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COMO ENSINAR

UMA CRIANÇA AUTISTA


Certa vez uma professora veio até mim e me contou as dificuldades que estava
passando para conseguir ensinar um aluno diagnosticado com autismo. Ela nunca teve
essa experiência e isso a deixava muito frustrada, pois não conseguia entender como
ensinar uma criança que não interagia com a professora e nem com os colegas, não
sabia lidar com os sentimentos e desejos e nem fazia perguntas. Ela sempre conduziu
suas aulas sem um planejamento individualizado e se questionava: "Como vou realizar
a avaliação se ele não acompanha a sala?".
O aluno foi diagnosticado com 4 anos por uma Neuropediatra, estava
matriculado em uma escola regular da Educação infantil. Ele não se comunicava
verbalmente e utilizava somente alguns gestos com a intenção de se comunicar. Além
da falta de comunicação oral, outros aspectos estavam presentes como a pouca
interação com os colegas, presença de várias estereotipias e forte temperamento.
A professora sabia que algo tinha que ser feito, algo necessitava ser modificado,
entretanto sozinha não foi capaz de descobrir como começar. Diante de todas as
dificuldades ela não se acomodou e buscou ajuda com os demais profissionais que
acompanhavam o aluno com autismo, Fonoaudiólogo, Psicólogo, Terapeuta
Ocupacional e demais funcionários da escola que estava matriculado.
Os especialistas explicaram que o primeiro passo foi construir o Plano
Educacional Individualizado (PEI).
O que é Plano Educacional Individualizado (PEI)?
O PEI é uma ferramenta para otimizar o processo de ensino e aprendizagem de
alunos com algum transtorno. É um recurso pedagógico com foco individualizado. Esse
Plano de ensino é construído com a ajuda de todos os profissionais que estão
acompanhando o aluno, como professores, coordenadores pedagógicos, pais,
familiares e os especialistas que estão cuidando da criança.
Existem 3 níveis para a elaboração do PEI. No nível 1 é observado quais são as
necessidades educacionais do aluno. No nível 2 são avaliadas quais as áreas que o
aluno tem mais facilidade e mais dificuldade para proporcionar as adequações do
ambiente físico e mudanças curriculares. E por fim, o nível 3 ocorre a intervenção
diretamente, com base nos objetivos elaborados no PEI, sempre reavaliando o aluno
para ver se está progredindo.
Os autores desse Plano Educacional Individualizado afirmam ser necessário
responder a quatro questões:
Como ensinar?
Proporcionar formas de instrução mais acessíveis ao aluno, de modo que o
professor passe o conteúdo de maneira clara e objetiva. Além de buscar quais
estratégias, métodos e materiais devem ser utilizados para melhor compreensão do
aluno, com o objetivo de ajudá-lo a construir habilidades que ainda não foram
aprendidas.
Em que condições?
É importante reorganizar o contexto físico do ambiente para melhor participação
do aluno. Promover atividades para serem realizadas em grupo ou isoladamente,
aumentar o tempo de realização e adequar o espaço físico e a forrma de instrução para
otimizar o aprendizado da criança.
Por que ensinar?
Para ensinar um aluno com deficiência é preciso abrir mão do imediatismo e
compreender que os resultados aparecem, porém de forma mais lenta e sutil. E
imprescindível que o planejamento e as estratégias sejam elaborados de forma
colaborativa de modo a alcançar os objetivos propostos pela escola, família e
profissionais.

PLANO EDUCACIONAL
INDIVIDUALIZADO
Como elaborar um PEI?
Agora vamos aprender o passo a passo de como construir o PEI.
"O PEI é considerado uma proposta de organização curricular que norteia a mediação
pedagógica do professor, assim como desenvolve os potenciais ainda não consolidados
do aluno. O registro ou mapeamento do que o sujeito já alcançou e o que ainda
necessita alcançar é fundamental para que se possa pensar o que vai ser feito para que
ele atinja os objetivos traçados." Débora Pereira

Basicamente o PEI é constituído em 4 etapas:


• Conhecer o Aluno: Traçar um perfil com suas habilidades e
necessidades. Conhecer sua história, seus gostos, seus conhecimentos já adquiridos e
o que ele precisa aprender.
• Estabelecer Metas: Nesta etapa, você deve definir as metas de curto,
médio e longo prazo. Avaliar o que a criança deve aprender em cada espaço de tempo
a partir do seu perfil.
• Elaboração do Cronograma: Com as metas traçadas, você precisa definir
como e quando elas serão executadas.
• Avaliação: Você precisa realizar o Registro Avaliativo do aluno
organizando os procedimentos e avaliando as metas alcançadas.
Segundo Débora Pereira, existem alguns pontos importantes que devem ser
observados na elaboração do Plano Educacional Individualizado (PEI).
• O nível de desempenho do aluno, ou seja, quais habilidades que ele
possui.
• Elaboração de metas anuais. Há metas de curto ou longo prazo de modo
a facilitar sua realização, lembrando que os planos devem ser avaliados 3 vezes ao ano,
de acordo com a evolução e necessidade do participante.
• O modo como o aluno será avaliado. É necessário construir um processo
de avaliação de acordo com o progresso da criança.
• Deve ser especificado o período de realização dos relatórios periódicos
com os avanços do aluno em sala de aula, lembrando sempre das metas a serem
cumpridas e seus prazos, isso é muito importante.
• É essencial considerar durante a elaboração do Plano os especialistas
fora da sala de aula, como Fonoaudiólogo, Psicólogo e outros, eles podem ajudar muito
e oferecer sugestões para um desenvolvimento melhor.
• Quando necessário, pode propor mudanças no Plano e a escola
precisará se estruturar para conseguir suprir as possíveis novas necessidades que
foram alteradas.
• É necessário adaptar os materiais e recursos pedagógicos necessários
de acordo com as necessidades específicas de cada criança.
O próximo passo é o preenchimento de um inventário de habilidades escolares,
ou seja, a escola e os professores necessitam observar e identificar o desempenho do
aluno de acordo com quatro categorias: comunicação oral, leitura e escrita, raciocínio
lógico-matemático e comunicação alternativa. Por meio dessa ficha o profissional
consegue avaliar as habilidades e dificuldades que o aluno possui.
Unidade básicas que podem ser trabalhadas dentro do PEI.
1) As habilidades acadêmicas: são aquelas pré-estabelecidas pelos
Referenciais Curriculares, a saber: escrita, matemática e linguagem oral.
2) Habilidades de Vida Diária: trabalho voltado para alimentação, como o
lanche por exemplo, pois foi observado que o aluno ainda fazia uso da mamadeira e
tinha dificuldade em solicitar seu lanche para as professoras.
3) A inteligência do aluno: é a habilidade de compreender o conteúdo
oferecido pelo professor.
4) As metas e objetivos traçados: a partir do nível de conhecimento do
aluno, bem como a habilidade de se apropriar dos conteúdos esperados para sua idade,
elaborou-se o PEI com metas e objetivos prioritários baseado nos objetivos gerais da
classe.
5) Metodologia e Recursos Didáticos: é uma gama de possibilidades para
otimizar a aprendizagem do aluno com autismo, por exemplo: recursos pedagógicos,
naturais, tecnológicos entre outros.
6) Avaliação: o processo avaliativo é feito por intermédio dos registros
considerados significativos por parte dos professores, no momento da realização das
atividades propostas.
Só lembrando que as metas e objetivos devem ser elaborados de acordo com
as habilidades do aluno, por isso é muito importante o preenchimento correto do
inventário de habilidades escolares. A metodologia de ensino e os recursos pedagógicos
da escola precisam estar adaptados para que o aluno possa participar das aulas junto
aos seus colegas de sala. É muito importante considerar os objetivos atingidos, quando
a criança conquista um novo conhecimento, o professor conduz para novos desafios,
isso impede de insistir em uma habilidade já aprendida e perder o interesse do aluno.
Vale ressaltar que esse modelo serve para oferecer um norte para os
professores, contudo não podemos esquecer que cada aluno possui necessidades e
habilidades específicas e a partir delas que o Plano Educacional Individualizado é
construído individualmente.

Profissional
mediador
O mediador tem um papel muito importante no processo de inclusão do aluno com TEA,
pois ele ajuda em diversas situações no ambiente escolar.
Vale ressaltar: auxiliar na percepção por meio da distinção das informações
sensoriais, auditivas e visuais; ajudar a detectar possíveis obstáculos, identificar o
problema e buscar as soluções, isso contribui para o aluno ser mais ativo e que tome
iniciativas.
O mediador precisa ser flexível e criativo, precisa incentivar a criança
encorajando nas mais variadas e pequenas conquistas do dia a dia de sua rotina,
contribuindo para que ela se conheça, tome iniciativas e aprenda a ser mais tolerante e
lidar com as emoções.
A principal função do mediador é assumir o papel de porta voz entre aluno e as
várias situações da rotina escolar. Eles podem atuar em outros ambientes além da sala
de aula, como as dependências da escola, pátio, passeios pedagógicos e etc, sempre
auxiliando na geração de independência e autonomia, acompanhando a criança na
realização das atividades propostas e as atividades de necessidades pessoais da
criança.
De acordo com Renata Mousinho, esse processo de mediação e essencial
devido:
"A possibilidade do considerar o foco atencional do outro, ou seja, seus
interesses e chamar a atenção do outro para objetos ou assuntos de interesse mútuo
constituem importantes capacidades para a aquisição e o desenvolvimento da
linguagem, de habilidades sociais e das relações sociais. O seu aprimoramento permite
o uso dos gestos, o contato físico e a linguagem para deliberadamente influenciar e
dirigir o comportamento do outro durante a comunicação. Essas habilidades também
possuem uma forte relação com a possibilidade de interpretar e compartilhar emoções
e intenções levando em consideração experiências anteriores não só relacionadas a
eventos como também em relação a temas de conversação. Compartilhar a atenção,
dividir emoções e expressar suas intenções facilitam o engajamento no processo de
comunicação social recíproca. ” Renata Mousinho
Dicas Práticas para Professores e Mediadores de Crianças
Autistas
1) O profissional deve tentar proporcionar a construção de uma linguagem
oral espontânea e funcional, aplicando algumas estratégias específicas para cada aluno
para que esse objetivo seja alcançado.
2) É necessário o trabalho para possibilitar o aumento do contato visual,
assim como o reconhecimento geral de expressões faciais. É necessário também que
a criança compreenda a chamada reciprocidade social, ou seja, perceber se sua
comunicação foi satisfatória, realizar pequenos ajustes quando necessário e insistir no
ato comunicativo.
Durante a interação adulto/criança ou criança/criança é imprescindível buscar
estimular a imaginação por meio da brincadeira simbólica. A grande maioria das
crianças com autismo possuem o pensamento bastante concreto, com isso apresentam
dificuldades nas habilidades de imaginação como o faz de conta, por exemplo.
3) Uma dica importante é estimular o direcionamento do olhar para o objeto
desejado ou para a pessoa que está falando. Neste sentido, há uma ideia de
"triangulação do olhar", isto é, a criança olha para a pessoa e para o objeto de modo
alternado, fechando assim os vértices de um triângulo por meio do olhar.
4) Uma sugestão é reforçar as informações auditivas com o auxílio de pistas
visuais como fotografias, objetos ou até mesmo figuras, pois crianças com autismo
aprendem muito pelo visual. Ao realizar antecipação de algum acontecimento que, por
ventura, venha quebrar a rotina é interessante usar fotos de pessoas, lugares ou até
mesmo emoções (alegria por estar naquele lugar e com determinada pessoa). O
objetivo é proporcionar a compreensão de que algo novo está por vir e preparar o aluno
para se adequar a essa mudança.
5) No que se refere à construção de um diálogo, é preciso considerar alguns
pontos para melhor participação da criança nesse contexto comunicativo de trocas de
turnos. Lembrando que um diálogo precisa ser simétrico, ambos precisam falar metade
das vezes. Por isso, cuidado para não tornarem seus momentos de interação
verdadeiros monólogos!
Com o ter um diálogo com uma criança autista?
0 primeiro ponto a ser considerado diz respeito a maneira como as informações
são passadas. Por isso, utilize sempre frases curtas, claras e objetivas proporcionando
um melhor entendimento. Busque ajudar a criança autista na organização do seu
discurso, de modo que haja uma sequência lógica e coerente. Também incentive a
utilização do pronome na primeira pessoa quando a criança ainda não consegue utilizá-
lo.
Em se tratando de autistas verbais, é preciso ensiná-los a utilizar as trocas de
turnos no diálogo, assim aprenderão desde cedo a respeitar o momento de cada um na
comunicação verbal. Como também é importante ensinar a compreender os marcadores
que dão indícios de quando uma conversa inicia ou termina.
Na relação criança/criança é necessário esclarecer comentários dos coleguinhas
de sala. Deve-se sanar possíveis mal-entendidos, como também explicar metáforas,
piadas, ironias e algumas expressões de difícil entendimento para o aluno.
Ao iniciar um diálogo, opte por assuntos que façam parte dos interesses restritos
da criança. Isso gera motivação e interesse inicial pela conversa, em seguida você
introduz outros temas e elementos no discurso. Na presença de ecolalias, tanto tardias
como imediatas, e de perguntas repetitivas busque atribuir um significado para elas,
trazendo-as para dentro de um contexto significativo e continue o diálogo.
O mediador precisa estar atento e responder qualquer som emitido pela criança
com autismo, seja ele compreensível ou não. Busque sempre utilizar gestos
apropriados, um tom de voz tranquilo e sempre no mesmo padrão vocal (nem alto
demais e nem baixo) e uma linguagem corporal que destaque as suas emoções, isto é,
use e abuse de expressões faciais.
Na sala de de aula, estimule para que o aluno fixe sua atenção nas informações
oferecidas pelo professor ou para as atividades que estão sendo realizadas na sala. No
recreio, mediar uma melhor interação com outras crianças proporcionando uma
comunicação efetiva entre elas e observando o comportamento de cada uma para
auxiliar o aluno a como agir em coletivo. De acordo com Renata Mousinho:
"Por esse aspecto, ter um mediador propiciando a aquisição de linguagem e das
habilidades sociais no cotidiano escolar amplia a possibilidade da quantidade de
estimulo recebido, como também a qualidade, já que a estimulação sempre ocorrerá em
situação real de uso, diferente do que se pode proporcionar num consultório. O
mediador favorece por meio da interação, que a criança desenvolva a leitura e ajuste ao
contexto social, aprenda a brincar e a fazer amigos, aprenda a mudar o turno nas
situações dialógicas, ensina formas convencionais de comunicação, melhora a
compreensão da linguagem. Nas crianças que começam a falar tardiamente, facilita o
desenvolvimento de vocabulário expressivo durante as rotinas e atividades diárias,
expandindo-o." Renata Mousinho
Para finalizar, outra dica importante se refere à aplicação dessas sugestões no
cotidiano escolar. É de suma importância que o mediador conheça as dificuldades que
estão atreladas ao autismo. O profissional deve ser capacitado nessa área, com o intuito
de compreender que comportamentos e produções verbais aparentemente sem sentido
podem sim ter um significado; esta é uma premissa indispensável para poder fazer uso
dessas dicas de modo eficaz. Lembrando que todas as informações aqui compartilhadas
só terão real valor se aplicadas com consciência, coerência, ética, conhecimento e
principalmente respeitando a individualidade de cada aluno.
A escola, o professor titular e o assistente devem basear suas práticas na
compreensão das diferentes características do Transtorno do Espectro Autista inclui-se
dentro do espectro os problemas de interação social, dificuldade na comunicação,
interesses restritos e comportamentos repetitivos.

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