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Sabendo que o OJ português dispõe de uma regra geral de referência material presente no
16º, e não se verificando no caso nenhuma exceção à aplicação desta regra, a referência à lei
da nacionalidade (no caso, americana) remete para a aplicação do seu direito material.
Assim sendo, cabe atender às normas materiais americanas para resolver a questão,
qualificando-as através do seu conteúdo e função como previsto no 15º.
Para esta qualificação, deve identificar-se o conceito quadro da norma de conflitos (no caso,
casamento), partindo do conceito previsto direito material português, mas com autonomia
interpretativa, adotando-se uma teoria de interpretação autónoma ao invés de uma teoria de
Lex Fori. No caso, seria de considerar a essencialidade de alguns elementos previstos no 1577º,
nomeadamente a pretensão de constituir família e a plena comunhão de vida. Assim, através
da autonomia, seria alargado o âmbito do 1577º pelo 49º, tornando o conceito quadro mais
abrangente para o 2º momento da qualificação.
Por fim, no último momento caberia a subsunção da norma designada competente ao conceito
quadro inicialmente obtido, ou seja, verificar se a norma é reconduzível ao conceito quadro,
atendendo ao seu conteúdo e função como previsto no 15º.
Caso 8
Estamos perante uma situação jurídica plurilocalizada, com ponto de contacto com duas
ordens jurídicas distintas: francesa (nacionalidade de ambos os nubentes) e portuguesa.
A questão em causa é a da capacidade para casar, regulada na nossa lei pelo art 49º CC. O
mesmo remete a questão para a lei da nacionalidade dos nubentes, que é a lei francesa (art
31º, nº 1 CC). Não obstante, por via do art 15º CC, concluímos que a remissão para o Direito
estrangeiro (neste caso, para o Direito francês), apenas opera perante as normas que, pelo seu
conteúdo e pela função que têm nessa lei, integram o regime do instituto visado na norma de
conflitos.
Desta feita, cumpre determinar qual o sentido do art 49º CC, concluindo o instituto que a
mesma visa proteger. O conceito de casamento (conceito-quadro inscrito no art 49º)
corresponde ao definido no art 1577º, como sendo o contrato mediante o qual duas pessoas
assumem a vontade de viver em comunhão de vida. Ora, o conceito de casamento aqui
presente não se trata de uma mera união entre duas pessoas: exige-se, entre outras coisas,
que em causa estejam duas pessoas vivas.
Assim sendo, não é de aceitar o casamento entre Angelique e Pierre. A interpretação da norma
tem de atender às finalidades por ela visadas que, neste caso, passam por partilhar uma vida, o
que não se identifica com a situação aqui em análise. O problema aqui solucionado é um
problema de qualificação, sendo este o processo mediante o qual integramos um caso
concreto na previsão de uma norma jurídica, ou o subsumimos ao conceito que delimita essa
norma. A qualificação opera por via de três momentos:
No caso em apreço, não era possível subsumir ao conceito integrado pela norma de conflitos
do art 49º CC. Permitir este casamento, mais, violaria a reserva de ordem pública internacional
(art 22º CC).
Caso 9
Qualificação do 877º CC -> A matéria podia ser sobre obrigações, sobre sucessões ou sobre
relações familiares. A doutrina entende que o 877º tem dois objetivos: a proteção da quota
legítima do filho e a proteção da situação familiar, entendendo a maioria que o conteúdo e
função da norma é a proteção da família, e uma minoria que é uma norma sucessória.
O 57º do CC seria a norma de conflitos aplicável nesta matéria, que atribui competência à lei
nacional comum dos pais; na falta desta, a lei da sua residência habitual comum e; se os pais
residirem em Estados diferentes, a lei pessoal do filho. Ora, no caso, os pais viviam em Estados
separados, pelo que seria aplicável a lei pessoal de Carlos, ou seja, a lei material brasileira.