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Anomalia de Ebstein

Definição: Trata-se de uma má-formação cardíaca que acomete o ventrículo direito e a valva
tricúspide. O resultado final é o deslocamento do folheto septal da valva tricúspide para a região
apical, com displasia do mesmo. O folheto mural posterior pode ou não também se deslocar, o que
não ocorre com o folheto anterior. Essa alteração na valva tricúspide causa uma "atrialização" do
ventrículo direito, tornando-o pequeno e mal funcionante.

Fisiopatologia

A má-formação leva à insuficiência tricúspide, aumento atrial direito. Pode haver shunt direita-
esquerda pelo FOP ou CIA, aumento e sobrecarga com falência do VD.

Patologias associadas:
Comunicação interatrial (CIA) ou forame oval patente (FOP), 50% dos casos;

Comunicação interventricular (CIV)

Via acessória (Wolf-Parkinson-White);

Graus variáveis de obstrução do trato de saída do VD;

Persistência do canal arterial;

Coarctação da aorta;

Insuficiência tricúspide.


Apresentação Clínica

Anamnese

O espectro clínico é bem variável e é definido pelo grau de deformidade da valva:


Muito grave: Morte intrauterina por hidropisia fetal;

Grave: Sintomas no recém-nascido (cianose);

Moderada: Sintomas no fim da adolescência (arritmias ou insuficiência cardíaca);

Leve: Pode não haver sintomas, com relato de pacientes que foram até a nona década
de vida.

Em crianças, pode haver retardo do desenvolvimento e insuficiência cardíaca à direita e


cianose. Já pacientes jovens e adultos podem apresentar intolerância ao esforço,
taquiarritmias supraventriculares, shunt direita-esquerda pela comunicação entre os átrios e
até embolia paradoxal, gerando um quadro de AVC. Sinais de insuficiência ventricular direita
podem estar presentes e estes pacientes podem inclusive cursar com morte súbita de
provável origem arrítmica.

Exame Físico

A despeito do quadro de insuficiência ventricular direita, a pressão venosa central não está
aumentada devido a um átrio grande e complacente e um VD pequeno, portanto não é de se
esperar turgência jugular patológica.

A primeira bulha está desdobrada pelo componente tricúspide (sail sound ou som de vela de
barco), enquanto a segunda bulha se desdobra pelo bloqueio de ramo direito. Há um sopro
holossistólico pela valva tricúspide que aumenta com a inspiração, além da presença de
cianose a depender do shunt pela comunicação atrial.


Abordagem Diagnóstica

Eletrocardiograma (ECG): O ECG na anomalia de Ebstein pode apresentar diversas


alterações, como: aumento atrial direito, representado por uma "apiculação" da onda P melhor
visível em DII e V1; baixa voltagem; um intervalo PR geralmente aumentado; e um padrão de
bloqueio de ramo direito. Em paciente com via acessória, pode haver PR curto e onda delta.
Fibrilação atrial e flutter podem estar presentes na apresentação e, controversamente, em
determinados casos o ECG pode ser normal.

Radiografia de tórax: Pode evidenciar aumento atrial direito e cardiomegalia com coração
em "moringa". As demais estruturas não apresentam grandes alterações.

Ecocardiograma (ECO): O diagnóstico é confirmado pelo ecocardiograma através de um


deslocamento apical do folheto septal da valva tricúspide, maior ou igual a 8 mm/m2,
associado a um folheto anterior com aparência de vela de barco. O tamanho e função do VD
também podem ser medidos. O ECO permite ainda o diagnóstico e avaliação de
comunicações entre os átrios e estima a gravidade da regurgitação tricúspide.

Cineangiocoronariografia: Este exame se presta, na anomalia de Ebstein, a excluir casos


duvidosos de coronariopatia em adultos e medir as pressões do lado direito do coração.

Ressonância magnética (RM): A RM exibe uma melhor apresentação espacial e visualização


das estruturas cardíacas em pacientes que não apresentam janela acústica favorável ao
ecocardiograma. Além disso, ela é capaz de informar os volumes atrial e ventricular direito e a
função do VD.


Diagnóstico Diferencial

Insuficiência cardíaca; * INFO


Insuficiência tricúspide; * INFO
CIA. * INFO

Acompanhamento

O acompanhamento depende da gravidade do quadro, podendo ser anual em casos estáveis


com plastia da valva tricúspide, até acompanhamentos mais esparsos em casos
assintomáticos.


Abordagem Terapêutica

A abordagem da anomalia de Ebstein é cirúrgica e sua indicação advém dos seguintes


quadros:

Cianose importante;

Insuficiência cardíaca com baixa capacidade funcional;

Embolia paradoxal;

Eventualmente, para tratamento de arritmias supraventriculares não controladas


clinicamente ou cardiomegalia importante, porém assintomática;

Dilatação progressiva e disfunção sistólica do VD.

A plastia da valva tricúspide é sempre preferencial quando possível, e deve ser realizada por
equipe experiente. A plastia é possível se o folheto anterior da valva não estiver aderido ao
miocárdio do VD, e se o VD tiver um tamanho adequado e favorável ao procedimento
cirúrgico.

Caso não possa ser realizada, a plastia deve-se proceder a substituição da valva por uma
prótese. Ocasionalmente, em pacientes com regurgitação tricúspide grave e VD hipoplásico, a
melhor opção pode ser a cirurgia de Fontan. Pacientes com fibrilação atrial ou flutter podem
se beneficiar da cirurgia de Maze. Deve ocorrer o fechamento de comunicações interatriais e
eliminação da via acessória, caso essa esteja presente.

No mais, pacientes mais graves com regurgitação tricúspide grave podem se beneficiar de
uma conexão cavopulmonar bidirecional.

O resultado da plastia da valva é excelente a médio prazo, já a substituição por prótese


apresenta resultados mais modestos com necessidade de reabordagem para troca da valva.

Para mais informações sobre o tratamento no período neonatal e infantil, acesse Anomalia de
Ebstein. * INFO

O tratamento das taquiarritmias pelo Ebstein não difere das taquiarritmias fora da doença e
pode ser revisado em conteúdo específico. Acesse: Taquiarritmias * INFO

Autoria

Autor(a) principal: Gabriel Quintino Lopes (Clínica Médica e Cardiologia).

Equipe adjunta:
Eraldo Moraes (Cardiologia, Eletrofisiologia, com especialização em Marca-passo).


Referências Bibliográficas

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2013.

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