INTRODUÇÃO
1
Este trabalho é parte do resultado das pesquisas desenvolvidas nas áreas objeto do estudo para subsidiar
a realização do estágio pós-doutoral na Universidade de Barcelona, no período de agosto de 2012 a julho
de 2013, supervisionado pela Profa. Dra. Maria Angelis Alió i Torres e financiado pela Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES).
demanda turística em expansão. Este processo se deu de forma intensa, principalmente,
em áreas ainda não consolidadas, através da destruição de ambientes naturais e em áreas
consolidadas do bairro favorecendo a inserção de problemas sociais tais como:
migração da população autóctone, segregação residencial, substituição da mão de obra
local por de origem externa.
Em Poblenou o processo se deu a partir do final da década de 1980, com a
escolha de Barcelona para sediar os Jogos Olímpicos de 1992, no qual o poder público e
a iniciativa privada iniciam um processo de implantação de vários empreendimentos
com vistas a atender as necessidades de realização dos referidos Jogos, favorecendo um
processo de atratividade por parte do turismo local. Tais empreendimentos se
constituem em obras gentrificadas as quais provocaram uma transformação e uma
revalorização e renovação dos imóveis que tem contribuído para a “expulsão” da
população autóctone do bairro (BERNHARDET, 2012; OBESO, 2012). Associada a
isto o capital privado tem investido maciçamente através da construção de prédios
verticalizados em áreas consolidadas, antes ocupadas por antigas fábricas ou pela
substituição de edificações antigas, fatos que têm contribuído para descaracterizar e
eliminar a história do bairro(TATJER, 2008). Assim, os agentes imobiliários procuram
auferir um lucro cada vez maior com a construção de edifícios verticais nas duas áreas,
que diminuem o custo com a compra de lotes, fazendo com que o metro quadrado da
terra aumente significativamente de preço.
Para realização da pesquisa, utilizamos como metodologia nas duas áreas, fontes
primárias e secundárias as quais foram importantes para averiguarmos a natureza da
problemática investigada. Com relação às fontes secundáriasforam feitas visitas a
órgãos públicos e privados visando identificar trabalhos sobre as áreas objeto de estudo
que subsidiassem aos temas que nos propusemos realizar. Quanto à fonte primária
foram aplicados questionários com a população residente das duas áreas, e demais
agentes sociais estabelecidos nos bairros, como comerciantes, incorporadores de
imóveis, proprietários de hoteis etc.
O crescimento do turismo que tem se acentuado em Natal nas últimas décadas,
ao lado das políticas públicas empreendidas, tem impulsionado a expansão urbana da
cidade de forma acelerada, tanto no sentido horizontal quanto vertical. O bairro Ponta
Negra, devido as suas belezas naturais, é uma das áreas onde esse processo tem sido
mais acentuado, se constituído como local de atratividade, tanto por parte de segmentos
mais privilegiados de Natal quanto de outros estados brasileiros e também do exterior,
que procuram investir no bairro com aquisição de imóveis. Com efeito, Ponta Negra
tem se constituído em um local privilegiado da cidade onde o poder público, através de
projetos de urbanização do bairro, e o capital imobiliário, através da construção de
condomínios verticalizados, notadamente o flat, investido maciçamente, como forma de
atender a essa demanda solvável da sociedade, que passa a exigir do poder público
melhor infraestrutura urbana. Essa expansão tem trazido consequências profundas na
estruturação do bairro pois, com a elevação dos preços dos terrenos e dos imóveis
construídos, vem ocorrendo um afastamento de segmentos pobres da população para
áreas mais distantes, estabelecendo-se assim uma segregação residencial.
No bairro Poblenou em Barcelona, mesmo considerando as peculiaridades e
características locais, existem similaridadescom a realidade em Ponta Negra. A partir
dos anos de 1970 do século passado, inicia-se em Poblenou um processo de decadência
econômica, em virtude do colapso da atividade industrial a qual perdurou até o final da
década de 1980. Devido ao anúncio da escolha de Barcelona para sediar os Jogos
Olímpicos de 1992, começa uma escalada de revalorização do seu tecido urbano com a
construção da Vila Olímpica e de outras intervenções urbanísticas como a implantação
da Ronda Litoral, as construções do Nodo de Glories, do Teatro Nacional de Catalunha,
do Auditório Municipal e do Fórum Universal de Culturas e a abertura da avenida
Diagonal (RODÓ, 2010; ARXIU HISTÒRIC DEL POBLENOU, 2001), se constituindo
para alguns estudiosos como obras gentrificadas que transformaram o bairro em local de
atratividade. Por sua vez, o capital privado vem investindo, através da construção de
prédios verticalizados residenciais, para atender a uma demanda solvável externa ao
bairro e para atender as necessidades de serviços, principalmente hotelaria, dado ao
aumento do fluxo turístico local. Essa política de transformação do tecido urbano que
está sendo direcionada, está contribuindo para uma descaracterização original e
alteração na estruturação do bairro, resultando na elevação dos preços dos imóveis. Com
efeito, o bairro de Poblenou vem perdendo ao longo do tempo parte da população de
menor poder aquisitivo para os segmentos sociais melhor remunerados, ocorrendo assim
à substituição de parte dos moradores locais por moradores oriundos de outras áreas da
cidade e/ ou de outras regiões da Espanha e da Europa (CAPEL, 2003; OBESO, 2012).
Diante dessa realidade sobre as duas áreas estudadas verificamos que, a partir dos
últimos anos, está ocorrendo um considerável aumento das edificações verticais, embora
essa forma de edificação venha beneficiando, tão-somente, as classes privilegiadas, pois
são empreendimentos caros que a população de menor poder aquisitivo não tem
condições de adquirir.
Achamos por bem salientar que esta parte do trabalho corresponde à uma
discussão sucinta das duas realidades estudadas, não tendo neste momento à intensão de
aprofundar as análises desses impactos teoricamente.
As atividades exercidas pelo homem sejam elas no espaço urbano ou rural quase
sempre provocam alterações ao meio ambiente. Em se tratando do espaçourbano
essasatividades estão associadas ao processo de urbanização que tem se intensificado
nos útimos anos causando impactos ao meio ambiente natural com “efeitos
significativos de alteração no relevo e nas propriedades do solo, que na maioria das
vezes se traduzem em conseqüências desastrosas, principalmente no período chuvoso,
levando a perda materiais e até mesmo de vida” (RAMALHO, 2007, p. 73). Portanto,
com o aumento do processo de urbanização as cidades passam a absorver em seu
interior problemas socioambientais diversos.
Entre as atividades mais comuns que hoje presenciamos nesse espaço dentro
desse processo de urbanização das cidades, correspondem aos desmatamentos,
ocupação de áreas inadequadas para implantaçaão de infraestruturas, aterramentos e
nivelamentos de solos, construções (horizontais ou verticais), pavimentação ou
asfaltamentos de vias públicas, canalizações de rios, cortes de encostas, lixo, drenagens
pluviais, esgotamento sanitário, intensificação do transito dentre outros, os quais têm
graves consequências na degradação do solo, provocando diversos impactos ao meio
ambiente como: contaminação da água, poluição dos mananciais superficiais (rios,
lagoas e praias), poluição sonora, poluição do ar, aumento de temperatura, erosão,
impermeabilização dos solos, redução dos espaços livres, alteração da paisagem etc.,
causando transformações no quadro natural.
Tais transformações têm trazido impactos socioespaciais para o ambiente urbano
que tem contribuído para a diminuição da qualidade ambiental urbana e
comprometimento das condições de vida da população. Estes impactos afetam a
população indistintamente, não levando em consideração as condições econômicas,
sociais ou culturais da mesma.
Entre as diversas ações exercidas pelo homem no espaço urbano, a construção de
prédios verticalizados, tem contribuído e vem contribuindo para provocar diversos
impactos no interior das cidades, na qual é “considerada como o resultado formal de um
modo de apropriação, produção e consumo do espaço urbano pelos agentes sociais
responsáveis pela sua (re)produção”, resultando com isto num desdobramento de
“impactos, tanto de natureza social quanto ambiental para a cidade” (COSTA, 2007, p.
272-273). A verticalizaçao, portanto, provoca alteraçõesnos ecossistemas existentes e na
forma de viver das pessoas as quais estão cada vez mais expostas aos riscos que se
produzem no contexto de uma cadeia de interações, já que o mais importante são os
fatores tecnológicos em detrimento dos seus efeitos danosos a sociedade e ao meio
ambiente, ocorrendo tanto em escala local e regional como
2
Atividades do setor terciário desenvolvidas dentro da atual modernização da economia ligada a centros
de informática, de logística, de ciência e tecnologia, ao sistema financeiro, ao varejo moderno, os serviços
complexos e sofisticados, presentes tanto en países desenvolvidos quanto subdesenvolvidos, ou seja, são
atividades terciárias desenvolvidas no atual momento da economia, que nas palavras de Milton Santos,
são atividades inerentes ao “método científico informacional”.
Além disso, outro agravante ambiental é a poluição do lençol freático e dos
mananciais superficiais, ou seja, a verticalização vem causando impactos ambientais
graves que tem contribuído para comprometer a qualidade de vida da população
residente. Primeiro a verticalização se dá com a destruição de ambientes naturais como
dunas e vegetação, a exemplo de Ponta Negra, e ambientes construídos que se
constituem em áreas importantes para preservar a história do bairro, a exemplo de
Poblenou; segundo, essa mesma verticalização tem contribuído para poluir a praia,
contaminar o aquifero, poluir o meio ambiente, aumentar o calor devido a presença das
edificações, intensificar o trânsito e aumentar a produção de lixo.
Esses impactos socioambientais que acabamos de relatar nos bairros estudados,
percebemos que, em Poblebouos entrevistados não têm conhecimento detalhado dos
problemas ambientais derivados das transformações que estão ocorrendo provocadas
pela verticalização, uma vez que tais problemas não se apresentam de forma muito clara
para a sociedade local. No entanto, alguns entrevistados externaram que a verticalização
está acabando com a essência do bairro. As construções de grandes edifícios em frente
ao mar estão deixando para trás os edifícios mais baixos e de pessoas de baixo nível de
renda. Igualmente consideram que com a verticalização, as casas de um ou dois
pavimentos estão condenadas a “morte”, porque os construtores esperam comprar suas
terras para construir edifícios altos e vendê-los a preços, também altos, para as pessoas
que vêm de outras regiões ou países. Esses depoimentos externam que a verticalização
está causando problemas sociais aos moradores do bairro, os quais se sentem
encurralados pelo capital imobiliário em venderem os seus imóveis e aí sejam
construídos os grandes edifícios destinados aos que podem pagar.
Quanto ao turismo há também um desconhecimento da maioria dos
entrevistados sobre os impactos que o mesmo vem trazendo ao meio ambiente e a
população em geral. Para alguns entrevistadoso turista não consome no bairro,
procurando outras áreas da cidade, não contribuindo para dinamizar o comércio
local.Portanto, este comércio atende apenas as necessidades de consumo de segmentos
dos moradores permanentes, não exercendo uma atratividade para outros consumidores.
Além disso, existem estudos que comprovam problemas ambientais graves em
Poblenou. Para Carbó (2008) vem ocorrendo um processo de insatisfação por parte dos
representantes de associações de bairros de Pobelnou que lamentam a falta de
integração do Parc Central delPoblenou com o próprio bairro onde o mesmo se encontra
inserido. Um dos maiores absurdos que ocorre em Barcelona é o Parque de Poblenou,
pois se constitnui como uma cultura de barreiras. Algumas paredes de concreto, feito
em moldes de canas estão cobertas de vegetação, com arcos que são inspirados na
arquitetura de Gaudi, embora lhe falte a beleza, sua razão estrutural e os seus valores
simbólicos (CARBÓ, 2008).
Para o referido autor existem no bairro problemas de contaminação atmosférica,
causados pela intensificação do tráfego e de outros vetores poluentes existentes que tem
causado problemas respiratórios aos cidadãos que aí vivem, contaminação das fontes de
abastecimento de água provenientes de efluentes poluentes além de contaminação
acústica decorrente de uma alteração do seu entorno dos níveis sonoros produzidos.
Portanto, podemos inferir que em Poblenou os impactos ambientais decorrentes
do processo de expansão urbana e da morfologia que está ocorrendo em seu espaço, são
revestidos de fatos preocupantes que precisam ser equacionados com urgência.
Em Ponta Negra e em Poblenou foi verificado que a verticalização vem
contribuindo para diminuição da visibilidade das belezas naturais, já que o solo
sobreposto funciona como uma barreira que impede a visão da população que se
encontra nas vias, nas casas, ou em lugares que antes permitia essa visão. Além disso, a
verticalização tem favorecido à intercepção das massas de ar, já que os edifícios
funcionam como uma barreira que impede a fluidez original dos ventos, aumentando a
temperatura e criando um micro clima urbano e menos agradável à população residente
do bairro, fato que reflete na qualidade de vida dessa população.
A intensa pavimentação e asfaltamento das ruas também têm contribuído para o
aumento de temperatura, alterando aspectos ambientais naturais das localidades, e
causando o que alguns especialistas chamam de estresse térmico na população.
Outro impacto, dessa feita de natureza social, é a segregaçao residencial. A
supervalorização do solo nos dois bairros tem contribuído para se assentuar cada vez
mais uma especulação imobiliária que tem causado uma segregação residencial,
colocando a população de menor renda à margem desse processo.
Ambos os bairros padecem também da descaracterização da cultura local,
estabelecida antes da efetivação desses processos. Tais processos favoreceram à
inserção do estranho que importou novos valores culturais e novos costumes, levando a
população antiga a um processo de impessoalidade na qual “ninguém mais se conhece”,
se perderam as amizades e as relações de visinhanças. Tanto em Ponta Negra quanto em
Poblenou esse processo é muito evidente. Ponta Negra, antes uma praia de pescadores e
de artesãos nativos e Poblenou um bairro de trabalhadores fabris, os quais preservavam
a sua cultura e sua história. A presença do “estranho” devido ao intenso fluxo turistico e
a presença de pessoas oriundas de outras áreas do país e do exterior, tamém “estranhos”,
vem ocorrendo uma descaracterização cultural em ambos os bairros. Estabelece-se
assim à inserção de uma “nova” cultura, na qual o que passa a predominar são os
valores, ideias, costumes, história etc., do externo, ficando a cultura autóctona
esquecida..
Portanto, podemos inferir que a verticalização e o tursimo que estão ocorrendo
nos bairros de Ponta Negra e Poblenou são processos interligados que estão coroados de
ações que têm contribuído para degradar o meio ambiente e para concentrar problemas
sociais dos mais diversos, resultando no comprometimento da qualidade de vida da
população residente.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
REFERÊNCIAS