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AO JUÍZO DA __ VARA CÍVEL DA COMARCA DE XXXXXXX, ESTADO DE

XXXX.

Processo nº XXXXX-00.0000.0.00.0000

JAIMINHO CARTEIRO, já qualificado nos autos do processo em epígrafe, por


intermédio de seu bastante procurador que esta subscreve, vem perante este juízo, com
fulcro no art. 313, inc. V, alínea ‘a’ do CPC, requerer a SUSPENSÃO DO
PROCESSO por prejudicialidade externa, pelas razões que passa a expor.

O imperativo legal consubstanciado no art , 313, inc. V, alínea ‘a’ do CPC[1]


estabelece que, quando a sentença de mérito depender do julgamento de outra causa ou
da declaração de existência de relação jurídica que constitua objeto principal de outro
processo pendente, far-se-á necessária a suspensão do processo.

Destaca-se, portanto, que o presente litígio recai sobre objeto comum à usucapião
sob nº XXXXX-00.0000.0.00.0000 que tramita perante a vara cível da comarca de
XXXXX, qual seja, o imóvel de matrícula nº XXX situado na Rua 00, Lt. 00, Qd. 00,
Setor XXX do município XXXX (UF).

A pendencia de declaração judicial na usucapião, quanto à existência de


prescrição aquisitiva em favor do Requerido constitui-se como causa prejudicial externa
em relação à presente ação de imissão na posse, de modo que o processamento desta
deve ser sobrestado até o julgamento definitivo da usucapião sob pena de causar dados
irreparáveis ao Requerido, notadamente diante do risco de irreversibilidade da medida
de desapossamento.

Importante destacar que o dano irreparável consiste no iminente risco do


Requerido ser despejado de sua residência, na qual vive há 18 anos, violação ao direito
social à moradia e à dignidade humana, garantias constitucionais expressa no art. 6º e no
art. 1º, inc. III da C.R.F.B[2] respectivamente.

Tamanha é a relevância social do direito à moradia que, além de sua expressão na


lei maior, constituiu-se um regime especial para a prescrição aquisitiva pró-moradia ou
usucapião especial urbana, como é o caso da pretensão do Requerido, facilitando-a. No
mesmo espírito, consignando o pedido de suspensão ora pleiteado, está o disposto no
art. 11 da Lei nº 10.257/2001:

Art. 11. Na pendência da ação de usucapião especial urbana, ficarão sobrestadas


quaisquer outras ações, petitórias ou possessórias, que venham a ser propostas
relativamente ao imóvel usucapiendo. (grifo nosso).

Portanto, subsumindo-se o caso ao disposto no art , 313, inc. V, alínea ‘a’ do CPC
e art. 11 da Lei nº 10.257/2001, demonstrada está a necessidade de sobrestamento da
ação de imissão na posse até o julgamento definitivo da usucapião especial urbana. No
entanto, considerando a natureza a ação de imissão na posse, na qual a pretensão do
autor é se ver na posse do bem imóvel, a medida liminar concedida por este juízo na
decisão contida no evento nº XX, se efetivada, entregará antecipadamente ao autor a
tutela por ele pretendida sem sequer garantir o contraditório do Requerido, fato que lhe
causará danos irreparáveis.

A medida liminar, tal como foi concedida, inaudita altera pars, em inobservância
do art , 313, inc. V, alínea ‘a’ do CPC e art. 11 da Lei nº 10.257/2001, se for efetivada,
privará o Requerido de seu patrimônio sem o devido processo legal, grave violação do
inc. LIV do art. 5º da Constituição Federal[3].

Diante de tais considerações sobre o risco representado pela efetivação da medida


liminar, mister observar o fim social [4] do mandamento substanciado no art. 11 da Lei
nº 10.257/2001, qual seja, preservar a posse de imóvel usucapiendo em favor do autor
da usucapião especial, como forma de preservar o direito social à moradia. Neste
sentido, merece destaque o seguinte julgado do Tribunal de Justiça de Goiás.

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO SECUMDUM


EVENTUM LITIS. AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE.
LIMINAR DEFERIDA. DESOCUPAÇÃO DO IMÓVEL.
AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. POSSE
INJUSTA E PERIGO DE DANO NÃO DEMONSTRADOS.
CONTROVÉRSIA SOBRE A PROPRIEDADE DO
IMÓVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO PRETÉRITA. 1. O
agravo de instrumento é um recurso secundum eventum litis, ou
seja, a matéria transferida ao exame do Tribunal é unicamente a
versada na decisão recorrida. Não cabe à instância superior,
portanto, a pretexto de julgamento do agravo, apreciar ou rever
outros termos/atos do processo que não foram decididos pelo
juízo de origem, sob pena de supressão de instância. 2. A
concessão da tutela de urgência exige a presença dos requisitos
insculpidos no art. 300 do CPC, quais sejam, a probabilidade do
direito alegado e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do
processo. A existência de título de domínio do imóvel em nome
do autor, por si só, não autoriza a imissão liminar na posse do
bem, caso não demonstrada também a urgência da medida e a
posse injusta do réu. 3. A existência de ação de usucapião
pretérita pleiteando o reconhecimento da prescrição aquisitiva
do imóvel reivindicado, com fulcro no artigo 183 da
Constituição Federal, demonstra que a posse exercida pelos réus
é capaz de se contrapor ao título de domínio apresentado pelos
autores. Prudente, portanto, a revogação da ordem liminar de
imissão de posse, notadamente diante do risco de
irreversibilidade da medida de desapossamento. AGRAVO DE
INSTRUMENTO CONHECIDO E PROVIDO. DECISÃO
REFORMADA. (TJ-GO - AI: XXXXX20188090000, Relator:
ITAMAR DE LIMA, Data de Julgamento: 21/08/2018, 3ª
Câmara Cível, Data de Publicação: DJ de 21/08/2018). (Grifo
nosso).

Portanto, considerando o escopo social do mandamento legal de suspensão de


ações possessórias ou petitórias protocoladas no curso da ação de usucapião especial, o
qual visa proteger o vulnerável morador das medidas de desapropriação irreversíveis em
corolário ao direito social à moradia, além do sobrestamento do feito até o julgamento
definitivo da usucapião, é medida necessária para a justa aplicação da lei, a revogação
da liminar concedida no evento nº XX e, por consequência, do mandado de imissão na
posse, evento YY.

Ainda sobre a necessidade de revogação da medida liminar para a preservação de


direitos do Requerido, mister destacar a jurisprudência do STF que, no julgamento da
ADPF nº 828/DF, que determinou a suspensão de ordens ou medidas de desocupação
pelo período de 6 (seis) meses, de áreas que já estavam habitadas antes de 20 de março
de 2020, data em que foi aprovado o estado de calamidade pública em razão da
pandemia. Esta engloba quaisquer imóveis que sirvam de moradia, como é o caso do
imóvel ocupado pelo Agravante.

DIREITO CONSTITUCIONAL E CIVIL. ARGUIÇÃO


DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO
FUNDAMENTAL. TUTELA DO DIREITO À MORADIA
E À SAÚDE DE PESSOAS VULNERÁVEIS NO
CONTEXTO DA PANDEMIA DA COVID-19. MEDIDA
CAUTELAR PARCIALMENTE DEFERIDA. [...] VII.
Conclusão 1. Ante o quadro, defiro parcialmente a medida
cautelar para: i) com relação a ocupações anteriores à
pandemia: suspender pelo prazo de 6 (seis) meses, a contar da
presente decisão, medidas administrativas ou judiciais que
resultem em despejos, desocupações, remoções forçadas ou
reintegrações de posse de natureza coletiva em imóveis que
sirvam de moradia ou que representem área produtiva pelo
trabalho individual ou familiar de populações vulneráveis, nos
casos de ocupações anteriores a 20 de março de 2020, quando
do início da vigência do estado de calamidade pública (Decreto
Legislativo nº 6/2020) [...]

Em destaque à evidente prejudicialidade nas ações que tem em comum a


pretensão de seus autores na fruição plena da posse e propriedade do mesmo imóvel,
bem como enfatizar o risco que oferece a decisão contina no evento XX, caso tal liminar
seja efetivada, cabe menção aos seguintes julgados, demonstrando-se a pacificação
jurisprudencial:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE USUCAPIÃO.


AÇÃO DE IMISSÃO DE POSSE. REUNIÃO PROCESSOS.
JULGAMENTO CONJUNTO. MANUTENÇÃO DA RÉ NA
POSSE IMÓVEL. 1. Serão reunidos para julgamento conjunto
os processos que possam gerar risco de prolação de decisões
conflitantes ou contraditórias caso decididos separadamente,
mesmo sem conexão entre eles (CPC/2015, 55 § 3º). 2. O
ajuizamento de ação de usucapião configura-se questão
prejudicial à ação de imissão de posse com base na propriedade,
recomendando-se a suspensão da determinação de desocupação
do imóvel até provimento final do processo. 3. Deu-se
provimento ao agravo de instrumento da ré. 4ª Turma Cível.
DJE: 14/09/2018. Relator: SÉRGIO ROCHA. (Grifo nosso).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMISSÃO DE


POSSE. CONTROVÉRSIA SOBRE A PROPRIEDADE DO
IMÓVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO PRETÉRITA.
SUSPENSÃO DO FEITO AUTORIZADA.
PREJUDICIALIDADE EXTERNA. RECURSO
SECUNDUM EVENTUM LITIS. DECISÃO A QUO
MANTIDA. 1. O agravo de instrumento consiste em recurso
secundum eventum litis e, portanto, nele, o exame da vexata
quaestio limita-se ao acerto ou desacerto da decisão prolatada
pelo juízo a quo, razão pela qual é vedado ao órgão ad quem, em
regra, externar manifestação acerca de matéria estranha ao
decisum vituperado. 2. Nos termos da alínea a, inciso V, do
artigo 313, do Código de Processo Civil, "suspende-se o
processo quando a sentença de mérito depender do julgamento
de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência
de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro
processo pendente". 3. O ajuizamento da ação de usucapião
configura-se questão prejudicial à ação de imissão de posse com
fundamento na propriedade, motivo pelo qual recomenda-se a
suspensão do feito, visando afastar o risco da prolação de
decisões conflitantes. 4. AGRAVO DE INSTRUMENTO
CONHECIDO E DESPROVIDO (TJGO, XXXXX-
36.2020.8.09.0000, 2ª Câmara Cível). (Grifo nosso).

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMISSÃO DE


POSSE. ROL TAXATIVO. MITIGAÇÃO.
CONTROVÉRSIA SOBRE A PROPRIEDADE DO
IMÓVEL. AÇÃO DE USUCAPIÃO PRETÉRITA.
SUSPENSÃO DO FEITO AUTORIZADA. CUSTAS
PROCESSUAIS E HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. NÃO
INCIDÊNCIA. 1. Mitiga-se o rol taxativo do artigo 1015 do
CPC quando a discussão da matéria trazida no agravo de
instrumento restar prejudicada ao tempo do julgamento do
recurso de apelação, caso dos autos. 2. A existência de ação de
usucapião pretérita pleiteando o reconhecimento da prescrição
aquisitiva do imóvel reivindicado, demonstra que a posse
exercida pelo réu é capaz de se contrapor ao título de domínio
apresentado pelos autores. Prudente, portanto, a suspensão do
feito pelo prazo de 01 ano, notadamente diante do risco de
irreversibilidade da medida de desapossamento. 3. Não há falar-
se em condenação do agravado em custas e honorários
advocatícios quando a decisão agravada não põe fim ao
processo. 4. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO, EM
PARTE. DECISÃO REFORMADA. (Grifo nosso).

Por todo o exposto, pugna a Vossa Excelência, em caráter de urgência, que


declare a prejudicialidade externa em razão da pendencia de sentença definitiva na ação
de usucapião especial, sobrestando o feito e revogando a ordem liminar de
desapossamento até o julgamento definitivo do processo de usucapião especial urbana,
com fundamento nos arts. 313, inc. V, alínea ‘a’ do CPC, e no mandamento contido no
art. 11 da lei nº 10.257/2001, em corolário ao direito social à moradia e demais
disposições legais e constitucionais que o corroboram, considerando ainda o contexto
pandêmico e a jurisprudência do STF fixada no julgamento da ADPF nº 828/DF.

Termos em que
aguarda deferimento.

Local e data.

Advogado, OAB/UF-XX.XXX

[1] Art. 313. Suspende-se o processo: [...] V - quando a sentença de mérito: a) depender
do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de
relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente;

[2] Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia,
o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à
infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. [...] Art. 1º A
República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem
como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana;

[3] Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do
direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes: [...] LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal;

[4] LINDB - Art. 5o Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se
dirige e às exigências do bem comum.

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