CARR, Edward Hallet. O que é História? 8. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
Questão: O que é história? Acton:
“É uma oportunidade única de registrar, da maneira mais útil para o maior número, a abundância de conhecimentos que o século XIX está em vias de legar... Pela divisão criteriosa do trabalho, deveríamos ser capazes de fazê-lo e levar ao conhecimento de todos o documento mais recente e as conclusões mais amadurecidas da pesquisa internacional . (...) Não podemos ter nesta geração a história definitiva, mas podemos dispor da história convencional e mostrar o ponto a que chegamos entre uma e outra, agora que todas as informações estão ao nosso alcance e que cada problema tem possibilidade de solução”. (The Cambridge Modern History: its origin, authorship and production, 1907. p. 10-12) 50 anos mais tarde. Sir George Clark comenta: “Historiadores de uma geração posterior não parecem desejar qualquer perspectiva desse tipo. Eles esperam que seu trabalho seja superado muitas e muitas vezes. Eles consideram que o conhecimento do passado veio através de uma ou mais mentes humanas, foi ‘processado’ por elas e portanto, não pode compor-se de átomos elementares e impessoais que nada podem alterar... A pesquisa parece ser interminável, e alguns eruditos impacientes refugiam-se no ceticismo, ou pelo menos na doutrina segundo a qual , desde que todos os julgamentos históricos envolvem pessoas e pontos de vista, um é tão bom quanto outro,e não há verdade histórica ‘objetiva” . (The New Cambridge Modern History, introdução, 1957. p. xxiv-xxv). Duas opiniões contraditória abrem a discussão. Responder o que é história parte do momento histórico que vivenciamos e que visão de sociedade nós temos. O século XIX foi uma grande época para os fatos. Gradgrind diz: “são fatos... Na vida só queremos fatos”. E os historiadores do século XIX concordavam com ele. Ranke e a necessidade de se mostrar as coisas exatamente como se passou, influenciou três gerações posteriores de historiadores. Essa concepção de história está ligada ao positivismo, que querendo sustentar a história como ciência, disseminaram, através da influência que tinham, o culto ao fato. Isso faz parte de uma visão empirista da história, que separa completamente sujeito e objeto. Os fatos como impressões sensoriais mantém-se fora do pesquisador, que deve manter a imparcialidade na observação. A história consistiria num conjunto de fatos verificados. Os fatos estariam disponíveis nos documentos, como o peixe na tábua do peixeiro. Segundo o senso comum há fatos históricos que são os mesmos para os historiadores. Por exemplo que a bomba de Hiroshima e Nagasaki explodiram em 1945. Isso é algo que um historiador deve saber, mas elogiá-lo por isso é a mesma coisa que elogiar um arquiteto que usa a madeira certa quando projeta uma casa. É um dever do historiador saber. 1. É uma condição para o trabalho e não uma função essencial. Existem ciências auxiliares como a arqueologia, por exemplo, que datam pedaços de cerâmica, objetos, e produzem essa matéria prima do historiador, e não história. 2. A necessidade de estabelecer os fatos básicos não repousa em qualquer qualidade dos próprios fatos, mas surge á priori, da vontade do historiador. É comum dizer que os fatos falam por si, mas os fatos só falam quando o historiador os aborda, é ele quem decide quais fatos vem à cena e em que ordem naquele contexto. Alguém disse que um fato é como um saco, só fica de pé quando se coloca alguma coisa dentro. O único motivo pelo qual queremos saber que a bomba explodiu em 1945 é porque os historiadores olham como um grande acontecimento histórico. O acontecimento de eu ter vindo dar aula aqui, ou de alguém ter chegado atrasada é um fato, mas provavelmente será esquecido a não ser que algum historiador deseje trazê-lo à tona. O historiador é um selecionador. A concepção de que existe uma serie de fatos objetivos e independentes da interpretação do historiador é um absurdo, mas ao mesmo tempo uma idéia muito difícil de se erradicar. Alguém já se perguntou por exemplo como os fatos de uma coleção: História Geral da Civilização Ocidental, por exemplo, estão ali. De tantos outros fatos que existiram. Não existe a distinção entre fatos históricos e outros fatos do passado, porque os poucos fatos conhecidos são fatos históricos. Para muitos autores a história tem sido uma série de lacunas, um quebra-cabeça a ser montado, com muitas partes faltando. Exemplo: Sabemos muito de como a Grécia era vista por um ateniense (devido às fontes), mas pouco sabemos como ela era vista por um espartano, um persa, um outro integrante da sociedade considerado um não cidadão, por exemplo. A imagem daquela sociedade foi pré-selecionada e pré-determinada para nós, porque havia pessoas com uma visão particular e que consideravam os fatos que sustentavam essa visão como dignos de serem preservados. O historiador da idade moderna tem que selecionar os fatos que considera mais relevantes, e isso para o positivismo é uma heresia. O historiador deve selecionar o numero maior de fatos irrefutáveis e objetivos possíveis. (Que vire um colecionador de selos) A crítica que se faz é à pulverização dos trabalhos. Pessoas que sabem cada vez mais sobre cada vez menos. Especialização em pequenos assuntos. “história em migalhas?” A fissura em fatos era justificada por uma fissura nos documentos. Os documentos eram o grande templo dos fatos. Havia uma reverência. “se está nos documentos, é verdade”. O que aqueles documentos diziam? O que as pessoas pensavam? O que queriam que outros pensassem? Na verdade, não diziam nada, até que o historiador tomasse posse deles para a interpretação. Trabalhar sobre ele, decifrar. Exemplo da obra do finado alemão. (documento negado por Hitler) acentua ainda mais a imagem do ocidente. Fatos e documentos são importantes, mas não deve haver um fetiche sobre eles. Não respondem o que é a história. Pouco se interessava pela natureza das coisas, não havia preocupação com a filosofia da história. Acreditavam que não era necessário discutir a finalidade da história (o que é? Pra que serve?), porque isso já estaria óbvio e evidente. Nos últimos 50 anos muitos trabalhos sérios se comprometeram com em definir o que é a história. Dilthey na Alemanha, Croce na Itália “toda história é uma história contemporânea”. Que o trabalho principal do historiador não é registrar, mas avaliar. Em 1910, Karl Becker diz que “os fatos da história não existem para o historiador até que ele os crie”. A história não é relacionada com o “passado em si”, nem com “o que o historiador pensa do passado”, mas as duas coisas ao mesmo tempo. O passado não é um passado morto, mas um passado que, de alguma forma, ainda está vivo no presente. “A reconstituição do passado na mente do historiador está na dependência da evidência empírica. Mas não é em si mesmo um processo empírico e não pode consistir de uma mera narração de fatos. Ao contrário, o processo de reconstituição governa a seleção e interpretação dos fatos: isto, aliás, é o que faz deles fatos históricos.” (CARR, 2002, p. 57) Deve-se levar em consideração que: 1. Os fatos da história nunca chegam puros até nós, sabendo-se que nem podem existir numa forma pura. Passam sempre pelos filtros da mente daquele que registra (dinâmica). (processo crime) Preocupa-se não com os fatos que há no livro, mas em saber quem escreveu. Os fatos são peixes nadando. Mas o historiador pode decidir em que parte do oceano navegar. 2. É necessário imaginação para compreender a mente daqueles que viveram no passado. A história não pode ser escrita se o historiador não consegue nenhum tipo de contato com a mente daquele sobre quem está escrevendo. Perigos do anacronismo, dos preconceitos. 3. Só podemos visualizar o passado e atingir nossa compreensão do passado com os olhos do presente. O historiador pertence a sua época e a ela está ligado da existência humana. As próprias palavras que ele usa quando vai construir a história (império, nação), denotam essa ligação com o atual. Essas palavras têm um sentido, estão num contexto. É necessário chamar atenção para os perigos dessa visão de história, porque sendo assim, não há objetivo na história, história é tudo oq eu o historiador faz. Há ou não há uma verdade histórica objetiva? Não se pode pensar que a história é puramente interpretação. As mais variadas. (relativismo) Não se pode pensar que por causa dos diversos ângulos de visão não há uma forma que dê corpo à história. Como o historiador deve tratar seus fatos? Alguns se isolam, lêem lêem, lêem e depois apenas escrevem. Mas a leitura das fontes, da bibliografia e a escrita é um processo que deve ser simultâneo, partes de um processo único. A relação do homem com o meio é a mesma relação do historiador com as fontes. Se ele lê fontes ao memso tempo que escreve e interpreta a interpretação modifica as fontes, mas as fontes modificam a interpretação. O que é história: relação: (presente/passado; fato/historiador) Papel dos Annales: Fontes, dimensões dos objetos, personagens históricos, resistências.