Introdução • Embora o sistema nervoso central seja constituído pelo encéfalo e pela medula espinal, são considerados tumores primários do SNC as neoplasias que acometem as estruturas intracranianas do neurocrânio, basicamente o encéfalo, seus envoltórios e os nervos cranianos, sendo mais frequentes os gliomas , meningeomas e os neurinomas. • O encéfalo, devido à existência da barreira hematoencefálica e também por estar envolvido pela caixa craniana, de certa forma está protegido de exposições aos agentes químicos e físicos que podem causar neoplasias em outros órgãos, exceto à radiação, que pode induzir ao desenvolvimento de meningeomas. Síndromes raras, de origem heredofamiliar , estão relacionadas com desenvolvimentos de TPSNC, como as facomatoses, relacionadas com gliomas, e a neurofibromatose, com neurioma central e meningeomas. Gliomas • Os gliomas são tumores primários mais frequentes do SNC. Tem origens nas células neurogliais, astrócitos, oligodendrogliocitos, céluas ependimarias e microgliais, que são responsáveis, basicamente, pela manutenção e proteção dos neurônios. • Funções: – Astrócito: fornecem o apoio físico e bioquímico, ajudando no isolamento das superfícies receptoras dos neurônios. – Oligodendrogliócitos: Produzem mielina no SNC. – Células Ependimárias: revestem as paredes dos ventrículos do aqueduto de Sylvius e do canal central da medula. – Células Microgliais: em resposta a um fator agressor ao SNC, assumem a função de macrófagos. MENINGEOMAS • Os meningeomas são tumores que se originam de células meningoteliais, encontradas mais frequentemente nas vilosidades aracníodeas, estruturas predominantes na região parassagital fronto parietal. • Por esse motivo, os meningeomas são mais incidentes nessa localização, com pico de incidência aos 45 anos. • O sexo feminino é o mais acometido, aproximadamente 3:1 em relação ao sexo masculino. • Foram identificados receptores hormonais nos meningeomas e a progesterona é um fator positivo de estimulo ao crescimento tumoral , tanto que pode haver piora clinica e neurológica durante a gravidez. • Porem após a menopausa, a frequência dos meningeomas entre os sexos se iguala. • A Radioterapia é outro fator que favorece o desenvolvimento de meningeomas. • Pacientes que já foram submetido a radioterapia na região do crânio, podem desenvolver meningeomas tardiamente. NEURINOMA • É o terceiro tipo de tumor primário mais frequente no sistema nervoso central. • Seu crescimento é muito lento, acometendo mais as mulheres, sendo raro na raça negra. • A maioria dos neurinomas intracranianos tem origem no oitavo nervo craniano (acústico), nos seus ramos vestibular inferior ou superior. • A sintomatologia inicial do neurinoma do nervo acústico costuma ser a hipoacusia. • Situa-se na entrada do meato acústico interno , pois é essa localização que o 8º nervo craniano adquire celuas de Schwann, que produzem mielina e são as células de origem dos neurinomas (por isso também denominados schwannomas). QUADRO CLINICO • Os sintomas dos pacientes portadores de TPSNC podem ser agrupados em focais e generalizados. • Focais: são aqueles que permitem estimar o local do SNC que esta sendo acometido. – Por exemplo: a hemiparesia ou hemiplegia, podem estar relacionadas a uma lesão na área motora ou na cápsula interna contralaterais ao déficit motor. • A afasia de expressão denota o acometimento da porção média do giro frontal inferior. • A afasia de compreensão esta relacionada com a porção posterior do giro temporal superior, ambas localizadas no hemisfério dominante. • As lesões localizadas no vermis cerebelar distúrbios de coordenação motora ipsilateral. • Generalizados: são os sintomas que ocorrem isoladamente, não permitem a identificação do local do SNC acometido. – Por exemplo: a cefaleia pode ocorrer de forma insidiosa, progressiva, geralmente pela manha, ao acordar, e demonstra aumento progressivo da pressão intracraniana, que ocorre pelo próprio volume do tumor ou por bloqueio do fluxo liquórico, levando à hidrocefalia. – O tempo de evolução da cefaleia depende do ritmo de crescimento tumoral, o mais agressivos com historia mais curta. – Pode ocorrer de forma súbita, sugerindo sangramento tumoral, nessa situação também pode ocorrer diminuição do nível de consciência e instalação de outros déficits. • Em associação à cefaleia por hipertensão intracraniana (HIC) ocorrem vômitos e, em situações mais criticas de HIC, pode haver amaurose por isquemia dos nervos ópticos e alterações do nível de consciência. • Crises convulsivas ocorrem mais frequentemente em pacientes com tumores de crescimento lento, sendo um sintoma generalizado, mas que, em algumas situações, assume características que podem sugerir o local acometido. – Exemplo: Uma crise convulsiva relacionada ao lobo temporal , chamada de crise uncinada, também pode ter características próprias, iniciando-se por alucinações olfativa. DIAGNOSTICO • É feito com base na historia e anamnese, exame físico e neurológico cuidadosos do paciente, orientando a solicitação de exames complementares, dentre os quais, atualmente, os princípios são a tomografia computadorizada e a ressonância nuclear magnética do crânio. • A RNM tem definição de imagem superior à TC, principalmente na fossa posterior, onde a TC apresenta muitos artefatos provocados pelo componente ósseo da pirâmide petrosa. • Atualmente a angiografia é muito pouco utilizada no diagnostico de tumores cerebrais, mas pode ser útil em tumores muito vascularizados, em que pode ser feita uma embolização pré-operatória para reduzir o sangramento cirúrgico. Estadiamento • Tumor Primário (T): • TX – tumor primário indefinido • T0 – sem evidencia de tumor primário • Tumor supratentorial: • T1 – tumor com 5 cm ou menos no seu maior eixo; limitando a um hemisfério cerebral; • T2 – tumor com mais de 5 cm no seu maior eixo; limitando a um hemisfério cerebral. • T3 – tumor que invade o sistema ventricular; • T4 – tumor que atravessa a linha media, invade o hemisfério cerebral contralateral, ou invade o espaço infratentorial. • Supratentorial: parte superior do cérebro • Infratentorial: parte inferior do cérebro • Tumor infratentorial: • T1 – tumor com 3 cm ou menos no seu maior eixo, limitando a um hemisfério cerebelar; • T2 – tumor com mais de 3 cm no seu maior eixo, limitado a um hemisfério cerebelar; • T3 – tumor que invade o sistema ventricular; • T4 – tumor que atravessa a linha média e invade o hemisfério cerebelar contralateral, ou invade o espaço supratentorial. • Linfonodo regional (N): • Essa categoria NÃO é aplicada para Tumores primários do Sistema Nervoso Central. • Metástase a Distancia (M): são muitos raras em TPSNC • MX – a presença de metástases a distancia não é determinada • M0 – ausência de metástases a distancia • MI – presença de metástase a distancia • Graduação Histopatológica: • GX – graduação indefinida • G1 – bem diferenciado • G2 – moderadamente diferenciado • G3 – pouco diferenciado • G4 – indiferenciado TRATAMENTO • O tratamento dos TPSNC está apoiado principalmente na cirurgia e na radioterapia, sendo a neurocirurgia o primeiro recurso utilizado, com poucas exceções. • Os conceitos de cirurgia oncológica que preconizam a retirada em bloco, sem a abertura das paredes do tumor e com margens de ressecção, raramente podem ser aplicados na cirurgia neurológica. • O procedimento permite a obtenção de amostra da neoplasia para definição do diagnostico histológico e a redução do volume tumoral , melhorando a atuação do tratamento adjuvante. • A radioterapia é a forma de tratamento muito importante nos TPSNC, podendo ser utilizada de forma combinada à cirurgia ou isolada. Geralmente é indicada em tumores de histologia de alto grau, mesmo se ressecados totalmente, e nos tumores parcialmente, e nos tumores parcialmente ressecados, independente da histologia. • As lesões localizadas em regiões de difícil ou impossível acesso cirúrgico, como o diencéfalo, tronco cerebral e região motora cortical, são candidatas a tratamento com radioterapia exclusiva após biópsia estereotáxica, ou mesmo sem diagnostico histológico, como para os tumores de nervo óptico e os infiltrativos da ponte. • A politica de tratamento e a técnica de irradiação empregada, incluindo a forma, a composição dos campos e a dose prescrita, dependem do tipo histológico do tumor, da sua localização, do seu volume e da tolerância do tecido cerebral normal circunjacente. • A dose máxima que pode ser aplicada ao SNC é de 60 a 61 Gy. • A radionecrose é uma das complicações que podem ocorrer, estando diretamente relacionada à dose e à duração da radioterapia, sendo mais comum após o primeiro ano do termino do tratamento: raramente ocorre com doses totais abaixo de 54 Gy, em frações diárias de 180 a 200 cGy, porem podem ocorrerem doses totais de 50 Gy, se aplicadas em frações diárias de superiores a 220 cGy. • O tratamento para radionecrose costuma ser conservador, com uso de corticoide mas, em casos em que há grande efeito de massa tumoral, esta indicada a cirurgia. • Outros efeitos colaterais da radioterapia incluem hiperpigmentação da pele, eritema cutâneo, alopecia, atrofia cerebral, demência e déficits focais. • Essas complicações tardias encefálicas estão associadas a alterações degenerativas microvasculares da senescência, acentuadas com diabetes de longa evolução e doença hipertensiva ou arteriopatias escleróticas. • Após 1 mês do termino da radoterapia, é feito um controle utilizando métodos de imagem para determinar a resposta do tumor ao tratamento. Seguimento • Evolutivo dos pacientes submetidos ao tratamento para TPSNC malignos é feito com métodos de imagem (TC ou RNM) a cada três meses nos primeiros 24 meses, a cada seis meses nos próximos 12 meses e a seguir anualmente; mas isso pode variar de acordo com a evolução clinica e intercorrências de cada paciente, como o comportamento biológico de cada tumor, com os métodos terapêuticos utilizados e presença ou não de resíduo tumoral. • Para pacientes submetidos a tratamento de tumores benignos, tal controle pode ser semestral no primeiro ano e a seguir anualmente; também pode variar conforme a evolução de cada paciente e a presença ou não de tumor residual. Rotina terapêutica e aspectos técnicos • Sempre que o campo terapêutico estiver em proximidade com o aparato óptico ou auditivo, sugere-se campimetria visual ou audiometria prévias para identificação e mensuração de eventuais déficits preexistentes. • As doses limitanes em órgão de risco devem ser consideradas em todos os planejamentos, inclusive para modificações da técnica escolhida. ÓRGÃO VOLUME MÁXIMO / DOSE MÁXIMA
Medula espinal Dose pontual máxima: 45 Gy
Tronco cerebral Dose pontual máxima: 55,7 Gy
Cristalino Dose pontual máxima: 10 Gy
Quiasma óptico Dose pontual máxima: 50 Gy
Nervo óptico D/E Dose pontual máxima: 50 Gy
Hemisfério cerebral sem PTV Dose pontual máxima: 45 Gy
Hipófise Dose pontual máxima: 54 Gy
• As questões relativas à definição de volume alvo e margens clinicas e terapêuticas para os gliomas são:
GTV Volume tumoral definido pela sequencia em T1 com contraste
da RNM CTV Margens sugerida de 2 cm do GTV com margens usualmente assimétricas e volume corrigido pelo edema na sequencia em T2 da RNM (gliomas de baixo grau usualmente utilizam CTV único) CTV 2 Quando aplicável (gliomas de alto grau) margens assimétricas sugeridas de 1 a 2 cm do GTV. PTV Margens adicionais a serem definidas pela imobilização/setup do paciente para cada CTV (individualizada para cada serviço – usualmente 0,5 cm) Neoplasia cerebral localizada • O paciente deve ser posicionado em decúbito dorsal com os braços ao longo do corpo de maneira confortável e reprodutível. • É utilizado suporte de cabeça e máscara termoplástica, moldada no paciente no dia da simulação. • A máscara utilizada para região cerebral é a curta. • É comum o uso do acessório de apoio para os pés, pois isso facilita na reprodução diária do posicionamento. • Utilizando a radioterapia tridimensional, a simulação não pode ser realizada somente com imagens da tomografia, pois estas, mesmo com contraste, não permite uma exata definição de toda extensão tumoral, além de não ser possível visualizar muitos órgãos de risco. Além disso, evita-se fazer tomografia com contraste em radioterapia para que o cálculo não seja alterado, já que este leva em consideração a densidade do tecido na imagem de acordo com a escala de cinza (Hounsfield). • Portanto, para tumores cerebrais é necessária a realização de uma simulação complementar com ressonância magnética (RM). O posicionamento realizado na tomografia deve ser reproduzido na RM. As imagens dos dois exames são enviadas ao sistema de planejamento de radioterapia e este realiza a fusão das imagens. Os órgãos e alvo tumoral são delimitados na tomografia ao mesmo tempo em que são visualizados nas imagens de RM. • A dose de radiação a ser administrada depende do tipo de tumor, seu grau mutagênico e dos órgãos sadios adjacentes. Varia entre 180 cGy/dia (ex.: melanoma) a 200 cGy/dia (ex.: glioblastoma). A dose total pode variar de 50,4 Gy (28 frações de 180 cGy) a 66 Gy (33 frações de 200 cGy). • A distribuição dos campos, ou seja, a incidência de cada entrada da dose que será absorvida pelo tumor, depende também de sua localização e dos órgãos de risco. • Existem limites de dose recomendados para cada tecido sadio na região cerebral, como por exemplo, o tronco cerebral tem um limite máximo de dose de 54 Gy • Em caso de lesões menores, malignas ou benignas, ou até metástases, pode ser indicada a técnica de radiocirurgia estereotáxica. Esta técnica tem como principio a localização precisa do alvo utilizando coordenadas espaciais. • Com maior precisão na localização, é possível aumentar a dose administrada no alvo, e entregar menos dose nos órgão de risco. • A radiocirurgia estereotáxica pode ser realizada em uma única fração (dose de 12 Gy a 20 Gy) ou fracionada (4 frações de 5 Gy ou 5 frações de 4 Gy). • Também é indicada no tratamento de malformações arteriovenosas cerebrais (MAV), as quais não são neoplasias. CRÂNIO TOTAL • O protocolo de irradiação total do cérebro é indicado para os casos em que o crânio está com múltiplas lesões, geralmente proveniente de metástases. É um tratamento considerado paliativo. O posicionamento é o mesmo utilizado no caso de lesões localizadas. • A dose de radiação é prescrita no meio do diâmetro látero – lateral (DLL), distribuindo metade da dose em cada incidência (lateral direito e lateral esquerdo), compondo dois campos paralelos e opostos. O colimador deve ser angulado e cada incidência para que o cristalino não seja irradiado, mesmo na contralateral do campo. • A dose mais comum é de 30 Gy (10 frações de 3 Gy). Também pode ser administrado 20 frações de 2 Gy (40 Gy no total). TUMORES DA HIPÓFISE • Os tumores da hipófise são benignos e podem ser tratados com drogas e hormônios, cirurgicamente ou com radioterapia. A conduta depende do tamanho do tumor (microadenoma ou macroadenoma). • Hoje em dia, a preferência está no emprego da radioterapia, devido aos seus resultados. • O posicionamento e os acessórios utilizados ainda seguem a mesma filosofia dos protocolos anteriores, com uma ressalva. • É comum o uso de base de acrílico angulada para hiperflexionar a região craniana, permitindo que a região facial fique livre de incidências de campos, mesmo em relação à saída destas. • A composição dos campos mais comum é com uma incidência anterior e duas incidências laterais (direita e esquerda). • O uso de filtro em cunha nos campos laterais faz-se necessário. Pode ser utilizado o filtro dinâmico. • Se a base angulada não for utilizada, a entrada do campo anterior deve ser realizada com a mesa rotacionada, devido à incidência anterior. • A dose é prescrita na isodose resultante da composição dos campos descritos. Pode variar de 45 Gy (25 frações de 180 cGy/dia) à 50,4 Gy (28 frações de 180 cGy/dia). Existem casos em que são utilizados 54 Gy (30 frações de 180 cGy/dia). • As doses dependem no volume tumoral e seu grau histológico. TÉCNICA DE NEURO-EIXO • Este protocolo é empregado nos casos de Leucemia Linfoide Aguda (LLA), meduloblastoma e ependimonas. • É utilizado quando é necessário irradiar todo o crânio e toda a extensão medular, ou seja, toda a coluna onde há o líquido medular. • O paciente é posicionado em decúbito ventral, com pescoço fletido para evitar a divergência do feixe na cavidade oral, maxila e mandíbula. • Para isso é necessário deitar o paciente em uma rampa ou em um colchão a vácuo (melhor reprodutibilidade) e utilizar a base de neuroeixo, onde é encaixada a testa e o queixo do paciente. • Os campos de coluna são campos diretos, prescritos na profundidade do canal medular. • Quando necessário separar os campos de coluna (e geralmente é, pois o colimador abre até 40 cm), é denominado campo de coluna torácica e campo de coluna lombar. • Para evitar a sobre dose dos campos de coluna, é feito um "gap" (espaçamento) entre estes campos e este "gap" deve ser movido durante o tratamento, para que a sobre dose não seja sempre no mesmo local. • O "gap" é calculado por semelhança de triângulos e depende da profundidade de cálculo. • Nos campos craniais, a dose é prescrita no meio do diâmetro látero-lateral (DLL), distribuindo metade da dose em cada incidência (lateral direito e lateral esquerdo). • O ângulo do colimador para o campo cerebral deve acompanhar a divergência do campo de coluna, para que seja evitada também uma superposição da dose. • Um "gap" também é calculado nesta região, pois existe a divergência dos campos cerebrais no encontro do campo de coluna. Este "gap" também é movido ao longo do tratamento. Posicionamento e Tratamento do