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SÍNDROME METABÓLICA

INTRODUÇÃO população mais jovem, atualmente estimada em até 23% e


> 60% entre crianças obesas e com sobrepeso.
A síndrome metabólica (síndrome X, síndrome de
resistência à insulina) consiste em um grupo de Quando estratificada pela raça/etnia, a maior prevalência
anormalidades metabólicas que conferem aumento de da síndrome metabólica foi observada em 35% em
risco de doenças cardiovasculares (DCV) e diabetes hispânicos, seguidos de 33% em brancos e negros não
melito. hispânicos.
As principais características da síndrome metabólica FATORES DE RISCO
incluem:
SOBREPESO/OBESIDADE: a adiposidade central é
− Obesidade central, uma característica essencial da síndrome, e a prevalência
− Hipertrigliceridemia, da síndrome reflete a forte relação entre a circunferência
− Níveis baixos de colesterol da lipoproteína de alta abdominal e o aumento de adiposidade.
densidade (HDL),
ESTILO DE VIDA SEDENTÁRIO: a falta de atividade
− Hiperglicemia; física e o menor condicionamento cardiorrespiratório são
− Hipertensão. preditores de eventos de DCV e do risco relacionado à
EPIDEMIOLOGIA morte. Muitos componentes da síndrome metabólica estão
associados a um estilo de vida sedentário, incluindo
A prevalência da síndrome metabólica varia em todo o aumento do tecido adiposo (predominantemente central),
mundo. Em geral, a prevalência da síndrome metabólica colesterol HDL reduzido e aumento dos triglicerídeos, da
aumenta com a idade. A maior prevalência registrada em pressão arterial e da glicose nas pessoas geneticamente
todo o mundo é entre norte-americanos nativos. suscetíveis.
A maior industrialização global está associada a taxas ENVELHECIMENTO: a síndrome metabólica afeta
crescentes de obesidade e a um aumento esperado na quase 50% da população dos Estados Unidos com > 60
prevalência da síndrome metabólica, particularmente com anos, e as mulheres de > 60 anos de idade são mais
o envelhecimento da população. Além disso, a prevalência frequentemente acometidas.
e a gravidade crescentes da obesidade entre crianças
reflete características da síndrome metabólica em uma DIABETES MELITO: a grande maioria (cerca de 75%)
dos pacientes com diabetes tipo 2 ou com tolerância
diminuída à glicose tem síndrome metabólica.
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DOENÇA CARDIOVASCULAR: indivíduos com idosos, a presença de um defeito na fosforilação oxidativa
síndrome metabólica são duas vezes mais propensos a mitocondrial leva ao acúmulo de triglicerídeos e
morrer de doença cardiovascular em comparação com moléculas lipídicas relacionadas no músculo, no fígado e,
aqueles que não a têm, e seu risco de um infarto agudo do talvez, em outros tecidos, isto é, células β.
miocárdio ou acidente vascular cerebral (AVC) é três
vezes maior. A prevalência aproximada da síndrome AUMENTO DA CIRCUNFERÊNCIA ABDOMINAL
metabólica em pacientes com doença cardíaca coronariana A circunferência abdominal é um importante componente
(DCC) é de 60%, com uma prevalência de cerca de 35% dos critérios diagnósticos mais recentes e mais
em pacientes com doença arterial coronariana prematura frequentemente aplicados para a síndrome metabólica.
(com 45 anos de idade ou menos), e uma prevalência Entretanto, medir a circunferência abdominal não
particularmente alta nas mulheres. distingue de maneira confiável os aumentos do tecido
ETIOLOGIA adiposo subcutâneo daqueles decorrentes da gordura
visceral; essa distinção requer tomografia
RESISTÊNCIA À INSULINA computadorizada (TC) ou ressonância magnética (RM).
Com aumentos no tecido adiposo visceral, os ácidos
A hipótese mais aceita e unificadora para descrever a graxos livres derivados do tecido adiposo alcançam o
fisiopatologia da síndrome metabólica é a fígado. Por outro lado, aumentos da gordura SC abdominal
insulinorresistência, que é causada sistemicamente por um liberam produtos da lipólise na circulação sistêmica e,
defeito da ação da insulina. portanto, exercem menos efeitos sobre o metabolismo
Um grande contribuinte preliminar para o hepático.
desenvolvimento da resistência à insulina é uma DISLIPIDEMIA
abundância dos ácidos graxos circulantes. Os ácidos
graxos livres são derivados predominantemente dos Em geral, o fluxo de ácidos graxos livres para o fígado
estoques de triglicerídeos do tecido adiposo liberados resulta em aumento na produção de lipoproteínas de
pelas enzimas lipolíticas intracelulares. A lipólise das densidade muito baixa (VLDLs) ricas em triglicerídeos e
lipoproteínas ricas em triglicerídeos nos tecidos pela contendo ApoB. O efeito da insulina nesse processo é
lipoproteína-lipase também produz ácidos graxos. complexo, mas a hipertrigliceridemia é um excelente
marcador do distúrbio de resistência à insulina.
É importante salientar que a inibição da lipólise no tecido
adiposo é a via mais sensível de ação da insulina. Por Outro distúrbio principal das lipoproteínas na síndrome
conseguinte, quando ocorre resistência à insulina, o metabólica é uma redução do HDL-colesterol. Essa
aumento da lipólise produz mais ácidos graxos, os quais redução é uma consequência das modificações na
reduzem ainda mais o efeito antilipolítico da insulina. O composição e no metabolismo da HDL. Em presença de
excesso de ácidos graxos aumenta a disponibilidade do hipertrigliceridemia, a redução no conteúdo de HDL-
substrato e cria resistência à insulina. Os ácidos graxos colesterol é uma consequência da redução do conteúdo de
comprometem a captação da glicose mediada pela insulina éster de colesteril do núcleo da lipoproteína em
e acumulam-se como triglicerídeos tanto no músculo combinação com alterações mediadas pela proteína de
esquelético quanto no cardíaco, enquanto o fluxo transferência do éster de colesteril nos triglicerídeos,
aumentado de ácidos graxos aumenta a produção de tornando essa partícula menor e mais densa. Essa alteração
glicose e a produção e acúmulo de triglicerídeos no fígado. na composição da lipoproteína também resulta em um
aumento da depuração de HDL da circulação. Essas
A resistência à leptina também pode ser um mecanismo alterações na HDL têm uma relação com a resistência à
fisiopatológico para explicar a síndrome metabólica. insulina que provavelmente é indireta, ocorrendo em
Fisiologicamente, a leptina reduz o apetite, promove gasto consonância com mudanças no metabolismo das
de energia e aumenta a sensibilidade à insulina. Além lipoproteínas ricas em triglicerídeos.
disso, a leptina pode regular a função cardíaca e vascular
por um mecanismo dependente de óxido nítrico. No Os indivíduos com hipertrigliceridemia frequentemente
entanto, quando há desenvolvimento de obesidade, ocorre têm aumentos no teor de colesterol das subfrações de
hiperleptinemia, com evidência de resistência à leptina no VLDL1 e VLDL2 e no número de partículas de LDL.
cérebro e em outros tecidos que resulta em inflamação, Ambas essas alterações da lipoproteína podem contribuir
resistência à insulina, hiperlipidemia e uma gama de para o risco aterogênico em pacientes com síndrome
distúrbios cardiovasculares, como hipertensão, metabólica.
aterosclerose, DCC e insuficiência cardíaca.
INTOLERÂNCIA À GLICOSE
A hipótese do estresse oxidativo fornece uma teoria
unificadora para o envelhecimento e a predisposição à Os defeitos na ação da insulina na síndrome metabólica
síndrome metabólica. Em estudos de indivíduos levam ao comprometimento da supressão da produção de
insulinorresistentes com obesidade e diabetes tipo 2, na glicose pelo fígado (e pelos rins) e redução da captação de
prole de pacientes com diabetes tipo 2 e nos indivíduos
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glicose e do metabolismo nos tecidos sensíveis à insulina necrose tumoral α (TNF-α) produzido por adipócitos e
– isto é, tecidos muscular e adiposo. macrófagos derivados dos monócitos resulta em mais
resistência à insulina e lipólise dos estoques de tecido
HIPERTENSÃO ARTERIAL adiposo em AGL circulante. A IL-6 e outras citocinas
A insulina é um vasodilatador com efeitos secundários na também aumentam a produção hepática de glicose,
reabsorção de sódio nos rins. Entretanto, em caso de produção de VLDL pelo fígado, hipertensão e resistência
resistência à insulina, o efeito vasodilatador da insulina é à insulina no músculo. A resistência à insulina também
perdido, porém o efeito renal na reabsorção de sódio fica contribui para o acúmulo aumentado de triglicerídeos no
preservado. fígado. As citocinas e os AGLs aumentam ainda a
produção hepática de fibrinogênio e a dos adipócitos do
A insulina também aumenta a atividade do sistema inibidor do ativador do plasminogênio tipo 1 (PAI-1),
nervoso simpático, um efeito que é preservado no caso de resultando em um estado protrombótico. Níveis mais altos
resistência à insulina. A resistência à insulina também está de citocinas circulantes estimulam a produção hepática de
associada ao comprometimento específico da via na proteína C-reativa (PCR). A produção reduzida da citocina
sinalização da fosfatidilinositol-3-cinase. No endotélio, anti-inflamatória e citocina adiponectina sensível à
esse comprometimento pode causar um desequilíbrio entre insulina também está associada à síndrome metabólica.
a produção de óxido nítrico e a secreção de endotelina 1,
com consequente redução do fluxo sanguíneo. Além disso, MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS
aumentos na expressão do gene do angiotensinogênio no A síndrome metabólica normalmente não está associada a
tecido adiposo de indivíduos obesos resultam em sintomas. Ao exame físico, a circunferência abdominal e a
aumentos da angiotensina II circulante e em pressão arterial estão frequentemente aumentadas. A
vasoconstrição. presença de um ou de ambos os sinais deve alertar o
ADIPONECTINA médico sobre a necessidade de buscar anormalidades
bioquímicas que possam estar associadas à síndrome
A adiponectina é uma citocina anti-inflamatória produzida metabólica.
exclusivamente por adipócitos. Ela aumenta a
sensibilidade à insulina e inibe muitas etapas no processo SÍNDROME DOS OVÁRIOS POLICÍSTICOS
inflamatório. No fígado, inibe a expressão das enzimas A síndrome dos ovários policísticos é altamente associada
gliconeogênicas e a taxa de produção de glicose. No à resistência à insulina (50-80%) e à síndrome metabólica,
músculo, a adiponectina aumenta o transporte de glicose e com uma prevalência da síndrome entre 40 e 50%. As
aumenta a oxidação do ácido graxo. mulheres com síndrome dos ovários policísticos têm 2 a 4
FISIOPATOLOGIA vezes mais tendência a ter síndrome metabólica do que as
mulheres sem essa síndrome.
Os ácidos graxos livres (AGLs) são liberados em
abundância da massa de tecido adiposo expandida. No APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO
fígado, determinam um aumento da produção de glicose e A apneia obstrutiva do sono é comumente associada à
triglicerídeos e secreção das lipoproteínas de densidade obesidade, hipertensão, aumento das citocinas circulantes,
muito baixa (VLDLs). As anormalidades comprometimento da tolerância à glicose e resistência à
lipídicas/lipoproteicas associadas consistem em reduções insulina. De fato, a apneia obstrutiva do sono pode prever
do colesterol da lipoproteína de alta densidade (HDL) e a ocorrência de síndrome metabólica, mesmo na ausência
um aumento do número de partículas do colesterol da de excesso de adiposidade.
lipoproteína de baixa densidade (LDL).
DIAGNÓSTICO
Os AGLs também reduzem a sensibilidade à insulina no
músculo, inibindo a captação de glicose mediada pela
insulina. Os defeitos associados consistem em redução da
glicose a partir do glicogênio e aumento do acúmulo de
lipídeos nos triglicerídeos (TGs). O aumento da glicose
circulante e, até certo ponto, dos AGLs aumenta a secreção
de insulina pancreática, resultando em hiperinsulinemia. A
hiperinsulinemia pode resultar em aumento da reabsorção
de sódio e aumento da atividade do sistema nervoso
simpático (SNS) e contribui para hipertensão, assim como
os níveis mais altos de AGL circulante.
O estado pró-inflamatório sobrepõe-se e contribui para a
resistência à insulina produzida pelo excesso de AGLs. O
aumento da secreção de interleucina 6 (IL-6) e fator de
Confirmação de diagnostico: ≥ 3 critérios
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HISTÓRIA CLÍNICA primária é um desafio mundial contemporâneo, com
importante repercussão para a saúde. Destaca-se o
Idade, tabagismo, prática de atividade, física, história aumento da prevalência da obesidade em todo o Brasil e
pregressa de hipertensão, diabetes, diabetes gestacional, uma tendência especialmente preocupante do problema
doença arterial coronariana, acidente vascular encefálico, em crianças em idade escolar, em adolescentes e nos
síndrome de ovários policísticos (SOP), doença hepática estratos de mais baixa renda. A adoção precoce por toda a
gordurosa não-alcoólica, hiperuricemia, história familiar população de estilos de vida relacionados à manutenção da
de hipertensão, diabetes e doença cardiovascular, uso de saúde, como dieta adequada e prática regular de atividade
medicamentos hiperglicemiantes (corticosteróides, física, preferencialmente desde a infância, é componente
betabloqueadores, diuréticos). básico da prevenção da SM
EXAME FÍSICO TRATAMENTO
MEDIDA DA CIRCUNFERÊNCIA ABDOMINAL
ESTILO DE VIDA
A medida da circunferência abdominal é tomada na metade
da distância entre a crista ilíaca e o rebordo costal inferior A obesidade, particularmente abdominal, é a força motora
PRESSÃO ARTERIAL por trás da síndrome metabólica. Assim, a redução do peso
Deve-se aferir no mínimo duas medidas da pressão por é a abordagem primária ao distúrbio.
consulta, na posição sentada, após cinco minutos de repouso
PESO E ESTATURA Em geral, as recomendações para a perda de peso incluem
Devem ser utilizados para o cálculo do índice de massa uma combinação de restrição calórica, aumento da
corporal; atividade física e modificação do comportamento. A
restrição calórica é o componente mais importante,
IMC = peso/altura2
enquanto os aumentos na atividade física são importantes
EXAME DA PELE PARA PESQUISA DE ACANTOSE
NIGRICANS para a manutenção da perda de peso.
EXAME CARDIOVASCULAR Plano alimentar

EXAMES LABORATORIAIS A adoção de um plano alimentar saudável é fundamental


no tratamento da síndrome metabólica. Ele deve ser
− Glicemia de jejum individualizado e prever uma redução de peso sustentável
− Dosagem do HDL-colesterol e dos triglicerídeos de 5% a 10% de peso corporal inicial. O primeiro passo é
− Outros: colesterol total, LDL-colesterol, estabelecer as necessidades do indivíduo a partir da
creatinina, ácido úrico, microalbuminúria, avaliação nutricional, incluindo a determinação do índice
proteína C reativa, TOTG (glicemia de jejum e de massa corporal, circunferência abdominal e, quando
após duas horas da ingestão de 75g de dextrosol), possível, a composição corporal. Além disso, a
eletrocardiograma. determinação do perfil metabólico é muito importante na
terapia nutricional da síndrome metabólica.
Obs.: A presença de LDL aumentado não faz parte dos
critérios diagnósticos da síndrome metabólica, porém, O plano alimentar deve fornecer um valor calórico total
frequentemente, os pacientes portadores de resistência à (VCT) compatível com a obtenção e/ou manutenção de
insulina e síndrome metabólica apresentam aumento da peso corporal desejável. Para obesos, a dieta deve ser
fração pequena e densa do LDL colesterol que tem um hipocalórica, com uma redução de 500kcal a 1000kcal do
potencial aterosclerótico maior gasto energético total (GET) diário previsto ou da
anamnese alimentar, com o objetivo de promover perdas
PREVENÇÃO PRIMÁRIA ponderais de 0,5kg a 1,0kg/semana.
De acordo com a Organização Mundial de Saúde, os Antes de prescrever uma dieta para a perda de peso, é
fatores de risco mais importantes para a morbimortalidade importante enfatizar que o paciente levou um tempo para
relacionada às doenças crônicas não-transmissíveis desenvolver uma massa gordurosa aumentada; assim, a
(DCNT) são: hipertensão arterial sistêmica, correção não precisa ocorrer rapidamente. As dietas com
hipercolesterolemia, ingestão insuficiente de frutas, restrição de carboidratos normalmente promovem uma
hortaliças e leguminosas, sobrepeso ou obesidade, perda de peso inicial mais rápida. No entanto, após um
inatividade física e tabagismo. Cinco desses fatores de ano, a quantidade de redução de peso é minimamente
risco estão relacionados à alimentação e à atividade física reduzida ou não é diferente daquela apenas com restrição
e três deles têm grande impacto no aparecimento da calórica. Por conseguinte, a adesão à dieta é mais
Síndrome Metabólica (SM). importante do que o tipo de dieta escolhido.
A predisposição genética, a alimentação inadequada e a Atividade física
inatividade física estão entre os principais fatores que
contribuem para o surgimento da SM, cuja prevenção Antes de prescrever um programa de atividade física a
pacientes com síndrome metabólica, é importante
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assegurar que o aumento de atividade não cause risco. geral, para todos os fármacos que produzem perda de peso,
Alguns pacientes de alto risco devem submeter-se a uma maior redução do peso corporal leva a uma maior
avaliação cardiovascular completa antes de iniciar um melhora nos componentes da síndrome metabólica.
programa de exercícios. Para um participante inativo,
aumentos graduais na atividade física devem ser A cirurgia metabólica ou bariátrica é uma opção para
incentivados, visando aumentar a adesão e evitar lesões. os pacientes com a síndrome metabólica Recomendado
para paciente:
É importante salientar que várias atividades rotineiras –
como jardinagem, caminhada e limpeza da casa – − IMC de mais de 40 kg/m2
requerem gasto calórico moderado. Assim, a atividade − IMC de mais de 35 kg/m2 com comorbidades.
física não precisa ser definida somente em termos de − IMC de apenas 30 kg/m2 e diabetes tipo 2
exercícios formais, como corrida, natação ou tênis.
O bypass gástrico ou a gastrectomia vertical em “sleeve”
OBESIDADE resulta em drástica redução do peso e melhora das
manifestações da síndrome metabólica.
Em alguns pacientes com síndrome metabólica, as opções
de tratamento precisam estender-se além da intervenção
no estilo de vida.
Os fármacos para a perda de peso encontram-se em duas
classes:
− Supressores do apetite
− Inibidores da absorção
Os supressores do apetite incluem fentermina (apenas para
uso em curto prazo [3 meses]), bem como as adições mais
recentes de fentermina/topiramato, lorcasserina,
naltrexona/bupropiona e liraglutida em alta dose (3,0 mg)
(em lugar de 1,8 mg, dose máxima para tratamento do
diabetes tipo 2), que foram aprovadas sem restrições
quanto à duração da terapia.
Em ensaios clínicos, a combinação fentermina/topiramato
de liberação prolongada resultou em uma perda de peso de TRATAMENTO MEDICAMENTOSO
cerca de 8% em relação ao placebo em 50% dos pacientes.
Os efeitos colaterais incluem palpitações, cefaleia, O tratamento medicamentoso na síndrome metabólica
parestesias, obstipação e insônia. A lorcasserina resulta em estará sempre indicado quando não se conseguir resultado
menos perda de peso – em geral, cerca de 5% além do com as medidas de mudanças do estilo de vida, situação
placebo –, mas pode causar cefaleia e nasofaringite. A muito frequente na prática clínica.
combinação de naltrexona/bupropiona de liberação
HIPERTENSÃO ARTERIAL
prolongada reduz o peso corporal em ≥ 10% em cerca de
20% dos pacientes; todavia, essa combinação está O mais importante objetivo do tratamento da hipertensão
contraindicada para indivíduos com distúrbios arterial é a redução da pressão arterial e com isso a
convulsivos ou na presença de qualquer condição passível morbimortalidade cardiovascular e renal.
de predispor a crises convulsivas. Essa combinação
também aumenta o pulso e a pressão arterial e não deve As IV Diretrizes Brasileiras de Hipertensão Arterial
ser administrada a pacientes com hipertensão não recomendam que qualquer uma das cinco principais
controlada. A liraglutida em alta dose resulta em uma classes de drogas anti-hipertensivas (diuréticos,
perda de peso de cerca de 6% em relação ao placebo, com betabloqueadores, antagonistas de cálcio, inibidores da
> 10% de perda de peso em cerca de 33% dos pacientes. enzima conversora de angiotensina (IECA) e
Os efeitos colaterais comuns limitam-se ao trato bloqueadores dos receptores de angiotensina II (BRA)
gastrintestinal superior, incluindo náusea e, com menos podem ser utilizadas como tratamento inicial da
frequência, vômitos. hipertensão arterial, não havendo diferenças entre eles em
relação aos benefícios cardiovasculares. Entretanto, ao
O orlistate inibe a absorção de gordura em cerca de término de grande parte dos estudos que avaliaram o
30%. Além disso, o orlistate reduziu a incidência de controle da pressão arterial (PA), a maioria dos pacientes
diabetes tipo 2, um efeito particularmente evidente em utilizou associação dos hipotensores.
pacientes com comprometimento da tolerância à glicose
em condições basais. Esse fármaco, com frequência, é Na presença de síndrome metabólica, se o diabetes estiver
difícil de tomar devido ao vazamento oleoso pelo reto. Em presente, o bloqueio do sistema renina angiotensina tem
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se mostrado útil. Estudos clínicos têm demonstrado A história natural do diabetes tipo 2 evidencia, com o
benefício para a proteção renal na nefropatia diabética passar dos anos, uma deterioração progressiva da glicemia
com proteinúria, em diabéticos do tipo 1 (IECA) e do tipo decorrente da instalação mais acentuada do fator
2. deficiência insulínica. Nessa fase, as sulfoniluréias
podem ser associadas aos sensibilizadores de insulina. A
Nos hipertensos com PA 160mmHg/100mmHg, a deficiência de insulina pode se acentuar, ocorrendo então
associação de drogas deve ser considerada para o início do a necessidade de associação de insulina aos agentes orais
tratamento anti-hipertensivo. Em cerca de dois terços dos e finalmente insulinização plena.
pacientes hipertensos, são necessárias duas ou mais drogas
para a obtenção do controle pressórico, especialmente As glinidas e a acarbose são drogas auxiliares indicadas
quando os níveis pressóricos são mais elevados ou se as no tratamento da hiperglicemia pós-prandial.
metas a serem atingidas são mais rigorosas. Quando a
associação de drogas for empregada, o diurético deve ser Combinações terapêuticas de metformina e glitazonas,
utilizado. metformina e sulfoniluréias, e glitazonas e sulfoniluréias
têm sido amplamente utilizadas.
Em pacientes com síndrome metabólica, a redução da
pressão arterial para cifras inferiores a Em relação às metas a serem alcançadas no tratamento do
130mmHg/85mmHg pode ser útil, considerando-se o diabetes do tipo 2, recomenda-se uma glicose de jejum de
elevado risco cardiovascular associado. No paciente com até 110mg/dL, pós-prandial inferior a 140mg/dL e
diabetes tipo 2, a pressão arterial deve ser reduzida abaixo hemoglobina glicosilada (%) até o limite superior do
de 130mmHg/80mmHg, não importando que associação método.
de drogas seja necessária para se alcançar este objetivo. A É necessário ressaltar, mais uma vez, a importância de se
presença de nefropatia com proteinúria importante implica tratar o diabetes no contexto dos outros componentes da
em redução da pressão arterial para valores abaixo de síndrome metabólica. Todas as estratégias necessárias
120mmHg/ 75mmHg. Para os pacientes portadores de para a diminuição da aterosclerose devem ser
doença cardiovascular estabelecida e com idade superior a implementadas.
50 anos, recomenda-se atingir essa meta em menos de seis
meses. DISLIPIDEMIA

A associação de anti-hipertensivos, utilizando-se As alterações do metabolismo lipídico apresentam uma


hipotensores em separado ou combinado em dose fixa, relação frequente com a aterogênese e, consequentemente,
deve obedecer à premissa de não se associar drogas com com a aterosclerose e a elevada morbimortalidade
mecanismos de ação similares. cardiovascular.

DIABETES TIPO 2 Convém enfatizar que apesar de os níveis de LDL-


colesterol não constituírem um dos critérios diagnósticos
A maioria dos pacientes com hiperglicemia não responde desta síndrome, as evidências de estudos clínicos
ou deixa de responder adequadamente ao tratamento não- controlados apontam para a necessidade da redução do
medicamentoso, e nesses casos, devem ser iniciados um LDL-colesterol como meta primária a ser alcançada com
ou mais agentes hipoglicemiantes com a finalidade de o tratamento, concomitantemente com a correção dos
controlar a glicemia e promover a queda da hemoglobina níveis do HDL-colesterol e dos triglicérides.
glicada –A1c.
As estatinas são os medicamentos de escolha para reduzir
Além do objetivo de normalização da glicemia, é o LDL-C em adultos. Estudos de prevenção primária e
fundamental a necessidade de serem desenvolvidas secundária mostram que as estatinas diminuem os eventos
estratégias dirigidas para a diminuição da incidência de coronarianos, a incidência de acidente vascular encefálico
eventos cardiovasculares. A adoção de metas mais rígidas, e a necessidade de revascularização do miocárdio e a
não só dos valores glicêmicos, como também dos outros mortalidade cardiovascular total.
fatores de risco associados, deve ser perseguida. Em
relação aos agentes orais utilizados no tratamento do Os fibratos demonstraram benefício na redução de
diabetes tipo 2, a droga ideal deve ter além do efeito anti- eventos cardiovasculares em indivíduos com HDL-C
hiperglicemiante, uma ação antiaterogênica. abaixo de 40mg/dL, componente frequente da síndrome
metabólica. Os fibratos são também indicados para o
O diabetes tipo 2 é decorrência de dois defeitos básicos: tratamento da hipertrigliceridemia quando a dieta e a
resistência insulínica e deficiência insulínica. Nas fases atividade física não forem suficientes para corrigi-la. Os
iniciais da moléstia, predomina o fator resistência, sendo ácidos graxos ômega-3 podem ser usados como terapia
indicado o uso de drogas sensibilizadoras da ação coadjuvante da hipertrigliceridemia ou em substituição
insulínica: metformina e glitazonas. Acarbose também aos fibratos em caso de intolerância a estes.
pode ser utilizada nesta situação.

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O ácido nicotínico de liberação intermediária pode fenofibrato pode ser mais eficaz do que a genfibrozila
aumentar o HDL-C e, segundo alguns estudos contribui nesse grupo.
para redução de eventos cardiovasculares.
TRIGLICERÍDEOS
O ezetimiba associado às estatinas permite acentuada
redução do LDL-C e a sua utilização pode ser considerada Um fibrato (genfibrozila ou fenofibrato) é o fármaco de
para atingir as metas lipídicas preconizadas. escolha para reduzir os triglicerídeos em jejum, que
costumam atingir uma diminuição de 30 a 45%. A
A terapêutica combinada de estatinas com fibratos ou administração concomitante com fármacos metabolizados
com o ácido nicotínico pode ser uma opção atrativa nos pelo sistema 3A4 aumenta o risco de miopatia. Nesses
indivíduos com síndrome metabólica que apresentem casos, o fenofibrato pode ser preferível à genfibrozila.
elevação do LDL-colesterol e dos triglicerídeos e redução
do HDL-colesterol. Outros fármacos que reduzem os níveis de triglicerídeos
incluem estatinas, ácido nicotínico e prescrição de ácidos
OUTROS PONTOS graxos ômega-3. Para esse propósito, uma dose
intermediária ou alta das estatinas “mais potentes”
LDL-COLESTEROL (atorvastatina, rosuvastatina) é necessária. O efeito do
As diretrizes para o colesterol da ACC/AHA de 2013 não ácido nicotínico nos triglicerídeos em jejum está
têm recomendações específicas para pacientes com relacionado com a dose e é de cerca de 20 a 35%, um efeito
síndrome metabólica; entretanto, deve-se prescrever uma que é menos pronunciado do que aquele dos fibratos. Em
estatina em todos os pacientes com diabetes, de 40 a 79 pacientes com síndrome metabólica e diabetes, o ácido
anos de idade, com LDL-colesterol entre 60 e 189 mg/dL. nicotínico pode aumentar os níveis de glicemia em jejum.
Para pacientes com diabetes e doença cardiovascular A prescrição de preparações de ácido graxo ômega-3
aterosclerótica (DCVAS) diagnosticada, as evidências reduz os níveis de triglicerídeos em jejum em cerca de 25
atuais sustentam uma dose de estatina de alta intensidade a 40%. Não ocorre qualquer interação medicamentosa
(p. ex., atorvastatina 40 a 80 mg ou rosuvastatina 20 a 40 com fibratos ou estatinas, e o principal efeito colateral de
mg ao dia). Para os pacientes com síndrome metabólica seu uso é a eructação com gosto de peixe.
sem diabetes, deve-se utilizar uma estimativa de risco de HDL-COLESTEROL
DCVAS de 10 anos, e um risco de ≥ 7,5% deve levar a
uma discussão entre o profissional de saúde e o paciente Pouquíssimos compostos modificadores de lipídeos
sobre a instituição de terapia com estatina para prevenção aumentam os níveis de HDL-colesterol. Estatinas, fibratos
primária da DCVAS. e sequestradores de ácido biliar têm efeitos modestos (5-
10%), enquanto a ezetimiba e os ácidos graxos de ômega-
Dietas com restrição de gorduras saturadas (menos de 6% 3 não têm qualquer efeito. O ácido nicotínico é o único
de calorias) e gorduras trans (o menos possível) devem ser fármaco atualmente disponível com propriedades de
aplicadas de maneira intensiva. Embora as evidências elevação do HDL-colesterol previsíveis. A resposta está
sejam controversas, o colesterol da dieta também pode ser relacionada com a dose, e o ácido nicotínico pode
restrito. Se o colesterol continuar elevado, é necessária aumentar o HDL-colesterol em cerca de 30% acima da
intervenção farmacológica. linha de base. Após vários ensaios de ácido nicotínico
Com base em evidências substanciais, o tratamento com versus placebo em pacientes tratados com estatina, ainda
estatinas, que reduz o LDL-colesterol em 15 a 60%, é a não há evidências de que elevar a HDL com ácido
intervenção farmacológica de primeira escolha. nicotínico afete de maneira benéfica os eventos de
DCVAS em pacientes com ou sem síndrome metabólica.
O inibidor da absorção do colesterol ezetimiba é bem
tolerado, devendo ser uma segunda escolha de intervenção PRESSÃO ARTERIAL
medicamentosa. A ezetimiba reduz o LDL-colesterol em A relação direta entre a pressão arterial e a taxa de
15 a 20%. mortalidade por todas as causas foi bem-estabelecida em
Os sequestradores de ácidos biliares, colestiramina, estudos que comparam os pacientes com hipertensão (>
colestipol e colesevalam podem ser mais efetivos do que a 140/90 mmHg), os pacientes com pré-hipertensão (>
ezetimiba; todavia, como podem aumentar os níveis de 120/80 mmHg, porém < 140/90 mmHg) e os indivíduos
triglicerídeos, precisam ser usados com cautela em com pressão arterial normal (< 120/80 mmHg).
pacientes com síndrome metabólica quando os Em pacientes com síndrome metabólica sem diabetes, a
triglicerídeos em jejum são > 300 mg/dL. Os efeitos melhor escolha para o anti-hipertensivo inicial é um
colaterais consistem em sintomas gastrintestinais inibidor da enzima conversora de angiotensina (ECA) ou
(distúrbios do paladar, distensão abdominal, eructação, um bloqueador do receptor de angiotensina II, visto que
constipação, irritação anal). essas duas classes de fármacos são efetivas e bem
Os fibratos são mais bem empregados para reduzir o LDL- toleradas. Em todos os pacientes com hipertensão, deve-se
colesterol quando os triglicerídeos não estão elevados. O recomendar um padrão de dieta com restrição de sódio,
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@anabea.rs | Ana Beatriz Rodrigues
rica em frutas e vegetais e laticínios com baixo teor de
gordura. O monitoramento doméstico da pressão arterial
pode ajudar a manter um bom controle da pressão arterial.
ALTERAÇÃO DA GLICEMIA DE JEJUM
Em pacientes com síndrome metabólica e diabetes tipo 2,
o controle glicêmico intensivo pode modificar, de maneira
favorável, os níveis de triglicerídeos em jejum e/ou HDL-
colesterol.
Nos pacientes com comprometimento da glicemia em
jejum sem diagnóstico de diabetes, uma intervenção no
estilo de vida que inclua redução do peso, restrição
dietética de gordura e aumento da atividade física mostra
reduzir a incidência de diabetes tipo 2. A metformina
também reduz a incidência de diabetes, embora o efeito
seja menor do que o observado com intervenção no estilo
de vida.
RESISTÊNCIA À INSULINA
Várias classes de fármacos (biguanidas, tiazolidinedionas
[TZDs]) aumentam a sensibilidade à insulina. Pelo fato de
a resistência à insulina ser o mecanismo fisiopatológico
primário para a síndrome metabólica, os fármacos
representativos nessas classes reduzem sua prevalência.
Tanto a metformina quanto as TZDs aumentam a ação da
insulina no fígado e suprimem a produção endógena de
glicose. As TZDs, mas não a metformina, também
melhoram a captação de glicose mediada pela insulina no
músculo e no tecido adiposo.
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA
I Diretriz Brasileira De Diagnóstico E Tratamento Da
Síndrome Metabólica - 2005
Jameson, JL Medicina Interna de Harrison - 2 Volumes.
Disponível em: Minha Biblioteca, (20ª edição). Grupo A,
2019.

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