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VENTILAÇÃO MECÂNICA NA

SÍNDROME DO DESCONFORTO
RESPIRATÓRIO AGUDO

Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA) ou


Síndrome da Angústia Respiratória Aguda (SARA) – ARDS
(Acute Respiratory Distress Syndrome) – trata-se de uma
insuficiência respiratória aguda, com rápida evolução
sintomática, e uma lesão pulmonar aguda em seu estágio
mais grave, desnudando um dano alveolar difuso, sendo
esta a característica histológica mais importante (BARBAS,
2011; RIOS, 2016; COSTA, 2020).
O desenvolvimento ocorre a partir do aumento da
permeabilidade da membrana alveolar capilar pulmonar,
gerando quadros de hipoxemia (relação PaO2:FiO2 < 300) e
opacidade pulmonar bilateral difusa (SILVA, QUEIROZ,
BOGLIOLO FILHO, 2016; WILSON, CALFEE, 2020).
Além disso, caracteriza-se por um processo de inflamação
aguda, diminuição do tecido pulmonar ventilado e dispneia
aguda, com diversas possibilidades de etiologia (RANIERI
et al., 2012; WARE, 2021), como a infecção por SARS-Cov-
2 – COVID-19, em que, segundo a CONASS, 2021,
a Síndrome do Desconforto Respiratório
Agudo desenvolveu-se como a forma crítica da infecção.
Dessa forma, entende-se que a SARA não é uma doença
específica, mas sim uma agressão intensa à barreira dos
alvéolos-capilares, a partir de fatores etiológicos, causais
ou agentes de risco, como pneumonia, sepse, aspiração e
trauma grave (WARE, 2021).
EU QU ERO B AIXAR

O tratamento primário para a SDRA baseia-se,


principalmente, na ventilação mecânica (VM) com pressão
de platô limitada e baixo volume de corrente, sendo estes,
indicativos de redução da mortalidade; já para melhora
clínica, o bloqueio neuromuscular e a posição prona foram
os mais indicativos (WARE, 2021), tendo todos o objetivo de
melhorar a oxigenação e diminuir as possíveis
complicações de hipoxemia (BEZERRA et al., 2020).
Fisiopatologia
O pulmão através das unidades alvéolo-capilares distais
elimina dióxido de carbono e facilita a transferência de
oxigênio.  No pulmão não lesado é estabelecida uma
barreira seletiva para fluidos e solutos através de uma
monocamada de células endoteliais. Dessa forma, quando
se forma edema alveolar, esta camada é responsável pela
reabsorção de fluido, sendo depois removido
primariamente pela circulação linfática e pela
microcirculação pulmonar (DA COSTA, 2020). 
Na Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo, existe
uma inflamação exacerbada e descontrolada, a perda da
permeabilidade da membrana alveolar-capilar, a
acumulação de leucócitos e plaquetas no espaço alveolar, e
a ativação desequilibrada da cascata de coagulação
(COSTA, 2019).
Com esse aumento da permeabilidade ao líquido e às
proteínas no endotélio pulmonar, há formação de edema
no interstício pulmonar. Em seguida, o fluido edematoso se
transloca para os alvéolos, muitas vezes facilitado pela
lesão endotelial. Um aumento da
permeabilidade vascular pode acontecer, por morte das
células endoteliais ou por quebra das junções
intercelulares (caderinas).
Em suma, a lesão endotelial vai provocar um aumento da
permeabilidade alvéolo-capilar, resultando em hipoxemia
arterial e déficit de eliminação de dióxido de carbono,
devido a uma incompatibilidade entre o processo de
ventilação-perfusão e a um shunt (DA COSTA, 2020).
O que acontece no doente com SDRA, independentemente
da causa, é uma lesão tanto no endotélio capilar como no
epitélio alveolar. Começa por ocorrer uma lesão aguda e
difusa do pulmão, consequência da resposta do sistema
imunitário a um estímulo, este pode consistir numa lesão
diretamente no epitélio alveolar, por inalação de toxinas ou
infecção pulmonar (pneumonia e aspiração gástrica); ou
numa lesão no endotélio capilar por toxinas circulantes
(COSTA, 2019).
Quando observamos as alterações histológicas, estas são
principalmente divididas em 3 fases (DA COSTA, 2020):
 Fase exsudativa (dias 1 a 7): Este estádio caracteriza-se

principalmente pela formação de edema intersticial e


intra alveolar bem como da formação de membranas
hialinas devido à precipitação do edema;
 Fase proliferativa (dias 7 a 21): Este estádio

caracteriza-se essencialmente pela resolução do


edema, com hiperplasia de pneumócitos tipo II e
presença de inflamação crônica, fibrose organizada,
necrose do parênquima e macrotrombos;
 Fase fibrótica (após 21 dias): Alguns doentes

(fundamentalmente aqueles que apresentam doença


prolongada) podem ainda evoluir para este estádio
que é caracterizado por fibrose pulmonar com
alteração da estrutura pulmonar e bronquiectasias de
tração.
Em suma, o edema e o colapso alveolar nas fases
exsudativa e proliferativa levam à hipoxemia grave
apresentada por estes doentes. Assim, como os alvéolos
continuam a ser perfundidos e não se encontram
ventilados, isto leva a que exista uma baixa relação
ventilação/perfusão e consequente shunt pulmonar. Existe
também um aumento do espaço morto que poderá levar a
uma difícil eliminação do CO2, no entanto a hipercapnia é
incomum (COSTA, 2020).
Tratamento para a Síndrome do
Desconforto Respiratório Agudo
A ventilação mecânica é a base do tratamento
para Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo,
visando reduzir a lesão pulmonar, sendo necessária,
portanto, que nas primeiras 48hrs de tratamento se utilize,
por recomendação, modos ventilatórios controlados
garantindo os valores de PaCO2 e pH adequados
(WIEDEMANN, WHEELER, BERNARD et al. 2006).
Entretanto, existem alguns efeitos adversos da VM que
surgem de duas principais causas: aumento não fisiológico
da pressão transpulmonar e aumento/diminuição não
fisiológicos da pressão pleural durante a ventilação com
pressão positiva ou negativa. Tais efeitos são responsáveis
pela lesão pulmonar induzida pelo ventilador.
Todavia, há princípios para que o tratamento seja seguro a
todos os pacientes e para que o pulmão infle artificialmente
aumentando a pressão transpulmonar; dessa forma,
existem duas opções a serem seguidas: ventilação com
pressão positiva ou ventilação com pressão negativa, em
que a caixa torácica é expandida pela pressão externa
negativa. Entre as duas opções citadas há também formas
mistas de ventilação, sendo por meio de pressão positiva
nas vias aéreas que induz a contração dos músculos
respiratórios, reduzindo a pressão pleural durante a
expiração (VIEILLARD- BARON et al., 2016).
Os pacientes infectados por COVID-19 apresentam
alterações na oxigenação pulmonar, manifestando um
quadro agudo de dispneia, sendo necessária a terapia com
VM, por desenvolvimento da SDRA, enquanto complicação
da infecção viral. Entretanto, por vezes, a VM não é
suficiente para que os pulmões obtenham um grande fluxo
de ar, fazendo-se necessário o uso do recurso de posição
prona, pois a parte mais pesada dos pulmões se localiza no
dorso corporal, o que aumenta a dificuldade da respiração
em posição supina; contudo, a posição prona permite o
maior fluxo sanguíneo e o oxigênio é distribuído de
maneira mais homogênea.
O uso do recurso combinado de posição prona e ventilação
mecânica, portanto, é altamente recomendável para
adultos com SDRA grave, fazendo-se necessária de 12 a 16
horas por dia (PAUL, 2020; GATTINONI, 2017).
Conclusão
É evidente que a Síndrome do Desconforto Respiratório
Agudo se mostra constante em casos presentes nas UTI,
principalmente, após a infecção pandêmica do COVID-19,
capaz de agravar-se e desenvolver tal síndrome. Dessa
forma, portanto, como base de tratamento para reduzir os
danos pulmonares causados por tal, a VM associada a
posição prona se destaca como benéfica à melhora
respiratória e à sobrevida dos pacientes acometidos

Ventilação mecânica na SDRA


A ventilação mecânica e a PEEP não previnem ou tratam diretamente a SDRA, mas
mantêm o paciente vivo até que a patologia subjacente seja resolvida e a função
pulmonar adequada seja restaurada.

A base da ventilação mecânica contínua (VMC) durante a SDRA consiste na


ventilação convencional 'volume-dependente' usando volumes correntes de 10-15
ml/kg.

Nas fases agudas da doença, é utilizada assistência respiratória completa


(geralmente por meio de ventilação 'assistida-controlada' ou ventilação forçada
intermitente [VMI]).

A assistência respiratória parcial geralmente é fornecida durante a recuperação ou


desmame do ventilador.

A PEEP pode levar à retomada da ventilação em zonas de atelectasia,


transformando áreas pulmonares previamente desviadas em unidades respiratórias
funcionais, resultando em melhora da oxigenação arterial com menor fração
inspirada de oxigênio (FiO2).

A ventilação de alvéolos já atelectáticos também aumenta a capacidade residual


funcional (CRF) e a complacência pulmonar.

Geralmente, o objetivo da CMV com PEEP é atingir uma PaO2 maior que 60 mmHg
em uma FiO2 menor que 0.60.

Embora a PEEP seja importante para manter a troca gasosa pulmonar adequada em
pacientes com SDRA, efeitos colaterais são possíveis.

Complacência pulmonar reduzida devido à hiperdistensão alveolar, retorno venoso e


débito cardíaco reduzidos, RVP aumentada, pós-carga ventricular direita aumentada
ou barotrauma podem ocorrer.

Por essas razões, níveis 'ótimos' de PEEP são sugeridos.

O nível ótimo de PEEP é geralmente definido como o valor no qual o melhor O2del
é obtido com uma FiO2 abaixo de 0.60.

Os valores de PEEP que melhoram a oxigenação, mas reduzem significativamente o


débito cardíaco não são ideais, pois nesse caso o O2del também é reduzido.

A pressão parcial de oxigênio no sangue venoso misto (PvO2) fornece informações


sobre a oxigenação tecidual.

Uma PvO2 abaixo de 35 mmHg é indicativa de oxigenação tecidual abaixo do ideal.

Uma redução no débito cardíaco (que pode ocorrer durante a PEEP) resulta em
baixa PvO2.

Por esse motivo, o PvO2 também pode ser usado para a determinação da PEEP
ideal.

A falha da PEEP com CMV convencional é o motivo mais frequente de mudança


para ventilação com relação inspiração/expiração (I:E) alta ou inversa.

Atualmente, a ventilação com relação I:E reversa é praticada com mais frequência
do que a ventilação de alta frequência.

Proporciona melhores resultados com o paciente paralisado e o ventilador


cronometrado para que cada novo ato respiratório inicie assim que a expiração
anterior atingir o nível ideal de PEEP.

A frequência respiratória pode ser reduzida prolongando a apneia inspiratória.

Isso muitas vezes leva a uma redução da pressão intratorácica média, apesar do
aumento da PEEP, e, portanto, induz uma melhora no O2del mediada pelo aumento
do débito cardíaco.
Ventilação por pressão positiva de alta frequência (HFPPV), oscilação de alta
frequência (HFO) e ventilação por jato de alta frequência (HFJV) são métodos que
às vezes são capazes de melhorar a ventilação e a oxigenação sem recorrer a altos
volumes ou pressões pulmonares.

Apenas a HFJV tem sido amplamente aplicada no tratamento da SDRA, sem


vantagens significativas sobre a CMV convencional com PEEP demonstrada de
forma conclusiva.

A oxigenação extracorpórea por membrana (ECMO) foi estudada na década de


1970 como um método que poderia garantir uma oxigenação adequada sem
recorrer a qualquer forma de ventilação mecânica, deixando o pulmão livre para
cicatrizar das lesões responsáveis pela SDRA sem submetê-lo ao estresse
representado pela pressão positiva ventilação.

Infelizmente, pacientes tão graves que não responderam adequadamente à


ventilação convencional e, portanto, eram elegíveis para ECMO, apresentavam
lesões pulmonares tão graves que ainda apresentavam fibrose pulmonar e nunca
recuperaram a função pulmonar normal.

Desmame da ventilação mecânica na SDRA


Antes de retirar o paciente do ventilador, é necessário verificar suas chances de
sobrevivência sem assistência respiratória.

Índices mecânicos como pressão inspiratória máxima (PImáx), capacidade vital (CV) e
volume corrente espontâneo (VC) avaliam a capacidade do paciente de transportar
ar para dentro e para fora do tórax.

Nenhuma dessas medidas, no entanto, fornece informações sobre a resistência dos


músculos respiratórios ao trabalho.

Alguns índices fisiológicos, como pH, relação espaço morto/volume corrente,


P(Aa)O2, estado nutricional, estabilidade cardiovascular e equilíbrio metabólico
ácido-base refletem o estado geral do paciente e sua capacidade de tolerar o
estresse do desmame do ventilador .

O desmame da ventilação mecânica ocorre progressivamente, para garantir que a


condição do paciente seja suficiente para garantir a respiração espontânea, antes da
retirada da cânula endotraqueal.

Essa fase geralmente se inicia quando o paciente está clinicamente estável, com
FiO2 inferior a 0.40, PEEP de 5 cm H2O ou menos e os parâmetros respiratórios,
referidos anteriormente, indicam uma chance razoável de retomada da ventilação
espontânea.
A VMI é um método popular para desmame de pacientes com SDRA, pois permite o
uso de PEEP modesta até a extubação, permitindo que o paciente enfrente
gradualmente o esforço necessário para a respiração espontânea.

Durante esta fase de desmame, o monitoramento cuidadoso é importante para


garantir o sucesso.

Alterações na pressão arterial, aumento da frequência cardíaca ou respiratória,


redução da saturação de oxigênio arterial medida pela oximetria de pulso e piora das
funções mentais indicam falha do procedimento.

Uma desaceleração gradual do desmame pode ajudar a prevenir uma falha


relacionada à exaustão muscular, que pode ocorrer durante a retomada da
respiração autônoma.

Monitoramento durante a SDRA


A monitorização arterial pulmonar permite medir o débito cardíaco e calcular O2del
e PvO2.

Esses parâmetros são essenciais para o tratamento de possíveis complicações


hemodinâmicas.

A monitorização da artéria pulmonar também permite a medição das pressões de


enchimento do ventrículo direito (PVC) e das pressões de enchimento do ventrículo
esquerdo (PCWP), que são parâmetros úteis para determinar o débito cardíaco ideal.

O cateterismo arterial pulmonar para monitoramento hemodinâmico torna-se


importante no caso de a pressão arterial cair tão baixo a ponto de exigir tratamento
com drogas vasoativas (por exemplo, dopamina, norepinefrina) ou se a função
pulmonar se deteriorar a ponto de exigir PEEP superior a 10 cm H2O.

Mesmo a detecção de uma instabilidade pressora, como a necessidade de grandes


infusões de líquidos, em um paciente que já se encontra em condição cardíaca ou
respiratória precária, pode exigir a colocação de cateter de artéria pulmonar e
monitorização hemodinâmica, mesmo antes da necessidade de drogas vasoativas
administrado.

A ventilação com pressão positiva pode alterar os dados de monitoramento


hemodinâmico, levando a um aumento fictício dos valores de PEEP.

Valores elevados de PEEP podem ser transmitidos ao cateter de monitorização e ser


responsáveis por um aumento nos valores calculados de PVC e PCWP que não
correspondem à realidade (43).

Isso é mais provável se a ponta do cateter estiver localizada próxima à parede


torácica anterior (zona I), com o paciente em decúbito dorsal.

A zona I é a área pulmonar sem declividade, onde os vasos sanguíneos estão


minimamente distendidos.
Se a extremidade do cateter estiver localizada no nível de um deles, os valores de
PCWP serão muito influenciados pelas pressões alveolares e, portanto, serão
imprecisos.

A zona III corresponde à área pulmonar mais declive, onde os vasos sanguíneos
estão quase sempre distendidos.

Se a extremidade do cateter estiver localizada nesta área, as medições feitas serão


afetadas apenas marginalmente pelas pressões de ventilação.

A colocação do cateter no nível da zona III pode ser verificada por meio de uma
radiografia de tórax em projeção lateral, que mostrará a ponta do cateter abaixo do
átrio esquerdo.

A complacência estática (Cst) fornece informações úteis sobre a rigidez pulmonar e


da parede torácica, enquanto a complacência dinâmica (Cdyn) avalia a resistência
das vias aéreas.

Cst é calculado dividindo o volume corrente (VT) pela pressão estática (platô) (Pstat)
menos PEEP (Cst = VT/Pstat – PEEP).

O Pstat é calculado durante uma apnéia inspiratória curta após uma respiração
máxima.

Na prática, isso pode ser obtido pelo comando de pausa do ventilador mecânico ou
pela oclusão manual da linha expiratória do circuito.

A pressão é verificada no manômetro do ventilador durante a apnéia e deve estar


abaixo da pressão máxima das vias aéreas (Ppk).

A complacência dinâmica é calculada de forma semelhante, embora neste caso seja


utilizada Ppk em vez da pressão estática (Cdyn = VT/Ppk – PEEP)

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