes (SNT), que tem como objetivos organizar o processo de captação e 21
distribuição de tecidos, órgãos e partes retiradas do corpo humano para finalidades terapêuticas.
Seu funcionamento foi estabelecido por meio do Decreto Nº 2.268, de 30 de junho de 1997 -
DOU 123, de 01.07.97, que regulamenta a Lei n° 9.434, de 4 de fevereiro de 1997, que dispõe
sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e
tratamento, já vista anteriormente.

Integram o SNT o Ministério da Saúde, as Secretarias de Saúde dos Estados e do


Distrito Federal ou órgãos equivalentes, as Secretarias de Saúde dos Municípios ou órgãos
equivalentes, os estabelecimentos hospitalares autorizados, e a rede de serviços auxiliares
necessários à realização de transplantes.

Quanto às atribuições do SNT, são elas:

 Coordenar as atividades previstas pelo decreto anteriormente


mencionado;
 Expedir normas e regulamentos técnicos para disciplinar os
procedimentos estabelecidos e para assegurar o funcionamento ordenado e harmônico
do SNT e o controle, inclusive social, das atividades que desenvolve;
 Gerenciar a lista única nacional de receptores, com todas as indicações
necessárias à busca, em todo o território nacional, de tecidos, órgãos e partes
compatíveis com as suas condições orgânicas;
 Autorizar estabelecimentos de saúde e equipes especializadas a
promover retiradas, transplantes ou enxertos de tecidos, órgãos e partes;
 Avaliar o desempenho do SNT, mediante análise de relatórios recebidos
dos órgãos estaduais e municipais que o integram;
 Articular-se com todos os integrantes do SNT para a identificação e
correção de falhas verificadas no seu funcionamento;
 Difundir informações e iniciativas bem sucedidas, no âmbito do SNT, e
promover intercâmbio com o exterior sobre atividades de transplantes;
 Credenciar centrais de notificação, captação e distribuição de órgãos
nos diferentes Estados do país.

As Secretarias de Saúde dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios ou órgãos


equivalentes, para que se integrem ao SNT, devem instituir, na respectiva estrutura 22

organizacional, as chamadas Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos


(CNCDOs). As CNCDOs são as unidades executivas das atividades do SNT. Suas incumbências
são:

 Coordenar as atividades de transplantes no âmbito estadual;


 Promover a inscrição de potenciais receptores, com todas as indicações
necessárias à sua rápida localização e à verificação de compatibilidade do respectivo
organismo para o transplante ou enxerto de tecidos, órgãos e partes disponíveis, de que
necessite;
 Classificar os receptores e agrupá-los, em ordem estabelecida pela data
de inscrição, fornecendo-lhes o necessário comprovante;
 Comunicar ao órgão central do SNT as inscrições que efetuar para a
organização da lista nacional de receptores;
 Receber notificações de morte encefálica ou outra que enseje a retirada
de tecidos, órgãos e partes para transplante, ocorrida em sua área de atuação;
 Determinar o encaminhamento e providenciar o transporte de tecidos,
órgãos e partes retirados ao estabelecimento de saúde autorizado, em que se encontrar
o receptor ideal;
 Notificar o órgão central do SNT de tecidos, órgãos e partes não
aproveitáveis entre os receptores inscritos em seus registros, para utilização dentre os
relacionados na lista nacional;
 Encaminhar relatórios anuais ao órgão central do SNT sobre o
desenvolvimento das atividades de transplante em sua área de atuação;
 Exercer controle e fiscalização sobre as atividades de transplantes em
sua área de atuação.
A política de transplante no Brasil defende que a retirada de tecidos, órgãos e partes e
o seu transplante ou enxerto só podem ser realizados por equipes especializadas e em
estabelecimentos de saúde, públicos ou privados, prévia e expressamente autorizados pelo
Ministério da Saúde. Para isso, os estabelecimentos de saúde devem contar com serviços e
instalações adequados à execução de retirada, transplante ou enxerto de tecidos, órgãos ou
partes, atendidas, no mínimo, as seguintes exigências, comprovadas no requerimento de
23
autorização:

 Atos constitutivos, com indicação da representação da instituição, em


juízo ou fora dele;
 Ato de designação e posse da diretoria;
 Equipes especializadas de retirada, transplante ou enxerto, com vínculo
sob qualquer modalidade contratual ou funcional, autorizadas conforme disposições
apresentadas no Decreto;
 Disponibilidade de pessoal qualificado e em número suficiente para
desempenho de outras atividades indispensáveis à realização dos procedimentos;
 Condições necessárias de ambientação e de infraestrutura operacional;
 Capacidade para a realização de exames e análises laboratoriais
necessários aos procedimentos de transplantes;
 Instrumental e equipamento indispensáveis ao desenvolvimento da
atividade a que se proponha.

A composição das equipes especializadas deve ser determinada em função do


procedimento, mediante integração de profissionais autorizados; é exigido, no caso de
transplante, a definição, em número e habilitação, de profissionais necessários à realização do
procedimento, não podendo a equipe funcionar na falta de algum deles. Além da necessária
habilitação profissional, os médicos devem instruir o pedido de autorização com certificado de
pós-graduação, em nível, no mínimo, de residência médica ou título de especialista reconhecido
no País, e certidão negativa de infração ética, passada pelo órgão de classe em que forem
inscritos.

Como funcionam as Centrais de Transplantes:


1. O receptor preenche uma ficha e faz exames para determinar suas características
sanguíneas, da estatura física e antigênicas (no caso dos rins);

2. Os dados são organizados em um programa de computador. A ordem cronológica é


usada principalmente como critério de desempate;

3. Quando aparece um órgão, ele é submetido a exames e os resultados são enviados


para o computador;
24
4. O programa faz o cruzamento entre os dados de doador e receptor e apresenta dez
opções mais compatíveis com o órgão;

5. Os dez pacientes não são identificados pelo nome para evitar favorecimento. Só
suas iniciais e números são mostrados. Nesta etapa, todos os profissionais da central têm
acesso ao cadastro;

6. O laboratório refaz vários exames e realiza outros novos com material armazenado
desse receptor. Nesse momento, o receptor ainda não é comunicado;

7. A nova bateria de exames aponta o receptor mais compatível. Nessa etapa, o


acesso ao cadastro fica restrito à chefia da central;

8. O médico do receptor é contatado para responder sobre o estado de saúde do


receptor. Se não estiver apto para receber o transplante, o processo recomeça;

9. O receptor é contatado e decide se deseja o transplante e em que hospital fará a


cirurgia.

Como funciona o sistema de captação de órgãos

1) Identificação do potencial doador:

Um doador em potencial é um paciente com morte encefálica, internado em hospital


sob cuidados intensivos. Nesse período, é informada à família a possibilidade de doação dos
órgãos. Caso a família concorde com a doação, viabiliza-se a remoção dos órgãos depois que o
diagnóstico de morte encefálica se confirmar. A notificação deste diagnóstico é OBRIGATÓRIA
POR LEI. O diagnóstico de morte encefálica passa por algumas etapas, que serão descritas em
detalhe no próximo módulo. Cabe ressaltar que nenhum dos médicos responsáveis pelo
diagnóstico de morte encefálica pode fazer parte de equipe transplantadora.

2) Notificação

O hospital notifica a Central de Transplantes sobre um paciente com suspeita de morte


encefálica (potencial doador). No Estado de São Paulo, a captação se faz de forma regionalizada
25
– a Central de Transplantes repassa a notificação para uma OPO (Organização de Procura de
Órgão) que cobre a região do hospital notificador. Nos demais Estados, tal função cabe à
CNCDO correspondente.

3) Avaliação

A OPO ou a Central de Transplantes se dirige ao Hospital e avalia o doador com base


na sua história clínica, antecedentes médicos e exames laboratoriais. Avalia-se a viabilidade dos
órgãos, bem como a sorologia para afastar doenças infecciosas e teste de compatibilidade com
prováveis receptores. A família é abordada sobre a doação e também pode autorizar a remoção
do paciente para o hospital da OPO, que muitas vezes tem mais condições para uma melhor
manutenção.

4) Informação do doador efetivo

A OPO informa a Central de Transplantes quando o doador já tem toda a sua avaliação
completa e o mesmo é viável. São passadas todas as informações colhidas, resultados de
exames, peso, altura, medicações em uso, condições hemodinâmicas atuais, bem como local e
hora marcada para a extração dos órgãos.

5) Seleção dos receptores

Todo paciente que precisa de transplante é inscrito na Lista Única de Receptores do


Sistema Nacional de Transplantes do Ministério da Saúde (cuja ordem é seguida com rigor, sob
supervisão do Ministério Público), por uma equipe responsável pelo procedimento do
transplante. A partir desse cadastro, a Central de Transplantes emite uma lista de receptores
inscritos, compatíveis para o doador; no caso dos rins deve-se fazer ainda uma nova seleção por
compatibilidade imunológica ou histológica.
6) Identificação das equipes transplantadoras

A Central de Transplantes informa a equipe de transplante sobre a existência do


doador e qual paciente receptor foi nomeado. Cabe à equipe decidir sobre a utilização ou não
deste órgão, uma vez que é o médico o conhecedor do estado atual e condições clínicas de seu
paciente.
26
7) Os órgãos

As equipes fazem a extração no hospital onde se encontra o doador, em centro


cirúrgico, respeitando todas as técnicas de assepsia e preservação dos órgãos. Terminado o
procedimento, as equipes se dirigem para seus hospitais de origem para procederem ao
transplante.

8) Liberação do corpo

O corpo é entregue à família condignamente recomposto, sendo fornecida toda


orientação necessária.
DESCRIÇÃO DAS ETAPAS:

1- Hospital notifica a Central de Transplantes sobre um paciente com morte


encefálica (doador);

2 - Central de Transplantes repassa a notificação para a OPO (Organização de


Procura de Órgão);
27

3 - OPO contata o Hospital e viabiliza o doador;

4 - OPO informa a Central de Transplantes se o doador é viável;

5 - Central de Transplantes emite a lista de receptores e encaminha para o


Laboratório de Imunogenética (apenas para o Rim);

6 - Laboratório de Imunogenética realiza "crossmatch" e informa para a Central de


Transplantes;

7 - Central de Transplantes com a lista definitiva dos receptores para cada órgão,
informa as Equipes de Transplante;

8 - Equipes de Transplante realizam os transplantes.


5 O DOADOR DE ÓRGÃOS - ASPECTOS GERAIS DOS TRANSPLANTES

5.1 O Doador de Órgãos


28

 O doador

Os doadores de órgãos podem pertencer a uma das seguintes categorias:

 Doadores com coração “batendo”: doador com morte encefálica, doador


vivo relacionado, doador vivo não-relacionado, doador anencefálico.
 Doadores com coração “parado”.
 Animais.

Atualmente, como vemos constantemente divulgado nos meios de comunicação, o


mais importante doador de órgãos para transplante tem sido o portador de morte encefálica. A
falha no reconhecimento ou o reconhecimento tardio do portador de morte encefálica pode levar
à perda de órgãos devido à parada cardiorrespiratória inesperada, instabilidade hemodinâmica
ou infecção.

A grande maioria dos portadores de morte encefálica é constituída por pacientes


vítimas de problemas cerebrais: traumatismo cranioencefálico, hemorragia subaracnoide,
neoplasias cerebrais não-metastatizantes ou isquemia cerebral. A decisão de interromper o
tratamento do paciente portador de lesão cerebral grave e iniciar o suporte para doador potencial
de órgãos é difícil, tanto do ponto de vista conceitual quanto do ponto de vista ético. Apesar
dessas dificuldades, deve ser considerado doador potencial de órgãos todo paciente cuja
terapêutica orientada para o cérebro foi avaliada como ineficaz ou a morte encefálica já ocorreu.
Critérios Gerais e Específicos para a Doação de Órgãos

A seguir, apresento dois quadros com os critérios de exclusão de doador de órgãos e


critérios para doação de órgãos específicos.

29

Critérios de exclusão do doador Exemplos

Infecção Sepse bacteriana ou fúngica

Hepatite ou encefalite viróticas

AIDS

Infecção ativa por citomegalovírus ou infecção


hepática sistêmica

Tuberculose ativa

Sífilis

Doença de Chagas

Uso habitual de drogas endovenosas

Malignidade Exceto tumores primários do SNC ou carcinomas de


pele ou cervical localizados, sem metástase

Traumatismo direto do órgão

Órgão a ser doado Critérios

Córneas Idade: 1-65 anos

História pregressa negativa para cirurgia ou doença


intraocular

Retirada ideal até seis horas após parada circulatória

Rins Idade: 1 mês a 75 anos

História negativa para doença renal

Perfusão renal adequada

30
Débito urinário adequado

Fígado Idade: menor ou igual a 75 anos

Peso e altura do doador satisfatórios

Provas de função hepática normais

Ausência de etilismo

Coração Idade: menor ou igual a 60 anos

Altura e peso do doador satisfatórios

RX de tórax e ECG normais

Parada cardíaca não prolongada

Doses baixas de agentes inotrópicos positivos

Coração/Pulmão Mesmos critérios para o coração, somando:

Trauma ou infecção pulmonar ausentes

Ventilação artificial menor do que 24 horas, se


possível

Diâmetro torácico do receptor adequado

Ausência de tabagismo

Pâncreas Idade menor ou igual a 65 anos

Amilase plasmática normal


História familiar negativa para diabetes mellitus

Os prováveis doadores de órgãos devem ser submetidos a uma avaliação laboratorial,


resumida a seguir:

 Sorologias: VDRL, HBsAG, Anti-HCV, citomegalovírus, doença de


Chagas, HLA.
31
 Bioquímica: Sódio, cloro, potássio, cálcio, fósforo, glicose, creatinina,
provas de função hepática.
 Hematologia: hemograma, tempo de protrombina, tempo de
tromboplastina parcial, contagem de plaquetas, grupo sanguíneo ABO.
 Bacteriologia: Gram e cultura de escarro, urocultura, hemoculturas.

 Morte Encefálica

Durante as últimas três décadas, os avanços tecnológicos, como equipamentos


sofisticados mantenedores da atividade respiratória, ressuscitadores cardíacos e a alimentação
parenteral em UTI, possibilitaram o prolongamento da vida por tempo indeterminado, criando-se,
assim, possibilidades de uma nova situação, antes completamente impensada: “Um encéfalo
morto e um coração vivo.”

O crescente sucesso dos programas de transplantes de órgãos e tecidos levou a


Comunidade Científica Mundial a discutir e adotar o princípio de que a morte da pessoa ocorre
quando o encéfalo falha irreversivelmente em suas funções, e atualmente o conceito de morte
encefálica é aceito no Brasil e na maioria dos países como sendo a morte do indivíduo, visto que
a função de todo encéfalo representa mais exatamente a vida do que a função cardiovascular
persistente sem nenhuma função encefálica.

Conceituação
De acordo com a Comissão para os Estudos dos Problemas Éticos na Pesquisa
Comportamental Médica e Biomédica, Morte Encefálica (ME) é um quadro clínico num paciente
portador de doença estrutural ou metabólica conhecida, de caráter completa e indubitavelmente
irreversível, expressando falência total de todas as funções de todo o encéfalo, inclusive do
tronco encefálico, quadro clínico este que persiste de maneira invariável por um período mínimo
de seis horas. Portanto, a morte encefálica consiste na parada total e irreversível das
32
atividades do encéfalo.

É importante diferenciar a morte encefálica da morte cerebral; nesta, partes ou todo o


tronco encefálico (mesencéfalo, ponte e bulbo) e ainda o cerebelo podem funcionar, sendo
chamada esta condição de estado vegetativo persistente, ou morte neocortical.

Diagnóstico

É necessário que se comunique à família o início do procedimento de diagnóstico, e


deve-se permitir a presença do médico da família na realização do procedimento.

1. Critérios Clínicos

O diagnóstico de morte encefálica (ME) é baseado em dados obtidos através da


anamnese, exame clínico e exames laboratoriais:

 Paciente com doença estrutural ou metabólica conhecida e irreversível,


na ausência de intoxicação exógena recente, uso de depressores do SNC, bloqueio
neuromuscular e/ou hipotermia primária, na certeza de que todas as medidas de proteção
encefálica já tenham sido realizadas (metabólicas, hemodinâmicas, etc).
A causa do coma deve ser estabelecida desde o início. A ME ocorre quando o encéfalo
se lesa por intermédio de agentes físicos ou químicos, porém os resultados finais de agressão
são os mesmos: anoxia tecidual bloqueando a produção de energia cerebral nas mitocôndrias.

 Perda da função de todo o encéfalo, inclusive do tronco encefálico,


33
levando a um estado permanente de inconsciência. O paciente em ME apresenta-se em coma
profundo, aperceptivo, com arreatividade comportamental e/ou reflexa a estímulos nociceptivos
aplicados em níveis acima do forame magno.

 A Escala de Coma de Glasgow-Liege = 3, ou seja: não abre os olhos


nem apresenta resposta verbal, mesmo aos estímulos dolorosos intensos, nem apresenta
resposta motora, a não ser através dos reflexos medulares; não apresenta nenhuma resposta
integrada no tronco encefálico. O paciente não apresenta reflexo corneano, de vômito, faríngeo,
ou de resposta reflexa à estimulação brônquica por cateter de aspiração introduzido até a
traqueia; a função do nervo vago também pode ser testada mediante observação de frequência
cardíaca após a aplicação de uma injeção endovenosa de 0,04 mg/kg de sulfato de atropina; a
inatividade do núcleo dorsal do vago é inferida, caso não se observe alteração alguma da
frequência que, no indivíduo sadio, causaria uma bradicardia.

 Positividade ao teste da apneia: o teste da apneia deve ser efetuado


após todos os reflexos dos nervos cranianos terem sido verificados e estavam ausentes, pois os
valores elevados de PaCO2 podem aumentar a pressão intracraniana, comprometendo uma
função encefálica residual. Quando o paciente é desconectado do respirador por tempo
suficiente para que a tensão arterial de dióxido de carbono se eleve acima do limiar de
estimulação respiratória, não devem ocorrer movimentos respiratórios; uma oxigenação
adequada deve ser mantida durante o teste se o paciente for ventilado em 100% de 02 por cinco
minutos, antes da realização do mesmo, e um fluxo de 2 de 4 a 6 l/mm for distribuído através do
tubo endotraqueal, enquanto o ventilador estiver desligado. Isto é particularmente importante nos
doadores de órgãos.

2. Exames Laboratoriais
Embora na opinião da maioria dos autores a ME possa ser diagnosticada unicamente
através de critérios clínicos, recomenda-se a confirmação dos achados clínicos por um exame
complementar que evidencie a ausência de fluxo sanguíneo e/ou de eletrogênese encefálicos.
Tais exames podem ser:

34
 Angiografia cerebral;
 Mapeamento cerebral por radionuclídeo, que consiste na injeção
endovenosa de 99mTc, que passa através da circulação cervical para dentro do crânio;
a ausência de circulação intracraniana é confirmatória de ME;
 Eletroencefalograma (EEG), que é o exame mais prático e o mais
difundido;
 Estudo dos potenciais evocados do tronco encefálico.

Princípios a Serem Observados no Diagnóstico de Morte Encefálica

Quanto à realização dos testes devem estar presentes 2 médicos no mínimo, sendo
um deles necessariamente especialista em Neurologia. É proibida a participação dos médicos
integrantes da equipe especializada em captação de órgãos e transplante em qualquer etapa do
diagnóstico de ME.

Período de observação

Se no final da avaliação há evidências de ME, deve-se aguardar um período mínimo de


observação para uma segunda avaliação (exame clínico e, se necessário, complementar) para
se fazer o atestado, de acordo com as seguintes faixas etárias:
 De 7 dias a 2 meses incompletos - 48 horas;
 De 2 meses a 1 ano incompleto - 24 horas;
 De 1 ano a 2 anos incompletos - 12 horas;
 Acima de 2 anos - 06 horas.

Os exames complementares a serem observados para constatação de ME deverão 35


demonstrar, de forma inequívoca:

 Ausência de atividade elétrica cerebral ou,


 Ausência de atividade metabólica cerebral ou
 Ausência de perfusão sanguínea cerebral.

O atestado também deve ser feito por dois médicos capacitados e que não estejam
envolvidos em equipes de transplantes. A terapia contínua após a expedição de um atestado de
ME só se justifica na preservação de órgãos para transplantes ou quando se tratar de uma
paciente grávida com um feto viável. O atestado de ME equivale a um atestado de óbito e a data
documentada por esse atestado é considerada a data do óbito a ser usada para todos os
procedimentos médicos e legais.

 Assistência de Enfermagem ao Potencial Doador Falecido

O reconhecimento e a manutenção dos potenciais doadores estão entre os grandes


desafios enfrentados pelas equipes que atuam em terapia intensiva. Neles estão implicadas
questões de cunho ético e legal, questões afetivas que envolvem a família e a equipe numa
situação extremamente delicada e desgastante e ainda questões técnicas relativas à adequada
condução desses potenciais doadores, vivos ou falecidos.

Em caso de doadores em morte encefálica, os doadores chamados falecidos, o


objetivo da assistência de enfermagem é minimizar a perda de órgãos transplantáveis decorrente
da parada cardíaca e morte, da instabilidade hemodinâmica, de infecções nosocomiais ou
complicações relacionadas com a terapia intensiva.

Inicialmente o potencial doador é extensivamente avaliado do ponto de vista clínico e


laboratorial bem como em relação à determinação do grupo sanguíneo, peso, altura, idade,
doença de base e história clínica pregressa, informações indispensáveis inclusive para as
equipes de captação de órgãos. 36

Após a constatação da morte encefálica (através de exames clínicos e


complementares, já anteriormente discutidos) e obtido consentimento para doação, o objetivo do
tratamento passa a ser direcionado para a preservação da função dos órgãos e a otimização da
oferta de oxigênio para os tecidos. Nesta fase, novos exames possibilitarão a detecção de
condições que eventualmente possam contraindicar a doação.

A manutenção da estabilidade hemodinâmica do doador na UTI é fundamental, uma


vez que o sucesso do transplante é também baseado primariamente na recuperação segura de
enxertos de alta qualidade. Rigorosas medidas de suporte ao doador devem ser instituídas com
a finalidade de favorecer adequada perfusão dos tecidos até a retirada dos órgãos. As alterações
fisiopatológicas que acompanham o quadro de morte encefálica isoladamente ou em associação
a lesões induzidas pelo fator etiológico deste evento são expressas nas inúmeras complicações
detectadas no doador. Assim, na abordagem deste paciente, avaliações e intervenções
dinâmicas da enfermagem devem estar direcionadas para estas manifestações.

As principais medidas de avaliação e intervenção de enfermagem dirigidas ao doador


falecido são apresentadas no quadro a seguir.
INTERVENÇÃO DE ENFERMAGEM JUSTIFICATIVA

Realizar mudanças de decúbito a intervalos Prevenção de úlceras de pressão e


regulares atelectasias.

* A restrição relativa a este cuidado se aplica


às situações de extrema labilidade
37
hemodinâmica do doador.

Instalar sonda gástrica Favorecer a descompressão gástrica e


prevenir aspirações.

Instalar cateter vesical de demora A mensuração e a monitoração do débito


urinário horário permitem a avaliação da
função renal. Um débito urinário entre 1-2
ml/kg/h refletem adequada perfusão renal.

Obtenção de acesso venoso central Possibilita a monitorização da PVC,


indispensável como um guia para a adequada
reposição volêmica. Os valores da PVC devem
ser mantidos entre 8 a 10 mmHg.

Obtenção de acesso arterial Permite a monitorização da Pressão Arterial


Média (PAM) e coleta de amostras sanguíneas.

Obtenção de outros acessos venosos Além do acesso venoso central, é desejável a


presença de pelo menos um acesso venoso
periférico, para reposição volêmica,
administração de drogas vasoativas,
hemoderivadas e medicamentos, evitando
inclusive a administração simultânea de
soluções incompatíveis.

Monitorização eletrocardiográfica Indispensável na detecção e no diagnóstico de


arritmias cardíacas. As alterações do ritmo
cardíaco na ME podem ser atribuídas a
múltiplos fatores: distúrbios eletrolíticos,
hipovolemia, hipotensão, hipotermia e
hipoxemia entre outros.

* Na parada cardíaca, ocorrência presente em


aproximadamente 25% dos doadores em ME,
estão indicadas as manobras avançadas de
reanimacão. Deve ser reforçada para toda a
38
equipe a importância do diagnóstico precoce
da condição de parada cardíaca e a instituição
imediata da ventilação e das compressões
torácicas, com o intuito de manter os órgãos
perfundidos e prevenir os efeitos adversos da
acidose.

Monitorização e avaliação de parâmetros vitais Pulso, saturação de oxigênio, PA, PVC, PAP e
e hemodinâmicos a intervalos regulares. PCP. A manutenção de uma PA sistólica entre
100-120 mmHg é considerado suficiente para
manter a adequada perfusão dos tecidos.

Reposição rigorosa das perdas volêmicas. Manter a PVC no nível considerado ideal. Na
persistência da hipotensão, drogas vasoativas
estão indicadas e sua administração deverá
ser rigorosamente controlada, seus efeitos
detectados e comunicados.

Detecção de alterações sugestivas de diabetes Esta condição patológica, presente em


insipidus aproximadamente 80% dos pacientes em ME,
exibe sinais clínicos que devem ser
prontamente detectados e comunicados:
poliúria, baixa densidade urinária. A reposição
do débito urinário horário e a correção dos
distúrbios metabólicos e eletrolíticos são
habitualmente necessárias.

Pesquisa da glicosúria e da glicemia capilar a Auxilia na detecção rápida da hiperglicemia e


intervalos regulares seu controle é fundamental na prevenção da
cetoacidose e diurese osmótica, situações que
podem dificultar o manuseio dos doadores.

Manutenção da oxigenação e da ventilação Promover adequada oxigenação de todos os


órgãos. A intubação traqueal e a ventilação
mecânica favorecem adequada ventilação
alveolar e facilitam a higiene broncopulmonar,
39
possibilitando uma efetiva troca gasosa. Os
cuidados respiratórios devem estar cercados
das medidas usuais de assepsia. A Pressão
Positiva Expiratória (PEEP) é útil para
promover a re-expansão de unidades
alveolares colapsadas e na prevenção de
microatelectasias. Outros parâmetros
ventilatórios devem ser objeto de avaliação e
vigilância constante pela equipe de
Enfermagem.

Manutenção da temperatura corporal A mensuração a intervalos regulares da


temperatura corporal (axilar, via sensores de
temperatura esofágicos, retais ou através do
cateter de Swan-Ganz) deve ser realizada
como cuidado de enfermagem de rotina nos
potenciais doadores. É desejável a
manutenção da temperatura corporal acima de
35 graus, sendo inclusive este limite inferior de
temperatura uma das condições exigidas para
realização dos exames neurológicos para o
diagnóstico de morte encefálica.

* Os efeitos deletérios da hipotermia como


exacerbação da acidose metabólica,
depressão miocárdica, aumento do consumo
de oxigênio, disfunção renal, indução de
arritmias, coagulopatias, devem ser evitados
pelas consequências indesejáveis na
preservação dos órgãos do doador. Medidas
de aquecimento artificiais devem ser
empregadas: colchão térmico, aquecimento
dos gases inspirados e aquecimento das
soluções parenterais.
40
Detecção precoce de distúrbios de coagulação Reposição imediata de hemoderivados,
e sangramento quando necessário.

Manutenção de medidas de assepsia Evita a exposição do doador a infecções


nosocomiais. Procedimentos invasivos devem
ser realizados sob condições de rigorosa
assepsia. Vigilância e cuidados meticulosos em
relação aos cateteres vasculares e arteriais,
sonda vesical de demora e linhas de
monitorização devem ser reforçados. Cateteres
e sondas inseridos em situações de
emergência devem ser substituídos em
condições adequadas e eletivas.

Aplicar colírio em região ocular regularmente e Evitar ressecamento das córneas e formação
ocluir olhos com gaze de úlceras.

Para a cirurgia de extração dos órgãos, o doador é transportado e recebido no Centro


Cirúrgico pela equipe de Enfermagem, encaminhado para a sala de operações e transferido da
maca para a mesa cirúrgica. É então colocado em decúbito dorsal, evitando movimentos
bruscos, pois podem comprometer os órgãos a serem doados. O anestesista verifica as vias de
acesso venoso do paciente, instala a monitorização eletrocardiográfica do paciente, bem como a
de determinação da saturação de oxigênio no sangue. É importante que o paciente esteja com
sonda vesical de demora instalada, para coleta de material para urocultura, avaliação do débito
urinário e verificação da função renal.
Na sala de operações, uma grande mesa é montada com os instrumentos cirúrgicos.
Em seguida, é realizada a antissepsia das regiões torácica, abdominal e inguinais direita e
esquerda, utilizando soluções de PVPI degermante e logo após PVPI tópico ou clorexidina.
Inicia-se o ato cirúrgico com incisão longitudinal, que vai do manúbrio esternal à sínfise pubiana,
e faz-se primeiro a retirada do coração, seguido por fígado, rins e córneas. Efetuada a remoção,
o corpo do doador deverá ser condignamente recomposto, de modo a recuperar, tanto quanto
41
possível, sua aparência anterior, com cobertura das regiões com ausência de pele e enchimento,
com material adequado, das cavidades resultantes da ablação.

5.2 A família do doador de órgãos

O panorama da captação de órgãos para transplantes, apesar das grandes diferenças


culturais e econômicas pelo mundo, mostra aspectos semelhantes nas mais diversas regiões.
Existem algumas questões que se mostram “universais” nos estudos a respeito, em relação ao
comportamento das populações à doação de órgãos: a negativa da família em consentir na
doação de órgão é citada como o principal entrave na efetivação de transplantes de órgãos; os
comportamentos dos familiares estão condicionados a questões culturais e psicológicas; há a
tendência de os familiares consentirem na doação desde que estejam orientados a respeito do
conceito de morte encefálica e da finalidade humanística de doar; o sucesso na captação de
órgãos depende das habilidades comunicativas dos profissionais de saúde ao relacionarem-se
com os familiares de doadores.

Estudos mostram que os familiares certamente desempenham um papel de suma


importância no processo de doação. A família emerge como um elemento central nesse
processo; de um lado, ela é vista como o principal obstáculo à efetivação de transplantes, mas,
de outro, ela é percebida também como vítima em todo o processo, se considerarmos a dor da
perda brusca e traumática e, somando-se a isso, o grande estresse que representa a decisão de
doar os órgãos em meio a esta turbulência.
Diante disso, é importante conhecermos a experiência do familiar do doador de órgãos,
para que se possa identificar eventuais falhas da nossa assistência, para então pensarmos em
novas formas de abordar os familiares diante dessa difícil decisão. É preciso que haja
comunicação e interação com esses familiares, como parte integrante da assistência de
Enfermagem. Muito mais do que apenas informar sobre o estado do doador, ou sobre o
processo de doação de órgãos, é essencial que os profissionais de saúde, especialmente os da
42
enfermagem, estejam disponíveis e abertos para perceber as necessidades dos familiares.

Não apenas informá-los sobre a condição real do doador, mas ajudá-los a


compreender a realidade como ela se apresenta. Esse processo tem algumas etapas: perceber
os momentos que a família vivencia, as ansiedades e inseguranças, e atuar passo a passo,
ajudando a inteirar-se do que acontece. Muitas famílias se queixam do abandono que sentem
logo após consentirem a doação, como se todo o suporte e atenção de que dispunham antes da
doação não fossem mais vistos como necessários pela equipe de saúde. É preciso que
estejamos atentos a isso a fim de fornecer toda a assistência indispensável, em todas as etapas
do processo.

Algumas orientações, encontradas em estudos de renomados autores da área, são


importantes: não forçar nada, dar tempo para que os familiares percebam e aceitem a morte do
seu familiar. Apenas depois lidar com a questão do diagnóstico de morte encefálica. O pedido de
doação deverá ser posterior, e desvinculado das informações a respeito do estado do doador. E
então é o momento de estabelecer diálogo com a família para que esta tenha espaço e tempo,
mesmo diante da urgência do tempo no processo da captação de órgãos, para que possa
decidir-se por si e conscientemente se aceita ou não a doação. Nesse processo, cabe ao
profissional informar, apoiar, esclarecer, acompanhar, estar próximo e, principalmente,
disponível, não apenas antes, mas também depois da doação, e pelo tempo que se fizer
necessário.

Não se pode esquecer que, diante da morte traumática e inesperada de um ente


querido, a família terá que passar pela angústia, negação da realidade, dor da perda, por
conflitos pessoais e pela insegurança para decidir-se, e após a decisão. É possível, porém,
estimulá-la, em todo este processo, a expressar-se permitindo-se ser ajudada; e estimulá-la a
escolher livremente, como uma possibilidade para transcender o sofrimento e acreditar em
perspectivas para além daquele momento. É importantíssimo que a família não se sinta de forma
alguma coagida ou pressionada a optar pela doação.

Aspectos Gerais dos Transplantes

43

Antes de prosseguirmos no curso, falando sobre as diversas modalidades de


transplantes e suas indicações, vamos abordar os aspectos gerais do tema. Independente da
modalidade realizada, o paciente transplantado é especialmente exposto a dois riscos: o de
rejeição e o da infecção. A rejeição é combatida pelo uso contínuo dos chamados medicamentos
imunossupressores, que podem, por sua vez, desencadear o surgimento de infecções, devido à
queda de resistência do organismo a fatores patogênicos.

Por serem características gerais das diversas modalidades, trataremos sobre elas de
forma geral, para que depois possamos prosseguir abordando cada modalidade separadamente.
O objetivo desta parte do módulo é apresentar os aspectos principais da imunologia e rejeição
no paciente transplantado, bem como os cuidados com os medicamentos imunossupressores e
as infecções no paciente transplantado.

5.3 Imunologia em Transplantes

A imunologia de transplantes estuda a compatibilidade imunogenética entre doadores-


receptores ao transplante de órgãos ou de tecidos. O complexo maior de histocompatibilidade
(MHC), denominado no homem de Sistema HLA (Human Leukocyte Antigen) está envolvido nos
mecanismos de reconhecimento celular, visando proteger o organismo de agressões externas e
da regulação da resposta imunológica. A rejeição é a expressão de complicados mecanismos da
resposta imunológica envolvendo, na maioria das vezes, os antígenos HLA do órgão
transplantado.

A resposta imunológica acontece pela intervenção dos elementos de defesa, com o


envolvimento de anticorpos, de numerosos mecanismos de regulação e de fatores
amplificadores celulares. A semelhança genética entre doador e receptor contribuirá para o
sucesso e a sobrevida do órgão transplantado. Pode-se dizer que os transplantes de órgãos ou 44
tecidos são classificados em:

 A: autotransplante: transplante de órgãos, tecidos ou células do mesmo


indivíduo;
 B: isotransplante: transplante entre indivíduos de mesma constituição
genética (gemelares);
 C: alotransplante: transplantes feitos com órgãos de indivíduos da
mesma espécie (são os mais comuns);
 D: xenotransplante: entre indivíduos de espécies diferentes (ainda em
caráter experimental).

IRMÃO

C
PORCO

D
D IRMÃO
GÊMEO B

MACACO A IRMÃO
GÊMEO

A rejeição de transplantes contribuiu enormemente para a imunologia, pois através de


seus estudos foi possível a identificação dos antígenos de histocompatibilidade e uma melhor
compreensão da fisiologia das células T, as principais responsáveis pela rejeição. O transplante
de órgãos é atualmente aceito como uma opção terapêutica efetiva para doenças crônicas
terminais e seu objetivo principal é o sucesso sem a ocorrência de rejeição. A prevenção da
rejeição pode ser feita através de testes prévios comparando os antígenos de
histocompatibilidade do doador com os do receptor (“provas de reação cruzada”), através da
terapia imunossupressora ou ambos.

A rejeição do órgão transplantado (enxerto) ocorre quando o receptor reconhece o


tecido enxertado como estranho. Esse reconhecimento se faz através dos antígenos
pertencentes ao sistema de histocompatibilidade principal, designados no homem como 45
antígenos leucocitários humanos (HLA), presentes nas células do enxerto. A reação é muito
complexa e envolve a imunidade celular e anticorpos circulantes. A participação desses dois
mecanismos varia entre os enxertos, podendo participar um ou outro mecanismo, às vezes os
dois. Estudos em humanos e em animais de experimentação demonstraram que as células T
são as grandes responsáveis pelas reações de rejeição de transplantes.

Tipos de rejeição

Segundo os aspectos morfológicos e os mecanismos envolvidos, as rejeições são


classificadas em: hiperaguda, aguda e crônica.

TIPO TEMPO MECANISMO

Hiperaguda Minutos a algumas horas Anticorpos pré-formados

Aguda celular Dias a semanas Ativação de células T

Aguda humoral Dias a semanas Anticorpos

Crônica Meses a anos Ativação de células T e


anticorpos

Rejeição Hiperaguda
Mediada por anticorpos, ocorre minutos a poucas horas após o transplante em
pessoas previamente sensibilizadas. A sensibilização prévia ocorre após transfusões
sanguíneas, gestações múltiplas ou transplantes anteriores. Um dos exemplos mais dramáticos
é verificado quando órgãos, geralmente rins ou coração, de doadores de grupos sanguíneos A e
B são transplantados para receptores do grupo O, que normalmente possuem isoemaglutininas
pré-formadas contra os antígenos A e B.
46
As lesões básicas na rejeição hiperaguda são arterite e arteriolite agudas
disseminadas, trombose vascular e necrose isquêmica. Com a prática das provas de reação
cruzada, que detectam a presença de anticorpos do receptor contra os linfócitos do doador, a
rejeição hiperaguda pode ser evitada.

Rejeição aguda

Ocorre dentro de alguns dias em receptores não tratados com imunossupressores ou,
então, meses a anos após a interrupção da imunoterapia. Nesse tipo de rejeição, pode haver
participação tanto da imunidade celular (rejeição aguda celular), como da humoral (rejeição
aguda humoral), predominando um ou outro mecanismo. A rejeição aguda celular ocorre nos
primeiros meses pós-transplante, com início súbito e é detectada pela deterioração clínica das
funções do órgão. É muito importante o diagnóstico de rejeição celular, pois ela responde
prontamente à terapia imunossupressora.

A rejeição aguda humoral ou vascular (vasculite) ocorre geralmente nos primeiros


meses pós-transplante ou tardiamente, quando a terapia imunossupressora é descontinuada.
Em quase todos os pacientes há também evidências de rejeição aguda celular.

Rejeição crônica
Usualmente evolui de forma insidiosa e não é passível de reversão com a terapêutica
instituída. Esse tipo “crônico” pode surgir dentro de poucas semanas após o transplante, e é
mais bem observado nos transplantes renais. Por se tratar de um processo inespecífico, é difícil
identificar os mecanismos patogenéticos que levam a ela.

47

5.4 Imunossupressão

Concomitantemente aos transplantes, e servindo de base para seu desenvolvimento,


conforme vimos anteriormente, surgiu a moderna imunossupressão. Com a introdução da
ciclosporina, inaugurou-se um novo e moderno estágio da terapia imunossupressora,
caracterizado por maior seletividade e menor incidência de efeitos colaterais. Os benefícios das
drogas imunossupressoras são: diminuição das chances de rejeição aguda do transplante, bem
como das chances de rejeição crônica, e aumento da sobrevida do órgão (enxerto)
transplantado.

A imunossupressão tem evoluído da estratégia de citotoxicidade, com alta morbidade,


para estratégias que procuram alterar a regulação da resposta imune, a fim de reduzir
seletivamente as respostas contrárias ao órgão transplantado, almejando o estado ideal, que é a
tolerância imunológica. Nos últimos anos várias drogas imunossupressoras, com função
imunomoduladora conhecida, têm sido introduzidas na clínica ou nas pesquisas experimentais, e
este fato tem permitido uma ampla variação nos esquemas de imunossupressão.

A seguir, apresentamos os principais medicamentos imunossupressores utilizados


atualmente.

- Prednisona: corticosteroide usado como imunossupressor e também como reversor


de rejeição estabelecida. Diminui a produção de anticorpos e inibe a formação do complexo
antígeno-anticorpo; deprime a maturação das células T. A principal vantagem deste em relação
aos outros imunossupressores consiste no fato de que este não é tóxico ao órgão. Efeitos
colaterais: aumento de peso, aumento do apetite, retenção de líquidos (edema), hipertensão
arterial, acne, alteração de humor, insônia, alterações do nível de açúcar no sangue.

- Ciclosporina: é um importante imunossupressor, inibe a produção e a liberação das


linfocinas (fator de crescimento das células T); a dose é calculada por peso; nível da droga é 48
dosado no sangue (coleta em jejum); efeitos colaterais: tremores, hipertensão, hirsutismo,
cansaço, hipercalemia, náuseas e vômitos, desconforto gástrico, nefrotoxicidade.

- Micofenolato Mofetil: imunossupressor que atua inibindo a proliferação de linfócitos; a


dosagem varia de acordo com o órgão transplantado. Efeitos colaterais: diarreia, náuseas e
vômitos, anemia, leucopenia, neutropenia, dor abdominal, gastrites, hipertensão, tonturas e
vertigens, distúrbios do sono.

- FK506: age na inativação das células T; dose calculada de acordo com o peso; nível
da droga é dosado no sangue, em jejum e 1h antes da próxima dose; quando usado, substitui a
ciclosporina. Efeitos colaterais: diarreia, náuseas e vômitos.

- Azatioprina: age interferindo na multiplicação de células T; usado em combinação


com outros imunossupressores. Efeitos colaterais: dores articulares, alopecia, etc.

Cuidados de Enfermagem na Imunossupressão:

Cuidados durante a administração:

 Administrar os imunossupressores sempre no mesmo horário, de acordo


com a prescrição médica;
 Verificar a necessidade de coleta de exames antes da administração
dos medicamentos ou duas horas após a administração, conforme protocolo hospitalar (Ex:
coleta de dosagem de imunossupressor sérica);
 Verificar se existe a necessidade de material especial para a
administração do imunossupressor. (Ex: ciclosporina líquida em copo de vidro);
 Verificar aprendizagem e aderência do paciente e/ou cuidador em
relação às medicações.

Monitorização dos efeitos colaterais:


49

 Avaliar volume de diurese, devido ao efeito nefrotóxico;


 Observar episódios de convulsão/ tonturas e vertigens, associado
frequentemente à dose de imunossupressor;
 Observar e avaliar alterações no padrão de sono, pois o paciente pode
apresentar insônia;
 Observar alterações de comportamento do paciente;
 Observar episódios de cefaleia;
 Observar queda de cabelo, hipertricose, hipertrofia gengival, tremores
de extremidades;
 Avaliar hábito intestinal, pois podem ocorrer episódios de diarreia;
 Observar episódios de náuseas, vômitos, flatulência;
 Investigar aceitação alimentar;
 Observar queixa de dor abdominal, que pode estar relacionado com a
ocorrência de gastrite;
 Observar episódios de hipertensão ou hipotensão: dependendo do
imunossupressor utilizado – principalmente OKT3 e ATG;
 Observar episódios de taquicardia;
 Observar episódios de febre: principalmente durante imunossupressão
com OKT3 e ATG, além poder indicar presença de infecção (decorrente da imunossupressão);
 Observar presença de flebite em local de administração de ATG;
 Avaliar glicemia capilar, devido ao efeito hiperglicemiante das drogas
imunossupressoras;
 Observar sinais e sintomas de hiperglicemia.
5.5 Infecções no Paciente Transplantado

Apesar de todos os avanços na prática médica na ciência dos transplantes, a rejeição


do enxerto e as infecções persistem como problemas críticos entre os transplantados. A grande 50
maioria dos receptores de transplantes (70 a 80%) apresenta pelo menos um episódio de
infecção no pós-transplante. Destes, 50% são acometidos em algum momento de suas vidas por
infecções sistêmicas consideradas graves, as chamadas “infecções maiores”. Estas infecções
são, na maioria das vezes, causadas por bactérias, podendo também ser devidas a fungos ou
vírus.

Como as infecções continuam sendo a principal causa de mortalidade em qualquer


período pós-transplante é fundamental preveni-las e tratá-las de maneira efetiva. O risco de
infecção pós-transplante depende basicamente da interação entre a exposição do receptor aos
patógenos potenciais e seu estado de imunossupressão. O quadro clínico, a incidência e o tipo
de infecção pós-transplante variam de acordo com o órgão transplantado, com o tempo de
transplante, com a duração do procedimento cirúrgico, o esquema de imunossupressão
empregado, a procedência do órgão (doador vivo ou falecido), o agente etiológico envolvido no
processo infeccioso, etc.

Como os regimes de imunossupressão usados nos transplantes de órgãos sólidos são


muito similares, o padrão das infecções também se assemelha. Assim, é possível estabelecer
uma sequência evolutiva usual das infecções, de maneira a facilitar o raciocínio diagnóstico e
definir estratégias de prevenção.
Tempo Características

Infecções no primeiro mês pós transplante Mais de 90% das infecções são infecções
bacterianas hospitalares. Relacionadas com o
ato cirúrgico, cuidados pós-operatórios e
complicações cirúrgicas.
51
Raramente ocorrem infecções oportunistas.

Infecções no segundo ao sexto mês pós- Maior risco de surgimento das infecções pelos
transplante vírus imunomoduladores (citomegalovírus,
herpes vírus e vírus Epstein-Barr)

Infecções após o sexto mês de transplante Os pacientes cujos transplantes foram bem-
sucedidos recebem, a partir deste período, doses
menores de imunossupressores, tendo um
quadro de infecções muito semelhante ao da
população geral. Entretanto, cerca de 10% dos
pacientes desenvolvem infecções crônicas e
progressivas por vírus da hepatite B e C, CMV ou
papilomavírus. Pode ocorrer disfunção do órgão
infectado e o risco de certos tipos de neoplasia é
maior a partir deste período. Outros 5-10% dos
transplantados acabam por desenvolver
episódios recorrentes de rejeição aguda ou
crônica, necessitando de um aumento da carga
imunossupressora, mantendo-se, portanto, em
permanente risco de infecções oportunistas.

Aspectos Particulares das infecções nos transplantados


- imunossupressão: é o fator que, isoladamente, exerce maior influência na
ocorrência das infecções nos transplantados, especialmente após os avanços obtidos na técnica
cirúrgica dos transplantes. Os corticoides, como visto anteriormente, são utilizados em quase
todos os esquemas até agora propostos. Tais fármacos, quando administrados em altas doses,
diminuem a produção de anticorpos e a imunidade celular, além de inibir a resposta inflamatória,
o que aumenta significativamente o risco de infecções em geral e das infecções fúngicas em
52
especial.

- o doador: com o objetivo de reduzir os riscos de transmissão do agente infeccioso


pelo próprio órgão a ser transplantado, o possível doador deverá passar por uma minuciosa
avaliação clínica e laboratorial. Esta avaliação poderá excluir o doador ou orientar a necessidade
de terapia antimicrobiana específica após o transplante.

- o receptor: existem dois pontos fundamentais a serem considerados na abordagem


de um possível receptor de órgãos. O primeiro é que os receptores já apresentam falência
orgânica em pelo menos um sistema vital, sendo, portanto, mais suscetíveis a contrair infecções
e menos aptos a se recuperarem delas. Além disso, poderá haver persistência da doença de
base no período pós-transplante (hepatite B, diabetes mellitus). O segundo ponto a ser
considerado é que esses receptores serão inevitavelmente submetidos a uma carga expressiva
de imunossupressores, o que, além de agravar as possíveis doenças de base, torna-os
potencialmente mais suscetíveis à reativação de infecções subclínicas preexistentes.

Febre no paciente transplantado

A maior parte dos pacientes transplantados que evolui com infecção sistêmica
apresenta febre. Embora isto facilite a suposição diagnóstica sobre processos infecciosos em
geral, é importante lembrar que a imunossupressão interfere nas manifestações clínicas usuais
da infecção, mascarando seus sintomas e sinais, inclusive a própria resposta febril. Na presença
de febre é de fundamental importância a identificação do foco infeccioso. A investigação deve se
iniciar através de uma história clínica bem detalhada e de um exame físico dirigido
especialmente para o tórax, mucosa oral, abdome e região perineal.
O diagnóstico das diversas infecções no transplantado pode, entretanto, ser dificultado
pela existência de processos infecciosos não acompanhados de febre. Além disso, pode ocorrer
febre em doenças não relacionadas com infecção, como nas rejeições agudas, nas reações
hemolíticas, na trombose venosa profunda, nas reações a drogas, nas isquemias ou nos infartos
do órgão transplantado. Deste modo, é de suma importância que a equipe de saúde esteja
sempre com sua atenção voltada para a possibilidade de infecção no paciente transplantado,
53
sempre que este apresentar evolução clínica diferente daquela habitualmente esperada.
6 AS DIFERENTES MODALIDADES DE TRANSPLANTES,

Tipos de Transplantes e Indicações

54
Este módulo tem como objetivo apresentar ao estudante um breve resumo das
diversas modalidades de transplante atualmente disponíveis, destacando suas principais
indicações, contraindicações e resultados. Aborda-se também o xenotransplante, a polêmica
modalidade ainda em fase experimental, que transplanta órgãos e tecidos entre seres vivos de
espécies diferentes. Não é objetivo deste módulo apresentar detalhadamente a descrição de
cada técnica cirúrgica, cabendo ao estudante interessado em determinada modalidade, a busca
por maiores conhecimentos. A assistência de enfermagem dos três tipos de transplantes de
órgãos sólidos mais realizados será apresentada no próximo módulo.

6.1 Transplante Hepático

Os transplantes hepáticos têm apresentado um grande progresso quanto a seus


resultados, desde o primeiro, realizado por Starzl, em 1963. Na América do Sul e no Brasil, o
transplante ortotópico de fígado foi realizado pela primeira vez em São Paulo, em 1985,
desenvolvendo-se gradualmente e estendendo-se a outros centros. Todo paciente cuja vida
esteja seriamente comprometida por uma hepatopatia aguda ou crônica é, em princípio,
candidato a um transplante hepático, desde que outra forma de tratamento clínico ou cirúrgico
seja ineficaz, e que não se descubra contraindicação alguma ao procedimento.
As doenças hepáticas que se constituem atualmente em indicações para transplante
podem ser classificadas em quatro categorias principais:
 Hepatopatias crônicas avançadas – é a indicação mais
frequente para transplante, inclui as hepatites virais B, C, D, além da
hepatopatia alcoólica.

O transplante hepático em pacientes portadores de formas mais graves de hepatopatia


alcoólica, ou seja, de cirrose hepática ou de hepatite alcoólica, envolve algumas questões
polêmicas, como a possibilidade de recidiva do alcoolismo após o transplante e a possível não-
55
adesão do paciente aos cuidados e medicação especiais após o procedimento.

 Insuficiência hepática fulminante - associada a uma mortalidade


muito elevada, qualquer que seja sua etiologia. Por isso, as possibilidades de
êxito na decisão de se fazer o transplante hepático dependem muito da eficácia
das medidas de suporte clínico e do estabelecimento de um diagnóstico seguro.

 Distúrbios metabólicos genéticos - indicação de transplante


hepático mais em crianças do que em adultos.

 Tumores malignos do fígado - O transplante de fígado como


tratamento do câncer hepático é raramente bem-sucedido. O câncer geralmente
retorna no fígado transplantado ou em outro local; menos de 20% dos
receptores sobrevivem pelo menos um ano.

As contraindicações podem ser absolutas ou relativas.

 Absolutas: tumores malignos hepáticos com metástases extra-


hepáticas, sepse extra-hepatobiliar, moléstias cardiopulmonares severas e
AIDS.

 Relativas: hepatopatias avançadas, tipo vírus-B com replicação


viral ativa, esquistossomose mansoni hepatoesplênica descompensada com
hipertensão pulmonar, trombose da veia porta, positividade para o HIV, cirurgias
abdominais prévias extensas, obesidade intensa e má adesão do paciente ao
programa do transplante hepático.

Surpreendentemente, os transplantes de fígado são rejeitados menos intensamente


que os transplantes de outros órgãos, como o rim e o coração. As sobrevidas globais atuais são
de 80% em um ano e de 60% em cinco anos. Os resultados são ligeiramente melhores nos
transplantes pediátricos, apesar de uma taxa de complicações técnicas (trombose da artéria
hepática) mais elevada por causa do pequeno calibre dos vasos. Além da rejeição, muitas outras
complicações, isoladas ou associadas, podem misturar-se com os fenômenos da rejeição ou
com as consequências do seu tratamento.
Se o receptor apresenta um fígado aumentado de tamanho, náusea, dor, febre,
icterícia ou função hepática anormal, conforme demonstram os resultados dos exames de 56
sangue, o médico pode realizar uma biópsia com agulha (remoção de um pequeno fragmento de
tecido hepático através de uma agulha e exame do material ao microscópio). Os resultados da
biópsia ajudam a determinar se o fígado está sendo rejeitado e se a dose das drogas
imunossupressoras deve ser aumentada. A possibilidade de retransplantar rapidamente um
paciente em que o fígado não é funcional (não funcionamento primário, trombose vascular,
rejeição resistente ao tratamento) melhora sensivelmente o prognóstico.

6.2 Transplante Renal

O transplante renal constitui o tratamento mais adequado para a insuficiência renal


crônica, porém é necessário selecionar, entre os portadores de insuficiência renal crônica,
aqueles que preenchem os critérios, levando-se em consideração o aspecto técnico-cirúrgico,
sobrevida e recidiva da doença. Essa seleção é necessária porque é preciso cautela na
indicação do transplante para pacientes em quem esse procedimento representa alto risco, tanto
do ponto de vista técnico-cirúrgico, como da sua sobrevida. Além disso, nesses pacientes, os
procedimentos dialíticos, hemodiálise e CAPD têm propiciado um tempo de vida superior ao
transplante, com uma qualidade satisfatória.

Pacientes idosos, pacientes portadores de vasculopatias sistêmicas, de hepatite


crônica ativa, de nefropatias que apresentam alto índice de recorrência pós-transplante, de
neoplasias em estado de remissão, de processos infecciosos crônicos sob controle
medicamentoso e cardiopatas graves vivem mais quando submetidos a tratamento dialítico.
Pacientes hipersensibilizados, mesmo que estejam com condições adequadas para
serem receptores de um transplante renal, dificilmente são transplantados em decorrência de
sua hiper-reatividade imunológica, que levaria a uma rejeição imediata do enxerto. Excluídos
esses pacientes de risco, pode-se dizer que entre 50-75% dos pacientes em diálise são
candidatos a um transplante renal. Os progressos da terapêutica imunossupressora e da seleção
imunogenética mostram, em estudos estatísticos sucessivos, aumento da sobrevida do paciente
57
transplantado, sem a necessidade de utilização de procedimentos dialíticos. Essa sobrevida
pode significar uma vida “normal”, na maioria das vezes, e até acima das expectativas, em
alguns casos.

O transplante renal pode ser feito tanto a partir de doador vivo quanto de doador
falecido. O doador vivo é, na maioria das vezes, parente em primeiro grau do receptor. O
parentesco e, quando possível, a seleção do mais semelhante imunologicamente entre eles faz
com que, a médio e longo prazo, a duração do enxerto seja maior no transplante com doador
vivo do que no transplante com doador falecido. O número de indivíduos na fila de espera por
um transplante de rim tem aumentado significativamente nos últimos anos, e, embora o número
de transplantes realizados em cada ano também tenha aumentado, apenas uma pequena
porcentagem dessas pessoas chega efetivamente a ser transplantada.

Alguns pacientes são transplantados antes de iniciarem o programa de diálise. No


entanto, esses são minoria e geralmente o doador é aparentado. A técnica do transplante renal
tornou-se rotineira, podendo ser efetuada em qualquer centro que tenha uma estrutura mínima
para a realização de procedimentos cirúrgicos, diferente do transplante hepático ou cardíaco. A
sistematização e o entrosamento das equipes envolvidas no transplante renal reduzem o tempo
cirúrgico e diminuem consideravelmente as complicações peri e pós-operatórias, tais como a
isquemia prolongada do enxerto, que poderia levar à sua perda. A cirurgia do transplante renal é
considerada uma cirurgia de médio porte.

O período das primeiras 24 horas de pós-operatório do transplante renal está


associado à instabilidade hemodinâmica e à necessidade de reposição parenteral de grande
quantidade de líquidos. A evolução deste período inicial está associada à melhor evolução em
longo prazo. Por essas razões, a grande maioria dos centros de transplante acaba optando por
manter os pacientes em UTIs nas horas iniciais, embora não seja estritamente necessário. O
alvo do transplante renal em relação à função do enxerto é que, no pós-operatório, o paciente
apresente rápida diurese, com importante redução do nível das escórias formadas na
insuficiência renal. O paciente que não está com diurese adequada, ou que se encontra ainda
anúrico, é cuidadosamente avaliado em relação à possibilidade de rejeição ou de disfunção
precoce do enxerto.

58

6.3 Transplante Cardíaco

O transplante cardíaco constitui o tratamento indicado para o paciente com


Insuficiência Cardíaca Congestiva (ICC) grave e refratária ao tratamento clínico. Estudos de caso
mostram melhora significativa na sobrevida dos pacientes com o diagnóstico citado, capacidade
de realização de atividade física, possibilidade de retorno ao trabalho e qualidade de vida,
quando comparado ao tratamento convencional da ICC.

O transplante cardíaco é um dos sucessos evidentes da Medicina do século XX, tendo


evoluído de um procedimento experimental, no começo do século, para um tratamento
estabelecido das ICC terminais a partir da década de 80. Os resultados positivos do transplante
cardíaco, ao longo do tempo, têm contribuído para uma discrepância entre o número de
doadores e de receptores existentes na fila de espera. Segundo o Sistema Estadual de
Transplantes da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, do período de julho de 1997 a
dezembro de 2005, havia 632 pacientes na lista de espera para realização de transplante
cardíaco. Com a ampliação das indicações de transplante e o número crescente de receptores
potenciais, o principal obstáculo tornou-se o limitado suprimento de doadores.

É estimado que um em cada quatro candidatos potenciais falece na fila à espera de um


doador. Apenas 20% dos potenciais doadores tornam-se doadores reais. As razões dessa
escassez são diversas, mas é importante destacar que uma delas é o manuseio inadequado do
doador. Por outro lado, os avanços no tratamento clínico têm melhorado o prognóstico da ICC
sem transplante. Em alguns centros médicos, aparelhos mecânicos (“coração mecânico”) podem
manter vivos os pacientes durante semanas ou meses, até que seja encontrado um doador de
um coração adequado. Contudo, muitos desses pacientes também acabam morrendo enquanto
esperam.

São indicações para a realização do transplante cardíaco:

 Pacientes com insuficiência cardíaca classe IV persistente (aqueles


59
que sentem falta de ar mesmo ao repouso, com internações recorrentes), apesar de
todos os outros recursos de tratamento disponíveis (medicamentos em doses
adequadas, revascularização por angioplastia ou cirurgia de ponte de safena, se
indicados e terapia de ressincronização com marcapasso artificial).
 Pacientes dependentes de suporte circulatório (como o coração
artificial) ou drogas injetáveis vasoativas (para manter a pressão arterial e o
funcionamento cardíaco).
 Presença de arritmia ventricular refratária (inclusive ao desfibrilador
automático implantável), que costuma ser o mecanismo que leva à morte.
 Um consumo máximo de oxigênio (VO2 máximo) inferior a 10 ml/kg/min
no teste cardioplumonar, chamado de ergoespirometria (teste cardiopulmonar). Este
valor indica um desempenho cardíaco muito reduzido.

As contraindicações são a presença de condições não-cardíacas que possam reduzir a


expectativa de vida ou aumentar o risco de infecção, rejeição ou outras complicações: infecções
ativas, presença de tumores malignos, doença pulmonar grave, HIV positivo, uso de drogas
ilícitas ou alcoolismo, e incapacidade de tomar as medicações imunossupressoras ou realizar o
acompanhamento médico após o transplante.

Um dos maiores desafios no manuseio do paciente transplantado cardíaco é a


detecção apropriada e precoce da rejeição. Ao contrário de outros órgãos, a rejeição cardíaca
pode levar a danos miocárdicos graves e irreversíveis antes das manifestações clínicas. Até o
momento, não se dispõe de exames não-invasivos confiáveis para a monitoração da rejeição,
sendo a biópsia endomiocárdica considerada o melhor padrão. As biópsias endomiocárdicas
constituem procedimentos de baixa morbidade, e geralmente são realizadas no laboratório de
hemodinâmica, com a retirada de quatro a seis fragmentos do miocárdio do ventrículo direito,
usualmente através da veia jugular interna.
As infecções são responsáveis por quase metade de todas as mortes que ocorrem
após um transplante de coração. A etiologia da infecção varia de acordo com o tempo após o
transplante, mas a maioria é bacteriana. Outra complicação é a aterosclerose (artérias
obstruídas), a qual se desenvolve nas artérias coronárias de aproximadamente um quarto dos
receptores de transplante de coração. Cerca de 95% dos receptores de transplante de coração
conseguem de modo significativamente melhor realizar exercícios e levar a cabo suas tarefas
cotidianas do que conseguiam antes do transplante. Mais de 70% dos receptores de um 60
transplante de coração retornam ao trabalho.

6.4 Transplante de Pâncreas

O transplante de pâncreas é recomendado para os pacientes que tenham


complicações secundárias do diabetes ou hipoglicemias assintomáticas que representam risco
de vida. Ao contrário do transplante de outros órgãos, ele não é o último recurso para salvar a
vida, mas, ao contrário, ele visa prevenir as complicações do diabetes e especialmente controlar
a concentração de açúcar no sangue de forma mais eficaz do que pode ser feito com a injeção
de insulina várias vezes ao dia.

Estima-se que 0,3% da população ocidental seja acometida pelo diabetes mellitus tipo
I. Esse grande número de pacientes vem assistindo a um grande progresso no controle
medicamentoso e de suporte da doença que, por muitos anos, levava vidas rapidamente em
quadros de cetoacidose. A descoberta da insulina, entretanto, não significou a cura, mas apenas
um controle eficiente da doença, já que, apesar dos múltiplos regimes terapêuticos disponíveis,
as complicações secundárias da endocrinopatia podem apenas ser adiadas, mas não evitadas.
Além disso, é sabido que os pacientes são submetidos, continuamente, a um regime alimentar
restrito.

Foi na década de 60 que o transplante de pâncreas e o de ilhotas pancreáticas passou


a ser estudado como uma nova solução para o diabetes. Atualmente, o transplante de pâncreas
é um procedimento cirúrgico já consagrado, porém, é uma intervenção delicada e o pós-
operatório também exige, como nas demais modalidades, que o paciente permaneça
hospitalizado por um longo período. Assim como nos outros transplantes, a tolerância ao
transplante de pâncreas estabelece o tratamento imunossupressor permanente, para evitar a
rejeição do enxerto. Os riscos infecciosos e neoplásicos trazidos por esse tratamento
desautorizam o emprego do transplante pancreático nas fases iniciais do diabetes, a título de
profilaxia das complicações secundárias.
61
Devido ao risco da imunossupressão, quase todos os transplantes de pâncreas têm
sido realizados em indivíduos diabéticos que também necessitavam de um transplante de rim
devido à insuficiência renal. Portanto, as indicações de transplante pancreático isolado são
restritas aos casos de neuropatia em crianças ou jovens, diabetes de difícil controle clínico
devido à resistência insulínica ou à retinopatia proliferativa precoce rapidamente progressiva.
Alguns serviços indicam o transplante pancreático isolado também nos pacientes não urêmicos
que iniciam complicações do diabetes.

Está contraindicado o transplante pancreático isolado em um paciente que tenha


clearance de creatinina inferior a 50-60ml/min, uma vez que a nefrotoxicidade da ciclosporina
agrava a função renal, exigindo um transplante renal posteriormente. A indicação de transplante
de pâncreas também é para insulino-dependentes que se submeteram ao transplante de rim e
que já usam imunossupressores (medicamentos contra a rejeição) e permanecem com
dificuldades de controle, ou evoluindo com complicações secundárias.

Na maioria dos centros o transplante de pâncreas tem sido indicado somente em


associação a um transplante de outro órgão que, em 75% dos casos, é o rim. Algumas vezes, o
acometimento cardíaco ou a concomitância de uma doença hepática motiva o transplante
simultâneo de múltiplos órgãos. Portanto, o transplante pancreático pode ser realizado como
procedimento único, associado simultaneamente a um transplante de outro órgão, ou suceder o
transplante de outro órgão algum tempo depois. O enxerto pode ser proveniente de doador
falecido ou, em um número menor de casos, de doador vivo aparentado. No pós-transplante,
pode ocorrer perda do órgão transplantado em 15% a 20% dos casos. Nessa modalidade de
transplante, o pâncreas do receptor não é removido, pois ele ainda cumpre as funções
digestivas. O novo pâncreas será responsável apenas pela produção de insulina.
Transplante de Células Pancreáticas

O implante de células do pâncreas no fígado do paciente, embora ainda experimental,


é encarado como uma alternativa de tratamento para a independência da insulina. O transplante
de ilhotas consiste na retirada das ilhotas de Langerhans (agrupamento das células
62
responsáveis pela produção de insulina) do pâncreas de um doador falecido; depois de
separadas e passadas por um processo de purificação no laboratório, são injetadas através da
veia porta, levando-as direto para o fígado, onde passarão a produzir insulina. A cirurgia dura
cerca de 35 minutos e é feita com anestesia local. O paciente volta para casa no dia seguinte e a
recuperação é muito rápida. Mas são necessários alguns cuidados como acompanhamento e
repouso, e manutenção com imunossupressores por toda a vida. É indicado que o paciente
tenha a mesma dieta, atividades físicas e mantenha hábitos de vida saudáveis.

O candidato a este tipo de transplante deve ter diabetes tipo I há mais de 5 anos, com
idade superior a 18 anos, sem complicações e com a função renal normal, peso não superior a
60 kg, uso de menos de 30U de insulina por dia e com frequentes crises de hipoglicemia severa
que passam despercebidas. Nesses casos, a substituição da insulina pela imunossupressão é
totalmente justificada.

Quando se faz o transplante, tanto de ilhotas como de pâncreas, não se pode garantir
que o paciente ficará independente das aplicações de insulina. Na grande maioria dos casos, a
quantidade de insulina necessária fica, no mínimo, diminuída, o que já é um grande conforto
para as pessoas que sofriam de hipoglicemias assintomáticas.

6.5 Transplante de Pulmão

O transplante pulmonar é uma modalidade terapêutica eficaz para pacientes com


doenças pulmonares em estádio final. O transplante de pulmão melhorou consideravelmente nos
últimos anos. Os progressos obtidos na abordagem do doador, preservação do pulmão, técnica
operatória, manuseio da imunossupressão, profilaxia, diagnóstico e tratamento das infecções e
tratamento da rejeição têm possibilitado o aumento da sobrevida com menor morbidade.
Habitualmente, é transplantado um pulmão, mas em algumas vezes, ambos os pulmões são
substituídos. Quando a doença pulmonar também provocou lesão cardíaca, o transplante de
pulmão é algumas vezes combinado com um transplante de coração.
A obtenção de pulmões é um problema, pois a sua preservação para transplante é 63
difícil. Por essa razão, o transplante deve ser realizado o mais breve possível após a obtenção
do órgão. Os transplantes de pulmões podem ser oriundos de um doador vivo ou de doador
falecido. De um doador vivo, não é possível se obter mais que um pulmão inteiro e, geralmente,
apenas um lobo é doado. Com poucas exceções, a indicação para transplante pulmonar é a
presença de doença pulmonar incapacitante progressiva, irreversível, em estádio final. Deve ser
considerado quando se julgar que a expectativa de vida está limitada a 12 ou 18 meses.
Contudo, a maioria das doenças pulmonares não apresenta dados clínicos que permitam
predizer a sobrevida e deve-se usar senso judicioso para a indicação do transplante.
Os candidatos não devem padecer de outras afecções clínicas, cirúrgicas ou
psiquiátricas, devem possuir suporte social e emocional para suportar o esforço físico e
emocional de um transplante. Em geral, não são aceitos pacientes com mais de 65 anos e
também não são considerados aqueles que fumam. Todos os pacientes, exceto os portadores
de hipertensão pulmonar, devem participar de um progressivo exercício de reabilitação,
enquanto esperam pelo procedimento, pois isto possibilita melhora na performance, tornando-os
mais resistentes aos rigores da cirurgia e da convalescença.
Aproximadamente 80 a 85% dos indivíduos submetidos a um transplante de pulmão
sobrevivem por pelo menos um ano e aproximadamente 70% sobrevivem por cinco anos. Várias
complicações podem ameaçar a sobrevivência dos receptores de transplantes de pulmão e de
coração-pulmão. O risco de infecção é alto, pois os pulmões estão continuamente expostos ao
ar, o qual não é estéril. Uma das complicações mais comuns é a má cicatrização do local onde a
via respiratória é suturada. Em alguns indivíduos submetidos a um transplante de pulmão, as
vias aéreas tornam-se parcialmente obstruídas por tecido cicatricial, o que exige um tratamento
adicional.
O diagnóstico e tratamento da rejeição permanecem um problema de difícil solução,
pois pode ser difícil de ser detectada, avaliada e tratada. No período pós-operatório precoce, o
diagnóstico é empírico, baseando-se em achados clínicos, incluindo temperatura, diminuição da
PaO2, aparecimento de infiltrados pulmonares e alterações na cintilografia perfusional. A biópsia
pulmonar transbrônquica para o diagnóstico de rejeição crônica é importante na diferenciação da
infecção viral pelo citomegalovírus. Mais de 80% dos receptores apresentam algumas evidências
de rejeição no mês que sucede a cirurgia.
A rejeição causa febre, falta de ar e fraqueza. A fraqueza ocorre devido à baixa
concentração de oxigênio no sangue. Como ocorre com outros órgãos transplantados, a rejeição
do transplante de pulmão pode ser controlada por uma alteração do tipo ou da dose das drogas 64
imunossupressoras. Uma complicação tardia do transplante de pulmão é a oclusão das
pequenas vias respiratórias, a qual pode representar uma rejeição gradual. Os principais
problemas a serem resolvidos incluem a disponibilidade de órgãos, a melhora dos regimes
imunossupressores e a habilidade de diagnosticar e tratar prontamente a rejeição.

6.6 Transplante de Intestino

Os transplantes intestinais, apesar de ainda não terem obtido o mesmo sucesso dos
transplantes de rins, fígado ou coração, têm sido indicados e realizados com maior frequência
em alguns centros de transplante, com resultados bastante satisfatórios. Comparados com
outros órgãos que são amenos para o transplante, o trato gastrointestinal tem provado ser
particularmente difícil. No mínimo duas questões parecem ser responsáveis. A primeira é que o
trato gastrintestinal é o órgão mais imunologicamente abundante no corpo em termos de
linfócitos. Eles servem como um forte estímulo para a rejeição. O segundo é que a flora
bacteriana do intestino delgado e grosso serve como um grande reservatório de patógenos
potenciais, aumentando o risco de infecção após o transplante.
As tentativas iniciais de transplante do intestino delgado começaram nos meados dos
anos 60 e duraram até o início dos anos 70, mas foram abandonados porque todos os pacientes
morreram. O advento de imunossupressores mais eficazes foi o passo crítico que permitiu ao
transplante do intestino delgado continuar. Tentativas registradas começaram de novo em 1987.
Embora esse paciente também tenha morrido subsequentemente, a duração da sobrevivência
da criança (> 6 meses de sobrevivência) demonstrou que o uso de ciclosporina, como um
imunossupressor, poderia acentuar a sobrevivência significantemente. O próximo avanço
importante veio no início dos anos 90, com o advento de imunossupressores mais efetivos
(tacrolimus). No entanto, a maior barreira ao sucesso dos transplantes intestinais continua sendo
imunológica, cujo progresso depende do desenvolvimento de medidas preventivas, métodos
diagnósticos e tratamento da rejeição.
65
O transplante intestinal é indicado para os pacientes com disfunção intestinal ou
submetidos a uma ressecção total ou quase total do intestino delgado, produzindo uma síndrome
de má-absorção, conhecida como síndrome do intestino curto. Os pacientes com essa síndrome
têm uma qualidade de vida ruim e alta mortalidade. Inicialmente, eles devem ser incluídos em
um programa de adaptação intestinal, com o objetivo de conseguir o máximo da capacidade
absortiva dos intestinos. É o período necessário para que o paciente possa utilizar a via oral e
manter o seu estado nutricional. O tempo gasto para esta adaptação pode durar mais de um ano
e depende de dois fatores principais: comprimento com qualidade do intestino remanescente e a
presença do piloro ileocecal.

A nutrição parenteral total (NPT) é imprescindível até a adaptação às dietas enterais. A


maioria dos pacientes consegue a adaptação desejada. Outros se tornam dependentes, parcial
ou totalmente, da NPT e estão expostos a complicações, tais como flebites, obstrução do
cateter, desequilíbrio metabólico, septicemia e insuficiência hepática, que é a causa mais comum
de morte em crianças.

Há uma subpopulação de pacientes com a síndrome do intestino curto mantida em


nutrição parenteral total que tem indicação de transplante combinado, hepatointestinal ou
multivisceral, porque desenvolveu colestase, esteatose, inflamação periportal, fibrose e cirrose.
Embora a princípio pareça que as indicações para o transplante do intestino delgado sejam
relativamente evidentes, elas podem ser difíceis de racionalizar em muitos pacientes. A
sobrevivência e qualidade de vida após o transplante devem ser consideradas em relação à
nutrição parenteral de longo prazo, e a probabilidade de que a criança eventualmente seja capaz
de abandonar a nutrição parenteral.

O transplante intestinal é uma opção viável e a mais promissora para esses casos. No
entanto, devem ser empregados, como primeira opção, outros procedimentos cirúrgicos, tais
como os esfíncteres artificiais e a interposição do segmento do cólon, que podem apresentar
bons resultados, embora não definitivos. A solução definitiva para pacientes com síndrome do
intestino curto, dependentes da nutrição parenteral total, é o transplante intestinal. As principais
causas da síndrome de intestino curto, em crianças e adultos, estão apresentadas no quadro a
seguir.

66

Na criança No adulto

Má-formações congênitas: agenesia do intestino Vasculares: obliteração arterial, trombose


delgado, atresias segmentares e múltiplas, venosa, vólvulo completo
vólvulo sobre mesentério comum.

Enterites: infecciosas, após quimioterapia. Rádicas acidentais

Excepcionais: trombose da veia mesentérica Síndrome de Gardner


superior, lesões iatrogênicas da artéria
mesentérica superior.

Comuns à criança e ao adulto: pós- Esclerodermia


radioterapia, causas traumáticas, doença de
Crohn.

As contraindicações absolutas ao transplante do intestino delgado são AIDS, sepse


generalizada, neoplasia maligna e falência de múltiplos órgãos. As contraindicações relativas
são dependentes do centro de transplante, mas incluem peso (< 5 kg) e cirurgias abdominais
prévias múltiplas. Os enxertos intestinais podem ser obtidos de doador vivo ou falecido com
retirada de múltiplos órgãos. No doador vivo, a perda de 150-200 cm de intestino delgado,
habitualmente, não leva a um comprometimento funcional. Podem-se utilizar segmentos do
jejuno ou do íleo com resultados semelhantes, do ponto de vista imunológico e funcional. É
importante ressaltar que a cirurgia deve ser precedida de um preparo adequado do intestino,
incluindo a descontaminação seletiva.

De acordo com dados do registro de transplante intestinal, o tamanho do centro de


transplante e o número de transplantes realizados são positivamente correlacionados com o
melhor resultado. A maioria dos centros registra que a sobrevivência é menor para pacientes que
receberam um transplante de intestino delgado com um fígado, em oposição àqueles que foram 67
transplantados apenas com intestino delgado.

A taxa de sobrevivência geral de pacientes com a síndrome de intestino curto nos anos
recentes está na faixa de 80% a 94%, embora, a mortalidade seja maior naqueles com
enterocolite necrosante. Em pacientes (principalmente aqueles com síndrome do intestino curto)
que requerem nutrição parenteral de longo prazo (até 25 anos), a sobrevivência é de
aproximadamente 94%. A sobrevivência em longo prazo após o transplante de intestino delgado
é significantemente menor do que aquele para a nutrição parenteral de longo prazo. Como
observado previamente, entretanto, aproximadamente 4% das crianças desenvolvem
insuficiência hepática. Essas crianças encontram sua única esperança para sobrevivência no
transplante de intestino delgado.

Após o transplante de intestino delgado, a necessidade de medicações


imunossupressoras é também para o resto da vida. Assim como em outros órgãos
transplantados, o paciente encara o risco da doença linfoproliferativa pós-transplante. O risco
parece ser maior para o transplante de intestino delgado do que para outros órgãos. Uma série
de novos procedimentos e medicações está sendo desenvolvida para diminuir estas e outras
complicações do transplante do intestino delgado. É muito provável que a sobrevivência após o
transplante de intestino delgado continue a melhorar.

6.7 Transplante de Pele


A pele protege órgãos delicados de serem agredidos ou infeccionados, regula a
temperatura do corpo, mantém os fluidos essenciais, elimina os resíduos e logo dá um alerta
de calor, frio, dor, contato e pressão. Devastadores ferimentos da pele, como extensas
queimaduras de terceiro grau, são fatais a menos que haja uma intervenção especializada e
rápida. Esta intervenção depende muito da saúde da pele. Por um século os médicos têm
ciência de que a melhor bandagem para queimadura intensa é a pele humana. Se um
68
paciente está excessivamente queimado para ser seu próprio doador, ele precisa de enxertos
de pele de um doador falecido para poder ser curado. Estas bandagens biológicas de pele de
doador ainda não podem ser imitadas.

O enxerto de pele é um segmento de tecido, composto de epiderme e derme, que foi


completamente separado de sua localização original e de seu suprimento sanguíneo antes de
ser transplantado para outra área do corpo. Quanto às suas classificações, os enxertos podem
ser denominados, em relação ao doador:

 Autoenxertos: são aqueles retirados dos próprios indivíduos que


irão recebê-los. São os mais frequentemente usados, por não apresentarem
risco de rejeição. Também chamados de isoenxertos.
 Homoenxertos: ou aloenxertos, são aqueles transplantes de
pele de indivíduos diferentes, porém da mesma espécie. São usados, na maioria
das vezes, como “curativos biológicos”, isto é, somente para cobertura
temporária de áreas cruentas, já que sua integração completa é impossível por
causa da rejeição que ocorre, em média, por volta do quadragésimo dia após a
enxertia. Quando se utilizam como doadores parentes próximos dos receptores
(pais, irmãos), a rejeição poderá demorar um pouco mais para se manifestar,
mas é inevitável. No caso de gêmeos idênticos, o homoenxerto funciona como
autoenxerto.
 Heteroenxerto: xenoenxertos são aqueles realizados entre
indivíduos de espécies diferentes. Os mais usados, devido à facilidade de
obtenção, são os de pele porcina liofilizada, também usados como “curativo
biológico”, pois, devido à rejeição, sua retirada se faz necessária por volta do
vigésimo dia.
Quanto à espessura, podem ser:

 Pele parcial: são os enxertos compostos da epiderme e parte da derme,


que podem ser subdivididos em parciais finos, médios e grossos, dependendo da
espessura da derme neles contida.
69
 Pele total: são compostos da epiderme e da totalidade da derme.

A escolha para utilização de enxertos finos ou grossos, parciais ou totais vai depender
do tipo e das características da área a ser transplantada. Por exemplo, os enxertos finos têm
maior possibilidade de integração em relação aos de pele total que, por sua vez, têm melhores
resultados estéticos e menor tendência à retração em longo prazo. Quanto às áreas doadoras,
praticamente toda a superfície corporal pode ser utilizada como área doadora, principalmente
quando há necessidade de se enxertar grandes áreas, mas algumas áreas são consideradas
preferenciais: costuma-se preferir a retirada de pele das coxas, dos braços, do abdômen e das
costas, pela facilidade da retirada. Não é possível apenas usar a pele das mãos e da face.

Os enxertos de pele têm inúmeras aplicações clínicas, sendo basicamente indicados


em todos os casos em que não se consegue o fechamento de áreas cruentas por primeira
intenção. Essa condição é presente frequentemente nas queimaduras de segundo grau profundo
e nas de terceiro grau, nas grandes lacerações e esmagamentos e em reconstruções pós-
exérese de tumores de pele. A escolha da área doadora e do tipo de enxerto em relação à sua
espessura deve ser analisada caso a caso, levando em consideração as seguintes premissas:

1. Quanto mais grosso o enxerto, melhor será o resultado estético.


2. Quanto mais fino o enxerto, mais fácil será a sua integração à
área receptora.
3. O enxerto retirado de áreas mais próximas ao leito receptor terá
aparência mais semelhante à da pele vizinha da região enxertada.
4. O cuidado no tratamento da área doadora e a retirada dos
enxertos em locais menos expostos são fundamentais para se minimizar as
sequelas estéticas dessas áreas.

Como foi visto até agora, o transplante de pele é um pouco diferente de outros
transplantes. Ele não é um transplante definitivo, quando utilizada pele de doador falecido.
70
Inicialmente tem uma durabilidade de duas a três semanas, não mais que isso. A partir desse
período, começa a haver rejeição. Essa pele não sofre uma rejeição imediata porque o paciente
queimado é extremamente imunossuprimido, ou seja, tem uma resistência muito baixa, causada
pela própria queimadura. A queimadura causa um grau avançado de imunossupressão, por isso
na fase inicial o enxerto é aceito normalmente, mas após o período de duas a três semanas o
paciente passa a ter uma melhora clínica por conta do transplante e, consequentemente, uma
melhora imunológica, o que leva à rejeição e a queda da pele enxertada.

Esse transplante com pele doada tem como objetivo fazer com que o paciente tenha
uma melhora clínica. Com a cobertura da pele queimada pela do próprio paciente, essa
definitiva, ou pela de doador, ela promove uma integração e o paciente apresenta uma melhora
do ponto de vista clínico, nutricional e infeccioso, já que a perda de proteínas e nutrientes
causada pela queimadura deixa de acontecer. Com isso, ganha-se tempo para que a pele do
paciente retirada para o transplante definitivo se recupere para que se possa então fazer outros
transplantes nos locais antes cobertos com pele de doador. A cobertura da área queimada é
gradativa.

O tempo de recuperação total para um paciente com uma queimadura grande leva
aproximadamente três meses. Do ponto de vista de cobertura de pele a recuperação é total, mas
esses pacientes, na maioria das vezes, desenvolvem algumas sequelas. A principal delas é
estética. O paciente queimado leva para o resto da vida o estigma das queimaduras, já que é
nítido, ao olhar para a pele, que esta não é natural. Além disso, ele fica com cicatrizes e a
qualidade da pele enxertada nunca é igual à natural, ela é mais sensível e menos elástica.
6.8 Transplante de Ossos

Com exceção do sangue, o osso é o tecido humano mais frequentemente


transplantado. O transplante ósseo é comumente referido como enxerto e os enxertos podem ser 71
divididos, de acordo com a sua natureza, em:

 Enxerto autólogo: transplante de um tecido ou órgão e, no nosso


caso, do osso de um local para outro.
 Isoenxerto: enxerto permutado entre pessoas com
características geneticamente idênticas do mesmo zigoto, como gêmeos
humanos idênticos.
 Aloenxerto ou enxerto homólogo: transplante de um indivíduo da
mesma espécie, mas com características genéticas desiguais.
 Xenoenxerto ou enxerto heterólogo: transplante de um indivíduo
de uma espécie para outra, por exemplo, da vitela para o ser humano.

Em geral, o enxerto autólogo fresco é o material de enxerto mais eficiente, sendo


frequentemente usada a crista ilíaca como área doadora. Esse tipo de enxerto é, em geral,
usado com eficiência na maioria das situações clínicas. Porém, quando usado para suprir
defeitos amplos, o enxerto ósseo autólogo deixa a desejar, ensejando-se por alternativas, como
o enxerto homólogo, de doadores vivos e falecidos, e o heterólogo, de animais ou mesmo
substitutos minerais.

O transplante ósseo atende às seguintes funções principais: imobilização, osteogênese


e substituição. A imobilização utiliza o enxerto cortical denso e, em geral, é removido da face
subcutânea da tíbia ou da fíbula. É geralmente fixado com parafusos e é de reabsorção e
substituição lentas, sendo necessária uma proteção prolongada contra o suporte de peso. A
osteogênese, que é a substituição por osso novo, faz-se de modo rápido quando se usa o
enxerto esponjoso. Sua medula permeável é rapidamente penetrada por capilares e muitos dos
osteoblastos originais na superfície do implante sobrevivem e continuam a produzir osso novo.
Enquanto isso, as espículas delgadas de osso morto são reabsorvidas e substituídas por osso
novo. A substituição de falhas ósseas é uma das indicações para o uso dos enxertos.

As principais indicações dos enxertos variam de acordo com a época e a evolução da


medicina. Antes da era metalúrgica da ortopedia, a indicação dos enxertos era mais ampla, pois
eles eram usados como meio de fixação inerte e eficiente. Após uma queda na sua utilização, 72
volta-se hoje a usá-los de modo mais intensivo nas grandes falhas por tumores e revisões de
próteses, e também devido às facilidades do transplante ósseo pediculado ou microcirúrgico e
dos bancos de ossos. Mas, de um modo geral, os transplantes ósseos são utilizados nos
seguintes casos:

 Preencher cavidades ou defeitos devidos a cistos, tumores ou


traumatismos;
 Artrodeses;
 Restabelecer defeitos de ossos longos;
 Provocar a união de uma pseudoartrose;
 Apressar união de fraturas recentes, retardos de consolidação e
osteotomias.

O enxerto pode ser dividido em enxerto ortotópico e heterotópico, em relação ao local


de sua colocação. O ortotópico é o posicionamento em um local adequado, como um leito ósseo.
O heterotópico é o posicionamento inadequado, em que o enxerto é colocado em um leito
muscular. Usa-se também o termo substituto de enxerto, que são opções sintéticas para a
substituição dos enxertos. Estes são substâncias minerais compostas de hidroxiapatita ou
fosfato tricálcico ou uma mistura de ambos.

Diferente dos órgãos que podem ser doados, o osso não apresenta nenhum tipo de
rejeição. Como o osso é basicamente de cálcio e fósforo, não existe o antígeno, que vai provocar
um anticorpo no paciente que o recebe. Desta forma, qualquer osso serve pra qualquer pessoa.
O preconceito em relação às doações de ossos é o principal obstáculo às pessoas que estão na
fila de espera para receber um transplante ósseo. Em todo o Estado de São Paulo só foram
realizadas 12 doações de ossos em 2007.

Assim como nos demais órgãos, a doação só pode ser feita após a constatação da
morte encefálica. Em 2007, foram 1.719 mortes nesta situação. Somente 22% doaram qualquer
tecido. Desses, 80% recusaram doar o osso. O primeiro grande motivo é que os familiares
acham que vai deformar o corpo, o que não é verdade. O osso doado é substituído por prótese e 73
o corpo é entregue à família sem deformação alguma.

6.9 Transplante de Córnea

O bulbo ocular é composto de três camadas. A camada externa, fibrosa, é formada


pela esclera e pela córnea. A camada média, vascular, chamada de úvea, consiste em íris, corpo
ciliar e coroide. A camada interna, retina, é a túnica mais nobre e a razão da existência das duas
anteriores, que oferecem a ela proteção e nutrição.
A córnea e o cristalino são os dois principais componentes ópticos do olho. Funcionam
como duas lentes focalizadoras. O poder de refração total do olho é de aproximadamente 58,6
dioptrias. A córnea é responsável por 43,05 dioptrias e o cristalino por 19,11. Assim sendo, a
córnea, mais especificamente sua superfície anterior, tem enorme importância óptica, pois é
responsável por mais de dois terços do poder refracional total do olho. Para manter sua
transparência, a córnea é privada de vasos. O limbo marca a transição entre a córnea,
74
transparente, de um lado, e a esclera, opaca, de outro, sendo fartamente suprido de vasos
sanguíneos e linfáticos, para alimentar a córnea.

Quando a transparência da córnea for atingida, de forma irreversível, seja por


inflamação, infecção, traumatismo, degeneração, distrofia, etc, seja também quando houver
somente alteração da forma da córnea, sem opacificação (ceratocone, por exemplo), o
transplante de córnea é indicado. Os transplantes de córnea são um tipo comum e altamente
bem-sucedido de transplante. Uma córnea com cicatriz ou opacificação pode ser substituída por
outra córnea transparente e sadia através de uma microcirurgia que leva aproximadamente uma
hora. As córneas provêm de doadores falecidos, não necessariamente em morte encefálica. A
enucleação (retirada do globo ocular) deve ser feita em até seis horas após o óbito do doador. A
doação de córnea está contraindicada apenas nas seguintes situações:

1. Óbito de causa desconhecida;


2. Óbito por doença do sistema nervoso central sem etiologia determinada;
3. Doença de Creutzfeldt-Jakob;
4. Panencefalite esclerosante subaguda;
5. Rubéola congênita;
6. Leucoencefalopatia multifocal progressiva;
7. Síndrome de Reye;
8. Encefalite subaguda, infecção cerebral por citomegalovírus;
9. Septicemia;
10. Hepatite;
11. Raiva;
12. Doenças oculares;
13. Cirurgia intraocular prévia;
14. Leucemia;
15. Doença de Hodgkin;
16. Linfossarcoma;
17. AIDS e grupos de risco.

A córnea raramente é rejeitada porque ela não possui uma irrigação sanguínea própria,
75
ela recebe oxigênio e outros nutrientes dos tecidos e líquido próximos. Como os anticorpos
(proteínas produzidas em resposta a antígenos, neste caso as do tecido estranho) e as células
do sistema imune, as quais circulam no corpo, não atingem a córnea transplantada, a rejeição de
um transplante de córnea é menos provável que a de um tecido que possui uma irrigação
sanguínea abundante.

6.10 Xenotransplantes

Os transplantes trouxeram benefícios significativos aos doentes, quer pelo aumento da


esperança de vida, quer pela melhora da qualidade da mesma. Na verdade, o sucesso foi tal que
provocou um abismo entre a procura do transplante e a escassez de órgãos e tecidos humanos
disponíveis para tal. Diante disso, muitas iniciativas, tais como campanhas publicitárias,
implementação de protocolos nos hospitais, programas de formação para o público e
profissionais foram implantadas com a intenção de diminuir tal abismo. No entanto, à medida que
o sucesso dos programas foi aumentando, maior foi a procura e tais estratégias não foram
suficientes para aumentar o número de doadores.

Desta forma, cresceu o interesse dos pesquisadores em descobrir caminhos


alternativos para satisfazer a escassez de órgãos e tecidos para transplante. Xenotransplante é
a denominação dada ao transplante de órgãos entre diferentes espécies e tem se constituído
numa opção alternativa para reduzir a escassez de órgãos e tecidos humanos. É uma técnica
que ainda se encontra pouco desenvolvida e, como tal, tem um longo caminho a percorrer no
mundo da investigação científica. Rodeia-se ainda de uma série de barreiras, de cunho clínico,
ético e financeiro.

Barreiras Clínicas

 Rejeição e infecção: O transplante bem sucedido de órgãos inteiros de


porcos geneticamente manipulados para seres humanos está se tornando cada vez menos 76
provável. O enorme problema da rejeição do órgão ainda não foi superado e experiências em
animais ainda não mostraram que o órgão de um porco pode realmente sustentar a vida de um
primata ou um ser humano. Por exemplo, o fibrinogênio (um agente coagulador do sangue) é
produzido pelo fígado. No entanto, não é provável que o fibrinogênio produzido pelo fígado de
porcos possa interagir adequadamente com plaquetas sanguíneas humanas, causando
hemorragias no receptor do transplante. Além disso, o risco de infecção de uma espécie para
outra e o aparecimento de doenças de origem não humana, em que o surgimento de vírus letais
poderá ser catastrófico, ainda assustam a população e a comunidade científica.

 Intoxicação: O uso maciço de medicamentos destinados a suprimir o


sistema imunológico nos receptores de um xenotransplante provoca reações tóxicas e aumenta
os riscos de câncer. Até mesmo pacientes que receberam um transplante de órgão humano
precisam de intervenção médica devido à sua reação aos medicamentos imunossupressores.
Esses medicamentos deverão ser ministrados em doses muito mais elevadas aos receptores de
xenotransplantes, causando ainda mais problemas médicos.

Barreiras Éticas

 Se por um lado há quem veja o xenotransplante como meio para


prolongar a vida e melhorar a qualidade da mesma, por outro há quem pense que o homem não
tem qualquer direito de utilizar os animais em seu próprio benefício.
 Coloca-se também o problema do tipo de animal usado e do uso de
espécies em vias de extinção.

Barreiras econômicas
 Como uma técnica em desenvolvimento, implica em grandes
investimentos.
 Além disso, os custos do xenotransplante são astronômicos. O uso
vitalício de medicamentos, as hospitalizações periódicas e a possibilidade de surgirem novas
doenças podem extenuar o sistema de saúde já sobrecarregado.

Diante de tais barreiras, conclui-se que o xenotransplante necessita de uma grande 77

concentração de forças, das quais se destacam as econômicas e científicas. Será necessário


muito tempo e estudo para investigação e controle clínico, como por exemplo: programas de
vacinação, prazo de vigilância médica para os pacientes, suas famílias e equipes médicas que
estiveram diretamente envolvidas.

Só depois dos riscos associados com possíveis transmissões de doenças infecciosas e


de difícil tratamento estiverem devidamente controladas é que será ético começar a
experimentação clínica em seres humanos. Quando isso acontecer, os xenotransplantes só
deveriam ser aplicados em pacientes humanos quando os resultados sugerissem que esta
operação teria hipóteses razoáveis de ser bem sucedida. Mas será de extrema importância que
os doentes deem o seu consentimento livre e sejam devidamente informados de todo o
processo.

É de grande importância o aparecimento de precauções e leis para todo o processo


que envolva o transplante de órgãos de animais para humanos. Sendo assim, é necessária a
criação de um corpo competente e conhecedor, que seja independente das equipes de
investigação que trabalham com esta técnica. Um exemplo seria a criação de um conselho
consultivo para o xenotransplante. Este deveria combinar o conhecimento científico e médico
necessário para examinar todos os protocolos que se relacionassem com este assunto.

Além de tudo aquilo já mencionado anteriormente, existe ainda outro problema, que é a
falta de informação do público em geral, referente a possíveis preconceitos ou medos. Existe por
isso uma grande responsabilidade dos pesquisadores, dos meios de comunicação e de todos
aqueles que são responsáveis por informar a sociedade, em dar a conhecer corretamente o
problema.
Na curta história dos xenotransplantes, nenhuma tentativa de colocar um órgão animal
em um corpo humano teve sucesso. As pessoas que receberam órgãos de animais sofreram
graves complicações e nenhuma deixou o hospital com vida. Todas morreram poucos meses
após o transplante. Desde o início dos xenotransplantes, as autoridades de saúde reconhecem
os riscos de transplantes de órgãos de animais para a saúde humana. Portanto, acredita-se que
o mesmo deve ser visto com cautela, e não ainda como alternativa à utilização de órgãos
78
humanos. Campanhas que busquem aumentar a conscientização da população sobre a doação
de órgãos, visando aumentar o número de doadores, continuam sendo a opção mais aceitável
do ponto de vista ético e científico.
7 ASSISTÊNCIA DE ENFERMAGEM EM DIFERENTES MODALIDADES DE TRANSPLANTES

7.1 Assistência de Enfermagem em Transplantes


79

A modalidade terapêutica do transplante veio enfatizar a importância da capacitação e


da qualificação dos enfermeiros. Para que haja uma assistência de enfermagem de qualidade
diferenciada é imprescindível que, além do domínio técnico, exista a sistematização das ações.
Estabelecendo e reavaliando o diagnóstico de enfermagem, conforme a evolução do paciente, o
enfermeiro intervirá com segurança em todos os níveis de alterações apresentadas pelo mesmo,
nas diversas fases do tratamento. Assim, deve-se criar os protocolos assistenciais de
enfermagem que garantirão esta sistematização, a padronização das condutas dos profissionais,
a construção de parâmetro de qualidade para assistência e a redução da possibilidade de
variações indesejadas nas condutas.

Diante disso, apresento a seguir 3 modelos de protocolos assistenciais, desenvolvidos


por enfermeiros altamente capacitados e atuantes na área de transplantes, referentes ao
transplante hepático, cardíaco e renal. O primeiro, alusivo ao transplante hepático, é extenso e
minuciosamente descritivo; o segundo, sobre o transplante renal, é mais enxuto, voltado
principalmente às questões voltadas exclusivamente ao transplante, e o cardíaco, apresentado
por último, traz apenas as considerações sobre as medidas para evitar complicações no
transplante cardíaco. É necessário ler as seções somando-se as anteriores, para que se possa
entender de maneira global como deve ser a assistência de Enfermagem ao paciente
transplantado.
7.2 Transplante Hepático

1) Fase pré-operatória do receptor

80
A atuação do enfermeiro no transplante hepático inicia-se no ambulatório, quando o
paciente é encaminhado para avaliação da indicação do transplante. É feita uma consulta por um
dos médicos da equipe e, posteriormente, discute-se o caso numa sessão clínica do grupo,
quando é confirmada ou não a indicação cirúrgica. Uma vez candidato ao transplante, o paciente
é encaminhado ao enfermeiro da equipe, que desenvolverá primordialmente as seguintes
funções:

- Realizar a consulta de enfermagem, levantando os seguintes dados:

CONSULTA DE ENFERMAGEM PRÉ-OPERATÓRIA

Identificação do paciente

Doença de base que indicou o transplante

História pregressa

Evolução e condições atuais de saúde

Medicamentos em uso

Tratamentos e cirurgias realizadas

História familiar e social

Hábitos alimentares
Atividade sexual

Traços étnico-culturais

- É feito também o exame físico, identificando-se aspectos de interesse para a


Enfermagem, como:

81

EXAME FÍSICO DURANTE CONSULTA DE ENFERMAGEM PRÉ-OPERATÓRIA

Estado de consciência e emocional

Higiene corporal

Cor, turgor e elasticidade da pele

Integridade cutaneomucosa

Condições da musculatura e capacidade de locomoção

Presença ou não de circulação colateral e condições da rede venosa periférica

Expansibilidade torácica e padrão respiratório

Presença ou não de ascite e hepatoesplenomegalia

Edema

Cicatrizes

Varizes de membros inferiores

Perfusão capilar

Aferição de parâmetros vitais e antropométricos e perímetro abdominal

- Orientar o paciente e a família quanto à (ao): protocolo de exames pré-operatórios,


incluindo finalidades, preparos, procedimentos e locais de realização; cirurgia, incluindo pré,
trans e pós-operatório; importância da adesão ao tratamento imunossupressor; critérios de
distribuição do órgão (MELD ou PELD).

Para essas informações são utilizados recursos audiovisuais, bem como um manual do
transplantado hepático, elaborado geralmente pela equipe multiprofissional que dá suporte ao
paciente transplantado. Este manual deve trazer, de forma clara e objetiva, as principais
informações e orientações referentes ao transplante, em todas as suas fases, e ser entregue ao 82
paciente e família logo no início das consultas pré-operatórias e de acompanhamento. As
informações importantes, de interesse do paciente, incluindo endereço e telefone do hospital e
da equipe, devem estar contidas nele.

- Programar junto aos enfermeiros das Unidades de Internação, Centro Cirúrgico e


Unidade de Terapia Intensiva, as visitas pré-operatórias, de acordo com protocolos específicos
de cada setor e conforme as condições e o interesse do paciente e da família. As visitas
programadas têm por objetivo prepará-los para as diversas fases do período de internação,
buscando reduzir o nível de ansiedade, informando e esclarecendo dúvidas. Este momento
também possibilitará uma aproximação junto às equipes, a apresentação da área física das
unidades, as rotinas de cada serviço, bem como equipamentos utilizados e procedimentos
habitualmente realizados. Em relação à UTI, as visitas também visam desmistificar o ambiente
da terapia intensiva, comumente chamada de “lugar para morrer”.

- Informar-se dos resultados dos exames laboratoriais, imagenológicos,


histopatológicos, realizados durante a avaliação pré-operatória dos vários sistemas e órgãos.
Cabe ressaltar a importância de o enfermeiro estar ciente também das avaliações e/ou
acompanhamento dos demais membros da equipe multiprofissional (nutricionista, assistente
social, psicólogo, fisioterapeuta, terapeuta ocupacional, dentista, especialistas médicos).

- Manter integração entre o centro de captação de órgãos e a equipe de transplante.

Ao surgir um doador em potencial, o centro de captação de órgãos aciona o enfermeiro


coordenador de transplantes que faz uma seleção preliminar dos pacientes em lista de espera,
cujos protocolos pré-transplante estejam concluídos, ou em situação considerada superurgente
(hepatite fulminante e retransplante), contatando posteriormente o plantonista médico do grupo.
Ocorrendo a confirmação da doação e feita a seleção final do receptor, o enfermeiro deverá:
- Convocar o receptor para admissão imediata no hospital.

- Acionar as equipes cirúrgicas da retirada do fígado e do implante, o


anatomopatologista, os anestesiologistas, o bioquímico, os enfermeiros do centro cirúrgico e da
UTI, o instrumentador e o perfusionista.

- Comunicar aos setores assistenciais e de apoio a realização da cirurgia: setor de


83
admissão, unidade de internação, centro cirúrgico, UTI, laboratório de urgência, central de
materiais e esterilização, serviço de nutrição e dietética e farmácia.

- Confirmar reserva de sangue e hemoderivados, conforme solicitação no pré-


operatório imediato.

- Responsabilizar-se por todo o material e instrumental cirúrgico utilizado na retirada e


posterior preparo e implante do órgão.

- Compor a equipe de retirada e transporte do enxerto.

- Preparar e realizar a perfusão e conservação do órgão.

2) Fase pré-operatória imediata do receptor

Os objetivos da assistência de enfermagem, no pré-operatório imediato, visam ao


preparo físico e emocional do paciente para enfrentar a grande cirurgia ao qual será submetido.
As ações de enfermagem devem fazer parte de uma assistência global sistematizada, conforme
protocolo estabelecido desde a inclusão do paciente em lista de espera. Ao fazer a admissão do
paciente na unidade de internação, a enfermagem atualiza os dados relativos às condições de
saúde e ao exame físico, buscando identificar complicações ou o risco de instalação das
mesmas.

Através da comunicação interprofissional, essas complicações podem e devem ser


tratadas, prevenindo a exacerbação do quadro no trans e no pós-operatório imediato. É feita a
antropometria e aferição de sinais vitais, imprescindíveis para o cálculo de anestésicos e outras
drogas que serão usadas nas fases peri e pós-operatórias. Neste momento, é comum o paciente
estar acompanhado dos familiares, que vivenciam o estresse pré-operatório. A enfermagem
deve criar condições para que eles expressem suas angústias, ansiedades, medos e dúvidas.

É importante ouvi-los e orientá-los, procurando aliviar seus anseios e diminuir suas


inquietações. Dependendo do estado geral do paciente, é feito o banho de aspersão ou no leito,
usando sabão degermante de PVPI ou outro, em caso de alergia. A tricotomia é controversa e
indicada somente em instituições em que tal medida é rotineiramente aplicada a pacientes 84
cirúrgicos. Após o banho e tricotomia, quando indicado, é feita uma degermação prévia da pele
com solução degermante de PVPI ou clorexidina, em ambos os braços, onde serão instalados os
cateteres venosos; na região cervical, local de inserção do cateter central; axilares esquerda e
direita, tórax, abdome, genitália e região inguinal direita.

Antibióticos profiláticos são indicados para reduzir a colonização do trato


gastrintestinal, evitar a infecção da ferida operatória ou prevenir contra infecção por vírus
oportunista, e o pré-anestésico é rotineiramente administrado para produzir sedação inicial,
relaxamento muscular e redução do estresse pré-operatório. O paciente é ainda orientado
quanto ao jejum e à colheita de sangue para a última revisão laboratorial pré-operatória e é
encaminhado ao setor de radiologia para um exame de tórax. São retiradas jóias, próteses e
roupas íntimas do paciente, e o mesmo é orientado a fazer esvaziamento vesical, antes de ir
para o centro cirúrgico.

A enfermagem pode elaborar uma lista de conferência pré-operatória conforme o


modelo abaixo, de forma a garantir a qualidade da assistência, já que item por item da lista
deverá ser revisto e checado. São registrados no prontuário do paciente todos os dados
levantados referentes à anamnese e ao exame físico, a medicação administrada, os cuidados e
orientações realizados na unidade de internação, além de passar verbalmente essas
informações à enfermagem do centro cirúrgico, que receberá o paciente.

LISTA DE CONFERÊNCIA PRÉ-OPERATÓRIA

Nome do Paciente: Leito: Registro:

( ) O paciente está em jejum


( ) Colhido sangue para revisão laboratorial

( ) Feita radiografia de tórax

( ) Realizada tricotomia em regiões ____________________________

( ) Banho com uso de solução degermante ______________________

( ) Aplicada solução antisséptica conforme protocolo


85
( ) Anotados os parâmetros vitais e antropométricos (peso, altura e circunferência abdominal)

( ) Administradas todas as medicações prescritas

( ) Confirmada reserva de sangue

( ) Retiradas jóias e próteses, e familiares foram orientados quanto à guarda dos mesmos

( ) Estimulada micção. Anotados volume e aspecto.

( ) Anotados todos os procedimentos realizados

( ) Anexados os exames complementares ao prontuário

Data:___________ Horário: Assinatura e COREN:

3) Fase transoperatória

Assim como em qualquer cirurgia, o paciente está sujeito a riscos e, entre eles, a
rejeição do órgão transplantado e a infecção pós-operatória merecem destaque. A enfermagem
cirúrgica pode atuar efetivamente no controle da infecção da ferida operatória. A cirurgia de
transplante hepático é considerada uma cirurgia limpa. O tempo cirúrgico varia de 4-12 horas,
exigindo anestesia prolongada, com grande manuseio de tecidos e órgãos, necessidade de
ampla reposição de líquidos e sangue, sem contar o estresse físico e psicológico ao qual o
paciente está sujeito.

Pelo caráter de urgência do procedimento, é necessário que a gerência de


enfermagem do centro cirúrgico atente para alterações na escala, que podem se fazer
necessárias para adequar o quadro de funcionários às demandas exigidas pela magnitude do
procedimento. O enfermeiro do centro cirúrgico é o responsável pelo preparo e
acondicionamento de todo o material e instrumental cirúrgico utilizado nos diversos momentos da
cirurgia, bem como pelo provimento de materiais de consumo estéreis e montagem das salas de
operações.

Em alguns casos, as cirurgias do doador e receptor são feitas no mesmo hospital, 86


portanto nestes casos devem ser reservadas três salas de operação para todo o procedimento.
Uma para o doador, uma para o back table (preparo do enxerto) e uma para o receptor. A sala
destinada ao receptor deve ser maior, de forma a acomodar um número maior de aparelhos e de
membros da equipe anestésico-cirúrgica.

O transporte do paciente a ser transplantado é feito até o centro cirúrgico pela equipe
de transporte do setor, sendo recepcionado pelo enfermeiro da equipe, que recebe as
informações referentes ao paciente e confere seu prontuário. O paciente é transportado à sala
cirúrgica e recebido pelos anestesiologistas e equipe de enfermagem da sala de operações. O
receptor é transferido da maca para a mesa cirúrgica, provida de colchão térmico forrado com
controlador de fluidos corpóreos, que os absorve com eficiência minimizando o contato e a
potencial contaminação dos profissionais, além de evitar a hipotermia.

Os procedimentos de monitoração cardíaca, oximetria, cateterização radial direita e


esquerda são iniciados como protocolado para grandes cirurgias. O paciente é posicionado em
decúbito dorsal, instalado cateter vesical de demora, sonda nasogástrica, e instalada a placa
neutra do bisturi elétrico, preferencialmente na panturrilha. É importante lembrar-se de colocar
coxins de proteção em zonas de maior atrito (calcâneos, proeminências ósseas em geral).

Simultaneamente, são montadas três mesas cirúrgicas, sendo uma para o preparo dos
equipamentos da circulação extracorpórea do fígado (nem sempre necessária), outra com os
instrumentais cirúrgicos, e os instrumentos especiais são dispostos na mesa de Mayo. É feita a
antissepsia das regiões torácicas e axilares, abdominal e inguinais direita e esquerda, utilizando
solução de PVPI degermante e, a seguir, PVPI tópico. São colocados os campos adesivos na
região abdominal.

Durante o período transoperatório, permanecem na sala de operação, além da equipe


médica, enfermeiros, técnicos, instrumentador, perfusionista, e geralmente há revezamento ao
longo do tempo cirúrgico, por se tratar de cirurgia extensa. A equipe de enfermagem também
desenvolve as seguintes atividades: auxilia a equipe médica na paramentação; faz observações
quanto à manutenção das técnicas assépticas no campo cirúrgico; encaminha exames
laboratoriais; providencia para que os soros, sangue e hemoderivados estejam aquecidos e
prontos para o uso imediato; faz provisão de cilindro de oxigênio e orienta quanto aos cuidados
durante o transporte do paciente à UTI; faz relatório de enfermagem, preenche a folha do
87
transoperatório, auxilia no controle dos volumes infundidos e eliminados, com registro na ficha do
transoperatório. Além disso, controla o fluxo de pessoas estranhas na sala de operação, para
que a equipe cirúrgica tenha um ambiente propício, ao mesmo tempo em que faz o controle
sobre o risco de infecção ambiental, decorrente do trânsito constante de pessoas na sala.

Após o término da cirurgia e transferência da mesa para a maca, o paciente é coberto


com campo cirúrgico estéril e cobertores aquecidos, para prevenir a hipotermia durante seu
transporte à UTI. O mesmo permanece na sala de operações alguns minutos após o término da
cirurgia para detectar sinais de hemorragia precoce e desequilíbrio hemodinâmico grave. Se
estiver estável, deve-se comunicar à UTI sobre a transferência do paciente.

O transporte do paciente é um momento importante a ser considerado. Trata-se de um


paciente de alto risco, com alterações hemodinâmicas importantes, com instabilidade da
temperatura corporal, submetido a uma cirurgia de longa duração, com uma multiplicidade de
linhas venosas, arteriais, drenos, cateteres e tubo orotraqueal. Tudo isto exige um transporte
rápido e seguro, para se evitar acidentes de percurso. O paciente deve seguir com a pressão
arterial média (PAM) monitorada, um oxímetro de pulso, estar aquecido e protegido, por menor
que seja a distância e mais rápido o trajeto. Atenção redobrada deve ser dada à ventilação, com
o objetivo de fornecer a mais alta concentração de oxigênio possível.

4) Fase pós-operatória

Na UTI
Na UTI, o planejamento dos cuidados de enfermagem ao paciente transplantado
objetiva avaliar, detectar, antecipar e intervir nas potenciais complicações que se seguem ao
transplante: complicações técnicas resultantes de um procedimento cirúrgico complexo e
extenso, e aquelas decorrentes da resposta imunológica do hospedeiro ao enxerto e do regime
de imunossupressão.

O conhecimento prévio dos candidatos ao transplante fornece importantes dados na 88


avaliação e no acompanhamento pós-operatório desses pacientes na UTI. A indicação clínica
para o transplante, as características da doença de base, o estágio de evolução da patologia, o
reconhecimento das manifestações clínicas da doença, bem como a percepção dos aspectos
sociais e emocionais que envolvem o paciente e sua família, constituem informações adicionais
que possibilitarão ao enfermeiro intensivista uma abordagem holística do paciente frente às
intercorrências no pós-operatório imediato, reconhecidamente uma das fases mais complexas do
transplante.

A Unidade deve ser preparada com antecedência para a chegada do paciente e o


quadro abaixo mostra uma sugestão de lista de conferência no preparo do leito do paciente
transplantado na UTI:

LISTA DE CONFERÊNCIA NO PREPARO DO LEITO DE UTI

Leito com grades laterais, ajustável a diferentes posições

Monitor de eletrocardiograma

Eletrocardiógrafo

Ventilador de volume com termoumidificador

Bombas de infusão: no mínimo três

Cobertores térmicos

Monitores de pressão: PAM, PVC, DC


Monitor de PA não-invasiva

Oxímetro de pulso

Sistema de vácuo, oxigênio e ar comprimido

Glicosímetro

Tomadas elétricas e extensões


89
Equipamentos de proteção individual (EPIs)

Relógio/calendário

As infecções constituem a maior causa de morbidade e mortalidade após transplantes.


Devemos destacar que, para o paciente de UTI, fontes exógenas como a própria equipe,
procedimentos habitualmente utilizados em terapia intensiva, artigos e equipamentos constituem
um risco adicional aos pacientes transplantados. A indicação de isolamento protetor em quarto
privativo é controversa, mas não podemos esquecer que os pacientes transplantados são de
incontestável alto risco, submetidos a uma extensa e complexa intervenção cirúrgica, em regime
de imunossupressão e em uso de diversos procedimentos invasivos, estando, portanto, mais
vulneráveis a patógenos comuns e oportunistas, além da possibilidade de terem reativadas
infecções latentes, como tuberculose, citomegalovírus e herpes.

Diante disso, não oferecemos aqui uma resposta, mas cabe uma política institucional
que defina normas de prevenção e controle de infecção considerando riscos, benefícios e custos
de determinadas práticas. Os princípios de assepsia e lavagem das mãos devem ser reforçados
conforme preconizado, além da adoção de outras precauções padrão, como métodos simples e
de baixo custo na prevenção e redução da incidência de infecções hospitalares.

A continuidade do suporte iniciado no transoperatório é de fundamental importância na


assistência de enfermagem intensiva. A recepção do paciente na UTI é um momento de
fundamental importância, pois é um momento de troca de informações entre as equipes do
centro cirúrgico e UTI. Deve-se informar as particularidades de todos os procedimentos
realizados, bem como de qualquer complicação potencial esperada para que sinais e sintomas
pertinentes sejam prontamente reconhecidos. Nenhum detalhe deve ser omitido.
Num primeiro momento, o enfermeiro e sua equipe devem realizar uma rápida
inspeção, a fim de detectar e corrigir possíveis acidentes, como desconexões, obstruções e
deslocamentos, que possam ter ocorrido durante o transporte. A seguir, uma meticulosa
avaliação deve ser realizada, observando todos os dispositivos, feridas cirúrgicas, drenos
aspirativos e cateter vesical, e será então reiniciada a infusão das medicações e toda a
monitorização do paciente, nos aparelhos próprios da terapia intensiva.
90
Só então o enfermeiro deverá planejar a assistência de enfermagem, de forma
sistematizada, pautada nas avaliações clínicas e na monitoração de todos os sistemas
fisiológicos, identificando e intervindo prontamente nas intercorrências e complicações, além de
oferecer suporte emocional ao paciente e sua família.

No caso do transplante hepático, o protocolo desta fase deve incluir:

 Monitoração de sinais vitais: T, P, FR, PA e dor, a cada 15 minutos, até


estabilização, e depois de hora em hora.
 Monitoração de dados hemodinâmicos, a cada 30 minutos até
estabilização, depois de hora em hora.
 Monitoração do débito cardíaco a cada duas horas, ou com maior
frequência, em casos de instabilidade hemodinâmica. A indicação da monitoração
hemodinâmica invasiva é sustentada pela extensa perda volêmica no trans e no pós-
operatório: hemorragias decorrentes de rupturas de anastomoses, coagulopatias,
úlceras de estresse e desequilíbrios de fluidos em resposta ao trauma cirúrgico.
 Monitoração da temperatura axilar (evitar a retal), ou através do cateter
de artéria pulmonar, a cada hora, e após estabilização, a cada quatro horas. Espera-se o
retorno à normotermia até oito horas após admissão.
 Avaliação dos pulsos centrais e periféricos quanto à frequência,
amplitude, ritmo e simetria a cada quatro horas. A avaliação dos pulsos das
extremidades superior e inferior, bem como da perfusão, cor e temperatura, oferece a
oportunidade de detectar precocemente sinais de insuficiência vascular relacionada com
o procedimento de bypass endovenoso, quando utilizado.
 Avaliação de enchimento capilar, temperatura da pele, estado de
hidratação, turgor e presença de edema.
 Mensuração do volume dos drenos supra e infra-hepáticos e biliar a
cada duas horas, nas primeiras seis horas, e depois a cada quatro horas. Avaliar o
débito dos drenos. Se maior do que 50ml/h, notificar. Avaliar permeabilidade dos drenos;
a redução abrupta do débito deve ser investigada. Avaliar cor e consistência das
drenagens. 91
 Mensuração do volume urinário horário, bem como glicosúria, cetonúria,
pH urinário e gravidade específica a cada quatro horas. Alterações do débito urinário e
mudanças no aspecto da urina devem ser imediatamente comunicadas.
 Controle e registro integral de todos os volumes administrados e
eliminados.
 Pesquisa de presença de sangue nas fezes, urina, secreção gástrica e
traqueal. Notificar, se positiva.
 Pesquisa e avaliação de sinais de sangramento e a extensão do mesmo
pela ferida cirúrgica e nos sítios de inserção de cateteres venosos e arteriais, drenos
aspirativos e dreno biliar (se presente).
 Checagem do pH da secreção gástrica a cada seis horas.
 Mensuração da circunferência abdominal a cada quatro horas, nas
primeiras oito horas de pós-operatório imediato, com o objetivo de detectar
precocemente coleção de fluidos no abdome.
 Avaliação dos sinais de possíveis reações transfusionais.
 Registro eletrocardiográfico diário.
 Avaliação e detecção de possíveis manifestações clínicas decorrentes
de alterações metabólicas e hidroeletrolíticas.
 Instituição de medidas de aquecimento até normalização da temperatura
corporal: ventilação com nebulização aquecida, calor radiante, algodão, cobertores
térmicos, é importante manter cabeça, tórax e membros protegidos.
 Avaliação do padrão respiratório: expansibilidade, simetria e ausculta
quanto à presença de ruídos adventícios e anormalidades dos sons respiratórios
decorrentes de atelectasias e derrame pleural.
 Manutenção das vias aéreas pérvias, através de rigorosos cuidados
respiratórios. Manter correto posicionamento do tubo orotraqueal, evitando trações,
dobras e acotovelamentos dos circuitos do ventilador.
 Reposicionar o paciente a cada duas horas se estiver estável,
favorecendo adequada expansão pulmonar, melhorando a troca gasosa e facilitando a
drenagem de secreções.
 Observação rigorosa do paciente estabelecendo uma relação de 92
confiança, durante a retirada progressiva do ventilador. Sinais vitais, saturação de
oxigênio e nível de consciência devem ser avaliados e registrados com maior frequência.
 Avaliação da dor quanto à localização, tipo e frequência. A dor pode
restringir e limitar incursões respiratórias efetivas, tornando o padrão respiratório
superficial, contribuindo para o desenvolvimento de atelectasias e distúrbios de
ventilação-perfusão. O aumento da pressão intra-abdominal por sangramento pode
inclusive comprometer as funções respiratória e renal.
 Fornecimento de oxigênio suplementar, aquecido e umidificado, por
máscara facial após extubação. Observar sinais precoces de dificuldade respiratória.
 Mobilização do paciente no leito e depois na poltrona, estimulando
movimentação ativa dos membros.
 Incentivo para a realização de exercícios respiratórios e mobilização
passiva e ativa sob supervisão da equipe de fisioterapia.
 Avaliação de sinais neurovitais: utilizar a escala de Glasgow de hora em
hora. Alterações neuropáticas são um importante sinal de encefalopatia hepática,
alterações metabólicas (hipoglicemia), dentre outros.
 Reforço de medidas de controle e prevenção de infecção para toda a
equipe: lavagem rigorosa das mãos, redução do trânsito à beira do leito, utilização de
EPIs e adoção das precauções padrão.
 Inspeção da ferida operatória, incisões e todos os locais de inserção de
drenos e cateteres, em busca de sinais de infecção. Lembrar que os sinais locais
precoces de infecção e inflamação podem ser mascarados pelo uso de esteroides, bem
como pela resposta do organismo à infecção, febre e leucocitose. A observação deve
ser redobrada na hora da troca de curativos.
 Manutenção de técnica asséptica na manipulação de cateteres venosos,
drenos e linhas de monitoração.
 Coleta de culturas conforme protocolo instituído, acompanhando os
resultados.
 Inspeção da cavidade oral, pele e região perianal, para avaliação das
condições da mucosa, bem como de sinais de crescimento bacteriano. A higiene oral
deve ser realizada cuidadosamente a cada quatro horas. A região perianal deve ser 93
higienizada várias vezes ao dia, com sabonete neutro. Os cuidados com a pele incluem,
além da inspeção diária, a hidratação e a proteção das proeminências ósseas. Soluções
alcoólicas não devem ser utilizadas pelo risco de ressecamento da pele,
comprometendo a integridade cutaneomucosa, interrompendo importante linha de
defesa contra infecções.
 Acompanhamento do protocolo de imunossupressão, atentando para os
efeitos adversos dos imunossupressores, já vistos anteriormente, destacando a
nefrotoxicidade, hipertensão arterial, neurotoxicidade, distúrbios de comportamento,
distúrbios metabólicos, leucopenia e plaquetopenia.
 Oferecer segurança e suporte emocional ao paciente e sua família,
através de explicações claras e objetivas sobre o tratamento, evolução clínica do
paciente e quaisquer outras informações que estes desejem.
 Promover um ambiente de tranquilidade e repouso, que favoreça o
descanso do paciente: controlar o tráfego de pessoal, estímulos sonoros e luminosos.
Planejar os cuidados de enfermagem de forma a concentrar procedimentos,
possibilitando períodos de sono ininterrupto pelo menos um ciclo completo de 90
minutos a cada 12 horas.
 Avaliação da etiologia da insônia e detecção de sinais de privação do
sono.
 Inclusão de atividades diversificadas e técnicas de relaxamento durante
a permanência na UTI, tais como música, leitura, televisão e atividades manuais.
 Estímulo à independência e favorecimento da participação da família na
recuperação do paciente.
Com uma evolução satisfatória, o paciente geralmente permanece na UTI por dois a
quatro dias. Assim que a estabilidade é atingida, são gradativamente removidas todas as linhas
venosas centrais e arteriais, permanecendo o paciente apenas com um acesso venoso periférico
(para administração de medicamentos). Amostras de todos os cateteres retirados devem ser
colhidas e enviadas para cultura.

A extubação é realizada geralmente no primeiro dia de pós-operatório e deve seguir o 94


protocolo do serviço. Se sons intestinais estão presentes, a sonda nasogástrica é removida e a
dieta é gradativamente iniciada. Os cateteres urinário e gástrico são comumente retirados após
24 horas de pós-operatório e os drenos aspirativo e biliar, se presentes, são mantidos.

Por ocasião da transferência do paciente para a Unidade de Internação, o enfermeiro


intensivista deve informar o enfermeiro da unidade a respeito da evolução do paciente no pós-
operatório imediato, as principais intercorrências, complicações, bem como as intervenções de
enfermagem e quaisquer recomendações relevantes, visando garantir a continuidade da
assistência de enfermagem.

Na Unidade de Internação

As informações sobre o transoperatório, o pós-operatório imediato, as intercorrências


apresentadas na UTI e a terapêutica medicamentosa constituem dados essenciais para o
enfermeiro planejar e cuidar na unidade de internação. Assim que o paciente retorna, é feito um
exame físico objetivo, procurando levantar dados sobre:

Levantamento de dados sobre Características

Estado geral do paciente Aspecto emocional e físico; permitir que o


paciente expresse seus sentimentos

Condições da pele Atentar para feridas operatórias, sítios de


inserção de cateteres e drenos. O objetivo é a
detecção de possíveis sinais flogísticos ou
pontos secretantes e de lesões associadas ao
uso de drogas.

Padrão respiratório Atelectasias, derrame pleural e a embolia são


comuns no pós-transplantado hepático.

Frequência cardíaca, características do pulso Referencial para avaliar alterações desses


periférico, temperatura axilar e pressão arterial parâmetros, relacionadas com o uso de 95
drogas, infecções ou rejeição.

Queixas de dor e sinais de edema, hematoma As discrasias sanguíneas podem persistir até a
e equimoses em qualquer local normalização da função do enxerto.

Regiões de proeminências ósseas Risco de desenvolver úlceras de pressão.

Grau de dependência do paciente Com o objetivo de estabelecer a demanda


apropriada de cuidados de enfermagem.

Condições dos acessos venosos Administração de medicamentos.

Abdome Avaliar o perímetro abdominal, caso o paciente


tenha evoluído com ascite pré-operatória;
presença ou não de circulação colateral e dor
associada à palpação do fígado.

Quanto ao protocolo assistencial de enfermagem nessa fase, deve incluir uma


minuciosa avaliação clínica, conforme o quadro a seguir:

MONITORAÇÃO CLÍNICA DO TRANSPLANTADO HEPÁTICO

Verificar parâmetros vitais a cada quatro horas até a estabilização e após, de seis em seis horas.
A hipertensão pode estar relacionada com o esquema de imunossupressão, com a rejeição e
com outras causas. A taquicardia pode refletir instabilidade hemodinâmica, infecção ou rejeição.
A febrícula pode indicar rejeição. Alterações no sistema respiratório são comuns nos pacientes
transplantados.

Observar sinais e sintomas de rejeição: febrícula, mal-estar, taquicardia, fígado aumentado e


doloroso à palpação, icterícia e acolia fecal.

A confirmação do diagnóstico de rejeição se dá somente por biópsia hepática.

Observar e comunicar sinais e sintomas de outras complicações como: dispneia, tosse seca ou
96
produtiva, náuseas, vômitos ou diarreias prolongadas, dor, sangramento.

Observar efeitos colaterais da imunossupressão, dependendo do fármaco utilizado nos


esquemas de cada serviço (ver capítulo sobre imunossupressão).

Pesar e aferir o perímetro abdominal do paciente diariamente. Estes dados auxiliam na avaliação
do estado nutricional e do equilíbrio hídrico do paciente, além de monitorar a evolução da ascite,
quando presente.

Medir e anotar volume e aspecto da diurese. A síndrome hepatorrenal pré-operatória comum nos
hepatopatas, a nefrotoxicidade da ciclosporina, a resposta ao trauma cirúrgico e a rejeição
comprometem, às vezes de forma grave, a função renal.

Verificar a glicosúria a cada seis horas. Comunicar, se positiva, uma vez que alguns pacientes
necessitam de insulina para controlar a hiperglicemia induzida pelos esteroides.

Fazer balanço hídrico, constituindo um dado para avaliar a função hepatorrenal, controlar o uso
de diuréticos e identificar desequilíbrio hídrico do paciente.

Observar aspecto e frequência das evacuações. Ao retornar a produção, a excreção e a


drenagem normais da bile, as fezes, antes acólicas, passam a apresentar a coloração marrom.

- Observação das feridas operatórias e sítios de inserção dos cateteres e drenos,


atentando para sinais flogísticos e presença de secreção. As incisões realizadas nas regiões
axilar e femoral podem romper canais linfáticos e favorecer a drenagem de linfa por algum
tempo. Conforme a rotina instituída por cada serviço, deve-se estabelecer a terapêutica
adequada para os pontos secretantes.
- Retirada dos pontos cirúrgicos em torno do vigésimo dia pós-operatório, após
avaliação do cirurgião. A retirada dos mesmos é tardia em função do retardo cicatricial
provocado pelo corticoide.

- Cuidados com o dreno biliar, se utilizado e conforme descrição prévia. Por volta do
sétimo dia de pós-operatório são feitas uma colangiografia via dreno biliar, uma ultrassonografia
e uma biópsia hepática percutânea. Havendo alteração importante de crase sanguínea, são 97
prescritos hemocomponentes para infusão antes e após a punção, com o objetivo de evitar
sangramentos. É indicado antibiótico profilático em alguns serviços e administrado antes da
colangiografia. Não havendo alterações na árvore biliar pela ultrassonografia e pela
colangiografia, o dreno é fechado e mantido por três a seis meses, dependendo do serviço,
quando será então retirado. Queixas de cólica abdominal, mal-estar e febre durante as primeiras
24 horas de pinçamento do dreno devem ser notificadas. O aparecimento desses sintomas pode
indicar obstrução ou infecção de vias biliares e requer reabertura do dreno.

- Cuidados com drenos aspirativos, se ainda mantidos nesta fase. Encaminhar pontas
de cateteres e drenos para cultura conforme protocolo do serviço.

- Higiene do paciente ou acompanhamento nos primeiros dias, se necessário. Atenção


especial deve ser dada à cavidade oral, à genitália e à região perineal, tendo em vista o risco de
colonização e infecção por fungos nessas áreas.

- Acompanhamento e ajuda, se necessário, na alimentação do paciente, registrando e


comunicando alterações no padrão de ingesta.

- Manutenção das precauções-padrão na manipulação do paciente, suas secreções e


excreções e materiais de risco utilizados.

- Administração de medicamentos prescritos conforme a necessidade do paciente e o


protocolo de cada serviço. Nessa fase de recuperação, o paciente usa habitualmente as
seguintes medicações, por via oral: imunossupressores, antifúngicos, diuréticos, antiulcerosos,
antibióticos, suplementos vitamínicos e sais minerais. Os princípios na administração de
medicamentos devem ser observados, incluindo atenção especial na monitoração dos efeitos
adversos de cada droga. Mediante a inabilidade do paciente em tomar qualquer medicamento
prescrito, comunicar.
- Reforço nas orientações da fisioterapia e auxiliar o paciente, quando necessário, na
realização dos exercícios, estimulando a sua independência.

- Providências quanto aos encaminhamentos relativos a exames laboratoriais,


imagenológicos, anátomo-patológicos, etc, visando a qualidade nos processos propedêuticos.

98
Os cuidados acima mencionados, nessa última fase de contato da enfermagem com o
paciente hospitalizado, devem ter como meta principal a motivação do paciente e familiares no
sentido de prepará-los para o autocuidado, já preparando-os para a alta hospitalar.

Alta hospitalar

O momento da alta hospitalar é muito aguardado pelo paciente e seus familiares, mas
pode ao mesmo tempo gerar muita tensão, uma vez que dúvidas quanto ao estado do paciente e
seus cuidados no ambiente domiciliário podem existir. É importante que o enfermeiro esteja
sensível a estas questões no momento da alta e mesmo durante a internação do paciente,
planejando fornecer as muitas informações de alta em pequenas porções, dia após dia. Tal
medida pode favorecer a assimilação das orientações pelo paciente e familiares, bem como
reduzir a ansiedade. Tais orientações estendem-se a todas as modalidades de transplante.

Para conduzir as orientações de alta, o enfermeiro deve estar atento a algumas


questões importantes referentes ao ambiente: este deve ser calmo, contando apenas com a
presença do paciente e do cuidador; deve-se evitar barulho: desligar tevê, evitar interrupção,
fechar a porta; é importantíssimo utilizar linguagem clara e objetiva, de acordo com o nível de
compreensão do paciente; confirmar a aprendizagem, pedindo ao paciente e/ou cuidador que
repita o seu entendimento acerca de alguns pontos principais. É sempre bom orientar que, em
casos de dúvidas, o paciente ou familiar deverá ligar no hospital e procurar por um enfermeiro da
equipe.

Por ocasião da alta hospitalar, espera-se que o paciente transplantado esteja apto a:
Manter dieta condizente com suas necessidades nutricionais. Evitar consumo de doces e
frituras, beber somente água filtrada.

Realizar monitoração do peso diário, temperatura e pressão arterial e características das


eliminações.

Conhecer os nomes, indicações, dosagens, intervalos, vias de administração e efeitos adversos


99
de todos os medicamentos em uso, especialmente os imunossupressores.

Tomar corretamente a medicação prescrita.

Reconhecer sinais e sintomas relacionados aos efeitos adversos das drogas em uso.

Identificar sinais e sintomas de infecção oportunista e de rejeição e vir para o hospital,


imediatamente, caso estes se apresentem.

Manter cuidados com o dreno biliar, se ainda utilizado.

Desenvolver atividades de lazer ou trabalho, compatíveis com a imunossupressão.

Procurar o hospital, o grupo de transplante ou qualquer profissional envolvido com o programa


fora dos retornos previamente agendados, diante de uma necessidade urgente.

Compreender a importância da realização dos exames e dos retornos ambulatoriais frequentes


para controle com a equipe de transplante.

Registrar em um diário, criado exclusivamente para este fim, todos os dados da sua evolução
diária.

Evitar aglomerações, contatos com qualquer tipo de animal e pessoas doentes, pelo menos nos
seis primeiros meses pós-transplante. Usar máscara e lavar as mãos, caso necessite se expor.

Compreender a dinâmica com a qual poderá voltar a desempenhar atividades físicas: limitações
de peso por 60 dias após o transplante; esforço: subir escada devagar com uso de corrimão se
necessário; direção de carros após 30 dias apenas; atividade sexual após liberação médica
(geralmente em torno de 30 dias após transplante). Exercícios Físicos: caminhadas de 15
minutos inicialmente; uso de cinta para obesos ou pacientes com sobrepeso, deve ser
providenciada desde a internação.

Acompanhamento ambulatorial

100
Após a alta, o paciente é orientado a fazer o controle ambulatorial com retornos
semanais, passando a quinzenais, mensais, conforme a evolução do mesmo. Esse
acompanhamento tem por objetivos:

 Avaliar a readaptação fisiológica diante do trauma anestésico-cirúrgico


de grande porte;
 Fazer controle terapêutico dos imunossupressores ou outras drogas,
mediante titulação periódica e ajustes das doses;
 Fazer avaliação clínica e laboratorial, buscando identificar precocemente
sinais e sintomas de infecção, rejeição ou de outras complicações e dar suporte no
retorno às atividades sociais do paciente.

A espera exaustiva até a realização da cirurgia e a alta hospitalar, associada ao medo


da rejeição e infecção, os controles ambulatoriais e domiciliares, e as alterações do padrão de
vida ao qual o paciente estava habituado são algumas fontes de estresse possíveis no ambiente
familiar. O enfermeiro deve estar sensível a elas e procurar desenvolver estratégias e
intervenções que busquem minimizar o impacto do transplante nas relações familiares.
Falaremos mais sobre isso no capítulo sobre a família do paciente transplantado.
7.3 Transplante Renal

1. Período pré-operatório imediato

101

Os objetivos da assistência de enfermagem, no pré-operatório, visam o preparo bio-


psico-sócio-espiritual e emocional do paciente e familiares/cuidadores para enfrentar o trauma
anestésico-cirúrgico ao qual será submetido, a avaliação física e continuidade do tratamento. A
enfermeira deverá garantir a interação multidisciplinar, para viabilizar os cuidados necessários ao
paciente no período perioperatório.

O enfermeiro deve possibilitar ao paciente e familiar/cuidador o esclarecimento de


dúvidas, uma vez que é o elemento da equipe de saúde que mais tempo permanece ao lado dos
mesmos, sendo um elo entre a equipe multidisciplinar e os pacientes. Estes esclarecimentos
deverão ser feitos avaliando previamente o estado bio-psico-sócio-espiritual e emocional do
paciente.

Portanto, cabe ao enfermeiro:

 Implementar atividades de educação e ensino do paciente e


familiar/cuidador em todas as fases do período perioperatório da cirurgia, incluindo os
cuidados com a terapia imunossupressora, coleta de exames clínico-laboratoriais,
prevenção de complicações da doença de base e adesão ao tratamento proposto;
 Realizar entrevista e exame físico, buscando identificar complicações ou
risco de instalação das mesmas, bem como o levantamento dos principais diagnósticos
de enfermagem no pré-operatório.
 Planejar a assistência de enfermagem, designando membros da equipe
para: desempenhar as diversas atividades e procedimentos importantes no preparo e
encaminhamento do paciente ao centro cirúrgico, conforme o quadro a seguir:
ATIVIDADES DA EQUIPE DE ENFERMAGEM NO PRÉ-OPERATÓRIO IMEDIATO DO
TRANSPLANTE RENAL

Preparo pré-operatório como: jejum, tricotomia, preparo da pele, remoção de prótese dentária,
retirar esmalte

Limitar o número de visitantes e orientá-los a lavar as mãos ao entrar no quarto, para prevenir
102
infecção

Estar atento aos principais cuidados na utilização de dispositivos, tais como, drenos, sondas e
cateteres pós-procedimento.

Salientar a importância do controle de diurese, pressão arterial, temperatura, (como principais


marcadores de complicações).

Salientar a importância de checar acesso dialítico (frêmito de fístula arteriovenoso,


permeabilidade do cateter de hemodiálise ou diálise peritoneal)

Comunicar os setores na instituição envolvidos no processo do transplante, tais como Banco de


Sangue, UTI, Centro Cirúrgico.

Caso haja prescrição médica pré-definida, realizar a administração dos medicamentos, coleta
de exames padronizados na instituição ou prescritos pelo médico e procedimento preparatórios.

Preparar o paciente para encaminhamento ao Centro Cirúrgico.

Registrar adequadamente os procedimentos realizados.

Encaminhar o paciente ao Centro Cirúrgico com exames realizados ou trazidos de casa se


necessário.

Cabe ressaltar a importância da família novamente no contexto do transplante renal. O


suporte familiar deve acontecer conforme necessidade dos membros da família e infraestrutura
(recursos humanos e materiais) existentes no serviço.

Em algumas instituições, o enfermeiro inicia as orientações para autocuidado no


período pré-operatório, conforme protocolo institucional, envolvendo o paciente e a família no
processo de educação. Caso isto ocorra, é recomendável, conforme mencionado no transplante
hepático, que seja elaborado um cronograma para orientação envolvendo também a equipe
multiprofissional.

2. Período transoperatório
103

A atuação da enfermagem nesse período tem como objetivos:

 Avaliar, detectar e intervir precocemente nas possíveis complicações


intraoperatórias;
 Assegurar o posicionamento em mesa cirúrgica livre de danos devido ao
tempo cirúrgico prolongado;
 Realizar tricotomia em sala de cirurgia, utilizando tricotomizador elétrico;
 Realizar a sondagem vesical de demora utilizando dispositivo fechado,
com técnica asséptica;
 Monitorar hemorragias e perdas de líquidos, bem como a entrada de
soluções parenterais (soroterapia, hemoterapia e medicamentos);
 Administrar hemoderivados junto à equipe da anestesia; realizar coleta
de exames laboratoriais de urgência;
 Prevenir a ocorrência de hipotermia por meio da administração de
soluções parenterais aquecidas (as soluções podem ser aquecidas em microondas por
até 60 segundos, evitando-se a desnaturação de seus componentes a qual ocorre
quando a temperatura atinge 42ºC) ou a utilização de insuflação de ar aquecido;
 Prevenir a ocorrência de lesões ulcerativas por pressão, utilizando-se
dispositivos acolchoados (gel ou espuma), ou curativos protetores (hidrocoloide),
protegendo-se as saliências ósseas (regiões occipital, escapular, cubital, sacral,
calcâneos).
3. Período pós-operatório

A atuação da enfermagem nesse período tem como objetivos: avaliar, detectar e


intervir precocemente nas possíveis complicações pós-transplante renal. Para tanto é necessário
que a equipe de enfermagem tenha conhecimento da história do paciente, enfocando a evolução
104
da doença, estado atual e terapêutica utilizada para controle da doença até o momento, bem
como da evolução do paciente durante o transplante de rim e possíveis complicações
associadas ao procedimento cirúrgico.

O período das primeiras 24h do pós-operatório do transplante renal está associado à


instabilidade hemodinâmica e à necessidade de reposição parenteral de grande quantidade de
líquidos.

Os cuidados no pós-operatório são similares aos realizados com pacientes submetidos


a procedimentos cirúrgicos de médio porte, enfatizando:

 Monitorização do balanço hidroeletrolítico,


 Cuidados para prevenção de infecção,
 Controle da dor,
 Manutenção e estímulo da função pulmonar,
 Deambulação precoce,
 Restauração das funções gastrointestinais,
 Restauração da função renal.

Para atingir os objetivos propostos, os aspectos principais do cuidado estão descritos a


seguir.
Ter conhecimento de como foi o procedimento cirúrgico, enfocando a ocorrência de
complicações, dificuldades, medicamentos utilizados durante a cirurgia, tempo cirúrgico,
alterações na recuperação pós-anestésica;

Evolução esperada nos primeiros dias após o procedimento, enfocando o funcionamento do rim
transplantado; avaliação da função do enxerto, por meio da avaliação da eliminação urinária,
bem como da evolução dos exames clínicos de função renal (ureia, creatinina, sódio e potássio); 105

Administração e avaliação da terapia imunossupressora do paciente;

Detecção precoce das complicações relacionadas ao procedimento cirúrgico; a monitorização


das complicações pós-transplante renal, na UTI, é prioridade.

Preparar e testar os equipamentos necessários para receber o paciente submetido ao


transplante renal, na UTI;

Ter conhecimento de como foi o procedimento cirúrgico, enfocando a ocorrência de


complicações, dificuldades técnicas, medicamentos utilizados durante a cirurgia, reposição
volêmica com hemoterápicos, tempo cirúrgico, alterações na recuperação pós-anestésica.

Avaliar o paciente ao recebê-lo na UTI;

Avaliação da função cardiopulmonar: frequência cardíaca, pressão arterial, frequência


respiratória e saturação de O2, de acordo com padrões de normalidade;

Avaliação do estado de hidratação do paciente: condição clínica e verificação da PVC, reposição


de líquidos conforme prescrição médica;

Realizar balanço hídrico rigoroso;

Avaliar função renal: controle de diurese a cada hora, objetivando-se um padrão maior ou igual a
30 ml/h; Observar manutenção do cateter urinário pérvio;

Avaliação dos resultados dos exames clínico-laboratoriais, informando a equipe médica a


ocorrência de alterações relevantes;

Manejo e controle da dor: no paciente consciente, realizar a avaliação da dor utilizando-se escala
numérica ou analógica (5º sinal vital);

Cuidados com acessos vasculares, drenos e sondas; evitando-se trações e umidade;

Avaliar presença de hemorragia, hematomas na ferida cirúrgica

Estimular a deambulação o mais precocemente possível, visando prevenção de complicações


vasculares e pulmonares, bem como a ocorrência de úlceras por pressão;

Estimular e supervisionar a realização de exercícios respiratórios. Em alguns serviços, são 106


realizados pelo fisioterapeuta;

Instituir cuidados para a prevenção de infecção: realização de curativos com técnica asséptica,
restrição de visitas, entre outros;

Realizar controle rigoroso da glicemia capilar.

Além destas medidas importantes de cuidado, existem algumas intervenções de


Enfermagem que devem ser implementadas de forma a reduzir o risco de complicações em
pacientes transplantados renais. A seguir, apresentamos as principais complicações, bem como
os cuidados de Enfermagem na sua prevenção, devidamente justificados na terceira coluna.

Complicação Cuidados de Enfermagem Justificativa

 Realizar balanço hídrico A função renal no período pós-


rigoroso e avaliar o resultado. operatório imediato está
 Realizar controle da diurese, relacionada com a formação de
Disfunção precoce com enfoque nas alterações urina (24-48horas) e
do enxerto de suas características normalização da creatinina e
(volume cor, densidade, odor, ureia sérica. A demora no
presença de sedimentos, funcionamento do enxerto é
hematúria, entre outros). definida como a necessidade de
 Monitorar resultados de diálise durante os primeiros 7
exames laboratoriais, que dias após o transplante,
caracterizem a função renal. enquanto ocorre a regeneração
das células tubulares.

Infecção  Monitorizar a evolução da Os fatores que predispõem o


temperatura (Ta _ 38º). paciente ao aparecimento de
 evolução da infecção são: condições clínicas
cicatrização. do receptor e doador, presença
107
 Avaliar condições das de doenças sistêmicas,
inserções de cateteres e alterações da defesa
drenos. imunológica (utilização de
 Realizar oral medicamentos
higiene
adequada e avaliação da imunossupressores), técnica
cavidade oral, (atenção cirúrgica. Devido à terapêutica
para o aparecimento de medicamentosa, a febre poderá
monilíase oral). ser mascarada, por este motivo

 Avaliar condições dos esta não pode ser o único


interdígitos. parâmetro de avaliação.

 Investigar queixas de mal-


estar, episódios de
náuseas/ vômito/ diarreia.
 Observar presença de
edema, calor, rubor na
ferida operatória; ardência
ao urinar, tosse, dificuldade
respiratória e diarreia.

Obstrução do trato  Realizar controle da A obstrução pode ocorrer


urinário diurese, com enfoque nas devido à presença de coágulos
alterações de suas e torção das vias urinárias,
características (volume cor, compressão externa por
densidade, odor, presença edema/ hematoma ou linfa,
de sedimentos, hematúria, retenção urinária,
entre outros. extravasamentos de urina,
 Manter sonda vesical rejeição aguda do ureter. Se a
pérvia, observar a obstrução persistir a bexiga
ocorrência de dobras na pode tornar-se hiperestendida e
extensão, trações ou ocorrer um rompimento da
obstrução por coágulos. anastomose ureterovesical.
 Avaliar a presença de
Se a obstrução ocorrer o
edema ou abaulamentos 108
volume urinário diminui e o
próximos à incisão
paciente poderá referir
cirúrgica.
desconforto abdominal.
 Avaliar a presença de dor
na ferida operatória.
 Realizar lavagem da sonda
conforme orientação
médica.
Linfocele  Realizar controle da Linfocele é a coleção de líquido
diurese, com enfoque nas linfático ao redor do enxerto,
alterações de suas que pode ter causas
características (volume cor, relacionadas ao doador ou ao
densidade, odor, presença receptor. Dependendo da
de sedimentos, hematúria, origem o exame físico revelará
entre outros. sinais e sintomas diferenciados.
 Avaliar presença e evolução
O exame físico mostrará edema
de edema, principalmente
de membros inferiores
de membros inferiores e
(principalmente do lado da
peri-incisão cirúrgica.
incisão cirúrgica), dor ao redor
 Monitorar presença de
da incisão, o volume de diurese
exsudato em incisão
poderá diminuir. Se a linfocele
cirúrgica e observar suas
chegar a exteriorizar através da
características.
incisão cirúrgica, o exsudato é
 Investigar presença de dor
claro e constante.
no local cirúrgico.
Fístulas urinárias  Realizar controle da Podem ocorrer desde os cálices
diurese, com enfoque nas renais até a bexiga, sendo que
alterações de suas as fístulas ureterais distais são
características (volume cor, as mais frequentes.
densidade, odor, presença Manifestam-se através de um
de sedimentos, hematúria, aumento de volume da área do
entre outros. enxerto, diminuição do débito
 Avaliar presença e evolução urinário, elevação da creatinina 109
de edema, principalmente sérica, perda de líquido pela
de membros inferiores e incisão cirúrgica, íleo paralítico,
peri-incisão cirúrgica. febre.
 Monitorar presença de
exsudato em incisão
cirúrgica e observar suas
características.
 Investigar presença de dor
no local cirúrgico.
 Monitorar funcionamento
intestinal, presença de
peristaltismo, eliminação de
flatus e de fezes).
 Monitorar resultados de
exames laboratoriais.
 Monitorizar a evolução da
temperatura.

Hematomas  Avaliar presença e evolução Podem ocorrer em


de edema, principalmente consequência da técnica
de membros inferiores e cirúrgica, ou biópsia. Podem ser
peri-incisão cirúrgica. subcapsular, perirrenal ou
 adjacente ao enxerto.
no local cirúrgico.
 Avaliar aspecto da pele
peri-incisão cirúrgica.

Trombose da artéria  Realizar controle da Pode ser causada por uma


renal diurese, com enfoque nas torção na artéria renal, severa
alterações de suas desidratação, hipotensão,
características (volume cor, tempo prolongado de isquemia
110
densidade, odor, presença quente.
de sedimentos, hematúria,
Caracterizada pelo
entre outros.
aparecimento abrupto de anúria
 Observar sinais e sintomas
nas primeiras 48 horas após o
de trombose.
procedimento.

Trombose da veia  Realizar controle da Pode ser resultado de uma


renal diurese, com enfoque nas compressão da veia renal por
alterações de suas uma coleção de líquidos,
características (volume cor, coágulos na veia renal,
densidade, odor, presença coagulopatia, hipovolemia, e
de sedimentos, hematúria, causas decorrentes da técnica
entre outros). cirúrgica. Caracterizada por
 Avaliar presença e evolução oligúria ou anúria precoce,
de edema, principalmente edema de extremidades.
de membros inferiores.

Estenose da artéria  Monitorar a pressão arterial. Pode ocorrer meses após o


renal  Avaliar sinais e sintomas de transplante, causado
hipertensão. principalmente por
aterioesclerose, técnica
cirúrgica, trauma cirúrgico na
artéria.

Caracterizada por hipertensão


severa, refratária ao tratamento
medicamentoso.

Rejeição aguda  Realizar controle da Caracterizada por alteração do


111
diurese, com enfoque nas nível sérico da creatinina, pode
alterações de suas ser assintomático. O
características (volume cor, diagnóstico é realizado através
densidade, odor, presença da biópsia renal.
de sedimentos, hematúria,
entre outros.
 Avaliar presença e evolução
de edema, principalmente
de membros inferiores.
 Observar sinais e sintomas
de febre e oligúria.
 Monitorar a pressão arterial.
 Avaliar sinais e sintomas de
hipertensão.
 Avaliar e controlar episódios
de dor.
 Acompanhar os resultados
dos exames laboratoriais.

7.4 Transplante Cardíaco


Os cuidados pós-operatórios no transplante cardíaco são semelhantes aos outros
procedimentos que requerem a abertura do esterno, como bypass, reparação de valva, entre
outros. Na unidade de terapia intensiva os objetivos da assistência são manutenção adequada
da função respiratória, estabilização hemodinâmica, acompanhamento da terapia
imunossupressora e monitorização dos sinais e sintomas de complicações.

Como já falamos exaustivamente sobre a assistência de Enfermagem nos transplantes 112


hepático e renal, trazendo aspectos referentes ao preparo do paciente para a cirurgia,
assistência de Enfermagem no Centro Cirúrgico e no pós-operatório imediato, em UTI, vamos
nos ater, no caso do transplante cardíaco, apenas às intervenções e medidas de Enfermagem
que devem ser adotadas para prevenir complicações, pois os demais aspectos são semelhantes
aos demais transplantes.

A seguir, apresentamos as principais complicações dos transplantes cardíacos, bem


como os cuidados de Enfermagem na sua prevenção, devidamente justificados na terceira
coluna.
Complicações Cuidados de Enfermagem Justificativa

Desnervação do  Controlar rigorosamente a Na cirurgia do transplante, o coração


frequência cardíaca: verificar do doador é completamente
coração
frequência, ritmo e amplitude. desconectado da inervação simpática
 Avaliar oximetria digital. e parassimpática (vagal), que
 Manter cuidados com marcapasso influenciam na frequência cardíaca, na
externo: monitorar o
funcionamento adequado, avaliar o velocidade da condução elétrica e na
113
local de inserção, proteger durante força de contratilidade. No pós-
o banho. operatório imediato, bradiarritmias são
observadas. Primária do

Enxerto

Disfunção primária  Manter cuidados principalmente no A disfunção mais comum é a


pós-operatório imediato (UTI). disfunção do coração direito, sinais
do enxerto
 Controlar rigorosamente a PVC e desta alteração são o aumento da
atividade cardíaca. pressão venosa central, diminuição do
 Observar e avaliar o balanço débito cardíaco e da pressão
hídrico.
ventricular esquerda.
 Avaliar volume urinário.
 Avaliar função pulmonar
(frequência respiratória, oximetria).
 Observar o aparecimento de Relacionado com o tempo de isquemia
edema de extremidade. fria; disfunção direta do coração
 Na UTI: observar medidas das relacionada ao aumento da resistência
pressões cardíaca e pulmonar.
vascular pulmonar; resposta humoral -
 Avaliar o nível de consciência.
rejeição. Como sinais observam-se o
aumento da PVC e diminuição do
débito cardíaco.

Rejeição Rejeição

 Monitorar sinais e sintomas de A rejeição é resultado da resposta do


rejeição aguda: fadiga; arritmias; sistema imune do receptor ao coração
dispneia; hipotensão; ganho de do doador. Pode causar febre,
peso; intolerância a pequenos fraqueza e frequência cardíaca
esforços; distensão abdominal;
aumentada ou algum outro tipo de
edema de MMSS e MMII; febre;
sensação de gripe por todo o
corpo. anormalidade no ritmo cardíaco.
 Supervisionar a administração
adequada do imunossupressor.
 Avaliar função cardíaca: monitorar
frequência cardíaca, ritmo e
amplitude;
 Realizar balanço hídrico; monitorar
a instalação de hipertensão
arterial;
 Pesar o paciente diariamente.
 Avaliar função renal: controle 114
rigoroso do débito urinário;
monitorar presença de edema
principalmente nas extremidades;
 Avaliar função pulmonar: realizar
ausculta pulmonar; avaliar
frequência respiratória, amplitude,
presença de ruídos adventícios.

Hipertensão  Monitorar os níveis de pressão É comum após Transplante cardíaco e


arterial. afeta 50 a 95% dos receptores. O
Arterial
 Avaliar sinais e sintomas de aumento do risco
hipertensão arterial: cefaleia; dor
precordial dificuldade respiratória; para o desenvolvimento da
edema; hipertensão está associado ao uso de
 Alteração visual; sangramento inibidores da calcineurina.
nasal.
 Avaliar funcionamento renal:
volume urinário.
 Acompanhar resultados de
exames laboratoriais, observar
valores séricos de sódio, potássio,
ureia e creatinina.
 Atuar juntamente com a nutrição
para adequação da dieta
(hipossódica).
 Avaliar função pulmonar: sinais de
sobrecarga cardíaca.

Infecção  Observar sinais e sintomas de


infecção: febre; alteração da
função cardíaca; A frequência e intensidade do
 Orientar quanto à restrição do processo infeccioso estão diretamente
número de visitantes; relacionadas ao grau de
 Orientar visitantes quanto à imunodepressão necessária para
necessidade da lavagem de mãos prevenir ou tratar os episódios de
no contato com o paciente;
rejeição. Alguns fatores podem
 Avaliar a incisão cirúrgica: influenciar o surgimento ou não de
observar presença de edema, processos infecciosos como a
calor, rubor na ferida operatória, presença concomitante de doenças
bem como a evolução da crônicas, a escolha do doador, técnica
cicatrização e presença de
cirúrgica adequada (presença de
secreções; realizar curativo de
acordo com protocolo institucional. tecidos desvitalizados, coleções não
 Realizar higiene oral adequada e drenadas, cateteres invasivos) e o
avaliação da cavidade oral, perfil psicossocial do receptor
(atenção para o aparecimento de (aderência à terapêutica
monilíase oral); medicamentosa, rotina de autocuidado
115
 Avaliar condições de interdígitos: e higiene do ambiente e pessoal).
presença de micose.
 Realizar ausculta pulmonar, avaliar
frequência respiratória, amplitude,
presença de ruídos adventícios;
 Investigar presença de tosse e
aspecto da secreção se houver;
 Realizar controle da diurese, com
enfoque nas alterações de suas
características (volume cor,
densidade, odor, presença de
sedimentos, hematúria, entre
outros);
 Acompanhar resultado de exames
clínicos/ laboratoriais se solicitado.
 Realizar higiene íntima sempre
que necessário.
 Manter cuidados necessários com
sonda vesical de demora,
assegurando manipulação
asséptica deste dispositivo, bem
como evitar trações;
 Acessos vasculares: avaliar
aspecto da inserção dos acessos
vasculares (central / periférico),
evitar trações;
 Observar sinais flogísticos de
infecção;
 Realizar troca de curativo de
cateter central diariamente e
sempre que necessário, com
material recomendado pela
instituição.
8 A EXPERIÊNCIA DO PACIENTE E DA FAMÍLIA DIANTE DO TRANSPLANTE

A experiência do transplante, para o paciente e para a família, é uma jornada difícil, na


qual eles ingressam muitas vezes sem ter conhecimento algum sobre o assunto. O medo, a
116
incerteza do futuro e o sofrimento decorrentes do diagnóstico de uma doença terminal e sua
piora progressiva, a espera angustiante pelo momento do transplante e a convivência com o
órgão transplantado, são fatores que merecem a consideração da equipe multiprofissional, em
especial a da Enfermagem, que convive mais tempo com o paciente e sua família.

Portanto, esta seção é destinada à melhor compreensão da experiência que o paciente


e família atravessam a partir da descoberta da necessidade de realização do transplante. A vida
das famílias é completamente alterada. Sonhos e planos antes traçados pelo paciente para si
próprio, para a construção de seu futuro, ou os traçados para ele por seus familiares, são
anulados e eles se percebem diante de uma nova realidade: a de uma doença crônica,
degenerativa e incurável, cuja única solução está pautada no transplante de órgãos.

A família e o paciente se percebem não podendo mais viver como antes, e então
procuram atravessar a experiência do transplante buscando estratégias que os façam sentir que
estão se fortalecendo em meio às adversidades impostas pela condição da doença. É uma luta
constante de enfrentamento e adaptação à nova realidade. Quando pensamos em
enfrentamento e adaptação da doença, estudos mostram que é necessário que conheçamos o
desdobramento dinâmico da doença em estudo e seus tratamentos e processos de acordo com
o tempo. Assim, se pensarmos na experiência de um transplante de órgãos, podemos designar a
ele as seguintes fases:

 Saber da necessidade do transplante – Primeira fase de crise da doença, visto


que é o que gera o desequilíbrio na família e inclui o período inicial de adaptações e tratamento
da doença.
 Esperar pelo transplante – Primeira fase crônica da doença, marcada por uma
relativa constância na progressão da doença, com episódios de crise e necessidade de
internações e hospitalizações até a chegada do transplante.
 Receber o transplante – Nova fase de crise da doença, devido à complexidade do
procedimento ao qual ela é submetida, ao novo desequilíbrio na unidade familiar para acomodar o
transplante e ao período inicial de adaptações e tratamento para estabelecimento das doses de
medicações e prevenção de rejeições e infecções, bem como complicações cirúrgicas. É a família
entrando em uma nova fase na experiência de doença.
 Conviver com o transplante – Nova fase crônica da doença, quando o paciente 117
apresenta relativa estabilidade do quadro, embora ainda exposto às complicações pontuais
decorrentes do transplante. A doença é, de certa forma, controlada pelas medicações e assume
uma certa constância.

Portanto, vemos que a família e o paciente vivenciam duas fases de crise,


representadas por saber da necessidade do transplante e receber o transplante, ambas
marcadas por um desequilíbrio mais intenso na família, devido às adaptações que são mais
intensas nesses períodos; e duas fases crônicas, que são esperar pelo transplante e conviver
com ele, marcadas por uma relativa constância e estabilidade, embora ainda exposta a riscos e
incertezas.

Resultados encontrados em diversos estudos indicam que a família sofre intensamente


em todas as fases do transplante. No entanto, o que costumamos ver na prática é que a família e
o paciente são muito mais ajudados durante as chamadas fases de crise, o que faz com que
muitas vezes se sintam abandonados e com muitas dúvidas nas fases de espera e convivência
com o transplante. Não podemos esquecer que a incerteza permeia o cotidiano do paciente
transplantado e família, e por isso, a família pode e deve ser ajudada neste processo em todas
as fases.

O período de espera pelo transplante é evidenciado como uma fase crítica


determinada pelas incertezas da família e do paciente em relação ao procedimento e
prognóstico. O reconhecimento do dilema que a família passa neste período, questionando todos
os aspectos que permeiam a questão cirúrgica do transplante, pode gerar oportunidades de
diálogos e intervenções que promovam alívio no estresse vivido pela família, reduzindo o
estresse das demandas emocionais e cognitivas impostas pela assustadora condição do
transplante.
A fase de conviver com o transplante é quando o paciente e a família se veem em
maiores condições de viver de tal forma que os possibilitem adotar um novo estilo de vida,
compatível com a nova realidade, adequando o transplante ao cotidiano da família e
incorporando comportamentos que permitam o equilíbrio dentro da nova realidade familiar. No
entanto, como já mencionado, a diminuição de suporte social nesta fase é prejudicial, pois ainda
precisam de base e apoio para permanecerem fortes. Reconhecer essa fase da trajetória da
118
doença como um período que ainda impõe demandas sobre o paciente e a família possibilita ao
enfermeiro um olhar direcionado a promover recursos e reconhecer as forças do indivíduo e de
sua família.

Certas condições do contexto da experiência do transplante de órgãos são essenciais


para que paciente e a família passem pela experiência com menos sofrimento. Ambientes que
beneficiam o desenvolvimento do manejo e adaptação da doença são aqueles que
disponibilizam suporte social. A equipe, as outras famílias que aguardam pelo transplante ou já
sofreram o procedimento, bem como pacientes já transplantados ou que aguardam o
transplante, são recursos importantíssimos no decorrer da experiência. O enfermeiro deve
buscar estratégias de aproximação do paciente e sua família destes recursos, para que, através
da troca de experiências, possam se sentir mais seguros e compreendidos.
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