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AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 2121159 - SC (2024/0028356-3)

RELATOR : MINISTRO FRANCISCO FALCÃO


AGRAVANTE : ESTADO DE SANTA CATARINA
ADVOGADO : FELIPE WILDI VARELA - SC020548
AGRAVADO : MIGUEL ANTONIO KOVALESKI
AGRAVADO : NEUSA APARECIDA MIOTTO KOVALESKI
ADVOGADOS : GÉLSON JOEL SIMON - SC016971
PAULO CÉSAR PAZIN - SC026871

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO.


INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE.
DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE
NA ORIGEM. CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO
DO STJ. TEMA 1.004/STJ. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME
FÁTICO-PROBATÓRIO. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA.
I - Na origem, trata-se de ação de indenização por desapropriação
indireta contra o Departamento de Infraestrutura de Santa Catarina -
DEINFRA/SC, objetivando compensação pecuniária em decorrência de
esbulho de imóvel localizado às margens Rodovia SC-480. Na sentença
julgou-se procedente a ação. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida,
porém, de ofício, adequada aos consectários legais incidentes
em indenização. Agravo interno do Estado de Santa Catarina em recurso
especial interposto contra decisão que conheceu parcialmente do recurso
especial e, nesta parte, negou-lhe provimento.
II - Não há violação do art. 1.022 do CPC/2015 quando o
Tribunal a quo se manifesta clara e fundamentadamente acerca dos pontos
indispensáveis para o desate da controvérsia, apreciando-a (art. 489 do
CPC/2015), apontando as razões de seu convencimento, ainda que de forma
contrária aos interesses da parte, como verificado na hipótese. Também em
recurso especial, não cabe ao STJ examinar alegação de suposta omissão de
questão de natureza constitucional, sob pena de usurpação da competência
do STF: AgInt nos EAREsp 731.395/SP, relator Ministro Francisco Falcão,
Corte Especial, DJe 9/10/2018; AgInt no REsp 1.679.519/SE, relator
Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 26/4/2018; REsp
1.527.216/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe
13/11/2018. Conforme entendimento pacífico desta Corte “o julgador não
está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes,
quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”. A
prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 confirma a jurisprudência já
sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, “sendo dever do
julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão
adotada na decisão recorrida”. [EDcl no MS 21.315/DF, relatora Ministra
Diva Malerbi (Desembargadora convocada TRF 3ª Região), Primeira Seção,
julgado em 8/6/2016, DJe 15/6/2016.]
III - Com relação à alegada violação dos arts. 186, 927 e 944 do
Código Civil, consoante se constata dos excertos reproduzidos do decisum
recorrido, o posicionamento adotado pela Corte a quo encontra-se em
consonância com o entendimento do STJ, no sentido de que as faixas de
domínio constituem propriedade pública, sendo que, uma vez instalada em
propriedade privada, retira do proprietário do imóvel total disponibilidade
sobre esse espaço, ou seja, impossibilita que ele faça uso e gozo dessa
porção de terra, não podendo construir, obstar o acesso, exigir pagamento
(pedágio) para sua utilização, etc. Nesse caso, em tese, por óbvio, implica
em desapossamento ou esvaziamento sócio econômico do particular,
cabendo-lhe, por isso, a devida a indenização. No caso dos autos, em que
pese o ente estadual recorrente alegar que o decreto expropriatório
estabelece área maior que a efetivamente apossada, é certo que os
expropriados perderão por completo a disponibilidade da poção de terra
oficialmente definida na norma estadual, cuja titularidade (domínio e
propriedade) será exclusivamente do ente público expropriante, ainda que
não promova a ocupação por inteiro da área desapropriada.
IV - No que concerne à apontada violação do art. 884 do Código
Civil, do art. 27 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, bem assim do Tema
1.004/STJ, é forçoso esclarecer que o STJ, no julgamento do citado tema,
apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, estabeleceu o entendimento de
não ser devida indenização por desapropriação indireta quando o imóvel,
que teve parte de porção de terra expropriada/apossada pelo Poder Público,
foi vendido/alienado para terceiro em momento posterior à desapropriação,
uma vez que, presumivelmente, a limitação administrava já foi considerada
no preço do negócio. Entretanto, para a hipótese dos autos, a Corte
Estadual, no fundamento do aresto recorrido, bem assim na fundamentação
do julgamento proferido em sede de juízo de retratação, foi categórico ao
concluir que os expropriados adquiriram o imóvel em 25/05/1983, ou seja,
em momento anterior ao esbulho possessório, em 13/05/1994, data do
último decreto desapropriatório (Decreto n. 4.471/1994). Nesse passo, para
se deduzir de modo diverso do aresto recorrido, entendendo que a aquisição
do imóvel se deu em período posterior ao esbulho do imóvel, ou, ainda, de
não ser a data do Decreto n. 4.471/1994 o marco inicial do apossamento
administrativo, na forma pretendida no apelo nobre, demandaria o
revolvimento do mesmo acervo fático-probatório já analisado, providência
impossível pela via estreita do recurso especial, ante o óbice do enunciado
da Súmula 7/STJ.
V - Agravo interno improvido.

ACÓRDÃO

Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam
os Ministros da SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, em sessão virtual
de 12/03/2024 a 18/03/2024, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos
do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com
o Sr. Ministro Relator.
Não participou do julgamento o Sr. Ministro Afrânio Vilela.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Francisco Falcão.

Brasília, 18 de março de 2024.

Ministro Francisco Falcão


Relator
AgInt no RECURSO ESPECIAL Nº 2121159 - SC (2024/0028356-3)

RELATOR : MINISTRO FRANCISCO FALCÃO


AGRAVANTE : ESTADO DE SANTA CATARINA
ADVOGADO : FELIPE WILDI VARELA - SC020548
AGRAVADO : MIGUEL ANTONIO KOVALESKI
AGRAVADO : NEUSA APARECIDA MIOTTO KOVALESKI
ADVOGADOS : GÉLSON JOEL SIMON - SC016971
PAULO CÉSAR PAZIN - SC026871

EMENTA

PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO.


INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE.
DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE
NA ORIGEM. CONSONÂNCIA COM O ENTENDIMENTO
DO STJ. TEMA 1.004/STJ. IMPOSSIBILIDADE DE REEXAME
FÁTICO-PROBATÓRIO. DESPROVIMENTO DO AGRAVO INTERNO.
MANUTENÇÃO DA DECISÃO RECORRIDA.
I - Na origem, trata-se de ação de indenização por desapropriação
indireta contra o Departamento de Infraestrutura de Santa Catarina -
DEINFRA/SC, objetivando compensação pecuniária em decorrência de
esbulho de imóvel localizado às margens Rodovia SC-480. Na sentença
julgou-se procedente a ação. No Tribunal a quo, a sentença foi mantida,
porém, de ofício, adequada aos consectários legais incidentes
em indenização. Agravo interno do Estado de Santa Catarina em recurso
especial interposto contra decisão que conheceu parcialmente do recurso
especial e, nesta parte, negou-lhe provimento.
II - Não há violação do art. 1.022 do CPC/2015 quando o
Tribunal a quo se manifesta clara e fundamentadamente acerca dos pontos
indispensáveis para o desate da controvérsia, apreciando-a (art. 489 do
CPC/2015), apontando as razões de seu convencimento, ainda que de forma
contrária aos interesses da parte, como verificado na hipótese. Também em
recurso especial, não cabe ao STJ examinar alegação de suposta omissão de
questão de natureza constitucional, sob pena de usurpação da competência
do STF: AgInt nos EAREsp 731.395/SP, relator Ministro Francisco Falcão,
Corte Especial, DJe 9/10/2018; AgInt no REsp 1.679.519/SE, relator
Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe 26/4/2018; REsp
1.527.216/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe
13/11/2018. Conforme entendimento pacífico desta Corte “o julgador não
está obrigado a responder a todas as questões suscitadas pelas partes,
quando já tenha encontrado motivo suficiente para proferir a decisão”. A
prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015 confirma a jurisprudência já
sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça, “sendo dever do
julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão
adotada na decisão recorrida”. [EDcl no MS 21.315/DF, relatora Ministra
Diva Malerbi (Desembargadora convocada TRF 3ª Região), Primeira Seção,
julgado em 8/6/2016, DJe 15/6/2016.]
III - Com relação à alegada violação dos arts. 186, 927 e 944 do
Código Civil, consoante se constata dos excertos reproduzidos do decisum
recorrido, o posicionamento adotado pela Corte a quo encontra-se em
consonância com o entendimento do STJ, no sentido de que as faixas de
domínio constituem propriedade pública, sendo que, uma vez instalada em
propriedade privada, retira do proprietário do imóvel total disponibilidade
sobre esse espaço, ou seja, impossibilita que ele faça uso e gozo dessa
porção de terra, não podendo construir, obstar o acesso, exigir pagamento
(pedágio) para sua utilização, etc. Nesse caso, em tese, por óbvio, implica
em desapossamento ou esvaziamento sócio econômico do particular,
cabendo-lhe, por isso, a devida a indenização. No caso dos autos, em que
pese o ente estadual recorrente alegar que o decreto expropriatório
estabelece área maior que a efetivamente apossada, é certo que os
expropriados perderão por completo a disponibilidade da poção de terra
oficialmente definida na norma estadual, cuja titularidade (domínio e
propriedade) será exclusivamente do ente público expropriante, ainda que
não promova a ocupação por inteiro da área desapropriada.
IV - No que concerne à apontada violação do art. 884 do Código
Civil, do art. 27 do Decreto-Lei n. 3.365/1941, bem assim do Tema
1.004/STJ, é forçoso esclarecer que o STJ, no julgamento do citado tema,
apreciado sob o rito dos recursos repetitivos, estabeleceu o entendimento de
não ser devida indenização por desapropriação indireta quando o imóvel,
que teve parte de porção de terra expropriada/apossada pelo Poder Público,
foi vendido/alienado para terceiro em momento posterior à desapropriação,
uma vez que, presumivelmente, a limitação administrava já foi considerada
no preço do negócio. Entretanto, para a hipótese dos autos, a Corte
Estadual, no fundamento do aresto recorrido, bem assim na fundamentação
do julgamento proferido em sede de juízo de retratação, foi categórico ao
concluir que os expropriados adquiriram o imóvel em 25/05/1983, ou seja,
em momento anterior ao esbulho possessório, em 13/05/1994, data do
último decreto desapropriatório (Decreto n. 4.471/1994). Nesse passo, para
se deduzir de modo diverso do aresto recorrido, entendendo que a aquisição
do imóvel se deu em período posterior ao esbulho do imóvel, ou, ainda, de
não ser a data do Decreto n. 4.471/1994 o marco inicial do apossamento
administrativo, na forma pretendida no apelo nobre, demandaria o
revolvimento do mesmo acervo fático-probatório já analisado, providência
impossível pela via estreita do recurso especial, ante o óbice do enunciado
da Súmula 7/STJ.
V - Agravo interno improvido.

RELATÓRIO

Na origem, trata-se de ação de indenização por desapropriação indireta contra

o Departamento de Infraestrutura de Santa Catarina - DEINFRA/SC, objetivando

compensação pecuniária em decorrência de esbulho de imóvel localizado às margens

Rodovia SC-480. Na sentença julgou-se procedente a ação. No Tribunal a quo, a sentença

foi mantida, porém, de ofício, adequada aos consectários legais incidentes em

indenização.

Trata-se de agravo interno do Estado de Santa Catarina em recurso especial

interposto contra decisão que conheceu parcialmente do recurso especial e, nesta parte,

negou-lhe provimento.

A decisão recorrida tem o seguinte dispositivo: "Ante o exposto, com

fundamento no art. 255, §4º, I e II, do RISTJ, conheço parcialmente do recurso especial e,

nesta parte, nego-lhe provimento."

No agravo interno, a parte recorrente traz, resumidamente, os seguintes

argumentos:

Deve-se infirmar, por ser inaplicável ao caso dos autos, o fundamento da decisão
agravada segundo o qual seria o caso de incidência da Súmula 7 do STJ. As balizas fáticas
foram delineadas pelo voto-condutor do acórdão local.
A propósito, como se pode inferir, a análise da pretensão recursal demandará apenas a
revaloração do contexto fático-probatório incontroverso já delineado pelo Tribunal local na
fundamentação do julgado, notadamente em relação à seguinte circunstância, qual seja:
obras de ampliação/implantação da Rodovia SC-480.
Efetivamente, a controvérsia reside na conclusão jurídica extraída pelo Tribunal local
a partir dessas circunstâncias, notadamente no que se refere à indenização.
Não há a necessidade de que, para o reconhecimento da procedência da pretensão
recursal veiculada, ocorra reexame de fatos ou de provas, o que é vedado na via especial.
Em verdade, o que se pede é que, respeitados os contornos fáticos já delineados na decisão
proferida pela Corte de origem, esse Superior Tribunal de Justiça atribua nova qualificação
jurídica a eles, aplicando, de forma adequada, o direito à hipótese.
Deve ser afastado, particularmente, o óbice da Súmula 7 do STJ, porquanto
inadequado ao caso dos autos, uma vez que a análise dos fundamentos recursais é restrita a
aplicação de dispositivo infraconstitucional. Vale dizer, não se mostra necessário adentrar
no reexame de provas, mas, ao contrário, tão-somente verificar a subsunção da lei federal ao
caso, situação essa contrariada pelo r. acórdão recorrido.
[...]
Ocorre que, como foi demonstrado, as questões levantadas pelo recorrente não foram
apreciadas, de modo que não se tem resposta para a pergunta: a área que embora esteja
prevista no Decreto Expropriatório para faixa de domínio, mas que não foi efetivamente
ocupada deve ser indenizada? Isso não foi respondido pelo julgador!
Os acórdãos, contudo, deixaram de apreciar questão imprescindível trazida pelo
Estado, em evidente afronta ao art. 1.022 do CPC.
Requer-se, por isso, o provimento do recurso especial, a fim de que, uma vez
reconhecida a violação ao art. 1.022, I e II do CPC, seja determinado o retorno dos autos ao
Tribunal local, para que sejam supridas as omissões/contradições reconhecidas.
[...]
Por conseguinte, apenas a área efetivamente ocupada pelo Poder Público no caso
concreto, pela Rodovia SC-480 é que deve ser indenizada, pois essa é a extensão do dano
sofrido pelo particular.
Em relação ao restante da área prevista no decreto expropriatório, ou seja, no tocante
à faixa de domínio projetada como passível de desapropriação, mas que não foi fisicamente
ocupada, não há dano. Quando muito, há mera limitação administrativa, mas não há esbulho
e, consequentemente, não há dever de indenizar.
Contudo, o órgão julgador entendeu de modo diverso. De acordo com o julgado,
considerando que o decreto expropriatório declarou de utilidade pública uma faixa de
domínio de até 40 (quarenta) metros de largura para a instituição do sistema viário, haveria
esbulho em relação a toda a essa área, que deve ser integralmente indenizada, ainda que não
tenha havido apossamento físico.
Nada obstante, não se pode concordar com essa conclusão, pois ela viola frontalmente
os artigos 186, 927 e 944 do Código Civil!
Com efeito, a exegese dos artigos 186 e 927 do Código Civil sinaliza que só há dano
ao particular em relação à área sobre a qual recaiu apossamento físico.
A mera previsão, no decreto expropriatório, de que poderá ser instituída faixa de
domínio de até 30 metros (faixa de domínio projetada), quando muito, configura limitação
administrativa, mas não esbulho.
E, considerando que só há dano em relação à área fisicamente ocupada pelo Poder
Público, é apenas essa área que deve ser contemplada na indenização, conforme artigo 944
do Código Civil.
[...]
Como exposto, o apossamento administrativo ocorreu em 1967, seguido do Decreto
Expropriatório n.° 366 de 1975, e a parte autora, quando adquiriu o imóvel (em 25 de maio
de 1993), já tinha plena ciência das limitações administrativas que incidiam sobre o imóvel.
Na hipótese não houve lesão ao patrimônio do adquirente. Ao adquirir um imóvel que
tem uma limitação administrativa em sua área, a potencial desvalorização certamente
foi considerada na fixação do preço.
Assim sendo, tratando-se de ação cuja causa de pedir é a violação à propriedade ou à
posse, na qual o cidadão turbado ou esbulhado não pode vindicar a coisa após
sua incorporação à esfera pública, em razão da supremacia do interesse público, resta ao
lesado a alternativa apenas de exigir a indenização pelo dano sofrido.
Para que o atual proprietário do bem tivesse direito ao valor da indenização,
pela desapropriação indireta, seria necessário que demonstrasse nos autos que adquiriu o
imóvel pelo seu preço antes da desvalorização advinda do apossamento administrativo.
Assim sendo, independentemente da natureza jurídica da ação, a
pretensão indenizatória encontra óbice no princípio jurídico segundo o qual é vedado o
enriquecimento ilícito, a teor do art. 884 do Código Civil, visto que somente quem sofreu o
dano tem o direito de ser reparado.
Esta, de igual modo, a intelecção do art. 27 do Decreto-Lei 3.365/1941, ao estabelecer
que para a fixação do preço da indenização deve-se levar em consideração a depreciação do
bem "pertencente ao réu". Ora, se não havia propriedade dos recorridos quando da restrição
administrativa, inexistiu depreciação sobre a esfera jurídica patrimonial de quem adquire o
bem.
Inexiste, conclusivamente, comunicação entre a conduta estatal e o dano alegado. O
dano, se existente, ocorreu sobre a patrimonialidade do antigo proprietário, não
do adquirente. Assim, deve ser negado o pleito indenizatório por limitação administrativa,
quando estas são anteriores à aquisição do imóvel, buscando os autores ressarcimento de
prejuízo que a parte evidentemente não sofreu, o que afronta a boa-fé das relações jurídicas
e a regra inserida no artigo 844 do Código Civil.

É o relatório.

VOTO

O agravo interno não merece provimento.

A parte agravante repisa os mesmos argumentos já analisados na decisão

recorrida.

Não há violação do art. 1.022 do CPC/2015 quando o Tribunal a quo se

manifesta clara e fundamentadamente acerca dos pontos indispensáveis para o desate da

controvérsia, apreciando-a (art. 489 do CPC/2015), apontando as razões de seu

convencimento, ainda que de forma contrária aos interesses da parte, como verificado na

hipótese. Também em recurso especial, não cabe ao STJ examinar alegação de suposta

omissão de questão de natureza constitucional, sob pena de usurpação da competência do

STF: AgInt nos EAREsp 731.395/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Corte Especial,

DJe 9/10/2018; AgInt no REsp 1.679.519/SE, relator Ministro Sérgio Kukina, Primeira

Turma, DJe 26/4/2018; REsp 1.527.216/SP, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda

Turma, DJe 13/11/2018.

Conforme entendimento pacífico desta Corte “o julgador não está obrigado a

responder a todas as questões suscitadas pelas partes, quando já tenha encontrado motivo

suficiente para proferir a decisão”. A prescrição trazida pelo art. 489 do CPC/2015

confirma a jurisprudência já sedimentada pelo Colendo Superior Tribunal de Justiça,

“sendo dever do julgador apenas enfrentar as questões capazes de infirmar a conclusão

adotada na decisão recorrida”. [EDcl no MS 21.315/DF, relatora Ministra Diva Malerbi


(Desembargadora convocada TRF 3ª Região), Primeira Seção, julgado em 8/6/2016, DJe

15/6/2016.]

Com relação à alegada violação dos arts. 186, 927 e 944 do Código Civil, a

Corte Estadual, na fundamentação do aresto vergastado, assim firmou seu entendimento

(fls. 570-571):

[...].
O ente público lançou mão de tese para restringir a área indenizável. Em linhas gerais,
defendeu que a faixa de domínio possui cunho de limitação administrativa e não impõe a
perda da propriedade.
Contudo, razão não lhe assiste.
Como é cediço, a faixa de domínio corresponde à base física sobre a qual assenta uma
rodovia - não só as pistas de rolamento, mas também canteiros, acostamentos, sinalização e
faixa lateral de segurança. A seu turno, a área não edificável compreende o hiato de 15
metros, contados a partir da linha que demarca a faixa de domínio (TJSC, Apelação Cível n.
0003002-78.2013.8.24.0001, de Abelardo Luz, rel. Desembargador Pedro Manoel Abreu,
Primeira Câmara de Direito Público, julgado em 7-5-2019).
[...].
De fato, sobre as porções de terra non aedificandi, incidem restrições à plena
utilização do proprietário, não gerando a ele, em contrapartida, direito ao percebimento de
qualquer compensação.
In casu, o laudo pericial bem observou a faixa de domínio, fazendo constar apenas
sua metragem para fins do cômputo indenizatório (Evento 51, Processo Judicial 2, p. 188-
200). Não foi outro o critério balizado pelo juízo a quo, o que resultou em condenação justa,
no importe de R$ 83.386,80.
[...].

Consoante se constata dos excertos reproduzidos do decisum recorrido, o

posicionamento adotado pela Corte a quo encontra-se em consonância com o

entendimento deste STJ, no sentido de que as faixas de domínio constituem propriedade

pública, sendo que, uma vez instalada em propriedade privada, retira do proprietário do

imóvel total disponibilidade sobre esse espaço, ou seja, impossibilita que ele faça uso e

gozo dessa porção de terra, não podendo construir, obstar o acesso, exigir pagamento

(pedágio) para sua utilização, etc. Nesse caso, em tese, por óbvio, implica em

desapossamento ou esvaziamento sócio econômico do particular, cabendo-lhe, por isso, a

devida a indenização.

No caso dos autos, em que pese o ente estadual recorrente alegar que o decreto
expropriatório estabelece área maior que a efetivamente apossada, é certo que os

expropriados perderão por completo a disponibilidade da poção de terra oficialmente

definida na norma estadual, cuja titularidade (domínio e propriedade) será

exclusivamente do ente público expropriante, ainda que não promova a ocupação por

inteiro da área desapropriada.

No que concerne à apontada violação do art. 884 do Código Civil, do art. 27

do Decreto-Lei n. 3.365/1941, bem assim do Tema 1.004/STJ, é forçoso esclarecer que

este STJ, no julgamento do citado tema, apreciado sob o rito dos recursos repetitivos,

estabeleceu o entendimento de não ser devida indenização por desapropriação

indireta quando o imóvel, que teve parte de porção de terra expropriada/apossada pelo

Poder Público, foi vendido/alienado para terceiro em momento posterior à

desapropriação, uma vez que, presumivelmente, a limitação administrava já foi

considerada no preço do negócio.

Entretanto, para a hipótese dos autos, a Corte Estadual, no fundamento do

aresto recorrido, bem assim na fundamentação do julgamento proferido em sede de juízo

de retratação, foi categórico ao concluir que os expropriados adquiriram o imóvel em

25/05/1983, ou seja, em momento anterior ao esbulho possessório, em 13/05/1994, data

do último decreto desapropriatório (Decreto n. 4.471/1994).

Nesse passo, para se deduzir de modo diverso do aresto recorrido, entendendo

que a aquisição do imóvel se deu em período posterior ao esbulho do imóvel, ou, ainda,

de não ser a data do Decreto n. 4.471/1994 o marco inicial do apossamento

administrativo, na forma pretendida no apelo nobre, demandaria o revolvimento do

mesmo acervo fático-probatório já analisado, providência impossível pela via estreita do

recurso especial, ante o óbice do enunciado da Súmula 7/STJ.

A esse respeito, os seguintes julgados:


PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. OMISSÃO E ERRO
MATERIAL CONFIGURADOS. CORREÇÃO DO JULGADO. DESAPROPRIAÇÃO
INDIRETA. PRESCRIÇÃO VINTENÁRIA. MARCO(S) INTERRUPTIVO(S). CC/1916.
ACORDO EXTRAJUDICIAL. ATO ADMINISTRATIVO. NULIDADE. AÇÃO DE
IMPROBIDADE. PREJUDICIALIDADE AFASTADA PELO TRIBUNAL DE ORIGEM.
REEXAME DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA
7/STJ.
1. O objeto do Recurso Especial diz respeito à prescrição da pretensão indenizatória
por apropriação indireta e à prejudicialidade externa decorrente da Ação de Improbidade
Administrativa. Constatada a existência de omissão e erro material no acórdão ora
embargado quanto às referidas matérias, cabe reexame da matéria para sanar os referidos
vícios.
2. Na origem, cuida-se de Ação de Desapropriação Indireta contra o Departamento
Nacional de Estradas de Rodagem - DNER, objetivando obter indenização pela
desapropriação de imóvel de propriedade da autora. A sentença de 1º grau acolheu a
preliminar de prescrição para extinguir o processo com resolução do mérito (fls.1.580-
1.593, e-STJ).
3. O TRF da 1ª Região deu provimento à Apelação da autora para - reconhecendo que
não se operou a prescrição vintenária na hipótese - afastar a prejudicial de mérito e
determinar o retorno dos autos à origem para análise do mérito da Ação de Desapropriação
Indireta.
4. Ao decidir a controvérsia, o Tribunal de origem concluiu: a) a interrupção da
prescrição, In casu, é regida pelo artigo 172 do Código Civil/1916, em vigor à época dos
fatos que supostamente interromperam a prescrição; b) inexiste respaldo jurídico em
condicionar o resultado de ação expropriatória ao desfecho de Ação de Improbidade
Administrativa, Na expropriatória, a discussão é sobre valores de indenização, fixados, em
regra, com a produção de prova pericial. Na Ação por Improbidade é que se perquire acerca
de suposta (i)legalidade ou nulidade de atos praticados por expropriante e/ou expropriado,
na elaboração e no pagamento de acordo administrativo extrajudicial.
5. Rever o entendimento alcançado pela Corte de origem - quanto à ocorrência de
marcos interruptivos aptos a afastar a prescrição, bem como quanto à inexistência
de conexão de processos tal como almejado nas razões recursais - requer novo exame do
acervo fático-probatório constante dos autos, providência vedada em Recurso Especial
conforme determina a Súmula 7/STJ.
6. Embargos de Declaração acolhidos, com efeitos modificativos, para anular o
acórdão de fls. 1.919-1.925, e-STJ, tornando-o sem efeito, e conhecer do Agravo para não
conhecer do Recurso Especial
(EDcl no AgInt no AREsp n. 2.017.749/DF, relator Ministro Herman Benjamin,
Segunda Turma, julgado em 18/12/2023, DJe de 10/1/2024).

PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO


AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA.
PRESCRIÇÃO. PRAZO DECENAL. MARCO INICIAL. VIGÊNCIA DO NOVO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. PRESCRIÇÃO AFASTADA NA ORIGEM COM
BASE NAS PROVAS DOS AUTOS. REVISÃO DO JULGADO. IMPOSSIBILIDADE.
NECESSIDADE DE REEXAME DA MATÉRIA FÁTICA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7
DO STJ.
1. O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento consolidado de que o prazo
prescricional deve ser contado a partir da entrada em vigor do novo Código Civil,
11/1/2003, e não da data do ato expropriatório. Nesse sentido: REsp 1.608.717/RS, de
minha relatoria, Segunda Turma, julgado em 19/6/2018, DJe 26/6/2018; AgInt no AREsp
829.887/SP, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 8/2/2018, DJe 23/2/2018;
AgInt no REsp 1.683.136/SC, Rel. Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, julgado
em 17/10/2017, DJe 24/10/2017; REsp 1.654.965/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda
Turma, DJe 27/4/2017; REsp 1.449.916/PB, Rel. Min. Gurgel de Faria, Primeira Turma, D
Je 19/4/2017.
2. No caso, o Tribunal a quo, soberano na análise do material cognitivo produzido nos
autos, registrou que a declaração de utilidade pública do imóvel ocorreu em 13/6/1997,
circunstância que interrompeu o lapso prescricional, por força do art. 172, V, do Código
Civil de 1916. Ademais, ficou consignado no acórdão recorrido que o autor, ora recorrido,
ajuizou a ação em 18/1/2011, fato que, aliado com a entrada em vigor do Código Civil de
2002 em 11/1/2003, rechaça a tese recursal de prescrição da pretensão ressarcitória, diante
da ausência de transcurso do prazo decenal.
3. Nesse contexto, a inversão do julgado exigiria, inequivocamente, a incursão na
seara fática dos autos, o que é inviável, na via eleita, nos termos do enunciado sumular n.
7/STJ: "A pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial."
4. Esta Corte Superior possui jurisprudência consolidada de que "a análise da
divergência jurisprudencial fica prejudicada quando a tese sustentada esbarra em óbice
sumular quando do exame do recurso especial pela alínea 'a' do permissivo constitucional
(AgRg no AREsp 278.133/RJ, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe
24/09/2014, e AgRg no AREsp 820.984/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, julgado em 08/03/2016, DJe 20/05/2016)" (AgInt no REsp 1.420.954/RS, Rel. Min.
Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 11/10/2016, DJe 14/11/2016).
5. Agravo interno a que se nega provimento
(AgInt no AREsp n. 1.015.128/GO, relator Ministro Og Fernandes, Segunda Turma,
julgado em 12/2/2019, DJe de 21/2/2019).

Ante o exposto, não havendo razões para modificar a decisão recorrida, nego
provimento ao agravo interno.

É o voto.
TERMO DE JULGAMENTO
SEGUNDA TURMA
AgInt no REsp 2.121.159 / SC
Número Registro: 2024/0028356-3 PROCESSO ELETRÔNICO

Número de Origem:
00079828520118240018

Sessão Virtual de 12/03/2024 a 18/03/2024

Relator do AgInt
Exmo. Sr. Ministro FRANCISCO FALCÃO

Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro FRANCISCO FALCÃO

Secretário
Bela. VALÉRIA ALVIM DUSI

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : ESTADO DE SANTA CATARINA


PROCURADOR : FELIPE WILDI VARELA - SC020548
RECORRIDO : MIGUEL ANTONIO KOVALESKI
RECORRIDO : NEUSA APARECIDA MIOTTO KOVALESKI
ADVOGADOS : GÉLSON JOEL SIMON - SC016971
PAULO CÉSAR PAZIN - SC026871

ASSUNTO : DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO -


INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE - DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA

AGRAVO INTERNO

AGRAVANTE : ESTADO DE SANTA CATARINA


ADVOGADO : FELIPE WILDI VARELA - SC020548
AGRAVADO : MIGUEL ANTONIO KOVALESKI
AGRAVADO : NEUSA APARECIDA MIOTTO KOVALESKI
ADVOGADOS : GÉLSON JOEL SIMON - SC016971
PAULO CÉSAR PAZIN - SC026871

TERMO

A SEGUNDA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, em sessão virtual de 12/03/2024 a 18/03


/2024, por unanimidade, decidiu negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.
Os Srs. Ministros Herman Benjamin e Mauro Campbell Marques votaram com o Sr. Ministro
Relator.
Não participou do julgamento o Sr. Ministro Afrânio Vilela.
Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Francisco Falcão.

Brasília, 19 de março de 2024

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