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NEUROFISIOLOGIA

Autor: Dr. Rodrigo Sartório

UNIASSELVI-PÓS
Programa de Pós-Graduação EAD
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Coordenador da Pós-Graduação EAD: Prof. Norberto Siegel

Equipe Multidisciplinar da
Pós-Graduação EAD: Profa. Bárbara Pricila Franz
Profa. Cláudia Regina Pinto Michelli
Prof. Norberto Siegel

Revisão de Conteúdo: Profa. Jeisa Benevenuti Sartorelli

Revisão Gramatical: Profa. Sandra Pottmeier

Revisão Pedagógica: Profa. Bárbara Pricila Franz

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci

Copyright © Editora UNIASSELVI 2009


Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.

612.8
S2513n Sartório, Rodrigo.
Neurofisiologia / Rodrigo Sartório.
Centro Universitário Leonardo da Vinci – Indaial:
Grupo UNIASSELVI, 2009.x ; 118 p.: il.

Inclui bibliografia.
ISBN 978-85-7830-195-8

1. Fisiologia Humana 2. Medicina - Neurofisiologia.


I. Centro Universitário Leonardo da Vinci.
II. Núcleo de Ensino a Distância III. Título
Dr. Rodrigo Sartório

Licenciado em Ciências Biológicas pela Universidade


Federal de Santa Maria e Mestre em Neurociências e
Comportamento pela Universidade Federal de Santa Catarina,
tem doutorado em Psicobiologia pela Universidade federal do
Rio Grande do Norte em Natal, onde pesquisou o desenvolvimento
do comportamento social do boto cinza, golfinho muito comum no
litoral brasileiro. Professor do curso de graduação em Pedagogia
nas disciplinas de Biologia da Educação e Didática do ensino de
Ciências, de cursos de Psicologia com disciplinas relacionadas à
Neurociências e do curso de Licenciatura em Ciências Biológicas.
Também atua em cursos de pós-graduação em todo o sul do Brasil,
nas áreas de Psicopedagogia, Educação Física, Educação Inclusiva,
Neuropedagogia e consultor de secretarias estaduais e municipais
de saúde e educação. Atualmente, tem se dedicado à pesquisa nas
áreas de desenvolvimento do comportamento adolescente e em
Psicologia Evolucionista, com publicações sobre a evolução e
bases neurais da mentira e do auto-engano. Publicou artigos
sobre brincadeira, cuidado parental, desenvolvimento
neuromotor e, mais recentemente, sobre o cérebro e
comportamento adolescente.
Sumário

Apresentação............................................................................7

CAPÍTULO 1
Vida e Aprendizagem................................................................ 9

CAPÍTULO 2
Tecido Nervoso e Neuroplasticidade................................ 29

CAPÍTULO 3
Estrutura e Funcionamento do Sistema Nervoso........... 59

CAPÍTULO 4
Ontogênese do Sistema Nervoso....................................... 95

CAPÍTULO 5
Neurociências e Educação..................................................109
APRESENTAÇÃO
Caro(a) pós-graduando(a):

Apresentamos aqui, o caderno de estudos de Neurofisiologia voltado


aos alunos de Pós-Graduação em Educação. Normalmente, nos currículos
de educação, pouca é a ênfase dada aos aspectos biológicos relacionados ao
aprendizado. Algumas escolas oferecem disciplinas de Biologia da Educação,
que não raras vezes, tem em seu conteúdo elementos do ensino de biologia dos
cursos de nível médio ou ainda uma biologia pobremente voltada às necessidades
do educador. Os conhecimentos da biologia da educação desde Vigotsky, Walon,
Lúria, Montessory e Piaget avançaram consideravelmente nos últimos 30 anos,
graças ao advento e importância dada à genética, evolução e neurociências no
entendimento da natureza humana e da aprendizagem. Novas explicações e
técnicas baseadas nestes estudos têm despontado na mídia e nas escolas de
formação de educadores, dando origem às disciplinas como Neurodidática,
Neuropedagogia, Neurofisiologia da Aprendizagem, Biologia da Educação.

Por outro lado, questões antes paradigmáticas com relação ao herdado e


adquiridas na aprendizagem, como por exemplo, a aparente oposição entre os
contextos sócio-histórico-culturais e a genética, fomentados essencialmente por
motivos políticos ideológicos (capitalismo e a lei do mais forte x comunismo e
automatismos sociais) não fazem mais sentido, cabendo agora, analisarmos até
que ponto pode ser maximizado as capacidades inatas de aprendizagem dos
indivíduos e facilitarmos assim, o desenvolvimento corpóreo; intelectual; ético;
emocional.

Nosso primeiro capítulo diz respeito à própria natureza da aprendizagem, que


em muitos aspectos se confunde com o conceito de seres vivos; Viver é Aprender.
Vamos discutir e trabalhar o conceito de seres vivos, de homeostasia, sobrevivência
e perpetuação, como a evolução biológica atua sobre a aprendizagem e a maneira
como nossas ideias acerca do cérebro e da aprendizagem evoluíram ao longo da
história da ciência.

O segundo capítulo é mais técnico, tratando basicamente das estruturas e


funcionamento do tecido nervoso, das células do sistema nervoso ao potencial de
ação, sinapses; e, por último da plasticidade neural. O educador pouco habituado
ao estudo desta abordagem da aprendizagem deve dar igual ou maior importância
ao capítulo, pois este servirá de instrumento fundamental para o entendimento
do restante do conteúdo do caderno, e ao final dos estudos, dará um suporte
para atuar de forma crítica sobre aspectos nutricionais, psicofarmacológicos
e as estimulações necessárias para o bom desenvolvimento das capacidades
cognitivas.

No terceiro capítulo faremos uma revisão sistemática do sistema nervoso,


com ênfase às principais estruturas responsáveis pelas regulações homeostáticas
e pelo aprendizado, culminando no maestro da orquestra cognitiva que é o
córtex pré-frontal, passando pelos mecanismos da percepção, cognição e os
componentes motores e hormonais das respostas que o organismo oferece ao
seu entorno.

O quarto capítulo aborda o desenvolvimento e aprendizagem desde o


momento da fecundação até a fase adulta, a forma com que o sistema nervoso
vai adquirindo, a partir de uma mente inespecífica, suas características especiais
e definindo a identidade do ser, tornando mais específico o indivíduo em termos
de habilidades ao longo da vida. Faremos uma análise do desenvolvimento
ontogenético; o desenvolvimento do ser ao longo da sua história de vida individual.

Nosso quinto e, último capítulo, fará referência à aplicabilidade dos


conhecimentos, conceitos, teorias e formulações apresentadas anteriormente,
voltados aos ambientes de aprendizagem formais e não formais, abordando
questões como memória, motivação e aspectos nutricionais relacionados à
aprendizagem, que constituirão nossas últimas contribuições no seu aprendizado
nesse momento.

Bons estudos!

O autor.
C APÍTULO 1
Vida e Aprendizagem

A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Apresentar os princípios básicos que regem a vida, a relação entre o organismo


vivo e seu meio e a evolução de nossas ideias sobre a mente humana.

 Entender o conceito de seres vivos e sua relação com aprendizagem; regulação


homeostática e sobrevivência.

 Analisar a interface entre vida e aprendizagem e superar o paradigma herdado


e aprendido.

 Entender os processos evolutivos biológicos e culturais.


Neurofisiologia

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Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

ConteXtualização
Para começarmos nossos estudos no mundo da neurofisiologia é importante
que trabalhemos alguns conceitos básicos da biologia, essencialmente, da
genética, ecologia, comportamento e neurociências. No capítulo que segue
vamos discutir o conceito de homeostasia e suas implicações na busca pelo
equilíbrio das estruturas e funções de todo o organismo vivo e sua interface com
os sistemas emocionais.

Todos nós algum dia já tivemos emoções destrutivas como a raiva e


respondemos de uma forma negativa a determinado problema, podemos ver esta
resposta como algo adaptativo em um universo evolutivo. A expressão da emoção,
em nosso caso a raiva, pode ser vista como um mecanismo de proteção contra
alguém que causou ou causa injuria ou prejuízo, ou ainda, como algo que gera
estresse e um prejuízo maior que seus supostos benefícios. Estes mecanismos
e os processos pelos quais nossos sistemas voltam ao normal são exemplos de
homeostasia no comportamento e no cotidiano das pessoas.

Também este capítulo se destaca na discussão que trava entre o paradigma


darwinista e a genética comportamental e suas aplicações no ambiente
educacional formal e não formal. Estes estudos são de importância para o
educador por abordar questões limítrofes do entendimento da natureza do
educando e por propor reflexões sobre assuntos tabus tais como, diferenças entre
sexos, orientação sexual e herança ligada ao comportamento.

Por fim, poderemos discutir a história da neurociência, sua importância na


evolução do pensamento científico e sua relevância enquanto ciência integradora
no século XXI.

Seres Vivos, Homeostasia e


Aprendizagem
Em seu livro “A origem das espécies” de 1858, Darwin enfatiza a importância
da luta pela sobrevivência e perpetuação como os caracteres principais que
constituem a vida, todos os organismos vivos estão constantemente empenhados
em sobreviver e deixar maior número de cópias possíveis de seus genes nas
futuras gerações. Seres humanos, enquanto contínuo deste processo, não estão
excluídos deste objetivo último da vida.

Filósofos de todos os tempos destacaram este equilíbrio enquanto aspecto


constituinte da vida: Aristóteles nos apresenta em suas análises sobre ética,

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Neurofisiologia

que a busca pelo bem-estar e a felicidade constituem ações morais. Descartes


inspirou-se nas fontes de água de Paris para explicar esta busca pelo equilíbrio,
num modelo denominado hidráulico. Descartes, na sua maneira “mecanicista”
de explicar o mundo, acreditava que os organismos humanos funcionavam de
maneira semelhante ao utilizado nas fontes e buscou subsídios na anatomia.
Ele supôs que a glândula pineal (que controla os ritmos diários do corpo e o
ciclo sono-vigília), por ficar próxima aos ventrículos preenchidos pelo líquido
cérebro espinhal (causa da hidrocefalia), bombeava este líquido ativando nervos,
músculos e ossos, de maneira que o indivíduo, estimulado pela visão da comida
e estando motivado para comer se dirigiria tal qual um autômato para a fonte
de comida. O sistema visual via nervo óptico, seria o mecanismo eliciador da
resposta dada pela pineal e o filósofo chegou a construir um “robô” a partir deste
modelo. No entanto, seu modelo mecânico não pressupunha um meio termo, e
os organismos deveriam chegar ao extremo da falta de nutrientes no corpo para
estarem motivados a beber ou comer. Dificilmente, alguém conseguiria sobreviver
se resolvesse buscar alimento apenas, quando sua fome estivesse no limite.

Walter Cannon, em 1929, cunhou o termo homeostasia para definir esta


busca por estados equilibrados do organismo. A homeostasia para Cannon é
definida como uma oscilação entre dois extremos o mais próximo possível de um
ótimo idealizado, é um sistema de regulação de todos os processos vivos.

Homeostasia: uma tendência de os estados fisiológicos do


organismo manter o equilíbrio.

Vamos usar a temperatura corpórea humana como exemplo: existe um limiar


inferior de tolerância que é de 34ºC, um limiar superior que em adultos pode
chegar até 40ºC e uma temperatura ótima (lembramos aqui que o ponto ótimo
é idealizado) que é de 36,5 ºC. O corpo terá sua temperatura oscilando o mais
próximo possível do ótimo, então em um dia quente de verão vamos procurar
um lugar com sombra e nossas glândulas sudoríparas serão ativadas de forma
a eliminar vapor de água e refrescar o organismo, o contrário vai ocorrer se o dia
estiver frio, nosso cérebro mandará comandos para que os músculos se contraiam
repetidamente para produzir calor metabólico e nossos pêlos ficarão eriçados de
maneira a manter o calor na superfície do corpo.

António Damásio analisando a natureza das emoções e sentimentos no livro


“Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos sentimentos” (2004, p. 43),
faz uma análise da vida e obra do filósofo do século XVII Benedictus Espinosa
a partir da perspectiva da neurociência e da biologia moderna, ele aborda que

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Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

“a tentativa contínua de conseguir um estado de vida equilibrado é um aspecto


profundo e definidor da nossa existência”. A palavra equilibrada aqui merece
destaque, pois todos os organismos vivos buscam o equilíbrio para manter suas
estruturas e funcionamento e sobreviver.

Figura 1 – Esquema representativo da homeostasia

Fonte: Tortora e Grabowski (2002. p. 7).

Esquema representativo da homeostasia quando esta é


perturbada por algum estímulo, como exemplificado no texto, que
pode ser a temperatura corporal.

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Neurofisiologia

Para Espinosa (apud DAMÁSIO, 2004, p.44) “cada coisa na medida do seu
poder, esforça-se por perseverar no seu ser e o esforço pelo qual cada coisa
tende a perseverar no seu ser nada mais é o do que a essência desta coisa”. As
emoções, neste sentido, nada mais são do que ajustes que o organismo promove
para manter a coesão das suas estruturas e funções. O aluno irrequieto, que
chama a atenção dos colegas e do professor com comportamentos inadequados
para a aula pode estar com problemas de relacionamento em casa. Sempre
lembro dos alunos hiperativos nestes casos, como uma área do cerebelo
responsável pela postura corporal e pela regulação da motivação denominada
vermis é reduzida na maioria dos casos (CASTELLANOS et.al., 2001), o aluno
fica se movendo constantemente na cadeira; senta, levanta, senta, deita por
vezes, pois seu cérebro manda comandos para o corpo ajustar a postura o tempo
todo, mesmo que esteja na posição adequada, uma dissonância entre o que o
corpo vive e aquilo que o cérebro acusa que o corpo vive.

As emoções constituem exemplos interessantes de como regulam os


processos homeostáticos. Geralmente, eventos que provocam emoções positivas
levam a um turbilhão de pensamentos que passam rapidamente em nossas
mentes, sem nos determos em um particular. Por outro lado, pensamentos
eliciados por emoções negativas são “ruminados” por longos períodos e nos
detemos demoradamente neles. Qual o valor adaptativo desta diferença?

Emoções positivas como felicidade, gratidão e bem estar são importantes


em nossas vidas, mas os estímulos que eliciam tais emoções não diminuem
nossa expectativa de vida ou saúde; então, não há necessidade de se deter em
solucionar problemas imediatos. Emoções negativas como nojo, tristeza, raiva,
medos e culpas estão imediatamente relacionados com a diminuição
do nosso sucesso, e, portanto, os pensamentos relacionados a
O aluno que estas emoções devem ser processados em nossas mentes de forma
entra na creche contínua, até termos certeza de que a ameaça passou ou o problema
deveria receber foi superado (DAMÁSIO, 2004).
uma caderneta
de relatos de Sentimos nojo daquilo que possa nos causar doenças como as
professores, fezes, que podem conter parasitas perigosos; o medo pode fazer com
coordenadores que sejamos mais cautelosos com relação a situações de perigo; a
pedagógicos gratidão pode fazer com que eu atue de forma altruísta com relação
e pais sobre a alguém, que num momento de necessidade me estendeu a mão
alterações ou que poderá me auxiliar em carências futuras. É de se esperar e
no peso, avaliar, portanto, o conjunto de emoções e situações em que o aluno
crescimento, o está inserido de forma a compreender na sua totalidade as respostas
desenvolvimento comportamentais oferecidas nos ambientes de aprendizagem, bem
psicomotor e da como sua história de vida.
linguagem.

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Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

Isso reflete um outro problema do ambiente educacional: a descontinuidade


e carência de informações do histórico escolar do aluno. O aluno que entra na
creche deveria receber uma caderneta de relatos de professores, coordenadores
pedagógicos e pais sobre alterações no peso, crescimento, o desenvolvimento
psicomotor e da linguagem, eventos de agressões, bem como amostras de
trabalhos escolares, de maneira semelhante às cadernetas de saúde e vacinações
oferecidas pelas secretarias de saúde. Muito do que é diagnosticado por médicos,
psicólogos e psicopedagogos poderia ter outra interpretação com base no histórico
do aluno. Um exemplo é o alarmante número de casos de hiperatividade, muitas
vezes erroneamente diagnosticados. O que é um comportamento impulsivo ou
eventos de depressão circunstancial ocasionado pela separação dos pais ou pela
perda de um ente querido, poderia ser resolvido de maneira alternativa àquela
proposta pela administração de fármacos. Este relatório poderia acompanhar
o aluno ao longo da sua vida, auxiliando no diagnóstico precoce correto e no
tratamento adequado de transtornos, principalmente na adolescência, momento
crítico de alterações no sistema nervoso, bem diferente daquele histórico escolar
contendo apenas as médias anuais do aluno, em determinadas disciplinas ou seu
desempenho em algumas habilidades e tarefas.

Atividade de Estudos:

1) Conceitue homeostasia e represente graficamente um exemplo


desse processo.
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Neurofisiologia

RelaçÕes Entre o Herdado e o


AdQuirido na Aprendizagem
Quanto do que aprendemos pode ser determinado por fatores biológicos
herdados de nossos pais; e quanto disso, pode ser delegado a fatores culturais,
sociais, às contingências da vida? Por muito tempo, antropólogos, sociólogos,
biólogos e historiadores se debateram neste paradigma, em uma discussão
controvérsia, rica em vieses, posições pessoais, defesas de ideologias. Vamos
procurar elucidar um pouco os contextos biológicos do nosso comportamento.

Pense na imagem de um bebê. Quais as primeiras sensações e pensamentos


lhe vêm à mente? Geralmente, emoções de alegria, ternura, encantamento e
uma necessidade incrível de proteção são eliciados como resposta ao bebê em
indivíduos de todas as idades e em todas as culturas. Será que estes comportamentos
são aprendidos no processo cultural ou determinados pelo funcionamento de nossas
estruturas nervosas e endócrinas?

Podemos pensar da seguinte forma: aqueles comportamentos


que são fundamentais para a sobrevivência do indivíduo ou de sua
prole serão determinados em primeira mão por fenômenos biológicos,
pois o organismo não poderá esperar que o contexto sócio-cultural
lhe proporcione o aprendizado pelo custo que isso acarretaria a
sua vida; outros comportamentos que possibilitam respostas mais
flexíveis e de menor relevância para a sobrevivência, ou que podem
aguardar do indivíduo um aprendizado no seu convívio com outros
apresentam menor determinação biológica.

Cuidar dos filhotes constitui uma rede de comportamentos complexos, é


de se esperar que alguns destes necessitem de aprendizado social, no entanto,
algumas respostas devem estar pré-programadas nas redes neurais. Existe um
gene denominado Fos β que é expresso no hipotálamo (área do cérebro que
controla todas as glândulas do corpo e os comportamentos motivados como
comer, beber, dormir, transar e cuidar dos filhotes), este gene, quando inativo
para a produção da proteína funcional Fos β, em camundongos geneticamente
modificados, produz um comportamento de indiferença aos estímulos olfatórios,
sonoros ou táteis advindos dos filhotes. Mães camundongos com duas cópias
inativas do gene não respondem prontamente aos chamados sonoros dos seus
filhotes quando eles estão fora do ninho, não apresentando a responsividade

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Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

materna ao chamado dos filhotes e não recuperando os mesmos para o ninho


(BROWN et. al., 1996).

A visão de filhotes e bebês invariavelmente, causa sentimentos de ternura


e encantamento em pessoas de praticamente todas as idades, basta você
agora, pensar em um gatinho ou cachorrinho brincando, ou na imagem de um
bebê engatinhando ou sorrindo. Estes sentimentos baseiam-se em sistemas
e processos inatos, a partir de mecanismos desencadeadores, como os
movimentos bruscos e repetitivos tão graciosos dos infantes de todas as espécies
de mamíferos. Outras características desencadeadoras são o tamanho maior
da cabeça em relação ao tronco, o crânio com a fronte arredondada e saliente,
olhos grandes situados abaixo da linha médio do crânio, extremidades curtas,
rechonchudas e arredondadas, bochechas salientes e nariz pequeno. Este
conjunto de características comuns a filhotes de todas as espécies, ao menos
de mamíferos e aves, foram selecionados ao longo da evolução, em conjunto
com áreas do cérebro para reconhecer estas características como eliciadores
do cuidado e proteção aos filhotes, num mecanismo coevolutivo para garantir a
sobrevivência dos genes dos organismos portadores destas características.

Pensar em termos evolutivos pode facilitar nosso entendimento das diferenças


de gênero, da sexualidade, do desenvolvimento e comportamento diferencial
de meninos e meninas nos seus ambientes de aprendizado. Devemos levar em
conta mais uma vez o ambiente ancestral primitivo no qual cérebros de homens
e mulheres evoluíram de forma diferente, pois utilizam estratégias reprodutivas
diferentes. Estes traços genéticos ao longo do tempo ficam marcados em fatores
ditos culturais. Exemplo disso são os inúmeros tabus em nossas sociedades. O tabu
do incesto (relação sexual entre parentes consanguíneos, afins ou adotivos) evitaria
acasalamentos consanguíneos e diminuiria a incidência de genes deletérios em
duplicata (problemas congênitos que precisam de cópias de genes tanto do macho
quanto da fêmea para expressarem suas características). Evitar relações
incestuosas aumentaria a sobrevivência e as chances de reprodução
dos filhotes e muitas espécies animais apresentam estratégias para Cérebros de
evitar o endocruzamento, seja por meio da dispersão (filhotes quando homens e
amadurecem se deslocam para longe do seu grupo social de origem, mulheres foram
formando novos bandos) ou por mecanismos de reconhecimento como projetados pelo
ferormônios, assinaturas vocais e comportamentos. processo de
seleção natural e
As sociedades humanas primitivas estavam organizadas de as consequências
maneira semelhante àquelas encontradas, ainda hoje, no alto Xingu disso, nas
ou na Amazônia; sociedades de caçadores e coletoras, com divisão habilidades e
sexual do trabalho, nas quais as mulheres ficavam próximas às áreas comportamentos
dormitórios e estavam responsáveis pelo cuidado com as crias e atuais de meninos
com a coleta de frutos, brotos e sementes; enquanto os homens se e meninas.

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Neurofisiologia

deslocavam a grandes distâncias e eram responsáveis pela caça (suprimento


protéico) e defesa do território. A partir desta organização podemos pressupor
diferentes maneiras pelas quais cérebros de homens e mulheres foram projetados
pelo processo de seleção natural e as consequências disso, nas habilidades e
comportamentos atuais de meninos e meninas.

Estudo mostrando preferências por brinquedos ditos “masculinos” como


bolas e carrinhos e brinquedos ditos “femininos” como bonecas e panelas foram
conduzidos com primatas não humanos pelas pesquisadoras Alexander e Hindes
(2002). Elas usaram macacos vervets (Cercopithecus aethiops sabaeus) em
experimento em que machos e fêmeas eram submetidos a duas categorias de
objetos para brincarem: brinquedos ditos “masculinos” e “femininos”. Importante
destacar que esses animais não são submetidos à estimulação precoce, que
reforce preferência por brinquedo, e muito menos, eles podem apresentar um
entendimento de suas identidades de gêneros, apenas podemos dizer que tais
preferências evidenciam que cérebros de primatas desenvolveram sistemas de
reconhecimento especializados para categorias de objetos que tenham valor
adaptativo, como expressões faciais das emoções. No estudo, “meninos” vervet
despenderam mais tempo com bolas e carrinhos de polícia. Este tipo de objeto
quando tirado da inércia apresenta um padrão de deslocamento muito semelhante
ao de uma caça. Quando olhamos um grupo de meninos atrás de uma bola e nos
remetemos a um ambiente de caça a uma lebre podemos pensar que a caçada
e a partida de futebol partilham de contextos semelhantes. Por este motivo
também, os meninos são mais hábeis na leitura de mapas e em habilidades que
requerem noções espaciais e justificamos porque as escolas de engenharia têm
proporcionalmente maior número de alunos do sexo masculino. As “meninas”
vervets permaneceram mais tempo em contato com brinquedos ditos “femininos”
como bonecas e panelas. É uma obviedade a preferência por bonecas e justifica
o fato de as mulheres apresentarem estruturas cognitivas mais desenvolvidas
para a linguagem (mulheres se comunicam mais e melhor que homens em geral)
e serem mais sensíveis a organismos potencialmente nocivos a filhotes como
baratas e ratos. As panelas parecem menos óbvias na preferência de vervets
fêmeas, mas panelas são ótimos recipientes para armazenar alimentos pequenos
como sementes, frutos e brotos.

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Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

Figura 2 – Macacos vervet com brinquedos “masculinos” e “femininos”

Fonte: Alexander e Hines (2002, p. 23).

Atividade de Estudos:

1) Apresente um exemplo de comportamento que pode ser


aprendido culturalmente, mas que pode ser eliciado pelos genes,
ou seja, de forma inata:
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Pelos exemplos e abordagens descritas, devemos ressaltar alguns aspectos


inerentes à aprendizagem e seus diferentes contextos explicativos. Podemos
dizer que o paradigma inato versus aprendido, cultural versus genético, está
ultrapassado.

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Neurofisiologia

Genes não são expressos no vácuo, nem tampouco determinam


comportamentos, os genes são responsáveis pela produção de
proteínas, que são os blocos de construção e de regulação do
metabolismo dos organismos vivos. Proteínas, por sua vez, podem
estruturar áreas do cérebro e regular o metabolismo de tal forma,
que estaremos aptos ou não, a desempenhar certos papéis e
apresentarmos determinadas preferências.

A influência dos hormônios masculinizantes (androgênicos como a


testosterona) e feminilizantes (estrógenos) durante o desenvolvimento perinatal
e a adolescência podem modificar áreas específicas do cérebro e nos habilitar
e proporcionar comportamentos característicos da identidade do gênero ao qual
pertencemos. Comportamentos ditos femininos, podem ser manifestados por
meninos sem que estes apresentem preferências sexuais por outros meninos. De
forma inversa, meninos podem apresentar preferências sexuais por outros meninos
sem que deixem suas características cognitivas gerais próprias de meninos. Um
problema bastante comum nos ambientes educacionais é a necessidade de
enquadramento das crianças em determinados tipos estereotipados. Um exemplo
bastante comum vem dos grandes escritores. Cérebros femininos são mais hábeis
para a linguagem, talvez por isso, tenhamos mais professoras de Letras a homens
lecionando nesta área, e mesmo as escolas de Letras têm em suas fileiras na
maioria mulheres. Como explicar gênios da literatura fazendo descrições tão
precisas inclusive de personagens femininos, como explicar Machado de Assis
na sua descrição da personalidade da Capitu em “Dom Casmurro”, ou ainda,
João Ubaldo Ribeiro em seu livro “A casa dos Budas ditosos” que descreve as
experiências devassas de uma vida inteira de uma senhora? Há um grande erro
em colocarmos rótulos em nossos alunos a partir de falsas suposições do que
deveria ser seu comportamento em relação ao seu gênero.

Apesar da maneira como nossos cérebros foram estruturados, a partir de


nossa origem evolutiva e das influências genéticas e hormonais que determinam
nosso comportamento, o cérebro humano é muito versátil e plástico, e pode sofrer
modificações significativas quando submetido à aprendizagem e experiências.
Vamos trabalhar melhor este tópico adiante no texto, quando discutirmos sobre
neuroplasticidade. De maneira geral, mesmo que tenhamos algumas preferências
inatas, podemos aprender habilidades, gostos e valores, inclusive contrários
aqueles aos quais somos predispostos desde que tenhamos motivação,
estímulos e treino adequado. Um exemplo contundente e simples é a conduta
homossexual de muitos indivíduos submetidos ao cárcere ou em qualquer evento

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Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

com ausência de pessoas do sexo oposto. Algumas pessoas podem se submeter


ao homossexualidade mesmo sem ter condutas inatas para isso, ou mesmo sem
nunca ter manifestado preferências por um relacionamento sexual com outras
pessoas do mesmo sexo, simplesmente porque a cópula e o sexo fazem parte do
repertório comportamental de nossa espécie, mas apresenta outras funções que
não a reprodutiva. Muitos animais apresentam relações homossexuais como parte
do aumento no vínculo social entre os indivíduos – se faço sexo com você, sou
seu amigo e parceiro, logo poderemos contar um com o outro. Em praticamente
todas as espécies de mamíferos sociais estudadas temos registros de eventos
de homossexualidade entre indivíduos próximos. O importante, como veremos
ao longo do texto, é que o educador esteja atento às preferências e aptidões de
meninos e meninas para auxiliar no seu desenvolvimento, não gerando frustrações
ou dúvidas desnecessárias ao seu aprimoramento.

Atividade de Estudos:

1) Quais estímulos do meio (de convivência) poderiam eliciar o


comportamento homossexual e como estes responderiam a uma
orientação sexual de caráter inato?
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HistÓrico de Nossas Ideias SoBre a


Mente, CÉreBro e Aprendizagem
A ideia de como a mente funciona e sua origem orgânica no cérebro data de
tempos muito remotos. Todos nós temos de certa forma, uma psicologia intuitiva,
ou seja, temos uma maneira de intuir sobre pensamentos, emoções, sentimentos e
prever ações tanto de nós próprios quanto de outros, no que chamamos de “Teoria

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Neurofisiologia

da Mente”. Nem sempre aquilo que nós pretendemos ser, está de acordo com o
que somos, em um processo denominado “dissonância cognitiva” (GAZZANIGA;
HEATHERTON, 2005). Em neurociências temos um jargão que dizemos sobre
a mente: existem ao menos três tipos de mentes que lutam o tempo todo dentro
de nós para ser a mais relevante, aquilo que nós pensamos ser, aquilo que nós
gostaríamos de ser e aquilo que nós realmente, somos.

Para ilustrar estes processos basta pensarmos que colocamos a mão em


nossas cabeças, na fronte, quando precisamos tomar uma decisão, exatamente
o local do córtex pré-frontal, área de tomada de decisões, de planejamento,
o cérebro executivo. Outra maneira de ilustrar a questão vem dos homens do
neolítico. Um crânio humano submetido a uma trepanação (orifícios e perfurações
na caixa craniana) encontrado na Dinamarca e datando de 7000 a. C. indica que
os povos do neolítico já sabiam de alguma forma a existência e importância do
cérebro para a fisiologia e o comportamento humano, este crânio apresentava
as bordas do orifício cicatrizadas, o que indica que o indivíduo sobreviveu muitos
anos após a cirurgia (CLOWER; FINGER, 2001). No “Papiro cirúrgico de Edwin
Smith” escrito no Egito antigo, Século XVII a. C. temos anotações sobre 30 casos
clínicos de traumas cranioencefálicos e medular relacionando lesões cerebrais a
disfunções de diversas partes do corpo, ou ainda, mudanças de comportamento
e humor como hemiplegias, paralisias, incontinências urinárias (FINGER, 1994).

Figura 3 – Crânio encontrado em sítio asteca submetido à trepanação

Fonte: Clower e Finger (2001, p. 1417).

A neurociência tem reforçado a ideia inicialmente proposta por Hipócrates


(460-379 a. C.) de que o estudo adequado da mente começa pelo entendimento
de como o cérebro funciona. Ou seja,

Deveria ser sabido que ele é a fonte do nosso prazer,


alegria, riso e diversão, assim como nosso pesar, dor,
22
Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

ansiedade e lágrimas, e nenhum outro que não o cérebro.


É especificamente o órgão que nos habilita a pensar, ver e
ouvir, a distingüir o feio do belo, o mau do bom, o prazer do
desprazer. É o cérebro também que é a sede da loucura e
do delírio, dos medos e sustos que nos tomam, muitas vezes
à noite, mas ás vezes também de dia; é onde jaz a causa
da insônia e do sonambulismo, dos pensamentos que não
ocorrerão, deveres esquecidos e excentricidades (FINGER,
1994, p. 13).

Aristóteles divergiu erroneamente deste ponto de vista, afirmando que


o coração era a sede da mente e que o cérebro funcionava apenas como um
refrigerador para o sangue (Teoria do Radiador). No final, ele afirmava que ao
menos as emoções teriam sua fonte no coração, de onde deriva o símbolo do
amor; um coração, que na realidade, é ativado em sua função simpática pelo nervo
Vago, nervo que controle as vísceras e é ativado por núcleos no encéfalo.

Galeno (130 – 200 d. C.) e posteriormente Nemésio (320 d. C.) desenvolveram


a ideia de que os ventrículos seriam os responsáveis pelas operações mentais,
da sensação à memorização e durante toda a idade média a noção de que nos
ventrículos circulavam os espíritos, favorecidos pela igreja católica, predominou
do Renascimento até a ideia apresentada anteriormente, de um modelo
hidráulico para o funcionamento da mente, desenvolvida por Descartes (1596 -
1650), que acreditava que o “espírito animal” fluía pelo corpo a ativar e regular
o comportamento e as ações, sendo que a ausência, ou pouca atividade dos
espíritos, poderia induzir ao sono. Apenas no século XIX, com a elucidação da
Teoria Celular por Theodor Schwann e os trabalhos pioneiros de coloração e
descrição das células nervosas, respectivamente, por Camilo Golgi e Santiago
Ramón y Cajal é que foi possível uma ideia mais acurada sobre a estruturação e o
funcionamento do tecido nervoso (FINGER, 1994).

Ainda no século XIX, a escola Frenologista (freno do latin significa alma)


começa a ganhar destaque no entendimento do sistema nervoso, principalmente
pelas correlações feitas entre lesões no cérebro e problemas relacionados ao
aprendizado, ao comportamento e memória. A escola frenologista realizava
medições no crânio em busca de respostas para o funcionamento do cérebro,
mas foi longe demais ao validar preconceitos raciais e de gêneros, necessários
para dar fôlego à indústria escravagista e a supremacia masculina caucasóide da
época (GOULD, 1991). Foi desenvolvido um mapa cognitivo do cérebro (figura 4)
e uma máquina frenológica, que mensurava a atividade encefálica.

Mas, como em realidade funciona o cérebro e de forma consequente, a


mente?

Uma primeira abordagem veio dos primeiros mecanismos de computação,


e as ideias de uma mente-esponja e uma mente-computador foram utilizadas
23
Neurofisiologia

até meados do século XX, e ainda hoje, faz-se analogias entre computadores
e cérebros. Será que é uma boa analogia? Diferentemente das máquinas de
computar, nossos processadores biológicos, são ao mesmo tempo, sequenciais
e paralelos; e, com exceção de algumas áreas da memória, não processamos
informações em matrizes binárias do tipo 0 -1. Além disso, nossas mentes podem
criar coisas que não existem no mundo real, computadores só podem criar coisas
para quais foram programados. A mente pensa, cria e imagina, os computadores
são apenas executores de uma tarefa.

Figura 4 – Mapa frenológico das principais capacidades cognitivas e suas localizações

Fonte: Kandel, Schwartz e Jessell (2003, p. 7).

Posteriormente, em 1992, Leda Cosmides e John Tooby desenvolveram


uma noção bastante diferente de como a mente funciona, eles fizeram analogia
com um canivete Suíço, a partir de determinados problemas que o organismo
enfrentava eles poderiam sacar de ferramentas específica contida no canivete
para resolução do dado problema (COSMIDES; TOOBY, 1992). A mente do tipo
canivete Suíço foi uma variação da concepção de mente muito em voga na década
de 1980 que era a mente modular. Neste modelo, a mente apresentava entradas
sensoriais, áreas de memória e percepção, e saídas motoras, subdivididas em
módulos com funções bastante específicas, uma variação do funcionamento da
mente frenologista bastante aceita ainda hoje.

24
Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

Em seu livro “A pré-história da mente: uma busca das origens da arte, da


religião e da ciência”, Steven Mithen faz um relato arqueológico do funcionamento
da mente, avaliando as origens evolutivas do cérebro humano, suas adaptações
e modificações e nos conduzindo a uma busca sobre como pensamos sobre a
mente (MITHEN, 2002). Este trabalho aponta para uma mente do tipo “capela”.
O modelo baseia-se nas catedrais romanescas que apresentavam uma grande
nave principal, e pequenas naves laterais. A nave central seria uma nave das
faculdades, habilidades e inteligências gerais e as naves menores, laterais,
seriam as inteligências especializadas do cérebro. À medida que o organismo
se desenvolve e é exposto a experiências e aprendizagens e com base na
sua constituição herdada estas inteligências, habilidades e faculdades se
desenvolveriam ocupando os espaços da inteligência geral, produzindo uma
supercapela, denominado “módulo da meta-representação” (MITHEN, 2002).

Figura 5 – A mente do tipo capela e as fases de desenvolvimento dos planos arquitetônicos

Fonte: Mithen (2002, p. 32). 25


Neurofisiologia

Atividade de Estudos:

1) Faça uma correlação entre a mente do tipo capela de Mithen e


a “Teoria das inteligências múltiplas” de Howard Gardner (1993)
que divide as inteligências em sete tipos básicos:
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
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____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

Algumas ConsideraçÕes
O aluno pode observar, ao longo do capítulo, que existem alguns princípios
norteadores do comportamento dos organismos, estes princípios não devem
ser vistos como regras ou leis, mas como norteadores de um determinado
comportamento dependente dos contextos. Um destes princípios é a necessidade
de regulação constante do organismo para que o mesmo não venha a perecer, ele
e seus genes e descendentes.

Outro ponto importante do capítulo é a função dos genes. Estes não


regulam imediatamente o organismo, mas produzem substâncias (as proteínas)
que formam a estrutura básica (por exemplo, na síndrome do X-frágil, que há

26
Capítulo 1 VIDA E APRENDIZAGEM

um bloqueio na expressão de um gene que produz uma proteína reguladora do


desenvolvimento neural). Se estas proteínas, ou blocos de construção não forem
expressos de maneira correta e no local correto, acarretará mudanças que podem
ser positivas ou nocivas ao indivíduo. Se positivas, os organismos sobrevivem
e deixam filhos com esta característica (observação: a característica poderá
ou não ser herdada pelos filhotes), se negativa, os organismos perecem, e tais
características (genes) perecem com ele.

ReFerências
ALEXANDER, Gerianne M.; HINES, Melissa. Sex differences in response
to children’s toys in nonhuman primates (Cercopithecus aethiops sabaeus).
Evolution And Human Behavior, n. 23, p.467-479, 2002.

BROWN, J.; BRONSON, R.; DIKKES, P.; GREENBERG, M. A defect in nurturing


in mice lacking the immediate early gene Fos β. Cell, n. 86, p. 1-20, 1996.

CASTELLANOS, F. Xavier; GIEDD, Jay N.; BERQUIN, Patrick C.; WALTER,


James M.; SHARP, Wendy; TRAN, Thanhlan; VAITUZIS, A. Catherine;
BLUMENTHAL, Jonathan D.; NELSON, Jean; BASTAIN, Theresa M.;
ZIJDENBOS, Alex; EVANS, Alan C.; RAPPOPORT, Judith L. Quantitative Brain
Magnetic Resonance Imaging in Girls With Attention-Deficit/Hyperactivity
Disorder. Arch Gen Psychiatr, n. 58, p. 289-295, 2001.

CLOWER, W.T.; FINGER S. Discovering trepanation: the contribution of Paul


Broca. Neurosurgery 49(6):1417-25, 2001.

COSMIDES, Leda; TOOBY, John. Cognitive adaptations for social exchange.


In: BARKOW, J. H., COSMIDES, L., TOOBY, J. The adapted mind. New York:
Oxford University Press, 1992. p.163-280.

DAMÁSIO, António. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos


sentimentos. São Paulo: Companhia das Letras, 2004.

FINGER, Stanley. Origins of Neuroscience: a History of explorations into Brain


Function. New York, Oxford University Press, 1994.

GARDNER, Howard. Frames of Mind: The Theory of Multiple Intelligences. New


York: Basic Books, 1993.

GAZZANIGA S. Michael; HEATHERTON, Tead. F. Ciência Psicológica: mente,

27
Neurofisiologia

cérebro e comportamento. 2ª imp. rev. Porto Alegre: ArtMed, 2005.

GOULD, Stepen J. A falsa medida do homem. São Paulo: Martins Fontes,


1991.

HIPOCRATES. Aforismos. São Paulo: Martin Claret, 2003.

KANDEL, Eric ; SCHWARTZ, James ; JESSELL, Thomas. Princípios da


neurociência. São Paulo: Manole, 2003.

MITHEN, Steven. A pré-história da mente: uma busca das origens da arte,


religião e da ciência. São Paulo: Editora UNESP, 2002.

TORTORA, G. J.; GRABOWSKI, S. R. Princípios de anatomia e fisiologia. Rio


de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2002.

28
C APÍTULO 2
Tecido Nervoso e Neuroplasticidade

A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Determinar os princípios básicos de neurotransmissão e as unidades básicas


do sistema nervoso, aspectos nutricionais, estimulação e como os neurônios
se transformam.

 Conhecer os conceitos de neurotransmissão, sistemas de neurotransmissores


e relação com psicofármacos, nutrientes e estímulos.

 Construir um modelo teórico-prático de funcionamento do tecido nervoso e


como este se transforma.
Neurofisiologia

30
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

ConteXtualização
No capítulo anterior discutimos as bases biológicas do comportamento
e do aprendizado, bem como os conceitos elementares em genética do
comportamento. Dissemos que os genes decodificam a produção das proteínas.
As proteínas são os blocos de construção das células, e o conjunto de células
em uma determinada área pode determinar como aquele organismo irá se
comportar frente a determinadas circunstâncias. Vamos agora ver como ocorre
esta organização celular e sua importância no aprendizado.

Este capítulo tem por finalidade apresentar ao aluno o funcionamento do


tecido nervoso, a estrutura dos diferentes tipos de células nervosas e sua relação
com as demais células do tecido nervoso. As células nervosas são as unidades
elementares que atuam na elaboração do comportamento, das sensações, da
percepção e das emoções, compreendê-las significa um importante passo no
entendimento da aprendizagem. Todas as modificações que ocorrem durante a
aprendizagem, ocorrem em um primeiro momento nestas células, em um processo
denominado neuroplasticidade, veremos aqui, como ocorrem as modificações no
número de células, bem como, no número de conexões entre elas. Estes saberes se
inserem no processo educacional de maneira que o educador e os administradores
educacionais possam elaborar estratégias para facilitar a aprendizagem, bem como
contribuir de forma marcante e crítica, na elaboração dos cardápios da merenda
escolar, na administração de psicofármacos e nas diferentes alternativas de
estimulação neural. Enfim, este capítulo complementa as ideas apresentadas no
capítulo anterior e serve de aporte para os capítulos subsequentes.

Estrutura e Funcionamento das


CÉlulas do Sistema Nervoso
As células nervosas surgiram primeiramente na história evolutiva nos
cnidários, que são representados atualmente por águas vivas e pólipos de corais
(anêmonas), devido ao fato de o corpo destes animais serem multicelulares e
apresentarem muitos estratos ou camadas diferentes, as células nervosas difusas
destes organismos faziam a comunicação entre os diferentes estratos do corpo
do mesmo. Então, estas células apresentam a importante função de transmitir
informação na forma de impulsos nervosos de uma região do corpo a outra de
maneira a integrar as suas diferentes estruturas. Neste sentido, no organismo
humano, temos basicamente três sistemas de integração: o sistema nervoso, o
sistema imune e o sistema endócrino. O sistema circulatório também poderia ser
pensado como um sistema integrador, por ser através dele que os três outros se
comunicam e são nutridos.

31
Neurofisiologia

Basicamente uma célula nervosa é composta de quatro partes principais:

Os dendritos: são as portas de entradas de estímulos na célula, estímulos


estes que podem vir de células sensoriais na retina, na pele ou no epitélio olfatório
no nariz, das células do ouvido interno ou ainda das papilas gustativas localizadas
na língua, ou podem vir de outras células dos sistemas nervoso, imune ou endócrino.

O corpo celular: onde encontramos o núcleo e os principais componentes


celulares. Tem importante função na fabricação das moléculas comunicantes do
sistema, bem como na tomada de decisões da célula neural, de seguir transmitindo
o impulso ou de bloquear o mesmo.

O axônio: é o fio condutor de estímulos até o próximo neurônio ou ainda até


uma célula muscular, o axônio é único, mas pode se ramificar em centenas de
milhares de botões terminais e estar conectado a 10.000 ou até 100.000 outras
sinápses (figura 6).

Fendas sinápticas: são os espaços nos quais as células neurais se


comunicam umas com as outras; são estreitas conexões entre os botões terminais
pré-sinápticos dos axônios e os botões pós-sinápticos geralmente localizados nos
prolongamentos de dendritos e nos corpos dos neurônios comunicantes. Neste
local são liberados pelo neurônio pré-sináptico os neurotransmissores que irão
atuar nas membranas plasmáticas pós-sinápticas.

Figura 6 – Neurônio contendo suas principais estruturas citoplasmáticas

Fonte: Carlson (2002, p. 28).

32
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

A primeira estrutura a ser estudada é a membrana plasmática (figura 7), uma


fina camada dupla de fosfolipídios (moléculas contendo ácidos graxos e fósforo)
com proteínas submersas na bicamada. Estas proteínas apresentam as mais
variadas funções, dentre as quais podemos destacar a formação de canais para
a entrada e saída de substâncias ao longo da célula, bem como, estruturas de
adesão e de transporte. A membrana plasmática delimita a célula e decide o que
entra e sai da mesma. Este fluxo depende, em muito, do que a célula carece, do
que ela apresenta em excesso ou do papel que ela precisa representar; mas,
ocorre basicamente a partir de um equilíbrio de forças e partículas dissolvidas
em água dentro e fora das células. Neste sentido, dizemos que a mesma é semi-
permeável ou de permeabilidade seletiva, ou seja, permite a passagem livre de
substâncias como água e alguns íons e seleciona, ao menos momentaneamente,
a passagem de outros íons e substâncias. Íons são partículas com carga positiva
(cátions) e cargas negativas (ânions). As partículas (átomos ou moléculas) com a
mesma carga se repelem e partículas de cargas contrárias se atraem. A atração
ou repulsão das partículas gera uma força denominada pressão eletrostática.
Tal como a força de difusão, força que move as partículas das áreas de alta
concentração para as de baixa concentração, a pressão eletrostática empurra
cátions para longe de regiões com excesso de cátions e ânions sendo empurrados
para longe de regiões com excesso de ânions. A presença de cargas negativas e
positivas dentro e fora das células faz com que a membrana plasmática apresente
o potencial de membrana, ou seja, a carga elétrica ou diferença de potencial
elétrico entre o interior e o exterior da célula.

Membrana polarizada: quando a quantidade de cargas


elétricas negativas está mais concentrada dentro da célula e as
cargas positivas em maior concentração fora da célula.

Membrana despolarizada: devido a abertura de canais iônicos,


íons positivos (cátions) entram na célula, deixando seu interior
positivo e seu exterior negativo.

Membrana repolarizada: após um potencial de ação, a bomba


de sódio e potássio restabelece o equilíbrio, diminuindo a quantidade
de cargas positivas dentro da célula.

Membrana hiperpolarizada: devido a abertura de canais


iônicos que permitem a entrada de íons negativos, a cargas negativas
no interior da célula ficam intensificadas.

33
Neurofisiologia

Dizemos que a membrana está polarizada quando apresenta


Dizemos que
cargas negativas em mais alta concentração no interior da célula e
a membrana
cargas positivas em maior concentração fora da célula. Existe um limiar
está polarizada
para isso, ou seja, um ponto estabelecido nesta diferença de carga
quando apresenta
que é de 70 mV (milivolts, ou milésimo de volts) aproximadamente.
cargas negativas
Quando o interior da célula está carregado em -70 mV, a membrana
em mais alta
está em repouso. Se alguma perturbação (impulso elétrico seguido pela
concentração no
liberação de estímulos químicos como neurotransmissores) altera este
interior da célula
equilíbrio permitindo a entrada de íons positivos deixa a membrana
e cargas positivas
despolarizada (um potencial excitatório) quando permite a entrada de
em maior
mais íons negativos dizemos que a membrana está hiperpolarizada
concentração fora
(um potencial inibitório). As alterações de permeabilidade que resultam
da célula.
na alteração de potencial de membrana pós-sináptico denominamos de
PPS – Potencial Pós-Sináptico: os PEPS – Potenciais Excitatórios
Pós-Sinápticos ou PIPS – Potenciais Inibitórios Pós-Sinápticos.

Figura 7 – Estrutura geral da membrana plasmática

Fonte: Extraído e adaptado de Tortora Grabowski (2002, p. 54).

34
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

Figura 8 – Força de difusão e pressão eletrostática e a concentração


relativa de alguns íons dentro e fora da célula

Fonte: Extraído e adaptado de Carlson (2002, p. 43).

A figura 8 ilustra algumas forças importantes operando através da membrana


para produzir os potenciais de membrana. Como a vida nos seus primórdios
evoluiu no mar, o meio extracelular de nossas células lembra a água do mar, ou
seja, uma solução de sal (NaCl). Já destacamos que a membrana plasmática é
semipermeável ou de permeabilidade seletiva.

Seguindo o modelo explicativo adotado por Carlson (2002), abordaremos os


quatro principais íons envolvidos na neurotransmissão. A membrana plasmática
será impermeável aos ânions orgânicos (A-), moléculas orgânicas produzidas ou
assimiladas pela célula, estando estes restritos ao ambiente intracelular. O íon
potássio (K+) está em maior concentração dentro da célula e a força de difusão
tende a empurrá-lo para fora, no entanto, como o exterior da célula está carregado
positivamente, a pressão eletrostática tende a forçar os cátions para o interior e
as duas forças opostas se anulam. O íon cloro (Cl-) está em maior concentração
fora da célula e a força de difusão empurra o mesmo para dentro, mas como o
interior é negativamente carregado a pressão eletrostática força os ânions para
fora da célula e as forças também se equilibram. O íon sódio (Na+) também está
mais concentrado fora da célula e é empurrado para dentro da célula por força
de difusão, mas como o íon sódio é positivo a pressão eletrostática não impede
que o Na+ entre na célula e as cargas negativas do líquido intracelular atraem o
Na+. Como as concentrações de sódio pouco se alteram dentro da célula, pode
se supor que a membrana apresenta permeabilidade seletiva aos íons Na+.
Uma outra força, a bomba de sódio e potássio mantém o equilíbrio empurrando
continuamente o Na+ para fora da célula. A bomba de sódio e potássio ocorre
devido a presença de proteínas que funcionam como canais através da membrana
pelos quais estes íons podem passar; a cada dois íons K+ que são bombeados

35
Neurofisiologia

para dentro da célula, três íons Na+ são retirados. No entanto, elas
Existem inúmeros
necessitam de energia fornecida pela molécula ATP (adenosina tri-
modelos e
fosfato) que é uma molécula produzida pelas mitocôndrias a partir da
maneiras de
glicose e da respiração celular que fornece energia para muitos dos
explicar as
processos biológicos.
diferentes
estruturas e o
As células nervosas atuam por meio destas mudanças no potencial
funcionamento
de membrana disparando ou não, conduzindo informação ao longo
de uma célula, a
das redes que produzem ou inibindo estes circuitos. Vamos agora,
mais clássica é o
desvendar o caminho intercelular percorrido para traduzir os estímulos e
modelo de célula
produzir as respostas eletroquímicas necessárias à neurotransmissão.
do tipo “ovo
frito”, contendo
Existem inúmeros modelos e maneiras de explicar as diferentes
a membrana
estruturas e o funcionamento de uma célula, a mais clássica é o
plasmática, o
modelo de célula do tipo “ovo frito”, contendo a membrana plasmática,
citoplasma e o
o citoplasma e o núcleo. Além deste modelo ser muito simplório,
núcleo.
ele não faz jus à ideia que se tem de uma célula, apesar disso,
metáforas são necessárias para um bom entendimento de uma
célula e seu funcionamento. Aqui, usaremos deste recurso didático,
Modelo de célula
e apresentaremos um modelo de célula do tipo “padaria” na tentativa
do tipo “padaria”
de elucidar as diferentes características de uma célula nervosa. Este
tem a vantagem
modelo tem a vantagem de apresentar a célula de forma muito dinâmica,
de apresentar a
além de lúdico, claro. Quando pensamos em uma padaria devemos
célula de forma
imaginar os diferentes setores que a constituem: os fornecedores
muito dinâmica,
e os diferentes ingredientes para produzir as mais variadas tortas,
além de lúdico,
biscoitos, pães, cucas; o padeiro, imprescindível; as fontes de energia;
claro.
os distribuidores dos produtos, bem como, as estradas e ruas em que
circulam; e por último, os consumidores destes produtos. Estudar as
células e tecidos é um grande exercício de abstração.

Neurotransmissores: moléculas liberadas dos botões terminais


dos axônios nas fendas sinápticas que se ligam aos sítios ativos nos
canais de entrada de íons (canais iônicos) e que, como uma chave
em uma fechadura, abrem estes canais para a entrada dos íons.

Primeiramente, neurotransmissores são despejados na fenda sináptica, por


exemplo, a dopamina, substância envolvida no prazer e na recompensa, bem
como no controle da motricidade fina. Um dos núcleos produtores de dopamina
é a Área Tegmentar ventral (entende-se por núcleo adensamentos de corpos

36
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

de neurônios). Estes corpos de neurônios enviam seus axônios por meio de


feixes de fibras neurais (conjunto de axônios oriundos dos corpos dos neurônios
localizados nos núcleos ou no córtex encefálico) até outro núcleo localizado na
região frontal do cérebro denominada Núcleo Acumbente (figura 9). Esta área
é que decodifica as mensagens do corpo de que aquilo que está sendo feito é
algo prazeroso e não doloroso. Quando realizamos uma atividade prazerosa
como sexo, comer, atividades físicas, lúdicas ou quando consumimos drogas
excitatórias do sistema nervoso (cocaína, anfetaminas e derivados) a dopamina
produzida pelos neurônios da Área tegmentar ventral são liberados ao longo
do axônio e despejados na fenda sináptica do núcleo acumbente o que informa
para o cérebro de que a atividade é prazerosa a ativa um mecanismo chamado
Sistema de Recompensa, que reforça o comportamento executado. É o clássico
“de novo” que as crianças exibem em relação ao girar o corpo sobre o próprio
eixo, correr, brincar.

Figura 9 - Sistema de recompensa, em destaque a área


tegmentar ventral e núcleo acumbente

Fonte: Herculano-Houzel (2005, p. 97).

Os neurotransmissores, na fenda sináptica, ligam-se a receptores


nas membranas pós-sinápticas, estes receptores quando acionados pelo
neurotransmissor abrem pequenos canais para a passagem de íons denominados

37
Neurofisiologia

canais iônicos dependentes de neurotransmissor permitindo a entrada de


íons sódio e, posteriormente, de íons potássio. Esta entrada de cargas positivas
nos neurônios pós-sinápticos, quando em quantidade suficiente para gerar um
potencial de ação (de + 70 mV) promove uma cascata de eventos que culminará
em sinapses nos próximos neurônios da rede neural.

Um importante evento intracelular, devido à entrada de cargas positivas, que


despolarizam a membrana e gera um potencial de ação é a síntese protéica, via
inúmeras moléculas mensageiras, para ativar segmentos do DNA (os genes) que
decodificam peptídeos que são os precursores das proteínas.

Estas moléculas podem ser enzimas, precursoras dos neurotransmissores,


receptores pós-membrana e demais componentes necessários à
neurotransmissão. As moléculas sinalizadoras da síntese poderiam ser na
nossa metáfora da padaria os pedidos que chegam, sendo o DNA o grande
livro contendo as receitas necessárias ao funcionamento celular. Este DNA
(o material genético) é um livro muito grande e não pode passar pelos poros
da membrana que recobre o núcleo celular (carioteca), portanto, as receitas
devem ser copiadas em uma molécula menor denominada RNA mensageiro,
que é como um bilhetinho contendo a receita específica para a produção dos
peptídeos, ou seja, os precursores e enzimas necessários para produzir mais
neurotransmissor. Este bilhetinho chega até o padeiro, que em termos celulares
são os ribossomos, unidades que realizam a síntese de peptídeos (proteínas) e
que traduzem a linguagem dos ácidos nucléicos (DNA – ácido desoxirribonucléico
e RNA – ácido ribonucléico) na linguagem dos peptídeos que são sequências
de aminoácidos (são os diferentes ingredientes - farinha, ovos, fermento, água,
leite - ou blocos de construção dos peptídeos - os biscoitos, pães, tortas e bolos
da padaria). Estes ribossomos estão aderidos a um sistema de membranas
internas da célula, em regiões denominadas Retículo Endoplasmático Rugoso
(o aspecto rugoso é devido aos ribossomos aderidos na sua superfície), que
funcionam como o armazém da padaria e se comunicam com o Complexo de
Golgi (o sistema de empacotamento da padaria) e dele se desprendem vesículas
denominadas lisossomos (os pacotes contendo os biscoitos, pães, bolos, ou mais
exatamente, os diferentes tipos de peptídeos e proteínas). Muitas vezes, dois ou
mais lisossomos contendo diferentes substâncias (precursores como L-DOPA e a
enzima que transforma L-DOPA em dopamina – a dopa descarboxilase) se unem
para formar uma única vesícula contendo o neurotransmissor (a dopamina) e
que deverá ser conduzida até os botões terminais da próxima fenda sináptica. As
principais estruturas citoplasmáticas envolvidas no processo de neurotransmissão
no corpo celular estão resumidas na figura 10.

Antes de deslocarmos nossa explicação dos eventos que ocorrem no corpo


celular para os eventos que ocorrem ao longo do axônio e na fenda, poderíamos

38
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

destacar alguns pontos importantes. Todos os passos descritos ocorrem


concomitante e continuamente, mas, a geração de um potencial de ação faz
a roda girar, em um sistema denominado Lei do tudo ou nada: ou o neurônio
chega ao limiar de +70mv e dispara, propagando-se com a mesma amplitude
ao longo de todo o axônio, ou ele não dispara. Podemos nos perguntar, como
existem contrações musculares fortes e fracas se o mesmo mecanismo se aplica
na condução de estímulos ao longo do axônio até a fibra muscular? O que resulta
uma contração forte ou fraca dos músculos não é a intensidade com que o neurônio
dispara e sim a frequência de disparos ao longo de um axônio, sendo a Lei do
tudo ou nada suplementada pela Lei da frequência. Como os neurônios recebem
informações de centenas e até milhares de outros neurônios alguns podem
gerar potenciais excitatórios (deixando entrar íons positivos) e outros podem
enviar mensagens inibitórias (deixando entrar íons negativos e hiperpolarizando
a membrana), os potenciais inibitórios fazem com que o neurônio não dispare.
Esta diferença nas sinalizações que o corpo neuronal recebe provoca um evento
denominado Somação, ou seja, a soma das cargas positivas e negativas que
entram no neurônio (CARLSON, 2002).

Figura 10 – Principais estruturas citoplasmáticas encontradas em neurônio multipolar

Fonte: Carlson (2002, p. 31).

O local em que o axônio se liga ao corpo celular é denominado cone de


implantação do axônio, onde encontramos inúmeras mitocôndrias, as “baterias“
da célula que fornecem energia na forma de ATP, discutidas anteriormente. Elas

39
Neurofisiologia

fornecem energia à membrana do cone de implantação que passa a realizar


movimentos vibracionais que formam um campo elétrico ao longo do axônio. Este
disparo elétrico do potencial de ação se propaga ao longo do axônio, mas nos
locais em que há a bainha de mielina ele dá saltos, pois, entre um segmento de
bainha de mielina e outro, temos os nódulos de Ranvier, espaços sem mielina ao
longo do axônio onde encontramos novamente os canais iônicos e onde o impulso
eletromagnético pode ser renovado. Os canais iônicos dependentes de tensão
se abrem para a entrada de íons sódio e potássio nos nódulos de Ranvier devido
à descarga elétrica gerada, por isso, dependentes de tensão ou voltagem. Por
este motivo dizemos que a condução é Saltatória, o potencial de ação pula de um
nódulo ao outro diminuindo o atrito o que aumenta a velocidade da transmissão
de informação. Veremos adiante, que a mielinização axônica pode ocorrer graças
à estimulação e treino, sendo aspecto fundamental da aprendizagem.

Bainha de mielina: um mecanismo de isolamento elétrico ao


longo do axônio que facilita a passagem dos impulsos elétricos,
fazendo com que os mesmos deem saltos e sejam reforçados de
tempos em tempos nos nódulos de Ranvier (espaços sem mielina).
Um neurônio mais mielinizado fará com que a resposta neural seja
mais rápida e intensa, aumentando a velocidade do pensamento, da
resposta emocional ou motora.

A entrada e dispersão de íons positivos despolarizam a membrana não


revestida pela bainha de mielina (isolante elétrico) renovando e conduzindo
o potencial de ação ao longo do axônio até o botão terminal. A despolarização
da membrana promove o deslocamento dos lisossomos ao longo do axônio
por um sistema de microtúbulos que são as estradas que levam os produtos
da nossa padaria, por estas estradas deslocam-se moléculas carreadoras
denominadas cinesinas (cine = movimento) que transportam os lisossomos, como
os carros que transportam os produtos da padaria (figura 11). Quando o impulso
chega ao botão terminal pré-sináptico até a fenda sináptica subsequente e a
despolarização da membrana no botão terminal faz com que as vesículas liberem
os neurotransmissores na fenda, reiniciando o processo em outro neurônio.

40
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

Figura 11 – Cone de implantação e axônio, mostrando os nódulos


de Ranvier ao longo de sua extensão e no detalhe moléculas de
cinesina carreando as vesículas ao longo dos microtúbulos

Fonte: Carlson (2002, p. 33).

Após a passagem do impulso elétrico, a membrana tende a se repolarizar


graças à ação da bomba de sódio e potássio discutida anteriormente, que
recoloca as cargas positivas para fora da célula. Os impulsos podem ser da fração
de milisegundos e o conjunto de impulsos que percorrem uma fibra nervosa
(como vimos, um conjunto de axônios) é denominado ondas eletroencefálicas e
podem ser medidas em Hz (ondas/segundo) em um eletroencéfalograma, sendo
que as ondas equivalem aos potenciais de ação em mV. Estas ondas equivalem
às alterações do potencial de membrana como pode ser visualizado na figura 12.

41
Neurofisiologia

Figura 12 - Ondas eletroencefálicas em diferentes estágios de atividade cortical

Fonte: Cardoso (1997, p. 4).

Os neurotransmissores ou seus subprodutos, após a liberação na fenda


sináptica são recaptados/transportados de volta para o neurônio pré-sináptico,
este processo é importante para o restabelecimento da atividade sináptica e para
reciclagem das substâncias neurotransmissoras.

O mecanismo de recaptação é a principal via de ação das drogas


de abuso e dos psicofármacos. Exemplo interessante é a cocaína
que não permite a recaptação da dopamina, esta, por sua vez, fica
mais tempo atuando na fenda sináptica e nos sítios ativos dos canais
iônicos, aumentando a sensação de prazer para o organismo. Outro
exemplo, são os inibidos seletivos da recaptação da serotonina
(ISRS) utilizados atualmente, para tratamento de distúrbios de humor
como a depressão, potencializando a ação da serotonina na fenda
sináptica.

Apesar de toda a ênfase dada aos neurônios, estes constituem uma fração
das células que compõem o sistema nervoso. A outra metade do cérebro é
composta de células gliais (glia significa “cola”) que nutrem, sustentam, limpam,
ligam e conferem proteção às células neurais.

42
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

Os Astrócitos ou Astroglia (figura 13) nutrem e fornecem suporte físico para


os neurônios, seu nome faz referência a sua forma (forma de astros) eles limpam
os dendritos, fornecem algumas substâncias de que os neurônios necessitam
(inclusive a energia utilizada pelos mesmos, tendo em vista, os neurônios não
serem capazes de armazenagem de energia) controlam a composição química do
fluído extracelular e promovem a remoção ou liberam substâncias na fenda
sináptica, participando ativamente da neurotransmissão. O papel nutricional dos
astrócitos tem como base o fato de que as células neurais, diferentemente das
células de outros tecidos do corpo, não podem entrar em contato direto com o
plasma sanguíneo, rico em água e outras substâncias tóxicas ao neurônio. Como
estudamos, a transmissão de mensagens através do cérebro, depende de um fino
equilíbrio entre as substâncias extracelular e intracelular nos neurônios, se a
composição do líquido que banha os neurônios for minimamente
alterada, poderá interferir na transmissão. Em todos os tecidos os
capilares sanguíneos (capilares são vasos sanguíneos de pequeno A transmissão
calibre – vênulas e arteríolas - que penetram nos tecidos do corpo) de mensagens
apresentam poros através do qual o sangue pode extravasar e nutrir as através do
células. No sistema nervoso os capilares não exibem as fendas e as cérebro, depende
células que formam estes pequenos vasos são firmemente ligadas, em de um fino
um sistema denominado Barreira Hematoencefálica. Os astrócitos são equilíbrio entre
as células responsáveis por retirar os nutrientes dos capilares, as substâncias
transformá-los e distribuir os mesmos às células nervosas. Eles também extracelular e
retiram o excesso de substâncias e o material excretado pelo neurônio intracelular nos
e depositam estes no sistema circulatório. Como podemos ver estas neurônios.
células participam ativamente do sistema de neurotransmissão.

43
Neurofisiologia

Figura 13 – Imagem de astrócito, da barreira hematoencefálica


e uma rede interativa entre eles

Fonte: Carlson (2002, p. 36).

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Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

Duas importantes células da glia têm funções semelhantes – os


Oligodendrócitos no sistema nervoso central e as Células de Schwann no
sistema nervoso periférico. Elas dão sustentação aos axônios e produzem a
bainha de mielina. Os oligodendrócitos formam prolongamentos semelhantes a
remos que revestem os axônios em segmentos de bainha de mielina (composta
de 80% de lipídeos e 20% de proteínas) que isolam um neurônio do outro e
facilitam a transmissão sináptica (figura 14). Existe uma crescente proliferação da
bainha de mielina à medida que usamos uma rede neural, de forma que o treino
e o uso continuado de áreas especializadas do cérebro terão seus neurônios
cada vez mais mielinizados, aumentando a velocidade do impulso nervoso e,
consequentemente da resposta neural.

Figura 14 – Oligodendrócito e a produção da bainha de mielina

Fonte: Carlson (2002, p. 37).

As Micróglias, as menores células da glia, atuam como as vigilantes do


tecido nervoso, fagocitando (envolvendo e digerindo) neurônios doentes ou em
degeneração, ou ainda, fragmentos de células e substâncias tóxicas. As micróglias
funcionam como o sistema imune dentro do cérebro, protegendo o mesmo de
microorganismos invasores, promovendo reações inflamatórias no caso de danos
ao cérebro.

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Neurofisiologia

Células da glia: conjunto de células do sistema nervoso que


tem como função nutrir, envolver, fornecer suporte físico, limpar e
conferir proteção ao sistema nervoso a as demais células neurais.
Participam ativamente do processo de neurotrasnmissão.

Quanto às células nervosas propriamente ditas, elas não são todas iguais,
o exemplo utilizado na explicação do funcionamento da célula neural é de um
neurônio multipolar ou de associação. Os três tipos principais de neurônios são
os neurônios unipolares (com apenas um axônio originando-se do corpo celular),
bipolares (um axônio e um dendrito originando-se do corpo celular) e multipolares
(um axônio e muitos dendritos originando-se do corpo celular) como visualizado
na figura 15.

Os neurônios multipolares são encontrados em maior quantidade no sistema


nervoso e têm importante papel na integração neural, sendo funcionalmente
denominados interneurônios ou neurônios de associação. Os neurônios bipolares
são neurônios sensoriais encontrados nos sistemas visuais, auditivos, enquanto
os neurônios unipolares podem ser encontrados no sistema somatossensorial
(soma = corpo) como o tato, dor. Os neurônios podem ser classificados quanto a
sua função, sendo que os neurônios sensoriais transformam estímulos mecânicos
(tato, audição), químicos (gustação, olfação) e luminosos (visão) em impulsos
nervosos em um processo denominado transdução do sinal. Os neurônios
motores determinarão a contração de um músculo ou a secreção de uma
glândula, enquanto os interneurônios ou neurônios de associação, localizados
inteiramente no sistema nervoso, farão as inúmeras conexões entre os diferentes
sistemas. Voltaremos a discutir e utilizar estas classificações no capítulo 3 sobre
as estruturas do sistema nervoso.

46
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

Figura 15 – Diferentes tipos de neurônios. Em A: neurônio motor, em B e C: neurônios


do sistema sensorial, em D: diferentes tipos de neurônios de associação

Fonte: Kandel, Schwartz e Jessell (2003, p. 24).

47
Neurofisiologia

Principais Sistemas de
Neurotransmissão e Mecanismos de
Ação dos PsicoFármacos
Os neurotransmissores apresentam mecanismos de produção e ação que
podem ser alterados por inúmeras substâncias e drogas. As drogas que facilitam
ou potencializam os efeitos de um determinado neurotransmissor na célula
pós-sináptica são denominadas Agonistas, como o exemplo da cocaína, que
é um agonista dopaminérgico. As drogas que dificultam ou inibem os efeitos de
um determinado neurotransmissor na célula pós-sináptica são denominadas
Antagonistas, como o curare, uma droga utilizada por índios amazônicos que
atua inibindo a ação da acetilcolina (responsável pelas contrações musculares),
portanto, imobilizando o animal durante a caça.

As substâncias que atuam no sistema nervoso proporcionam dois efeitos


gerais já discutidos; ou eles despolarizam a membrana (PEPS) ou hiperpolarizam
a mesma (PIPS). Os dois principais neurotransmissores no cérebro são os
aminoácidos glutamato (excitatório) e o GABA - ácido gama amino butírico –
(inibitório). Os demais sistemas de neurotransmissores têm função moduladora.
Por exemplo, a acetilcolina ativa o córtex cerebral e facilita a aprendizagem,
mas a aprendizagem e memorização em si ocorrem via neurônios que secretam
glutamato e GABA. Algumas drogas podem atuar sobre estes sistemas específicos
de neurotransmissão, outras atuam sobre os sistemas mais gerais GABAérgicos
e glutamatérgicos. A figura 16 apresenta os principais mecanismos de ação das
drogas e complementam nosso modelo explicativo do funcionamento das células
nervosas. Ergon é a palavra grega para “trabalho”, por este motivo designamos
o nome do neurotransmissor seguido do sufixo érgico, então glutamatérgico,
serotoninérgico, acetilcolinérgico e assim por diante.

A Acetilcolina é um dos principais sistemas de neurotransmissão. Ela


participa de todos os processos de contração muscular, inclusive do sistema
nervoso visceral (controle das vísceras). Os sistemas acetilcolinérgicos são todos
facilitadores sinápticos, aumentando a potenciação sináptica. São responsáveis
por muitas das características do sono REM (o sono com sonhos) e envolvidos
com a ativação do córtex cerebral e consequentemente da aprendizagem,
principalmente a perceptual. Controlam o ritmo do hipocampo, área responsável
pela aquisição de muitos dos tipos de memória. A acetilcolina é composta de duas
partes: a colina, encontrada em grande quantidade nos ovos, e o acetato, que é
transferido de uma molécula de acetil-CoA, que faz parte de muitas das reações
das células, inclusive no metabolismo da glicose.

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Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

A epinefrina, norepinefrina, a dopamina e a serotonina pertencem a uma


família de compostos denominados Monoaminas, sendo que algumas drogas
podem ter efeitos sobre estes quatro sistemas de neurotransmissão.

Figura 16 – Exemplos das diferentes etapas da transmissão sináptica e como


algumas drogas (agonistas e antagonistas) podem alterar a transmissão

Fonte: Carlson (2002, p.106).

A dopamina já foi discutida anteriormente e participa de dois


sistemas relacionados à aprendizagem, o Sistema de Recompensa ou
do Prazer; que elicia respostas do cérebro a eventos e atividades que O Mal de
proporcionam prazer ao organismo e o Sistema de Reforço dos padrões Parkinson está
motores finos, que se origina numa área do mesencéfalo denominada relacionado com
Substância Negra e se dirige aos núcleos basais no telencéfalo (ver a degeneração
capítulo 4) e são responsáveis pelo controle dos padrões motores finos dos feixes de
como escrever, falar, jogar bola. fibras que se
projetam da
O Mal de Parkinson está relacionado com a degeneração dos substância negra
feixes de fibras que se projetam da substância negra aos núcleos aos núcleos
basais e por este motivo, os indivíduos afetados apresentam os basais e por
tremores característicos desta patologia. Existe estreita relação entre este motivo,
o sistema dopaminérgico e a esquizofrenia, e a diminuição deste os indivíduos
neurotransmissor, em determinadas áreas do cérebro, produz alguns dos afetados
efeitos característicos das pessoas com TDAH (Transtorno de déficit de apresentam
atenção e hiperatividade). A substância metilfenidato (nome comercial os tremores
Ritalina e mais recentemente o Concerta) é um inibidor da recaptação característicos
de dopamina e está sendo amplamente, e muitas vezes irrestritamente, desta patologia.

49
Neurofisiologia

utilizado no tratamento do TDAH. Como veremos posteriormente, no capítulo sobre


desenvolvimento, os sistemas dopaminérgicos de recompensa estão envolvidos de
forma marcante no consumo de drogas de abuso por parte dos adolescentes e é
um aspecto a ser considerado na educação de nossos jovens.

A epinefrina é um hormônio sintetizado pela medula das adrenais


A epinefrina é um
ou supra-renais que são glândulas localizadas acima dos rins, como a
dos hormônios
unidade filtradora dos rins é denominada néfrons, o nome do hormônio
do estresse, faz referência à localização de sua produção. O nome comum desta
responsável substância é adrenalina, pois é produzida pelas adrenais, como a
pelo aumento indústria farmacêutica se apropriou do nome corrente, os fisiologistas
dos batimentos passaram a usar este novo termo que faremos corrente no presente
cardíacos, texto. A epinefrina é um dos hormônios do estresse, responsável pelo
dilatação aumento dos batimentos cardíacos, dilatação das pupilas, aumento
das pupilas, do tônus muscular, preparando o corpo para agir, enquanto que a
aumento do norepinefrina é um neurotransmissor produzido pelo Lócus coeruleus,
tônus muscular, um núcleo localizado no tronco encefálico, e sua principal ação é
preparando o um aumento da atividade cortical no cérebro e, consequentemente,
corpo para agir aumento da vigilância e da atenção.

A serotonina é uma monoamina produzida no tronco encefálico,


O aumento numa região chamada Núcleos da Rafe, a partir do aminoácido
dos níveis de triptofano, por isso ela é também designada por 5-HT (5-hidróxi-
serotonina diminui triptamina). Este neurotransmissor tem importante papel na regulação
a agressividade, dos comportamentos motivados, como beber, comer, dormir, transar. A
por isso, quando serotonina está relacionada com muitas doenças mentais, principalmente
estamos com os transtornos do humor. A fluoxetina (nome comercial Prozac) é uma
fome somos droga inibidora da recaptação da serotonina, o que mantém a mesma
geralmente mais mais tempo atuando na fenda sináptica aumentando a sua potenciação,
agressivos, e utilizada para tratar ansiedade, distúrbios obsessivos-compulsivos e
mais “mansos” depressão. Existe relação entre o consumo de carboidratos (açúcares)
quando estamos e o aumento dos níveis de serotonina, o que explica o consumo
saciados. de chocolate quando estamos ansiosos. O aumento dos níveis de
serotonina diminui a agressividade, por isso, quando estamos com fome
somos geralmente mais agressivos, e mais “mansos” quando estamos saciados.
Outro efeito do aumento dos níveis de serotonina é a diminuição da libido, portanto,
um jantar como prato principal uma pasta à Carbonara não é uma boa estratégia
de sedução. Isso torna os tratamentos psicofarmacológicos da depressão menos
eficazes para homens, tendo em vista os inibidores seletivos da recaptação da
serotonina ocasionarem disfunção erétil. A serotonina não é responsável pelo sono,
mas pode induzir ao sono e está relacionada ao sono REM, o que explica a vontade
irresistível de dormir após o consumo de carboidratos ou após o sexo.

Os neurotransmissores são de diversas naturezas; podem ser lipídeos,


como a anandamida, responsável por eliminar memórias traumáticas, peptídeos,
50
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

alguns relacionados com o controle da dor e mesmo gases solúveis, como o óxido
nítrico, envolvido no controle da musculatura da parede intestinal, dilatando os
vasos sanguíneos no cérebro (o que pode evitar acidentes vasculares cerebrais)
e estimula as alterações que produzem ereção peniana. Parece que o óxido
nítrico tem participação nas alterações neurais decorrentes da aprendizagem.
Voltaremos a discutir sobre os sistemas de neurotransmissão no capítulo 4, sobre
as estruturas do sistema nervoso.

Atividade de Estudos:

1) Em uma cartolina e utilizando lápis de cor, canetinhas ou giz


de cera faça um desenho esquemático de neurônio contendo
suas principais partes, estruturas e a partir disso produza um
modelo explicativo para o funcionamento do neurônio durante
um potencial de ação: Use outros materiais plásticos se assim
desejar, como moldes em gesso ou uma iluminura.
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Neuroplasticidade
Podemos conceituar plasticidade neural como toda modificação estrutural
ou química no sistema nervoso decorrente da aprendizagem, de experiências,
após lesões, traumas (LENT, 2004). Mudanças no ambiente externo, ou mesmo
interno do organismo, geram respostas plásticas dos neurônios. Neste sentido,
o principal propósito da aprendizagem é adaptar o organismo com sucesso ao
ambiente, que está sempre em mudança. Este é um dos princípios definidores
da vida, no que Lynn Margulis denominou de “acoplamento estrutural”. As
mudanças no ambiente podem representar mudanças significativas na morfologia
celular do cérebro e na sua anatomia. Existem inúmeras maneiras de estas
51
Neurofisiologia

mudanças ocorrerem, a mais comum delas é a proliferação dos


Podemos
espinhos dendríticos, que crescem na direção de outros neurônios para
conceituar
estabelecer novas conexões sinápticas. Como discutido anteriormente,
plasticidade
um neurônio pouco estimulado, uma célula estelar (formato de estrela)
neural como
localizada na superfície do cérebro, que apresenta aproximadamente
toda modificação
10.000 conexões com outras células neurais. A partir da estimulação
estrutural ou
diferencial, este número pode saltar para 100.000 conexões. Existe um
química no
crescimento dos dendritos em direção as células neurais adjacentes
sistema nervoso
a partir do momento que o neurônio necessita produzir respostas a
decorrente da
mudanças do meio, são os espinhos dendríticos, como ilustrado na
aprendizagem,
figura 17. Em A temos um neurônio visualizado a partir de microscopia
de experiências,
por bioiluminescência, que mostra o mesmo durante sua atividade, em
após lesões,
B. e C. temos um aumento da imagem ilustrando o crescimento do
traumas.
espinho dendrítico. Em D. e E. temos uma fotomicrografia por varredura
demonstrando a intumescência da região correspondente ao botão
terminal, no local em que o espinho dendrítico se conecta a um prolongamento de
um outro neurônio. Esta intumescência tem a função de aumentar a superfície de
contato com o outro neurônio, aumentando a área de liberação e contato entre as
células, um evento muito comum nos processos biológicos.

Figura 17 - Fotomicrografias mostrando a atividade de neurônio


durante a proliferação das conexões sinápticas

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Fonte: Lent, (2004, p. 75).
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

O ambiente educacional empobrecido não proporciona a proliferação


ampla de conexões sinápticas. A figura 18 ilustra as células estelares do córtex
do cérebro de ratos em duas situações: uma em um ambiente empobrecido
com apenas comida e água, e outra com barra para roer, roda de estimulação,
rampa e estratos elevados do ambiente. Ao observar a figura, observe que as
células estelares proliferaram suas conexões para dar conta de responder ao
ambiente enriquecido do ratinho. Os painéis, exposições de trabalhos dos alunos,
esquemas, plantas, computadores e demais instrumentos disponibilizados nas
salas de aula equivalem aos brinquedos na caixa do segundo ratinho. Os trabalhos
dos alunos expostos nas paredes da sala de aula apresentam um componente a
mais neste sentido, pois proporcionam uma vinculação emocional ao ambiente
de aprendizado do tipo “esta é a minha sala onde está o meu trabalho, são os
meus colegas e as minhas (meus) professoras (es)”. Não por acaso, as crianças
procuram imediatamente os seus trabalhos entre os vários publicados nas
paredes da escola (observações de campo, dados não publicados).

Figura 18 – Proliferação das células estelares do córtex de ratos em dois


ambientes, um ”empobrecido” e o outro “enriquecido” com diversos estímulos

Fonte: Disponível em: <http:// site/scripts/documents_info.


php?categoryID=200301&documentID=273>. Disponível em: 14 mar. 2009.

Em um experimento clássico em que um macaco foi treinado por uma


hora por dia para realizar uma tarefa que requeria o uso dos dígitos 2 e 3, e
ocasionalmente, o dígito 4. Após 3 meses eles mediram as áreas do córtex motor
primário dos indivíduos antes e depois de receberam a estimulação diferencial

53
Neurofisiologia

(JENKINS et. al., 1990) . A figura 19 ilustra as alterações estruturais do encéfalo


devido à aprendizagem.

Figura 19 – A1: Estimulação diferencial dos dígitos 2,3 e 4 de macaco,


A2: áreas do mapa somatotópico no córtex representando os dígitos antes
da estimulação diferencial e A3: após a estimulação diferencial

Fonte: Kandel, Schwartz, e Jessell (2003, p.1274).

Outra questão importante é a ocorrência do que Ramachandran denomina


“membro fantasma”. Este pesquisador da Universidade da Califórnia, em San
Diego, realizou inúmeros experimentos de discriminação de estímulos sensoriais
utilizando um cotonete, mas também, trabalhou com pessoas que haviam
amputado alguma parte do seu corpo. Durante um experimento com um homem
que havia amputado o braço, o pesquisador solicitou que ele fechasse os olhos
e tocou suas bochechas com um cotonete. O paciente relatou estar sentindo o
cotonete no seu braço amputado. Como o homem sentiu o toque na bochecha
como sendo no seu braço amputado? O que ocorre neste caso é que o mapa
somatossensorial, ou seja, as áreas corticais primárias das sensibilidades do
corpo são adjacentes umas as outras, e muitas vezes estas representações
podem se confundir.

De maneira ampla, o cérebro pode se adaptar consideravelmente ao longo


da vida. Uma criança apresenta um potencial maior de plasticidade do cérebro
do que um indivíduo adulto. Esta questão pode ser observada nos inúmeros
casos de pessoas que sofreram traumatismos cranianos com lesões no cérebro
ou mesmo de isquemias e acidentes vasculares cerebrais e que perdem

54
Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

alguma habilidade específica, como a fala, ou a motricidade de um membro,


ou mesmo a sensibilidade de uma área do corpo, com o tempo voltam a ter
estas habilidades. Áreas adjacentes, àquela lesionada, assumem o controle ou
a percepção do conjunto de neurônios mortos. A estimulação será importante
componente de reabilitação neuropsicológica, trabalho amplamente desenvolvido
por fonoaudiólogos, fisioterapeutas e neuropsicólogos. Ainda é pouco discutido
na literatura sobre o papel da estimulação diferencial e seu uso nos ambientes
educacionais em crianças com dificuldades de aprendizagem, ou aquelas que
desejam melhorar suas habilidades e aptidões, ou ainda, adquirir algumas novas.

Atividades de Estudos:

1) Conceitue potencial sináptico excitatório e inibitório e dê exemplos


relacionados a alguns neurotransmissores.
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2) Cite quatro células da glia e suas principais funções:


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3) Diferencie a estrutura e função dos neurônios motores, sensoriais e


de associação.
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Neurofisiologia

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4) Qual o significado dos termos agonista e antagonista? Dê


exemplos relacionados a algum dos neurotransmissores
estudados.
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5) Qual a função da neuroplasticidade, quais eventos podem


desencadear alterações no tecido neural e quais mudanças
morfológicas acontecem no neurônio?
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6) Explique os princípios básicos da neurotransmissão, levando em


consideração os passos e componentes envolvidos no processo.
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Capítulo 2 TECIDO NERVOSO E NEUROPLASTICIDADE

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7) Quais os componentes citoplasmáticos principais necessários para


elucidar a importância do neurônio enquanto célula condutora de
sinal no organismo?
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Algumas ConsideraçÕes
Neste capítulo, discutimos a maneira como os impulsos nervosos são
gerados e propagados. Podemos resumir que os impulsos nervosos têm caráter
tudo ou nada, ou ocorrem ou não ocorrem, que são propagados e podem ser
medidos por frequência, que são somatórios, ou seja, ocorre um equacionamento
das cargas positivas e negativas dentro do neurônio e que são saltatórios, o que
aumenta sua velocidade.

Importante revisar que o entendimento da neuroplasticidade é papel


preponderante do educador, e estimular a criação de novas sinapses e a
emergência de novos neurônios é papel central na educação, essencialmente nos
ambientes formais e com crianças e adolescentes. Ambientes educacionais ricos
em estimulação e afeto propiciarão uma rede de conexões neurais, que no futuro,
poderão definir a personalidade, bem como, as preferências do indivíduo, mesmo
face às aptidões inatas que estes trouxerem.
57
Neurofisiologia

O modelo estudado neste capítulo serve de suporte técnico para o


entendimento da formação das redes neurais que estruturam o cérebro e o
sistema nervoso, o que veremos no próximo capítulo.

ReFerências
CARDOSO, Silvia Helena. Entendendo os sonhos. Cérebro & Mente, Campinas,
n. 2, p. 1-10, jun. 2007. Disponível em: <http://www.cerebromente.org.br/n02/
mente/neurobiologia.htm>. Acesso em: 3 fev. 2008.

CARLSON, Neil. Fisiologia do comportamento. 7.ed. São Paulo: Manole, 2002.

HERCULANO-HOUZEL, Suzana. O cérebro em transformação. Rio de Janeiro:


Objetiva, 2005.

JENKINS, J.N.; McCARTY, J.C.; PARROTT, W.L. Effectiveness of fruiting sites in


cotton: yield. Crop Science, Madison, v. 30, n.2, p. 368-369, 1990.

KANDEL, Eric; SCHWARTZ, James; JESSELL, Thomas. Princípios da


neurociência. São Paulo: Manole, 2003.

LENT, Roberto. Cem bilhões de neurônios: conceitos fundamentais de


neurociências. São Paulo: Atheneu, 2004.

TORTORA, G. J.; GRABOWSKI, S. R. Princípios de anatomia e fisiologia. 9ª.


Edição. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2002.

58
C APÍTULO 3
Estrutura e Funcionamento
do Sistema Nervoso

A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Identificar as diferentes estruturas e o funcionamento das áreas do sistema


nervoso imediatamente relacionado ao aprendizado.

 Construir um mapa das principais áreas cognitivas e identificar maneiras de


desenvolvê-las no ambiente de aprendizado.
Neurofisiologia

60
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

ConteXtualização
No último capítulo discutimos como as células do tecido nervoso operam
e como elas, no seu conjunto, podem sofrer as modificações necessárias para
compreender e responder a um mundo permanentemente cambiante. Neste
capítulo, o aluno vai estudar as principais estruturas do sistema nervoso e como
elas se relacionam com a aprendizagem. O cérebro humano é a estrutura mais
complexa do universo conhecido, sendo as áreas da linguagem as mais recentes
em termos evolutivos. Será um tema importante também, pois, nos remete ao
que foi estudado no capítulo 1 deste caderno, o estudo das áreas responsáveis
pela homeostasia, pois muitas destas áreas são as que possibilitam determinados
tipos de aprendizagem, como a habituação, que é um tipo de aprendizado, no
qual não aprendemos a dar novas respostas, mas sim, a deixar de responder a
estímulos repetitivos que não sejam danosos ao organismo. A maneira pela qual o
organismo buscará suas experiências e respostas ao ambiente proporcionarão o
amadurecimento e desenvolvimento do cérebro.

Apesar da complexidade do que será estudado, o aluno poderá, neste


capítulo, organizar seus conhecimentos sobre o sistema nervoso, sobre o
cérebro e, como este, produz a mente - o que será particularmente discutido.
Poderá visualizar e reconhecer as áreas que produzem os estados conscientes
e as diferenças nas estruturas cognitivas que produzem algumas dificuldades de
aprendizado. Com base nos estudos realizados nos capítulos anteriores, o aluno
está apto a embarcar nesta jornada pelo sistema nervoso e suas interações com
as demais regiões do corpo.

O Corpo Aprende: Uma Visão


Sistêmica
No livro A árvore do conhecimento, os chilenos Francisco Varela e Humberto
Maturana, trazem um curioso conceito de cognição: para eles, este processo é
fruto das percepções que o organismo tem do seu entorno (o que chamamos de
aprendizagem perceptual, a forma mais elementar de aprendizagem em nossos
organismos) e as respostas que o mesmo fornece para se adaptar ao ambiente
e sobreviver. Logo, cognição = percepção + ação (MATURANA; VARELA, 2002).
Neste sentido, uma ameba (um ser unicelular que usa prolongamentos
da membrana plasmática e do citoesqueleto para se deslocar), quando Cognição =
encontra uma fonte de nutrientes e se aproxima desta fonte, fornece percepção + ação
uma resposta cognitiva para o seu entorno. Diferentemente, na tradição (MATURANA;
psicológica, para representarmos o que é cognição no organismo, VARELA, 2002).

61
Neurofisiologia

deveríamos excluir as sensações e as respostas motoras; então, teríamos os


componentes cognitivos do organismo; a percepção, a memória, as emoções, as
motivações.

Neste texto vamos empregar a abordagem mais ampla de cognição utilizada


pelos biólogos da Escola de Santiago do Chile. O sistema nervoso é o grande
controlador das respostas do organismo; se uma glândula libera seu conteúdo, é
graças aos estímulos eletroquímicos fornecidos pelo sistema nervoso, se um feixe
de fibras musculares se contrai ou relaxa é devido aos milhares de efetores do
sistema nervoso que controlam todos os músculos do organismo.

Existe também, uma estreita relação entre sistema imune e sistema nervoso:
geralmente quando um deprime sua atividade, o outro segue na mesma tendência,
e não raras vezes somos acometidos de mazelas como viroses, bacterioses e
verminoses quando estamos emocionalmente abalados. Em verdade, os parasitos
que provocam estas patologias já estão presentes em nosso organismo, apenas na
espreita, esperando o melhor momento para tirar proveito do hospedeiro. Somos
uma mescla de respostas automatizadas e padrões novos de ação aprendidos a
partir de nossa existência. Estas respostas se apresentam em diferentes níveis;
no capítulo 2 discutimos os níveis mais elementares de interação; os átomos,
moléculas, células e tecidos. Podemos perceber que este nível elementar sofre
transformações radicais devido ao aprendizado, as experiências, as lesões e
danos que o sistema nervoso pode ser submetido.

Subindo na nossa escala de complexidade, temos os órgãos do corpo;


o estômago é parte fundamental da cognição, e não é à toa que ocorre o frio
na barriga quando marcamos um encontro com “aquela” pessoa escolhida e
preferida. Existe um nível acima, o sistêmico, que conecta diferentes órgãos e
que formará em última instância o organismo. Por exemplo, o hipotálamo, área
responsável pelos comportamentos motivados e uma das áreas principais das
emoções, ele apresenta um feixe de fibras nervosas que conecta o mesmo às
vísceras: o Nervo Vago, um dos nervos cranianos. É possível que, alterações nas
nossas expectativas, nos nossos estados emocionais provocarão alterações nos
nossos intestinos, em uma manifestação impressionante da interação entre as
diversas partes do corpo. Um exemplo dessa manifestação é o que ocorre com
os casais de namorados, sempre “falam com a barriga”, fenômeno comum dos
intestinos que ficam “roncando” enquanto os parceiros se beijam.

Há uma estreita relação entre os diferentes tipos de células do corpo, e


a cognição (do latin, cognocere, estar a par de) não é exclusividade do tecido
nervoso; nós pensamos com a pele, expomos nosso pensar pelos olhos, e
podemos ver no escuro da retina parte do nosso encéfalo, pois a retina é também
constituinte do sistema nervoso. Em biologia, muitas vezes, faz-se necessário
dividir, fracionar, separar para compreender as interações entre as partes, mas

62
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

isso não significa que os anatomistas, morfologistas e fisiologistas “pensem”


nestas partes de forma isolada do restante do corpo, é apenas um recurso
epistêmico e metodológico.

As lesões provocadas por traumatismos cranianos, acidentes vasculares


cerebrais (extravasamento do sangue contido nos capilares, o que provoca a
intoxicação dos neurônios), isquemias (quando os capilares sanguíneos que
irrigam o cérebro não possibilitam mais a passagem de sangue porque ressecam,
morrem), por provocarem a morte de vastas áreas do tecido nervoso, podem
ser ferramentas poderosas para compreensão do sistema nervoso, conhecendo
as alterações cognitivas provocadas pela morte neural. Foi desta forma, que
descobrimos a participação de uma área do cérebro bastante primitiva, o Tálamo,
na produção da cognição e consciência. Os exames pós-morte de uma mulher
jovem, que permaneceu em coma vegetativo persistente (com ciclos de sono e
vigília, sem funções cognitivas, consciência, pensamentos ou emoções) ao longo
de dez anos, após acidente de automóvel, determinaram extensas lesões no
tálamo, enquanto o cérebro e o tronco encefálico apresentavam apenas pequenas
anormalidades (TORTORA; GRABROWSKI, 2002).

Esta estrutura funciona como um comunicante entre os principais


sistemas sensoriais e o córtex encefálico, sendo a maioria dos processos Poderíamos
de percepção mediada pelo mesmo. O tálamo é responsável também viver e ser sem
por selecionar os estímulos que entram e saem das áreas cognitivas um braço, sem
superiores e pelo processo de atenção. Podemos pressupor que esta uma perna, ou
senhora já não apresentava mais o que chamamos de individualidade, mesmo com
de imanente, aquilo de subjetivo que os sujeitos produzem. Esta parte de apenas
pessoa continuou existindo apesar de seu organismo estar vivo por um rim, mas não
meio de aparelhos? E se fosse possível um voltar a si, o que seria do poderíamos mais
indivíduo, que não mais teria passado nem futuro, nem acesso ao seu ser, sem algumas
mundo subjetivo, nem aos seres que lhe cerca? Somos um todo que é estruturas do
constituído por bem mais que as somas das partes, mas algumas partes cérebro.
parecem ter maior participação naquilo que somos. Poderíamos viver e
ser sem um braço, sem uma perna, ou mesmo com parte de apenas um
rim, mas não poderíamos mais ser, sem algumas estruturas do cérebro.

Tálamo: área primitiva do encéfalo responsável pela seleção


dos estímulos sensoriais que chegam ao cérebro, que possibilitam
a percepção e a atenção. Funciona como um filtro sensorial, para
que o cérebro não seja bombardeado com estimulações, portanto,
responsável pela atenção e participante ativo dos processos
conscientes.

63
Neurofisiologia

DivisÕes Gerais do Sistema Nervoso


Podemos dividir o sistema nervoso em duas partes com estruturas
Podemos dividir o
principais: sistema nervoso periférico, constituído por nervos e gânglios
sistema nervoso
periféricos; e, o sistema nervoso central, constituído da medula espinhal
em duas partes
e do encéfalo.
com estruturas
principais:
Uma outra divisão, funcional, divide o sistema nervoso em
sistema nervoso
somático, controle consciente dos músculos esqueléticos; e autônomo,
periférico,
responsável pelos automatismos das vísceras e órgãos.
constituído por
nervos e gânglios
O sistema nervoso periférico está distribuído por praticamente
periféricos;
todo o corpo. Temos no lado externo da coluna vertebral e ao longo
e, o sistema
da mesma, um conjunto de gânglios a partir dos quais partem os
nervoso central,
nervos que enervarão o corpo, órgãos sensoriais, músculos, vísceras e
constituído da
glândulas. Este conjunto de glânglios não está revestido por ossos ou
medula espinhal
membranas especiais.
e do encéfalo.
O sistema nervoso central está restrito ao espaço interno da coluna
vertebral e da caixa craniana, estando, portanto, “empacotado” por estojos ósseos,
por membranas especiais; as meninges e pelo LCE – Líquido Cérebro Espinhal.

O sistema nervoso autônomo, visceral ou vegetativo é assim designado por


não apresentar um controle consciente do seu funcionamento, ao menos, não
em condições normais, tendo em vista que, alguns iogues e pessoas adeptas da
meditação consigam controlar algumas destas funções como a pressão arterial e
o metabolismo.

O conjunto de gânglios periféricos à coluna vertebral são os responsáveis


pelo sistema nervoso autônomo simpático e parassimpático, que são controlados
por núcleos profundos do sistema nervoso central no que chamamos de sistema
de sobrevivência do organismo, localizados no tronco encefálico e no diencéfalo.
Este dois sistemas funcionam cooperativamente e de forma antagônica oscilando
o organismo nos seus estados de equilíbrio homeostático, e são os responsáveis
pelas alterações quando algum estímulo quebra o equilíbrio. De maneira
didática e em termos gerais o sistema simpático é responsável pela ativação
comportamental e gasto energético do organismo. É o responsável pelo aumento
dos batimentos cardíacos e da respiração, elevação dos níveis de glicose, ereção
dos pelos, dilatação das pupilas, inibe a salivação (boca seca), bem como o
sistema digestório. Em contrário, o sistema parassimpático é responsável pela
inibição comportamental e ganho ou economia de energia para o organismo,
diminui os batimentos cardíacos e a pneumotaxia, estimula a digestão e a
absorção dos nutrientes pelo intestino, contrai a pupila e estimula a salivação.
64
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Figura 20 – Em A, termos e direções do corpo de organismo bilateral – humanos. Em


B: Planos do corpo e as três possíveis dimensões e exemplos de cortes do encéfalo

A. B.

Fonte: Extraído e adaptado de: Carlson (2002, p. 65), Tortora e Grabowski (2002, p.11).

O sistema nervoso central é subdividido em medula espinhal, “empacotada”


pelos ossos das vértebras, e encéfalo, “empacotado” pela caixa craniana.
Interessante salientar que somos animais bilateriais, ou seja, se seccionarmos
nosso organismo em duas partes sempre terá duas porções diferentes: lado
direito, lado esquerdo, anterior, posterior, dorsal, ventral, tal como vimos na
figura 20. Muitas das estruturas discutidas na sequência apresentarão esta
importante divisão, como hemisférios cerebrais e cerebelares, núcleos talâmicos e
hipotalâmicos direito e esquerdo. Poucas estruturas são únicas, como é o caso da
glândula pineal. A figura 21 ilustra as divisões e subdivisões do sistema nervoso
central.

65
Neurofisiologia

Figura 21 – Divisões e subdivisões do sistema nervoso central

Fonte: Gazzaniga e Heatherton (2005, p. 128).

A medula espinhal (figura 22) é constituída de substância branca na sua


porção externa e de massa cinzenta na sua porção interna. Os nervos espinhais
emergem em dois pares de raízes nervosas principais, um par de raízes dorsais,
onde penetram os nervos sensitivos que trazem as informações das estruturas
sensoriais para a medula e desta para o encéfalo; e, um par de raízes ventrais,
de onde emergem os nervos dos neurônios motores que irão atuar sobre a
musculatura. Muitas das decisões podem ser tomadas ao nível da medula
espinhal, como o “reflexo de estiramento” ou “reflexo espinhal”. Um exemplo é
o reflexo patelar, um procedimento comum para avaliar as respostas reflexas
e motoras. Neste caso, batemos com um martelo de borracha no tendão que
liga a patela (antiga rótula, o osso do joelho), os músculos têm receptores de
estiramento dentro deles de tal maneira que mudanças na extensão produzem
respostas que penetram a medula via prolongamento dendrítico e retorna ao
músculo que erguerá a perna. As respostas reflexas mostram certa autonomia
da medula. Isso é particularmente importante devido à velocidade da resposta,
pois se este movimento necessitasse de respostas mais elaboradas do cérebro
poderia demorar em demasia, e seu joelho estaria já estraçalhado. A medula
conduz os sinais da periferia do corpo para as áreas centrais do sistema nervoso
e vice-versa, é um importante elo no corpo e por este motivo esta localizada no
eixo longitudinal do organismo.

66
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Figura 22 – Medula espinhal com destaque para a substância cinzenta

Fonte: Gazzaniga e Heatherton (2005, p. 128).

Figura 22 – Medula espinhal com destaque para a substância


cinzenta (corpos de neurônios) ao centro e substância branca (feixes
de axônios) na periferia, raiz ventral (motora) e raiz dorsal (sensitiva).

A porta de entrada dos estímulos são os órgãos sensoriais, responsáveis


pelos sentidos gerais somáticos e viscerais (calor, frio, tato, pressão, vibração,
dor) e pelos sentidos especiais (visão, olfato, paladar, audição, equilíbrio). Células
receptoras localizadas nestes órgãos se encarregam de receber as informações
advindas do meio externo e convertem as mesmas em sinais eletroquímicos
do sistema nervoso. Elas são classificadas de acordo com o tipo de estímulo
fornecido, por exemplo, os fotorreceptores (cones e bastonetes) detectam
variações sobre a luz (comprimento de onda luminosa) que incide sobre a
retina. O sinal é então convertido em impulsos nervosos no neurônio sensorial
de primeira ordem, no caso da visão, células ganglionares localizadas também
na retina, formam feixes de axônios formadores do nervo óptico, um dos nervos
cranianos que discutiremos em breve.

67
Neurofisiologia

Os mecanorreceptores, localizados nos músculos para detectar o estiramento


e produzir o reflexo patelar, detectam a pressão mecânica ou o estiramento,
produzindo as percepções de tato, pressão, vibração, equilíbrio, audição e
propriocepção (que informam sobre a posição do corpo, comprimento e a tensão
dos músculos, posição e movimento das articulações). Os termorreceptores
detectam variações de temperatura. Nociceptores respondem a lesões nos tecidos
produzindo a sensação de dor. Os quimiorreceptores detectam substâncias
químicas na boca, no nariz e nos líquidos corporais.

As informações somáticas, ou das sensibilidades gerais, são conduzidas


via as raízes dorsais dos nervos espinhais e via alguns nervos cranianos para
a medula espinhal e núcleos do tronco cerebral, tálamo (centro que controla o
fluxo da informação) até as áreas somatossensoriais primárias do córtex cerebral.
As sensibilidades especiais apresentam nervos especializados (nervos cranianos
olfatório, olfatório acessório, óptico, vestíbulo-coclear e glossofarínfeo). Os nervos
cranianos são 12 pares de nervos (de cada lado do crânio) numerados de 0 a
12 e que emergem de núcleos localizados no encéfalo e que apresentam diferentes
funções (figura 23) que veremos a seguir.

Figura 23 – Nervos cranianos e suas principais funções

Fonte: Carlson (2002, p. 92).


68
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Importante salientar aqui, que desde o momento em que nossos ascendentes


desceram das copas das árvores e passaram a explorar as savanas (campos
abertos com grupos esparsos de árvores), a audição e a olfação perderam muito
do seu poder de vistoriar o ambiente e a visão adquiriu importância maior na
sobrevivência.

Ensinamos com a palavra, mas cada dia com maior intensidade,


somos levados a ensinar com a visão, afinal, somos animais
essencialmente visuais, e o sucesso da TV e do cinema ilustra bem
isso. No entanto, muitos indivíduos poderiam aprender com maior
facilidade se fossem utilizados outros meios sensoriais, como o tato,
a audição.

Esta abordagem se dirige particularmente, para crianças com


Crianças com
necessidades especiais, o tato, a audição, a olfação, e o paladar
trissomia do 21,
poderiam ser utilizados como poderosas ferramentas de ensino.
ou Síndrome
Crianças com trissomia do 21, ou Síndrome de Down, são extremamente
de Down, são
táteis, têm a pele muito sensível e poderiam ser alfabetizadas usando
extremamente
a pele como estrutura perceptual primeira, inscrevendo na mesma, as
táteis, têm a pele
letras, fonemas e depois sim, a criança passaria a usar o caderno, o
muito sensível
quadro. Saber sobre as particularidades do aluno é importantíssimo se
e poderiam ser
quisermos usar a neurociência como ferramenta na educação.
alfabetizadas
usando a pele
como estrutura
Principais Sistemas Sensoriais perceptual
primeira,
e Suas Estruturas inscrevendo na
mesma, as letras,
Comecemos pela sensibilidade especial relacionada à visão. fonemas e depois
Células especializadas, os cones e bastonetes na retina, ao fundo de sim, a criança
uma lente (o cristalino) e o globo ocular, captam luzes com comprimentos passaria a usar
de onda diferentes, sendo os bastonetes ativos ou desativos se há o caderno, o
branco ou preto respectivamente, oferecendo os intermediários do quadro.
cinza. Já os cones são especializados no sistema visual humano, para
o vermelho em maior quantidade, depois para o verde e por último, em
menor proporção, os cones para o azul. O nervo II, ou Nervo óptico é responsável
por retransmitir o sinal eletroquímico gerado a partir das células da retina até
o tálamo, que é a área responsável por filtrar o conteúdo das informações que
irão para o córtex de forma consciente ou de forma subliminar, dependendo da

69
Neurofisiologia

velocidade com que as imagens forem oferecidas ao olho; se a velocidade for


de até 200 frames por segundo, a imagem nos chega de forma consciente ao
cérebro, se for superior a 200 frames, a informação visual se torna subliminar.

A imagem toma forma no córtex occipital, parte mais posterior do encéfalo,


que se divide em córtex occipital primário (parte mais central e posterior desta
região), local em que a imagem se forma ainda de maneira rudimentar, sem os
meandros do que chamamos de percepção visual. Depois passa para a região
secundária, adjacente ao córtex occipital primário, onde as imagens ganham
sentido pela primeira vez, e se afastando da região primária cada vez mais, áreas
relacionadas ao movimento, na base desta região, as áreas relacionadas às
cores, bem como seu léxico. Tudo que fizer sentido do ponto de vista luminoso, o
faz nestas regiões do córtex.

A próxima sensibilidade especial a ser discutida é a audição, que a partir


do nervo vestibulococlear, retransmite as informações mecânicas advindas da
vibração da membrana timpânica a partir das ondas sonoras, esta é conectada a
três ossículos (o martelo, em contato com o tímpano e que retransmite a vibração
para a bigorna que por sua vez a repassa para o estribo), o estribo está em contato
com o órgão vestibulococlear e suas vibrações se propagam no interior deste órgão
e o seu respectivo nervo craniano traduz o sinal mecânico em sinal eletroquímico
até o tálamo anterior e o córtex temporal superior, área responsável pela audição.
Também do ponto de vista da audição existem as informações subliminares; nosso
sistema auditivo está preparado para filtrar, a partir do tálamo, as informações que
não forem relevantes naquele momento, por exemplo, quando estamos escutando
uma aula, o barulho dos carros passando na rua ou do ar condicionado não nos
é percebido de forma consciente, exceto se for um som muito estridente que o
cérebro não possa não prestar atenção. Muitos alunos, mesmo quietinhos na sala
de aula, podem estar prestando atenção em outros sons, e não na fala do professor/
professora, tons de voz muito constante em uma aula extensa pode ser de fácil
perda de atenção para o aluno e, como no teatro, pode ser necessário variar o tom
e o volume da voz para manter o expectador atento.

Provavelmente, para a grande maioria das tomadas de decisões, bem como,


na regulação hormonal, os sistemas olfatórios estão entre os mais primitivos e
sutis, sendo de fundamental importância na regulação de comportamentos
sociais e sexuais, e também, responsável por muitas alterações hormonais do
nosso organismos, tanto no que tange ao controle do estresse, assim como, no
desenvolvimento e alteração do eixo hormonal hipotálamo-hipófise-gônadas que
será amplamente discutido no capítulo IV deste caderno.

O sistema olfatório é constituído por duas estruturas quimioreceptoras


localizadas no interior de cada narina: as células mitrais do epitélio olfatório,

70
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

responsáveis por captar informações olfatórias mais gerais, as quais se


comunicam com células nervosas que irão compor o nervo olfatório, o bulbo
olfatório e o órgão vomeronasal, que apresentam células especializadas na
captação de informações olfatórias relacionadas aos feromônios, moléculas
que sinalizam nossos estados reprodutivos, de estresse, medo, raiva, amizade,
e também nossas qualidades genéticas, que estão relacionadas a escolha de
bons parceiros para acasalar para termos filhotes saudáveis, mas também como
forma de reconhecimento de parentesco, colaborando com outros mecanismos
sensoriais na identificação de filhotes, ou de outros indivíduos aparentados, e
evitando, desta forma, cruzamentos consanguíneos e consequentemente, filhotes
com maior probabilidade de problemas genéticos ou com baixa imunidade.
Tudo indica que estes sistemas estejam relacionados com nossa orientação
sexual, como foi discutido no capítulo I deste texto, quando estudamos os fatores
genéticos envolvidos na sexualidade.

Nas sensações táteis, essas agrupadas em sensibilidades gerais, diferentes


receptores localizados na pele e demais epitélios (tecidos de revestimento do corpo,
tais, como pulmões, estômago, intestino) são responsáveis por aferências ao longo
dos nervos das raízes dorsais da medula espinhal (Figura 22), também conhecidos
como nervos da raqui, e transmitem as sensações de calor e frio (receptores de
Ruffini e Krause) ou vibração e tato (receptores de Paccini) e táteis (receptores
de Meissner e Discos de Merkel), terminações nervosas livres auxiliam ainda na
pressão e tato, assim como, algumas são especializadas em dor (denominados de
nociceptores). O conjunto de receptores táteis nos oferece uma imagem do corpo no
cérebro, sendo que algumas regiões do corpo, por conterem mais e diversificados
receptores para tato estarão melhores representadas no cérebro. Perceba que para
o tato não temos apenas um tipo de receptor, mas um conjunto de receptores que
na sua totalidade desempenham papel importante na percepção tátil.

Outra importante informação sensorial é constituída pelo conjunto de papilas


gustativas presentes na língua. Até recentemente se acreditava que havia regiões
específicas para o doce e o salgado, o amargo e o azedo. Hoje sabemos que
as papilas gustativas estão dispostas de forma relativamente homogêneas na
língua e que a sensação dos diferentes tipos de gustação está relacionada ao
maior ou menor grau de estimulação das diferentes papilas. O sistema gustativo,
em conjunto com o sistema olfatório, constitui um tipo de informação sensorial
que responde a estímulos químicos advindos do meio, e ambos os sistemas se
retroalimentam e trabalham em conjunto na percepção química. Além disso, este
sistema, assim como o sistema olfatório, não apresenta aferências significativas
no tálamo, chegando ao cérebro em um primeiro momento de maneira subliminar.

No âmbito educacional pouca importância foi dada até o momento para


este sistema sensorial, não sendo utilizado como meio de aprendizagem formal.

71
Neurofisiologia

Maria Montessori, na sua educação cósmica, foi uma das poucas personalidades
em educação a dar alguma importância para os alimentos como mecanismo de
educação.

Outro aspecto importante e revolucionário na elucidação do sistema


gustativo vem não da educação formal, mas sim, da cozinha; Auguste Escoffier, o
renomado chef francês foi o primeiro a sistematizar as receitas de caldo de carne,
que são pratos na sua essência feitos de proteína desnaturada, na qual, em sua
receita original, vai muito pouco sal, nada de açúcares, não constituindo também
um sabor azedo ou amargo. Escoffier na sua cozinha descobriu o quinto sabor, o
“umami”, a palavra japonesa para “delicioso”. É o que sentimos quando comemos
de tudo, de caldo de carne à molho de soja, estimulando um conjunto de papilas
gustativas e não mais, como no clássico saber desse tópico, o doce, o salgado, o
azedo e o amargo (Lehrer, 2010).

Muito temos ainda que evoluir no que tange ao uso da gustação enquanto
método educacional, incluindo aí, os inúmeros saberes tradicionais e culturais
atrelados aos sabores.

O Tronco EnceFálico
O tronco encefálico é subdividido em bulbo, ponte e mesencéfalo
O tronco
(figura 21). O bulbo (ou medula oblonga, por ser de organização
encefálico é
semelhante à medula espinhal) apresenta os núcleos dos nervos
subdividido em
cranianos vestíbulo-cocleares: que conduzem impulsos da audição,
bulbo, ponte e
glossofaríngeos: relacionado ao paladar, deglutição e salivação, vagos:
mesencéfalo.
impulsos sensoriais e motores das vísceras no tórax e abdômen,
acessórios: controladores da deglutição, hipoglossos: movimentos da
língua durante a fala e a deglutição. Os tratos motores que se dirigem à medula
espinhal passam pelo bulbo, e nele, estão localizados núcleos responsáveis pelo
tato, vibração e propriocepção (a percepção que temos do corpo e dos órgãos
internos). Ainda no bulbo, temos o centro cardiovascular que regula a frequência
e a força dos batimentos cardíacos; o diâmetro dos vasos sanguíneos e a área
respiratória rítmica, que ajusta o ritmo básico da respiração.

A ponte localizada imediatamente superior ao bulbo e anterior ao cerebelo, é a


estrutura que conecta as partes do encéfalo entre si, a partir de axônios transversos
que conectam os dois hemisférios cerebelares e axônios longitudinais de tratos
sensoriais ascendentes e tratos motores descendentes. As áreas penumotáxicas
e apnêustica da ponte participam do controle da respiração. A ponte apresenta os
núcleos dos nervos cranianos trigêmeos: sensações somáticas da cabeça e da

72
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

face e músculos mastigatórios, abducente: impulsos motores dos movimentos dos


globos oculares, faciais: impulsos sensoriais do paladar e impulsos motores para
secreção da saliva e lágrimas, bem como contração dos músculos responsáveis
pelas expressões faciais, vestíbulo-cocleares: a ponte também apresenta núcleos
deste nervo que recebem impulsos sensoriais do aparelho vestibular (ouvido
interno) que controlam o equilíbrio e o balanço.

A terceira porção do tronco encefálico é o mesencéfalo ou cérebro médio, que


se estende da ponte até o diencéfalo. Apresentam um par de tratos, os pedúnculos
cerebrais, que contém axônios que conduzem impulsos nervosos do cérebro para
a medula espinhal, ponte e bolbo e axônios dos neurônios sensoriais que se
estendem do bulbo até o tálamo. A parte posterior do mesencéfalo apresenta os
corpos quadrigêmeos; os colículos superiores, centros reflexos que controlam os
movimentos dos olhos, da cabeça e do pescoço, em resposta a estímulos visuais
(algo sendo projetado em direção aos olhos), e os colículos inferiores, centros
reflexos para os movimentos da cabeça e do tronco em resposta e estímulos
auditivos (um ruído estridente como o choro de um bebê). Também os núcleos dos
nervos cranianos oculomotores: controlam os movimentos dos globos oculares,
as constricções da pupila e a forma do cristalino (foco), os nervos trocleares:
movimentos dos globos oculares.

Importantes núcleos do mesencéfalo são as substâncias negras, núcleos


liberadores de dopamina nos núcleos da base, do controle das atividades
musculares finas (movimento de pinça dos dedos, fala) os núcleos rubros, que
coordenam, juntamente com o cerebelo, os movimentos musculares, e a área
tegmentar ventral, discutida no capítulo 2, responsável por liberar dopamina
na ativação comportamental do sistema de recompensa, que faz com que
procuremos repetir atividades que dão prazer.

A formação reticular é constituída de feixes de fibras transversas e longitudinais


ao longo do tronco encefálico com núcleos profundos na sua estrutura que
participam de um sistema chamado SARA – Sistema Ativador Reticular Ascendente,
que emitem fibras que se projetam ao córtex cerebral, responsável pela manutenção
da consciência e pelo acordar do sono. Sua função eferente é a regulação do tônus
muscular (pequena contração dos músculos em repouso).

O CereBelo
O cerebelo (figura 24) ou pequeno cérebro, era considerado uma estrutura que
participava apenas do equilíbrio e da coordenação dos movimentos musculares.
Inúmeras pesquisas nas três últimas décadas têm revelado que o mesmo é um

73
Neurofisiologia

importante centro de integração sensorial e participa ativamente dos processos


cognitivos, sendo um auxiliar do cérebro quando este fica sobrecarregado. O
córtex cerebelar é constituído de quatro porções principais: na linha média, o
“Vérmix”, que recebe este nome em decorrência da sua forma vermiforme, a Zona
intermédia, a Zona lateral e o Lobo Floculonodular.

O Vérmix é particularmente importante por ser a área responsável


O Vérmix é
pelo equilíbrio e a postura corporal. Crianças com TDAH (Transtorno
particularmente
de déficit de atenção e hiperatividade) apresentam esta área reduzida,
importante
o que explicaria a constante troca na postura corporal, o senta e
por ser a área
levanta, parece que tem “o bicho carpinteiro” que o aluno não para
responsável pelo
quieto na cadeira. Isso parece ser fruto de uma dissonância entre a
equilíbrio e a
posição correta em que o organismo se encontra (postura corporal) e
postura corporal.
aquilo que o cérebro acusa ser a postura do corpo (CARLSON, 2002;
CASTELLANOS et. al., 2001). Danos ao lobo floculonodular também
promovem alterações no controle do equilíbrio e postura corporal. O vérmix
recebe informações auditivas, visuais, cutâneas e cinestésicas e junto com
os núcleos fastigiais cerebelares influenciam enormemente o comportamento.
A Zona intermédia participa do controle dos movimentos dos braços e pernas,
enquanto que a zona lateral participa dos movimentos independentes dos
membros, particularmente dos movimentos rápidos e apurados. Danos a zona
lateral alteram os comportamentos balísticos (de arremesso) que precisam ser
corrigidos previamente a cada lance (CARLSON, 2002).

74
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Figura 24 - Cerebelo e principais projeções cerebelares (aferentes e


eferentes) particularmente relacionadas ao controle dos movimentos,
equilíbrio, postura corporal e integração sensorial

Fonte: Carlson (2002, p. 266).

O DiencÉFalo
Nosso próximo ponto será o diencéfalo, esta área bastante primitiva apresenta
as estruturas denominadas sistemas de sobrevivência, incluso o tálamo, epitálamo
e hipotálamo. Vamos agora, estudar como cada estrutura participa do controle do
corpo e das glândulas, das emoções e dos comportamentos.

75
Neurofisiologia

Começaremos pelo tálamo (figura 25), já rapidamente discutido,


O tálamo é
que consiste de duas massas ovaladas unidas por uma massa cinzenta
importante
denominada Massa Intermédia. O tálamo é um centro retransmissor
estrutura do
das informações sensoriais (exceto as aferências do sistema gustativo,
sistema de
pois não podemos decidir a posteriori o que deve ou não entrar em
atenção do
contato com a mucosa da boca e a língua). Ele recebe aferências
organismo e uma
do sistema auditivo e se projeta para as áreas primárias da audição,
das principais
Muitas das informações auditivas não são retransmitidas ao córtex
estruturas que
conscientemente, por exemplo, o barulho repetitivo do trânsito, do ar
participam
condicionado ou da geladeira, enquanto estamos atentos a uma aula,
dos processos
um filme ou uma conversa animada com os amigos. Assim, o tálamo
conscientes.
seleciona estas informações negativamente, por elas não serem de
relevância no momento, e retransmite apenas o que é de interesse e
da atenção do organismo. Um som estridente, como uma batida de automóvel
ou o som de um bebê pode alterar os esquemas de atenção no nível talâmico. O
mesmo ocorre com uma cena, não visualizamos tudo na mesma, apenas aquilo
que é de nossa atenção, selecionando aspectos de maior relevância do contexto.
O aprendizado que ocorre quando deixamos de responder a estímulos repetitivos
é denominado de habituação, quando não adquirimos respostas novas. O tálamo
é importante estrutura do sistema de atenção do organismo e uma das principais
estruturas que participam dos processos conscientes.

O tálamo também apresenta projeções eferentes, mandando os comandos


do córtex motor primário para os núcleos da base, cerebelo e principais projeções
motoras do tronco encefálico. Ele filtra os comandos motores. Você já deve ter se
deparado com o planejamento de uma ação, mas a não conclusão do mesmo, do
tipo, pegar algo que esta caindo, mas não mover o corpo para alcançá-lo, este é o
tipo de filtro motor que é realizado pelo tálamo.

Figura 25 – Tálamo e seus principais núcleos e projeções

Fonte: Tortora e Grabowski (2002, p. 419).

O hipotálamo é o centro controlador de todas as glândulas do corpo via


glândula mestra – a hipófise (antes denominada pituitária). Ele participa ativamente

76
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

dos comportamentos motivados (que necessitam de motivos para


Hipotálamo é o
ocorrer, como fome, sede, sexo, comportamentos aditivos). Além disso,
centro controlador
é um importante centro controlador e eliciador de respostas emocionais,
de todas as
juntamente com os corpos amigdalóides.
glândulas
do corpo via
O hipotálamo (figura 26), de localização inferior ao tálamo, é
glândula mestra –
composto por núcleos e áreas localizados em quatro regiões principais:
a hipófise (antes
mamilar ou posterior, tuberal, supra-óptica ou anterior e pré-óptica.
denominada
Os corpos mamilares são estações retransmissoras para reflexos
pituitária).
relacionados ao olfato e a área anterior coordena o influxo simpático.
Ele participa
Na região tuberal uma das estruturas mais importantes é o infundíbulo,
ativamente dos
que conecta a hipófise ao hipotálamo. A região supra-óptica ou
comportamentos
anterior libera oxitocina e vasopressina na hipófise anterior. Estes
motivados (que
dois neurohormônios (pois funcionam como hormônios no sistema
necessitam de
circulatório e como neurotransmissor no tecido nervoso) apresentam
motivos para
importantes papéis no vínculo emocional entre a mãe e o filhote e a mãe
ocorrer, como
e o pai (oxitocina), que também é responsável por diminuir a sensação
fome, sede, sexo,
de dor durante o parto, dilatar o canal de parturição e contribui para a
comportamentos
liberação pela hipófise de prolactina, hormônio precursor da lactação. A
aditivos).
vasopressina também é um neurohormônio e parece estar relacionada
a inúmeros comportamentos de corte do macho para com a fêmea e na
vinculação emocional deste com aquela. Sua atuação hormonal está relacionada
a vaso constrição e aumento da quantidade de urina, necessária para demarcar
território e exibição sexual nos machos de mamíferos.

A área pré-óptica participa ativamente dos comportamentos parentais,


ou seja, de cuidado com os filhotes, conforme discutido no capítulo 1. Outro
núcleo bastante especial do comportamento é o INAH3 (núcleo intersticial 3 do
hemisfério anterior do hipotálamo); pesquisas apontam que este núcleo é maior
em ratos machos que em fêmeas, estando envolvido no reconhecimento de
ferormônios (hormônios de sinalização, por exemplo, de receptividade ao sexo,
de agressividade), e que seria menor em 1/3 dos casos de homossexualidade
masculina, envolvendo portanto, num reconhecimento de padrões masculinos de
odores como bons parceiros para acasalar (GILBERT, 2009).

Muitas das atividades corporais relacionadas à homeostasia são controladas


pelo hipotálamo: os impulsos sensoriais somáticos e viscerais, controle da pressão
osmótica, das concentrações hormonais e a temperatura do sangue. É o principal
controlador dos músculos lisos das atividades viscerais. Regula os sentimentos
de raiva, de agressão, de dor e de prazer, e com a ativação sexual. Regula a
ingestão de alimentos e de água e dos ritmos circadianos (os ritmos diários do
organismo, bem como, os estados de consciência).

77
Neurofisiologia

O diencéfalo ainda é formado pelo epitálamo, cujo principal componente é a


glândula pineal (também discutida no capítulo 1), que produz melatonina, o hormônio
que é liberado durante o escuro mais que durante a luz, considerada precursora
do sono. A pineal parece estar particularmente envolvida com os sonhos, pois há
um considerável aumento do seu volume quando o indivíduo apresenta o sono
REM (Rapid Eyes Moviment), que é o sono com sonhos. Também no epitálamo
encontramos os núcleos da habênula, relacionado às respostas emocionais
aos odores. A última estrutura a ser discutida é o corpo caloso, feixe de fibras
transversas que conectam um hemisfério cerebral ao outro, que até a década de 50
era seccionado para o tratamento da epilepsia, cirurgia denominada lobotomia, mas
que apresentava danos cognitivos superiores aos da epilepsia.

Figura 26 – Núcleos hipotalâmicos e suas relações com a glândula hipófise

Fonte: Tortora e Grabowski (2002, p. 420).

O TelencÉFalo
As primeiras estruturas a serem discutidas sobre o telencéfalo constituem o
que os fisiologistas, de Papez (1937) a McLean (1949) construíram sob o termo
Sistema Límbico, um conjunto de estruturas interconectadas particularmente
envolvidas na motivação e nas emoções. Além do córtex límbico, área

78
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

denominada córtex cingulado ou giro do cíngulo mostrado na figura 27, o


sistema límbico é constituído do hipocampo (área da memória de fatos e dados
– memória episódica), hipotálamo, tálamo e o córtex límbico que corresponde ao
giro do cíngulo. O Fórnix é importante feixe de fibras que conecta o hipocampo
ao hipotálamo, uma relação anatômica interessante entre memória episódica e
emoções e ativação do comportamento.

Figura 27 – Circuito de Papez e o sistema límbico proposto por McLean

Fonte: Gazzaniga e Heatherton (2005, p. 188).

Os corpos amigdalóides, de amigda, que significa em “forma de amêndoa”,


(não confundir com as toncilas palatinas, que são nódulos linfáticos na região
da garganta cirurgicamente extraídos comumente denominados amigdalas)
são as áreas primitivas das emoções. Nos primeiros dias de vida de um bebê,
as ressonâncias magnéticas mostram esta área bastante ativa. É o principal
centro da memória emocional, já que a memória episódica (de fatos e dados na
região hipocampal) só estará constituída após os 2,5 anos de idade. O núcleo
anterior da amígdala é reduzido em crianças que sofreram de abuso, negligência
e maus tratos, e em 2/3 dos casos de psicopatia esta área da amigdala é também
reduzida, o que explica em parte a asserção de que psicopatas sofreram algum
tipo de violência quando criança. Em muitos casos de psicopatologias existe uma
assimetria na amígdala direita e esquerda, conforme afirmam Pridmore, Chambers
e McArthur (2005). Esta área esta relacionada com o controle de muitas emoções,
incluindo ai o medo.

O hipocampo, do latim “cavalo marinho” graças ao seu formato (figura 28),


desempenha um importante papel no estabelecimento das memórias episódicas,
ao fazer novas conexões com o córtex cerebral a partir de cada nova experiência
ou aprendizado. Esta é a estrutura responsável pela memória de fatos e dados.
Importante salientar aqui que o hipocampo começa a se formar a partir de 1 ano de

79
Neurofisiologia

idade e não está totalmente funcional antes dos 3 anos, o que nos faz incapacitados
de lembrar de eventos com nitidez antes desta idade. A memória é mais emocional do
que episódica. Há, portanto, um mito de quando a memória pessoal se estabelece,
não havendo possibilidades de lembranças conscientes de fatos e dados no útero,
ou durante o nascimento, mas havendo, sim, uma memória perceptual e emocional
antes do período de 3 anos pois estas não estão diretamente relacionadas com a
formação hipocampal (HOWE E COUREGA, 2004).

Outro evento relacionado com o hipocampo é a distinção entre os símbolos


e os objetos aos quais estes se referem. Antes dos 2,5 a 3 anos as crianças
não distinguem os símbolos dos objetos, não conseguindo fazer diferenças de
escalas, ou tentando utilizar objetos que estão representados em uma folha de
papel. Uma criança poderá tentar calçar um sapato desenhado em um papel
ou ainda tentar entrar em uma miniatura de carro. A partir dos 3 a 4 anos estas
diferenciações já são possíveis de ocorrer, o que culminará na possibilidade de
uso dos símbolos para representar objetos ou ideias, atitudes estas, que vêm ao
encontro do período de alfabetização.

Figura 28 – Formação hipocampal

Fonte: Felten (2005. p. 32).

Os gânglios basais (figura 29) constituem as áreas de automação dos padrões


motores finos, como jogar futebol, escrever ou dedilhar um violão. Estas estruturas
recebem aferências da substância negra no tronco encefálico que despeja
dopamina nos núcleos basais influenciando no planejamento e na produção dos
movimentos. O Mal de Parkinson é uma degeneração deste feixe de fibras e a
consequente perda dos movimentos finos, ocasionando os conhecidos tremores e a

80
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

rigidez dos membros próprios deste distúrbio. Os gânglios basais estão envolvidos
na aprendizagem de hábitos automatizados como olhar os carros ao atravessar a
rua, o drible tipo “pedalada” do Robinho, a prática de digitar um texto, ou ainda,
hábitos socialmente mediados como acenar para alguém que te acena na rua,
estender a mão para cumprimentar alguém ou o clássico dedão em riste do “legal”,
“tudo bem”, “ok”. Estes hábitos e padrões motores finos, uma vez assimilados,
podem ficar cada dia mais preciso e automatizado, possibilitando ao cérebro outros
planejamentos e desviar a atenção para eventos periféricos ao movimento, como
por exemplo, mudar a marcha do carro enquanto se faz uma ultrapassagem. Quanto
mais exercitamos um padrão motor, melhor será a excelência no comportamento,
o que faz do treino uma ótima ferramenta. Em termos neurais significa dizer que
os feixes de fibras envolvidos nestes comportamentos ficam mais espessos, mais
mielinizados (mielinização axônica). Parece uma perda, ao aprendizado, o desuso
nas séries iniciais dos cadernos de caligrafias e dos livros de alfabetização; e,
possivelmente estamos perdendo escritores e leitores neste processo. Voltaremos
a discutir a mielinização axônica no capítulo 4.

Figura 29 – Gânglios basais e suas relações anatômicas com amigdala e tálamo

Fonte: Felten (2005, p. 29).

Acabamos de discutir sobre os principais núcleos subcorticais, partes


integrantes do telencéfalo, vamos agora discutir sobre as diferentes estruturas
e regiões dos relativamente simétricos hemisférios cerebrais. Basicamente, os
hemisférios esquerdo e direito são subdividos em quatro lobos: frontal, temporal,
parietal e occipital. A figura 30 ilustra esta subdivisão nos dois hemisférios.
Veremos que cada uma destas regiões é subdividida em outras mais, as quais
constituem, de forma integrada, os diferentes módulos cognitivos. Cada um dos
hemisférios apresenta um tálamo, um hipocampo, uma amígdala, gânglios basais
e um córtex cerebral.

81
Neurofisiologia

No córtex, do latin “casca”, temos os corpos celulares dos neurônios, que


representa a substância cinzenta, estes, como veremos no capítulo 4, migram das
regiões próximas aos ventrículos durante o desenvolvimento perinatal, guiados
pela neuroglia. Abaixo, temos as fibras aferentes e eferentes dos neurônios
corticais e dos núcleos subcorticais (também de matéria cinzenta); a substância
branca subcortical, como pode ser visualizada na figura 31.

Unindo os dois hemisférios, há um feixe de fibras transversas do diencéfalo,


o corpo caloso. Esta estrutura se tornou famosa pelas “lobotomias”, processos
cirúrgicos comuns em meados do século XX, aplicados em casos de epilepsia.

Figura 30 - Córtex cerebral em visão ventral (a), visão médio sagital


do hemisfério direito (b) e visão lateral do hemisfério esquerdo (c)
apresentando os principais lobos: frontal, temporal, parietal e occipital

82
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Fonte: Carlson (2002, p. 80).

As vias aferentes que se projetam ao córtex, são principalmente,


originadas dos núcleos da formação reticular (que constituem o SARA, discutido
anteriormente), do tálamo (que retransmite sinais dos sistemas sensoriais), e dos
núcleos subcorticais, principalmente os gânglios basais, os corpos amigdalóides e
a formação hipocampal.

As vias eferentes são principalmente destinadas ao tálamo (retransmissão


motora), hipotálamo (ativação de inúmeros comportamentos e glândulas), tronco
encefálico (ativação dos nervos cranianos e espinhais).

Figura 31 - Camadas do córtex cerebral e a medula


cortical, com detalhes do giro, sulco e fissura

Fonte: Tortora e Grabowski (2002, p. 422).


83
Neurofisiologia

O lobo occipital é responsável pela percepção visual; nele se formam as


imagens e o movimento dos objetos e é nesta região que estes primeiramente
fazem sentido. O lobo occipital participa na compreensão dos objetos em duas
vias principais, a que compreende “o que é o objeto” (ventral, em direção ao lobo
temporal) e a que compreende “onde está o objeto” e se está em movimento
(dorsal, em direção ao lobo parietal).

A informação luminosa (fótons) recebida pela retina é transduzida em sinal


eletroquímico pelas células ganglionares, formando os respectivos nervos ópticos
dos olhos direito e esquerdo, estes se dirigem aos neurônios do corpo geniculado
lateral, área do tálamo responsável pela retransmissão e filtro da informação visual
até o córtex occipital. Aquilo que chamamos de “informação subliminar” nada mais
é do que informações visuais que devido à velocidade com que são apresentadas
são recebidas pelo córtex, sem filtragem e de forma direta, o acesso à informação
ocorre de forma não consciente. Existe muita discussão na literatura e nos meios
de comunicação sobre o assunto, e parece ser bastante controverso, o quanto isto
influencia nossas escolhas, mas a mídia, o cinema, a indústria da propaganda,
apesar da legislação específica sobre o assunto, faz uso e abuso deste recurso.

As imagens visuais são topograficamente mapeadas, representadas de


maneira que preserva as relações espaciais; a imagem visual, retransmitida pelo
tálamo ao córtex occipital, é projetada o mais fiel possível no córtex visual primário
e deste para as áreas de associação. O hemisfério direito recebe as projeções
do campo visual esquerdo enquanto que o hemisfério esquerdo as projeções do
campo visual direito.

O lobo temporal apresenta mais especializações de suas áreas, participando


de forma marcante na compreensão da linguagem, por meio da área de Wernicke,
que em conjunto com a área de Broca (figura 32), região responsável pela produção
da linguagem falada ou gesticulada (no lobo frontal), constitui as principais estruturas
desta via de comunicação, ambas localizadas apenas no hemisfério esquerdo. Neste
sentido, existem as áreas correlatas no hemisfério direito, mas elas estão envolvidas
na compreensão e na articulação da “linguagem” musical. Também o lobo temporal
superior participa dos processos perceptivos da audição, ficando localizado próximo
à orelha e ao aparato auditivo. O pólo anterior medial do lobo temporal é a área
responsável pelos processos perceptivos relacionados à olfação. Importante salientar
aqui, que todas estas atividades são utilizadas em contextos sociais, e podemos dizer
que o lobo temporal é a área principal da sociabilidade. Tanto em termos sonoros
como em termos químicos (os ferormônios) nos comunicamos de forma intensa
socialmente, claro que estes estímulos são sutis, e por vezes, pouca importância lhe
delegamos.

84
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Figura 32 – Áreas principais da linguagem: Área de Broca e Área de Wernicke

Muito do que
Fonte: Carlson (2002. p. 499). chamamos
de empatia,
Muito do que chamamos de empatia, a capacidade que temos a capacidade
de nos colocar no lugar do outro, é processado no córtex temporal, que temos de
especialmente no giro da insula, área que representa os nossos estados nos colocar no
fisiológicos e que nos ajudam a entender os estados internos dos outros, lugar do outro, é
também envolvido no comportamento de nojo. Isso nos remete a “Teoria processado no
da Mente” a capacidade que nosso cérebro tem de criar uma imagem da córtex temporal,
mente de outras pessoas, inferindo suas intenções, motivações, emoções, especialmente no
interesses, bem como, os estados fisiológicos. giro da insula.

Pessoas com autismo apresentam capacidades limitadas


para as habilidades relacionadas à Teoria da Mente e são fontes
importantes de informação do funcionamento destas áreas.

O córtex órbito frontal (entre as órbitas dos olhos), o pólo anterior do lobo
temporal e o sulco temporal superior estão particularmente envolvidos, no seu
conjunto, na produção da imagem do estado do outro. Exercícios de empatia,
que poderão ter lugar ao longo de uma narrativa, reforçam em muito a aptidão,
discutiremos isso no capítulo 4. A imagem 33 ilustra as principais áreas envolvidas
na construção de uma “Teoria da mente”.

85
Neurofisiologia

O córtex temporal inferior corresponde em conjunto com vasta área do córtex


occipital no córtex visual de associação, formando a via ventral, responsável pela
formulação de inúmeros conceitos, adjetivos e substantivos em uma indicação
linguística do que é o objeto.

Figura 33 – Áreas envolvidas na construção de uma “Teoria da


mente”, em especial as áreas do córtex temporal

Fonte: Herculano-Houzel (2005, p. 196).

Alguns distúrbios parecem estar relacionados ao lobo temporal, como o “ouvir


vozes” característico dos esquizofrênicos, assim como o autismo e a Síndrome de
Asperger, uma forma branda de autismo. Pessoas que dizem ter “experiências
místicas”, ou que falam com Deus, apresentam o lobo temporal
bastante ativo. Podemos dizer que o córtex social está representado de
maneira expressiva no lobo temporal.

As sensações O lobo parietal é responsável pela integração sensorial do cérebro, a


do lado direito área das sensibilidades gerais, localizada no giro pós-central, apresenta
do corpo são o mapa somatotópico primário, o qual é representado na imagem de
percebidas pelo um “homúnculo sensório”. Esta ideia de homúnculo nada tem a ver com
córtex sensorial o pequeno homem que vivia no sêmen e que era inoculado no útero
esquerdo e das mulheres durante a cópula e ali crescia dando origem aos bebês,
vice-versa, repleto de preconceitos de gênero e uma visão bastante equivocada
assim como, os de desenvolvimento. O homúnculo sensório, ilustrado na figura 34a, é
músculos do uma representação espacial no cérebro de cada pequeno fragmento
lado direito são da superfície do nosso corpo e dos mecanorreceptores localizados nos
controlados pelo músculos, a partir das informações obtidas dos sensores para calor,
córtex motor frio, tato, movimento, pressão. Existe uma contra lateralidade do corpo
esquerdo e com relação ao cérebro; as sensações do lado direito do corpo são
vice-versa. percebidas pelo córtex sensorial esquerdo e vice-versa, assim como,

86
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

os músculos do lado direito são controlados pelo córtex motor esquerdo e vice-
versa, sendo os mapas também contralaterais.

Figura 34 a – Homúnculo motor (Córtex motor)

Fonte: Sternber, Robert J. Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artmed, 2008. p. 63.

Figura 34 a – Este mapa do córtex motor primário costuma


ser chamado de homúnculo (do latim “pessoa pequena”) porque é
desenhado como se fosse uma secção transversal do córtex cercada
pela figura de uma pequena pessoa de cima para baixo, cujas partes
do corpo estabelecem uma correspondência proporcional às partes
do córtex.

Figura 34 b – Homúnculo sensorial (Córtex sensorial)

Fonte: Sternber, Robert J. Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artmed, 2008. p. 64. 87
Neurofisiologia

Figura 34 b – Assim como acontece com o córtex motor primário


no lobo frontal, um homúnculo do córtex sensorial, de forma invertida,
mapeia as partes do corpo de onde o córtex recebe informações.

Podemos reparar nestes mapas que quanto mais utilizamos uma parte do
corpo ou quanto maior sua importância nas experiências do indivíduo, maior é sua
representação no córtex, assunto que discutimos em neuroplasticidade no capítulo
2. Somos essencialmente animais manuais e vocais, e isso implica em regiões
mais especializadas e volumosas do córtex para a percepção e o controle, assim
temos as mãos, que apresenta um volume e superfície reduzido, com um córtex
de aproximadamente 1/3 da área total do giro pós central (homúnculo sensório)
e as estruturas responsáveis pela oralidade (língua, mandíbula, maxila e lábios)
do giro pré-central (homúnculo motor) representadas com maior expressão. Na
figura 32 podemos ver que as áreas motoras da linguagem (área de Broca) são
contíguas às áreas motoras do aparato fonador, o que explica a afasia de Broca,
distúrbio que incapacita o indivíduo a expressar a linguagem. Importante salientar
aqui que mesmo as pessoas que se comunicam pela língua de sinais fazem
uso da área de Broca e Wernicke para produzir a linguagem, numa homologia
neural. Em nosso cotidiano utilizamos muito da gesticulação para nos comunicar,
principalmente o educador e, nossos cérebros são bastante adaptados a aprender
com gestos e sinais, assim como, para aprender outras línguas.

Dentre as especializações do córtex parietal (figura 35) temos a área psico-


somestésica, no córtex parietal posterior, responsável pela percepção somática.
O giro angular e o giro supra-marginal são responsáveis pelo esquema corporal.
Para exemplificar, relatos de experiência “quase morte” que a pessoa diz se
ver fora do corpo, na sala de cirurgia, com detalhes do procedimento cirúrgico
e monitorado por imageamento cerebral, indica uma grande ativação do giro
angular, que “produziria” uma projeção, uma imagem do corpo na mente. Uma
área específica, a junção temporoparietal, também está envolvida na produção do
que denominamos “Teoria da Mente”, enquanto reprodutor dos estados mentais
das pessoas, como seus desejos e crenças (HERCULANO-HOUZEL, 2005).

88
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Figura 35 – Córtex parietal posterior e o bloco sensitivo do


córtex, em especial as áreas do esquema corporal

Fonte: Kandel, Schwartz e Jessell (2003, p. 344).

Os neurocientistas, em especial Elkhonon Goldberg, costumam tratar o


cérebro como uma grande orquestra, e designar os lobos frontais como os
maestros da orquestra, em especial o córtex pré-frontal. Em seu livro “O cérebro
executivo: lobos frontais e a mente civilizada”, Goldberg (2002), discípulo de
Alexander Luria , ao qual dedica a obra, descreve as especializações da região
anterior do córtex. Um aspecto importante dos lobos frontais é que ele se
apresenta muito bem conectado as outras áreas do encéfalo.

O córtex pré-frontal está conectado as áreas de associação posterior, de


integração perceptual, com o córtex pré-motor, gânglios basais e cerebelo, a partir
dos quais exerce sua função de controle motor e dos movimentos, com o tálamo
e hipocampo, de grande importância na memória, e com o córtex cingulado, no
enriquecimento das experiências emocionais e para lidar com as incertezas.
Também exerce controle sobre a amígdala e o hipotálamo, no controle das funções
homesostáticas. O córtex pré-frontal parece determinar um mapa do córtex inteiro
através das suas inúmeras conexões, uma área de convergência para a produção
da consciência e da ideia de “eu” (GOLDBERG, 2002).

A área pré-motora, imediatamente anterior ao giro pré-central, corresponde


às áreas de programação motora, que são posteriormente conduzidas ao giro pré-
central, que é a área de execução motora. Esta região também, desempenha
papel no controle dos músculos lisos (involuntários) e do músculo cardíaco.

O córtex órbito frontal (entre as órbitas dos olhos) desempenha importante


papel no enriquecimento da experiência emocional, no reconhecimento das
emoções nas expressões faciais e, em conjunto com o giro cingulado, antecipa os
resultados danosos que os atos podem provocar.

89
Neurofisiologia

O córtex pré-frontal dorso lateral apresenta duas importantes funções


relacionadas ao hemisfério em que se encontra. O córtex pré-frontal dorso
lateral direito está particularmente envolvido na contagem do tempo. Quando
uma tarefa nova é apresentada, uma das funções desta área é determinar
quanto tempo deverá ser gasto na tarefa; e, o hemisfério direito é bastante ativo
quando realizamos uma nova tarefa. O córtex pré-frontal dorso lateral esquerdo
é o principal agente da memória de trabalho, um tipo especial de memória em
que determinamos à sequência dos eventos em uma dada tarefa, e o hemisfério
esquerdo é particularmente ativo durante as rotinas. A memória de trabalho coleta
as informações necessárias para fornecer respostas ao ambiente, selecionando o
que o organismo precisa.

Estas diferenciações entre os córtices pré-frontais direito e esquerdo revelam


muitas das especializações destes dois hemisférios. O hemisfério direito é o lado
mais emocional, mais lúdico também, é o nosso cérebro criativo, envolvido nas
habilidades artísticas como pintura e música (as relações feitas anteriormente
entre as áreas da linguagem do lado esquerdo – Broca e Wernicke - e suas
correlatas no hemisfério direito relacionadas à musicalidade). O hemisfério
direito é o lado mais estético do cérebro, e também a porção que tende a ver
a beleza do mundo, responsável também pela percepção de relações espaciais
e o reconhecimento de fisionomias. O hemisfério esquerdo é o nosso cérebro
mais racional, relacionado à linguagem (incluso a gramática) e ao pensamento
lógico-matemático. É o cérebro da rotina, o lado que representa o mundo real
em nossas mentes. Poderíamos traçar que, enquanto o hemisfério direito ficaria
contemplando a beleza do mundo de forma desordenada, o hemisfério esquerdo
ficaria chamando a atenção do indivíduo para as tarefas do dia, os compromissos
e como deveríamos proceder.

Taylor (2008), refere-se a estas diferenciações com uma crítica, argumenta


que desenvolvemos muito o hemisfério esquerdo e muito pouco o hemisfério direito.
Existe uma grande demanda por sermos racionais (o ideal grego e posteriormente
iluminista do homem racional em detrimento do emocional), por estarmos sempre
alertas e conectados ao mundo, por sermos rápidos e eficientes. Não somos
estas magníficas máquinas de computar, e ao menos metade de nossas mentes
corresponde a estruturas mais emocionais, mais necessitadas de um tempo
para contemplar o belo, a natureza, para “sair fora”, “sair do ar” e ficarmos mais
em sintonia com o entorno, como enfatiza a autora, esquecermos um pouco do
quanto individuais somos e relembramos do quão extensível são nossos corpos
do ambiente que nos cerca. Talvez, se nós educadores, quiséssemos ajudar
nossos alunos, estaríamos numa encruzilhada entre ensinarmos para o mundo
racional, tecnocrata e o mundo lúdico e criativo; educar para o individualismo e
educar para a compreensão de um todo interdependente. Devemos avaliar estes
possíveis caminhos enquanto educadores e traçarmos metas e encaminhamentos
em um meio termo entre estes dois possíveis “mundos” mentais.

90
Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

Atividades de Estudos:

1) Quais as áreas responsáveis pela compreensão e produção da


linguagem e onde elas se localizam?
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2) Cite três diferenças funcionais entre os hemisférios direito e


esquerdo.
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3) Sabemos que o hipotálamo está envolvido no controle dos


comportamentos motivados, e que a partir dele são produzidos
fatores de liberação hormonal e neurohormônios que atuam

91
Neurofisiologia

diretamente no comportamento sexual, alimentar, no sistema de


luta e fuga e no desenvolvimento e crescimento psicossomático.
De que forma o hipotálamo participa do controle glandular e dos
comportamentos motivados?
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4) O tálamo é constituído de dois lobos conectados por uma


substância cinzenta denominada massa intermédia. Em cada lobo
temos núcleos que recebem informações do sistema sensorial
e retransmitem estas informações para as áreas de projeção
do córtex e um núcleo que recebe informações do cerebelo e
transmite estas informações para o córtex motor primário. Como
o tálamo participa nos processos de atenção e na formação da
consciência?
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Capítulo 3 ESTRUTURA E FUNCIONAMENTO DO SISTEMA NERVOSO

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5) Conceitue os termos aferente e eferente e sua importância na


organização do sistema nervoso:
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Algumas ConsideraçÕes
Apresentamos neste capítulo uma organização sistemática do sistema
nervoso, com especial ênfase ao sistema nervoso central. O aluno deve ter em
mente a importância das estruturas reguladoras dos processos homeostáticos,
como o tálamo e o hipolálamo.

De especial interesse para o aluno são as áreas relacionadas à memória,


como o córtex pré-frontal dorso lateral esquerdo, participante da memória de
trabalho, o córtex pré-frontal como um todo, que tem papel especializado na
tomada de decisões, o hipocampo, relacionado à memória declarativa, de fatos e
dados, bem como os gânglios basais, que automatiza os padrões motores finos,
como uma memória motora.

O papel das áreas do cérebro relacionadas a Teoria da Mente merece um


destaque nos estudos por sua relação com a grande maioria dos problemas
relacionados a aprendizagem, como o autismo, asperger, TDAH e algumas formas
de dislexia, disgrafia e afasia.

Nosso próximo tópico vai tratar do desenvolvimento do sistema nervoso ao


longo da vida do organismo, e determinará a origem da organização estudada
neste capítulo.
93
Neurofisiologia

ReFerências
CARLSON, Neil. Fisiologia do comportamento. 7.ed. São Paulo: Manole, 2002.

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LEHRER, Jonah. Proust foi um neurocientista: Como a arte antecipa a ciência.


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MATURANA ROMENSIN, Humberto e VARELA GARCIA, Francisco J. A árvore do


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Imagem página 85: Continua a mesma referência, mas acredito que esteja em
melhor visualização e definição.

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TORTORA, G. J. & GRABOWSKI, S. R. Princípios de anatomia e fisiologia.


9.ed. Rio de Janeiro: Guanabara-Koogan, 2002. p.11.
94
C APÍTULO 4
Ontogênese do Sistema Nervoso

A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Promover uma idéia de desenvolvimento, ao longo da evolução da vida


e ao longo da história de vida do organismo, a partir dos conceitos de
desenvolvimento ontogenético e filogenético, neurogênese, exuberância e
lapidação sináptica e mielinização axônica.

 Identificar as diferentes fases de desenvolvimento e correlacionar com aspectos


inerentes ao processo de ensino-aprendizagem e o ambiente educacional.
Neurofisiologia

96
Capítulo 4 ONTOGÊNESE DO SISTEMA NERVOSO

ConteXtualização
No presente capítulo discutiremos os passos do desenvolvimento neural
e cognitivo, com base no estudado nos capítulos anteriores sobre os fatores
genéticos e ambientais envolvidos no desenvolvimento, as estruturas básicas do
sistema nervoso e a sua organização.

Você poderá pensar este capítulo de maneira cronológica, desde o período


embrionário e fetal e suas implicações para o futuro do organismo, até o início da
fase adulta, quando o cérebro e os sistemas atingem seu ponto mais avançado de
organização.

O cérebro de um recém nascido deverá ser pensado não como a tábula rasa
beconiana, mas antes disso, uma organização prévia que fornecerá os subsídios
estruturais necessários para as diferenciações cognitivas e comportamentais a
partir de suas experiências. Uma criança apresenta maiores potencialidades
de desenvolvimento que um adolescente ou adulto, mas a experiência de um
indivíduo maduro irá superar as capacidades de elaboração de respostas de uma
criança, mesmo em face de sua menor versatilidade. Durante a infância temos
potencialmente condições de especializarmos nosso cérebro em muitas direções,
fato este que durante a maturidade será enormemente limitada. Um bom exemplo
é o aprendizado da linguagem; uma criança aprenderá uma língua nova como se
fosse a sua mátria, e poderá aprendê-la sem sotaque ou entonações, enquanto um
adulto poderá aprender todo o corpo léxico de uma língua e suas particularidades
gramaticais, no entanto, estará fadado a pronúncia com sotaque da língua mátria.

Durante este capítulo você poderá perceber a importância do entendimento dos


processos e termos específicos do desenvolvimento neural, tais como exuberância,
lapidação e poda sináptica, mielinização axônica, termos fundamentais para saber
como agir frente ao aprendizado de diferentes faixas etárias.

Desenvolvimento EmBriolÓgico e
Aprendizagem
O sistema nervoso é uma das primeiras estruturas a emergir no desenvolvimento
do organismo. Revisaremos os passos até a ocorrência da neurogênese. Tudo
tem início com a fecundação, que é a união do material genético do macho (do
espermatozóide) com o material genético da fêmea, dentro da célula reprodutiva
feminina (óvulo). A segunda fase é uma massa de células que se proliferaram a
partir da célula ovo, ou ovo zigoto, denominada mórula (do latin significando amora,

97
Neurofisiologia

por ter formato semelhante ao fruto). A terceira fase é a formação da blástula,


cuja estrutura dá origem aos dois primeiros folhetos germinativos, os dois tecidos
embrionários, a ectoderma e a endoderma, e também será nesta fase que o embrião
se implanta na camada funcional do epitélio uterino. A quarta fase é a gastrulação,
na qual ocorre a formação do terceiro folheto germinativo, o mesoderma. Cada uma
destas camadas germinativas, ou tecidos embrionários originarão os tecidos do
indivíduo maduro; assim, a endoderma, que é a camada mais interna do embrião,
dará origem ao revestimento do epitélio gastrointestinal e o revestimento interno
da bexiga urinária. A mesoderma originará todos os tecidos de natureza conjuntiva
(derme, revestimento dos órgãos internos do corpo, músculos, tecido conjuntivo
ósseos, tecido conjuntivo cartilaginoso e adiposo, tecido conjuntivo denso).
Por último, a ectoderma, a camada mais externa, formará o tecido nervoso e os
apêndices e receptores nervosos localizados na pele.

A ectoderma sofre uma invaginação em direção à mesoderme, formando


o tubo neural e a crista neural, este formarão a medula espinhal e sua porção
anterior originará o encéfalo. A partir desta fase, designada por neurogênese, o
desenvolvimento do embrião ocorrerá tendo como eixo condutor o tubo neural e
o sistema nervoso primitivo do embrião. A próxima fase é a organogênese, que
é a formação dos órgãos internos do corpo. Daí em diante, o embrião começa a
adquirir um aspecto mais fetal, e passa a ser nutrido pela placenta e pelos vasos
do cordão umbilical, pois até então o mesmo era nutrido pelo saco vitelino.

A partir do terceiro mês gestacional o feto passa a sentir vibrações sonoras e


no quinto mês a audição está formada. Portanto, estimulações sonoras já podem
fazer parte do repertório de estímulos a ser submetido o feto.

Um aspecto importante do período embrionário é que a partir do sétimo mês


de vida gestacional o córtex passa a se tornar mais circunvoluto e se formam os
giros e dobras características do cérebro humano. Crianças nascidas pré-termo,
ou seja, antes das 40 semanas, são mais propensas a apresentar distúrbios como
TDAH, autismo, e em alguns casos, QI acima da média.

Próximo ao momento de parturição, muitos eventos importantes na formação


do cérebro acontecem. O primeiro deles é a apoptose neural, uma morte neural
programada de neurônios e diminuição do número de sinapses. Provavelmente,
estes respondiam pelos aspectos cognitivos do ambiente intrauteríno. Logo
após o nascimento, ocorrerá uma proliferação do número de neurônios, e um
dos eventos marcantes do desenvolvimento do cérebro, a migração neural. Os
neurônios localizados próximos aos ventrículos laterais (espaços preenchidos
pelo líquido cérebro espinhal na altura do telencéfalo, geralmente causadores da
hidrocefalia), auxiliados pelas células da glia, em especial os oligodendrócitos,
começam um processo de migração até o córtex cerebral, para formar as mais

98
Capítulo 4 ONTOGÊNESE DO SISTEMA NERVOSO

diversas áreas do cérebro. Provavelmente, uma migração em menor volume


faz com que os cérebros de crianças com TDAH, autismo, asperger e outras
disfunções cognitivas, incluso ai muitos tipos de afasias, dislexias e disgrafias
apresentem as respectivas áreas responsáveis pelas habilidades correlatas aos
distúrbios, menores ou ainda menos eficazes na transmissão sináptica.

Tomografias por emissão de pósitrons (PET – Scans) de bebês ao longo do


primeiro ano de vida demonstram bastante claramente a funcionalidade do encéfalo
em diferentes momentos, bem como, as habilidades possíveis de um bebê. Assim,
no primeiro mês de vida extrauterina, o bebê responde de forma muito emocional, o
que podemos deduzir de uma ampla e exclusiva atividade da amígdala durante as
tomografias. Aos 3 meses de idade as áreas da visão começam a ficar funcionais
e ativas, pois neste período o bebê começa a ter acuidade visual. Aos 6 meses as
áreas da visão estão bastante ativas e há aumento no funcionamento das áreas
motoras, bem como as áreas da linguagem. Aos 12 meses, as áreas responsáveis
pelo planejamento, todo o córtex somatosensorial e motor estão bastante ativos. As
áreas da linguagem estão bem formadas aos 12 meses de idade.

Com relação ao desenvolvimento da linguagem, até a década de 80 muito se


falava em período crítico, ou seja, um período em que a linguagem se estabelece
e passado esta fase não seria mais possível à aquisição da linguagem. Estudos
com uma menina que sofreu negligência e abuso e que se desenvolveu isolada
ao longo de 12 anos, sem se comunicar, num espaço mínimo de um porão
demonstrou que ela aprendeu a linguagem mesmo após este período, no que os
pesquisadores resolveram denominar de “período sensível” para a aquisição de
muitas habilidades, pois seria possível o aprendizado, mesmo que com certas
limitações (GAZZANIGA E HEATHERTON, 2005).
Em todas as
A linguagem é tópico interessante a ser discutido, pois ilustra culturas, no uso
bem como o cérebro amadurece e sua relação com a aquisição de de qualquer corpo
determinada habilidade. Neste sentido, os recém nascidos sabem léxico e mesmo
diferenciar a língua dos pais de outra língua, o que comprova a força do em crianças
aparato auditivo antes do nascimento. Por outro lado, o desenvolvimento com deficiências
de distinções de fonemas específicos apoia a teoria de que o potencial auditivas que
da linguagem é inato, mas moldado pela experiência. Até 3 meses os se comunica
sons são gritos, gorgolejos e grunhidos; de 3 a 5 meses: arrulhar e na linguagem
sorrir; dos 5 aos 7 meses: balbuciam usando consoantes e vogais; de 7 dos sinais, o
a 8 meses: balbuciam usando sílabas (ba-ba, dee-de-de); e com 1 ano, desenvolvimento
as sílabas são misturadas e a criança começa a adotar os sons e ritmos será na mesma
da língua nativa. Aos 18 meses as crianças passam a juntar palavras e sequência e
surgem as sentenças, ainda de forma rudimentar, no que o psicólogo apresentará
Brown (1996) denominou “fala telegráfica”. as mesmas
características.

99
Neurofisiologia

Este desenvolvimento é universal, ou seja, em todas as culturas, no uso de


qualquer corpo léxico e mesmo em crianças com deficiências auditivas que se
comunica na linguagem dos sinais, o desenvolvimento será na mesma sequência
e apresentará as mesmas características. Também a lateralidade cerebral
esquerda para o balbucio é um fenômeno universal: todos os bebês apresentam
assimetria direita da boca maior, lembrando que o hemisfério esquerdo manda os
comandos motores para o lado direito do corpo e vice-versa. Nos meses iniciais
do balbucio (6-7 meses) ele tende a ter o mesmo conteúdo; pais de bebes surdos
que utilizam linguagem dos sinais, os bebes fazem movimentos de mão idênticos
ao balbucio. As primeiras palavras são os performativos (sons semelhantes a
palavras aprendidos em um contexto, mas sem representar significado), e as
palavras verdadeiras (pretendem claramente representar conceitos). Entre 4 e 6
anos de idade é comum as crianças cometerem erros interessantes de linguagem,
pois existe uma sobreposição das regras gramaticais, o que demonstram que
as mesmas não apenas repetem o que adultos falam, mas que internalizam as
regras que permeiam a linguagem.

Noam Chomsky (apud VIOTTI, 2009) criou a idéia de uma gramática


universal, a partir dos conceitos de estrutura profunda, que são as regras
gramaticais básicas de todas as línguas conhecidas e de “dispositivo inato de
aquisição da linguagem”, representado pelos argumentos listados a seguir:

• embora os detalhes variem, a sequência similar de fases na aquisição da


linguagem sugere um mecanismo biológico universal;

• sensibilidade extremamente precoce do bebê para a linguagem indica um


componente inato da linguagem;

• bebês deficientes também apresentam capacidades lingusticas básicas;

• especialização dos aparatos humanos da fala e respiração;

• os esforços ativos da criança para dominar a linguagem, pois são usuárias


entusiásticas da linguagem.

Outro ponto controvertido no desenvolvimento cognitivo em crianças de 0 a


5 anos é a memória de fatos e dados, ou memória declarativa, como discutido
no capítulo 3, este tipo de memória está relacionado ao hipocampo, estrutura
que está totalmente formada apenas aos 3 anos de idade. Muito de terapias
alternativas tipo “regressão” e hipnose regressiva, parecem charlatanices quando
visualizamos aspectos da formação da memória.

100
Capítulo 4 ONTOGÊNESE DO SISTEMA NERVOSO

InFÂncia e EXuBerÂncia Sináptica


Durante os dois primeiros anos de vida do indivíduo um eixo neural-hormonal
está ativo, este eixo faz conexão entre o hipotálamo, com a hipófise, e os hormônios
hipofisários ativam as gônadas, é o eixo hipotálamo-hipófise-gônada, como
pode ser visualizada na figura 36. Quando o eixo está ativo as gônadas liberam
os hormônios sexuais: a testosterona, ou hormônio masculinizante, e o estrógeno,
ou hormônio feminilizante. A principal consequência desta ativação neural é o
processo de masculinização e feminilização dos cérebros. Estas diferenças fazem
com que ao final do processo tenhamos algumas áreas do cérebro sexualmente
dimórficas, por exemplo, as áreas responsáveis pelo reconhecimento de odores,
da linguagem, das noções de espaço e das preferências gerais que norteiam o
comportamento de meninos e meninas. Isso faz com que, a partir de dois anos os
meninos e meninas prefiram (geralmente) brincar com crianças do mesmo sexo, e
existe também aquele apego mais específico pelo parente de mesmo sexo, caso
especial dos meninos que preferem as brincadeiras mais truculentas dos pais do
que as brincadeiras mais tranquilas das mães.

Figura 36 – Eixo neuro-hormonal hipotálamo-hipófise-


gônadas, em seus diferentes estágios de ativação

Fonte: Herculano-Houzel (2005. p. 24).

101
Neurofisiologia

Eixo Hipotálamo-hipófise-gônadas: uma ativação da hipófise,


por parte do hipotálamo, que promove a liberação de fatores de
transcrição hormonal, fazendo com que as gônadas produzam e liberem
os hormônios sexuais testosterona e estrógeno.

Este processo é designado por poda neural, para transformar os cérebros


inespecíficos das crianças em cérebros especializados de cada sexo. Logo após
os dois anos este eixo neural fica desativo, fazendo com que as gônadas não mais
produzam os hormônios testosterona e estrógeno e dando início a um processo
designado por exuberância sináptica, a partir do qual ocorrerá uma razoável
expansão no número de sinapses e o cérebro cresce de volume vertiginosamente
até os 10 anos de idade. Isso irá caracterizar o cérebro da infância.

Exuberância sináptica: processo pelo qual ocorre um aumento


considerável no número de conexões entre os neurônios em
decorrência das estimulações que o indivíduo é submetido.

Concomitantemente, um cérebro que está na sua totalidade em expansão


necessita de estímulos amplos para seu desenvolvimento, não apenas de
estímulos específicos para torná-lo especializado para determinada tarefa.
Neste sentido, a brincadeira ocupa papel central, na medida em que proporciona
executar padrões motores que não serão utilizados diretamente, mas podem vir
a ser utilizados em futuras tarefas. A brincadeira é a melhor maneira
de treinar cérebros inespecíficos, cérebros que ainda não sabemos
A brincadeira
as escolhas que tomarão no futuro. A brincadeira tem como principal
é a melhor
característica a alternância de papeis, movimentos bruscos e repetitivos
maneira de
e ausência de finalidade, sua função é treinar papeis e padrões motores
treinar cérebros
que seriam perigosos se executados nos comportamentos específicos
inespecíficos,
aos quais se remetem. (VIEIRA; SARTORIO, 2003). Neste sentido, a
cérebros que
criança não brinca de lutinha para se tornar um boxeador, mas para
ainda não
aprender a evitar a luta, aprender a ceder e mediar os conflitos. Se
sabemos as
a brincadeira não apresentar alternância de papeis deixa de ser
escolhas que
brincadeira e se transforma na luta em si, este é um bom critério para
tomarão no
avaliação da brincadeira por professores(as) nas série iniciais, quando
futuro.
a diferença entre brincar de lutinha e a briga são muito tênues.

102
Capítulo 4 ONTOGÊNESE DO SISTEMA NERVOSO

Exemplos de crianças prodigiosas são muito elucidativos da exuberância


sináptica, e duas crianças em especial são boas de citar. Uma delas é o
Ronaldinho Gaúcho; que durante a infância driblava mesas, cadeiras, o cachorro,
o pai; um aficionado com o futebol, o irmão mais velho, jogador do Grêmio
portoalegrense. Todo o contexto bastante positivo e motivador, aliados a uma
inteligência sinestésica provavelmente herdada, tendo em vista a habilidade do
irmão, também jogador de futebol e ao exercício amplo e irrestrito relacionado
ao futebol possibilitaram uma miríade de conexões sinápticas próprias para o
desenvolvimento da percepção, motricidade, velocidade e técnica. Muito desta
inteligência sinestésica, que é a inteligência relacionada ao corpo em movimento
no tempo e no espaço, também pode ser encontrada em musicistas.

O outro exemplo vem, portanto, da música, com o jovem Mozart, que foi
criado em um ambiente musical, sendo seu pai compositor dava aulas para a
filha mais velha, enquanto Mozart, com apenas 4 anos ensaiava suas primeiras
composições. A família materna de Mozart também apresentava habilidades
musicais. Enquanto seu pai compunha e ensinava a filha em um instrumento
denominado cravo, o pequeno Mozart era embalado na perna acompanhando
o embalo; o movimento da perna, as estimulações sonoras e o ambiente
emocionalmente rico na casa da família constituíram estimulações amplas no
desenvolvimento da prodigiosa rede neural para a musicalidade no cérebro do
infante Mozart. O pai de Mozart, Leopold, percebendo a prodigalidade do filho
passou então a lecionar aulas ao pequeno compositor, deixando de lado seus
demais afazeres e formatando uma técnica para ensinar música. Um cérebro
preparado biologicamente, uma educação formal bastante diretiva para a música
e um ambiente emocional rico e motivador (todos gostamos de aplausos e
recompensas) e temos um indivíduo excepcional na inteligência musical. Vale
aqui lembrar que, em termos cognitivos, a excelência se adquire cedo.

Adolescência: Lapidação Sináptica e


Mielinização AXÔnica
O processo que forma uma grande massa de conexões sinápticas durante a
infância apresenta seu ápice durante os 8 a 10 anos de idade, quando começa a
se estabelecer o período da pré-adolescência, este momento já nos alerta de que
transformações dramáticas no corpo e no cérebro irão acontecer.

Até o século XIX, a adolescência se estabelecia em termos biológicos aos


16, 17 anos, socialmente, era um fenômeno bastante negligenciado pelo ocidente,
tendo em vista que mesmo antes de deixar de ser criança muitas pessoas já
estavam no mercado de trabalho. Esta idade caiu para 12,5 anos no Brasil durante
a década de 1970 e parece estar ocorrendo cada vez em mais tenra idade.
103
Neurofisiologia

O corpo de meninos e meninas começa a armazenar energia na forma de


lipídios na camada de pele denominada hipoderme, cujos adipócitos, células
especializadas em armazenar ácidos graxos e triglicerídeos, aumentam o seu
volume. Isso já pode ser visualizado durante a pré-adolescência. Com mais lipídios
armazenados na hipoderme deve haver um mecanismo para comunicar isso ao
cérebro, como as moléculas de lipídios são muito grandes para passar a barreira
hematoencefálica, àquela barreira entre o sangue e o tecido nervoso, produzida
pelos capilares sanguíneos e pelos astrócitos, uma outra molécula denominada
Leptina, produzida pelos adipócitos à medida que acumulam lipídios, passa a
barreira e informa o hipotálamo destas reservas.

O hipotálamo, como discutido em outros tópicos do caderno de estudos, é


a porção do diencéfalo que controla todas as glândulas do corpo, e que, graças
ao aumento da leptina passa a reativar o eixo Hipotálamo-hipófise-gônadas, ativo
no início da infância. Mais lipídios, mais leptina, significa um corpo preparado
para uma gestação e o cuidado das crias no caso das meninas e um
Mais lipídios, corpo preparado para defender o território, competir pelo acesso às
mais leptina, fêmeas e mesmo a dominância do bando. No entanto, maior exposição
significa um corpo e estimulação erótica podem diminuir a Idade Média da menarca em
preparado para meninas, bem como fatores genéticos são determinantes da faixa etária
uma gestação em que adolescentes de ambos os sexos apresentam a puberdade
e o cuidado das (SISK E FOSTER, 2004).
crias no caso das
meninas e um O fenômeno da adolescência estabelecido leva a alteração brusca
corpo preparado e extensa do corpo e da mente. Em um primeiro momento a ativação
para defender o do eixo hipotálamo-hipófise-gônadas propicia a produção e liberação
território, competir de testosterona nos meninos e de estrógenos nas meninas, de grande
pelo acesso às relevância para determinar os caracteres sexuais secundários próprios
fêmeas e mesmo desta faixa etária. Os meninos passam a produzir espermatozóides, a
a dominância do testosterona define melhor os músculos (maior síntese de proteínas)
bando. promove também o espessamento das cordas vocais, o aumento
de pelos nas pernas, região pubiana e aparecimento da barba, uma
agressividade em relação a outros machos aumentada, bem como um
A ativação do desejo por sexo. Nas meninas, a ativação do eixo promoverá a menarca,
eixo hipotálamo- a primeira menstruação, desenvolvimento de pêlos na região pubiana
hipófise-gônadas principalmente, aumento dos seios e dos quadris, uma maior síntese
propicia a de lipídios e aumento do desejo sexual. Um estirão do crescimento é
produção e comum neste período. Em termos neurais as principais ocorrências são
liberação de as podas sináptica, uma perda de até 30% dos neurônios e sinapses
testosterona nos e a mielinização axônica proeminente nas áreas mais utilizadas
meninos e de (HERCULANO-HOUZEL, 2005; GIEDD et. al., 1999) como pode ser
estrógenos nas visto no esquema da figura 37.
meninas.

104
Capítulo 4 ONTOGÊNESE DO SISTEMA NERVOSO

Poda sináptica: redução de até 30% na quantidade de sinapses


em diferentes áreas do cérebro em decorrência de uma necessidade
por especialização, própria da adolescência. Ela será seguida de
um aumento proeminente da bainha de mielina, principalmente dos
axônios das conexões sinápticas em maior atividade no cérebro do
adolescente.

Figura 37 – Representação esquemática dos processos de


exuberância sináptica da infância, poda sináptica da adolescência e
a mielinização axônica entre a adolescência e a fase adulta

Fonte: Friedrich e Preiss (2006, p. 55).

O estirão do crescimento que marca a adolescência no seu início promove


uma perda da identidade corpórea. Isso ocorre por termos na região do córtex
parietal o mapa somatotópico, um mapa cortical da topografia do nosso corpo.
O corpo muda de configuração mais rápida do que o cérebro tem condições de
mapear, e a representação do corpo no cérebro fica reduzida em proporção às
diversas partes do corpo. As consequências são os desastres na mesa do jantar,
pois o cérebro comanda um braço e uma mão maiores do que os representados
por ele, e são comuns os adolescentes derrubarem coisas à mesa. O andar
desajeitado de muitos adolescentes, e a postura por vezes arqueada de gente
que cresce rápido e vertiginosamente também são característicos deste momento
do desenvolvimento. De forma similar às mulheres grávidas esbarram o ventre
com frequência nos objetos e móveis, pois a representação do ventre na mente é
diferente da extensão e formato do mesmo.

Adolescentes adeptos de esporte com regularidade e que tocam algum


instrumento musical irão superar esta perda da identidade corpórea mais rápida,
105
Neurofisiologia

pois o cérebro promove com mais sintonia e agilidade o ajuste das representações
que forma do corpo. O comportamento corriqueiro de se prostrar na frente do
espelho verificando cada pedaço do rosto e do corpo parece estar em sintonia
com esta necessidade de ajuste de uma imagem corpórea, os meninos verificando
a espessura e rigidez dos músculos e as meninas atestando o formato e tamanho
dos seios, pernas e nádegas, e ambos os sexos olhando muito o rosto, agora um
pouco transformado e muitas vezes com as famigeradas espinhas e cravos que
tanto mal fazem para a auto-estima já ferida de um corpo que não é mais o de
criança, mas que tampouco é de um adulto; um corpo em transformação radical.

Juntamente com a perda da identidade corpórea e amplificada por esta,


ocorre a perda da identidade social. O adolescente não é mais criança e ao
mesmo tempo é tratado por muitos como o sendo, também não é ainda adulto e
apresenta desejos e necessidades parecidos com um adulto. O estabelecimento
de uma identidade social ocorre principalmente no contato com outros de sua
mesma faixa etária, o que pode ser inferido do ponto de vista evolucionista.
No passado primitivo humano e em muitas outras espécies de mamíferos, os
indivíduos juvenis do bando devem dispersar, formando novos bandos ou ainda
migrando para bandos já estabelecidos. Isso ocorre em particular quando meninos
passaram a produzir espermatozóides e a desafiar a hierarquia e mesmo ameaçar
o acesso privilegiado de outros machos adultos a sexo. O mesmo ocorrendo com
as meninas que deveriam competir por recursos para seus futuros filhotes, caso
viessem a acasalar com os machos do bando.

A puberdade e o período da adolescência são momentos decisivos


A puberdade para ser convidado a se retirar do bando, isso explica em muitas medidas
e o período da a necessidade que os jovens têm de formar grupos (as tribos urbanas
adolescência são exemplos marcantes deste comportamento) e também, o motivo
são momentos pelo qual muito se escondem quando estão em público com seus pais
decisivos para ser e são vistos por um colega, o que lhes parece uma vergonha, afinal:
convidado a se “está pensando que eu ainda sou criança”. Muitos dos comportamentos
retirar do bando, de revolta apresentados pelos adolescentes retratam uma necessidade
isso explica em neural de criar a sua visão de mundo e não mais incorporar a visão
muitas medidas a de mundo dos pais e das gerações agora “ultrapassadas”. As tribos
necessidade que urbanas refletem esta necessidade por espaço, por uma ideologia.
os jovens têm de A música parece ter um efeito também mediador deste processo na
formar grupos. medida em que movimenta o corpo por meio da dança, melhorando
a imagem corpórea, e se for a alto som e na companhia dos amigos,
melhor, pois facilita esta integração entre imagem corpórea e imagem social, o
que lembra a frase que acompanha todos os discos da banda Legião Urbana:
“ouça no volume máximo”.

Uma das consequências mais fortes da adolescência é a perda de até 30%


das sinapses do núcleo acumbente, área do córtex relacionada ao prazer. Esta

106
Capítulo 4 ONTOGÊNESE DO SISTEMA NERVOSO

redução considerável de sinapses dopaminérgicas faz com que o adolescente


se engaje nos chamados comportamento de risco, relacionados aos prazeres
consumatórios: não basta pensar em sexo, tem que fazer sexo, não dá mais
prazer brincar de roda, mas sim esportes radicais, aquela transa em um lugar bem
perigoso, correr em alta velocidade de carro e o uso de drogas psicoestimulantes,
principalmente cocaína e anfetaminas. Ou seja, 30% menos sinapses do prazer
significa atividades que possam liberar uma quantidade maior de dopamina para
suprir as demandas de um cérebro carente. As principais consequências é o que o
jovem passa a procurar novidades, passa a procurar os riscos que o conduzirão a
fase adulta, caso contrário nosso cérebro continuaria fazendo as mesmas coisas
da infância e não amadureceria. Outra característica disso é o tédio e a falta
de motivação da idade; é necessária maior estimulação para ativar um cérebro
carente de prazer.

A diminuição das áreas de recompensa do cérebro expõe os adolescentes


aos comportamentos impulsivos próprios da idade, mas principalmente ao uso
de drogas de abuso, entre elas o álcool, já discutido no capítulo 1, as drogas
estimulantes, que aumentam as concentrações de dopamina na fenda sináptica
e o tabaco, que coopta amplas áreas do cérebro, incluindo os sistemas de
recompensa e apresenta alto potencial aditivo.

Por último, a adolescência é marcada pelo processo de mielinização axônica,


ou seja, depois da poda sináptica é chagada a hora de reforçar aquelas vias
neurais que continuaram a ser usadas, afinal, se estão sendo usadas deverão
continuar servindo no futuro. Um bom exemplo para se fixar estes processos de
desenvolvimento neural é a busca pelo prazer, se aprendemos desde pequeno a
sentir prazer com coisas simples, formamos sinapses para estes prazeres, mesmo
que diminua a quantidade destas no cérebro adolescente, as que sobram podem
ser mielinizadas, portanto, reforçadas e mais rápidas ao longo do processo,
originando adultos também mais simples nas suas buscas pelo prazer.

A adolescência será um período de exercícios de tudo aquilo que nós


seremos na fase adulta, um período de maturação das vias neurais construídas
ao longo da infância e um instante para delegar um segundo plano para aquilo que já
não havia sido muito estimulado durante o início do processo. Neste sentido, há um
jargão em neurociências de que “menos é melhor”, que vale também para a memória,
num sentido de que precisamos “esquecer para lembrar”.

Para Giedd (1999) e seus colaboradores, a adolescência num sentido


neural pode se estender até os 30 anos de idade, momento no qual o córtex pré-
frontal e as áreas de tomadas de decisões sofrem por último seus processos de
mielinização. É quando conseguimos antecipar os resultados danosos dos nossos
atos e projetar nossas vidas a longo prazo.

107
Neurofisiologia

Algumas ConsideraçÕes
Ponderamos alguns aspectos relevantes para a formação do sistema nervoso
e o desenvolvimento cognitivo. O educador deve ter em mente estas etapas, não
como uma regra, mas como princípios norteadores de sua prática educativa.
Regras não existem em biologia, nem leis, apenas uma probabilidade de que
aquele fenômeno se estabeleça desta ou daquela forma. No desenvolvimento,
a noção antes postulada de idades não é muito realística, mas sim uma fase ou
período em que alguns processos se estabelecem.

A brincadeira durante a infância e as novidades durante a adolescência devem


ser levadas em consideração para o sucesso do processo de aprendizagem, pois
indicam as estratégias e caminhos a serem seguidos durante as relações do
ambiente educacional. É de fundamental importância aproveitar estes conceitos
básicos para refletir e buscar alternativas na sua prática pedagógica.

ReFerências
BROWN J. et al. A defect in nurturing in mice lacking the immediate early gene
Fos β. Cell, n. 86, p. 1-20, 1996.

FRIEDRICH, G.; PREISS, G. Educar com a cabeça. Viver: Mente e Cérebro, ano
XIV, n. 157, p. 50-57, 2006.

GAZZANIGA, M.; HEATHERTON, T. Ciência psicológica: mente, cérebro e


comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005.

GIEDD, J. N.; BLUMENTHAL, J.; Jeffries N. O.; CASTELLANOS, F. X. et al. Brain


development during childhood and adolescence: a longitudinal MRI study. Nature
Neuroscience, n. 2 p. 861-863, 1999.

HERCULANO-HOUZEL, Suzana. O cérebro em transformação. Rio de Janeiro:


Objetiva, 2005.

SISK, Cheryl L.; FOSTER, Douglas L. The neural basis of puberty and
adolescence. Nature Neuroscience, vol. 7, n. 10, p. 1040-1047, 2004.

VIEIRA, M. L. ; SARTORIO, R. ; MELO, A. F. F. . Análise comparativa do


desenvolvimento comportamental e físico de filhotes em três espécies de
roedores com diferentes sistemas de cuidado à prole. Revista de Etologia, São
Paulo, v. 5, n. 2, p. 75-89, 2003.

VIOTTI, Evani. Temática 3: a língua para Noam Chomsky. Disponível em:


< https://goo.gl/Nff1wN >. Acesso em: 27 fev. 2009.
108
C APÍTULO 5
Neurociências e Educação

A partir da concepção do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Definir os conceitos centrais das ciências cognitivas como memória, atenção,


emoções e motivação e sua relação com a aprendizagem.

 Solucionar problemas e desenvolver estratégias para os problemas enfrentados


no dia a dia do educador a partir de estudos de caso nos mais diferentes
ambientes de aprendizagem, formais e não formais, utilizando as ferramentas
das neurociências.
Neurofisiologia

110
Capítulo 5 NEUROCIÊNCIAS E EDUCAÇÃO

ConteXtualziação
Este é o último capítulo do caderno de estudos, mas como podemos notar ao
longo do texto, a complexidade sobre a qual a aprendizagem esta estabelecida
faz com que nossos estudos tenham apenas iniciado. Neste último tópico vamos
aplicar alguns dos pressupostos básicos dos capítulos anteriores a questões
pertinentes da psicologia e da neurociência.

Aquilo que denominamos por memória consciente é estabelecida em torno de


3 anos de idade, este ponto é importante, pois muitos usam supostas memórias
para desenvolver teorias e práticas terapêuticas duvidosas. Também é importante
destacar que somente após o estabelecimento da memória de fatos e dados é que
a aprendizagem simbólica, necessária a alfabetização e ao conhecer-se como ser
individual no mundo é possível.

Também a motivação é tema que merece destaque em nossos estudos, pois


permeia todo o processo de ensino e aprendizagem. Dois pontos são importantes
para iniciarmos esta discussão: um, que devemos valorizar o esforço e não
capacidades inatas e prévias do indivíduo, e em segundo, a motivação extrínseca,
os incentivos que damos para os alunos, deve estar relacionada àquilo que se
está querendo premiar. Não devemos dar uma bicicleta ao filho por este ter
passado de ano, o passar de ano é o prêmio em si, a motivação intrínseca deverá
ser o próprio prêmio.

Por último, os aspectos emocionais envolvidos na aprendizagem. Devemos


criar um ambiente emocional rico, que produza vínculos fortes, a sala de aula deve
ser a sala de aula do educando e o professor deve ser um parceiro preocupado
com o porvir do aluno, o aluno deve entender e validar os vínculos emocionais
com o ambiente e componentes próprios da aprendizagem, é o que chamamos
de “amor intelectual”, o amor que pode unir pessoas de famílias, faixas etárias e
por vezes, posições sociais diferentes, um amor que tem como ponto relacional a
vontade de aprender.

MemÓria e Aprendizagem
A mais primitiva das memórias ao longo da história de vida do indivíduo é a
memória emocional, que começa a ser constituída ainda no ventre e é bastante
ativa e funcional no recém nascido. A sede desta memória é a amígdala e ela
é considerada uma memória implícita, por não poder ser lembrada de forma
consciente, ou ainda não declarativa, pois não é possível uma descrição verbal

111
Neurofisiologia

dos eventos e fatos armazenados na mesma. Todavia, esta memória influencia e


muito nos medos e demais emoções expressas pelo organismo, bem como nas
suas tomadas de decisões.

Um segundo tipo de memória não declarativa ou implícita é a memória


motora, aquela necessária para mover os dedos sobre o teclado ao digitar um
texto ou aquela utilizada para trocar de marcha ou pronunciar uma proposição.
Os aspectos motores envolvidos neste processo não são declaráveis e os
procedimentos são muitas vezes automatizados.

A memória de trabalho, ou memória processual, é um meio termo entre


a memória declarativa e a não declarativa. Esta memória está envolvida na
sequência de tarefas e o tempo que deve ser gasto em cada uma delas. O
hemisfério cerebral esquerdo está particularmente envolvido no uso deste tipo de
tarefa, uma vez que é nele que se estabelecem as rotinas. A área mais específica
responsável por este módulo cognitiva é o córtex pré-frontal dorso lateral
esquerdo. Importante salientar que a mesma área correlata do hemisfério direito
é responsável pela contagem do tempo. Quando executamos uma tarefa pela
primeira vez o hemisfério direito, responsável pelas novidades estima o tempo
necessário para a tarefa, bem como a sequência de passos a ser realizado. À
medida que ficamos habituados com a tarefa e sua sequência passamos esta
função para o córtex pré-frontal esquerdo.

Muitos pais questionam o motivo pelos quais seus filhos não conseguem
executar uma sequência de tarefas pela manhã, por exemplo, acordar, arrumar
a cama, escovar os dentes, fazer o desjejum, escolher os materiais necessários
para as aulas e demais atividades do dia, e sempre reclama que seus filhos
esquecem alguma coisa. Muitas vezes, os pais não permitem que seus filhos
errem, e apresentam certo grau de ansiedade. Faz-se necessário deixar que a
criança execute o trabalho, mesmo que cometa erros, e repetidas vezes, caso
contrário, não sofrem o processo discutido no capítulo 4 de exuberância sináptica,
e permanece o módulo para memória de trabalho com poucas conexões. Um
cérebro pouco conectado é um cérebro que terá mais dificuldades durante a poda
sináptica própria da adolescência e menos capaz na fase adulta. Portanto, o
treino, o ensaio e erro, as repetições, perfazem a excelência de uma memória de
trabalho. Isso pode ser treinado em qualquer atividade que os ganhos cognitivos
servirão para todas as modalidades de trabalho futuros.

A memória declarativa, também denominada memória explicita ou consciente,


é a discutida no capítulo 3 sobre o hipocampo. Apesar de designarmos esta
área como a responsável pela memória, não existe uma sede propriamente dita
desta modalidade de memória, amplas áreas do córtex estarão envolvidas no
armazenamento das informações, dos fatos e dados relacionados à memória

112
Capítulo 5 NEUROCIÊNCIAS E EDUCAÇÃO

declarativa. O hipocampo tem a função, principalmente durante o sono REM,


o sono com sonhos e durante o sono profundo, de processar as informações e
consolidar as mesmas no cérebro (GAZZANIGA IVRY; MANGUN, 2006).

A memória declarativa, ou memória de fatos e dados, pode ser subdividida em


duas modalidades diferentes: a memória semântica, que resgata, via linguagem,
dados e fatos importantes do dia a dia e a memória episódica ou autobiográfica,
que representa a história de vida do organismo, também via linguagem. O que
não podemos explicar não pode ser lembrado, sendo a linguagem um aporte
fundamental para o pensamento (PINKER, 2008).

Muito tem sido discutido sobre memória, nas 3 últimas décadas, e


O sono tem
ainda parece uma área limítrofe no desenvolvimento das neurociências,
importância
drogas têm sido testadas para melhorar a memória e aspectos éticos
fundamental na
do uso deste tipo de medicamento podem ser questionados. O sono
aquisição da
tem importância fundamental na aquisição da memória, um cérebro que
memória, um
dorme pouco é um cérebro que lembra pouco. Na adolescência, fase
cérebro que
em que os indivíduos dormem tarde e muitas vezes acordam cedo para
dorme pouco é
ir à escola temos problemas sérios relacionados à falta ou dificuldades
um cérebro que
na memória, e vale salientar que agravante fenômeno para a diminuição
lembra pouco.
das horas de sono durante a infância e a adolescência é a internet e os
vários chats e sites de relacionamentos.

Outro fator negativo para a memória é o estresse. Neurônios da formação


hipocampal morrem quando o indivíduo está submetido a estresse crônico. A
neurogênese (nascimento de novos neurônios) adulta ocorre amplamente na
região hipocampal durante os períodos mais amenos, com pouco estresse.

A memória de trabalho e a memória declarativa podem, e devem,


ser estimuladas pelos educadores em sala de aula. Os exercícios de
fixação, muitas vezes negligenciado pelos educadores, devem estar
em pauta nas salas de aula e nas reuniões pedagógicas, bem como,
nos planejamentos dos professores. Sem treino, não há consolidação
de conhecimentos e hábitos. O mesmo ocorre com a memória
motora, o que os criticados cadernos de caligrafia representavam um
ganho cognitivo, pois, o treino motor leva a excelência. Os diários e
agendas poderiam servir de aportes para o exercício da memória, já
que temos, na maioria, estímulos visuais como os principais meios
de armazenar informações.

113
Neurofisiologia

Motivação
A motivação pode ser conceituada como um conjunto de fatores
que energizam, dirigem ou sustentam comportamentos (GAZZANIGA E
HEATERTHON, 2005). Existe um conjunto de comportamento controlado
pelo hipotálamo que chamamos de comportamentos motivados, ou seja, que
necessitam de um motivo para acontecer: fome para comer, sede para beber,
abstinência para sexo, sono para dormir e assim por diante. Neste sentido, a
motivação está diretamente relacionada com homeostasia, conceito discutido no
primeiro capítulo deste caderno de estudos que representam a tendência de as
funções corporais manterem o equilíbrio.

Maslow (1943) propôs uma teoria sobre as necessidades relacionadas às


motivações, designada por “Pirâmide das necessidades de Maslow” (Heylighen,
1992). Na base da pirâmide temos as necessidades fisiológicas, depois a
segurança, depois pertencimento e amor, no quarto patamar da pirâmide a estima
e por último a auto-realização. Interessante notar que para alcançarmos os pontos
mais altos é necessário antes satisfazer os degraus anteriores.

Motivação
extrínseca, são
objetos externos
para os quais
a atividade
está sendo
desenvolvida,
como uma
recompensa.
Um conceito central no entendimento da motivação é o de impulso,
Motivação enquanto estados fisiológicos que motivam o organismo a satisfazer
intrínseca, se suas necessidades, e o que promove a ativação fisiológica é a
refere ao valor excitação (arousal) como a atividade cerebral aumentada (GAZZANIGA
ou os prazeres E HEATERTHON, 2005).
relacionados
imediatamente Importante para o educador é compreender a diferença entre
com a atividade, motivação extrínseca, que são objetos externos para os quais a
sem objetivo atividade está sendo desenvolvida, como uma recompensa (se passar
ou propósito de ano ganhará uma bicicleta, se for bem à prova ganhará horas no
biológico vídeo game) e a motivação intrínseca, que se refere ao valor ou os
aparente. prazeres relacionados imediatamente com a atividade, sem objetivo
ou propósito biológico aparente (o aluno estuda porque isso estimula
114
Capítulo 5 NEUROCIÊNCIAS E EDUCAÇÃO

seu cérebro, lê literatura porque gosta de viver as estórias). Os comportamentos


intrinsecamente motivados ocorrem por si mesmos. Sempre que fornecemos
incentivos (motivação extrínseca) que não estejam relacionados também eles
com a atividade em si, isso enfraquece a motivação intrínseca (uma bicicleta por
passar de ano enfraquece o fato de que passar de ano é um grande prêmio em
si). Outro fator importante relacionado à motivação, é que não devemos elogiar
uma habilidade, já anteriormente conquistada ou inata, devemos elogiar o esforço
desempenhado na tarefa em si; elogios pela inteligência acima da média de um
aluno pode fazê-lo pensar que não precisa estudar ou se esforçar. E assim, criar
uma maneira enganosa de interpretar os resultados, o que ocasiona problemas de
estima posteriores, quando as tarefas se tornam mais complexas e o esforço se faz
necessário; fenômeno muito comum na 7ª série, ou 8º ano do Ensino Fundamental,
quando os conteúdos, nas áreas das ciências se torna mais complexo e se misturam
a miríade de transformações já discutidas, próprias da adolescência.

Nutrição CereBral e Estimulação


Neural
Chegamos neste tópico, ao fim do nosso caderno de estudos. Muito pode
ser discutido e criticado neste item sobre as merendas escolares oferecidas pelo
poder público e mesmo o que é disponibilizado nas cantinas de nossas escolas
(particulares ou públicas), geralmente uma dieta rica em calorias, mas pobre em
micronutrientes.

Primeiro ponto a ser estabelecido é o consumo do ácido alfalinolênico


(omega 3) presente nos peixes, frutos do mar, sementes e amêndoas. Este lipídeo
é essencial para a formação da bainha de mielina, juntamente com a vitamina D,
metabolizada a partir da exposição ao sol. Esta vitamina auxilia na fixação dos
lipídios junto à bainha de mielina; e, é produzida pelos melanócitos, as células da
pele responsável pela coloração. Esta vitamina também, auxilia na calcificação
dos ossos e está relacionada a osteoporoso.

No hemisfério norte (Escandinávia, Noruega e demais países nórdicos)


temos um ciclo de 6 meses de claro (verão) e 6 meses de escuro (inverno), ao
final do período de inverno ocorre epidemias de suicídio, pois o cérebro menos
mielinizado devido a baixa exposição à luz solar (diminuição da vitamina D) deve
retirar de algum lugar o nutriente, como o organismo é ecológico, ele vai retirar
das áreas que regulam o humor, pois não pode tirar das áreas motoras ou de
sobrevivência do organismo. O mesmo ocorre em 70% dos casos de depressão
pós-parto, devido às necessidades nutricionais do bebê, ele retira muito da bainha
de mielina no cérebro das mães. Muito deste transtorno poderia ser evitado com

115
Neurofisiologia

uma dieta rica em omega 3 e sol. Também a vitamina B12 (presente nas folhas
verdes das hortaliças) participa ativamente da formação da bainha de mielina,
portanto, está relacionada a aspectos cognitivos, enquanto a bainha de mielina
melhora e aumenta a velocidade de condução do impulso elétrico no neurônio.

A acetilcolina é um neurotransmissor importantíssimo na consolidação da


memória, bem como no sono REM, ela é composta de dois componentes, um
agrupamento acetil, e de colina, uma substância encontrada em abundância
no ovo, uma dieta com ovos 3 vezes na semana parece ser o indicado
(CALLEGARO, 2006).

Por outro lado, os açúcares de rápida absorção (presentes no


Os açúcares de
chocolate, refrigerantes e doces) provocam uma excitabilidade rápida
rápida absorção
ao cérebro e depois uma sonolência, deixando o organismo inabilitado
(presentes
para o estudo. As massas e carboidratos são excelentes nas primeiras
no chocolate,
refeições do dia, pois o cérebro necessita dos mesmos para iniciar as
refrigerantes
atividades. Os carboidratos de melhor qualidade são os encontrados
e doces)
nas frutas, legumes, como a batata, a cenoura e a beterraba e nos
provocam uma
cereais (arroz).
excitabilidade
rápida ao cérebro
Quanto às estimulações amplas do cérebro, as atividades físicas
e depois uma
estão em primeiro lugar. Elas diminuem a ação do estresse oxidativo
sonolência,
(que é a ação do oxigênio – radicais livres - não utilizado pelas células
deixando o
e que oxida moléculas orgânicas). A vitamina C ajuda a diminuir os
organismo
níveis deste oxigênio “ruim”, mas a atividade física é um bom redutor
inabilitado para o
do estresse e pode ser utilizada intercalada com a matemática, ou o
estudo.
estudo de línguas (é óbvio que se faz necessário um tempo entre a
atividade física, geralmente também lúdica, e as aulas de conteúdo
lógico-matemático ou linguístico).

Por último, manter pensamentos positivos, rezar/orar, meditar, fazer


trabalhos voluntários ou ajudar nas tarefas de casa, além de preparar as crianças
e adolescentes para a vida adulta, possibilitam estimular áreas do cérebro
relacionadas à sociabilidade, ajudam na diminuição do estresse e participam na
melhoria da resposta imunológica.

Atividade de Estudos:

1) A partir de pesquisa na internet e com base no caderno de estudos,


elabore uma dieta para a merenda escolar, de segunda a sexta,
que seja ideal para um bom rendimento nos estudos e uma boa

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Capítulo 5 NEUROCIÊNCIAS E EDUCAÇÃO

aprendizagem. Posteriormente, compare com a merenda que é


oferecida em alguma escola da sua comunidade.
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Algumas ConsideraçÕes
Chegamos aqui ao final dos estudos de neurofisiologia. Nosso último tópico
ressaltou a importância de uma boa nutrição para a aprendizagem, espero ter
fornecido dicas que possam alterar o cotidiano da merenda de algumas escolas
nas quais o aluno tenha influência.

Espero muito sinceramente que tenha de alguma forma motivado e incitado o


aluno a buscar mais conhecimento e informação na área da biologia e que tenha
dado os subsídios necessário para avançar.

De alguma forma, mesmo que na distância virtual do texto e do DVD, escrevi


pautado pelo sentimento que tenho durante as aulas presenciais, ministrado ao
longo dos poucos anos de docência, um sentimento que no início do capítulo
destaquei como “amor intelectual”. Mesmo nas dificuldades conceituais que
permeiam a neurofisiologia, as dificuldades próprias dos grandes amores e
das grandes conquistas, o ambiente virtual que aqui finda é local para vínculos
emocionais sinceros de transformação dos seres durante a aprendizagem,
transformação profunda de nossa realidade que hora é mente, hora é corpo.

Bom trabalho e uma boa construção de saberes ao longo do curso!!!

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Neurofisiologia

ReFerências
CALLEGARO, J. N. Mente criativa: a aventura do cérebro bem nutrido.
Petrópolis: Vozes, 2006.

GAZZANIGA, M. S.; HEATHERTON, T. F. Ciência psicológica: mente, cérebro e


comportamento. Porto Alegre: Artmed, 2005.

GAZZANIGA, M., IVRY, R. B., MANGUN, S. Neurociência cognitiva: a biologia


da mente. Porto Alegre: Artmed, 2006.

HEYLIGHEN, F. A cognitive-systemic reconstruction of Maslow´s theory of self-


actualization. Behavioral science. v. 37, 1992b, pp.39-57.

PINKER, S. Do que é feito o pensamento: a língua como janela para a natureza


humana. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.

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