Você está na página 1de 8

DIREITO CONSTITUCIONAL III

Erick Vinícius
Direito Constitucional Positivo

Roteiro de aula

Tema: Teoria Geral do Controle de Constitucionalidade

1. CONCEITO
O controle de constitucionalidade visa garantir a supremacia e a defesa das
normas constitucionais (explícitas ou implícitas) frente a possíveis usurpações.
Esse conceito deve ser entendido como a verificação de compatibilidade (ou
adequação) de leis ou atos normativos em relação a uma constituição, no que
tange ao preenchimento de requisitos formais e materiais que as leis ou atos
normativos devem necessariamente observar.
Doutrina majoritária – O controle de constitucionalidade se apresenta como a
análise de parametricidade entre a Constituição e a Legislação
infraconstitucional nos países em que a Constituição tem supralegalidade
(exerce relação de supremacia em relação a todo o ordenamento jurídico), sendo
portanto, formal e rígida.
É necessário para além da mera parametricidade, é necessário a exigência de
uma sanção. Ou seja, para uma “jurisdição constitucional tradicionalmente forte”,
não basta a inadequação da lei ou ato normativo. Após essa conclusão, faz-se
necessário a declaração de invalidade da lei ou do ato normativo.
Portanto, a luz da doutrina, é possível estabelecer, os pressupostos clássicos do
controle de constitucionalidade:
1) Existência de uma Constituição formal e rígida;
2) Constituição como norma jurídica fundamental;
3) Órgão dotado de competência para a realização do controle;
4) Uma sanção para a conduta realizada contra a Constituição.
2. ESPÉCIES (TIPOS) DE INCONSTITUCIONALIDADE

Quanto a conduta praticada:


a) Inconstitucionalidade por ação: decorre de condutas comissivas
praticadas pelo Poder Público contrárias a preceitos constitucionais.
Portanto, quando o poder público age de forma incompatível com a
constituição, ele está praticando uma inconstitucionalidade por ação.

Exemplo: a CF/88 veda pena de morte (salvo em caso de guerra


declarada). Se o legislador resolve aprovar uma lei estabelecendo a pena
de morte para um determinado crime, tal lei será inconstitucional (por
ação).

b) Inconstitucionalidade por omissão: Ocorre quando as medidas


necessárias para tornar plenamente aplicáveis as normas constitucionais
carentes de intermediação não são adotadas (omissão total) ou são
adotadas de modo insuficiente (omissão parcial).

Exemplo: art. 37, VII da CF - Direito de greve do servidor público.

Quanto à norma constitucional ofendida


Esse critério leva em consideração o parâmetro (norma de referência), podendo
haver a inconstitucionalidade formal e material.
a) Formal (nomodinâmica): é aquela que envolve o vício no processo de
produção das normas jurídicas, na medida em que as leis ou atos
normativos são editados em desconformidade com as normas
constitucionalmente previstas, obediência a requisitos formais. Esses
dizem respeito, ao modo ou à forma de elaboração (produção).

 Subjetiva: diz respeito à primeira fase do processo legislativo – fase de


INICIATIVA – relaciona-se ao sujeito que tem competência ou
legitimidade para iniciar o processo de produção da norma.

Exemplo: O art. 61, § 1º da CF trata de várias matérias cuja iniciativa é


privativa do Presidente da República. Se um parlamentar, entretanto,
apresentar um projeto de lei sobre uma dessas matérias, haverá um vício
de origem, ou seja, uma inconstitucionalidade formal subjetiva.

 Objetiva: dizem respeito as outras fases do processo legislativo.

Exemplo: inobservância do quórum constitucionalmente exigido para as


leis complementares (maioria absoluta).
b) Material (nomoestática): É aquela que ocorre quando o conteúdo de leis
ou atos normativos encontra-se em desconformidade (ou em desacordo)
com o conteúdo das normas constitucionais.

Exemplo: inconstitucionalidade do dispositivo da Lei de Crimes Hediondos


que vedava a progressão em abstrato do regime prisional. O conteúdo do
dispositivo da lei era incompatível com o conteúdo de uma garantia
prevista na CF, art. 5º, XLVI (princípio da individualização da pena).

Quanto à extensão
Relaciona-se a extensão da desconformidade da lei ou do ato normativo em
relação à Constituição.
a) Total: ocorre quando toda a lei ou o ato normativo se encontra em total
inadequação com a Constituição. O vício atinge a integralidade da norma,
não restando partes válidas a serem aplicadas.

b) Parcial: ocorre quando apenas partes da lei ou de ato normativo (alguns


dispositivos normativos) contrariam a Constituição.

Questão: Seria possível declarar apenas uma palavra ou uma expressão


como sendo inconstitucionais?
Sim, a declaração de inconstitucionalidade parcial pode incidir sobre uma
palavra isolada ou sobre determinadas expressões.
Atenção: declaração de inconstitucionalidade parcial é distinta do veto
parcial. Veto parcial (art. 66, §2o, CF): necessariamente deve abranger
todo o artigo, todo o parágrafo, toda a alínea ou todo o inciso.
Declaração de inconstitucionalidade parcial: O STF pode declarar a
inconstitucionalidade de apenas uma palavra ou uma expressão dentro
de um dispositivo. No entanto, é vedado declarar inconstitucional uma
palavra ou uma expressão de modo a modificar o restante do sentido do
dispositivo. Do contrário, o STF estaria atuando como legislador positivo
e isso não é permitido.

Quanto ao momento
Relaciona-se ao momento da produção ou da elaboração da lei ou do ato
normativo em relação ao parâmetro.
a) Originária: ocorre quando uma lei ou ato normativo é editado (nasce) após o
início da vigência de uma Constituição e contraria a mesma. Ou seja, sob a égide
de uma determinada Constituição, surge uma lei ou ato normativo que viola
(contraria) a Lei maior no ordenamento jurídico.
b) Superveniente: ocorre quando existem leis ou atos normativos vigorando (e
em consonância) sob a base de uma Constituição que posteriormente é
revogada por uma nova Constituição que não mais coaduna com essas leis ou
atos normativos, ou ainda, quando o Texto Constitucional é alterado por meio de
uma emenda constitucional. Ou seja, com o “surgimento de uma nova
Constituição ou com a alteração da atual por meio de emenda constitucional”, há
uma alteração do parâmetro constitucional, fazendo com que legislações
anteriores se tornem incompatíveis.

Para a doutrina majoritária e, sobretudo, para a jurisprudência do STF, não se


trata de inconstitucionalidade, mas de revogação (tecnicamente denominado de
“não recepção”) do direito anterior incompatível com a nova normatividade
constitucional.

Questão: A tese de inconstitucionalidade superveniente é adotada, no


Brasil, pelo STF?
No Brasil, em regra, a expressão “inconstitucionalidade superveniente” não é
adotada no Brasil. Isso ocorre porque o Brasil adota a teoria do Hans Kelsen,
segundo a qual só há inconstitucionalidade quando o poder público viola a
constituição. Na hipótese de inconstitucionalidade superveniente, por sua vez,
não há uma conduta do poder público que seja violadora da Constituição.

3. MATRIZES E MODALIDADES DE CONTROLE DE


CONSTITUCIONALIDADE.

Essas matrizes irão influenciar na criação e no desenvolvimento dos modelos de


controle de constitucionalidade em inúmeros países que se alinharão às bases
concebidas por elas.
Matriz americana (1.803) CONTROLE DIFUSO
Trata-se da primeira matriz concebida no mundo, deflagrada no celebre caso
Marbury x Madison, julgado pela Suprema Corte Americana em 1.803. Nesse
julgado restou consignado a doutrina da Supremacia da Constituição, bem como
a criação do controle de constitucionalidade das leis. As principais características
são:
a) Esse controle de atos normativos em relação à Constituição seria feito
pelo Poder Judiciário e, no caso norte-americano, por todos os seus
membros (todos os juízes e Tribunais) de forma DIFUSA.
b) Importante também destacar que o mesmo seria afeto sempre a casos
concretos a serem solvidos pelo Poder Judiciário no desempenho comum
de sua função jurisdicional, controlando-se a constitucionalidade de modo
incidental e gerando efeitos tradicionalmente intitulados de
INTERPARTES (pelo menos de início).
c) A declaração de inconstitucionalidade, no que tange à perspectiva
temporal, geraria efeitos ex tunc (retroativos), sendo o ato normativo
considerado inconstitucional desde o dia em que surgiu no ordenamento.
Nesse sentido a decisão é meramente declaratória de uma
inconstitucionalidade existente desde a origem da lei ou ato normativo
impugnado.

Matriz austríaca (1.920) CONTROLE CONCENTRADO


A segunda matriz, é a austríaca, que teve como marco a Constituição da Áustria
de 1920. Esse sistema foi delineado por Hans Kelsen e se disseminou na
Europa, sobretudo, após a 2ª Guerra Mundial. Nesse sistema, o controle também
é realizado pelo Poder Judiciário, que atuaria como uma espécie de “legislador
negativo”, tendo como principais características:
a) A criação de um órgão próprio e específico de controle de
constitucionalidade, denominado de “Corte” ou “Tribunal Constitucional”
sendo o único órgão dotado de legitimidade para a análise da adequação
de leis ou atos normativos em relação à Constituição; daí a terminologia
CONTROLE CONCENTRADO.

b) Esse controle engendrado por Kelsen não é realizado de modo incidental,


mas de modo direto (via principal), na qual o Tribunal Constitucional
analisa se o ato normativo em tese contraria ou não a Constituição, não
havendo, portanto, um “real” caso concreto, uma lide (pretensões
resistidas), sendo um controle realizado abstratamente num processo,
intitulado pela doutrina de objetivo, que traz consigo uma decisão de
efeitos erga omnes (válida para todos).

c) A declaração de inconstitucionalidade no que tange à perspectiva


temporal geraria efeitos ex nunc (pro futuro), na medida que, enquanto
um ato normativo não fosse declarado inconstitucional pelo Tribunal
Constitucional, ele seria válido (pressupõe validade).

No Brasil, ele é exercido:


 STF: exerce o controle concentrado quando o parâmetro é a Constituição
Federal.
 TJ: exerce o controle concentrado quando o parâmetro é a Constituição
Estadual.
No Brasil, o controle concentrado foi introduzido pela Constituição de 1934.
4. QUANTO À ANALISE DO MOMENTO PARA O CONTROLE

 Preventivo: refere-se ao controle feito para prevenir lesão à CF. Este


controle é feito antes, de modo a evitar que haja lesão. Recai sobre
projetos (produção).

 Repressivo: refere-se ao controle feito depois que já houve a lesão à CF.


Tem o objetivo de reparar ofensa à constituição.

QUESTÃO A partir de que momento o controle preventivo se torna repressivo?


Na jurisprudência do STF, prevalece o entendimento de que, a partir da
publicação do ato normativo, o controle passa a ser repressivo. Assim sendo,
quando o ato é publicado, o controle deixa de ser preventivo e passa a ser
repressivo.
STF - ADI 466 MC/DF: “A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tem
refletido claramente essa posição em tema de controle normativo abstrato,
exigindo [...] que a ação direta tenha, e só possa ter, como objeto juridicamente
idôneo, apenas leis e atos normativos, federais ou estaduais, já promulgados,
editados e publicados.”
Todavia, o STF admite a propositura de uma ADI questionando uma lei, antes
de ela ser publicada, desde que, até o julgamento da ação, a publicação já tenha
ocorrido.
STF - ADI 3.367/DF: “ADI. Propositura antes da publicação oficial da EC no
45/2004. Publicação superveniente, antes do julgamento da causa. Suficiência.
Carência da ação não configurada. Preliminar repelida. Inteligência do art. 267,
VI, do CPC. Devendo as condições da ação coexistir à data da sentença,
considera-se presente o interesse processual, ou de agir, em ação direta de
inconstitucionalidade de Emenda Constitucional que só foi publicada,
oficialmente, no curso do processo, mas antes da sentença.”
ATENÇÃO: O professor destaca que todos os Poderes podem exercer os dois
tipos de controle (preventivo e repressivo). A diferença é que o controle
preventivo é exercido, em regra, pelo Poder Executivo e pelo Poder
Legislativo. O Poder Judiciário somente exerce o controle preventivo
excepcionalmente.
De outro lado, o controle repressivo é exercido, em regra, pelo Poder
Judiciário. Apenas em situações excepcionais os demais poderes o exercem.
a) Preventivo
I- Poder Legislativo:
Geralmente, é exercido pela CCJ: A comissão é um órgão permanente em todas
as casas do poder legislativo.
Delegação atípica: é uma espécie de delegação feita pelo Congresso Nacional
ao Presidente da República para que este elabore a lei delegada. Neste caso, o
Presidente solicita ao Congresso uma delegação para elaborar lei sobre
determinado tema e, posteriormente, o Congresso analisa e aprova (ou não) a
lei criada. Trata-se, portanto, de controle feito antes de ocorrer uma lesão à
CF/1988.
II - Poder Executivo:
Veto - existem duas espécies de veto:
1º) jurídico: ocorre quando o Chefe do Executivo entende que o projeto de lei é
incompatível com a Constituição Federal. Neste caso, há uma análise jurídica.
 O exercício do controle preventivo pelo Chefe do Poder Executivo
somente ocorre no veto jurídico.
2º) político: ocorre quando o Chefe do Executivo entende que o projeto de lei é
contrário ao interesse público. Neste caso, não se trata de controle de
constitucionalidade, mas sim de juízo político.
III - Poder Judiciário:
O controle preventivo é exercido pelo Poder Judiciário apenas de modo
excepcional. A única hipótese de controle preventivo é o mandado de
segurança impetrado por parlamentar quando inobservado o devido processo
legislativo constitucional.
STF - MS 31.816-MC/DF: “Devido processo legislativo. Controle judicial.
Cabimento. Legitimidade ativa ad causam exclusiva do parlamentar em
exercício. Mandado de segurança conhecido. Limites constitucionais ao poder
de deliberação legislativa acerca do veto presidencial. Art. 66, §§ 4o e 6o, da
CF/88. Sobrestamento das demais proposições até a deliberação do veto
pendente. possibilidade.”
STF – MS 27.971/DF: EMENTA: [...] PERDA SUPERVENIENTE, PELO
IMPETRANTE, DE SUA CONDIÇÃO POLÍTICO-JURÍDICA DE
PARLAMENTAR. IMPOSSIBILIDADE DE PROSSEGUIMENTO DA AÇÃO
MANDAMENTAL. LEGITIMAÇÃO ATIVA “AD CAUSAM” QUE DEVE ESTAR
PRESENTE, JUNTAMENTE COM AS DEMAIS CONDIÇÕES DA AÇÃO, NO
MOMENTO DA RESOLUÇÃO DO LITÍGIO (CPC, ART. 462)...”.

b) Repressivo
Precipuamente, é o Poder Judiciário que exerce o controle repressivo. Os
poderes Executivo e Legislativo somente exercerão o controle repressivo de
forma excepcional.

Você também pode gostar