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DIREITO CONSTITUCIONAL

CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE
Visão detalhada sobre controle de constitucionalidade

1. Introdução

O controle de constitucionalidade consiste na aferição da validade das


normas em face da Constituição. Nesse sentido, as normas podem ser
consideradas inconstitucionais – quando em desacordo com a Constituição –
ou constitucionais – quando compatíveis com o Texto Maior. Por meio do
controle de constitucionalidade, é possível verificar a compatibilidade
vertical das normas com a Constituição, a fim de garantir a força normativa
do texto constitucional e assim, garantir a observância do princípio da
supremacia da Constituição.

No Brasil, adota-se a teoria da nulidade ao tratar dos efeitos das leis


declaradas inconstitucionais. Por influência do direito norte-americano, a
teoria considera que, a lei declarada inconstitucional é nula desde o seu
nascimento. Assim, em regra, a declaração de inconstitucionalidade opera
efeitos retroativos (ex tunc).

Sobre o assunto, faz-se necessário também destacar a teoria da


anulabilidade. A teoria da anulabilidade, proveniente da escola austríaca,
considera que a declaração de inconstitucionalidade da lei afeta o plano da
eficácia. Assim, a lei produz normalmente seus efeitos até ser declarada
inconstitucional. De acordo com a teoria, a declaração de
inconstitucionalidade gera efeitos prospectivos (ex nunc).

Apesar de o Brasil adotar a teoria da nulidade, observa-se, na jurisprudência e


na legislação, uma flexibilização da teoria, de forma que existe a possibilidade
de o Supremo Tribunal Federal (STF), ao decidir pela inconstitucionalidade da
norma, modular os efeitos da decisão por razões de segurança jurídica ou

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de excepcional interesse público e determinar, assim, o momento de produção
de efeitos da norma.

2. Pressupostos

Os pressupostos do controle de constitucionalidade são:

i) existência de uma constituição rígida;

ii) mecanismos de fiscalização das leis, com previsão de órgão com


competência para exercer a atividade de controle.

As constituições rígidas são aquelas que somente podem ser alteradas por
procedimento mais dificultoso do que o previsto para alteração das leis
ordinárias. Tal fato decorre do princípio da supremacia formal da
Constituição, tendo em vista que o legislador não poderá alterá-la por ato
infraconstitucional.

A existência de um mecanismo de fiscalização da constitucionalidade


garante a sua supremacia. O órgão competente para exercer o controle de
constitucionalidade pode exercer a função jurisdicional – por meio do Poder
Judiciário – ou função política – integrando a estrutura de outro poder. No
Brasil, compete, principalmente, ao Poder Judiciário fazer o controle de
constitucionalidade das leis. Excepcionalmente, os demais poderes poderão
realizar o controle.

3. Sistema misto

O Brasil adotou um sistema misto de controle de constitucionalidade e


incorporou uma matriz baseada no sistema norte-americano e outra matriz
baseada no sistema austríaco. Logo, percebemos que, no modelo brasileiro
de controle, coexistem duas matrizes de controle importadas de dois modelos
teóricos diferentes.

O sistema austríaco costuma ter sua idealização atribuída a Hans Kelsen. Já


o sistema norte-americano costuma ter sua idealização atribuída ao juiz John
Marshall, da Suprema Corte dos EUA, que elaborou o voto que contém os

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principais fundamentos no famoso precedente Marbury vs. Madison. Desse
modo, no Brasil, há dois caminhos possíveis para se questionar a
constitucionalidade de uma lei ou ato normativo.

O sistema austríaco se difere do norte-americano, pois nele há o controle


concentrado. É reconhecida a competência de órgãos específicos para esse
tipo de controle no Brasil, mas não é conferido indistintamente a todos os
órgãos judiciários. Somente dois Tribunais no Brasil exercem o controle
concentrado de constitucionalidade: o STF, quando o parâmetro de controle é
a Constituição Federal, e os Tribunais de Justiça (TJ), quando o parâmetro de
controle é a Constituição Estadual. O controle concentrado significa que essa
matriz de controle de constitucionalidade atribui competências a órgãos
específicos para seu exercício.

Diferentemente do sistema norte-americano que adota o controle difuso, no


sistema austríaco o controle ocorre de forma abstrata. Assim, o processo não
discute relações jurídicas individuais, mas, abstratamente, a validade ou não
da própria lei.

O controle por esse sistema ocorre pela via principal, por meio das ações de
controle concentrado de constitucionalidade (Ação direta de
inconstitucionalidade (ADI), ação direta de inconstitucionalidade por omissão
(ADO), ação declaratória de constitucionalidade (ADC), arguição de
descumprimento de preceito fundamental (ADPF, Representação de
inconstitucionalidade perante o TJ), portanto, não há um mero incidente, mas
um procedimento específico com requisitos delimitados de forma precisa em
lei.

Nesse sistema, diferentemente do sistema norte-americano, em que há um


pedido principal, por exemplo, de natureza condenatória, o pedido principal é
a declaração de inconstitucionalidade.

Um dos caminhos possíveis pelo sistema de controle norte-americano é o


controle pela via difusa. Todo e qualquer juiz, em qualquer grau de jurisdição,
tem competência para, no caso concreto, afastar a aplicação de uma lei que
entenda inconstitucional.

Nesse primeiro conjunto de possibilidade de controle de constitucionalidade,


qualquer juiz, qualquer Tribunal, qualquer órgão jurisdicional, qualquer órgão

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do Poder Judiciário, em qualquer grau de jurisdição, pode exercer o controle
difuso de constitucionalidade. Desse modo, quanto à competência dos
órgãos, temos um sistema difuso.

Além disso, nesse sistema, o controle é exercido em concreto. Existe um caso


concreto, uma demanda ajuizada no Poder Judiciário e, durante o julgamento
dessa demanda, surge como um argumento importante para o julgamento do
caso concreto a inconstitucionalidade de uma lei ou ato normativo aplicável
àquele caso. Diz-se que é em concreto, porque nesse tipo de controle há
partes delimitadas.

O controle nesse sistema é feito de forma incidental, pois a questão


constitucional é um mero incidente do processo, não há um procedimento
novo para isso. No primeiro grau de jurisdição, o controle pode ser feito por
meio de decisão interlocutória, sentença, ou em qualquer ato de conteúdo
decisório proferido pelo juiz.

Visto que ninguém ingressa em juízo requerendo diretamente a


inconstitucionalidade da lei, pois as partes têm outra pretensão, mas a causa
de pedir, por vezes, pode ser a inconstitucionalidade de uma lei ou um ato
normativo. Os efeitos da decisão nesse sistema são inter partes, quando o
juiz decide a questão constitucional no caso concreto, sua decisão feita na
fundamentação irá atingir tão somente as partes daquele processo. Se outras
partes trouxerem uma pretensão parecida com o mesmo pedido ou a mesma
causa de pedir, a decisão proferida no primeiro processo não afetará as
partes desse novo processo. O juiz deve fundamentar a cada apreciação do
mérito a questão constitucional novamente. Desse modo, a decisão do
primeiro processo não serve de base para a decisão de processos análogos.

Os efeitos da decisão no sistema norte-americano são efeitos ditos não


vinculantes, porque a decisão não se reveste de obrigatoriedade e não
autoriza a utilização da reclamação para garantir a autoridade da decisão do
órgão que controla a constitucionalidade da lei ou ato normativo.

É muito importante perceber que no Brasil - assim como no sistema norte-


americano, os efeitos são ex tunc, ou seja, eles retroagem até a data da
vigência da lei ou ato normativo questionado.

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4. Espécies de inconstitucionalidade

Sobre o assunto, existem variadas formas de manifestação da


inconstitucionalidade:

a) Na inconstitucionalidade por ação, a violação constitucional resulta de


uma conduta positiva de algum órgão estatal, por exemplo, quando se edita
uma norma contrária à Constituição. Na inconstitucionalidade por omissão,
verifica-se a inércia do legislador diante de um mandamento constitucional,
carente de regulamentação.

b) Inconstitucionalidade material (nomoestática): ocorre quando o conteúdo


da lei contraria a Constituição.

c) Inconstitucionalidade formal (nomodinâmica): ocorre quando existe um


desrespeito ao processo de elaboração da norma, estabelecido pela
Constituição.

A inconstitucionalidade formal poderá ser de três tipos:

i) orgânica;

ii) formal propriamente dita; e

iii) formal por violação a pressupostos objetivos do ato.

Acontecendo da seguinte forma:

• Inconstitucionalidade formal orgânica: decorre da inobservância da competência legislativa


para a elaboração do ato.
• Inconstitucionalidade formal propriamente dita: deriva da inobservância do processo
legislativo (fase de iniciativa, por exemplo).
• Inconstitucionalidade formal por violação a pressupostos objetivos do ato: processa-se
da inobservância de pressupostos específicos e essenciais para a edição de atos. Por
exemplo, citam-se as medidas provisórias que, para serem editadas, precisam atender aos
requisitos de urgência e relevância (art. 62, caput, CF/1988).

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d) Inconstitucionalidade originária e superveniente: Tem-se a
inconstitucionalidade originária, quando a norma-parâmetro for anterior à
norma objeto de impugnação. Exemplo: lei que contraria texto da
Constituição. Tem-se a inconstitucionalidade superveniente quando a
norma-parâmetro for posterior à norma objeto da impugnação.

No Brasil, entende o STF que, em regra, não existe a chamada


inconstitucionalidade superveniente. Dessa forma, não há possibilidade de
uma lei se tornar inconstitucional, tendo em vista que a inconstitucionalidade é
congênita, desde o seu nascimento. Assim, a promulgação de uma nova
Constituição ou edição de nova emenda constitucional irá revogar as leis
incompatíveis.

No entanto, a inconstitucionalidade superveniente pode ser observada na


hipótese excepcional de mutação constitucional, em que apesar de não
haver uma alteração formal do texto constitucional, há uma modificação
interpretativa decorrente de alterações na realidade fática subjacente, dando
origem, então, a uma nova norma jurídica. Assim, uma lei que nasceu
constitucional pode se tornar inconstitucional em razão de uma alteração no
sentido do parâmetro de constitucionalidade.

e) Inconstitucionalidade por arrastamento: nesse caso, quando uma norma


principal for declarada inconstitucional, todas as normas dela dependentes
também deverão ser consideradas inconstitucionais.

5. Outros critérios de classificação das formas de controle de


constitucionalidade

a) Sistemas de controle

Há três tipos de sistemas de controle:

• Controle judicial: Nesse caso, o Poder Judiciário detém a competência para declarar a
inconstitucionalidade das Leis.
• Controle político: O controle de constitucionalidade é realizado por órgão político. Trata-se
de modelo adotado na França.
• Controle misto: A fiscalização da constitucionalidade cabe ao Poder Judiciário e a órgãos
políticos.

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É importante salientar que o Brasil adota um sistema principalmente judicial.

Atenção!

Acerca do exercício de controle concentrado de constitucionalidade


por órgãos não judiciais, é importante o conhecimento do seguinte
julgado do STF, no qual o Supremo declarou a impossibilidade do
exercício de controle de constitucionalidade com efeitos erga
omnes e vinculantes pelo Tribunal de Contas da União:

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO.
IMPOSSIBILIDADE DE EXERCÍCIO DE CONTROLE DE
CONSTITUCIONALIDADE COM EFEITOS ERGA OMNES E
VINCULANTES PELO TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO.
DECISÃO DE AFASTAMENTO GENÉRICO E DEFINITIVO DA
EFICÁCIA DE DISPOSITIVOS LEGAIS SOBRE PAGAMENTO
DE “BÔNUS DE EFICIÊNCIA E PRODUTIVIDADE NA ATIVIDADE
TRIBUTÁRIA E ADUANEIRA” A INATIVOS E PENSIONISTAS,
INSTITUÍDO PELA LEI 13.464/2017. MANDADO DE SEGURANÇA
COLETIVO PROCEDENTE. ORDEM CONCEDIDA. 1. O Tribunal
de Contas da União, órgão sem função jurisdicional, não pode
declarar a inconstitucionalidade de lei federal com efeitos erga
omnes e vinculantes no âmbito de toda a Administração Pública
Federal. 2. Decisão do TCU que acarretou o total afastamento da
eficácia dos §§ 2º e 3º dos artigos 7º e 17 da Medida Provisória
765/2016, convertida na Lei 13.464/2017, no âmbito da
Administração Pública Federal. 3. Impossibilidade de o controle
difuso exercido administrativamente pelo Tribunal de Contas trazer
consigo a transcendência dos efeitos, de maneira a afastar
incidentalmente a aplicação de uma lei federal, não só para o caso
concreto, mas para toda a Administração Pública Federal,
extrapolando os efeitos concretos e interpartes e tornando-os erga
omnes e vinculantes. 4. Concessão da ordem no mandado de
segurança coletivo para afastar a determinação contida no item 9.2
do Acordão 2.000/2017 do Tribunal de Contas da União, proferido
no Processo TC 0216.009/2017-1, e determinar que as
aposentadorias e pensões dos servidores substituídos sejam

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analisadas em conformidade com os dispositivos legais vigentes
nos §§ 2º e 3º do art. 7º da Lei nº 13.464/2017 e inciso XXIII do § 1º
do art. 4º da Lei nº 10.887/2004 (STF – MS nº 35.410/DF, rel. Min.
Alexandre de Moraes, Data de Julgamento: 13.04.2021, Tribunal
Pleno, Data de Publicação: 06.05.2021).

b) Momentos de controle

Outro critério de classificação se trata do momento de controle. É possível


que o controle seja preventivo, realizado antes do ingresso do ato no
ordenamento jurídico; ou repressivo, após seu ingresso no ordenamento
jurídico.

O controle preventivo caracteriza-se quando a fiscalização acerca da


constitucionalidade incide sobre a norma na fase de elaboração, ou seja,
incide sobre projeto de lei e de emenda constitucional. Trata-se de controle
que se aplica no decorrer do processo legislativo de elaboração da
norma.

Esse controle, via de regra, é político. No entanto, o controle preventivo


poderá ser exercido pelo Poder Judiciário, como no caso em que um
parlamentar impetra mandado de segurança contra uma proposta de
emenda à Constituição manifestamente ofensiva à cláusula pétrea, ou se a
tramitação de projeto de lei ou de emenda à Constituição estiver violando
regra constitucional a respeito de seu processo legislativo (STF, MS nº
34.530/DF, decisão monocrática, rel. Min. Luiz Fux, julgado em 14.12.2016 e
MS nº 24.645/DF, rel. Min. Celso de Mello). Assim, se as regras do processo
legislativo forem desrespeitadas, abre-se a possibilidade de o parlamentar
impetrar mandado de segurança perante o STF.

Destaca-se, todavia, que, conforme entendimento do STF no julgamento do


RE nº 1.297.884/DF, indicado no informativo nº 1.021, em sede de
Repercussão Geral, Tema nº 1.120, ficou assentado que: 

Em respeito ao princípio da separação dos poderes, previsto no art. 2º da


Constituição Federal, quando não caracterizado o desrespeito às normas
constitucionais pertinentes ao processo legislativo, é defeso ao Poder

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Judiciário exercer o controle jurisdicional em relação à interpretação do
sentido e do alcance de normas meramente regimentais das Casas
Legislativas, por se tratar de matéria interna corporis. (STF – RE nº
1.297.884/DF, rel. Min. Dias Toffoli, Tribunal Pleno, Julg. 14.06.2021, Pub.
04.08.2021.)

Por sua vez, o controle repressivo caracteriza-se pela aferição de


constitucionalidade a incidir sobre a norma pronta, já integrante do
ordenamento jurídico. O controle repressivo comumente é jurisdicional.
Assim, caberá aos juízes e tribunais efetuar o controle de constitucionalidade
das normas já integrantes do ordenamento jurídico.

No entanto, excepcionalmente, o controle repressivo pode ser desempenhado


pelo Poder Legislativo. Nesse sentido, tem-se:

i) a hipótese do art. 49, V, da CF/1988, que estabelece que é competência


exclusiva do Congresso Nacional “sustar os atos normativos do Poder
Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação
legislativa”;
ii) a hipótese do art. 62 da CF/1988, que prevê que as medidas provisórias
serão submetidas à apreciação do Congresso Nacional, que poderá rejeitá-la
com fundamento na inconstitucionalidade.

Observação: Parte da doutrina apresenta posição no sentido de que o


controle político realizado pelo Congresso Nacional (art. 49, inciso V, da CF/
88) é de legalidade, e não de constitucionalidade, porque o objetivo é verificar
a que ponto o decreto regulamentar extrapolou os limites da lei.

Ressalta-se, ainda, que o controle repressivo também poderá ser


desempenhado, excepcionalmente, pelo Poder Executivo, quando determina
à Administração que não cumpra determinada norma, por ser inconstitucional
(STJ, REsp. nº 23.121/GO, julgado em 1993, rel. Min. Humberto Gomes de
Barros).

Obra coletiva do Curso Ênfase produzida a partir da análise estatística de incidência dos temas
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