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Capa
Representações e Avisos de Conteúdo
Sinopse
Dedicatória
1: Ruby
2: Morgan
3: Ruby
4: Morgan
5: Ruby
6: Morgan
7: Ruby
8: Morgan
9: Ruby
10: Morgan
11: Ruby
12: Morgan
13: Ruby
14: Morgan
15: Ruby
16: Morgan
17: Ruby
18: Morgan
19: Ruby
20: Morgan
21: Ruby
22: Morgan
23: Ruby
24: Morgan
25: Ruby
26: Morgan
27: Ruby
28: Morgan
29: Ruby
30: Morgan
31: Ruby
32: Morgan
33: Ruby
34: Morgan
35: Ruby
36: Morgan
37: Ruby
38: Morgan
39: Ruby
40: Morgan
41: Ruby
Agradecimentos
Representações
Protagonista lésbica;
Protagonista panssexual;
Romance sáfico.
Avisos de Conteúdo
Homofobia;
Abuso emocional;
Consumo de álcool;
Agressão parental;
Bullying;
Insinuações de sexo.
Sinopse
Morgan, uma corredora de elite, é forçada a se transferir de escola no
final do seu úl mo ano, depois de descobrir que ser queer vai contra o
código de conduta de sua escola par cular católica. Lá, ela conhece Ruby,
que tem dois hobbies: mexer na sua Ford Torino azul bebê de 1970 e
compe r em concursos de beleza locais, sendo esse úl mo para realizar os
sonhos de sua mãe autoritária. As duas se atraem uma pela outra e não
conseguem resis r aos seus sen mentos crescentes. Mas enquanto
Morgan — assumida e com orgulho, determinada a ter um novo começo —
não quer manter seu recente relacionamento em segredo, Ruby ainda não
está pronta para se assumir. Com cada garota em um caminho diferente
para viver sua verdade, será que conseguirão percorrer a distância juntas?
Para qualquer pessoa que teve sua vida virada de cabeça para baixo por
causa do amor.
1
RUBY
— Pegou tudo?
— Sim!
— Pegou o dinheiro do lanche?
— Sim, peguei o dinheiro do lanche.
— A lista de horários? Eles disseram que a prá ca vai até pelo menos
cinco e meia na maioria dos dias.
— Sim, então eu vou correr ou caminhar até o apartamento.
— Ok. Normalmente eu fico na loja até às seis e meia, então não se
preocupe caso não me encontrar em casa.
— Meu Deus, eu tô de boa. Eu consigo fazer as coisas sozinha.
— Eu só quero que seja bom para você. Você merece isso depois de...
— Podemos não falar sobre isso agora? Um novo começo e tudo mais?
— Ok, bem, o que a mamãe diria?
— Eu não sei. Eu te amo? Tenha um bom dia?
— Eu te amo. Tenha um bom dia. — Dylan sorri, mas seus olhos são
sérios.
— Puta merda, Dyl. Primeiro: você precisa melhorar sua imitação da
mamãe. E segundo: você está levando esse negócio de subs tuto um
pouco a sério demais.
— Eu só não quero estragar tudo. — ele diz. — Mamãe e papai vão me
matar se você se machucar, se perder ou seja lá o que pode acontecer com
crianças.
— Mano, eu tenho dezessete anos! — Eu resmungo ao amarrar o meu
cabelo castanho e longo em um rabo de cavalo.
O carro atrás buzina e alguém grita:
— O estacionamento é para desembarque. Dê o fora ou saia do
caminho.
— Caramba. — Dylan diz olhando para o espelho retrovisor.
— É, nada se compara a fúria de uma mãe de subúrbio atrasada para o
café. — eu digo. — Mas não se preocupe, vou ficar bem. E você precisa ir.
— O abraço rapidamente e saio correndo do carro antes que ele me
impeça.
Mas apesar do que eu falei para Dylan, eu não faço ideia do que eu
estou fazendo. Um bando de jovens agitados passam por mim, rindo com
seus amigos, completamente alheios ao fato de eu ser nova por ali. Eu
coloco a minha maior mochila no ombro — ou pelo menos tento, que é
quando eu percebo o que está faltando. Merda.
— Dyl! — Eu o chamo, mas claro que ele não consegue me ouvir do
outro lado do estacionamento. Então eu faço o que sei fazer de melhor: eu
corro, rápido. Eu voo pelo estacionamento, ziguezagueando entre as
fileiras de carros, na esperança de conseguir chegar até Dylan, enquanto
ele se move lentamente através do engarrafamento que se formou à frente
da entrada da escola. Eu estou quase lá, só mais uma fileira, quando uma
buzina e barulho de freios me fazem congelar.
E ali, a trinta cen metros do meu quadril vejo o parachoque de um carro
azul brilhante. Sério? Eu olho de volta para o carro do Dylan a tempo de vê-
lo desaparecer na estrada.
— Droga! — se não fosse por esse carro estúpido, eu teria conseguido.
Eu não estaria parada no meio do estacionamento da nova escola sem
meus horários, meu caderno ou um maldito lápis. — Qual é o seu
problema? — eu me viro colocando as mãos no capô do carro. — Olha por
onde anda.
Eu olho para a cabine para encarar o idiota machista, sem dúvida,
dirigindo esse carro gigante estúpido e me deparo com o par de olhos azuis
mais brilhantes que já vi — que imediatamente se estreitam e me encaram
de volta.
— É você quem está correndo no meio do estacionamento. — ela diz
saltando do carro e me empurrando para longe a fim de inspecionar o capô
do carro. — Se você fez um arranhão neste…
— Você poderia ter me matado!
— Teria sido culpa sua se isso vesse acontecido. — ela diz, se
endireitando de um jeito que faz com que estejamos nariz com nariz —
Onde você estava indo? A escola é do outro lado, caso não tenha
percebido…
E, ai não. Ah, não. Ela é… muito… fofa. E antes que eu consiga perceber,
meu cérebro está fazendo uma lista inú l de tudo que eu não deveria estar
pensando. Tipo como a sua mão perfeitamente bronzeada ficaria perfeita
ao lado da minha mais clara e rosada. E se há marcas de bronzeado
debaixo do seu moletom cinza com capuz e seu jeans apertado. Ah, Deus,
eu sou uma perver da.
Seria muito mais fácil ficar com raiva dela se ela realmente fosse um
cara idiota, mas é complicado. Primeiro que iria requerer uma
reinicialização total do sistema se eu quiser sair dessa sem me constranger.
Primeiro passo: calar a boca que está aberta como se eu es vesse
testemunhando um milagre. Segundo passo: se recompor rapidamente.
Tipo, a parte racional do meu cérebro reconhece que ela é um saco. Mas
a parte não racional quer saber o seu nome, número de telefone, se é
solteira e como ela se sen ria namorando uma estrela do atle smo com
quase nada de persuasão feminina.
— Oi! Eu te fiz uma pergunta. — Ela balança as mãos na frente do meu
rosto. E sim, isso foi de grande ajuda. Por favor, con nue sendo uma idiota,
garota do carro.
— Esqueci a minha mochila no carro. — respondo assim que meu
cérebro volta a funcionar. — Eu estava tentando alcançar meu irmão antes
dele ir embora.
— Por que você não ligou para ele? — Ela aponta para o celular saindo
do meu bolso. É, ok, boa pergunta.
— Ins nto? — eu digo. — Eu sou uma corredora. Eu corro. É isso que eu
faço.
— É, então, não corra por aqui. Isso é um estacionamento. Para
estacionar. Foi para isso que foi feito. — Ela diz, zombando do meu tom de
voz.
— Era uma emergência.
A garota bufa e prende seu cabelo — longo, com fios loiros escuros que
parecem ter sido clareados desde que surgiram — em um coque
bagunçado no topo de sua cabeça — Você tem sorte de não ter um
arranhão seu de quando você socou meu…
— Eu não soquei o seu carro. Eu o pressionei levemente com as minhas
mãos em sinal de frustração.
— Claro. Bem, a boa no cia é que isso vai te custar uma lavagem de
carro para rar as marcas sujas do seus dedos do meu capô. — Ela sorri de
uma maneira maldosa que não deveria deixar borboletas no meu
estômago, mas que realmente acontece. E po, sério? Sério? Será que eu
poderia pelo menos uma vez não sen r atração por alguém que parece
que vai me bater sem pestanejar?
— Eu não vou pagar uma lavagem no seu carro só porque eu o toquei.
Ela dá de ombros e vai até a porta aberta do carro.
— Valeu a pena tentar. Ele está precisando de uma, de qualquer
maneira.
E agora, quando a minha boca se abre, é de aborrecimento em vez de
admiração.
— Valeu a pena tentar? Você… Você quase me matou! Você quase me
matou, e então tentou me enganar me fazendo pagar para lavar seu carro
que já vai ser lavado? Que po de monstro você é?
— O po que não esquece a mochila e que não vai se atrasar para a
aula. — Ela diz antes de entrar no carro e inverter o jogo.
— Idiota! — Eu grito, mostrando o dedo do meio para ela, mas ela revira
os olhos e ri.
Eu tenho o bom senso de esperar até que ela esteja fora de vista antes
de admi r a derrota e pegar meu telefone. Dylan atende no primeiro
toque, parecendo totalmente em pânico. Depois de assegurar a ele de que
sim, estou bem, de que o mundo não acabou e de que nada terrivelmente
ruim aconteceu nos cinco minutos desde que ele me deixou — exceto
quase ser atropelada pela garota mais rude dessa cidade, coisa que eu,
defini vamente, não menciono — ele se acalma o suficiente para prometer
me trazer a mochila.
Encontro um banco perto da pista atlé ca, com uma boa visão do
estacionamento e espero. Tanto trabalho para chegar mais cedo para
encontrar minhas salas. Há algumas garotas correndo na pista, sem dúvida,
devem fazer parte do me da escola, eu me pergunto se elas estão
treinando ou se estão correndo voltas como penalidade. Minha an ga
treinadora, na St. Mary’s, era muito boa nisso. Ela costumava dizer que
chegar cedo fazia bem para a alma, embora meu corpo discordasse
veemente.
Eu reconheço umas das garotas correndo: Allie Marce — nós
compe mos uma contra a outra algumas vezes, e eu meio que conheço
ela. Ela é rápida, mas não tão rápida quanto eu e, defini vamente, não
consegue correr por muito tempo. Ninguém consegue. Bem, ninguém por
aqui, pelo menos. Eu ouvi dizer que ela ia mudar de categoria em sua
úl ma temporada.
Elas passam por mim, seus rabos de cavalo balançando atrás delas. Eu
balanço minha perna, querendo estar correndo também. Mal posso
esperar até mais tarde, quando meus pés finalmente estarão tocando a
pista, forçando meu corpo até meus músculos queimarem, meu estômago
tremer e… eu paro, me lembrando que ainda não sou tecnicamente
membro da equipe, não até minha dispensa sair.
Se isso acontecer. Com a minha classificação anterior, a treinadora não
pensou duas vezes antes de me deixar pra car com elas nos úl mos meses
de aula. Até assinei uma carta de intenção antecipada para poder
concorrer à escola dos meus sonhos — embora no momento esteja “em
espera” enquanto eles “avaliam o incidente”.
Eu passei muito tempo tentando me convencer de que está tudo bem e
que nada disso dói. Que ir de uma atleta famosa a um escândalo é uma
evolução totalmente normal para a qual eu estava totalmente ciente e
preparada. Eu desvio o olhar da linha de chegada enquanto as garotas a
cruzam, tentando não pensar em como deveria ser eu, na minha an ga
escola, com minhas velhas amigas.
Minha mãe vive me dizendo que é apenas uma questão de tempo até
que eu seja liberada para compe r de novo e tudo seja resolvido com a
minha faculdade. Aparentemente, ter como opção se re rar ou ser expulsa
de sua escola — uma escola que seus pais estão processando por um
número de mo vos, incluindo discriminação e assédio — torna muito
menos provável que sua nova escola esteja buscando atletas de elite.
Vamos apenas esperar que a Associação Atlé ca do Ensino Médio
concorde quando finalmente decidirem o meu caso.
A Treinadora não recrutou ninguém. Nós vemos sorte, porque meu
irmão tem um apartamento em um distrito escolar com um programa de
corrida decente na mesma associação, e aconteceu que a escola nha uma
vaga para corredor de longa distância. Se dependesse de mim, eu ainda
estaria correndo com minha an ga equipe do St. Mary, mas não depende.
É o que acontece quando você perde a cabeça com uma professora que
te diz que é contra o estupido código de conduta da escola par cular ser
gay. E então resolve transformar a sua vida em um inferno por causa disso.
Nós tentamos a educação domiciliar quando tudo começou a piorar.
Pensamos ingenuamente que poderíamos esquecer aquela parte da minha
vida e que todo o resto seria como antes. Mas então a escola saiu no
no ciário local e comecei a sen r que todos estavam me observando ou
algo do po. Talvez no início fosse coisa da minha cabeça, mas depois
minhas amigas pararam de me ligar e os pais delas pararam de mandar
mensagem para os meus. A única coisa que me restava era sair de lá.
Tanto faz. Sem problemas. Um novo começo. Uma nova eu. Orgulhosa,
por dentro e por fora. Me posicionando. Tão diver do! É melhor que essa
permissão saia antes do campeonato estadual ou terão que me acorrentar
ao banco para me impedir de compe r. Eu não vou perder a úl ma
temporada de atle smo da minha carreira no ensino médio, então que
Deus me ajude.
O primeiro sinal toca, e todo mundo sai correndo para dentro, o
estacionamento e o terreno da escola se tornam uma cidade fantasma em
questão de segundos. E eu fico sentada, esperando por Dylan. Já atrasada
para meu novo começo.
3
RUBY
Dou risada quando ela me mostra o dedo do meio, porque eu? Eu sou a
idiota da história? Ela é quem sai correndo entre as fileiras de carros
estacionados como um esquilo em alta velocidade. Se tem alguém errado
aqui, é ela. Com certeza. E daí que eu tentei fazer com que ela pagasse pela
lavagem do carro? A garota bateu com as mãos no meu bebê. Ela teve
sorte de eu não as ter cortado.
Eu paro em uma vaga de estacionamento, longe o suficiente para que
ela não possa me ver, mas de onde estou, ainda posso vê-la e, também
vejo, seus grandes olhos castanhos muito zangados. Houve um segundo,
quando o sol passou por eles que pareciam âmbar. Não que eu esteja
interessada nela ou nos seus olhos cor de mel, majoritariamente
castanhos. Mas estou ligeiramente curiosa. É uma escola bem pequena, e
eu conheço a maioria dessas pessoas desde que eu era mais nova. Não é
comum termos novos alunos, especialmente tão tarde no ano le vo —
deve ter algo aí.
Uma ba da na janela chama minha atenção, e me viro para ver Everly —
literalmente a única pessoa na terra autorizada a tocar no meu carro além
de mim — me olhando de maneira engraçada. Eu abro a porta e ela dá um
passo pra trás, passando seus dedos pelas tranças. Um dos caras da equipe
de lacrosse assobia, enquanto passa com seus companheiros, abrindo um
sorriso para ela e acrescentando um:
— Vocês estão bonitas, garotas. — Everly estala a língua.
— Queria poder dizer o mesmo de você, Marcus.
Marcus coloca a mão no peito de maneira dramá ca, recuando,
enquanto o resto da equipe diz em coro:
— Ooooooh! Ai!
Isso sempre acontece com a Everly. Quer dizer, quando você se parece
com a Amandla Stenberg em Harrington Falls, é muito di cil isso não
acontecer, mas mesmo assim. Eu vou aceitar “vocês estão bonitas, garotas”
qualquer dia que as pessoas disserem, desde que ela não esteja por perto.
Eu acho que é isso que você ganha quando quase todo mundo te considera
uma bomba-relógio inú l. Como se fosse só uma questão de tempo antes
de eu começar a cuspir crianças, arruinar a vida dos outros ou algo assim.
Eu puxo meu banco para frente, rando do caminho um par de saltos,
meus sapatos de sapateado e algumas sacolas de roupa para pegar minha
mochila.
— Você sabe que ele gosta de você.
— Eu sei. — ela sorri.
— Mas?
— Mas nada. Ele não me convidou para sair e eu não vou convidá-lo.
— Uau. — eu digo enquanto começamos a caminhar em direção à
entrada do prédio. — Uma bela maneira de retroceder os direitos das
mulheres em uns dez bilhões de anos. Se você gosta dele, vá em frente.
— Falou a garota que sai se esgueirando por aí toda vez que Tyler
Portman manda mensagem pedindo uma foda.
— Ei! — eu levanto um dedo. — Não há nada de errado em ser um ser
sexual. Tanto ele quanto eu mandamos mensagens de maneira frequente.
É casual. Sem queixas, sem sen mentos…
— O cara gosta de você.
— Ele não gosta!
— Esse chupão no seu pescoço diz o contrário. — Coloco minha mão
sobre ele, para cobri-lo.
— Eu passei maquiagem!
— Então, não passou tão bem. — ela ri. — Dê crédito ao Tyler, é
impressionante como ainda dá pra ver mesmo com todo esse bronzeado
em spray que você usou.
— Isso foi coisa da minha mãe. — Eu digo jogando as mãos para cima e
franzindo a testa quando noto uma pequena falha.
— Então, diga para sua mãe que se ela fizer sua bunda branca parecer a
de uma Kardashian, eu não vou parar de reclamar até que você volte ao
tom de pele que Deus te deu.
Eu bufo. Nem me lembro qual é o meu tom de pele mais. Minha pele,
unhas e cabelo têm sido bronzeados, pintados e descoloridos desde que eu
era uma criança. Às vezes — o tempo todo — eu gostaria de poder
remover tudo isso, só para ver como sou por baixo.
— Você acha que eu estou brincando? — Everly sorri. — Se sua mãe
ver que pagar por todas aquelas fotos que tem no Instagram, talvez ela
finalmente te deixe em paz.
Everly é obcecada por fotografia, seu trabalho demonstra sua
excelência. Ela é fantás ca. Ela tem feito meus ensaios nos úl mos dois
anos e fornecido conteúdo para a conta do Instagram que minha mãe
gerencia. Ela acha que posso chamar a atenção de agências de modelo,
mas tudo que conseguimos até agora foram mensagens de uns caras
bizarros.
Mas se esqueçam das fotos com poses e das postagens promovidas.
Everly é a rainha da fotografia espontânea. Ela está sempre com sua
câmera no pescoço, nos fotografando quando menos esperamos. Seu
projeto final de artes é baseado na ideia de que as fotos podem mostrar
quem uma pessoa realmente é, sem baixar a guarda.
Eu não sei; nunca baixei a guarda.
Eu solto meu cabelo do coque bagunçado e o jogo ao redor dos ombros,
cobrindo meu pescoço o melhor que posso.
— Melhorou?
Ela volta para onde Tyler se juntou a Marcus e o resto da equipe de
lacrosse.
— Acho que depende para quem você pergunta.
— Meu Deus, Everly. Um chupão é um sinal de uma noite descuidada,
não de uma declaração de amor!
— Uhum, tá bom, e quando você combinar isso com o senhor “Por
favor, não me deixe, Ruby, por que você não pode passar a noite aqui?" —
Ela une as mãos como se es vesse implorando.
— Nunca vai rolar. — Empurro ela, mas estou rindo.
— Vish — Everly engole seco.
— O quê? — Eu olho em volta, tentando descobrir o que a assustou,
mas a única coisa remotamente fora do comum é a garota nova fazendo
beicinho sozinha em um banco.
— Ah, nada. Só seus traumas paternos aparecendo.
— Ah, me erra! — eu digo, mas no fundo eu não quis dizer isso. Se há
uma pessoa neste mundo que pode e realmente me responsabiliza por
todas as merdas que eu faço, essa pessoa é a Everly. — Não são traumas
paternos. É só trauma de não querer me amarrar a um cara burro do
colégio e acabar que nem minha mãe.
Everly abre a boca para dizer mais alguma coisa, mas não consigo ouvir
devido ao som do sino, sinalizando que é melhor todos nos arrastarmos
para dentro antes que recebamos uma falta.
— Salva pelo gongo. — Everly diz enquanto alcançamos Marcus e o
resto dos caras. Ele pousa o braço no ombro dela e sussurra algo em seu
ouvido que a faz rir.
Tyler está no lado oposto, observando tudo. Ele se afasta um pouco da
mul dão, diminuindo a velocidade para acompanhar o meu ritmo. Ele é
um cara padrão — um metro e noventa, com músculos magros do po
perfeito para lacrosse, com cabelo bagunçado e um rosto gen l que se
ilumina quando ele sorri.
Eu faria, honestamente, qualquer coisa para evitar essa conversa
estranha do dia seguinte… mas não posso porque ele e eu temos a mesma
aula no primeiro período.
— Você foi embora de novo. — Tyler diz, quando os outros não podem
nos ouvir.
— Eu sempre vou. — ainda não entendo por que ele con nua surpreso
com isso. — E você deixou algo em mim. — acrescento, mudando o meu
cabelo de lugar apenas o suficiente para que ele veja. O sorriso malicioso
em seu rosto não me passa despercebido antes que ele volte ao normal. —
Você fez de propósito? — a pergunta sai alto o suficiente para que Everly
vire a cabeça e olhe para mim.
— Relaxa, não foi nada. Eu só exagerei na dose.
— Bem, seria ó mo se você pudesse não exagerar no meu corpo. — Ele
se inclina em minha direção.
— Isso não anularia o propósito de todo o nosso acordo? — Eu o
empurro com meu ombro.
— Só não faça isso de novo. Ok?
— Foi sem querer, Ruby. — ele diz, seu tom de voz se tornando menos
brincalhão. — Você não vai me fazer sen r como um idiota só porque você
quis sexo e eu te dei.
— Jesus, Tyler. Não seja um babaca.
— Eu não sou a pessoa babaca aqui.
— O que você quer dizer com isso? — Eu largo minha bolsa em cima da
minha mesa. E, ok então, eu acho que esse vai ser o assunto do dia.
Primeiro sou a idiota e agora, aparentemente, também sou uma babaca.
Perfeito.
— Você sabe exatamente o que eu quero dizer com isso — Ele diz, e
atravessa a sala até sua cadeira.
Mas eu não sei o que isso quer dizer. Eu realmente não sei.
A menos que ele esteja se referindo ao negócio de eu sempre ir embora,
o que não vai rolar.
Eu olho pela janela, uma dor de cabeça já se formando atrás dos meus
olhos. Observo a garota nova sair do banco e caminhar até um Honda Civic
de merda — cinza, com pequenas manchas de ferrugem no pára-choque.
Eu vejo um vislumbre do motorista quando ele se inclina para fora da
janela para dar a ela uma mochila. Defini vamente não era o pai dela —
muito jovem — mas a maneira como ele bagunça o cabelo dela quando
pega a bolsa significa que ele também não é o namorado. Uma pequena
parte de mim relaxa com essa percepção. Tento não pensar muito sobre o
que isso quer dizer.
Procuro um lápis em minha mochila, qualquer coisa que desvie os meus
olhos da garota do lado de fora, grata quando meu telefone vibra no bolso.
Pego-o e encontro cerca de uma dúzia de mensagens de texto da minha
mãe, lembrando-me que tenho aula de sapateado esta noite às seis e
meia, e para usar sapatos bons, sorrir e ter certeza de fazer o cheque para
uma semana depois da data, e… e… e… sempre há mais instruções. Mamãe
gosta de dizer:
"A única coisa melhor do que ser uma rainha do concurso é: ser a mãe
de uma rainha do concurso". Exceto que eu acho muito di cil acreditar
nisso.
Mas há algumas coisas que não são para serem ditas em voz alta: po
como o sonho dela não é mais o meu sonho, não é há um tempo, não
importa o quanto eu tente forçar. Tipo, como eu gostaria que aquele
cheque pré-datado fosse para contas e man mentos, e não para aulas de
sapateado que odeio, que spray bronzeador não vai fazer bem a ninguém.
Tipo, como eu estou fingindo sorrisos há tanto tempo que estou com medo
de não saber mais como é um sorriso verdadeiro.
4
MORGAN
Eu gostaria de poder dizer que o resto da manhã foi melhor, que depois
de esquecer minha mochila e quase ser atropelada por um carro, foi tudo
tranquilo. Mas não foi. A inspetora me fez uma enxurrada de perguntas por
estar atrasada e depois me mandou para a diretoria, aparentemente não
convencida de que eu era uma aluna nova, porque "novos alunos não
começam no final do ano le vo." O que faz sen do, mas é o que eu sou e o
que estou fazendo.
Depois que tudo foi esclarecido, fui para o meu armário, onde a
combinação que me deram defini vamente não funcionou, e então o
período de planejamento acabou e o primeiro período começou. Acho que
a inspetora sen u mais pena do que aborrecimento enquanto me
acompanhava de volta ao escritório, onde o diretor disse:
— Já sen u nossa falta? — Uma jus fica va de atraso e uma nova
combinação depois, eu estava a caminho. Mais ou menos.
Porque eu também já estava atrasada para o terceiro período. Foi tolice
a minha pensar que todas as 200 salas de aula ficavam no segundo andar,
mas descobri que a sala 215 fica na nova ala do primeiro andar. Qual o
sen do disso?
Por um milagre, chego à minha aula do quarto período, Ciências
Polí cas — o úl mo período antes do almoço — mais cedo. A professora se
apresenta como a Sra. Morrison, me entrega um livro didá co e diz para
sentar em qualquer lugar. É quando eu percebo que as carteiras estão
alinhadas em um semicírculo ao redor da sala, em vez de filas, como todas
as salas da minha an ga escola. Claramente, não há ordem por aqui.
— Os assentos não têm os nomes das pessoas? — Eu pergunto, olhando
em volta enquanto todos os alunos entram.
— Não, Srta. Ma hews, não na minha sala de aula. Você é livre para
escolher qualquer carteira.
Eu examino a sala, selecionando um assento à direita e na parte de trás,
com uma boa visão da professora e de todos os outros. Não que haja muita
escolha; a forma como as coisas estão configuradas faz com que todos
estejam visíveis o tempo todo. Muito esperta. Vai ser quase impossível
enviar uma mensagem de texto ou parar de prestar atenção na aula sem
que ela perceba.
Allie entra, me dando um sorriso encorajador enquanto caminha alguns
passos para dentro da sala. Ela ocupa um lugar vazio ao lado de uma
pessoa que só posso presumir que seja sua amiga, pela maneira como elas
imediatamente começam a conversar. Tudo bem. Ou vai ficar, depois da
escola, quando eu encontrar o me, espero ser mais bem recebida do que
o meu an go me — elas se afastavam de mim como se eu fosse uma
batata quente. Ou talvez isso tenha acontecido depois que chamei a
treinadora de homófobica e misógina. Enfim.
Eu abaixo minha cabeça e folheio o livro, examinando as páginas e
desejando estar em qualquer lugar, menos aqui, até que alguém chuta
minha cadeira. Eu olho para cima e dou de cara com a garota do carro. O
coque bagunçado se foi, seu cabelo está caindo como uma cascata em
volta de seu rosto, que eu defini vamente fico olhando por muito tempo.
Ela limpa a garganta.
— Você está sentada no meu lugar. — ela diz, não de uma maneira rude,
mas com extrema firmeza… Sem ceder espaço para discussão.
— Achei que as carteiras não nham donos. — Digo, embora meu
ins nto me diga para minhas coisas e correr. Mas eu cansei de recuar. Esta
é uma nova versão minha.
Ela range os dentes.
— É algo implícito.
— Como?
— Olha, eu entendo que você seja nova e tudo mais, mas este é o meu
lugar e tem sido desde setembro, então se você pudesse passar por cima…
— Engraçado você dizer ‘passar por cima’ — eu sorrio. — Isso é meio
que uma coisa sua, né? Passar por cima dos outros?
Eu posso jurar que suas narinas dilataram. Seria fofo, se ela não fosse
tão irritante. Ah, que se dane, ainda é defini vamente fofo, mas estou
tentando ignorar. A menos que expandir as narinas num momento de raiva
conte como flerte, se for assim…
— Você quase bateu no meu carro, não o contrário.
— Algum problema, senhoritas? — A Sra. Morrison pergunta, virando-se
do quadro branco e levantando uma sobrancelha ques onadora.
Abro a boca para dizer que sim, há um problema, um problema muito
grande, na verdade, mas não maior do que o meu nível de atração por essa
pessoa, que é claramente a rainha de todos os idiotas do mundo, mas sou
interrompida por uma voz do outro lado da sala.
— Seu nome é Morgan, certo? — Allie diz, e eu me viro em sua direção.
— Senta com a gente. — Ela bate o lápis na mesa vazia ao lado dela.
Eu me viro para a garota pairando sobre mim, hesitante em deixá-la
vencer, mas ela parece mais entediada do que irritada agora, então não
parece que vale a pena retomar a discussão. Pelo menos não por hoje.
Pego meus livros e deslizo para fora da cadeira.
— Primeiro dia di cil? — Allie pergunta quando eu me jogo no assento
ao lado dela. Ela rou suas roupas de corrida e colocou um suéter de
aparência macia, com as mangas puxadas para baixo sobre as mãos. Suas
unhas vermelhas e brilhantes aparecem, em contraste com a brancura de
sua pele.
— É, po isso. — Eu respondo enquanto a Sra. Morrison anuncia que ela
esqueceu uma apos la no escritório e que já volta. Ela nos diz para abrir o
livro na página 106 e então desaparece pela porta.
— Então, esta é a Lydia. Ela também está na equipe de atle smo. — Allie
aponta para a garota ao lado dela.
— Ei, a treinadora está animada por você estar aqui. — Diz Lydia,
empurrando para trás o cabelo preto ondulado que cai ao redor de seu
rosto. O corte da gola de seu moletom é muito grande e um dos lados cai
por ombro, expondo ainda mais sua pele marrom clara. Os professores da
minha an ga escola teriam um ataque cardíaco se vissem isso.
— É? E como todo mundo se sente? — Só porque a treinadora está
"empolgada", não significa que o resto da equipe esteja. Eu sou uma atleta
um pouco controversa.
Allie e Lydia trocam um olhar que já me diz tudo.
— Isso é ó mo, né? — Lydia enrola uma mecha no dedo.
— A maioria do me está de boa. E o resto, você não precisa se
preocupar. Você recebe sua permissão e nos leva às estaduais, e as pessoas
vão ignorar todo o resto.
Certo. Todo o resto. Tipo essa coisa sobre ser super gay, toda essa coisa
de ser transferida ou ser expulsa, toda essa coisa de "ter uma das minhas
candidaturas a faculdades de elite revogada e a outra colocada em
“espera” logo depois de os no ciários falarem a meu respeito.” Mas, ei,
qualquer faculdade que não me aceite — como eu sou — não é uma
faculdade que eu gostaria de estudar de qualquer maneira, certo? Pelo
menos é o que digo a mim mesma quando acordo todos os dias.
— Só não querem se envolver. — Allie interrompe. — Tipo, nós não nos
importamos se você é gay ou algo assim… — Ela sussurra a palavra "gay"
como se fosse algum po de segredo horrível. O que não é.
— Legal, então, eu realmente me importo com isso. — Eu digo, o que faz
um silêncio constrangedor crescer entre nós, mas eu acho que é melhor
deixar isso esclarecido, em vez ser empurrada para dentro do armário de
novo.
Allie parece chocada.
— Ai meu Deus, isso foi tão errado. Claro que você se importa. Claro que
eu me importo! Está tudo bem! É…
— Cala a boca, Allie. — Lydia sorri, se inclinando ainda mais para frente,
para me encarar. — Olha, já que tornamos isso estranho, eu vou ser direta
e dizer que, nº 1: Allie mete os pés pelas mãos com bastante frequência e
nº 2: eu sou pan, então você não é a única garota queer do me. Quando
eu disse que as pessoas vão ignorar todo o resto, eu quis dizer, po, sobre
as coisas de ser expulsa da outra escola. Ninguém na equipe se importa
com quem você, eu, Allie ou qualquer outra pessoa está namorando,
contanto que não interfira no nosso desempenho. Neste ponto, estamos
todos apenas procurando fazer o suficiente e sobreviver estes úl mos
meses. E eu acho muito legal que você se impôs na sua velha escola por
isso. Foi uma merda o que tentaram fazer com você.
Eu não nha percebido o quão grande é o peso que sen a no meu peito,
até agora, quando tudo foi liberado. Eu sorrio pela primeira vez durante
todo o dia quando a professora retorna, acenando com um monte de
papéis na mão.
— Quem está pronto para aprender sobre as emendas? — Ela pergunta
cantarolando.
•••
•••
•••
Eu acordo cedo e vou para o Billy. Ele ainda não chegou, então sento na
varanda e espero. Eu nem deveria estar aqui hoje, tenho que estar no
estúdio em breve para ajudar minha treinadora de concurso com suas
aulas — uma tenta va fú l de pagar minha própria conta cada vez maior
— então toda vez que ele me vê, ele sabe que algo está errado. E mesmo
que eu tente contornar isso, pedindo horas extras ou penhorando algumas
peças do meu carro, ele descobre e me manda para casa com o sanduíche
do café da manhã que ele pegou no caminho e dinheiro suficiente para
cobrir todas as despesas.
Ele chama de adiantamento sobre o pagamento futuro, mas nós dois
sabemos que não é.
Dirijo bem devagar todo o caminho para casa, olhando para os dois
lados, indo abaixo do limite de velocidade. Chego na mesma placa de PARE
onde atropelei a Morgan e não posso deixar de pensar em como seus
lábios se curvaram quando lhe entreguei a bebida. A maneira como ela
apertou minha mão de volta quando eu estava com medo.
Mas então, quando eu paro na minha garagem, ouço minha mãe e
Chuck discu ndo, e me lembro de todos os dez mil mo vos pelos quais eu
nunca deveria falar com ela novamente.
10
MORGAN
A úl ma coisa que espero ver ao dar um passo à frente para ser coroada
como a terceira colocada no evento Miss Tulip é a maldita Morgan
Ma hews sentada na terceira fileira dessa barraca temporária
rapidamente superaquecida que a cidade desenterrou de algum lugar. Ela
me dá um pequeno sorriso e acena, e eu quase tropeço enquanto pego
minhas rosas e a faixa, porque, que diabos, Morgan?
Foi estranho o suficiente que ela tenha me seguido até o banheiro na
noite passada, mas isso é um outro nível. O que ela está fazendo? É algum
po de vingança pelo fim de semana passado? Ela vai me entregar os
papéis do processo na frente de todo esse público? Quer dizer, eu
pesquisei ela no Google. Eu sei que seus pais estão dispostos a processar
qualquer coisa que se mova.
Merda, pensei que já era ruim o suficiente ela estar saindo com meu
vizinho Aaron, o que significa que eu inevitavelmente irei topar com ela
indo até a casa ao lado algum dia. Eu nunca pensei que teria que me
preocupar com ela aparecendo aqui também.
Meu sorriso falso vacila por meio segundo, e luto contra a vontade de
lamber a vaselina dos meus dentes até sair. Em vez disso, viro meus olhos
para mamãe, tentando me firmar na presença dela. Ela está de pé agora,
com os dedos presos nos cantos da boca, puxando os lábios para cima
como uma versão extravagante do Coringa. Eu sorrio ainda mais, deixando
meus dentes perfeitamente clareados terem seu momento sob os
holofotes, meu batom vermelho es cado enquanto seguro minhas rosas.
O anfitrião con nua, considerando Lily Carter vice-campeã e coroando
Melanie Cho como a nova Miss Tulip, e eu fico paralisada, olhando
fixamente para o fundo da tenda, deixando minha mãe orgulhosa. Ao meu
lado, Lily pega minha mão e a aperta. Comunicação de concurso para me
ajude a não enlouquecer.
Eu me permi , por um segundo, lembrar quando era a mão de Morgan
na minha, e então volto a engolir a lembrança. Ela não está aqui por
nenhum bom mo vo. Não haverá mais mãos dadas. Não pode haver.
— Droga. — diz Lily, no segundo em que deixamos o palco. — Eu pensei
que ganharia esse.
Lily e eu fazemos concursos de beleza desde que éramos bebês. Em
outra vida, uma em que minha mãe não suspeitasse de tudo e de todos,
provavelmente seríamos melhores amigas.
Do jeito que está agora, somos mais como colegas de trabalho muito
educadas.
— Desculpe, Lil. — eu digo enquanto nos dirigimos para a área de ves r.
— Achei que você ganharia também.
Ela dá de ombros e desaparece em um borrão de tafetá e garotas
chorando, e vou direto para o canto onde escondi minhas coisas antes. Se
eu puder sair do ves ário e entrar no meu carro o mais rápido possível,
minimizarei o risco de minha mãe entrar nos bas dores e desmoronar
(uma ocorrência frequente e embaraçosa) e ter que descobrir qual mo vo
horrível que Morgan tem para estar aqui. (O que deve ser ruim. Porque,
por que mais ela estaria?)
Eu me troco o mais rápido possível e pego meu kit, passando por uma
dúzia ou mais de garotas. Dou um rápido abraço de parabéns em Melanie,
enxugando suas lágrimas de felicidade obrigatórias da minha bochecha e
abro a cor na que nos separa do resto da tenda. Então eu levanto a aba de
emergência e saio pela parte de trás.
— Ei. — Morgan diz no segundo que estou do lado de fora. E merda,
estamos sozinhas aqui. Atrás da tenda. Onde ninguém vai. Como ela…?
— Apenas acabe com isso logo. — eu digo, estendendo minha mão. Na
verdade, nunca recebi documentos de processo antes, mas imagino que
sozinha atrás de uma barraca funciona tão bem quanto parada na minha
garagem.
Morgan franze o rosto. — Ok.
Ela coloca algo na minha mão, mas defini vamente não é um papel. É o
meu delineador da sorte, o único verdadeiro luxo que é só meu. Eles nem
mesmo vendem no Walmart. Tenho que fazer o pedido direto da Sephora.
Passei a manhã toda surtando procurando por ele.
— Onde você encontrou isso?
— Você deixou na lanchonete ontem.
— E você veio até aqui só para devolvê-lo? — Eu inclino minha cabeça.
— Por quê?
Morgan olha para o chão, pegando um pedaço de grama morta. — Eu
queria te agradecer pelo outro dia. Por cuidar de mim quando estava
machucada. Sei que você perdeu um concurso, e eles parecem muito
importantes para você. Eu esperava que isso nos deixasse quites?
E isso é tão despropositadamente doce que meu estômago dá uma
cambalhota.
— Obrigada. — eu digo, virando-me para ir embora. — Pelo meu
delineador e por não me processar.
— Ainda com o processo? Por que eu deveria?
Eu olho para ela, as sobrancelhas levantadas. — Eu te atropelei com
meu carro.
— Eu caí, lembra? — ela diz com um pequeno sorriso. — Você
simplesmente estava lá.
Eu balancei minha cabeça. — Qual é a sua, Ma hews?
— Nada.
— Você realmente dirigiu até aqui só para me dar isso? — Eu pergunto,
segurando a caneta delineadora.
Ela encolhe os ombros. — Talvez eu também quisesse ver quem seria a
nova Princesa das Flores. Parece uma informação crucial para se ter agora
que moro aqui.
Eu sorrio. Não consigo evitar. — Miss Tulip. — eu a corrijo. — E é a
Melanie Cho.
Seus olhos enrugam um pouco quando ela se inclina para frente, perto o
suficiente para que eu possa sen r o calor de sua pele contra minha
bochecha. Sua respiração em meu ouvido. Meu coração bate tão forte que
juro que o mundo inteiro pode ouvi-lo.
— Você deveria ter vencido. — diz ela.
Eu engulo em seco. — Eu…
— Ruby, eu estava lá esperando por você. O que você está fazendo? —
Eu me afasto para encontrar minha mãe caminhando ao nosso lado, com o
rosto contraído.
Quase deixo cair meu ves do. — Nada!
— Quem é a sua amiga?
— Só alguém da escola. — Eu me desloco ligeiramente entre elas.
— Eu sou a Morgan. — diz ela, estendendo a mão em volta de mim e
claramente não entendendo o ponto.
Minha mãe a sacode, um olhar cé co em seu rosto. — Ruby nunca
convidou nenhuma amiga da escola para seus desfiles antes.
— Oh, bem, eu não fui convidada, por si só. Eu…
— Estamos quase terminando. — eu digo, interrompendo Morgan. — Te
encontro no carro, mãe?
Minha mãe me encara por um segundo antes de puxar o ves do das
minhas mãos e se virar em direção ao estacionamento. — Não demore.
— Sua mãe parece legal. — Morgan diz assim que ela está fora do
alcance da voz.
E, merda, aquela falsa cortesia — aquela tenta va de fingir que minha
mãe foi tudo menos rude — é mor ficante. Eu deixo cair meu queixo. —
Por que você está realmente aqui, Ma hews?
— Eu só queria devolver o seu…
— Bem, você já fez. Então, acho que é isso? — Tento fazer minha voz
soar dura.
A surpresa — e dor — no rosto de Morgan fez minha cabeça zumbir. Eu
odeio isso. Muito.
Mas não tanto quanto odeio a conversa que sei que vou ouvir da minha
mãe no caminho para casa.
— Sim, acho que é. — Ela parece brava. E, oh Deus, eu mereço isso.
— Este aqui não parece tão ruim. — diz Everly, deslizando o laptop pela
cama. Ela está com o site do concurso do condado aberto.
— Não importa, Ev.
— Mas este tem um prêmio que sua mãe não pode arruinar para você.
— A vergonha aquece minha barriga. Não importa o quanto eu tente
mantê-la fora disso, Everly sempre enxerga através da conversa fiada direto
para como as coisas estão ruins.
— Improvável. — eu digo.
— Bem, se ela conseguisse, seria realmente impressionante, porque é
uma bolsa de estudos para a Universidade Comunitária Hudson para as
seis primeiras colocadas, e inclui uma bolsa para os dormitórios. Isso pode
rar você da casa da sua mãe para sempre. — Ela bate na tela. — Esta
pode ser a sua saída.
— Eu não posso deixar minha mãe.
— Ela ficaria bem, Ruby.
— Ok, nesse caso, deixe-me começar a destruir seus sonhos e
abandoná-la como todo mundo fez porque Everly Jones disse que ela
ficaria bem. — Estou sendo dramá ca, mas não consigo evitar.
— E quanto aos seus sonhos?
— Eu não tenho nenhum. — Eu sorrio, fechando seu laptop.
Ela revira os olhos e se joga ao meu lado, olhando para mim com o canto
do olho. — Você é uma men rosa.
— Vamos lá, tenho tanta probabilidade de ir para a faculdade quanto de
ganhar a Miss América. Você e eu não somos iguais.
— Ruby, eu te amo, mas pare com isso. Eu ro fotos de pessoas quando
elas não estão olhando. Você restaura carros e os mantém funcionando. Se
uma de nós está mais preparada para ter uma carreira, não sou eu.
— Você realmente acha isso? — Eu pergunto porque nunca pensei nisso
dessa forma.
Ela cruza os braços e me encara até que eu relutantemente concordo
que ela talvez tenha razão, e então abro seu laptop para distraí-la com
filmes da Ne lix.
Mais tarde, no entanto, depois que Marcus chega com uma pizza e
todos estão dormindo, menos eu, eu clico novamente para ler sobre a
bolsa. Porque meu orientador mencionou uma vez que Hudson nha um
programa de tecnologia automo va dos bons. E se eu vesse um sonho,
provavelmente seria isso.
Sempre achei que acabaria trabalhando em um posto de gasolina ou
algo assim, desmantelando peças para Billy entre os concursos com a
mamãe. Não parecia que "mais" era realmente uma opção. Mas Everly está
certa. O prêmio cobre a mensalidade, mais hospedagem e alimentação no
novo prédio de habitação estudan l que eles construíram no ano passado.
Terminar até mesmo entre as seis primeiras pode ser di cil em um
concurso em todo o condado, mas pode ser viável se eu realmente tentar.
Clico no site, tentando encontrar uma lacuna ou as letras pequenas, mas
tudo parece legí mo.
Diz até que posso solicitar bolsas para cobrir meus livros e refeições,
mas não preciso de tudo isso. Livros, talvez, mas tenho vivido de ramen e
vitaminas desde que me lembro. Tenho certeza de que conseguiria
trabalhos paralelos o suficiente no Billy para, pelo menos, cobrir isso. E eu
estaria perto o suficiente para ficar de olho na minha mãe. Talvez
pudéssemos até mesmo chegar a um acordo, como ainda fazer alguns
concursos locais ou algo assim. Talvez este pudesse ser o primeiro passo,
mas não da maneira que ela queria dizer.
Everly funga e rola, e eu desligo seu laptop, desligando meus sonhos
junto com ele. É estúpido até pensar nisso. Eu tenho responsabilidades. Eu
tenho uma obrigação. Eu tenho… muita energia agora e nenhum lugar para
colocá-la.
Pego meu telefone e digito uma mensagem. Tyler responde
imediatamente.
12
MORGAN
Aaron está parado perto de uma mulher branca que parece ter cerca de
trinta anos, mediante ao que parece ser uma estante de livros arrumada às
pressas, quando eu entro no centro.
Dylan entusiasmadamente me deixou no seu caminho para o trabalho,
me chamando de “bastante sociável” e me dizendo que estava “orgulhoso
de mim” e para “entrar lá e mudar vidas” até que ficasse constrangedor. Eu
basicamente ve que expulsá-lo do estacionamento agora pouco. Para ser
honesta, no entanto, talvez não tenha me importado totalmente. Acho que
precisava de algum reforço posi vo depois da maneira como Ruby jogou
pingue-pongue com minhas emoções ontem.
— Morgan! — o rosto de Aaron se ilumina. Ele guarda uma pilha de
livros e se aproxima para me dar um abraço de boas-vindas. — Você veio!
— Não perderia. — eu digo. — Obrigada por me convidar.
— Claro! Hm, esta é Izzie. — ele aponta para a mulher, que parece
ligeiramente exasperada quando alguns livros caem ao lado dela. — E,
Izzie, esta é Morgan.
— Oi, Morgan. Desculpa a bagunça. Recebemos uma pilha de novas
doações este mês e estou tentando organizar tudo. — ela ra uma mecha
de seu cabelo castanho-escuro dos olhos. — É tão bom finalmente
conhecê-la. Aaron falou muito bem de você.
— Adoraria ajudar aqui no que puder. — eu olho um livro em par cular
que tem um menino e um cachorro na frente coberto com o que parece
ser… Post-its? — Todos esses livros foram doados? Isso é fantás co.
— Sim, temos alguns patronos muito generosos. Cada livro apresenta
um personagem principal que se enquadra no guarda-chuva LGBTQ+. Você
é sempre bem-vinda para pegar os livros emprestados, caso algo chame
sua atenção.
— Legal. — eu digo, pegando. — Eu defini vamente irei.
— Perfeito. Eu sei que o final do ano pode ser estressante para os
alunos. É sempre bom pra car um pouco de autocuidado. — diz ela. — A
biblioteca está disponível sempre que estamos abertos e é um sistema de
honra, então não há necessidade de assiná-los nem nada. Nós confiamos
em você. — ela se inclina para mais perto. — E, honestamente, se alguns
não forem devolvidos, não nos importamos, contanto que encontrem um
bom lar.
Eu sorrio porque isso é ridiculamente legal. Eu sou o po de pessoa que
defini vamente devolveria cada livro que pegasse emprestado — eu nem
mesmo racho as lombadas ou dobro as orelhas —, mas eu estou meio
obcecada com a ideia de que se alguém realmente se apaixonasse por um,
estaria tudo bem se ficasse para sempre.
— Então, o que exatamente vocês fazem aqui? — Eu pergunto.
— O que não fazemos? — Aaron diz.
— Ele tem razão. Fazemos um pouco de tudo. — Izzie encolhe os
ombros. — Aconselhamento, apoio, visitas escolares. Nós ajudamos com o
estabelecimento de Clubes do Orgulho e Alianças Homossexuais-
Heterossexuais em lugares que não os têm. Aaron e eu, na verdade,
montamos aquele em sua escola com a Srta. Ming. Ajudamos a colocar os
adolescentes em contato com os recursos de que precisam, caso estejam
em uma situação de risco. Mas também fazemos Bailes do Orgulho e
outros eventos diver dos…
— É uma espécie de serviço centralizado quando se trata de gays. —
Aaron faz um gesto de arminha com os dedos e tento não rir. — Vamos,
iremos mostrar a você.
Eu olho em cada sala obedientemente enquanto apontam para o
escritório da diretora, a sala, a área da cozinha, as salas principais, o
espaço de aconselhamento e o playground no quintal, como se es vessem
tentando me convencer de como é bom, ou algo assim. Mas eu já sabia
antes de chegar aqui que, defini vamente, estava dentro.
— Então, o que exatamente eu faria como uma conselheira?
— Os conselheiros são alunos que se voluntariam aqui, seja por horas na
Sociedade Nacional de Honra7 ou simplesmente porque querem. — diz
Izzie. — Nós os combinamos com outros adolescentes que achamos que se
beneficiariam com suas experiências, e muitas vezes isso se transforma em
uma combinação mutuamente benéfica. Nossos conselheiros tendem a
rar tanto disso quanto dão.
— Se es ver interessada, pedimos que estude nosso manual online e
faremos uma verificação de antecedentes, é claro. Vamos fazer com que
você assista a algumas sessões com Aaron, ou comigo, até que se sinta
confortável. Aaron é nosso conselheiro sênior, então ele está sempre aqui
para ajudar a responder às suas perguntas, ou ser seu parceiro em uma
sessão di cil.
— Então nós apenas… conversamos?
— Mais ou menos isso. — diz Aaron. — Às vezes as pessoas vêm e só
querem alguém para ouvi-las. Outras vezes, querem conselhos. Você
sen rá isso conforme você avança.
Izzie inclina a cabeça. — Na verdade, já tenho alguém em mente com
quem gostaria de colocar você. Acho que seria uma combinação excelente,
considerando suas duas histórias.
— O jogador de futebol? — Aaron pergunta.
Ela assente. — Temos um menino que vem aqui de vez em quando, um
atleta como você.
— Ele nos dá um nome falso toda vez, mas parece que não se lembra
dele, então nunca é o mesmo. — diz Aaron. — Defini vamente não
frequenta a nossa escola, então, vai saber quão longe ele viaja. Algumas
pessoas percorrem um longo caminho para chegar aqui, tem menos risco
que alguém que você conheça veja você entrar.
— Entendo. Eu odeio isso, mas eu entendo. — Eu digo.
— Acho que você estaria em uma posição única para lhe dar conselhos.
— Sim. — eu digo. — Eu realmente quero encontrar uma maneira de
trabalhar com atletas estudantes. É complicado. As pessoas não entendem
os desafios que enfrentamos se não os viveram.
— Bem, acho que você vai descobrir que trabalhar no centro é um
grande primeiro passo em sua defesa. Você será capaz de pôr a mão na
massa ajudando as pessoas individualmente.
— Isso parece ó mo.
— Bem-vinda a bordo, então. — ela diz. — Aaron pode configurar um
login online para revisar todo o material. Ele tem uma consulta no final da
tarde também, se você ver tempo para ficar.
— Sim. — Digo, querendo começar com essas coisas o mais rápido
possível, para sen r que estou fazendo algo que importa pela primeira vez,
ao invés de me esconder atrás de meus pais e advogados.
Mais tarde, depois de assis r uma reunião com Aaron e essa garota,
Caroline, preencher uma grande quan dade de papelada e responder a
alguns testes online, sou oficialmente uma conselheira. Ainda tenho que
assis r mais algumas sessões enquanto esperamos minha verificação de
antecedentes ser esclarecida, e Izzie vai me visitar assim que eu começar a
aconselhar por conta própria, mas parece um grande passo.
No final do dia, quando meu irmão chega em casa com um bolo
comemora vo, ele me dá o maior abraço.
— Para que é isso? — Eu pergunto quando ele finalmente me solta.
— Nada. — ele diz. — Eu só estou feliz que você seja minha irmã.
13
RUBY
Charlene sorri quando entro no estúdio que ela divide com sua irmã
gêmea, June. Ela é alta, quase 1,80 e dentes brancos brilhantes, o cabelo
pintado de preto para esconder o cinza. Mais de trinta anos longe de seu
tulo de Miss EUA, um pouco mais velha e mais suave do que costumava
ser, ela ainda é uma força a ser reconhecida no circuito de concurso.
— Olá, Ruby. — ela diz. — Você está um pouco adiantada.
— Eu sei. — eu abaixo minha cabeça. — Eu esperava que pudéssemos
conversar.
— Mas é claro. Por que não conversamos no meu escritório antes que
seus alunos cheguem? — Ela coloca os papéis que está segurando na
recepção e segue em direção ao fundo.
Charlene não é apenas minha tutora de concurso; ela também é meio
que a minha chefe. Ela e a irmã dirigem um pequeno, mas respeitado,
negócio. Charlene dirige o lado técnico do concurso, June oferece balé e
dança moderna. Havia tantas coincidências entre os clientes que fazia
sen do abrirem uma loja juntas.
Sigo Charlene até o menor dos dois escritórios, ela diz que é sua
maldição por ser três minutos mais jovem, e me sento em frente a ela.
— O que posso fazer por você, querida?
— Eu quero ganhar o concurso do condado. — as palavras me cortam,
parecendo mais uma admissão de culpa do que uma declaração de
intenções. — Queria saber se você estaria disposta a fazer algumas aulas
extras comigo, caso eu pegasse mais aulas em troca. Sei que mal estou
cobrindo o que já devemos a você, mas eu preciso disso.
— Posso perguntar o por quê?
— Eu preciso ser elegível para um estadual, e preciso ganhar um
estadual para chegar ao Miss América. — Odeio men r para Charlene, mas
não posso arriscar que ela conte a verdade para minha mãe, que, embora
ela veja isso como um primeiro passo importante, eu enxergo isso como
uma saída de emergência em um navio que de outra forma está
afundando.
Charlene se move para frente em sua cadeira, estudando meu rosto. Eu
luto contra a vontade de encolher, evocando minha melhor postura para o
desfile.
— Não dá para men r para uma men rosa. — Diz ela, juntando as
mãos.
— Não estou. — eu forço. — Eu preciso da sua ajuda. — Pelo menos
essa parte é verdade.
— Nós duas sabemos que esse é o sonho da sua mãe, não o seu.
— Por favor. — Eu posso sen r tudo escapando. A porta batendo na
minha cara. Nada de programa automo vo. Sem saída. Serão desfiles de
shopping de terceira categoria e feiras do condado para o resto da minha
vida.
Charlene suspira.
— A assistente de June está de licença maternidade. Eu ia contratar um
estagiário, mas se você puder ser um segundo par de olhos nas aulas de
"Passos para Desfiles", além de dar suas aulas de maquiagem habituais,
podemos dar um jeito. Uma aula par cular por semana, mais dever de
casa. Porém você tem que ser sincera, Ruby, você tem enrolado há anos.
Se a sua mãe não fosse uma das minhas melhores alunas, eu já teria
largado você. Sei do que você é capaz. Eu sei o que está em seu DNA. Tudo
poderia ser seu se você quisesse de verdade.
— É… — Eu olho para baixo, esfregando uma mancha de graxa na ponta
do meu polegar. Como é que todo mundo parece saber o que está em meu
DNA, exceto eu?
— Agora vá se preparar. As meninas estarão aqui em breve para a sua
aula, e nós temos as crianças de seis a oito anos vindo para o "Passos para
Desfiles" depois. Você fica para os dois, e podemos começar suas aulas
extras na próxima semana.
— Combinado. — Digo, apertando a mão dela. Eu estava planejando ir
para a casa de Billy depois, mas vou mandar uma mensagem avisando que
não posso. Uma perda de curto prazo, para um ganho de longo prazo.
14
MORGAN
•••
Dylan chega tarde em casa com uma pizza. Ele me diz com entusiasmo
que finalmente convidou aquela mulher que gostava para sair, e que ela
disse sim. Tento não pensar muito sobre o quanto gostaria que fosse eu e
Ruby. Ele vai para a cama cedo, mas fico acordada vendo Ne lix a noite
toda com aquele sen mento de obsessão.
E então, por volta da meia-noite, jogando a vergonha fora, pego meu
telefone e envio uma mensagem: espero que o desfile tenha ido bem! ☺
21
RUBY
•••
•••
É verdade que eu nunca nha ido a uma festa assim antes, mas achei
que nha uma expecta va bem baixa para ficar impressionada. Agora que
estou aqui, percebo que deveria ter sido ainda mais baixo, po no nível de
um porão. Está super lotado enquanto atravessamos a casa até a cozinha,
Allie liderando o caminho, rindo e gritando:
— Hora da cerveja, vadias!
A música bate forte o suficiente para fazer as paredes chacoalharem, e
tudo está pegajoso e cheira a suor e cerveja velha. Eu nunca quis menos
estar em algum lugar — e isso foi antes de notar a Ruby se esfregando
contra um monte de caras do me de lacrosse.
Certo, apague tudo que eu pensei no carro. Estou fora.
Eu me viro para sair, mas Allie me para, duas cervejas em suas mãos. Ela
me dá uma e levanta a outra no ar, dançando no meio da sala de estar para
um coro de fiu-fiu. Um lugar encantador, realmente, essa casa cheia de
meninos burros.
Lydia surge ao meu lado com seu próprio copo, levantando uma
sobrancelha para nossa amiga dançarina.
— Allie ama essa merda. — ela diz, tomando um grande gole de cerveja.
Eu sigo o exemplo, tentando não tossir quando o líquido quente e
espumoso a nge a parte de trás da minha garganta.
— É sempre tão nojento assim? — Desloco meu peso para descolar
meus pés do chão, sem ter certeza absoluta de que estou falando da
cerveja ou literalmente de todo o resto.
Lydia assente, bebendo o resto da cerveja em um gole enquanto
observa Allie na mul dão, sua mandíbula ligeiramente tensa, cabeça
inclinada... e um desejo nos olhos que quase parece com o meu.
— Puta merda, Lydia, você gosta...
— Vou buscar mais cerveja. — Ela me corta com um olhar que diz
Esquece antes de desaparecer no meio da mul dão.
Interessante. Talvez eu não seja a única garota queer com uma paixão
impossível hoje à noite.
Anika e Drew estão no canto, e assim que nos percebemos, eles
começam acenar para eu me aproximar. Estou me movendo através da
mul dão, sendo empurrada aqui e ali. Quando estou quase chegando
neles, faço uma meia ondinha para cumprimentá-los no exato momento
em que algum garoto dá um passo para trás, fazendo com que o que
sobrou da minha cerveja caia sobre nós dois.
— Que caralhos! — ele grita, virando-se como se pretendesse me
agredir... no exato segundo em que uma mão envolve a minha cintura e me
puxa para trás.
— Desculpa, Travis. — Ruby grita por cima do ombro, nos levando para
longe. — Foi sem querer.
O garoto, Travis, aparentemente, balança a cabeça, puxando camisa
ensopada de cerveja e a arrancando.
— Você veio! — Ruby grita sobre o barulho da música, puxando-me para
o canto oposto da pista de dança. Posso dizer imediatamente que ela está
bêbada, mas tento ignorar porque ela parece tão legi mamente feliz em
me ver. Olho para Anika e Drew, que fazem expressões confusas iguais, e
eu peço desculpas rapidamente com a boca.
— Acho que eu fiquei entediada. — eu grito de volta, e a música muda,
a ba da pulsando contra a pista de dança. Ruby dá um sorriso tão grande e
largo que quase me afogo nele. Estou tão ferrada, tão absolutamente
perdida nessa garota na minha frente, essa garota que está sorrindo como
se me ver fosse a melhor coisa que aconteceu com ela o dia todo.
Ruby segura seu cabelo comprido nas mãos, puxando-o até o topo da
cabeça e deixando-o cair em cascata sobre seus ombros enquanto ela
começa a dançar. Obrigada por isso, universo. Defini vamente nunca vou
esquecer esse momento enquanto eu viver.
— Amo essa música! — ela grita, aproximando-se ainda mais até que se
encosta em mim a cada movimento. Eu fico parada e desajeitada, sem
saber quais são as regras nessa situação, se essa performance é para
mim... ou para todos os outros.
— Dança comigo. — ela sussurra no meu ouvido, me girando para estar
atrás de mim, e meu corpo inteiro cora a rando fogo na minha pele.
Ela coloca suas mãos sobre meus quadris, me empurrando e me
puxando até eu encontrar o ritmo, seu corpo pressionado contra minhas
costas, sua respiração no meu ombro enquanto ela canta. Ela desliza seus
dedos do meu quadril para minha mão sem avisar, entrelaçando nossos
dedos e depois os passando pela minha barriga. Minha respiração prende
quando ela os trás um pouco mais para baixo, logo abaixo da cintura das
calças justas demais da Lydia, antes de me rodar para encará-la. Perco a
ba da nisso, rindo enquanto ela morde o lábio. Ela solta a minha mão,
passando os dedos pelos meus lados e depois pelo meu pescoço, as mãos
dela por toda parte e em lugar nenhum até que somos só nós na pista de
dança, a perna dela se encaixando entre as minhas enquanto o mundo
inteiro se desfaz.
— Eu sei que você gosta de mim. — ela sussurra no meu ouvido. E eu...
Eu não sei o que fazer. Ela puxa minhas mãos ao redor de seu pescoço e
abaixa sua cabeça no meu ombro, um toque de sua língua contra minha
pele antes de recuar, limpando seu lábio como se fosse apenas uma gota
de cerveja. Estou perdida, completamente, na sensação do corpo dela sob
a ponta dos meus dedos...
E então as pessoas começam a fazer barulho e gritar, e eu percebo
quantos dos meninos do lacrosse estão observando, incen vando e
aplaudindo nosso espetáculo. Eu odeio isso.
Ruby ainda está dançando, se diver ndo com a atenção e não
percebendo que eu perdi o ritmo. E então Tyler aparece atrás dela,
transformando nosso par em um trio, e eu paro de dançar por completo. A
cerveja bate no meu estômago, afogando todas as borboletas enquanto as
mãos dele tocam a pele dela.
Tyler agarra os quadris de Ruby e a puxa na direção dele. Ela ri, nunca
perdendo uma ba da, e eu fujo da pista de dança e subo as escadas, como
uma garota em um filme de terror, sem saber para onde estou indo só
precisando escapar. Adequado para esse cenário de pesadelo. Encontro um
cômodo vazio e corro para a janela, abrindo-a e engolindo o ar fresco da
noite.
Uma mão aparece e esfrega minhas costas, e eu salto, meu estúpido
cérebro sem esperança rezando para que seja Ruby. Mas não é. É a Anika
parada ali, com Drew atrás dela me dando um olhar compreensivo.
— Tá tudo bem, tá tudo bem. — diz Anika, e eu nem percebo que estou
chorando até que ela me puxa para um abraço.
— Eu só… não sei. — Eu fungo no ombro dela. — Eu não entendo.
Pensei que ela gostasse de mim.
— Ela é uma bagunça, Morgan. — diz Drew, apertando meu ombro com
um olhar solidário.
— Mas o que ela quer? — Eu choro, como se eles fossem saber. Acho
que nem ela sabe. — Eu disse que nunca mais faria isso, me apaixonar pela
garota que mais vai mexer com a minha cabeça. E eu fiz, po, seguindo o
manual. Qual é o meu problema?
— Ei, ei, para. — diz Anika. — Não tem nada de errado com você. Por
que não saímos daqui? Vamos nos encontrar com o resto da gangue no
restaurante. Vem com a gente.
— Eu arrastei Allie e Lydia até aqui só para poder ver a Ruby. — Eu ri,
curta e amarga. — Não posso deixá-las de lado.
— Mesmo? — Drew pergunta, parecendo hesitante em me deixar. —
Tenho certeza de que elas vão entender.
— Não posso. — Não quero admi r que uma pequena parte de mim
ainda está esperando que Ruby apareça magicamente e peça desculpas.
Anika e Drew trocam um olhar.
— Eu sei que não somos melhores amigas nem nada, — diz ela — mas
até eu consigo ver o quanto isso está te deixando mal. Só vem com a gente,
por favor? Vamos conversar com comida ruim e luz pior. Aaron também
está vindo. Ele pode entrar em modo conselheiro completo com você.
Eu balanço a cabeça.
— Eu só preciso de um minuto para me recompor. Mas vão, se divirtam.
Eu estou bem, juro.
Anika me puxa para um abraço desajeitado.
— Ok, bem, manda uma mensagem se precisar da gente.
— Farei isso. — eu digo, e forço um sorriso.
Acontece que "um minuto" foi uma péssima es ma va. Eu levo mais
para quinze, na verdade, sentada no chão, acalmando meu estômago,
tratando minha libido abalada, e tentando muito não chorar pelo fato de
que a experiência român ca mais intensa da minha vida pode ter sido
apenas um show que Ruby estava fazendo para seu ficante, Tyler, e seus
amigos.
A parte irremediavelmente ingênua de mim ainda espera que eu esteja
errada e que Ruby não tenha subido porque ela ainda está lá embaixo
procurando por mim. Talvez ela já tenha mandado Tyler embora, mas não
tenho ideia porque não consegue me encontrar enquanto estou aqui em
cima amuada em vez de lutando pela garota que eu quero.
Eu junto meu ego do chão e desço de cabeça baixa, respirando fundo
enquanto viro o corredor, só para bater imediatamente na Lydia.
— Aí está você! — Ela parece irritada. — Estava te procurado em todos
os lugares!
— O que foi?
Ela une seu braço ao meu e me puxa.
— Estamos indo. Agora. Allie está no carro chorando a alma inteira.
— Por quê? O que aconteceu? — Juro por Deus, se algum desses
meninos lhe tocou ou a machucou de alguma forma, eu...
— Aquilo aconteceu. — diz ela, apontando para trás de nós.
Viro minha cabeça bem a tempo de ver Tyler mergulhar a Ruby na pista
de dança, acariciando seu pescoço e beijando atrás de sua orelha. Sua
cabeça vira quando ele a puxa para cima, seus olhos sonolentos
encontrando os meus, arregalando um pouco antes de se fecharem
quando ele beija o canto da boca dela.
— Aquele desgraçado do caralho. — diz Lydia, encarando Tyler
enquanto me puxa para fora. — Iludindo a Allie assim, deixando ela pensar
que era mais do que realmente era.
— Sim. — eu sussurro. — Aquele desgraçado.
23
RUBY
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Ruby fica para o treino e até me dá uma carona para o centro depois.
Nós duas tentamos corajosamente fingir que não falei nada. Ruby
provavelmente está esperando evitar a conversa por completo, e eu estou
desejando nunca ter começado em primeiro lugar.
Eu deveria estar feliz com o que tenho. Pelo menos é o que digo a mim
mesma mais e mais vezes. Nós duas sorrimos quando nos despedimos com
um beijo, mas parece vazio de alguma forma.
Meu irmão me pega no caminho para casa depois do meu turno e me
diz que há algo esperando por mim em casa. Quando tento bisbilhotar, ele
apenas sorri e diz: — É uma surpresa. — Espero que seja Ruby, mas sei que
ela tem que dar algumas aulas hoje à noite e depois tem outra sessão de
treinos com sua treinadora. Tenho certeza de que ela estará exausta
quando terminar.
O que quer que eu pensasse que pudesse ser, não esperava que a
surpresa fosse meus pais na cozinha, quatro dias antes da próxima visita.
Estão desfazendo as sacolas de comida para viagem como se fosse um
negócio normal, mas as malas na sala de estar sugerem que este não é
apenas um dos nossos jantares habituais.
— Surpresa! — minha mãe grita, correndo para me puxar para um
abraço. Ela me aperta com força, e quando o cheiro de seu perfume chega
ao meu nariz, percebo o quanto realmente sen falta dela. Ela cheira a
segurança, casa e mãe, e mesmo chamadas diárias pelo Face me não são
suficientes.
Nós duas enxugamos os olhos com risadas aguadas enquanto ela se
inclina para trás para olhar para mim. — Ah, eu precisava disso. — ela diz.
Meu pai solta um alegre — Ei, atleta. — enquanto coloca alguns pratos
na mesa, educadamente ignorando o fato de que eu estou uma bagunça
chorosa. Estava tão focada em tudo que acontecia com Ruby, o centro e o
processo que esqueci como era estar apenas em família por um minuto.
O som de unhas no piso de madeira me alerta para a presença de outra
pessoa, e me viro bem a tempo de ver meu cachorro, Dusty, saindo
correndo do banheiro, água pingando do rosto. Ele provavelmente acabou
de beber metade do vaso sanitário, mas estou tão feliz em vê-lo que nem
me importo. Ele me ataca com suas patas gigantes de retriever, e caímos
de costas no sofá.
— Desce, garoto. — minha mãe diz. Papai agarra a coleira de Dusty,
tentando e não conseguindo puxá-lo de cima de mim enquanto ele cheira
e bufa por todo o meu pescoço e rosto, seu rabo abanando a mil por hora.
— Não, ele está ok. É um bom garoto. — Eu rio, coçando com meus
dedos em seu pelo e fazendo sua perna de trás bater descontroladamente
enquanto eu empurro nós dois para cima. E, tudo bem, meus braços e
pernas estão um pouco arranhados, mas vale a pena para um abraço de
cachorro tão épico de Dusty, o melhor garoto.
— Ele sen u sua falta. — Meu pai diz.
— Todos nós sen mos. — Mamãe acrescenta.
— Levem ela, então. — Dylan bufa. — Ela deixa seu maldito cabelo em
todos os lugares, acaba com o leite sem dizer nada e acha que cada copo
de manteiga de amendoim da casa pertence a ela.
Eu mostro minha língua para seus resmungos, e meu pai finge estar
irritado.
— Malditas crianças, sempre brigando. — diz ele, o que lhe rende uma
pancada na nuca da minha mãe.
— Por que essas malas? — pergunto assim que Dusty me abandona por
um Kong de brinquedo que meu irmão encheu de manteiga de amendoim.
— Precisamos de uma desculpa para visitar nossos filhos por alguns
dias? — Mamãe pergunta, e eu pareço chocada porque não era isso que
estava insinuando.
— Não, isso soa realmente incrível. A Ne lix lançou três novas comédias
român cas desde que cheguei aqui, então temos muito tempo de TV para
acompanhar. — Eu puxo a cadeira em frente a ela e começo a colocar
comida no meu prato. — Vocês não mencionaram isso no grupo.
— Devo ter mencionado no outro grupo. — Ela pisca.
— Que outro grupo? — pergunto, soando totalmente escandalizada.
— O que estamos só nós e seu irmão. — papai diz. — No que ele nos
avisa que ngiu o cabelo de rosa e fazemos planos secretos de vir visitá-los
por uma semana, sem dúvida frustrando a tenta va desta noite de deixar
sua namorada entrar de fininho, o que você acha que Dylan não sabe, mas
ele sabe, e nós também.
— Ai meu Deus, Dyl! — eu grito.
Ele apenas dá de ombros e pega um prato. — Eu nunca criei uma
criança! Eu não sei se você tem permissão para ter festas do pijama
secretas com namoradas! O que eu deveria fazer? Adivinhar?
— Você não deveria perguntar a mamãe e papai!
— Bem, eu não poderia te perguntar!
Eu gemo. — Há quanto tempo você sabe?
— É um apartamento de 800 pés quadrados, Morgan, e você é tão su l
quanto um elefante quando abre a porta da frente no meio da noite.
— Mas que...
— Crianças. — papai diz em sua voz severa de sem brigas.
— Agora comam. — mamãe diz, pegando seu garfo. Nós dois calamos a
boca e fazemos o que nos foi mandado, mas faço questão de dar duas
cotoveladas em Dylan enquanto pego um guardanapo.
— Vocês estão aqui pra me cas gar ou algo assim? — pergunto assim
que todos veram a chance de comer.
— Não. — papai diz. — Isso nem faz sen do, já que você estará indo
para a faculdade em breve, de qualquer jeito. Mas queremos conhecer
essa garota, e vamos ter uma conversa séria sobre limites e
comportamento apropriado quando você está morando na casa de outra
pessoa.
— Você não quer que Ruby venha? — perguntei a Dylan. — Achei que
você gostasse dela.
— Não, ela é ok. — diz ele, esfregando a testa. — Eu não me importo se
vocês transam aqui ou qualquer outra coisa, mas não quero ouvir, e não
quero acordar com a porta da frente batendo quando ela sai às cinco todas
as manhãs. Isso é tudo.
Meu pai engasga com um pouco de arroz, e minha mãe dá um tapinha
nas costas dele. — Braços acima da cabeça, querido. — ela diz, e então se
vira para mim. — Talvez eu possa colocar isso de forma um pouco mais
eloquente do que Dylan, mas sim, seu pai e eu reconhecemos que você
tem quase dezoito anos e confiamos em você para tomar boas decisões. Se
você quer que sua namorada passe a noite, precisa perguntar a Dylan
primeiro e ser respeitosa com isso. E seu pai e eu esperamos que você
esteja pra cando sexo seguro. Se ver perguntas...
E, ai meu Deus. Ai meu Deus. Por favor, deixe-me desaparecer nesta
pilha de carne lo mein15. Por favor, Deus. Por favor. É tudo que peço. — Só
para deixar claro, não estamos. — murmuro.
— Não estão pra cando sexo seguro? — mamãe diz. — Só porque vocês
duas são mulheres...
E, ai meu Deus. Ai meu Deus. Faça isso parar.
— Não, quero dizer que não estamos... — digo um pouco mais alto. —
Não estamos... Não fazemos isso quando ela dorme aqui. Só conversamos.
— três conjuntos de sobrancelhas se erguem em uníssono. — Tudo bem,
tudo bem, nós nos beijamos! É o que querem que eu diga? Mas não fomos
além disso. A mãe dela trabalha à noite, e o namorado da mãe dela é um
esquisito, e é por isso que ela dorme aqui o tempo todo. Nós não estamos,
po, constantemente... sabe? — Enfio o garfo na minha comida, minhas
bochechas ficam vermelhas enquanto o resto da mesa explode em
gargalhadas.
— Uau, informação demais. — diz meu irmão.
— Cala a boca, Dylan! — Ele uiva quando eu o chuto por baixo da mesa.
— Olha, se Ruby precisa de um lugar para dormir, não me importo se ela
vier. Mas quero saber que ela está aqui, para não andar com minha cueca
surrada quando há uma garota aleatória à espreita pelo apartamento, ok?
Eu bufo. — Eu pessoalmente gostaria que você nunca andasse por aí de
cueca.
— E eu gostaria de não saber o som quando minha irmãzinha...
— Ok! — papai se anima. — Mudando de assunto antes que eu tenha
que enfiar esses pauzinhos nos meus ouvidos para não ouvir o que quer
que seja o final dessa frase.
Mamãe e papai trocam um olhar. Ele lhe dá um pequeno aceno de
cabeça, e ela suspira. — Há outros mo vos para estarmos aqui, Morgan. —
ela diz.
— Além de me trauma zar pelo resto da vida?
— Sim. — ela diz, e seu olhar sombrio ra o sorriso do meu rosto.
— Ok? O que foi? — Olho para meu irmão, mas ele está encarando o
prato. Ele nem olha para cima quando eu cutuco seu tornozelo.
— Bem, por um lado, a razão pela qual trouxemos malas é porque
vamos ficar direto para a sua corrida neste fim de semana. — diz ela.
— Minha corrida? — pergunto e ela sorri.
— Sim, sua primeira com a nova equipe.
— Ai meu Deus! A troca foi aprovada? — Eu quase derrubo meu copo
com pressa para abraçá-la. — Eu posso mesmo compe r?
— Sim. — minha mãe diz, nossos olhos lacrimejando.
— Não acredito! Nós conseguimos! St. Mary caiu!
— Beth. — meu pai diz, estendendo a mão e apertando a da minha
mãe. — Conte a ela o resto.
Eu mudo meu olhar entre eles, o clima da mesa ficando sério
novamente quando volto a me sentar.
— E além disso... — ela respira fundo. — Seu pai e eu decidimos
arquivar o caso contra St. Mary.
— O quê? Por quê?
— Nossos advogados estão nos dizendo que seria extremamente di cil
vencer neste momento. É uma escola par cular, uma escola religiosa...
Podem levar até a Suprema Corte. E com a forma como este país está
agora... — Ela para.
— Está nos custando muito dinheiro manter isso, Espor sta. — diz
papai. — Nós pegamos um pouco de força por um tempo após as
entrevistas, mas as pessoas seguiram em frente, e os patrocinadores que
nhamos antes não podem se comprometer com tudo empilhado contra
nós assim. É dinheiro melhor gasto no seu futuro.
— E a St. Mary tem muitos doadores influentes que os apoiam. Não
temos realmente escolha. — mamãe acrescenta. — Mas a boa no cia é
que, em troca de desis rmos do processo, eles desis ram da pe ção para
te banir por conduta an despor va e re raram a alegação com o conselho
de atle smo de que você estava envolvida em qualquer po de esquema
de recrutamento. Estão até enviando um relatório favorável à sua nova
treinadora, e ela pode enviar para as faculdades para que possamos deixar
tudo isso para trás. Eu sei que você está desapontada, querida, mas
fizemos a coisa mais importante para você...
— E os jovens que vierem depois de mim? — pergunto, e então olho
para baixo. — E os jovens queer que estão na escola agora? Vocês sabem
que estão lá. Até sabem quem são alguns deles! Como podem
simplesmente desis r?
Papai respira fundo, como se es vesse decidindo o que dizer.
— O quê? — eu pergunto. — O que mais vocês não estão me contando?
— Nós pensamos nas outras crianças. — papai diz. — Até entramos em
contato com os pais para tentar transformar isso em uma ação cole va
quando as coisas começaram a ficar muito caras, mas eles não quiseram. A
triste verdade disso é que todo mundo só quer manter a cabeça baixa até a
formatura. Ninguém mais queria arriscar o pescoço. Sinto muito. Eu sei
que esse não é o resultado que esperávamos, mas...
— Não estou mais com fome. — Empurro meu prato para longe e saio
correndo pelo corredor.
Bato a porta do meu quarto e me jogo na cama, empurrando um
travesseiro sobre a cabeça e esperando que a penugem pelo menos abafe
meu grito.
Minha porta se abre, e eu arrasto o travesseiro para baixo, pronta para
gritar para meus pais saírem. Exceto que é Dylan, e ele tem Dusty com ele.
— Ei. — ele diz, fechando a porta atrás dele enquanto meu cachorro
pula na minha cama. — Sinto muito. Eu sei o quanto isso é um saco.
Abraço Dusty com força, enterrando meu rosto em seu pelo. — Não,
você realmente não sabe.
Dylan passa a mão pelo cabelo e se senta ao meu lado na cama. —
Talvez você esteja certa. Foi tudo compara vamente fácil para mim, cara
branco, hétero e tudo. — Ele suspira. — Mas tenho que te dizer uma coisa,
e você tem que jurar não contar a mamãe e papai que eu contei.
— O quê? — pergunto, a preocupação entorpecendo um pouco as
bordas da minha raiva.
— Eu sei que fizeram parecer que essa foi uma escolha que eles fizeram,
mas na verdade não foi.
— Mas eles...
— Eles quase perderam a casa por causa disso. Eles a hipotecaram de
novo para conseguir mais dinheiro para os honorários do advogado e
outras coisas. A prá ca do papai também. Na verdade, cobri o pagamento
da casa no mês passado, quando estava muito ruim. Eu sei que é
ridiculamente injusto que eles tenham que fazer isso, e que você tenha
que passar por isso, mas você saiu da situação rela vamente ilesa,
enquanto eles ainda estavam afundando rápido.
Balanço a cabeça. — Mas não tem outro jeito? Nenhum mesmo?
— Eles até tentaram envolver a ACLU16. Confie em mim, exploraram
todos os caminhos.
Eu suspiro. — Ó mo, nem mesmo a ACLU ajudaria?
— Quem sabe? — Dylan passa as mãos pelo cabelo. — Duvido que
sequer estejam cientes disso. Aparentemente, pode levar uma eternidade
para que os pedidos sejam revisados, porque recebem muitos todos os
dias. Mamãe e papai não podiam esperar mais. Morgan, você tem que
deixá-los fora disso. A culpa os está matando, mas vão perder tudo se
con nuarem lutando. E você também. Se você perder essa bolsa, com o
estado financeiro deles agora...
Engulo em seco. Não sei o que fazer com essa informação. Sempre
pensei nos meus pais como invencíveis. A ideia de que mergulharam tanto
nisso que veram que pedir dinheiro emprestado ao meu irmão me deixa
um pouco doente.
— Eu acho... — digo, acariciando Dusty gen lmente. — Acho que
poderia con nuar pressionando por mudanças de outras maneiras. Já falei
com Izzie sobre querer fazer mais. Dessa forma, não acabou de verdade.
Está meio que pausado enquanto eu encontro um novo ângulo.
— Sim. — Ele sorri, aliviado. — Soa como uma ó ma ideia. E enquanto
isso, podemos ficar felizes por você ter uma nova escola segura e uma
namorada que parece legal demais para você?
— Ei!
Ele sorri. — Mas, falando sério, isso pode ser suficiente, só por
enquanto?
— Eu me sinto vendida.
— Você não foi.
— Dylan... — Meu telefone vibra, interrompendo o momento, e Dusty
pula da minha cama e arranha a porta.
— É a Ruby? — ele pergunta, levantando-se e abrindo a porta para
Dusty.
— Sim.
— Convida ela pra vir aqui. — ele diz. — E, por favor, converse com
mamãe e papai.
— Eu vou. — digo, sem saber com o que estou concordando. Talvez
ambos.
•••
Ruby de repente e misteriosamente não pode vir para minha casa ao
longo de toda a semana que meus pais estão lá. Ela dá desculpas, culpando
o dever de casa e as sessões de treinamento tarde da noite, e tento não
deixar isso me incomodar.
Ela aparece na minha corrida sexta à noite, no entanto. Minha primeira
corrida oficial na nova escola, onde finalmente não sou uma voluntária,
mas uma par cipante real.
Ela me pega debaixo das arquibancadas e me dá um beijo de boa sorte
perfeitamente incrível antes da minha corrida. Se meus pais ficam confusos
por que meus lábios estão, de repente, do mesmo tom do batom rosa da
garota sentada na fileira atrás deles, não perguntam. Se ficam confusos por
que ela grita mais alto quando ganho o 800 e quando ganhamos o 4x4,
também não perguntam.
Ruby me manda uma mensagem depois, sen mental e orgulhosa, da
tranquila segurança de seu carro no estacionamento. Ela me diz que
adorou me ver correr e que eu sou o “melhor segredo” que ela já teve. E
me convenço de que ser o “melhor segredo” dela é bom, que a dor no meu
peito não significa nada. Que estamos bem, ó mas até. Que estamos
apenas descansando para a próxima batalha.
31
RUBY
— Onde você estava? — A voz de minha mãe corta a minha névoa feliz
antes mesmo de eu ter entrado pela porta da frente.
Vendo Morgan correr? Porra, incrível. Voltando para casa depois? Mate-
me agora.
— Bem? — Diz ela, com as mãos nos quadris.
— Você me assustou. — Os cachorros gritam e põem as patas em mim
enquanto coloco as chaves do carro no balcão. — O que você está fazendo
em casa? Não tem trabalho?
— Eu lhe fiz uma pergunta primeiro. Onde você estava, Ruby Gold? —
Eu odeio quando ela usa meu nome do meio. Odeio com força. Ela afirma
que me deu esse nome porque eu era tão preciosa para ela. Certo. — E
não diga que você estava com aquele garoto do lacrosse, porque eu o vi no
caminho com Marcus esta noite, e você não estava lá.
— Em nenhum lugar. — Respondo, os cabelos do meu pescoço
arrepiando sobre o fato de que ela andava me observando. — Por aí. Mas
por que você ainda está aqui?
Ela se acomoda na borda de sua poltrona reclinável, onde Chuck está
dormindo, a TV ainda está transmi ndo o Fox News. Tem um cigarro aceso
na mão dele, e ela o agarra e o apaga toda indiferente. Como se não fosse
grande coisa ele poder ter incendiado o lugar todo.
— Estou rando um tempinho de folga. — Diz mamãe, levantando o
queixo, me desafiando a ques oná-la. Não perco meu tempo. Estou nesta
terra há tempo suficiente para saber que " rar um tempinho de folga"
significa que ela foi demi da ou dispensada de novo.
Eu suspiro e vou para o meu quarto, seguida pelos cães. O la do
incessante deles aumenta minha frustração. A mãe me segue, o pé dela
prende minha porta quando eu tento fechá-la.
— Não vire as costas para mim, menina.
— O que foi desta vez? Faltou muito ao trabalho para sair com o caso
perdido do seu namorado? — Eu me arrependo imediatamente de dizer
isso. Raramente é culpa dela quando isso acontece. Ela trabalhará até
morrer, se for preciso. É apenas a natureza do negócio. Há poucos
contratos de limpeza a serem cumpridos, o que significa que ela tem que
con nuar trocando de empresas por horas. E quando acabam, o úl mo a
entrar é o primeiro a sair. Mamãe é sempre a úl ma nestes dias.
— Qual é o seu problema? — Pergunta ela, levantando a voz o suficiente
para me dizer que está falando sério.
— Por onde devo começar? — Eu surtei. — Não temos dinheiro e agora
você nem sequer tem emprego! — E não sei por que não consigo parar.
Hoje à noite, estou passando dos limites, mas algo sobre sentar uma fila
atrás da perfeita família Morgan me irritou.
Encontrei seus olhos bem a tempo da palma da sua mão bater contra
minha bochecha. — Não se atreva a falar comigo dessa maneira.
Eu ponho minha mão na bochecha, minhas narinas flamejando de raiva.
— Isso doeu.
— Assim como as palavras. — Ela caminha até meu armário, passa
através dos ves dos e depois me a ra um. Ele cai com um baque e um
barulho na minha cama. — Sabe o que eu passo só para que você possa ter
o po de chance que eu nunca ve? Quanto eu sacrifico?
— Eu nunca te pedi…
— Eu sou sua mãe. É o meu trabalho. — Todo o seu comportamento
muda então, enquanto ela se transforma de novo em minha doce e
cansada mãe, seu sorriso de rainha-de-beleza enfeitando seu rosto. —
Veste isso, querida, quero te ver andar.
E eu odeio isso. Odeio que ela me esbofeteie num segundo e me chame
de "querida" no outro. Odeio o quanto eu gostaria de poder fazê-la feliz,
como cada palavra zangada parece ser minha culpa.
— Está bem. — eu digo suavemente, mesmo estando exausta. Esta é a
maneira mais rápida de terminar a discussão, a única maneira realmente.
Minha mãe me ajuda a ves r meu ves do — o ves do de noite sempre
foi sua parte favorita — e depois puxa meu rabo de cavalo. Ela pega uma
das minhas escovas da cômoda e a passa lentamente pelo meu cabelo. —
O que você realmente estava fazendo esta noite? — Ela me pergunta
novamente, sua mão aperta apenas um pouco.
— Eu estava consertando o carro da Sra. Williams. — Não é uma men ra
completa. Eu parei lá depois do encontro.
— Fui até lá às seis procurar por você depois que vi os garotos
passarem. Ela disse que você ainda não nha ido lá porque estava vendo
alguma corrida.
— Ah, sim, parei na pista de corrida no meu caminho para a casa dela.
Eu esqueci.
— Everly não corre, corre? Eu sei que o Tyler joga lacrosse.
Eu engulo com força. — Não, eles não estavam lá. — Eu me viro para
olhar para ela. — Pensei que seria legal dar uma olhada. Nunca es ve em
uma. Você já foi? Poderíamos ir nós duas um dia destes. Vai ser diver do.
Mamãe me olha diretamente nos olhos, um leve cenho franzido
puxando seus lábios. — Ouvi um rumor sobre você hoje, menina, e é
melhor que não seja verdade.
Isto é ruim. Isto é muito ruim.
— O que você ouviu?
Ela pousou a escova, demorando um pouco antes de responder. — Acho
que você sabe, e acho que tem algo a ver com o porquê de você estar
naquela pista hoje. — Ela olha em meus olhos como se es vesse
procurando uma resposta ou esperando que eu quebrasse.
Milagrosamente, não faço nada disso. — Não vou aceitar outra situação
como a que vemos com sua amiguinha do concurso. Você entendeu? —
Eu aceno. — Agora calce seus sapatos e saia. — Diz ela, e sai
intempes vamente para o final do corredor.
Merda.
Merda! Se alguém sabe sobre mim e Morgan, se alguém disse alguma
coisa e chegou até minha mãe... Mas não posso me preocupar com isso
agora. Não há tempo. Não quando ela está assim.
Meus sapatos esperam por mim no armário, dois lembretes perfeitos e
brilhantes de como não estou correspondendo às expecta vas de minha
mãe. Eu calço meus pés, a memória das vitórias de Morgan hoje se
transformando em cinzas na minha boca. Foi um risco. Um risco estúpido.
Por que eu fui?
Eu me permito um minuto rápido para choramingar, depois fico de pé,
em posição e pronta para o concurso. A ardência da mão da minha mãe
ainda está fresca na minha bochecha.
32
MORGAN
Ruby e Everly estão discu ndo quando eu entro na escola. Faço uma
nota mental para perguntar a ela sobre isso mais tarde, dando-lhes um
amplo espaço enquanto me dirijo ao meu armário. Ruby deu a entender
que Everly sabe sobre nós, mas como ainda não fomos formalmente
apresentadas, não sinto que seja meu lugar ir acalmar as coisas entre elas.
Ruby esteve estranha durante todo o fim de semana, distante. Ela ainda
não apareceu, nem mesmo depois que meus pais par ram. Es ve surtando
pensando que foi algo que eu fiz. Mas ver Ruby e Everly brigando... Talvez
não tenha nada a ver comigo, ou conosco, de maneira alguma. Talvez a
ansiedade do resto de sua vida esteja temporariamente afetando nosso…
bem, o que quer que tenhamos. Eu coloco um rosto feliz e finjo não me
incomoda o quanto ela compar menta todas as suas relações.
A Ruby me ignora no quarto período. Mas então ela me arrasta para o
armário do zelador quando estou passando durante o sexto período. O
sexto período é meu período livre, mas ela tem inglês e eu sei que não
pode se dar ao luxo de faltar.
— O que você está fazendo? — Eu meio rio, esperando que ela me
beijasse ou dissesse algo parecido com eu estava ansiosa para te ver. Mas
seu rosto está triste, comprimido de alguma forma, como se ela vesse um
gosto ruim na boca e não conseguisse rar.
— Precisamos conversar. — Diz ela, e meu estômago cai. Sei por
experiência própria que precisamos conversar com frequência precede
diretamente para isso foi um erro, que é então rapidamente seguido por
acho que não gosto de garotas.
Eu me abraço, me preparando para o pior.
— Sobre?
— Há rumores. Sobre nós. — Diz ela, parecendo absolutamente em
pânico agora.
— Que po de rumores?
— Você sabe que po de rumores. — Diz Ruby, arrancando seu rabo de
cavalo só para voltar a prendê-lo. — Você já contou a alguém? Não contou,
certo?
— Não? —Meu cérebro ainda está tentando processar o fato de que
posso não estar levando um pé na bunda afinal, mas isso também não soa
bem.
— Você contou a alguém sobre nós? Qualquer um? Porque Everly é a
única pessoa que sabia de mim, e ela jura por sua vida que não contou a
ninguém. — A Ruby respira com tremor. Será que ela vai chorar? — Mas
Everly disse que também ouviu algumas coisas e fez o melhor que pôde
para abafá-las para eu não entrar em pânico. Se não foi ela, foi você? Você
não faria isso, certo? Eu sei que você sabe como isso é importante. Sou
uma idiota por até perguntar, mas preciso ouvir isso. Não contou a
ninguém, certo? Ninguém além de seu irmão sabe?
Eu me desloco sob o peso do seu olhar suplicante. — Quero dizer, não
exatamente..
A Ruby parece tão chocada, tão machucada, que minha cabeça gira. —
Não . . . exatamente? Não exatamente?!
— Alguns amigos, mas eles não...
— Jesus Cristo. — Diz ela, se afastando de mim. — Jesus Cristo. Quem?
— Alguns amigos do Clube do Orgulho. E só. E eles nunca diriam nada.
Eu prometo.
— Por que você faria isso? Você sabia! Você sabia que eu… — Ela está
pra camente vibrando. Com raiva? Ansiedade? Eu dou um passo em
direção a ela, pretendendo envolvê-la em um abraço, mas ela se afasta. —
Para quem você contou, Morgan? Especificamente. Eu preciso saber.
— Ninguém, na verdade. Só, po, Aaron...
— Aaron? Meu vizinho, Aaron? Porra. Quem mais?
Eu olho para o lado. — Não sei. Anika, Drew e Brennan também estavam
lá, mas eles nunca contariam a ninguém sobre nós.
— O que você disse a eles sobre mim? Que direito você nha?
— Eu não disse a eles sobre você; eu disse a eles sobre nós. Não é a
mesma coisa! Não é como se eu vesse te rado do armário ou algo assim!
— Sim, você fez isso! — Diz ela, lágrimas escorrendo nos seus olhos.
— Eu não fiz. Juro. Só contei o quanto você me fez feliz, e... Você tem
que entender. Eles são meus amigos. Devo apenas fingir que a melhor
coisa da minha vida não está acontecendo? Isso não é justo.
— Eu não sou sua melhor coisa! — Ruby grita, colocando suas mãos na
cabeça com um gemido.
— Eu não entendo qual é o problema...
— O problema é que as pessoas estão começando a falar de nós como
se es véssemos namorando ou algo assim!
— Oh. — Eu exalo com força, as palavras dela me sugando o ar. Eu
pensei que estávamos namorando.
— Sim, “oh”. — Diz ela, desentendida. — Você sabia que era um
segredo. Era entre nós e não para mais ninguém.
— Não, certo. Entendi. — eu digo, segurando as lágrimas. — Claro como
água. Mensagem recebida.
Ruby me alcança, e agora é minha vez de me afastar. — Não seja assim.
Eu engulo um fôlego de raiva. — Não quero que você me toque agora,
está bem?
— Tudo bem. — Ela deixa cair a mão. — Pensei que estávamos na
mesma página com tudo isto.
Passo a mão nas minhas bochechas, desejando que não es vessem
molhadas. — Sim, acho que entendi mal.
— O que você acha que “segredo” significa, Morgan? Porque é não
contar nossos assuntos para ninguém.
— Minha vida não é um segredo. — Eu digo, um pouco mais alto, nem
mesmo me importando com quem ouve do outro lado da porta. — E
lamento ter ficado com a ideia errada de namorarmos por causa das flores
e dos constantes beijos e, sabe, do encontro. E por falar em beijos, já
pensou que talvez eu não queira mais fazer isso só quando estamos
sozinhas? Que talvez eu queira beijar minha namorada depois de ganhar
uma corrida como todo mundo beija quem quer que esteja namorando,
sabe, sem se esconder debaixo da arquibancada como se es véssemos
cometendo um crime?
— Você sabe que nós não podemos...
— Sim, agora eu sei. Não podemos fazer nada disso. Nunca. — Eu a
empurro para a porta. — Porque acontece que não tenho uma namorada.
Eu só tenho um segredo.
•••
Aaron aparece enquanto eu estou sentada na sala de aconselhamento,
minha cabeça sobre a mesa e meu coração no chão. Porque a Ruby não me
enviou nenhuma mensagem ou tentou falar comigo desde nossa briga, e
honestamente, eu nem sei se ela vai fazer isso.
Dói muito mais do que eu esperava.
— Ei. — Diz ele, batendo no batente da porta. — Você está bem?
— Sim, estou bem. — eu minto. Mas quando ele fica ali parado, eu
acrescento: — Não quero falar sobre isso.
— Está bem. —Diz ele. — Só queria ter certeza de que você ainda estava
de pé para sua consulta.
— O Danny já está aqui? — Eu olho para o relógio. Todo este transtorno
me fez perder a noção do tempo.
— Se for uma noite ruim, posso fazer. Só precisamos do espaço.
— Não, eu estou bem. Mande-o entrar. — Eu me sento um pouco mais
direito e conserto minha camiseta. Talvez ajudá-lo com suas coisas me faça
sen r melhor, ou pelo menos me ajude a passar o tempo entre agora e, eu
não sei, a eternidade?
Danny aparece na porta alguns segundos depois. Ele está com um
moletom enorme, com o capuz todo puxado para cima. Há óculos de sol na
mão dele. Seria cômico como ele estava tentando ser incógnito, se não
parecesse tão miserável.
— Ei. — Digo eu, e enfio a bandeja de biscoitos que Izzie sempre deixa
na direção dele. Ele pega um biscoito doce e me olha com cuidado.
— Você parece horrível.
— Obrigada, você também.
Uau, estou realmente mandando bem nessa coisa de conselheira hoje.
Dou a ele um minuto para terminar seu biscoito, mas quando ele não diz
mais nada, eu o cutuco um pouco. — Queria falar sobre alguma coisa em
par cular? Ou isso é só um encontro casual?
— Eu não sei. — Diz ele, limpando os lábios, o joelho já balançando. Já
faz um tempo que estamos parados nisso, falando de medos superficiais
quando posso dizer que há algo muito maior agitando por baixo de tudo
isso.
— Em que posição você joga mesmo?
— Por quê? — Ele arregala seus olhos para os meus. — Você, de
repente, gosta de futebol?
— Um pouco. Eu gosto dos Patriots e tudo isso.
— Os Patriots não prestam. — Diz ele.
— A gente odeia o que não podemos ser, certo?
— Não, a gente odeia porque eles são maus e horríveis.
— E suponho que as outras equipes são todos anjos?
Danny se encolhe e pega outro biscoito. Eu espero que ele diga mais,
mexendo no meu lugar.
— Eu sou um recebedor. — Ele finalmente diz.
— Deixe-me adivinhar. Você está apaixonado por quem? O zagueiro?
— Não. — Ele parece ofendido.
— Outro recebedor?
Ele olha para baixo, resmungando para si mesmo, e pega outro biscoito.
— Outro recebedor então. — Eu lhe ofereço um sorriso simpá co.
— Como você sabia?
— Porque você parece tão miserável quanto eu hoje, e acho que só o
amor pode fazer isso com a gente.
— Puta merda, isso é sombrio.
— Você vai me contar o que houve ou vai me fazer con nuar
adivinhando?
Ele suspira. — Você é muito chata.
— Eu me orgulho disso. — Eu digo. — Namoro dentro da equipe pode
ser um pesadelo.
— Sim, acho que você fala por experiência própria. Sabe, eu realmente
pensava que você era uma lenda urbana gay até que a vi no no ciário.
— Não. — Eu rio. — Mas, você está dois terços certo.
Ele levanta as sobrancelhas.
— As partes “gay” e “lenda”, obviamente. — Eu digo, me gabando.
Ele murmura e tenta esconder um pequeno sorriso. — Credo.
— Chega de falar de mim, afinal. Qual é o seu problema? Vocês dois
estão juntos? Ou é, po, uma paixão platônica?
— Você também é insistente. — Diz ele. — Irritante e insistente.
— É por isso que me pagam uns bons trocados.
— Te pagam por isto? — Ele parece cé co.
— Quero dizer, não, sou uma voluntária. — Eu pego um biscoito. — Mas
você vai responder à pergunta agora?
Danny inclina-se de volta em sua cadeira. — Con nue adivinhando. É
engraçado.
— Vocês estão juntos?
Ele acena com a cabeça.
— E alguém encontrou vocês dois e está causando problemas?
Ele abana a cabeça.
— Vocês dois se assumiram, e vivem na cidade mais amigavelmente gay
da terra, e tudo é rosas desde nossa úl ma conversa?
Ele abana a cabeça novamente.
— Você foi o único que saiu do armário?
Outro abano de cabeça.
— Ele é um namorado de merda?
Ele ri e abana a cabeça com força com essa.
— Você é o namorado de merda?
— Não. — Ele sorri. — Nós dois somos bons um para o outro.
— Eu desisto. Estou perdida. O que o levou a dirigir noventa minutos até
este centro para ver uma conselheira?
Ele bate com os dedos na mesa e solta um longo suspiro. — Eu ainda
não me assumi. Mas falei para ele que quero e ele disse que não quer. E
desde então, tem sido como… — Ele faz uma pausa. — Sinto que estou
sufocando ou algo assim. Estou nisso com ele, realmente estou, mas
ninguém pode saber. É uma bagunça.
E, uau, essas palavras caem no meu colo como uma pilha de jolos. Toda
a dor e frustração que sinto de Ruby e nossa discussão se reacende dentro
de mim. — É mais do que confuso. É um lixo puro e completo.
— Perdão?
— Se ambos estão apaixonados um pelo outro e têm um bom
relacionamento, então por que não deveriam gritar para o mundo? Na
minha opinião, ela não está realmente levando seus sen mentos em conta.
Ela está manipulando você. Não é justo.
— Ele. — Diz ele.
— O quê?
— Você disse “ela”.
Eu abano a cabeça. — Você sabe o que eu quis dizer. Seu namorado
deveria querer que as pessoas soubessem que vocês estão apaixonados.
Faz parte de estar apaixonado.
— Ele diz que não é assim tão simples.
— Então, ele que se foda. Não deixe alguém te prender em um armário,
literalmente ou figura vamente. Porque é uma droga e não melhora
depois de um tempo. Confie em mim, também sei bastante sobre isso.
Ele sopra um suspiro, suas bochechas incham enquanto ele considera o
que eu disse. — Mas é complicado. Nós dois temos mais um ano de escola;
estamos no segundo ano. Não me importa o que vai acontecer comigo;
não sou uma superestrela do futebol. Mas ele poderia ser. Já está sendo
procurado pelas faculdades. Ele poderia conseguir uma bolsa de estudos,
tornar-se profissional, até.
— E então o quê? Daí você será o segredo dele na faculdade também?
Isso é, se vocês dois chegarem tão longe com todas as escapadas e
men ras.
— Ei!
— Seu namorado perfeito precisa ganhar esse rótulo. E você precisa ter
algumas conversas di ceis com ele. Se vocês fazem um ao outro feliz, por
que o que os outros pensam é importante? Não vão expulsá-lo da equipe
por ser gay.
— Isso não literalmente aconteceu com você? Estaríamos arriscando
tudo se saíssemos do armário. Eu estou pronto, mas...
— Então, vamos processá-los. E vamos processar as faculdades. E
processaremos toda a porra da NFL, se for preciso. Mas você vai sair do
armário. E seu relacionamento não será um segredo por mais um segundo!
Uma ba da na moldura da porta chama minha atenção, e vejo Izzie ali
parada com um sorriso apertado. — Morgan, posso falar com você por um
momento?
— Eu estou no meio de...
— Não, eu sei. — Diz ela. — Vou pedir ao Aaron que entre para
terminar. Só preciso de você emprestada por um minuto.
— Está bem. — Levanto-me devagar e olho para Danny. — Voltarei
assim que puder.
— Melhor não. — Ele parece bravo.
Abro minha boca e depois fecho-a antes de seguir Izzie até o escritório
dela.
— Sente-se. — Diz ela quando está atrás de sua mesa.
— O que está acontecendo? — Eu me sento devagar. — Nunca a vi
interromper uma sessão de aconselhamento antes.
— Está tudo bem, Morgan?
— Sim.
— Parece que hoje você está um pouco nervosa.
— Eu estou bem.
Ela respira fundo. — Morgan, você sugeriu processar a NFL como uma
opção viável para ajudar Danny no seu relacionamento.
Esse é um ponto justo. — Está bem, talvez eu não esteja completamente
bem.
— Quer conversar sobre isso?
— Não. — Digo eu. — Posso simplesmente voltar ao trabalho?
— Infelizmente, tenho algumas preocupações reais sobre sua
capacidade de aconselhamento neste momento. Está tudo bem se você
não quiser conversar comigo. É por isso que temos um programa de
aconselhamento aqui em primeiro lugar. Mas eu adoraria se você...
— Você acha que eu preciso de terapia? Acha que eu estou fodida?
— Aconselhamento é para falar sobre as coisas e encontrar soluções que
funcionem. Todos podem se beneficiar com isso. Não se trata de qualquer
po de julgamento sobre sua saúde mental. Só quero ter certeza de que
você tem o apoio de que precisa.
— Eu sou a conselheira. Conselheiros não recebem aconselhamento.
— Na verdade, a maioria deles fazem. Nunca foi algo como uma rua de
mão única e com tudo o que você passou recentemente, acho que isso
poderia realmente lhe fazer bem.
— Obrigada por sua preocupação, mas tenho as coisas sob controle. De
verdade. Posso voltar lá? Danny e eu temos feito muitos progressos,
então…
— Receio que não. — Diz ela, dando-me um triste sorriso. — Seu
comportamento hoje cruzou algumas linhas com as quais realmente não
me sinto confortável.
— Ai meu Deus, você está me despedindo? — Pergunto, pulando do
meu assento. — Estou sendo demi da de um cargo voluntário?
— Não, Morgan. Claro que não. Ainda acho que você é um trunfo para
este centro. Mas, por enquanto, vou te rar do programa de
aconselhamento.
— Sério? — Sinto que vou surtar. Primeiro eu perdi o processo. Depois,
perdi a Ruby. E agora estou perdendo a única coisa que realmente ainda
me permite sen r que estou fazendo a diferença.
— Sei o quanto você gosta do seu papel aqui, e tenho outras coisas para
você fazer, mas neste momento não estou convencida de que você tenha o
espaço emocional para estar dando a outras pessoas.
— Eu tenho. Eu tenho todo o espaço. Muito espaço. Por favor. Eu
preciso disto.
— Aaron me contou sobre o resultado de sua ação judicial e o quanto
você tem lutado com isso. Tem muita coisa acontecendo fora do centro, e
me preocupo demais com você para arriscar que você se sobrecarregue.
Seria irresponsável da minha parte deixar que você assumisse mais.
— Eu não...
— Podemos reavaliar isto em algumas semanas, mas por enquanto
minha decisão se mantém. Eu adoraria que você con nuasse em outra
função, se es ver aberta a isso. Se você quiser sair mais cedo hoje, ou rar
algum tempo para pensar, eu entendo.
Sento-me ali por um segundo, de boca aberta, com a testa franzida,
deixando suas palavras afundarem na minha pele, onde podem se misturar
com todos os meus outros fracassos.
E então eu me calo porque este dia, este dia não vai me quebrar. — Eu
posso ficar por um tempo. Anika vai trazer um pouco das doações com
algumas pessoas da Sociedade de Honra esta noite. Vou ajudá-los a se
organizarem.
Izzie sorri. — Isso parece uma excelente ideia.
•••
•••
•••
•••
Se não foi a maneira como a porta bateu quando ela entrou correndo
durante a rodada final do concurso que chamou minha atenção, foi
defini vamente a maneira como ela prendeu o fio do microfone no pé
quando encontrou um assento na primeira fila, puxando da mão do
locutor, o que o fez meio que desajeitadamente se abaixar para pegá-lo
sem expor que a parte de trás de seu terno foi na verdade “costurada” com
fita de tecido.
E agora estou de pé no palco ao lado das outras semifinalistas — quinze
de quarenta —, postura perfeita, pescoço arqueado o máximo que dá,
perna inclinada para acentuar a fenda do meu ves do, queixo inclinado
para baixo, sorriso largo — olhando para os olhos de Morgan com o
coração batendo forte no peito como um beija-flor com metanfetamina.
Eu sou a próxima a responder à pergunta da entrevista, que
possivelmente vai decidir todo o meu futuro, e ter Morgan aqui me deixou
distraída. Consumida. Em absolutamente nenhum cenário, pensei que o
resultado do meu bilhete seria a presença dela aqui. Eu nem nha certeza
de que ela iria ler. As luzes ficaram um milhão de vezes mais quentes?
— Em seguida, temos Ruby Gold Thompson. — diz o locutor, lendo
minha biografia e todas as minhas vitórias e colocações anteriores
enquanto deslizo pelo palco. A cauda do meu ves do esvoaçava
elegantemente atrás de mim, suas contas brilhando sob as luzes. Mamãe
gastou dois contracheques inteiros neste ves do e agora ela nem está aqui
para ver. Eu engulo esse pensamento, amargo como a bile.
Eu paro ao lado do locutor quando ele termina de me apresentar — no
momento perfeito como sempre — e mostro meu melhor sorriso para o
público. Morgan está sentada bem atrás dos juízes. De alguma forma, ela
parece tão nervosa quanto eu.
O locutor levanta um aquário de vidro da arquibancada ao lado dele e o
estende para mim. Dentro há dezenas de perguntas dobradas, uma das
quais terei que responder espontaneamente com alguma aparência de
graça. Historicamente, sou péssima nisso, mas Charlene e eu temos
pra cado mais essa parte.
— Agora, querida. — diz ele. — Por favor, selecione sua pergunta.
Eu deslizo minha mão para dentro, fechando meus olhos rapidamente e
fazendo uma pequena oração para que eu consiga algo fácil. Algo onde eu
possa mostrar meu sorriso e dizer a coisa certa. Meus dedos pegam um, e
o puxo para fora e entrego ao locutor.
Ele desdobra o papel e lê:
— Conte-nos sobre a pessoa que você mais admira e como ela será sua
luz guia durante seu reinado como Miss Teen Portwood County.
Ele inclina o microfone na minha direção. Dou um passo para mais perto
dele e luto contra a vontade de limpar minha garganta —, isso seria um
número imperdoável de pontos deduzidos.
Rezo para que minha pontuação não esteja diminuindo com o meu
momento de silêncio, que eu pareça pensa va e contempla va, em vez de
totalmente apavorada. Porque eu sei o que quero dizer. E eu sei o que os
juízes querem ouvir. Mas não tenho certeza de que sejam a mesma coisa.
— Obrigada. — eu digo, ganhando alguns segundos preciosos para
endurecer meus nervos.
Ele sorri para mim de forma tranquilizadora.
— Este ano, esta primavera, na verdade, — digo, olhando para os
jurados com uma expressão que espero transmi r uma seriedade aberta.
— ve a oportunidade de conhecer alguém muito especial. Alguém que
realmente mudou minha perspec va sobre muitas coisas. Alguém que é
mais corajosa do que qualquer pessoa que já conheci e vive de acordo com
seus princípios a um nível que nunca pensei ser possível. Ela tem uma fé
inabalável em seus ideais, não importa o quanto o mundo tente arrancá-
los dela. Quase todos nós vemos coisas ruins e desviamos o olhar, mas ela
não. Não Morgan Ma hews. Ela é diferente.
Eu olho para ela apenas tempo o suficiente para ver seus olhos se
arregalarem. Tudo bem, talvez essa resposta seja um pouco mais intensa
do que eu esperava, mas é tudo o que tenho.
— Conheci Morgan quando ela foi transferida para minha escola e,
todos os dias, desde então, a observei trabalhar para tornar o mundo um
lugar melhor, não apenas para ela e para as pessoas ao seu redor, mas
também em uma escala maior.
— Morgan e eu vemos um começo di cil quando quase a atropelei
com meu carro. E então, não muito tempo depois disso, eu realmente
atropelei ela, mesmo que ela diga que caiu.
Algumas pessoas riem. Alguém tosse. Morgan fica imóvel como uma
pedra. Assis ndo.
— De alguma forma, apesar de tudo, nos aproximamos. Ela me ensinou
que amor e inclusão são o que nos torna humanos, que tudo bem ser... ser
quem você é. — Eu engulo em seco, tentando ficar equilibrada, para
permanecer perfeita, mas posso sen r os olhos de todos queimando em
mim. — Morgan vê através de mim, vê a pessoa que eu realmente sou, e
por causa disso, eu aprendi a me aceitar, a abraçar isso. A sen r orgulho. —
Eu olho para Morgan, seus olhos estão marejados, e respiro fundo. — E eu
amo isso nela. É por isso que estou escolhendo... É por isso que estou
pedindo a Morgan para ser meu farol, quer eu tenha a sorte de ser coroada
Miss Teen Portwood County ou não. Porque mesmo no pouco tempo que a
conheço, tenho visto a força para o bem que ela é neste mundo. Eu
também quero ser assim. Obrigada.
Há alguns aplausos estranhos quando volto para o meu lugar na fila de
concorrentes, nada parecido com Lilah ou Hannah depois de responder a
perguntas semelhantes com "minha mãe" e "Meghan McCain",
respec vamente.
O locutor segue em frente, agradecendo a todos e lendo os
patrocinadores oficiais enquanto os juízes marcam suas pontuações. Eu
colo meu melhor sorriso de vaselina e fico olhando para um ponto na
parede, fazendo tudo que posso para não olhar para Morgan, com medo
do que verei se a olhar.
Os nomes das dez finalistas são anunciados. De alguma forma, eu passo.
Dou minha úl ma volta ao redor do palco, sorrindo, acenando e rezando
para ficar entre as seis primeiras, antes de retornar ao meu lugar na fila.
Demora muito para os juízes se juntarem ao nosso anfitrião no palco,
seus braços cheios de faixas e buquês, e eu estou uma confusão de nervos.
O locutor troca sua lista de finalistas por três envelopes vermelhos
brilhantes, abrindo o primeiro com um sorriso experiente.
— A terceira colocada no concurso Miss Teen Portwood County é… Pia
Roth! — Diz o locutor, chamando-a como em um programa de variedades.
Todos aplaudem e comemoram enquanto ela aceita sua faixa e flores.
O resto de nós espera nervosamente em nossa fila. Agarramos as mãos
umas das outras e seguramos firme. Mais tarde, vamos voltar a ser
compe doras ferozes, mas agora, somos apenas crianças assustadas se
perguntando qual de nós o mundo mais ama.
— A primeira vice-campeã é... — ele diz, e eu aperto a mão da garota ao
meu lado. — Hannah Bronsky!
Hannah sai para pegar sua faixa e rosas e toma seu lugar ao lado de Pia.
Eu respiro fundo. Só resta uma vaga no pódio. Mas ainda há oito de nós na
fila.
— Agora, eu gostaria que todos vocês dessem uma grande salva de
palmas à nossa nova Miss Teen Portwood County... Amber Valejo!
A mul dão vai à loucura, comemorando e batendo palmas enquanto
Amber é coroada. Ela dá sua volta da vitória para “Aí Está Ela, Miss
America” enquanto as pessoas jogam rosas no palco.
É tudo muito dramá co — e lento — e luto contra o desejo de pegar as
folhas de pontuação final da mesa dos jurados.
As cor nas finalmente se fecharam e as vencedoras se afastaram, se
abraçando e chorando, enquanto o resto de nós espera pela colocação.
Restam apenas três chances para a bolsa, mas ainda há sete de nós no
palco. Um dos juízes se aproxima, checando nossas pontuações na
prancheta e apontando para várias garotas.
— Quatro. — ele diz. — Cinco.
— E seis. — Desta vez, ele está apontando para mim.
Ai, meu Deus, eu consegui. Corro para frente e o abraço enquanto ele
aponta para outra garota e diz:
— Sete.
— Obrigada, obrigada, obrigada. — digo, antes de enrolar minha saia o
melhor que posso e sair correndo para fora do palco. Eu desço os degraus
e olho para o público, procurando por Morgan, mas ela não está em lugar
nenhum. A sensação de ganhar a bolsa de estudos dá lugar à decepção, e
meus olhos ardem de dor pela onda de emoções.
Talvez ela vir aqui foi como eu ter ido à corrida estadual dela. E se ela
es vesse apenas planejando entrar e sair como um fantasma? Mas seu
texto...
Uma mão envolve meu pulso e me arrasta para uma pequena alcova
escondida. De repente, estamos cara a cara pela primeira vez no que
parece uma eternidade. Eu quero tanto beijá-la, mas não sei se ela quer
isso. Não sei se isso muda alguma coisa. Não sei se demorei muito para tê-
la de volta.
— Oi. — Morgan diz com um sorriso, e eu derreto.
40
MORGAN
RUBY THOMPSON
Primeira Paixão
— Meu Deus. — Seus olhos parecem um pouco vidrados. — Achei que
você me odiasse!
— Eu sei. É por isso que eu queria te mostrar isso. Como eu realmente
me sen a naquela época.
— Ruby...
— O rótulo está errado, no entanto. — eu interrompo, e Morgan inclina
a cabeça. — Não é uma paixão.
— Ruby. — Sua voz fica baixa.
— Eu te amo. — eu digo, as palavras saindo antes que eu perca a
coragem. — E eu sei que isso é brega pra caramba, mas gostaria de ser sua
namorada. Oficialmente. Se es ver tudo bem.
— O que aconteceu com ‘sem rótulos’? Você não precisa...
— Eu sei. Eu quero. — Eu entrelaço meus dedos com os dela. — Parece
certo.
Ela sorri, chorando.
— Bem, isso defini vamente venceu o discurso.
— Isso é um sim? — Pergunto. Porque, pela primeira vez, sou eu quem
precisa das palavras.
— Sim. — diz ela, aproximando-se até que estejamos completamente
cara a cara. — Eu adoraria que você fosse minha namorada, Ruby. E eu
também te amo.
Me inclino para frente até sen r seus lábios contra os meus, e então eu
despejo cada grama de mim mesma em nosso beijo. Minha vida inteira
pode ser uma série sem fim de pontos de interrogação agora, mas tenho
certeza disso. Isso eu quero.
— Vamos, então. — eu digo quando finalmente nos separamos. — Eu
quero levar minha namorada para um café da manhã.
Morgan sorri, olhando para a foto mais uma vez, em seguida, estende a
mão para mim enquanto saímos. Pego sua mão e aperto como já fiz
centenas de vezes. Mas desta vez parece diferente.
Desta vez, eu não quero soltar nunca mais.
AGRADECIMENTOS
[←1]
Nota da tradução: tulo de uma música da banda Metallica.
[←2]
Nota da tradução: D1 é a categoria de escolas/faculdades de elite, as
melhores.
[←3]
Centro de convenções localizado em San José, Califórnia.
[←4]
D.A.R.E. ou Drug Abuse Resistance Educa on (Educação sobre Resistência ao
Uso de Drogas, em tradução literal) é um programa an drogas muito
semelhante ao que conhecemos no Brasil como PROERD.
[←5]
Marca americana de água gaseificada que conta com vários sabores.
[←6]
Ao pé da letra, a palavra significa estranho e sempre foi usada como ofensa a
pessoas LGBT+. No entanto, a comunidade LGBT+ se apropriou do termo e hoje
é uma forma de designar todos que não se encaixam na
heterocisnorma vidade, que é a imposição compulsória da heterossexualidade
e da cisgeneridade.
[←7]
Organização norte-americana dedicada a reconhecer aqueles estudantes que
se destacam no Ensino Médio.
[←8]
Marca de suco em pó.
[←9]
Nota da tradução: O alternador é uma peça mecânica de extrema
importância para o funcionamento do veículo.
[←10]
Nota da tradução: em inglês, a frase é “i can’t even think straight”. Foi feito
um trocadilho com a palavra “straight” que pode significar tanto “direito/linear”,
quanto “hétero”.
[←11]
Nota da tradução: A “Não Pergunte, Não Conta” foi uma polí ca do Exército
estadunidense em vigor desde 1993 que proibia homens gays ou bissexuais
assumidos de servirem para, teoricamente, manter a segurança dos militares
queer e evitar assédios, agressões e etc. Poderiam servir ao exército, desde que
escondessem sua sexualidade. Essa polí ca foi derrubada em 2011.
[←12]
A palavra dough, em inglês, significa massa, mas também é uma gíria para
dinheiro, criando um trocadilho.
[←13]
Nota da tradução: em inglês, Everly diz “You’re not thinking straight right
now”. Foi feito um trocadilho com a palavra “straight” que pode significar tanto
“direito/linear”, quanto “hétero”.
[←14]
DEFCON é um sistema de alerta u lizado pelas Forças Armadas dos Estados
Unidos. Há 5 estados de alerta e aumenta de acordo com a gravidade, sendo o
DEFCON 5 (menos grave) até o DEFCON 1 (mais grave), correspondendo várias
situações militares. O DEFCON 1 sinaliza a eclosão de uma guerra nuclear.
[←15]
Prato chinês com macarrão de trigo, legumes e algum po de carne.
[←16]
A União Americana pelas Liberdades Civis é uma ONG que visa proteger os
direitos civis dos cidadãos dos Estados Unidos.
[←17]
Aliança entre Gays e Héteros.
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