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Introdução a

Fitoterapia
Luciano Senti da Costa

Unidade 01

Conhecendo o
panorama histórico
do uso e produção
de fitoterápicos no
Brasil e no mundo
Diretor Executivo
DAVID LIRA STEPHEN BARROS
Diretora Editorial
ANDRÉA CÉSAR PEDROSA
Projeto Gráfico
MANUELA CÉSAR ARRUDA
Autor
ANALICE OLIVEIRA FRAGOSO
Desenvolvedor
CAIO BENTO GOMES DOS SANTOS
O autor
LUCIANO SENTI DA COSTA

Olá. Meu nome é Luciano Senti da Costa. Sou formado em Ciências


Biológicas e tenho mestrado e doutorado em Farmacologia. Em minha
carreira acadêmica e profissional atuei em diversas áreas laboratoriais
por aproximadamente 25 anos, na parte experimental, na docência e na
pesquisa científica, dentre estas, a Fitoterapia. Atualmente trabalho como
diretor técnico-científico na empresa Studio Educacional DL, além de
exercer consultorias em assuntos relacionados à Biologia para empresas.
Em minha jornada aprendi que o professor deve ser uma pessoa capaz de
conduzir seus alunos ao conhecimento, indicando os melhores caminhos
e colaborando para seu desenvolvimento acadêmico, profissional e como
cidadão. Seguindo este mesmo ideal, hoje faço parte da equipe da Editora
Telesapiens e o material a seguir foi produzido pensando em você! Desejo
que tenha muito sucesso em seus estudos.
Iconográficos
Olá. Meu nome é Manuela César de Arruda. Sou a responsável pelo pro-
jeto gráfico de seu material. Esses ícones irão aparecer em sua trilha de
aprendizagem toda vez que:

INTRODUÇÃO: DEFINIÇÃO:
para o início do houver necessidade
desenvolvimen- de se apresentar
to de uma nova um novo conceito;
competência;
NOTA: IMPORTANTE:
quando forem as observações
necessários obser- escritas tiveram
vações ou comple- que ser prioriza-
mentações para o das para você;
seu conhecimento;
EXPLICANDO VOCÊ SABIA?
MELHOR: curiosidades e
algo precisa ser indagações lúdicas
melhor explicado sobre o tema em
ou detalhado; estudo, se forem
necessárias;
SAIBA MAIS: REFLITA:
textos, referências se houver a neces-
bibliográficas e sidade de chamar a
links para aprofun- atenção sobre algo
damento do seu a ser refletido ou
conhecimento; discutido sobre;
ACESSE: RESUMINDO:
se for preciso acessar quando for preciso
um ou mais sites se fazer um resumo
para fazer download, acumulativo das
assistir vídeos, ler últimas abordagens;
textos, ouvir podcast;
ATIVIDADES: TESTANDO:
quando alguma ativi- quando o desen-
dade de autoapren- volvimento de uma
dizagem for aplicada; competência for
concluído e questões
forem explicadas;
SUMÁRIO
Conhecendo o panorama histórico do uso e produção de
fitoterápicos no Brasil e no mundo...................................12

Fitoterapia no mundo: Da Pré-história a Era Cristã............13

Fitoterapia no mundo: Da Era Moderna aos dias atuais......17

Fitoterapia no Brasil...........................................................20

Mercado de fitoterápicos....................................................24

Iniciativa privada ...................................................25

Rede pública...........................................................28

Produtos naturais: do conhecimento popular à indústria


farmacêutica.....................................................................29

A Etnofarmacologia............................................................30

Etnofarmacologia e a investigação.....................................31

Da cultura popular à síntese...............................................31

Crenças populares e registros.............................................34

Bases conceituais..............................................................37

Bases empíricas..................................................................38

Conceitos básicos...............................................................40

Definições da fitoterapia.....................................................41

Definições científicas botânicas..........................................42


Regras básicas de nomenclatura..............................44

Legislação e políticas públicas sobre fitoterápicos............49

Legislação no mundo.........................................................49

Legislação brasileira..........................................................50

Política e programa nacional de plantas medicinais e


fitoterápicos.......................................................................53

Política nacional de plantas medicinais e fitoterápicos..53

Programa nacional de plantas medicinais e


fitoterápicos............................................................54
Introdução a Fitoterapia 9

01
UNIDADE

CONHECENDO O PANORAMA HISTÓRICO DO


USO E PRODUÇÃO DE FITOTERÁPICOS NO BRASIL
E NO MUNDO
10 Introdução a Fitoterapia

INTRODUÇÃO
O uso de plantas medicinais está profundamente enraizado na
cultura humana. A maioria das civilizações antigas guarda algum registro
de uso seja para cura ou em rituais religiosos. Apesar de todos os avanços
tecnológicos da Farmacologia e da Química, as plantas medicinais são
em muitos lugares, a única fonte de remédios atualmente. Mesmo em
países desenvolvidos, a produção de medicamentos à base de plantas
tem aumentado. No Brasil, temos uma enorme diversidade de flora
medicinal e pouco a pouco pesquisas estão sendo conduzidas para que
se tenha proveito de tanta matéria-prima. A disciplina de Introdução à
Fitoterapia irá abordar temas relevantes na área, desde a história do uso
de plantas medicinais até a produção dos diferentes tipos de produtos e
medicamentos fitoterápicos. Nesta primeira Unidade o foco será em dar
a você um contexto histórico útil para uma compreensão geral do uso
de plantas medicinais ao longo do tempo em diferentes civilizações e
épocas, como o conhecimento popular de diferentes regiões e culturas é
importante para a descoberta de novas plantas com potencial medicinal,
as bases conceituais necessárias para entendimento genuíno das
próximas unidades e também a legislação e incentivos governamentais
do nosso país em relação aos fitoterápicos. Desejo um bom estudo a você.
Introdução a Fitoterapia 11

OBJETIVOS
Olá. Seja muito bem-vindo à Unidade 1. Nosso propósito é auxiliar
você no desenvolvimento das seguintes objetivos de aprendizagem até o
término desta etapa de estudos:
• Conhecer o panorama histórico do uso e produção de fitoterápicos
e o mercado econômico desta categoria farmacêutica no Brasil e no mundo.
• Compreender a etnofarmacologia como uma área interdisciplinar
que alia conhecimentos tradicionais locais com estudos farmacológicos
científicos.
• Entender as bases conceituais da Fitoterapia, do empirismo às
definições científicas.
• Conhecer as leis brasileiras que regulam à produção e prescrição
de fitoterápicos no Brasil e as políticas e programas nacionais de plantas
medicinais e fitoterápicos.
O câncer é uma doença muito complexa, por isso exige muita
dedicação para conhece-la. Então? Preparado para uma viagem sem volta
rumo ao conhecimento? Ao trabalho!
Então? Preparado para uma viagem sem volta rumo ao
conhecimento? Ao trabalho!
12 Introdução a Fitoterapia

Conhecendo o panorama histórico do


uso e produção de fitoterápicos no Brasil
e no mundo

OBJETIVO
A Unidade 1 da disciplina de Introdução à Fitoterapia trata
de temas importantes à compreensão geral da área. Ao
término desta unidade você será capaz de entender todo
o panorama histórico que abarca a Fitoterapia, desde o
uso de plantas medicinais pelos povos pré-históricos até
os dias atuais. Você sabe quanto fatura esse mercado
no Brasil e no mundo? Você também vai descobrir nesta
unidade. Também será abordado a Etnofarmacologia e
você conseguirá compreender todo o processo gerado a
partir de descobertas etnofarmacológicas. Além disso, irá
aprender as bases conceituais da Fitoterapia e a legislação
que rege a categoria. Políticas e programas nacionais
relacionados ao tema serão explorados com objetivo de
contextualizar o aprendizado às normas de segurança e
eficácia determinadas pelo órgão regulador no Brasil.

O uso de plantas medicinais tem origem anterior à escrita, sendo


transmitido em grande parte oralmente. É o mais antigo e ainda usado
sistema de medicina. É um tipo de conhecimento popular, o qual cada
lugar tem o seu, baseado na flora regional. Por mais incrível que possa
parecer, até mesmo os animais se utilizam de plantas com objetivos
fitoterápicos. Um dos casos mais comuns é o de cães e gatos que
se alimentam de gramíneas quando sentem enjoo ou comem algo
venenoso. Antes de aprendermos mais a fundo sobre fitoterapia, vamos
reviver historicamente a origem e o progresso alcançado por essa área.
Introdução a Fitoterapia 13

VOCÊ SABIA?
É normal usarmos plantas como remédios, fazemos isso
há milênios, mas e se eu te disser que também é comum
inúmeras espécies animais fazerem o mesmo? Conheça a
zoofarmacognosia, ou seja, o uso de plantas específicas
por animais com intenção medicinal. Acesse este link com
uma matéria do Dr. Dráuzio Varella sobre o assunto:
https://bit.ly/2lFVb3Z.

Fitoterapia no mundo: Da Pré-história a


Era Cristã

DEFINIÇÃO
Fitoterápicos são produtos ou medicamentos produzidos
a partir de plantas medicinais com eficácia e segurança
comprovada. Os medicamentos produzidos a partir de
um princípio ativo isolado não podem ser chamados de
fitoterápicos.

O uso de plantas com objetivo de cura ou tratamento de alguma


enfermidade data de cerca de 60 mil anos atrás, o que apenas confirma
a importância deste conhecimento disseminado e passado através das
gerações. Foi, provavelmente, a forma mais primitiva de tentar combater
as doenças. Os mesopotâmios já utilizavam plantas como a papoula
(Papaver somniferum), mirra (Commiphora sp.) e alcaçuz (Glycyrrhiza
glabra).
Grandes civilizações antigas como a chinesa, egípcia, grega e
indiana possuem registros milenares do uso de plantas medicinais.
Exemplo: A planta Artemisia annua, conhecida popularmente
como absinto doce, era usada contra a malária na China por volta do
ano 206 a.C.
14 Introdução a Fitoterapia

Figura 1: Pintura da Artemisia annua retirada da Farmacopéia Ilustrada de Yunnan, compilada


no período chinês Ming, no ano de 1773.

Autor: © Wellcome Collection / Wikimedia Commons

O primeiro herbário que se tem notícia é chinês, criado por


volta do ano 3000 a.C. Porém, os egípcios também possuíam um vasto
conhecimento de suas plantas medicinais, com registros de 4000 anos
atrás. O preparo incluía plantas com propriedades vermífugas, diuréticas
e antissépticas. Confira outros exemplos a seguir:
• Ópio (Papaver somniferum), usado como sedativo e calmante;
• Mamona (Ricinus communis), óleo extraído das sementes da
mamona, utilizado como laxante;
• Cila (Drimia urticaria), usada como estimulante cardíaco;
• Hortelã pimenta (Mentha piperita), usada como digestivo;
Introdução a Fitoterapia 15

Figura 2: Mentha piperita, utilizada pelos egípcios há milênios para melhorar problemas
digestórios

Autor: Vsolymossy / Wikimedia Commons

A invenção da escrita teve um importante papel na disseminação


do conhecimento fitoterápico, pois permitiu registrar as espécies e
seus usos. Na Índia, no século I a.C., um médico indiano denominado
Charaka escreveu um tratado com 500 plantas medicinais, contendo
conhecimentos da medicina Ayurvédica, que tem sua origem há 5000
anos, em uma época que era comum o uso de encantamentos, plantas
e animais em rituais místicos e curativos. A maior parte do conhecimento
era transmitido oralmente e, portanto, não possui registro. Com a
chegada dos ingleses à Índia no século XVI, o Ayurveda foi desacreditado
e a medicina ocidental tida como única confiável. Entretanto, nos dias
atuais, figura entre os seis tipos de sistemas de saúde que possuem
reconhecimento no país.
16 Introdução a Fitoterapia

Figura 3: Estátua em homenagem ao médico hindu Maharishi Charaka

Autor: Alokprasad / Wikimedia Commons

Grécia e Roma se utilizaram de conhecimentos antigos e se


destacaram no uso de plantas com fins medicinais. Na Grécia, Hipócrates,
considerado o "pai da medicina" afirmava que a alimentação era fonte de
cura para doenças. Na era cristã, o médico grego Pendamius Dioscorides,
que foi médico de Nero escreveu um livro que continha cerca de 1000
drogas, sendo que 600 eram plantas. O livro De Matéria Médica foi
utilizado por gregos, romanos e árabes e turcos por mais de 15 anos.
Dentre as plantas mencionadas, destacam-se o cânhamo (Cannabis
sativa), a cicuta (Conium maculatum) e a mandrágora (Mandragora
officinarum).
Plínio, o Velho foi o primeiro a sugerir que para cada doença
existia uma planta curativa, ele foi o responsável por escrever História
Natural, com 37 volumes que mencionavam várias plantas medicinais.
Galeno, considerado o "pai da farmácia" escreveu mais de 300 tratados e
realizou muitas misturas com intuito de cura através das plantas.
Introdução a Fitoterapia 17

Figura 4: Ilustração de Claudius Galeno, rodeado de outros médicos da Idade Média, como
Dioscorides, sentado à esquerda

Autor: © Veloso Salgado/ Wikimedia Commons

Fitoterapia no mundo: Da Era Moderna


aos dias atuais
Na Idade Moderna, o médico suíço Paracelso ficou conhecido
por fundar as bases da medicina natural. Foi ele quem afirmou que uma
mesma substância pode ser remédio ou veneno, a depender da dose.
Porém, os avanços desta era não foram todos cientificamente corretos.
Exemplo: Foi Paracelso que criou a teoria de que a morfologia
da planta seria um indicativo da sua função. A planta serpentária que
lembra o corpo de uma serpente seria útil em picadas de cobra, o que é
completamente refutado atualmente.
18 Introdução a Fitoterapia

Figura 5: Dracunculus vulgaris, conhecida como serpentária devido a sua haste parecer
com uma serpente

Autor: © Jörg Hempel / Wikimedia Commons

A partir dos avanços na área da Química conquistados na Idade


Contemporânea, ficou mais fácil analisar os princípios ativos de cada
planta medicinal. Isso fez com que muitos medicamentos fossem
produzidos baseados em compostos extraídos de plantas. Foi a origem
da medicina alopática. A homeopatia surgiu nesta mesma Era.
Introdução a Fitoterapia 19

DEFINIÇÃO
Alopatia é o método medicinal utilizado pela medicina
tradicional. Nele, medicamentos são produzidos com
objetivo de produzir um efeito contrário ao da doença, como
os antivirais, antibióticos, anti-histamínicos, entre outros.
Podem ser produzidos de maneira sintética ou com base
em plantas, minerais e até animais. Possuem maior número
de efeitos colaterais e podem ser mais tóxicos. Homeopatia
refere-se ao tratamento por semelhança, neste método
o paciente é exposto à mesma substância causadora do
sintoma, porém em concentração extremamente baixa,
para que o corpo por si só se recupere. O objetivo é
encontrar um equilíbrio. Faz parte da medicina alternativa e
é considerada pela maioria dos cientistas ocidentais como
ineficaz ou até mesmo enganosa.

A alopatia em seu início usava o princípio ativo de muitas plantas


como matéria-prima para fabricação de medicamentos. Somente a
partir de um avanço das técnicas químicas foi possível iniciar a produção
artificial de substâncias medicamentosas. Por isso, este período ficou
marcado por uma vasta lista de extração de princípios ativos de plantas,
como:
• A morfina extraída do ópio (Papaver somniferum), utilizada como
analgésico;
• A atropina extraída da beladona (Atropa belladona), utilizada em
doenças do sistema nervoso;
• A cocaína extraída da coca (Erithroxylum coca), utilizada como
anestésico.
Desde então, a preocupação com a segurança dos medicamentos
vem aumentado, com uma série de passos até chegar ao medicamento
final vendido nas farmácias. Vários testes são feitos e um medicamento
pode demorar até 10 anos para chegar a ser comercializado, desde a
descoberta de seu princípio ativo.
20 Introdução a Fitoterapia

ACESSE
Para conhecer mais sobre a história da Fitoterapia assista
esse vídeo incrível sobre esta área acessando o link:
https://bit.ly/2lFbMoA

Fitoterapia no Brasil
Até a chegada dos portugueses ao Brasil no ano de 1500, os índios
eram os únicos detentores do conhecimento de plantas medicinais na
região. Nas tribos, os responsáveis pela cura através das plantas são
os pajés, que auxiliados pela imensa biodiversidade vegetal no país,
transmitiam esse conhecimento totalmente empírico às gerações
seguintes, com uma mescla de rituais religiosos e de cura.
Os africanos trazidos ao Brasil como escravos também
influenciaram ricamente o conhecimento de plantas medicinais, que
eram trazidas junto com eles e também usadas como tratamento e
rituais religiosos.
Porém, os europeus rapidamente demonstraram interesse pela
rica flora do país e com auxílio da identificação e nomenclatura indígena,
iniciaram a catalogação de espécies nativas utilizando desenhos. Nossas
espécies chegaram até a Europa e foram úteis para a farmacologia
existente na época.

REFLITA
Muitos remédios eram trazidos da Europa de Portugal em
navios, porém como a viagem era muito longa, alguns se
estragavam no percurso. Isso foi uma das causas para que
a flora medicinal brasileira fosse utilizada pelos médicos no
Brasil Colônia.

Os médicos portugueses no Brasil logo perceberam a utilidade


dos conhecimentos indígenas, visto a escassez de remédios europeus
na Colônia. Às plantas medicinais indígenas dava-se o nome de "as
árvores e ervas da virtude". Também os naturalistas europeus que faziam
Introdução a Fitoterapia 21

expedições às florestas brasileiras com objetivo de explorar, catalogar


e enviar à Europa plantas e animais que despertasse algum interesse
científico ou comercial.
O primeiro tratado médico que continha informações sobre plantas
brasileiras é o Historia Naturalis Brasiliae, escrito em latim e publicado
no ano de 1648 pelo holandês Guilherme Piso com observações de mais
três naturalistas europeus. A obra, além de conter uma lista de doenças
que afetavam o povo brasileiro, mencionava as formas de tratá-las,
como o uso da ipeca (Psychotria ipecacuanha) como emético (capaz de
provocar vômito).

Figura 6: Ilustração da Psychotria ipecacuanha, planta usada devido às suas propriedades


eméticas

Autor: © Franz Eugen Köhler / Wikimedia Commons


22 Introdução a Fitoterapia

IMPORTANTE
Os naturalistas e farmacêuticos da época que viajavam até
o Brasil faziam mais que apenas coletar e catalogar plantas
para enviar a Europa. Eles também extraíam substâncias
medicinais ativas das plantas, como o alcalóide cinchonina
das cascas de quina (Cinchona calisaya) e a pereirina do
pau-pereira (Platycyamus regnellii), o primeiro sendo
extraído em Lisboa e o segundo no Rio de Janeiro.

Figura 7: Estrutura química do alcalóide cinchonina, extraído da Cinchona calisaya

Autor: © Ccroberts / Wikimedia Commons

Na Europa, os responsáveis por vender e até mesmo produzir


medicamentos eram chamados de boticários, profissão regulamentada,
inclusive. A maioria cultivava em jardins as plantas medicinais para o
preparo de chás, extratos, tinturas e infusões. O local de venda chamava-
se botica, o que seria hoje equivalente às farmácias modernas. No Brasil,
o primeiro boticário, Diogo de Castro, chegou de Portugal na comitiva de
Tomé de Souza em 1549. Os jesuítas aprendiam com os índios e africanos
Introdução a Fitoterapia 23

e juntavam o aprendizado ao conhecimento europeu já consolidado,


originando medicamentos produzidos de plantas brasileiras, como a
rosa, o sene, manacá e copaíba.
A Era da Razão, conhecida como Iluminismo, iniciada no século
XVII, teve papel relevante no descrédito da medicina popular, com a
proibição aos curandeiros, por exemplo. Na prática, estes continuavam
sendo requisitados na Europa.
Apenas em 1819 foi introduzida a disciplina de Farmácia na
Universidade da Bahia e em 1832, o curso de Farmácia. Em 1971 foi
fundada a Academia Científica do Rio de Janeiro com objetivo de
oferecer uma pesquisa médica científica contrapondo os curandeiros
que se utilizavam de medicina popular de plantas. Devido à expansão
da indústria farmacêutica no decorrer dos anos, os medicamentos
fitoterápicos começaram a ser vistos com certa desconfiança, misticismo
e até mesmo julgados como sendo apenas crença popular sem eficácia.
Porém, é errôneo o pensamento de que um conhecimento prático
acumulado ao longo de milhares de anos não seria válido, portanto,
alguns fatores atuais estão sendo a causa do reavivamento dessa
prática milenar, dentre eles o alto custo de medicação convencional e os
efeitos colaterais que podem causar. Com isso, pesquisas relacionadas
à fitoterapia estão crescendo no meio científico, inclusive no Brasil, com
maior valorização de sua riquíssima flora local.

ACESSE
A ciência comprovou que conhecimento dos índios é
confiável e transformou conhecimento em medicamentos
fitoterápicos. Assista o processo no link
https://bit.ly/2nllehg.
24 Introdução a Fitoterapia

Mercado de fitoterápicos
Considerando a tradição, importância e eficiência no uso de
plantas com fins medicinais, torna-se importante analisar o mercado
financeiro deste setor no Brasil e no mundo. O mercado global de
fitoterápicos foi avaliado no ano de 2016 em cerca de 70 bilhões de
dólares e tende a aumentar a cada ano, pois os consumidores têm
mostrado certa preferência por medicamentos com menos efeitos
colaterais e substâncias sintéticas, além disso, o menor custo destes
em comparação com os alopáticos atraem o comprador. O aumento no
número de casos de algumas doenças como o câncer, diabetes, artrite e
doenças infecciosas contribui para um crescente mercado de fitoterapia.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, aproximadamente
70 a 80% da população mundial depende de plantas para tratamentos
médicos.
Apenas o segmento de extratos fitoterápicos gerou uma receita
de 27,1 bilhões de dólares em 2016, com expectativa de chegar aos 44
bilhões em 2024. Fitoterápicos usados para tratar problemas digestórios
são os mais procurados no mundo.
O continente europeu é líder no comércio de fitoterápicos, com
a Alemanha em primeiro lugar. Isso ocorre em parte pelas iniciativas
governamentais de divulgação e conscientização do uso de produtos
com base em plantas medicinais, e também pela maior flexibilidade
legal no lançamento de novos produtos.
Países asiáticos como China, Japão, e Índia têm visto grande
crescimento neste mercado devido às práticas tradicionais de medicina
alternativa serem tradicionais e também pelo aumento da expectativa
de vida, o que gera uma maior parcela da população de idosos.
Introdução a Fitoterapia 25

IMPORTANTE
O setor de fitoterápicos possui uma característica diferencial
que é o uso doméstico de plantas, parte das pessoas colhe
e prepara seus medicamentos sem nenhum controle ou
registro. Outra característica é a presença de produtores
locais que estão restritos à determinada região. Isso faz
com que a indústria se mostre um pouco desorganizada.

O objetivo é que, através do avanço da tecnologia de


equipamentos e técnicas, a produção de produtos com maior qualidade
ocorra ao mesmo tempo que estes possam ser distribuídos globalmente
e não apenas permaneçam concentrados em determinadas regiões.
Curiosamente, a América Latina, que possui vários países com
rica biodiversidade de flora medicinal engloba apenas 5% de todo o
mercado de medicamentos fitoterápicos.

REFLITA
Apesar da enorme biodiversidade da flora brasileira, a
maioria dos remédios fitoterápicos comercializados no
Brasil tem como base plantas estrangeiras, por isso a
necessidade de valorização e pesquisa da flora fitoterápica
local.

Iniciativa privada
O mercado farmacêutico brasileiro, apesar da crise econômica
que assola o país nos últimos anos, tem se mantido estável, em 2015
cresceu 12% em faturamento, com um total de R$ 84,3 bilhões em 2015.
O setor fitoterápico representa uma fatia de 2% deste total, gerando uma
receita de R$ 1,6 bilhão no mesmo ano.
26 Introdução a Fitoterapia

Gráfico 1: Comparação de vendas de produtos farmacêuticos alopáticos e fitoterápicos no


Brasil e no mundo em 2015

Autor: autoria própria

Ainda que os produtos alopáticos sejam mais vendidos, o mercado


de fitoterápicos cresce o dobro por ano, em comparação.
Exemplo: Um dos produtos com maior demanda em nosso país
é a castanha-da-Índia (Aesculus hippocastanum), de origem europeia
é utilizada principalmente para tratamento de condições relacionadas
ao sistema sanguíneo, como varizes e insuficiência venosa. Sua origem
condiz com a informação de que os produtos fitoterápicos mais
comercializados no Brasil não possuem origem brasileira.
Introdução a Fitoterapia 27

Figura 8: Ilustração da castanheira-da-Índia (Aesculus hippocastanum), feita no ano de 1885

Autor: Otto Wilhelm Thomé / Wikimedia Commons

Algumas empresas, como a Aspen Pharma Brasil, subsidiária


da gigante africana Aspen Pharmacare, lucram bastante com o setor
fitoterápico. Cerca de um terço do lucro da Aspen Pharma Brasil advém
de fitoterápicos, sendo o Calman o mais vendido. É um medicamento
à base de Passiflora incarnata, Crataegus oxyacantha e Salix alba e
que possui efeito calmante, sendo receitados em casos de ansiedade
leve. Indústrias como a Aché, o Grupo Natulab, Herbarium Laboratório
Botânico e Marjam Farma estão entre as empresas que mais apostam e
vendem fitoterápicos no país.
No varejo farmarcêutico, estima-se que a porcentagem de venda
de fitoterápicos seja em torno de 4 a 5% do total de produtos vendidos,
com tendência ao aumento.
Há uma contradição interessante em nosso país referente à
proporção de empresas farmacêuticas produtoras de fitoterápicos em
28 Introdução a Fitoterapia

relação ao local de origem da flora medicinal. Em 2015, a maioria das


empresas e registros localizavam-se na Região Sul e Sudeste, enquanto a
Região Norte, berço do maior número de espécies de plantas medicinais,
sequer se encontra na lista de empresas e registros da ANVISA.

Rede pública
Já na rede pública brasileira, a procura por medicamentos
fitoterápicos no SUS aumentou 161% entre os anos de 2013 e 2015,
segundo o Ministério da Saúde, passando de 6 mil para 16 mil pessoas
que procuraram medicamentos fitoterápicos em farmácias da rede SUS.
Os fitoterápicos podem ser encontrados industrializados,
manipulados ou a planta in natura e são utilizados para combater vários
tipos de doenças, como as ginecológicas, estomacais, reumatológicas e
até em casos de queimaduras.

ACESSE
Medicamentos fitoterápicos já são receitados por médicos
da rede pública. Veja como o médico Pedro Costa que
atende em Pernambuco receita estes medicamentos aos
pacientes através do link:
https://glo.bo/2mQa6bT.

Os maiores investimentos por parte do governo neste tipo


de tratamento incluíram 30 milhões de reais em 78 projetos com
plantas medicinais e fitoterápicos e o primeiro curso à distância para
300 médicos sobre fitoterapia. Mesmo com um cenário positivo
nesse sentido, nosso país possui potencial para crescer ainda mais,
considerando sua biodiversidade, principalmente. Atualmente o SUS
possui apenas 12 medicamentos fitoterápicos na Relação Nacional de
Medicamentos (RENAME) disponíveis para a população, e que não são
sequer encontrados em toda a rede de saúde pública nacional. Parte
da culpa é da falta de conhecimento dos médicos e, portanto, não os
prescrevem, os pacientes também não possuem conhecimento do uso
Introdução a Fitoterapia 29

de fitoterápicos no SUS e não pedem, tendo seu uso mais comum em


casa ou através de remédios comprados sem receitas nas farmácias.
Apesar de todas as iniciativas públicas e privadas para a expansão
da categoria de medicamentos fitoterápicos, o Brasil ainda poderia
produzir mais em relação à sua rica biodiversidade. As possíveis causas
para que o Brasil fique tão aquém do seu potencial são:
• Dificuldades burocráticas de acesso ao patrimônio genético
que desestimula a pesquisa e posterior tentativa de patente;
• Alto custo para pesquisas e produção de novos medicamentos;
• Poucos agricultores qualificados para entrega de plantas
cultivadas de acordo com os critérios exigidos pela ANVISA e sem uso
de agrotóxicos a serem usadas como matéria-prima para fabricação do
medicamento;
• Necessidade de importar, principalmente da Alemanha,
insumos fitoterápicos;
• Certa descrença por parte da população em usar medicamentos
provenientes de plantas e que não sejam sintéticos;
• Falta de status de medicamento seguro, ético e eficaz;
• Uso de plantas medicinais de maneira informal pelos brasileiros.

Produtos naturais: do conhecimento


popular à indústria farmacêutica
É muito comum, ao aparecer alguma doença, que as pessoas
indiquem algum tipo de remédio natural, normalmente passando a
receita de geração em geração, através dos séculos. Para àqueles que
possuem espaço em sua casa é bastante comum vermos algum canteiro
ou vasos com plantas medicinais como boldo, capim cidreira, hortelã,
etc. Vamos estudar neste capítulo um pouco a respeito da forma como
estes conhecimentos servem como base para os estudos químicos e
farmacológicos e posterior disponibilização ao mercado farmacêutico.
30 Introdução a Fitoterapia

A Etnofarmacologia

DEFINIÇÃO
A etnofarmacologia é um dos ramos da etnobiologia,
ciência que estuda cientificamente o conhecimento que
chamamos de “popular”, a respeito dos princípios ativos das
plantas, levando em consideração algum grupo étnico ou
social, procurando relacionar estes conhecimentos aos da
medicina tradicional.

Figura 9: A Etnobiologia e suas derivações.

Autor: autoria própria

Neste contexto, a estratégia principal da etnofarmacologia é aliar


os conhecimentos colhidos dos usuários de uma determinada região com
os estudos químicos e farmacológicos sobre as plantas consideradas
medicinais. Usando deste tipo de método, se pressupõem algumas
hipóteses a respeito da atividade farmacológica e ações terapêuticas
das plantas consideradas medicinais. A seguir veremos como funciona
esta dinâmica.
Introdução a Fitoterapia 31

Etnofarmacologia e a investigação
A fim de facilitar a compreensão do assunto, iremos citar um
exemplo. Minha avó, nascida e criada em Porto Alegre - RS, tinha
diabetes e costumeiramente frequentava as feiras de frutas e verduras
do bairro. Certo dia, ao conversar com uma amiga dela, surgiu o assunto
do diabetes e alguns tratamentos naturais para a cura da doença. Dos
inúmeros métodos e terapias indicados, minha avó não havia testado um
deles, que era o suco de sementes de laranja.
Ao chegar em casa, seguindo a receita da amiga, preparou o
suco e tomou durante o restante do dia. Disse-me ela, que após alguns
dias tomando o tal suco, que a glicemia dela havia reduzido os valores.
Este fato traz consigo a experiência de algumas pessoas, mesmo sem
saberem nada a respeito da atividade da semente ou testes de toxicidade,
faziam uso de uma receita para o diabetes. Este caso exemplifica um
pouco da dinâmica da etnofarmacologia, onde a partir de práticas e
crenças populares se estuda o princípio ativo e realizam-se testes a fim
de comprovar a eficiência e eficácia destes elementos, podendo levar a
produção de uma nova droga ou não.

Da cultura popular à síntese


Estima-se que aproximadamente 80% das drogas disponíveis
atualmente foram obtidas a partir de produtos naturais ou inspiradas por
compostos naturais (Mukherjee, 2010).
A Figura a seguir exemplifica a dinâmica que a etnofarmacologia
obedece.
32 Introdução a Fitoterapia

Figura 10: Diagrama de base da etnofarmacologia, desde a doença até a síntese do


medicamento.

Autor: autoria própria

ACESSE
Leia um excelente artigo sobre a etnofarmacologia que foi
realizado na Paraíba, neste artigo são abordados os efeitos
benéficos e maléficos de algumas plantas de uso popular.
Disponível em:
https://bit.ly/2lZmoi4.

Hoje temos uma grande quantidade de estudos que possibilitaram


a síntese dos princípios ativos de muitos medicamentos com base na
etnofarmacologia. A Tabela a seguir exemplifica alguns destes estudos.
Introdução a Fitoterapia 33

Tabela 1: Tipos de plantas medicinais, nomes científicos e indicações terapêuticas.

Indicado para: Nome científico: Princípio ativo:


Dilatador de pupila Atropa belladona Atropina
Anti-tussígeno Papaver somniferum Codeína
Glaucoma Pilocarpus jaborandi Pilocarpina
Antiespasmódico Papaver somniferum Papaverina
Analgésico e anti-inflamatório Salix alba Aspirina
Anti-hipertensivo Rauwolfia serpentina Reserpina
Estimulante Camellia sinensis Cafeína
Fibrilação atrial Digitalis purpurea L. Digoxina
Anti-colinérgico Hyoscyamus niger Hiosciamina
Desinfecção oral Styrax tonkinensis Benzoin
Fonte: Adaptado pelo autor de: Mukherjee, 2010

IMPORTANTE
Um ponto que merece muita atenção é a toxicidade que
algumas plantas apresentam, mesmo na cultura popular,
observamos algumas vezes, instruções a respeito de como
usar ou não usar determinada planta. De 10 plantas que
seguem para o laboratório a fim de serem pesquisadas,
cerca de 50% são eliminadas nos testes iniciais de toxicidade.

Portanto, mesmo no uso tradicional ou popular e mediante testes


em laboratório, é possível refutarmos o uso de algumas plantas, tendo
em vista principalmente às questões que envolvem a toxicidade das
mesmas.

REFLITA
Há pessoas que acreditam que as plantas não oferecem
riscos e não possuem efeitos colaterais, mas é um
pensamento perigoso e pode causar sérios problemas a
saúde, até a morte. Portanto, você como profissional da
área, ofereça instruções aos seus clientes, tendo em vista
a qualidade de vida dos mesmos.
34 Introdução a Fitoterapia

Crenças populares e registros


Apesar de termos exemplos bastante antigos a respeito do uso de
plantas medicinais na história da humanidade, o termo etnofarmacologia
foi criado no ano de 1895, por John W. Harshberger, da Pennsylvania
University, ao trabalhar com taxonomia botânica.
Além do potencial da biodiversidade, nosso país possui vasto nível
de conhecimentos populares a respeito do uso de plantas medicinais,
além da ampla sociodiversidade. Estes conhecimentos normalmente
vão se passando de geração em geração, perpetuando-se através da
história. Portanto, a etnofarmacologia tem em suas mãos, um volume
grandioso de informações a respeito do uso das plantas medicinais
tanto no passado, como no presente.
Acredita-se que cerca de 99,6% da flora de nosso país não seja
ainda conhecida quimicamente, em resumo, menos de 1% já foi estudado.
Devido à distribuição geográfica e à amplitude térmica e sazonal, nosso
país possui diversos biomas e dentro destes, distribuições específicas
da flora. Isto cria um regionalismo dentro do país, semelhante ao que
vemos com a cultura das diversas regiões. É provável que a região norte
do Brasil, na floresta amazônica, abrigue a maior quantidade de flora
medicinal ainda não explorada, seguido pelo cerrado, mata atlântica,
caatinga, pampa sulista e pantanal.
As diversas regiões do Brasil são povoadas basicamente por três
tipos de populações:
1. As tradicionais, também conhecidas como ribeirinhos, caboclos,
jangadeiros, caiçaras, que se originaram da miscigenação entre
europeus, negros e índios. Há dentro deste grupo os descendentes
diretos dos europeus que se estabeleceram em regiões mais ao sul do
Brasil.
2. Indígenas que vivem em comunidades, algumas ainda isoladas;
3. Quilombolas, descendentes dos africanos que vivem nos
quilombos.
Muito conhecimento destas comunidades tem se perdido através
do tempo, até mesmo a identidade de alguns povos. É provável que
a proximidade com as comunidades mais desenvolvidas possa ser um
fator limitante para a perpetuação das culturas medicinais destes povos.
Introdução a Fitoterapia 35

Vou citar aqui um exemplo: um povoado indígena que habita


em uma região próxima de alguma cidade, provavelmente em casos
de doenças irá ser atendido por alguma equipe de saúde mantida pelo
governo e provavelmente irá fazer uso de medicamentos fornecidos
pelo governo.
O isolamento geográfico de algumas comunidades, muitas
vezes com difícil acesso aos serviços de saúde, pode ser um fator que
predispõe a busca por elementos curativos através da natureza, fazendo
com que novas plantas sejam descobertas.
Neste contexto, tive a oportunidade de realizar um trabalho
comunitário em uma aldeia indígena na tribo dos Karajás, à beira do rio
Araguaia. Esta aldeia conta com um posto de saúde indígena, dentro
do território indígena e é atendida por uma equipe de saúde. Mesmo
com este serviço de apoio à saúde indígena, muitos ainda recorrem ao
pajé, mas é provável que grande parte do conhecimento a respeito das
plantas medicinais se perca ao longo do tempo, devido à comodidade
que encontram em casos de doenças.

Figura 11: Visão da Aldeia dos índios Karajás à beira do rio Araguaia.

Autor: autoria própria


36 Introdução a Fitoterapia

VOCÊ SABIA?
Acreditamos que você se interessa bastante por este
assunto e sugerimos a leitura do livro “Una Isi Kayawa —
Livro da cura Huni Kuî do Rio Jordão”, organizado pelo pajé
Agostinho Manduca Mateus Ika Muru e o etnobotânico
Alexandre Quinet, pesquisador do Jardim Botânico do Rio
de Janeiro. O livro reúne mais de 100 espécies de plantas de
uso terapêutico indígena. De acordo com um dos autores,
morto em 2011, seu principal objetivo era perpetuar a
cultura medicinal do seu povo através do registro impresso.
Para saber mais leia a matéria do projeto do livro pioneiro no
Brasil sobre plantas medicinais, com mais de 100 espécies
da cultura medicinal indígena disponível em: https://bit.
ly/2np9B8S

Atualmente estamos assistindo ações destrutivas que impactam


diversos biomas, como as queimadas, desmatamento para venda ilegal
de madeira e pecuária, etc. Esta perda da biodiversidade num processo
acelerado, aliada à mudança cultural, colocam em risco os saberes
tradicionais a respeito das plantas medicinais e seus usos.

ACESSE
Veja uma das reportagens sobre as queimadas na Amazônia
e o impacto que isto causa na Biodiversidade em nosso
país:
https://glo.bo/30wT3KM.
Introdução a Fitoterapia 37

Figura 12: Foto dos focos de queimadas em partes da América do Sul, entre 15 e 22 de
agosto de 2019. Pontos alaranjados indicam queimadas.

Autor: NASA

Portanto, é urgente a necessidade de registro dos conhecimentos


da medicina popular em nosso país, resgatando assim informações
valiosas do passado, fornecendo bases para os estudos presentes e
futuros da farmacologia das plantas medicinais e suas aplicações.

Bases conceituais
Ao buscarmos as bases conceituais da fitoterapia precisamos
voltar aos primórdios da humanidade, onde as doenças eram tratadas
pelos curandeiros e ou feiticeiros, como discutimos no Capítulo 1. Nesta
fase histórica surgiram os primeiros conceitos que formaram a fitoterapia.
Veremos neste capítulo as bases conceituais que deram origem aos
conceitos atuais da fitoterapia.
38 Introdução a Fitoterapia

Bases empíricas
A fim de entendermos melhor as origens dos conceitos da
fitoterapia, podemos imaginar um campo de prática do empirismo, ou
seja, observações das relações entre uso de plantas medicinais e efeitos
que apareciam. É bastante provável que alguns testes eram feitos em
animais domésticos, seguindo uma metodologia rudimentar de testes
de toxicidade.
Alguns relatos lendários indicam que as plantas medicinais
possuíam poderes advindos dos deuses, sendo usadas em rituais que
tinham como objetivo aproximar os homens dos deuses. Mesmo sem
conhecimento técnico-científico, as primeiras civilizações possuíam uma
capacidade metodológica bastante avançada. Um exemplo interessante
é o do curare, utilizado pela maioria das tribos indígenas, esta planta
era um dos principais “venenos” utilizados nas flechas para a caça. Fico
imaginando como os primeiros índios descobriram que o curare tinha
esta capacidade “tóxica” mortal.
Hoje o curare é utilizado na medicina, como relaxante muscular
em cirurgias, por ser um antagonista dos receptores nicotínicos. Agora
imagine a quantidade de elementos da flora que estão ainda à disposição
para novas descobertas.

Figura 13: Estrutura química estrutural do curare

Autor: Edgar181 / Wikimedia Commons


Introdução a Fitoterapia 39

Figura 14: Índios preparando flechas com curare.

Autor: Wellcome Collection

Podemos observar na ilustração anterior, os índios preparando o


material de caça com base de curare na ponta das flechas. Este desenho
retrata dois deles trabalhando na produção do veneno e outros dois na
impregnação do veneno nas pontas das flechas. Interessante notar que a
metodologia estava aprimorada e podemos observar o desenvolvimento
de métodos para este fim.
Observando atentamente ao desenho, é possível notarmos que
dentro da metodologia rudimentar são delineados alguns conceitos,
como a parte de extração do veneno através da fervura, algum mecanismo
de filtragem, etc. Sem conhecimentos de laboratório, as definições da
fitoterapia já faziam parte da prática dos nossos antepassados.
Neste caso em especial usamos o curare como exemplo, para os
índios era um elemento letal e hoje a medicina usa para salvar. Nesse
ponto podemos notar que um elemento, considerado altamente tóxico,
após estudos mais elaborados pela farmacologia é capaz de desvendar
outras utilidades. Ressaltamos neste ponto novamente a importância do
estudo da etnofarmacologia, este exemplo do curare é só um, na grande
40 Introdução a Fitoterapia

quantidade de elementos que ainda não foram estudados.


Os “experimentos” realizados por estas civilizações deram base
para a formulação de conceitos mais elaborados que temos hoje, mas
o princípio mantém a mesma ideia dos primórdios. Veremos a seguir
alguns destes conceitos que constituem a fitoterapia.

Conceitos básicos
A fim de entendermos melhor esta temática, vamos ver alguns
conceitos básicos:
a. Doença: distúrbio na compensação fisiológica do organismo,
causando o desequilíbrio de funções normais de algum sistema
biológico, levando a instalação de alguma patologia;
b. Medicamento: elemento isolado de origem química capaz
de levar a alterações nas funções celulares, causando a regulação de
funções fisiológicas. Normalmente são chamados de alopáticos e com
ação profilática, curativa, paliativa ou para fins de diagnósticos (RDC
Anvisa nº 84/02);
c. Remédio: qualquer substância ou recurso que é capaz de
combater ou aliviar algum distúrbio biológico;
d. Planta medicinal: qualquer elemento da flora com capacidade
regulatória sobre algum sistema biológico;
e. Fitoterapia: ramo das ciências terapêuticas que estuda os
efeitos das plantas com capacidades medicinais, em indivíduos que
apresentam algum quadro patológico ou até mesmo em casos de
prevenção de doenças ou alívio dos sintomas;
f. Princípio ativo de fitoterápico: substância de origem vegetal,
quimicamente caracterizada, com ação farmacológica conhecida e
comprovada, gerando efeitos terapêuticos totais ou parciais em algum
sistema biológico.
Introdução a Fitoterapia 41

IMPORTANTE
Não confunda os termos planta medicinal, medicamento
fitoterápico e medicamento homeopático. Cada um tem
definição própria e não são sinônimos.

Definições da fitoterapia
A palavra fitoterapia tem sua origem baseada em dois termos
do grego, onde Phyton, significando vegetal e Therapeia, significando
terapia. A junção dos dois termos significa terapia através do uso de
plantas.
De acordo com a definição que encontramos na Resolução
da Diretoria Colegiada nº 48/04 alterada pela Resolução nº 26 de
13/05/2014, da Anvisa, para elemento fitoterápico: em seu parágrafo
XI: produto obtido de matéria-prima ativa vegetal, exceto substâncias
isoladas, com finalidade profilática, curativa ou paliativa, incluindo
medicamento fitoterápico e produto tradicional fitoterápico, podendo
ser simples, quando o ativo é proveniente de uma única espécie vegetal
medicinal, ou composto, quando o ativo é proveniente de mais de uma
espécie vegetal.

ACESSE
Saiba mais a respeito desta resolução de extrema
importância para a fitoterapia, acessando o link com a
íntegra da mesma:
https://bit.ly/2mQrhKp.

A fitoterapia se baseia em conhecimentos multidisciplinares,


geralmente envolvendo profissionais da botânica, farmacologia,
fisiologia, bioquímica, química orgânica, fisiopatologia, nutrição,
vigilância farmacológica, todos em busca de fazer da fitoterapia uma
ciência consolidada.
42 Introdução a Fitoterapia

O termo planta medicinal foi definido no ano de 1978 pela


Organização Mundial da Saúde, como sendo qualquer tipo de planta
que possua em um ou mais de seus órgãos, substâncias que possuam
finalidade terapêutica. Neste mesmo ano a OMS estabeleceu o programa
de Medicina Tradicional, estimulando as práticas de uso de fitoterápicos
no tratamento a saúde.
A OMS sugere a formulação de políticas e regulamentações
nacionais referentes à utilização de remédios tradicionais de eficácia
comprovada e exploração das possibilidades de se incorporar os
detentores de conhecimento tradicional às atividades de atenção
primária em saúde, fornecendo-lhes treinamento correspondente (OMS,
1979).
Apenas no ano de 1991 a Fitoterapia foi reconhecida como método
terapêutico pelo Conselho Federal de Medicina brasileiro. Quatro anos
depois, em 1995, a ANVISA criou normas específicas para o registro de
medicamentos fitoterápicos.
Os medicamentos fitoterápicos são conhecidos por outros
nomes, podendo ser chamados de remédios à base de plantas,
fitomedicamentos, fitofarmacêuticos e fitoterapêuticos.

Definições científicas botânicas


A fim de que se tivesse uma linguagem universal a respeito dos
elementos biológicos foi criada a nomenclatura científica. A primeira
proposta foi criada no século XVII por Gaspard Bauhim e concluída por
Carl Von Linné no século seguinte.
A classificação de todos os seres vivos segue um padrão, onde
são utilizadas palavras em Latim, basicamente em um binômio, onde o
primeiro nome determina o Gênero e o segundo a espécie.
Introdução a Fitoterapia 43

Figura 15: Carl Von Linné, criador da linguagem científica de classificação dos seres vivos.

Autor: Alexander Roslin / Wikimedia Commons

Mas, de fato o primeiro a criar um sistema de classificação dos


seres vivos foi o filósofo grego Aristóteles, separando basicamente os
seres vivos em animais e plantas.
44 Introdução a Fitoterapia

Figura 16: Estátua de Aristóteles

Autor: Odabade90 / Creative Commons

Regras básicas de nomenclatura


Como citamos anteriormente, deve-se seguir o padrão binomial
de classificação dos seres vivos. Todas as palavras devem ser escritas
em itálico ou em caso que não seja possível inserir o itálico as palavras
devem estar sublinhadas. Para o gênero se utiliza a primeira letra em
maiúsculo e para a espécie, somente minúsculo. Existem também
padrões de classificação, obedecendo uma ordem de classificações,
conforme figura a seguir.
Introdução a Fitoterapia 45

Figura 17: Sistema de classificação dos organismos biológicos segundo a classificação de


Lineu

Autor: Peter Halasz / Wikimedia Commons

A fim de tornar mais prático o aprendizado, vamos utilizar o


exemplo da figura a seguir, onde podemos ver vários exemplares de
plantas.
46 Introdução a Fitoterapia

Figura 18: Figura com fotos de elementos que compõem o Reino Plantae, ou seja, Reino das
Plantas.

Autor: Rkitko / Wikimedia Commons

Na figura anterior vimos vários exemplares de plantas, que juntos


fazem parte do Reino Plantae, ou comumente chamados de Reino das
Plantas. Utilizaremos o exemplo do morango que está na figura. Quanto
ao reino já sabemos e se trata de uma planta, vamos agora classificar os
outros níveis.
Introdução a Fitoterapia 47

Figura 19: Exemplar de um morangueiro.

Autor: Formulax / Wikimedia Commons

Tabela 1: Tipos de plantas medicinais, nomes científicos e indicações terapêuticas.

Reino: Plantae
Divisão: Magnoliophyta
Classe: Magnoliopsida
Ordem: Rosales
Família: Rosaceae
Subfamília: Rosoideae
Género: Fragaria
Fonte: Adaptado pelo autor de: Mukherjee, 2010

Neste caso em específico não podemos classificar a espécie,


pois existem muitas variedades. Acredita-se que as primeiras espécies
tenham sido criadas do cruzamento de Fragaria virginiana com Fragaria
chiloensis, em 1714.
Em relação à classificação das plantas medicinais temos um fator
bastante complicador, ainda mais pensando na cultura popular, onde
não existem especialistas em classificação vegetal. Gostaria de dar um
exemplo bem clássico em nosso país, a respeito da canela-de-velho.
48 Introdução a Fitoterapia

É uma planta que ficou famosa nos tratamentos para pessoas com
problemas articulares e inflamatórios em geral, nos últimos anos. Mas
será que a canela-de-velho original é comercializada realmente ou
temos variantes semelhantes sendo vendidas sem sabermos?

IMPORTANTE
Assista o vídeo sobre a canela-de-velho, bastante
interessante sobre esta planta “milagrosa”:
https://bit.ly/2mZ7F6I

É extremamente importante saber realmente o tipo exato da


espécie que estamos utilizando para determinado fim terapêutico,
reduzindo assim os possíveis efeitos tóxicos de algumas plantas.
Caso você tenha dificuldade na classificação, sugerimos que busque
orientações de profissionais da botânica sistemática.

ACESSE
Sugerimos no link a seguir um excelente material gratuito.
Trata-se de um livro digital que reúne um acervo compilado
por mais de 40 anos e de forma bastante didática o autor
apresenta aproximadamente 400 espécies com funções
medicinais. Vale a pena baixar e ter este material. Disponível
no link: https://bit.ly/2lYVdnq.
Introdução a Fitoterapia 49

Legislação e políticas públicas sobre


fitoterápicos
No ano de 1978, na Conferência de Alma-Ata a Organização
Mundial da Saúde (OMS) recomendou que a medicina tradicional fosse
incluída na esfera pública, especialmente em países dependentes do
uso de plantas como terapia médica (uso por 85% da população).

Legislação no mundo
A OMS produziu diretrizes relacionadas à produção de fitoterápicos
com objetivo de auxiliar países que ainda tem dificuldades com eficácia
e segurança desses medicamentos.

IMPORTANTE
Cada país possui leis específicas para a área, em algumas
regiões produtos fitoterápicos podem ser considerados
medicamentos e em outras, alimentos que não precisam
de prescrição.

A União Europeia possui diretrizes próprias a serem seguidas


por seus países, como a sobre os Produtos Medicinais Fitoterápicos
Tradicionais 2004/24/EC para que possam ser regularizados e
circularem entre os países com a segurança necessária. Desde 2004,
medicamentos à base de plantas no Canadá foram incluídos no
Regulamento de Produtos Naturais para a Saúde, que possui diversas
exigências de eficácia e segurança que precisam ser respeitadas pelos
fabricantes.
Já nos EUA quem regula tanto as plantas medicinais quanto seus
produtos é a Lei de Educação e Saúde para Suplementos Alimentares
e no rótulo não deve constar nada para uso terapêutico específico. A
Austrália possui a Lei de Mercadorias Terapêuticas, criada em 1989,
encaixa os fitoterápicos na categoria de medicamentos complementares,
que são divididos em medicamentos de baixo risco ou alto risco. Os de
50 Introdução a Fitoterapia

baixo risco não passam por um processo tão rigoroso de segurança, já


os de alto risco são avaliados com maior rigor e individualmente antes
de serem vendidos.

ACESSE
Ainda que existam leis e regulamentos, as fraudes
acontecem até nos países de primeiro mundo. O jornal
Folha de São Paulo fez uma matéria sobre um estudo
que investigou fraudes em medicamentos fitoterápicos
nos EUA. Para acessar o conteúdo, clique no seguinte link:
https://bit.ly/2mULvCV.

Problemas ocorrem tanto com medicamentos regulados quanto


com os sem regulação. Os mais comuns são: substituição de uma
espécie vegetal por outra, inserção de metais pesados, elementos
tóxicos ou remédios sintéticos, dosagem incorreta e contaminantes.

Legislação brasileira
A obrigação de regular e controlar os medicamentos fitoterápicos
é do governo, através da Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(Anvisa).
A Anvisa é o órgão da federação que regula a produção, prescrição
e distribuição de plantas medicinais e fitoterápicos, as legislações por
ela criadas tem o objetivo de normatizar procedimentos, garantindo a
qualidade dos serviços ofertados no âmbito das plantas medicinais e
fitoterápicos no Brasil (Beleza, 2016).
Mesmo com relatos desde o ano de 1521, a regulamentação
oficial dos fitoterápicos no Brasil se inicia nos anos 1980, com a Portaria
de número 212 de 11 de setembro de 1981, definindo o estudo de plantas
medicinais como uma das prioridades da pesquisa clínica. Já em 1982,
o Ministério da Saúde lançou o Programa de Pesquisa de Plantas
Medicinais, visando o desenvolvimento de uma terapêutica alternativa
e complementar no país.
Introdução a Fitoterapia 51

Seis anos depois, em 1988, é implantada a fitoterapia como


prática na área de saúde, pela Comissão Nacional Interministerial de
Planejamento e Coordenação (CIPLAN) e orientando sua inclusão nos
serviços básicos de saúde.
Em 2006, o Ministério da Saúde brasileiro, através do Decreto nº
5.813 de 22 de junho aprovou a Política Nacional de Plantas Medicinais
e Fitoterápicos. Segundo a Anvisa (2018), em dezembro de 2008, foi
publicada a Portaria nº 2.960, que aprovou o Programa Nacional de
Plantas Medicinais e Fitoterápicos e criou o Comitê Nacional de Plantas
Medicinais e Fitoterápicos. O primeiro objetivo do programa era construir
e aperfeiçoar o marco regulatório em todas as etapas da cadeia produtiva
de plantas medicinais e fitoterápicos, a partir dos modelos e experiências
existentes no Brasil e em outros países (Anvisa, 2018).
A ideia por trás deste Programa é a de aproveitar a vasta
biodiversidade da flora brasileira para o bem dos cidadãos, de uma
maneira sustentável. Isso inclui a utilização terapêutica de fitoterápicos
pelo Sistema Único de Saúde, o SUS.

ACESSE
Saiba mais a respeito da política nacional de plantas
medicinais e fitoterápicos através do link:
https://bit.ly/1fZmOdX.

Em relação à Legislação de fitoterápicos, existe uma vasta lista


de leis, decretos, resoluções, portarias, resolução da diretoria colegiada
(RDCs), instruções normativas, etc. Não é nosso objetivo neste momento
discorrer a respeito das inúmeras leis, tendo em vista também suas
especificidades. A nível de consulta e aprendizado, sugerimos que você
acesse o site do Ministério da Saúde, no canal da Anvisa e busque por
informações mais precisas a respeito do tipo de assunto que pretende
se aprofundar. A seguir disponibilizamos o link de acesso direto.
52 Introdução a Fitoterapia

ACESSE
Para mais detalhes a respeito da legislação vigente a
respeito dos fitoterápicos, sugerimos que acesse o site:
https://bit.ly/2m1GS9N.
Se desejar acessar, a Anvisa mantém uma biblioteca de
normas, separadas por categorias: https://bit.ly/2FdkaUZ.

Atualmente estão em vigor as diretrizes da Resolução da Diretoria


Colegiada - RDC nº 105, de 31 de agosto de 2016, que
Alterou a Resolução da Diretoria Colegiada - RDC nº 26, de 13 de
maio de 2014, que dispõe sobre o registro de medicamentos fitoterápicos
e o registro e a notificação de produtos tradicionais fitoterápicos.

ACESSE
O Ministério da Saúde mantém um registro histórico em seu
site, do qual chama de linha do tempo dos fitoterápicos. É
um excelente material e sugerimos a sua leitura através do
link: https://bit.ly/2lZGqJi.

Foi possível notar que a legislação sobre fitoterápicos está


em constante atualização pelos órgãos reguladores, este aspecto é
relevante, pois com uma legislação atualizada e adequada, pode haver
motivação por parte das empresas e instituições de pesquisa que visam
à pesquisa com plantas medicinais.
Introdução a Fitoterapia 53

Política e programa nacional de plantas


medicinais e fitoterápicos
Política nacional de plantas medicinais e
fitoterápicos
Estabelecida em 2006, através do decreto nº 5813, o documento
possui como principal objetivo “Garantir à população brasileira o
acesso seguro e o uso racional de plantas medicinais e fitoterápicos,
promovendo o uso sustentável da biodiversidade, o desenvolvimento da
cadeia produtiva e da indústria nacional” (BRASIL, 2006).
Suas diretrizes visam incentivar as pesquisas de plantas medicinais
para desenvolvimento de novos fitoterápicos brasileiros, formar pessoal
técnico capacitado, conseguir investimentos públicos e privados,
promover práticas populares de uso de plantas medicinais, cultivo
destas plantas, como também a segurança e eficácia dos fitoterápicos
respeitando a diversidade da flora nacional.
Uma parte do documento trata da fiscalização e cobrança da
realização das diretrizes por parte dos estados brasileiros.
Não apenas o Ministério da Saúde esteve envolvido na criação
desta Política, mas também outros setores governamentais: a Casa
Civil, Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Ministério
da Ciência e Tecnologia, Ministério do Desenvolvimento Agrário,
Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Ministério da Integração
Nacional, Ministério do Meio Ambiente e Ministério da Saúde, cada um
com responsabilidades específicas.
O documento possui um capítulo que abrange a terminologia
utilizada na área, importante para compreensão do tema.

ACESSE
Para acessar o conteúdo completo é só seguir o link:
https://bit.ly/1fZmOdX
54 Introdução a Fitoterapia

Programa nacional de plantas medicinais e


fitoterápicos
Da Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos foi
criado o Programa com o mesmo nome, aprovado em 9 de dezembro
de 2008 através da Portaria Interministerial nº 2960.
O Programa estabelece prazos a serem cumpridos, ministérios
envolvidos em cada ação e os recursos.

ACESSE
Você pode acessar e fazer o download do Programa
Nacional completo neste link:
https://bit.ly/1J7FX5M.

A partir da Política e Programa Nacional de Plantas Medicinais


e Fitoterápicos, que estão há 13 e 11 anos, respectivamente em
funcionamento, é possível observar resultados satisfatório no SUS.
Os motivos que levam ao uso de fitoterápicos incluem:
• Menos efeitos colaterais que a medicina alopática;
• Efeito potencializado por usar vários princípios ativos e não
apenas um por vez;
• Baixo custo para o SUS.
Algumas espécies utilizadas na rede pública, bem como para que
são utilizadas, encontram-se a seguir.
Introdução a Fitoterapia 55

Tabela 3: Exemplos de espécies de plantas medicinais liberadas para uso e fabricação de


fitoterápicos pela Anvisa

Nome popular Nome científico Uso


Auxilia no tratamento
de gastrite, úlcera
Espinheira santa Maytenus ilicifolia
duodenal e sintomas de
dispepsias.
Apresenta ação
Guaco Mikania glomerata expectorante e
broncodilatadora.
Tratamento dos
sintomas de dispepsia
funcional e de
Alcachofra Cynara scolymus hipercolesterolemia leve
a moderada. Apresenta
ação colagoga e
colerética.
Apresenta ação
cicatrizante,
Schinus
Aroeira antiinflamatória e anti-
terebenthifolius
séptica tópica, para uso
ginecológico.
Auxilia nos casos de
Cáscara-sagrada Rhamnus purshiana obstipação intestinal
eventual.
Tratamento da dor
lombar baixa aguda e
Harpagophytum como coadjuvante nos
Garra-do-diabo
procumbens casos de osteoartrite.
Apresenta ação
antiinflamatória.
Auxilia no alívio dos
Isoflavona-de-soja Glycine Max
sintomas do climatério.

Fonte: Adaptado pelo autor de: Mukherjee, 2010


56 Introdução a Fitoterapia

ACESSE
A lista completa das plantas liberadas para uso pela Anvisa
no link:
https://bit.ly/2lsyZds.

Figura 20: Plantas medicinais mais usadas no SUS

Autor: Agência Senado / Ministério da Saúde


Introdução a Fitoterapia 57

ACESSE
Em Santarém, no Pará, teve início um plantio especial
em maio de 2019. Graças à Política Nacional de Plantas
Medicinais e Fitoterápicos do Ministério da Saúde, foram
plantadas cerca de 150 mudas de plantas medicinais que
irão atender o SUS local. Veja a matéria completa no link:
https://glo.bo/2lRUYLb.

Espero que você tenha gostado do conteúdo preparado nesta


unidade, tenho certeza que muitas informações úteis foram capturadas
por você, e agora chegou o momento de relembrar o que estudamos.
A história do uso de plantas medicinais tem início na pré-história,
período antes da invenção da escrita, no qual os conhecimentos eram
transmitidos apenas oralmente. Até mesmo essa época guarda registros
de uso de plantas com objetivos de tratamento e cura. De uma maneira
mais organizada, o uso de plantas medicinais guarda registros da
Índia, China e Egito, representantes da História Antiga e passa pelas
civilizações grega, romana e até o Brasil tem uma história relevante
sobre os primórdios da Fitoterapia, com a junção de conhecimentos
indígenas, africanos e europeus logo após a colonização pelos
portugueses em 1500. O uso popular de plantas medicinais é estudado
pela etnofarmacologia que leva em conta os conhecimentos adquiridos
empiricamente por diferentes povos em diferentes épocas. Seria muito
caro selecionar plantas aleatoriamente para fazer pesquisas medicinais.
Por isso, aproveita-se o conhecimento etnofarmacológico para iniciar
uma pesquisa já baseada em evidências empíricas de uso popular. É
importante lembrar que uma planta medicinal é qualquer elemento
da flora com capacidade regulatória sobre algum sistema biológico e
fitoterapia é o ramo das ciências terapêuticas que estuda os efeitos das
plantas com capacidades medicinais, em indivíduos que apresentam
algum quadro patológico ou até mesmo em casos de prevenção de
doenças ou alívio dos sintomas. Já o princípio ativo de fitoterápico é uma
substância de origem vegetal, quimicamente caracterizada, com ação
58 Introdução a Fitoterapia

farmacológica conhecida e comprovada, gerando efeitos terapêuticos


totais ou parciais em algum sistema biológico. Todas as espécies de
plantas seguem uma classificação científica com dois nomes: gênero e
espécie que é usada no mundo todo e não varia como a nomenclatura
popular. Em relação à legislação, pode variar bastante dependendo
de qual país se encontra. Por exemplo, normas quanto à segurança e
eficácia são mais rigorosas na União Europeia que na Índia. No Brasil,
a Anvisa é responsável por regular a produção e distribuição de
fitoterápicos. O SUS já disponibiliza alguns medicamentos fitoterápicos
para a população graças à Política e ao Programa Nacional de Plantas
Medicinais e Fitoterápicos que estabelece diretrizes e parcerias
com diversos Ministérios para incentivar a pesquisa, produção e uso
desses medicamentos na rede pública de saúde. Na próxima Unidade
estudaremos mais a fundo esta área de conhecimento tão interessante.
Até lá!
Introdução a Fitoterapia 59

BIBLIOGRAFIA
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Introdução a Fitoterapia 61

Introdução a Fitoterapia
Luciano Senti da Costa

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