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A TEORIA DO APEGO

Guy TONELLA
Dr en Psicologia Clinica e do Desenvolvimento
CES de Psicofisiologia
Membro da Facultad do Instituto Internacional de Analise Bioenergética

2020 ©
2

OS QUATRO CONCEITOS CHAVES


NA TEORIA DO APEGO

Bowlby voltou-se para a etologia para demonstrar a existência de uma necessidade de apego que
não deriva de nenhuma outra. Foi Harry Harlow (19581), um psicólogo experimental, que lhe trouxe
um argumento convincente.

Ele realizou um experimento em dois grupos de quatro macacos bebês. Cada um deles foi trancado
em uma gaiola, na presença de dois manequins atuando como substitutos maternos. Um deles era de
madeira, cercado de esponja e coberto com tecido de algodão, o outro era apenas de arame. As
observações mostraram que, independentemente do substituto ao qual a mamadeira estava presa, os
bebês macacos passavam a maior parte do tempo agarrados ao manequim coberto com tecido.
Embora o substituto fosse inteiramente passivo, eles pareciam amá-lo ternamente.
Quando novos itens foram colocados em suas gaiolas, os bebês correram para suas mães de roupas
de pano até serem tranquilizados; eles então se aventuraram a explorar esses objetos desconhecidos.
Bebês que tinham apenas a mãe substituta de metal entraram em pânico, gritando, se afastando,
balançando e chupando mãos e pés.

Uma das conclusões tiradas dessa experiência foi a de que existe uma necessidade tátil em primatas,
independente da fome e da sede, por um lado, de que, por outro lado, o contato corporal é uma fonte
de segurança e que ele é procurado em caso de perigo ou medo.

Bowlby continua sua investigação em estudos etológicos, como as observações relatadas por
Lorentz (1935-19572), por exemplo com os gansos, mostrando a existência de laços muito fortes
entre uma mãe e seu bebê.

Então não havia dúvida na mente de Bowlby de que os seres humanos, como os animais, têm um
repertório de comportamentos que promovem apego à mãe, além da necessidade de serem
alimentados. Para ele, a evolução do sistema de apego ocorreu sob a pressão da evolução: a
proximidade de figuras protetoras de adultos é usada na luta contra os perigos do meio ambiente.
Ele conclui que o sistema de apego é definido como o que mantém a proximidade mãe-bebê e dá ao
bebê uma sensação de segurança. A proximidade é, portanto, parte integrante do comportamento do
apego.

A FIGURA DE APEGO

1
HARLOW H., 1958, The nature of love, American Psychologist, 3, 673-685.
2
LORENZ K.Z., 1935, opus cité.
© Guy TONELLA
3

Uma figura de apego é uma figura à qual o bebê direcionará seu comportamento de apego
(geralmente a mãe, pelo menos inicialmente). Ele é uma pessoa que se envolve em uma interação
emocional e social duradoura com o bebê e responderá facilmente a suas abordagens e sinais.
As crianças têm uma tendência inata de se apegar especialmente a uma figura (monotropismo), o
que significa que em um grupo estável de adultos, uma figura específica se tornará uma figura de
apego privilegiada (Holmes, 19953). As figuras de apego da criança são, portanto, hierarquizadas,
não apenas de acordo com os cuidados prestados e de acordo com suas características (resposta aos
sinais, abordagens e solicitações de interação da criança).

O RELACIONAMENTO E O VINCULO DE APEGO


É baseado em um esquema geneticamente programado a partir do qual é construído gradualmente.
Ainsworth4 (1989) define quatro características que distinguem os relacionamentos de apego de
outros relacionamentos sociais:

• A pesquisa de proximidade;
• O conceito de segurança básica definido por uma exploração mais livre da criança na
presença da figura de apego;
• A noção de comportamento de refúgio, definida pelo retorno da criança à sua figura de
apego quando é confrontada com uma ameaça percebida;
• Reações de protesto marcadas em caso de separação da figura do apego.

O vínculo de apego é definido por seu componente psicodinâmico (Holmes 19955) : refere-se às
conexões emocionais recíprocas que unem intimamente o bebê e sua mãe, ou todas as pessoas em
geral.

A BASE DE SEGURANÇA
Mary Ainsworth, colaboradora de Bowlby, desenvolveu o conceito de "base de segurança".
Esse conceito nasceu da observação do bebê humano que, como o bebê animal, cuida de não se
aventurar além de uma certa distância e verifica regularmente se sua mãe ainda está lá antes de
continuar sua exploração.

Se o bebê, portanto, pode contar com uma figura de apego em caso de dificuldade, essa figura serve
como uma base segura a partir da qual ele pode funcionar independentemente dele, tanto
fisiologicamente quanto psicologicamente. Ao liberar o bebê da ansiedade e da raiva que surgem
quando suas necessidades físicas e emocionais permanecem não atendidas, ajuda a criança a
desenvolver uma sensação de bem-estar que lhe permite funcionar de forma independente.

É a proximidade e, em seguida, a confiança na disponibilidade da mãe que permitirá que a criança


se sinta segura e, portanto, não precisa mais ativar seu sistema de apego. Essa desativação abre
caminho para a ativação do sistema de exploração ambiental, que dá à criança a oportunidade de
desenvolver suas capacidades da melhor maneira possível. O sistema de apego e o sistema

3
HOLMES J., 1995, Something there is that doesn’t love a wall, John Bowlby, Attachment Theory and Psychoanalysis,
Attachment theory: Social, developmental and Clinical Perspectives, S. Goldberg, R. Muir, J. Kerr (Eds.), The Analytic
Press, London, 19-43.
4
AINSWORTH M., 1989, Attachment beyong infancy, American psychologist, 44, 709-716.
5
HOLMES J., 1995, ibid.
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4

exploratório são, portanto, antagônicos. A criança ativa seu sistema exploratório do meio ambiente
inibindo seu sistema de apego: quando tem certeza de que pode contar com sua figura de apego
como "base de segurança" permanente, pode, por um tempo, se separar para explorar.

Hofer (19956) indica que esse estado ideal de homeostase no bebê, associado a comportamentos
maternos específicos (reguladores da homeostase interna da criança), determinaria a formação de
reguladores fisiológicos ocultos que seriam a base da sensação de segurança, como é procurada ao
longo da vida.

REAÇÕES EMOCIONAIS À QUEBRA DO VINCULO DE APEGO


O sistema de apego é motivado por dois objetivos:

• Manter um estado emocional subjetivo de segurança a partir do qual fluem conforto e bem-
estar (emoções positivas)
• Manter um processo perceptivo, cujo índice seja suficientemente próximo da figura do
anexo.

Quando não são alcançados, ocorrem as seguintes manifestações emocionais negativas:


• A ansiedade suspende todas as atividades quando o acesso à figura do anexo está ameaçado.
A criança então ativa seu sistema de apego e manifesta expressões de ansiedade, alertando
sua figura do apego: expressões faciais, sons, choros, gesticulaçoes. Ele está aguardando
respostas reconfortantes para restaurar sua proximidade com sua figura de apego e recuperar
um estado de segurança;
• O objetivo da raiva é comunicar reprovações à mãe sobre um colapso no apego e
desencorajá-la a recomeçar. Bowlby sugere que, durante uma separação temporária, a raiva
pode ajudar a criança a superar obstáculos;
• A tristeza se manifesta quando a criança percebe que a figura do apego não está disponível e
que os esforços para tentar restaurar essa acessibilidade falharam. A tristeza pode levar à
retirada e desengajamento.

No caso em que a mãe não responde adequadamente a essas estratégias primárias, Mary Main
(19907) descreve dois tipos de estratégias secundárias que a criança usa:

• Ele acentua os sinais de apego que envia para atrair mais atenção de sua mãe, esperando que
ela lhe dê a segurança de que ele precisa.
Uma criança preocupada com a possível indisponibilidade de sua mãe ativa seu sistema de
apego continuamente, mesmo quando está seguro (iperativaçao fisiologica), e isso em
detrimento de seu sistema de exploração ambiental (Bowlby, 19698); ele não está disposto a
se interessar pelo mundo físico à sua volta, ocupado com a segurança de que precisa. Essa é
a origem do caráter oral descrito por Lowen. Ou:

6
HOFER M.A., 1995, Idden regulators. Implications for a new understanding of attachment, separation and loss, S.
Goldberg, R. Muir, J. Kerr (Eds.), Attachment theory. Social development and clinical perspectives, Hillsdale, NJ,
Analytic Press.
7
MAIN M., 1990, Cross-cultural studies of attachment organization: recent studies; changing methodologies, and the
concept of conditional strategies, Human Development, 33 (1), 48-61.
8
MAIN M., 1981, Avoidance in the service of attachment : a working paper, K. Immelmann, G. Barlow, I. Petrinovich,
M. Main (éds.), Behavioral Development: The Bielefels Interdisciplinary Projects, New York, Cambridge University
Press.
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5

• Ele desenvolve uma estratégia de evitaçao: ele desvia a atenção de sua mãe (Main, 19819 ;
Bowlby, 198010), até evita tudo relacionado ao apego, incluindo a mãe (ipoativaçao
fisiologica), em vez de permanecer expectante de uma resposta materna - que pode não vir -.
O sistema de apego aqui é desativado defensivamente. A criança desenvolve um
comportamento evitativo a origem do caráter esquizóide descrito por Lowen.

Por fim, Crittenden (199211) mostrará que as crianças, cujos pais têm um entendimento alternado e
depois comportamentos insensíveis, têm, a longo prazo, dificuldades em confiar nos outros e ficam
desorientados. Essa criança pode desenvolver um comportamento a origem da personalidad
“borderline” (o estado limite).

9
BOWLBY J., 1980, Attachement et perte, vol.3 : La perte, 1984, Paris, PUF.
10
BOWLBY J., 1980, opus cité.
11
CRITTENDEN P.M., 1992, opus cité.
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OS QUATRO PADROES
DE APEGO

OS QUATRO PADROES DE APEGO DA CRIANÇA


Ainsworth observou que as crianças com 12 meses de idade, a partir de separações e encontros
com um dos pais, desenvolvem padrões ou "modelos" de apego que são internalizados pela
criança. Esses padrões são configurados a partir das atitudes da figura do apego, geralmente a
mãe.
Ainsworth observou crianças a partir dos 12 meses de idade durante separações e reuniões com
um dos pais e elaborou modelos ou "padrões" de apego à medida que são internalizados pela
criança. Eles foram relacionados às atitudes da figura do apego, geralmente a mãe.

A CRIANÇA SEGURA (Ainsworth, 197812)

A criança segura usa sua mãe como base de segurança quando se volta para o mundo exterior
para brincar ou explorar o meio ambiente. Sempre que percebe uma situação potencialmente
perigosa, ela tem o reflexo de se refugiar perto de sua mãe e, quando se sente seguro novamente,
retoma suas atividades voltadas para o mundo exterior.
Ela manifesta sua necessidade de contato através dos olhos, mesmo à distância.

Esse padrão seguro corresponde a uma mãe que normalmente responde às necessidades do bebê
de maneira apropriada, rápida e coerente. Ela permite que o bebê expresse espontaneamente suas
emoções, sejam elas quais forem, e ela se mostra afetuosa e constante em suas respostas
(Ainsworth et al., 197813). Como resultado, aos 12 meses de idade, sua criança "segura" tem
menos necessidade de manter contato com ela e conseguiu ganhar confiança em sua própria
capacidade de controlar o que acontece com ela.

Com referência à teoria polivagal de S. Porges, a criança segura têm uma “margem de tolerância
relativamente ampla, é capaz de mentalizar, construir um sistema de conexão social eficaz e
alcançar um funcionamento adaptativo geral dos sistemas simpático e parassimpático” (Ogden et
al., 200614). Assim, ele pode manter sua atividade fisiológica dentro da margem de tolerância ou
retornar rapidamente a ela no caso de hiperativação.

Podemos observar uma congruência entre os estados internos da criança, seus estados mentais,
seus movimentos corporais e suas ações. Seu comportamento não é ambivalente nem ambíguo,
mas expressivo e direto. Seu Self (a casa dele) foi capaz de construir as interconexões entre as
cinco funções (as escadas entre os pisos da casa).

12
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, Patterns of attachment: a psychological
study of the strange situation, Hillsdale, NJ, Erlbaum.
13
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, opus cité.
14
OGDEN P., MINTON K. & PAIN C., 2006, Trauma and the body: A Sensorimotor approach to psychotherapy,
New York: W.W. Norton & Company.
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A CRIANÇA “ANSIOSA-EVITATIVA” (Ainsworth, 197815)

A criança “anxiosa-evitativa” tem uma ansiedade muito forte para se distanciar (separar) de sua
mãe. Além de um certo limiar, a ansiedade é tão forte que ele escolhe uma estratégia de evitação:
evita o contato com a mãe, fica indiferente a ele, continua a se concentrar em seu ambiente (seus
brinquedos ou atividades) ) apesar da angústia em que ele se encontra. Ele não usa mais a mãe
como base de segurança e, em momentos de reunião, ele ignora ou evita ativamente a mãe ou
desvia o olhar quando ela o pega nos braços (Main et Morgan, 199916).

Essa estratégia visa desativar seu sistema de apego - todos os seus comportamentos de apego -
para que ele possa regular sua intensa ansiedade. Portanto, ele deixa de procurar contato e, além
disso, evita o contato, tanto em termos de olhar quanto de atitude física.
A evitação constitui uma defesa (Bowlby, 197317, 198018 ; Ainsworth et al., 197819), permitindo
que a criança mantenha o controle de uma raiva e, provavelmente, uma angústia, que se tornou
intensa demais para ser psicologicamente tolerável, evitando assim a desorganização
comportamental (Main et Weston, 198220 ; Heinicke et Westheimer, 196621).

A mãe desta criança não pode levar em consideração os estados emocionais da criança. A criança
se vê abandonada a si mesma e não pode compartilhar seus afetos dentro deste relacionamento
interpessoal. Isso o leva a ter que ignorá-los e adotar uma atitude de evitação no futuro para
impedir que seus sentimentos voltem à tona (Main et Weston, 198222).

Mães de filhos esquivos têm as seguintes características:


• Elas parecem ter dificuldade em obter prazer com o relacionamento com o bebê;
• Main e Stradtman (198123) observaram nelas uma tendência a ser rejeitadora e avessa ao
contato físico. Elas muitas vezes se afastam da criança quando estão na presença dele.
Elas também podem mostrar um certo aborrecimento em resposta aos pedidos da criança:
gestos de aborrecimento, expressões faciais de aversão, curvatura dos ombros contraídos,
evitação do olhar (Cassidy et Shaver, 199924 ; Schore 2003a25 ; Siegel, 199926);
• Há uma ausência de expressão emocional nessas mães que, segundo Main (Main, 1977,
in Ainsworth et al., 197827), constituem um meio de controlar uma raiva importante. No
entanto, diferentemente das mães seguras, elas tomam o cuidado de não demonstrar ou

15
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, Patterns of attachment: a psychological
study of the strange situation, Hillsdale, NJ, Erlbaum.
16
MAIN M. & MORGAN H., 1996, Disorganization and disorientation in infant strange situation behavior: Phenotypic
resemblance to dissociative states, L. Mchelson & W. Ray (Eds.), Handbook of dissociation, New York: Plenum Press,
107-138.
17
BOWLBY J., 1973, opus cité.
18
BOWLBY J., 1980, opus cité.
19
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, opus cité.
20
MAIN M., WESTON D.R., 1982, opus cité.
21
HEINICKE C., WESTHEIMER I., 1966, opus cité.
22
MAIN M., WESTON D.R., 1982, opus cité.
23
MAIN M., SRADTMAN J., 1981, Infant response to rejection of physical contact by the mother: Agression,
avoidance and conflict, Journal of the American Academy of Child Psychiatry, 20, 292-307.
24
CASSIDY J. & SHAVER P., 1999, Handbook of attachment: Theory, research, and clinical applications, New York:
Guilford Press.
25
SCHORE A., 2003a, Affect dysregulation and disorders of the self, New York: Norton.
26
SIEGEL D., 1999, The developing mind, New York: Guilford Press.
27
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, opus cité.
© Guy TONELLA
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despertar sua raiva na presença da criança (Slade et Aber, 198728), essa atitude
compulsiva os privou de ouvir e empatia por ele. No entanto, essa raiva se manifesta
insidiosamente através de seu olhar, seu tom de voz ou seus gestos abruptos (Main, 1977,
in Ainsworth et al., 197829);
• Essas mães apreciam o fato de a criança se tornar "independente" cedo, à qual responde
positivamente (Main et Goldwyn, 199430), inibindo seus impulsos de apego, evitando
assim se sentir frustrado com suas necessidades de contato. Portanto, as crianças
ansiosas-evitativas são encorajadas a valorizar atividades não sociais muito cedo, tal
como sucesso acadêmico ou performances esportivas, em detrimento de áreas mais
afetivas e menos valorizadas. A rejeição materna empurra eles mesmos a desinvestir a
esfera afetiva e a superinvestir a esfera cognitiva. O mecanismo defensivo de idealização
do eu mesmo e dos outros permite que essas crianças suprimam seus afetos negativos
(Cassidy et Kobak, 198831);
• Elas podem se comportar como intrusas (Ainsworth, 1969, in Main, 199432 ; Belsky,
198433). Quando a criança não expressa a necessidade de estar com ela, ela a interrompe
em sua atividade, manifestando um desejo de proximidade acompanhado de afetos
positivos falsos. À medida que a criança responde aos seus pedidos, ela perde o interesse
nele. Em certa idade, a criança já não evita sua mãe intrusiva e desenvolve uma estratégia
mais sutil de evitar: ele olha para ela e fala com ela de maneira superficial, sem
demonstrar desejo de proximidade. Como resultado, isso não provoca uma reação
negativa da parte dela e, portanto, torna tolerável para ele uma proximidade física com a
mãe (Crittenden, 199534). Se, no entanto, a mãe não for mais invasida, mas permanecer
apagada, a criança poderá mostrar sentimentos falsos positivos.

Bartholomew (1990) distingue dois desenvolvimentos possíveis em crianças evitativas:

• Aqueles que se tornam medrosos: são crianças conscientes de suas necessidades de


apego, mas que não podem expressá-lo por causa do medo de reações dos pais que isso
possa causar. Essas crianças têm pais que expressam abertamente seus sentimentos
negativos em relação a eles;
• aqueles que se desapegam: são crianças que não reconhecem que precisam de outros.
Seus pais procuram controlar e não deixar que seus sentimentos negativos se expressem,
preferindo permanecer com frio, pouco disponíveis ou indiferentes às necessidades de
apego.

Em resumo, a criança evitativo requer pouca troca afetiva durante suas interações ou seus jogos.
Emite pouco ou nenhum sinal de angústia no caso de separação, pouca ou nenhuma reação

28
SLADE A., ABER L., 1987, Representational processes in children and adults: Clinical and developmental
perspectives, Paper presented at the meeting of the Society of the Institute for Contemporary Psychotherapy, New York
City.
29
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, opus cité.
30
MAIN M., GOLDWIN R., 1994, opus cité.
31
CASSIDY J., KOBAK R., 1988, opus cité
32
MAIN M., 1994, A move to the level of representation in the study of attachment organization : Implications for
psychoanalysis, Annual Research Lecture to the British Psycho-Analytical Society, London, July 6.
33
BELSKY J., 1984, The determinants of parenting. A process model, Child Development, 55, 83-96.
34
CRITTENDEN P.M., 1995, Attachment and psychopathology, S. Goldberg, R. Muir et J. Kerr (éds.), Attachment
theory: social development and clinical perspectives, Hillsdale, NJ, Analytic Press.
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visível ao retornar. Se ele for pego em braços, ele ignora ou se afasta da figura de apego sem
tentar manter contato. Ele trata estranhos da mesma maneira que sua figura de apego.

Sua figura de apego, por outro lado, oferece pouca ou nenhuma resposta à criança estressada.
Desencoraja o choro e incentiva a independência.

A CRIANÇA “ANSIOSA-AMBIVALENTE” (Ainsworth, 197835)

A criança experimenta uma forte ansiedade de separação e adota uma atitude ambivalente na
qual a busca por contato e a resistência ao contato oferecido por sua mãe são misturadas. Por
exemplo, quando sua mãe o pega nos braços para confortá-lo, ele imediatamente quer ser
libertado, mas ele realmente não aceita ser colocado no chão. De fato, ele não consegue se
recuperar da ansiedade de separação e resiste a usar os pais como base segura: resiste ao contato
de que precisa e pode permanecer em sofrimento passivo.
Essa resistência demonstra uma estratégia de hiperativação do sistema de apego embora consista
em resistir às suas necessidades de contato. Fixado nessa posição de resistência ao apego, ele não
pode realmente se interessar pelo meio ambiente (investindo suas funções cognitivas).

A mãe dessa criança espera que ele preencha seu próprio vazio emocional: ela não tem a
capacidade de deixar de lado suas próprias necessidades para atender às da criança.

• A mãe geralmente age de acordo com suas próprias necessidades emocionais e seus
próprios humores, em vez das da criança. Pode estimular a criança e hiperativá-la
enquanto a criança procura regular sua atividade fisiológica diminuindo-a. Esse
comportamento invalida a criança e produz desregulação fisiológica;
• Stern (198536) fala de "roubo emocional" quando a mãe, em vez de ajudar o filho a
descobrir como ele se sente, determina como ele deve se sentir. Algumas mães podem
fazer com que a criança se sinta culpada por se comportar da maneira que deseja. A
criança está tentando desesperadamente agradá-la, mesmo que isso vá contra seus
próprios sentimentos ou desejos(Main et Goldwin, 199437), e apesar do sentimento de
que nunca será capaz de satisfazer sua mãe e que será "Indigno";
• A mãe geralmente é inconstante: às vezes ela não está disponível para atender às
necessidades de seu filho, às vezes é intrusiva e excessivamente afetuosa. Portanto, não é
previsível e confiável (Main, 199538 ; Belsky, Rosenberg et Crnic, 199539). Sem saber se
pode contar com ela e quando, a criança desenvolve um forte sentimento de ansiedade,
sente raiva por suas necessidades não serem levadas em consideração e um sentimento de
culpa por sentir essa raiva. Essas emoções o colocam em um estado de confusão;

35
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, Patterns of attachment: a psychological
study of the strange situation, Hillsdale, NJ, Erlbaum.
36
STERN D., 1985, opus cité.
37
MAIN M., GOLDWIN R., 1994, opus cité.
38
MAIN M., 1995, Recent studies in attachement: Overview, with selected implications for clinical work, S. Goldberg,
R. Muir & J. Kerr (Eds.), Attachment theory: Social, developmental, and clinical perspectives, Hillsdale, NJ: Analytic
Press, 407-474.
39
BELSKY J., ROSENBERG K & CRNIC K., 1995, The origins of attachment security: “Classical” and contextual
determinants, S. Goldberg, R. Muir & J. Kerr (Eds.), Attachment theory: Social, developmental, and clinical
perspectives, Hillsdale, NJ: Analytic Press, 153-183.
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• No entanto, ele continua envidando esforços incessantes para atrair a atenção dessa mãe
que lhe dá apenas respostas frustrantes (Ainsworth et al., 197840 ; Belsky, Rovine et
Taylor, 198441). Isso está ligado ao fato de esses pais recorrerem a estratégias que
mobilizem a atenção do filho e o mantenham em uma relação de dependência: o filho,
por esse fato, mantém em constante ativação seu sistema de apego;
• Essa mãe não ajusta bem seu comportamento ao que o bebê está expressando, mas
responde adequadamente quando ele esta com medo (Haft et Slade, 198942). A criança,
assim, aprende a detectar estímulos alarmantes no ambiente que os assusta, a fim de
obter a atenção de sua mãe;
• Essa mãe pode usar chantagem emocional ou fazer promessas que não cumprirão. Nessa
relação de engano, a criança não tem nenhum elemento objetivo em que confiar para
prever o que esperar. Ele então aprende a basear suas reações no que considera ser o
estado emocional de sua mãe. Isso o leva a se concentrar na esfera afetiva em detrimento
da esfera cognitiva (Crittenden, 199543). Esforçando-se tanto para proteger a
suscetibilidade de sua figura de apego, ele ele tem a impressão que seus sentimentos são
determinados por ela. Isso o leva a acreditar mais tarde que são os outros responsáveis
por seus problemas;
• Essa mãe procura monopolizar seu filho para que ele cure suas feridas do passado. Elas o
impedem de obter independência.

A criança ambivalente dificilmente consegue usar sua figura de apego como base de segurança.
Ele busca a proximidade antes que a separação ocorra. Ele está estressado com a separação de
maneira ambivalente: ele parece inconsolável, mas mostra raiva, e quando sua mãe volta, ele
expressa relutância em mostrar-lhe sinais de simpatia e ser consolado (Main et Morgan, 199644).
De fato, ele não pode confiar na disponibilidade de sua figura de apego, que está continuamente
preocupada. Ele busca contato, mas resiste à raiva quando ela ocorre.

Essas crianças parecem irritáveis, com falta de controle sobre seus impulsos e o risco de acting
out, e têm medo de abandono (Allen, 200145). Eles têm um "caráter difícil" com "uma tendência
à expressividade intensa, uma tendência a estados mentais negativos, uma lenta adaptabilidade à
mudança e uma irregularidade nas funções biológicas" (Schore, 200346, p. 29).

Embora crianças ansiosos-ambivalentes tenham comportamento desregulado, elas mostram


maior coerência entre seus estados internos e suas habilidades motoras (movimentos externos).
Suas habilidades motoras podem mostrar porém falta de contenção, sendo os movimentos mais
orientados para a descarga de sua alta ativação fisiológica do que para a realização intencional de
um objetivo específico. Por exemplo, a criança pode chorar e ficar agitada quando seu sistema de

40
AINSWORTH M.D.S., BLEHAR M.C., WATERS E., WALLS S., 1978, opus cité.
41
BELSKY J., ROVINE M., TAYLOR D., 1984, The Pennsylvania infant and family development project III: The
origins of individual differences in infant-mother attachment: maternal and infant contributions, Child development, 55,
718-728.
42
HAFT W.L., SLADE A., 1989, Affect attunement and maternal attachment: a pilot study, Infant Mental Health
Journal, 10 (3), 157-172.
43
CRITTENDEN P.M., 1995, opus cité.
44
CARLSON E., AMSTRONG J., LOWEINSTEIN R. & ROTH D., 1998, Realationships between traumatic
experiences and symptoms of posttraumatic stress, dissociation, and amnesia, J.D. Bremmer & C. Marmar (Eds.),
Trauma, memory, and dissociation, Washington, DC: American Psychiatric Press, 205-227.
45
ALLEN J., 2001, Traumatic relationship and serious mental disorders, England: John Wiley & Sons.
46
SCHORE A., 2003, Affects dysregulation and disorders of the self, New York : Norton.
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apego é ativado, em vez de fazer movimentos direcionais e intencionais em direção à figura do


apego.

A CRIANÇA “DESORGANIZADA-DESORIENTADA” (Main et Solomon47)

A criança desorganizada-desorientada experimenta uma forte ansiedade de separação, mas,


durante a reunião, e apesar de sua óbvia angústia, falha em estabelecer contato (a usar a mãe
como base de segurança) e, portanto, em poder gerenciar sua angústia. Seu comportamento é
inconsistente, contraditório, até estranho. Por exemplo, ele pode segurar sua mãe olhando para
longe, chorar quando sai sem se aproximar dela ou permanecer congelado ...
A peculiaridade dessa criança é que ele não conseguiu desenvolver nenhuma estratégia coerente
de apego, nem usar os pais como base de segurança, nem desativar o sistema de apego nem
hiperativar o sistema de apego. Ele continua desorientado.

Mais de três quartos das mães de crianças desorganizadas também apresentam sinais de
desorganização:

• Sofreram luto ou trauma não resolvido ou foram vítimas de abuso (Eichberg, 198748)
• Eles sofrem de depressão (Crittenden, 198549, 198850)
• eles geralmente têm um comportamento assustador (maus-tratos) ou assustado
(ansiedade) com seu filho. Mas o comportamento delas não se deve ao relacionamento
com a criança, é devido às próprias lembranças.
• A ansiedade que elas sentem é transmitida à criança quando está em contato com ela.
Para ele, o relacionamento está centrado no tema do medo sentido pela mãe ou do medo
para a mãe. Esta mãe é então incapaz de cumprir sua função parental: ela não é mais uma
fonte de conforto e proteção para a criança, mas uma fonte de medo. Isso tem várias
consequências para a criança:
o A criança é incapaz de identificar a causa do medo de sua mãe e desenvolverá
medos inexplicáveis.
o A criança pode ser levada a acreditar que ele próprio é a fonte do medo de sua
mãe, especialmente quando ela está ansiosa e fugindo.
o Não sendo capaz de entender o estranho comportamento de sua figura de apego,
ele não encontra uma resposta organizada à sua disposição que lhe permita
enfrentar essa experiência que o assusta: ele não desenvolve nenhuma estratégia
evitadora, nem estratégia ambivalente e não tem para onde ir (Main et Hesse,
199051).

47
MAIN M., SOLOMON J., 1988, Discovery of an insecure disorganized-disoriented attachment pattern, T.B.
Brazelton et M.W. Yogman (eds), Affective Development in Infancy, 95-124.
48
EICHBERG C., 1987, Quality of infant-parent attachment: Related to mother’s representation of her own
relationship history, Paper presented at the Biennial Meeting Socviety for Research in Child development, Baltimore.
49
CRITTENDEN P.M., 1985, Social Networks, quality of parenting, and child development. Special Issue:
Intergenerational relationships, Journal of Family Issues, 13, (4), 432-449.
50
CRITTENDEN P.M., 1988, Distorded patterns of relationship in maltreating families: the role of internal
representation models. Special Issue: early maltreatment, Journal of Reproductive and Infant Psychology, 6, (3), 189-
199.
51
MAIN M., HESSE E., 1990, Parents ‘unresolved traumatic experiences are related to infant disorganized attachment
status: is frightened and-or frightening parental behavior the linking mechanism? M.T. Grenberg, D. Cicchetti, E.M.
© Guy TONELLA
12

o O medo que ele sente o leva a adotar uma atitude que é contraditória ou inibida.
As seqüências de comportamento que ele poderia ter iniciado são desordenadas
ou inibidas. A ação que ele inicia é ou acompanhada (contradição) ou substituída
(inibição) por movimentos ou expressões de apreensão. Isso constitue um colapso
das estratégias comportamentais de apego que tornam possível reduzir a
ansiedade ou o medo.

A criança desorganizada e desorientada apresenta respostas estereotipadas, como congelar ou


fazer certos movimentos e comportamentos contraditórios e desorientados, como aproximar-se das
costas. Na verdade, ele não tem uma estratégia de apego consistente.
Sua figura de apego, cuanto a elle, é congelada ou assustada, com um comportamento congelante
ou assustador; ela é intrusiva, mas está afastada, ameaçada por sua própria negatividade. Ela
confunde os papéis de mãe e filho, é inapropriada na comunicação emocional e pode ser abusiva
Essas mães são incapazes de regular fisiologicamente o filho. Por outro lado, causam
hiperativação em crianças quando estão hiperestimulantes e hipoativação quando negligenciadas.
A criança pode, portanto, ser mantida por períodos muito longos na zona de hiper ou hipoativação,
sem qualquer modulação por parte da mãe.

OS QUATROS PADROES DE APEGO DO ADULTO


Main (198552) distinguiu assim quatro tipos de "estados de espírito" ou quatro categorias de
adultos:

• O adulto autônomo seguro (correspondente à criança segura)


• O adulto desapegado (corresponde à criança que evita a ansiedade)
• O adulto em causa (corresponde à criança ansioso-ambivalente ou resistente)
• O adulto desorganizado e desorientado (corresponde à criança desorganizada e
desorientada)

O ADULTO "SEGURO-AUTÔNOMO"

Ele tem acesso a todas as suas memórias de infância, incluindo lembranças negativas. Ele da uma
olhada objetiva e atribuem importância aos seus relacionamentos de apego. Seu discurso é
coerente e reflete a concordância entre representações generalizadas (nível semântico) e as
memórias específicas que eles mantêm (nível episódico).
Para usar as formulações de Bowlby, pessoas seguras não reformulam sua história de acordo com
um modelo mais desejável.

A experiência de um amor profundo facilita a capacidade de permanecer perto de representações


episódicas, mas a metacognição (a capacidade de pensar em si mesmo) em pessoas que passaram
uma infância difícil pode permitir que elas se tornem seguras.

Cummings (eds), Attachment in the Preschool Years: Theory, Research and Interventions, The John D. and Catherine
T. Mac Arthur Foundation Series on Mental Health and Development, Chicago, University of Chicago Press, 161-182.
52
MAIN M., GOLDWIN R., 1985-1994, Unpublished Adult Attachment Interview scoring and classification manual,
Department of Psychology, Berkeley, University of California.
© Guy TONELLA
13

A modalidade segura é caracterizada por processos cognitivos e emocionais livres e autônomos,


sem distorção, ao contrário da insegurança marcada pelo uso de mecanismos defensivos como
clivagem, negação, denigração, que distorcem as representações mentais de um e outro (Fonagy et
al., 199553).

Em resumo, o adulto seguro tende a ter uma visão positiva de si mesmos, de seus parceiros e dos
relacionamentos que desenvolve. Ele se sente à vontade na privacidade e na independência,
equilibrando uma e outra. Ele mostra pouca evitação ou resistência negativa e toleram frustração e
decepção (Cassidy et Shaver, 199954). Suas habilidades motoras são integradas e seus movimentos
refletem seus estados internos. Seus comportamentos físicos em relação aos outros (aproximando-
se, alcançando, fazendo contato visual) são adequados ao contexto. Ele é capaz de se auto-regular
e preservar sua ativação dentro da margem de tolerância ou, quando a ativação excede a margem
de tolerância, ele pode procurar ajuda ou apoio de outras pessoas ou aceitar sem ambivalência ou
rejeição que outras pessoas o acalma. Expressa seu estado de espírito, seus desejos, suas intenções
nos três níveis cognitivo, emocional e sensório-motor, de maneira integrada e coerente.

Nas pessoas que tiveram uma infância bastante difícil, um ambiente adulto seguro, vínculos
afetivos de apego e uma capacidade metacognitiva (capacidade de pensar sobre si mesmos) podem
permitir que se tornem mais seguros.

O ADULTO "DESAPEGADO"

A idéia geral que ele tem dos pais não parece se basear nas experiências vividas com eles. Essa
incoerência no discurso refere-se à inconsistência entre os diferentes sistemas de memória,
memória procedural, memória episódica e memória semântica.

Esse adulto freqüentemente experimentava solidão ou rejeição durante a infância (Ainsworth,


1982; Main e Goldwyn, 1994). Para gerenciar a angústia resultante, adultos e crianças desativaram
seus sistemas de apego. O que leva aos seguintes efeitos:

• A evocação de uma representação geral (codificada na memória semântica) não envolve a


lembrança dos eventos ou emoções (codificados na memória episódica) na origem dessa
representação;
• Esses eventos episódicos da infância ou memórias carregadas de afeto são reprimidos o
dossociados, que testemunha a desativação do sistema de apego;
• O adulto se recusa a viver em pensamento o que experimentou, com os sentimentos a ele
associados, e a questionar a imagem que teve dele. Ele tende a idealizar suas experiências
com seus pais, distanciadas da experiência emocional original, ou a considerar suas
experiências como "normais", especialmente aquelas que são dolorosas;

53
FONAGY P., STEELE M., STEELE H., LEIGH T., KENNEDY R., MATTON G., TARGET M., 1995, Attachment,
the Reflective Self, and borderline states, S. Goldgerg, R. Muir, et J. Kerr (eds), Attachment theory. Social
developments and clinical perspectives, Hilsdale, NJ, Analytic Press, 234-278.
54
CASSIDY J., SHAVER P.R., 1999, Handbook of attachment: Theory, research and clinical applications, New York:
Guilford Press.
© Guy TONELLA
14

• Essa atitude mostra uma divisão entre pensamentos (cognições) e afetos; cognições
negativas são desapegadas da experiência emocional;
• Alguns adultos, no entanto, lembram episódios dolorosos desde a infância. No entanto,
eles os isolam e não os integram em suas representações, muitas vezes justificando que
eram excepcionais, ou que a sanção era merecida, ou que a atitude de seus pais era
justificada. Expressam um tipo de invulnerabilidade, como se não pudessem ser afetados
por tais eventos;
• Finalmente, outras pessoas reduzem consideravelmente seus relacionamentos de apego e
adotam uma atitude de denigração em relação a seus parentes ou a qualquer apego em
geral.

Para retomar a hipótese de Bretherton (198755), considerando todas as representações, semânticas


e episódicas, constituídas em redes de esquemas, os adultos dessa categoria teriam
compartimentado entre si certos esquemas de representações, impedindo a ativação de outros
esquemas para os quais o primeiro normalmente deve estar vinculado. Isso determinaria o
pensamento fragmentado em vez do pensamento em rede.

Essa estratégia de representação é adaptável para o adulto "desapegado" que a usa: ajuda-o a viver
o presente e a planejar planos para o futuro sem ficar preso em um passado de privações,
frustrações e sofrimentos. Por outro lado, ele se priva, em maior ou menor grau, de uma fonte de
vínculos emocionais e corre o risco de se reproduzir com seus parentes, especialmente com seus
filhos, as atitudes dos pais das quais ele próprio sofreu no passado.

O adulto desapegado, distante e evitativo, busca um alto nível de independência, muitas vezes
parecendo evitar qualquer forma de apego. Ele se vê auto-suficiente, sem a necessidade de apego e
sem o desejo de receber expressões de apego. Ele tende a suprimir seus próprios sentimentos,
controlando o risco de rejeição mantendo uma distância emocional dos outros, que muitas vezes
ele tem uma opinião ruim.

O adulto desapegado ansioso-evitativo experimenta sentimentos contraditórios sobre a intimidade.


Ele deseja e se sente desconfortável com a proximidade emocional. Ele tende a desconfiar dos
outros e se considera indigno de afeto, reprimindo a expressão de seus próprios sentimentos.

Portanto, esse adulto escolhe a auto-regulação em vez da regulação relacional, à custa de uma
certa tensão física crônica. Ele se sente mais à vontade na manifestação defensiva (distanciar-se,
empurrando os braços) do que na expressão de proximidade (física e / ou emocional, como segurar
a mão, segurar nos braços). "A falta de expressão emocional e contato visual, bem como um nível
mais baixo de ativação geral, também estão correlacionados com esse padrão de apego"
(Cozolino, 200256, p. 209).

55
BRETHERTON I., 1987, Opus cité.
56
COZOLINO L., 2002, The neuroscience of psychotherapy: Building and rebuilding the human brain, New York:
Norton.
© Guy TONELLA
15

O ADULTO "PREOCUPADO"

O adulto preocupado hiperativa seu sistema de apego. Sua excitação é tal que ele não pode dar um
passo atrás em sua história, o que o impede de ter uma visão objetiva e equilibrada de si e de seus
pais:

• Este adulto tem dificuldade em fazer generalizações (nível semântico) a partir de eventos
autobiográficos (nível episódico). Ele é incapaz de dar uma impressão geral de seus
relacionamentos, apesar da lembrança de muitas memórias específicas (Bretherton,
199057) ;
• Ele permanece muito envolvido, às vezes enredado, frequentemente de forma
ambivalente, em seus relacionamentos passados, e muitas lembranças de eventos ainda
inaceitáveis permanecem presentes em sua consciência, o que mantém uma grande
excitação e preocupação pelo infância, como se o adulto permanecesse sob a influência
dos pais;
• Isso pode causar certa irritação e propensão a um discurso marcado por uma quantidade
excessiva de informações, às vezes irrelevantes;
• Portanto, é difícil para ele ser independente e pensar por si mesmo.

Essa modalidade representacional do adulto preocupado permanece muito ancorada no nível de


memória episódica, próxima a afetos, até perturbado por afetos recorrentes, que podem mantê-lo
em certa confusão, privando-o de uma certa atividade cognitiva esclarecedora e generalizadora.

Em resumo, o adulto preocupado busca um alto nível de intimidade, aprovação e resposta a suas
iniciativas, mostrando-se excessivamente dependente. Ele tende a ser menos confiante, a ter uma
visão menos positiva de si e de seus parceiros. Mas também é provável que manifeste em seus
relacionamentos seus sentimentos, preocupações, às vezes com certa impulsividade.

É útil ajudar esses adultos a tolerar sua alta atividade emocional e fisiológica e ensiná-los a
direcionar intencionalmente seus movimentos para uma ação eficaz.

O ADULTO "DESORGANISADO-DESORIENTADO"

Esse adulto sofreu um ou mais eventos traumáticos, durante a infância ou mais tarde, que ainda
não foram assimilados (morte, violência, abuso, etc.). Isso pode dizer respeito a pessoas que
originalmente poderiam estar seguras, desapegadas ou preocupadas.

• Esse adulto que conta sua experiência pode apresentar uma desorientação no espaço e no
tempo (por exemplo, a morte de um ente querido aconteceu em dois momentos ou em
dois lugares diferentes).
• Imagens sensoriais podem ter se cristalizado em sua mente (imagem significativa) ou
imagens do passado às vezes parecem invadir sua mente (imagens recorrentes).

57
BRETHERTON I., 1990, Open communication and internal working models : Their role in attachment relationships,
R.A. Thomson (éd.), Nebraska symposium on motivation: Socioemotional developmental Psychology, 18, University of
Nebraska Press.
© Guy TONELLA
16

• Ele pode falar do evento no presente, como se não tivesse ocorrido (negação de abuso,
parente falecido ou parente apresentado como se estivesse vivo).
• Ele pode reviver o evento traumático assustador falando sobre ele (com imagens precisas
e muito detalhadas, emoções extremas, movimentos ou posturas evocativas ...),
reabsorvido no passado, perdendo o contato com a realidade presente.

Para Fonagy (199458), esses distúrbios na representação e no pensamento seriam um sinal de


submersão das defesas psíquicas.

Cerca de 80% das crianças vítimas de abuso podem ser descritas como desorganizadas, enquanto
apenas 12% das crianças não vítimas de abuso podem ser descritas como desorganizadas. Crianças
vítimas de abuso são mais propensas a se tornarem pais abusivos; uma minoria não,
desenvolvendo boas relações com outros adultos e se tornando pais não abusivos. A ligação entre
apego inseguro - particularmente desorganizado - e o surgimento de psicopatologias infantis está
firmemente estabelecida, embora o apego inseguro seja um fator de risco inespecífico para
problemas futuros, e não por si só uma patologia ou uma causa direta de patologia.

58
FONAGY P., 1994, Mental representations from intergenerational cognitive science perspective, Infant Mental
Health Journal, 15, 57-68.
© Guy TONELLA
17

AS SEIS PROPRIEDADES REGULADORAS


DO RELACIONAMENTO
INTERPESSOAL

O sistema de apego mãe-bebê apresenta diversas propriedades que organizam, orientam e regulam o
Self do bebê. A codificação das propriedades do sistema de apego precede em parte à codificação
das propriedades da figura de apego. De fato, o bebê só pode começar a se representar uma figura
de apego por volta dos 2 anos. Antes disso, a figura de apego só existe na consciência do bebê como
“pré-objeto” ou “objeto parcial” codificado como formas de percepções, de procedimentos de apego
afetivo e de procedimentos de interações.

Portanto, os impactos emocionais produzidos pela figura de apego são imediatos, mesmo se a figura
não está identificada como a causa dos impactos: as emoções resultantes afetam de imediato os
sistemas neurais, hormonais e imunológicos. Esses impactos, repetitivos, podem ser estruturalmente
ou funcionalmente organizadores ou desorganizadores do Self. Durante seus primeiros anos de vida,
a jovem criança não poderá, contudo estabelecer relações de causa e efeito entre os eventos externos
e sua experiência interna. Ele não poderá então identificar, adulto, o que na sua pequena infância
está originando suas disfunções. Ele só poderá constatar as manifestações reminiscentes de estados
sensório-emocionais e de estados mentais imergindo em sua vida atual, inclusive durante sessões de
psicoterapia.

O retorno recorrente de algumas experiências sensório-emocionais, na vida como em terapia, pode


ser visto como irracional, demasiado, fora de uma lógica consciente de causa e efeito. Eles não
podem ser relacionados à qualquer lembrança precisa porque eles pertencem ainda e
exclusivamente ao sistema de relação pré-verbal, não consciente, não simbolizado, e
constantemente reativado. Essas experiências são marcadas na memória procedimental a longo
prazo e seu retorno ocorre sempre que a circunstância atual, analógica (implicando uma forma
identificada àquela do passado) surge. Os circuitos neuronais subcorticais são, então, solicitados e
despertam, sem representações, as mesmas experiências sensório-emocionais e os mesmos
comportamentos emotivos.

Seis propriedades fundamentais constituem o sistema de apego mãe-bebê e continuam organizando,


posteriormente, a relação interpessoal do adulto, na vida cotidiana assim como na psicoterapia.
Cada uma dessas propriedades conduz o bebê e depois o adulto ou o paciente a construir
“procedimentos” concretos, gradualmente codificados (interiorizadas), todas convergindo para a
realização de uma capacidade de auto-regulação das relações interpessoais (de apego).

© Guy TONELLA
18

A INTENCIONALIDADE MUTUA
A intencionalidade emerge desde as primeiras interações díades mãe-bebê pós-natais. Ela descreve
a determinação consciente do bebê de interagir com o mundo à sua volta a partir de seu
envolvimento ativo com o outro devidamente atribuído.

A necessidade de comunicação do ser humano o predispõe, desde o nascimento, a receber as


intenções e emoções contidas nas mensagens intersubjetivas que lhes são enviadas. Essas mensagens
59
são transmitidos ao pequeno sob uma forma não verbal ou vocal e gestual. Nagy e Molnar (1994 ,
60
2003 ) observaram a intencionalidade da imitação realizada por bebês com menos de dois dias. O
bebê pode rapidamente depois de seu nascimento compartilhar intenções e experiências conscientes
expressando-as emocionalmente (Trevarthen, 1998d61).

A teoria da intersubjetividade inata postula que a criança nasce com uma consciência receptiva ao
estado subjetivo das outras pessoas, e procura interagir com estes estados (Stern, 197162, 197463,
197764 ; Bateson, 197165, 197966 ; Brazelton, Kozlowski et Main, 197467 ; Tronick, Als et Adamson,
197968 ; Trevarthen, 197469, 197770, 197971, 199872).
Esta sociabilidade natural dos bebês, envolvendo intenções e sentimentos de seus parceiros díades
(pai, mãe ou irmãos e irmãs), leva o recém-nascido à consciência de si e do outro, aos atos

59
NAGY E., MOLNÁR P., 1994, Homo imitans or Homo provocans? Abstract, International Journal of
Psychophysiology, 18 (2), 128.
60
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© Guy TONELLA
19

significativos e eventualmente à linguagem (Trevarthen e Hubley, 197873 ; Trevarthen, Murray e


Hubley, 198174 ; Trevarthen, 198075, 198876, 1990a77).
Para desenvolver uma comunicação interpessoal intencional, o bebê deve possuir duas
competências:

• Ele deve mostrar que possui os rudimentos de uma consciência individual e intencional
capaz de criar ligações entre objetos, situações, e ele próprio, e prever as consequências, na
forma de ações inteligíveis (Trevarthen, 197978): isto é uma característica da subjetividade
individual;
• Ele deve poder ajustar sua própria subjetividade à subjetividade dos outros e mostrar através
de atos coordenados que ele domina a sua intenção: isto é uma característica da
intersubjetividade.

A noção de intersubjetividade é centrada no compartilhamento de intenções e da consciência


prática. Os testes de desestabilização, de “Still face” ou rosto impassível (Gusella, Muir et Tronick,
198879 ; Langher, Cecchini, Lai, Margozzi et Taeschner, 199880 ; Murray et Trevarthen, 198581 ;
Reyes, Striano et Rochat, 199882), ou os procedimentos de desincronização de imagem de vídeo
apresentada à criança, mostram que a partir da idade de 2-3 meses, o bebê é emocionalmente
consciente do comportamento de sua mãe, e que ele reage sempre e de forma previsível aos
sentimentos expressos por sua mãe através de movimentos corporais (Trevarthen, 1993a83, b84 ;

73
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20

Tronick, 198985 ; Tronick, Als, Adamson, Wise et Brazelton, 197886 ; Nadel, Carchon, Kervella,
Marcelli et Serbat-Plantey, 199987):

• Frente ao rosto impassível, o bebê de uma mãe não deprimida desvia o olhar, retira-se de
uma interação social, se torna muito negativo, manifesta fortes reações neurovegetativas, por
vezes até raiva, e pode levar alguns minutos para aceitar novamente um contato social com
sua mãe, indicando assim que ele considera esta imobilidade como intencional (Cohn e
Tronick, 1982);
• Frente ao rosto impassível de uma mãe deprimida, o bebê se contenta de desviar o olhar,
sem nenhuma evidência de decepção ou de afastamento, como se ele não tivesse mais
intenções ou expectativas sociais (Nadal, 200288).

A SINCRONIZAÇÃO MUTUA
A organização psico-neural do bebê lhe permite controlar o ritmo e a forma de executar seus
movimentos corporais, de modo a se sincronizar às expressões dinâmicas de sua mãe, incluindo o
seu ritmo e a sua tonalidade vocal (Stern, 199389). Ele pode assim responder através de movimentos
e de expressões emocionais sintonizadas ao ritmo e ao tom das canções, danças ou músicas que lhes
são propostas (Custodero E Fenichel, 200390), já sabendo que, no útero, muitas semanas antes do
nascimento, o feto é capaz de perceber o estado de sua mãe, com base no ritmo de suas expressões
vocais em seu discurso (DeCasper e Spence 198691 ; Fifer et Moon, 199592 ; Hepper, 199593 ;
Lecanuet, 199694). O recém-nascido apresenta capacidades inatas para se comunicar por sequencias
rítmicas motoras acompanhando essas vocalizações e esses movimentos do corpo e das mãos; esses
padrões rítmicos motores correspondem para os adultos às sílabas, aos sons, às frases (Lynch, Oller,
Steffens et Buder, 199595 ; Poppel, 199496 ; Ross, 199397 ; Trevarthen, 1999a98 ; Trevarthen et al.,

85
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© Guy TONELLA
21

199999 ; Petitto et al., 2002100). Estes padrões rítmicos desempenham o papel de organizadores do
desenvolvimento permitem que as crianças e os adultos interajam juntos eficazmente e de forma
sincronizada, como dois parceiros trocam mensagens complementares ou de imitação mútua,
simultânea ou alternadamente. Por sua vez, a expressão da mãe também possui características
melódicas rítmicas e vocais. Ela é organizada através de frases repetidas, espécie de "narrativas"
emocionais de ritmo lento, variável e cíclica, criando para o bebê "envelopes narrativos dinâmicos"
necessários para o desenvolvimento da consciência de si e da consciência do outro, e necessários
para o bem-estar emocional do bebê (Stern, 1974101, 1985102, 1993103 ; Papousek Papousek, 1977104,
1987105, 1989106 ; Beebe e Lachmann, 1988107, 2002108).

Então, os recém-nascidos podem sincronizar-se por gesto com alguns momentos especiais da
"narrativa emocional" do adulto, e suas emissões vocais são idênticas em som e timbre aos da mãe
(Malloch, 1999109).

Trata-se claramente de um processo espelhado recíproco dos ritmos e expressões emocionais que
fluem entre o adulto e a criança, apesar da grande diferença de maturidade. A sincronização está
relacionada a ritmicidade das trocas no meio da díade mãe-bebê. Esta ritmicidade comum liberada
de um processo de sincronização mútua vai oferecer ao bebê um modelo rítmico permeando o
conjunto de seus padrões emergentes de vitalidade, somatossensorial e sensório-motor.

Ao contrário, a falta de sincronização ou de dessincronização mãe-bebê pode ter um impacto


negativo no desenvolvimento da criança. Uma experiência de interação cara a cara na televisão
entre jovens bebês e suas mães (Murray e Trevarthen, 1985 ; Nadel e al, 1999) mostra sequencias
de dessincronização mãe-bebê. Após um período de interação ao vivo em que havia uma boa
comunicação televisual entre a mãe e seu bebê, foi apresentado ao bebê uma sequencia
dessincronizada do comportamento maternal. Esta sequencia se caracterizava pelo fato de que a
mãe apresentava um comportamento dinâmico, olha para o seu bebê, fala com ele e sorri, mas

98
TREVARTHEN C., 1999a, Musicality and the Intrinsic Motive Pulse : Evidence from human psychobiology and
infant communication. Musicae Scientiae, Special Issue, 1999, (European Society for the Cognitive Sciences of Music),
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99
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© Guy TONELLA
22

desarticulada em relação ao comportamento do bebê. O bebê mostra rapidamente aversão ao olhar


de sua mãe, seguida por um retraimento social medida pela dissipação do sorriso e da falta de
vocalizações. Uma expressão de frustração e raiva se manifesta por crispações faciais no bebê e por
manifestações neurovegetativas tais quais bocejos, soluços, choros e vômitos. O retorno à
sincronização mãe-bebê é acompanhado pela retomada dos comportamentos positivos na maioria
dos bebês, exceto aqueles que estão muito chateados.

Outras mães, por fim, podem voluntariamente ter uma tendência a aumentar ou diminuir a
ritmicidade fisiológica e interativa do bebê. "Este bebê não deve ser um preguiçoso como o pai, me
disse um dia uma mãe, então eu o repreendo." Outra mãe, deprimida, me disse, tentando diminuir a
vitalidade de seu bebê que parecia esgotá-la: "Ela é muito inquieta, eu tento acalmá-la, mas ela logo
começa a chorar...". A ritmicidade adotada pela díade, no qual o bebê torna-se a propriedade do
sistema de apego e a memória procedimental do bebê o registra a longo prazo, origina o que
Winnicott (1950-1955110) chamava de masoquismo primário. A ritmicidade adotada pelo Self é uma
resposta às propriedades do sistema de apego e das suas exigências tais quais acelerar/desacelerar
ou aumentar/reduzir os estados de vitalidade e os estados emocionais do Self. O lado direito do
cérebro do bebê é dotado de uma receptividade precoce para a ritmicidade, já nas primeiras
semanas. Ele se adapta assim à ritmicidade dominando a díade mãe-bebê, a memória procedimental
registra a longo prazo e, talvez por toda a vida, se nada questioná-la. A falsa sincronização do bebê
com a mãe que o submete à uma ritmicidade fisiológica e interacional que não está atrelada à dele,
pode vir a originar um falso Self.
Na verdade, a sincronização intra-individual é tributária da sincronização interpessoal e a
sincronização interpessoal consiste em "promover o sincronismo ou a regulação dos sistemas
biológicos e comportamentais a nível do organismo" (Reite & Capitanio, 1985111, p. 235). Para
permitir que o bebê sincronize suas funções biológicas e funções comportamentais, as respostas da
mãe às necessidades do bebê, ou do terapeuta para as necessidades do paciente, não devem vir
muito cedo nem muito tarde (Beebe, 2000112).

Uma falta repetitiva de sincronização entre a mãe e o filho provoca nas jovens crianças um estado
de angústia registrada em sua memória a longo prazo. Esta experiência gera irritação e uma futura
intolerância à frustração. Uma vez adultos, essas crianças antecipariam como projeção a
incapacidade do terapeuta atendê-los de forma síncrona, nem muito cedo, nem muito tarde.

Com os pacientes adultos, a resposta do terapeuta não pode ser a espera ou o silêncio. Ele deve estar
no ajuste sincronizado, suscetível a instaurar um processo de resincronização necessária para a
retomada enriquecedora que permite a verdadeira troca intersubjetiva. Uma sincronização entre os
estados emocionais sensório-tônica do paciente e do terapeuta dependem de uma sincronização
entre seus estados mentais resultantes e sua possível tradução verbal.

A CONTENÇÃO
O bebê não é capaz de auto-regular sua vitalidade e estados sensório-emocionais. Sua figura de
apego lhe empresta seu olhar, sua voz, seus braços, enfim, seu corpo para conter os fluxos vitais do
seu bebê e o ajuda a não ser submergido com o que ele não conseguiria assimilar.

110
WINNICOTT DONALD, 1950-1955, L’agressivité et ses rapports avec le développement agressif, 1969, De la
pédiatrie à la psychanalyse, Payot, Paris, 80-97.
111
REITE M., CAPITANIO J.P., 1985, On the nature of social separation and attachment, M. Reiteand T. Field (Eds.),
The psychobiology of attachment and separation, pp. 223-255; Orlando, FL: Academic Press.
112
BEEBE B., 2000, Co-constructing mother-infant distress: The micro-synchrony of maternal impingement and infant
avoidance in the face-to-face encounter, Psychoanalytic inquiry, 20, p. 421-440.
© Guy TONELLA
23

Ela "desintoxica" tambem suas experiências e as torna acessíveis (Bion, 1962113, 1977114) através
dos ecos que ela envia para ele, transformando a experiência indigesta em experiência assimilável,
as vezes até em uma experiência positiva. Ela ensina assim para seu filho que é possível tirar
sempre algo positivo de uma experiência negativa.

Ela ajuda então a criança a manter sua homeostase interna dentro de uma "margem de tolerância
fisiológica" situada entre os dois extremos da hiperativação e hipoativação (Siegel, 1999115).
Vivenciando a experiência dentro desta margem, a jovem criança pode processar as informações
recebidas do mundo interior ou do mundo exterior e "tratar diversas intensidades de ativação
emocional e fisiológica, sem alterar o funcionamento do sistema [fisiológico]" (Siegel, 1999116).

Quando a mãe não é capaz de conter as intensas experiências sensório-emocionais e/ou negativas da
criança, estas constituem experiências desreguladas repetitivas, registradas na memória a longo
prazo, e à espera de ajuste. Elas podem então ressurgir de forma irracional sempre que uma situação
atual equivalente a uma situação do passado as reativarem. Elas se manifestariam reproduzindo o
script em que foram codificadas durante o período pré-verbal: de forma intensa, sem representação
e sem palavras, projetadas na situação atual e imersas. "É mais forte do que eu... É incontrolável e
só então eu percebo e tenho vergonha" poderão dizer estes pacientes.

Quando esses estados vitais e emocionais desregulados e traumáticos são reativados dentro da díade
terapêutica, Bion (1977117) sugere que o terapeuta atenda por uma "função continente", função que
a mãe não foi capaz de realizar. Como o terapeuta pode conter os estados reativos do seu paciente
que se apresentam na forma de fluxo sensório-emocional recorrentes, brutais e desorientados? Um
continente apresenta por definição um contorno, delimitado e com conteúdo flutuante e
desorientado. Isto é o que traz o olhar do terapeuta, sua voz, seus braços, seu corpo, seus ecos
emocionais, suas respostas implícitas que contém, orienta e regula a intensidade dos fluxos
sensório-emocionais, de forma que eles não sejam mais tóxicos, mas assimiláveis, metabolizáveis e
integráveis na economia global do Self.
A musculatura e suas variações de tonicidade funcionam como continente. Oferece um contorno
que delimita e reune um conteúdo flutuante. Contém os fluxos de excitação a fim de que sejam
metabolizáveis e não tóxicos : não ser submergido nem submergir ao outro.

O ENTONAMENTO AFETIVO
O pai ou o terapeuta está entonado ao estado afetivo da criança ou do paciente quando o eco afetivo
que ele remete para a criança ou para o paciente participa na regulação de seu estado de vitalidade e
de seu estado emocional e que a criança ou o paciente se sente recebido e "entendido".

O entonamento pode ser unimodal ou transmodal quando os sinais emitidos pela criança ou o
paciente e as respostas dadas pela mãe ou pelo terapeuta utilizam ou não o mesmo método de
comunicação: eles são feitos de micro-ajustes vocais, mímicas, postura, gestos, toque, etc. (Stern,
1985118). Não é, portanto, uma interpretação da condição do paciente, mas um eco afetivo.

113
BION W., 1962, Learning from experience, London : Karnac Books.
114
BION W. R., 1977, Seven servants, Ed. New York: Jason Aronson.
115
SIEGEL D., 1999, The developing mind, New York: Guilford Press.
116
SIEGEL D., 1999, The developing mind, opus cité.
117
BION W. R., ibid.
118
STERN D., 1985, Le monde interpersonnel du nourrisson, 1989, éd. PUF, Paris.
© Guy TONELLA
24

O entonamento pode ser imediato ou adiado, em função do atraso na resposta da mãe ou do


terapeuta baseado no sinal emitido pela criança ou pelo paciente, ampliado ou atenuado de acordo
com a constatação de que a mãe ou o terapeuta tem necessidade da criança ou do paciente
(estimulá-lo ou acalmá-lo), ou de acordo com os motivos inconscientes que orientam suas respostas.

É interesante identificar dentro do relacionamento terapêutico como o paciente reproduce os modos


de entonamento/ desentonamento pertencentes à mãe e nas quais ele se identificou. Ele as atualiza,
antecipando da parte do terapeuta um certo apoio ou pelo contrário, um “deixa pra lá”, de eco ou de
desinteresses, de aproximação ou de distância, de compromisso ou de retraimento emocional, de
contato ou de ausência de contato, de atividade ou passividade.

A REGULAÇÃO DOS ESTADOS DE VITALIDADE


E DOS ESTADOS EMOCIONAIS
Os mecanismos cerebrais de auto-regulação de origem filogenética evoluíram: enquanto que eles
serviam para indicar uma necessidade fisiológica e provocar uma resposta parental adequada, eles
se tornaram mecanismos de engajamento sócio-emocional ajustado entre dois indivíduos (MacLean,
1990119 ; Porges, 1997120 ; Panksepp, 1998a121, 1998b122). A comunicação, sustentada por
movimentos expressivos faciais, posturais e gestuais, tornou-se a função reguladora interpessoal
cointegrando de um lado as regulagens internas orgânicas e viscerais mediado pelo tronco cerebral,
com de outro lado, as regulagens externas ou adicionais que dependem das funções do diencéfalo e
do cérebro profundo (Trevarthen, 1985123, 1989124, 2001b125 ; Ploog, 1992126 ; Schore, 1994127 ;
Porges, 1997128 ; Tucker, 2000129). Consequentemente, a auto-regulação dos mamíferos através da

119
MACLEAN P., 1990, The Triune Brain in Evolution. New York: Plenum Press.
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© Guy TONELLA
25

comunicação emocional (Panksepp, 1998a130, 1998b131) e a expressão emocional via sistema motor
que está por trás (Holstege, Bandler et Saper, 1996132) são os descendentes evolucionistas dos
sistemas reguladores vagais das vértebras inferiores (Porges, 1997133).

Testes experimentais em recém-nascidos com menos de três meses confirmam que a interação entre
o bebê e o adulto é gerada por uma "co-regulação" e uma "co-consciência". Eles se manifestam na
forma de regulação mútua dentro do sistema dinâmico díadico complexo onde a sequencia exata dos
eventos é livre e não definido previamente (Fogel et Thelen, 1987134 ; Fogel, 1993a135, b136 ;
Tronick et Weiberg, 1997137). Estes testes também mostram que o bebê expressa emoções de forma
que elas afetem o adulto, regulando positivamente a troca para um encontro alegre. Ele corrige a
possibilidade de um contato perdido através de expressões emocionais negativas apelando para o
"reparo" da comunicação.

A mãe ou terapeuta têm a função de regular os estados de vitalidade ou emocionais do filho ou do


paciente, de modo que estes estados possam ser contidos, tolerados e orientados para a atenção
psíquica, para um possível desenvolvimento e integração (Schore, 2003138).
Isso sugere claramente que, na presença de personalidades dissociadas e incapazes de auto-
regulação, o objetivo terapêutico não é para aumentar a intensidade dos estados de vitalidade e
emocionais, mas contê-los para possível regulação. Esta regulação dos estados sensorio-emocionais
permitirá também uma ampliação interativa dos afetos positivos e dos "afetos de vitalidade", sobre
o afeto negativo (Stern, 1985139).

O desenvolvimento de procedimentos reguladores dentro da díade terapêutica se transforma


gradualmente em princípio de regulação esperada e contínua. Primeiramente, as sequencias
regulatórias são esperadas pelo paciente; em um segundo momento, elas se tornam previsíveis,
permitindo que cada um sinta a previsibilidade, a coerência e a adaptação recíproca (Beebe &
Lachmann, 2002140). Tornando-se previsível, um sistema de regras comuns é criado, constituindo
um procedimento sistemático. Portanto, a regulação é essencialmente uma propriedade sistêmica
antes de se tornar uma propriedade individual.

130
PANKSEPP J., 1998a). Affective Neuroscience.: The Foundations of Human and Animal Emotions. New York:
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131
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140
BEEBE B. & LACHMANN F. M., 2002, Infant research and adult treatment, éd. Hillsdale, NJ: Analytic Press.
© Guy TONELLA
26

A REPARAÇÃO
As tentativas de busca conjunta da ritmicidade, da sincronia, da entonamento afetivo, do continente
e de regulação podem às vezes falhar, acarretando reações sensorio-emocionais de desorganização e
desorientação. Essas experiências não são prejudiciais ao desenvolvimento se forem reparadas
dentro da díade.

Experiências interativas reparadoras existem no mesmo quadro do desenvolvimento normal. A


figura parental " suficientemente boa ", que induz a uma resposta de estresse no recém-nascido
recupera esta situação, se entonando com os efeitos negativos que ela originou, de modo a
promover sua regulação psicobiológica (Beebe & Lachmann, 1994141 ; Schore, 1994142, 2003143 ;
Lewis, 2000144).

Tronick (1989145) condiciona a "reparação interativa" da capacidade materna:

• Para admitir os efeitos negativos que ela originou em seu bebé


• Para identificar os sinais responsáveis pela perda de entonamento
• Para dar ao bebê o direito de expressar sua negatividade
• Para transformar a negatividade em uma experiência positiva
• Para restaurar uma comunicação mútua concedida.

Quanto maior for a capacidade reparadora díadica, maior será a tolerância para a ruptura.

Malastesta-Magai (1991146) pensa que "o fato de reexperimentar uma emoção positiva depois de ter
vivenciado uma experiência negativa, possa ensinar à criança que a negatividade pode ser suportada
e superada" (p. 218). O processo de resiliência do bebê seria fundada na capacidade da díade mãe-
filho de experimentar transições bem sucedidas entre afetos positivos, afetos negativos e retorno
para afetos positivos (Demos, 1991147). Essa capacidade de resiliência, após um evento estressante
dentro da díade mãe-filho, seria o último indicador da capacidade de apego (Greenspan, 1981,
citado por Schore, 2003148), bem como manter na criança ótimos níveis de vitalidade.

Na relação terapeuta-paciente, o processo de reparo é também uma jornada diádica (Tronick,


1989149). Primeiro, depende da capacidade do terapeuta de tolerar os estados negativos do paciente
que ele mesmo inconscientemente acionou (Beebe & Lachmann, 1994150). Este procedimento
envolve:

141
BEEBE B. & LACHMANN F. M., “Representation and internalization in infancy: Three principles of salience”,
Psychoanalytic Psychology, 11, 1994, p. 127-165.
142
SCHORE ALLAN, op. cit.,1994.
143
SCHORE ALLAN, op. cit., 2003.
144
LEWIS J. M., “Repairing the bond in important relationship: a dynamic for personality maturation”, American
Journal of Psychiatry, 157, 2000, p. 1375-1378.
145
TRONICK E. Z., 1989, “Emotions and emotional communication in infants”, American Psychologists, 44, 112-119.
146
MALATESTA-MAGAI C., 1991, Emotional socialization: its role in personality and developmental
psychopathology, D. Cicchetti and S.L. Toth (Eds.), Internalizing and externalizing expression of dysfunction:
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147
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development of resiliency, New York: Brunner/Mazel, 3-22.
148
SCHORE ALLAN, op. cit., 2003.
149
TRONICK E. Z., idem, 1989.
150
BEEBE B. & LACHMANN F. M., idem, 1994.
© Guy TONELLA
27

• O reconhecimento dos sinais verbais ou não-verbais à origem da dessintonia e os


sentimentos negativos que eles engendraram
• A oportunidade de expressar esses sentimentos negativos
• Sua desintoxicação pelo terapeuta, ou seja, sua transformação em uma experiência positiva
(por exemplo, a raiva em vigor, a vergonha em direito de sentir, fantasiar, exprimir)
• A restauração da comunicação mútua entonada.

Quando o terapeuta induz um procedimento de reparo interativo, sempre que houver


desentonamentos produzindo sentimentos negativos dentro da díade, o paciente já aguarda o
processo de reparo, experimentando sua previsibilidade, sua coerência e a adaptação recíproca. Um
sistema de regras comuns é criado que pode ser interiorizado pelo paciente e, em seguida,
reproduzida por ele. A capacidade mútua de reparar cria então um sentimento otimista de que a
relação pode ser mantida quando se desenvolve uma tensão interpessoal, criando uma esperança de
uma correção otimizada.

A capacidade de reparar aumenta a vitalidade e a capacidade de apego, assim como a capacidade de


resiliência.

CONCLUSÃO
O sistema de apego terapeuta-paciente, centrado na aquisição das propriedades reguladoras da
relação interpessoal, "aparenta ser uma comunicação entre dois Self interligados por um sentimento
de apego, em que os corpos e as psiques são temporariamente coativados e acoplados, desativados e
desacoplados, reativados e reacoplados. Eles se conectam e co-regulam, se desconectam e se auto-
regulam, se reconectam e regulam novamente mutuamente as atividades que os conectam. Este é o
campo intersubjetivo co-criado pelo paciente e pelo terapeuta, ressoando entre dois Self." (Tonella,
2010151).

151
TONELLA GUY, « L’engagement mutuel thérapeute/patient dans la régulation émotionnelle et la réparation du
Soi », Le corps et l’analyse : Revue des Sociétés Francophones d’Analyse Bioénergétique, vol. 11, 2010, éd. SOBAB :
Bruxelles, p. 51-61.
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OS QUATRO MODOS RELACIONAIS


DO SELF

A segunda metade do século XX abriu um amplo campo que elaborou os laços de apego e de
interação essenciais à construção do Self. Se D. W. Winnicott e M. Mahler foram precursores,
citem-se os primeiros teóricos do apego: Bowlby, Ainsworth, Main, bem como os trabalhos de
Wolf, Emde, Anders, Sander e Stern. Cada um deles contribuiu para mostrar que o Self enquanto
identidade subjetiva em construção, se faz através das relações mãe-bebê, e que essas relações são
obra de dois parceiros: seu apego mútuo e sua interatividade. Acredito ser isso verdade para a
construção das relações mãe-bebê e igualmente verdade para a construção das relações terapeuta-
paciente.
Quatro modos relacionais emergem progressivamente do encontro com a pessoa que cuida do bebê,
geralmente a mãe.

OS QUATRO MODOS RELACIONAIS DO SELF

O modo relacional existencial participa da emergência do núcleo existencial do Self, da


construção e, depois, da reprodução segura de seus invariantes somato-sensoriais. Ele se afirma no
primeiro olhar e se confirma nas trocas mãe-bebê, contendo a excitação orgânica da criança e
orientando sua vitalidade e suas necessidades de contato.
O modo existencial promove e valida, ao longo da vida, a base fenomenológica do estar-lá-vivo.

O modo relacional interacional participa da emergência dos invariantes sensório-motores que


tornam en Modelos Internos Operativos (MIO). Essos modelos som inicialmente ativado pelas
necessidades de apego e de exploração do ambiente. A regulação das ações envolvidas leva à
estimulação ou à inibição dos MIO sensório-motores, de acordo com as necessidades adaptativas.
O modo interacional garante a reprodução segura dos Modelos Iinternos Operativos sensorio-
motores.

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O modo elacional intersubjetivo facilita a emergência dos estados subjetivos pessoais e a tomada
de conciencia que som diferentes dos estados subjetivos do outro, mas que podem ser expressos e
compartilhados com o outro. Fundamenta-se na capacidade de entonamento.
O modo intersubjetivo promove a possibilidade de expressar e compartilhar seus estados subjetivos
com o otro.

O modo relacional discursivo participa da emergência da reflexão sobre o Self, sobre a relação
com o seu mundo interior e exterior e suas objetivações. Fundamenta-se na capacidade de
compartilhar significados a partir de um sistema de comunicação verbal.
O modo discursivo promove uma continuidade coerente entre o que é vivido e o que é pensado.

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