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II - A Ação Humana e os Valores

A rede concetual da ação é a representação do conjunto de todos os elementos


necessários para que ocorra uma ação: Agente – Intenção – Deliberação – Decisão –
Realização.

• Ação: uma interferência (intervenção) consciente e voluntária do sujeito;


• Acontecimento: uma ocorrência cujo sujeito é passiva, não interferiu, podendo
sofrer as consequências - nele mistura-se razão, consciência e vontade;
• Agente: quem, com vontade e liberdade, pratica a ação, sendo o único que pode
explicar os motivos;
• Ato voluntário: ato consciente, que supõe uma intenção, que provem da vontade
do agente;
• Ato involuntário: ato consciente ou inconsciente, mas que não é intencional, ou
seja, não provem da vontade do agente. Caso o ato seja involuntário, então, não é
cometida uma ação*;
“Mas como podemos saber se um ato é voluntário ou não? Porque talvez antes de
o levar a cabo pondero entre várias possibilidades e finalmente decido-me por
uma delas.” (Fernando Savater)
• Intenção: traduz aquilo que o gente tenciona fazer, atingir ou obter. A intenção é,
de certo modo, uma antecipação da ação, estando nela contidos os motivos, causas
e desejos do agente;
• Motivo: leva o agente a agir, em primeiro lugar, respondendo ao porquê da ação.
Em princípio, todo o agir humano é guiado por motivos que desencadeiam a ação;
• Deliberação: momento de hesitação, durante o qual o indivíduo examina a
questão a resolver através dos seus valores pessoais, pondera as vantagens e os
inconvenientes de uma ação ou de outro;
• Decisão: consiste na escolha de um indivíduo, entre várias opções. A decisão
conduz à concretização do ato ou à abstenção da realização do ato e,
simultaneamente, à futura responsabilização pelo ato;
• Execução: prática ou abstenção do ato, sendo o prolongamento da decisão;

*O passageiro do comboio (T11), Fernando Savater

• “Para nós os humanos o mundo não é simplesmente entrecruzamento total dos


efeitos e das causas mas a palestra cheia de significado em que atuamos.”;
• “Nós humanos, não respondemos apenas ao mundo que habitamos mas vamo-lo
também inventando e transformando de uma maneira não prevista (...). A nossa
espécie não está “fechada” pelo determinismo biológico, mas permanece “aberta”
e criando-se sem cessar a si própria, como referiu Pico della Mirandola.”;
• Acão (aquilo que faço voluntariamente podendo fazer o seu contrário –“faço
apercebendo-me e querendo”) = Reação (não faz uso do nosso livre-arbítrio, por
ser um estímulo, reflexo);
• “A verdade é que existe uma diferença entre o que simplesmente me acontece, o
que faco sem me dar conta e sem querer, o que faco sem me dar conta mas segundo
uma rotina adquirida voluntariamente e o que faço apercebendo-me e querendo.”
Heitor e as térmitas (T12), Fernando Savater

• Heitor distingue-se das térmitas-soldado pela sua capacidade de fazer uso do seu
entendimento, libertando-se da tirania das circunstâncias para realizar uma opção
própria: “Muito simplesmente, a diferença assenta no facto de as térmitas-soldado
lutarem e morrerem porque têm de o fazer, sem que possam evitá-lo. Heitor, por
seu lado, sai para enfrentar Aquiles porque quer. As térmitas-soldados não podem
desertar, nem revoltar-se, nem fazer cera para que outras vão para o seu lugar:
estão programadas necessariamente pela natureza para cumprir a sua heroica
missão. O caso de Heitor é distinto. Poderia dizer que está doente ou que não tem
vontade de se bater com alguém mais forte do que ele. Talvez os seus concidadãos
lhe chamassem cobarde e o considerassem insensível ou talvez lhe perguntassem
que outro plano via ele para deter Aquiles, mas é indubitável que Heitor tem a
possibilidade de se recusar a ser herói. Por muita pressão que os restantes
exercessem sobre ele, ele teria sempre maneira de escapar daquilo que se supõe
que deve fazer: não está programado a ser herói, nem o está seja que homem
for. Daí que o seu gesto tenha mérito e que Homero nos conte a sua história com
uma emoção épica. Ao contrário das térmitas, dizemos que Heitor é livre, e por
isso admiramos a sua coragem.”
• É o livre-arbítrio, a possibilidade de escolha a que Heitor está sujeito, que
determina a sua honra, coragem, dignidade, heroísmo.

Tese e Argumentação Objeções

Determinismo Radical

• Todos os acontecimentos, sem exceção, são Não é possível demonstrar


determinados, isto é, efeitos inevitáveis de que as leis naturais se
circunstâncias anteriores e das leis da natureza. aplicam a todas as realidades
• Todas as ações humanas e escolhas são do universo de forma
acontecimentos. constante e uniforme;
• Logo, todas escolhas e ações humanas são
determinadas (por desejos e crenças, fruto do
temperamento e caráter da pessoa, que, por sua Não consegue abalar a
vez, são determinados por fatores biológicos e nossa crença de que somos
culturais que lhe são exteriores). seres conscientes e livres;
• Concluindo, nenhuma das nossas ações é livre
e, por isso, não podemos ser responsáveis por
elas. Não é possível construir uma
vida social sem a ideia de
O determinismo é verdadeiro. uma responsabilidade moral;

• “(...) considero livre uma coisa que existe e age


unicamente pela necessidade da sua natureza;
considero constrangida aquela que é obrigada
por uma outra a existir a agir de determinada
maneira [como o Homem].”
• “Se, por um breve período, cada homem fosse
capaz de examinar as suas ações peculiares, de
buscar os seus verdadeiros motivos, de
descobrir como estão ligados, ficaria
convencido de que a sensação do seu livre-
arbítrio natural é uma ilusão que a experiência
tem de destruir rapidamente.” (Barão de Holbach)

É falso que o livre arbítrio exista; é uma ilusão.

• O Homem julga ser livre pela consciência dos Princípio da causalidade:


seus desejos. No entanto, este apenas reage a para uma determinada
causas já determinadas, que ditam a sua vontade consequência, existe uma
e o fazem agir segundo ela – “Assim é a determinada causa.
liberdade humana que todos os homens se
gabam de possuir e que consiste unicamente no
facto de os homens terem consciência dos seus
desejos e ignorarem as causas que os
determinam.”
• “Ele [o Homem] é guiado necessariamente, em
cada passo, pelas vantagens – reais ou fictícias
– que atribui aos objetos que suscitam os seus
desejos.” (Barão de Holbach)

Libertismo

O determinismo/causalidade universal e o O facto de termos a


indeterminismo são falsos. O livre-arbítrio existe. As experiência da liberdade e
ações humanas são auto-determinadas, isto é, resultam sentimentos associados à
da vontade do agente e das suas deliberações. responsabilização, não prova
que exista livre-arbítrio (este
Argumento da experiência: Há ações livres, que não são pode ser uma ilusão) – “(...)
o desfecho necessário de causas anteriores ou o e no entanto livre, porque
resultado do acaso. Temos essa sensação e experiência uma vez lançado ao mundo,
e fazermos escolhas conscientes, de poder interferir no é responsável por tudo
decurso normal das coisas pela nossa capacidade quanto fizer.” (Jean-Paul Sartre)
racional e deliberativa.
Argumento da responsabilidade: se as ações não Afirmar que a mente
resultassem da vontade e deliberação do agente, não funciona dentro de cérebro
teria sentido responsabilizar as pessoas. (enquanto estrutura
Argumento da causalidade do agente: os seres humanos biológica, física e química) e
transcendem a causalidade mecânica da natureza. A à margem de leis causais não
mesma pessoa, em circunstâncias idênticas, pode levar é plausível com o
a resultados distintos. O agente é autor da sua própria conhecimento da ciência.
causalidade.
Este argumento é apoiado pelo dualismo libertista:
corpo e cérebro são materiais e estão sujeitos às leis da “(...) a ciência (...) nunca conseguirá
prever completamente o
natureza; a mente é imaterial e não está, por isso, sujeita comportamento humano.”
às leis da natureza. Como as ações humanas advém da “Outros sentimentos humanos
mente/alma (imaterial), não são predizíeis (nem importantes [orgulho e vergonha]
também pressupõem o livre-arbítrio.”
causais).
Determinismo Moderado (Compatibilismo)

O determinismo natural é verdadeiro, contudo, este não Não distingue claramente


impede a liberdade e a responsabilidade humanas. É ações livres de ações não
possível pensar que o comportamento humano está livres.
causalmente determinado e simultaneamente pensar em
nós como agentes livres. Defende-se, assim, que há
ações livres e ações coagidas.
“Naturalmente, tudo no mundo é determinado, mas,
apesar de tudo, algumas ações são livres. Dizer que são Comportamentos
livres não é negar que sejam determinadas; é afirmar compulsivos (cleptomania)
que não são constrangidas. Não somos forçados a fazê- e desejos involuntários.
las.” (John Searle)

• Ação livre (causada voluntariamente – ausência de


constrangimentos e controlo sobre o
comportamento): ação cujas causas imediatas são Não salvaguarda a ideia
estados internos do sujeito como crenças, desejos, comum de liberdade e de
medos, inclinações,..., isto é, que são responsabilidade (se somos
determinadas/causadas pela personalidade (que resultado necessário da
resulta de um conjunto de experiências e de educação, não podemos ser
processos educativos). Um ato livre é aquele que pessoas diferentes das que
não teria acontecido se o agente não quisesse que somos).
acontecesse.
• Ação não livre (ação contra a vontade do sujeito):
ação cujas causas imediatas são fatores externos,
que o agente não pode controlar. Algo exterior à
ação.

Segundo Hume, “as ações livres são aquelas que estão


sobre o controlo causal das crenças e desejos do Segundo John Locke,
agente.” (“Quando uma crença está sobre o controlo do agente, podemos livremente
parece ser verdade que se o agente tivesse tido outro conjunto de praticar uma ação mesmo
desejos, também poderia ter selecionado e praticado uma ação não sendo livres para agir
diferente.”)
A teoria de Hume é compatibilista porque defende que uma ação é de outra maneira.
livre se se encontra causalmente relacionada de uma maneira Exemplo: a sala fechada
particular com as crenças e os desejos do agente. de Locke.

Nota:
Para um determinista moderado, o contrário de livre é
coagido (forçado);
Para um determinista radical, as causas constrangem
necessariamente o comportamento, remetendo-o para
um único futuro possível. Mas para um determinista
moderado, as causas condicionam a conduta, deixando
em aberto uma multiplicidade de futuros possíveis.
Os valores são qualidades potenciais que resultam da apreciação que um indivíduo ou
sociedade faz acerca de um objeto, de uma ação ou de um ser real ou ideal, em função da
presença ou ausência de algo que é desejável ou digno de estima. Enquanto um juízo de
facto é objetivo, reconhecendo uma realidade, um juízo de valor é subjetivo, podendo
colocar-se em causa e, por consequência, dar aso a discussão/controvérsia.
Valorar é tomar uma posição. A partir do momento em que adotamos um valor, estamos
determinados a agir consoante o mesmo, tendo este uma importância-chave no caminho
que vamos traçando para nós próprios.

A subjetividade dos valores


• O subjetivismo, ao defender que a veracidade ou falsidade dos juízos de valor depende
da opinião de cada sujeito, retirando todo o sentido ao debate racional sobre a moral.
De modo a persuadir alguém de que algo é bom ou mau, há que suscitar sentimentos e
preferências no orador, uma vez que as questões sobre valores estão completamente fora
do domínio do conhecimento.
• O objetivo dos debates racionais sobre questões morais é o progresso. O progresso
implica a passagem de um valor moral para outro ainda melhor, o que só é possível
se houver valores melhores que outros. Se todos os valores têm a mesma importância
(variam de pessoa para pessoa), se não há valores próprios, então os debates deixam
de fazer sentido.
Se há uma discórdia quanto a valores, há uma diferença de gosto. Daí que, como é uma
divergência apenas de gostos e não se dá ao nível de qualquer verdade objetiva, não há
meios para a resolver, porque não há forma de provar qualquer proposição subjetiva.
Assim, o subjetivismo acredita que os critérios científicos da objetividade não se podem
aplicar ao mundo axiológico.

A objetividade dos valores


• A verdade dos juízos morais não depende da perspetiva do sujeito e os juízos de valor
transcendem o sujeito. Assim, segundo o objetivismo, existem verdades absolutas.
O objetivo dos debates racionais sobre questões morais é o progresso. O progresso
implica a passagem de um valor moral para outro ainda melhor, o que só é possível se
houver valores melhores que outros. Simultaneamente, o objetivismo explica melhor o
facto de pensarmos que há opiniões e razões que pesam mais e outras menos na
justificação dos nossos juízos de valor.

O Relativismo Cultural
• O relativismo defende que o certo e o errado são definidos por cada cultura, sendo os
valores relativos. Culturas diferentes têm códigos morais diferentes. Logo, nada está
objetivamente certo ou errado. No que diz respeito à ética, os padrões de sociedade
diferentes são tudo o que existe. Assim, nós não podemos considerar que certos
costumes estão errados, apenas por não estarmos familiarizados com eles.
• O relativismo, ao aceitar que todas as práticas culturais devem ser entendidas dentro
do contexto de cada cultura, dado que todas as culturas têm o mesmo valor, promove
a tolerância entre sociedades divergentes. No entanto, a tolerância nem sempre é
desejável, porque, por vezes, tolerar é aceitar aquilo que se podia condenar, é deixar
fazer aquilo que se poderia impedir ou combater = conduz à aprovação da
intolerância.
• A decisão do que é o certo e o errado para uma determinada cultura perece na maioria das pessoas que
pertencem a essa sociedade. Dado que, para que uma sociedade funcione, é necessário que se aceite as
decisões da maioria, o relativismo promove a coesão social. Ao mesmo tempo, conduz ao
conformismo: a maioria pode estar enganada.
A necessidade de uma filosofia moral
Ética Deontológica de Kant

A Moral surge assim como sendo “aquilo que uma determinada sociedade espera de cada
um e, daí, o modo como cada um deve agir nessa sociedade para que o seu comportamento
seja considerado bom”. A moral impõe, então, regras, é normativa e há tantas morais
quantas as tradições das várias culturas. Deste modo, há que distinguir moral de ética.
Sendo que a primeira diz respeito aos costumes, a Ética é, normalmente, entendida como
sendo a disciplina filosófica que trata dos fundamentos da Moral, do Bem (em-si) e, daí,
ser universal. Daí que quando agimos eticamente, devemos ser capazes de justificar e
recomendar a nossa ação – tendo em consideração as preferências gerais.
Segundo Kant, Se existe uma ciência de que o homem tenha necessidade é precisamente
aquela que lhe ensina a ocupar como deve ser o lugar que é atribuído na criação e de
que pode aprender o que é preciso para ser um homem.

• A perspetiva moral de Kant estipula que o fundamento da moralidade é a lei moral e


o dever em si mesmo. As intenções que presidem às ações determinam a sua
legitimidade e moralidade (intenção pura e livre da vontade de aderir ao dever pelo
desejo de recompensa ou medo de punição) - nada é possível pensar que possa ser
considerado bom sem limitação a não ser uma só coisa: uma vontade boa (intenção
pura). A moralidade absoluta não é boa pelo que por seu intermédio possa ser
alcançado (feitos realizados), mas simplesmente pela intenção que comporta em si;
daí que, independentemente das consequências desta intenção, uma boa vontade
contenha sempre o seu valor próprio, e, por isso, inarredável.
O valor da moral não reside, portanto, no efeito que dela se espera. Nada senão uma
representação da lei em si mesma pode brotar o bem excelente. Este Bem, encontrando-
se já presente na pessoa que o realizou, não deve servir como finalidade: não se deve
esperar somente do efeito da ação. Isto porque quando nos virmos livres de fatores
externos, não fazemos boas ações. Logo, nem a felicidade deve constituir uma motivação
para a prática do correto. Assim, uma ação praticada por dever encontra o seu valor moral,
não no propósito que com ela se pretende atingir, mas na máxima que a determina - no
princípio da vontade segundo o qual a ação foi praticada. O critério da moralidade das
ações é o cumprimento do dever pelo dever que cumula no respeito absoluto pela lei
moral.
Despojando-nos de estímulos externos e aderindo a uma moralidade independente de
circunstâncias particulares, consagramos uma lei universal - válida e igual para toda a
Humanidade, não fazendo distinção entre indivíduos.
• O imperativo hipotético representa a aderência ao dever para alcançar qualquer coisa
que se quer ou que é possível que se queira. Já o imperativo categórico consiste
numa ação necessária por si mesma, que se realiza sem um propósito ulterior. No caso
de realizarmos uma ação boa como meio para um fim, o imperativo que a ordena é
hipotético; por outro lado, se realizarmos uma ação pelo simples facto de ela ser boa
(abstraindo-nos dos fins que possam ser realizados por tal vontade), então o
imperativo que a ordena é categórico.

O imperativo categórico
Fórmula da Universalidade: “Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao
mesmo tempo querer que ela se torne lei universal.” / “Age de tal modo que a máxima da
tua vontade possa valer sempre ao mesmo tempo como princípio de uma legislação
universal.” (A pergunta é “o que devo fazer?”; a resposta dita um princípio racional,
universalmente válido, absoluto, incondicional e necessário).
Fórmula da Humanidade: “Age de tal maneira que uses a humanidade, tanto na tua
pessoa como na pessoa de outrem, sempre e simultaneamente como fim e nunca como
meio.” - valorização das pessoas, opondo-se à sua instrumentalização.

• A finalidade da moralidade, por sua vez, é a autonomia: a opção pela lei racional e o
exercício da boa vontade (aquela que se deixa guiar unicamente pela razão, que é a
única coisa boa em si mesma). Enquanto seres racionais, os humanos procuram
exercer a sua autonomia de vontade ao pôr em prática ações próprias. São estas ações,
instigadas pela verdadeira autonomia, que lhes vão conferir dignidade. Resumindo, a
moralidade, cumulando na autonomia da nossa vontade em relação a fatores
extrínsecos, leva ao encontro da dignidade necessária para a nossa concretização
como pessoas. Simultaneamente, usando as pessoas como meios, em vez de fins,
estamos a negar-lhes a sua autonomia e, por consequência, a sua dignidade. Desta
forma, para sermos dignos temos, também, de reconhecer a
autonomia/dignidade/racionalidade dos que nos rodeiam. Ora, a moralidade que se
opõe à instrumentalização é a única condição que pode fazer de um ser racional um
fim em si mesmo.
• Este indivíduo digno é tanto legislador como seguidor da sua lei moral. Ele dita e
respeita o conjunto das suas morais e, por isso, e não por medo ou inclinação, está
submetido ao mesmo. Agindo segundo as suas máximas, ele consagra-as como leis
universais – (...) a dignidade humana consiste precisamente nesta capacidade de ser
legislador universal, se bem que com a condição de estar ao mesmo tempo submetido
a essa mesma legislação.
Objeções a Kant
• Não resolve conflitos entre deveres morais, tratando a moralidade como absoluta;
• Desculpa a negligência bem-intencionada (consequências nefastas que possam surgir de uma ação boa);
• Ignora o papel dos sentimentos e emoções (exemplo: piedade, generosidade, ...).

O Utilitarismo de Stuart Mill

• O utilitarismo de Stuart Mill é uma teoria teleológica (telos – fins) consequencialista.


Esta estipula que o fundamento da moralidade é a Utilidade ou a Maior Felicidade, ou
seja, maximizar a felicidade do maior número de pessoas. Deste modo, o Bem equivale
ao maior bem-estar/felicidade, uma vez que as ações só são justas na medida em que
promovem uma felicidade comunitária: todas as coisas desejáveis o são pelo prazer
inerente a elas mesmas, ou como meios para a promoção do prazer e prevenção da dor.
Daí que o critério da moralidade de uma ação seja as consequências da ação, isto é, a
felicidade ou infelicidade que possa proporcionar ao maior número de pessoas. Assim, o
utilitarismo sublinha os efeitos práticos da ação (resultados, fins exteriores), sendo, por
isso, uma moral assente em condições e circunstâncias (as consequências e os efeitos da
ação, em vez dos motivos do agente, determinam a sua utilidade e legitimidade).
• A própria lei moral de Mill baseia-se no Princípio da Utilidade (ou maior felicidade)
que é: “Age de modo a proporcionar a maior felicidade/bem-estar para o maior
número de pessoas”* - perguntamo-nos “O que é útil?”, como resposta a um
imperativo categórico, sendo a nossa aderência ao dever interesseira, ao esperarmos
alcançar algo com a mesma. *Este critério não é o da maior felicidade do agente, mas
o da maior felicidade geral. Até porque, não é necessário um indivíduo ser feliz pela
sua nobreza de caráter; se ele beneficiar do cultivo geral da nobreza de carácter, a sua
felicidade pode surgir como consequência desse benefício.
Por isso, há uma perspetiva hedonista inerente a esta teoria que entende o fim último das
ações humanas como a felicidade – existência tanto quanto possível isenta de dor e rica
em satisfações – para a maioria. Prescreve-nos a felicidade global como ideal moral e
política. Na avaliação da moralidade de uma determinada ação, analisa-se o cumprimento
do conjunto de regras e preceitos da conduta humana que culmina numa existência como
a descrita.
• A distinção de prazeres faz-se tanto a nível de quantidade como a nível de qualidade.
Se há um prazer que não se troca por qualquer quantidade de outro prazer, então este
comporta uma superioridade qualitativa. Contudo, Mill defende que alguns tipos de
prazer são qualitativamente superiores a outros. Isto é, há prazeres intrinsecamente
melhores do que outros. Os prazeres inferiores correspondem a prazeres corpóreos,
ou seja, dizem respeito à satisfação das necessidades primárias (comer, dormir, etc.)
Já os prazeres superiores correspondem aos prazeres intelectuais e emocionais, ou
seja, dizem respeito à satisfação das necessidades mentais/espirituais (como o
entendimento da beleza, do conhecimento, da amizade e do amor, etc.)
Mill argumenta que um juiz competente, o qual tem experiência dos dois tipos de
prazeres (intelectuais e corporais), não trocaria a oportunidade de fruir dos prazeres
superiores por nenhuma quantidade de prazeres inferiores. Por exemplo, ainda que os
prazeres de um porco fossem mais intensos e duradouros do que os de um ser humano,
os de um ser humano seriam preferíveis aos de um porco, pois o porco apenas se pode
satisfazer com prazeres inferiores (É melhor ser um homem insatisfeito do que um porco
satisfeito). Prazeres elevados e, por conseguinte, mais valorosos e enriquecedores,
dependem de capacidades exclusivamente humanas, que possuam um cognitivo mais
complexo como o pensamento racional e a autoconsciência. Prazeres inferiores, por
contraste, reduzem-te enquanto pessoa ao fazer apenas uso de faculdades que partilhas
com seres não racionais (animais).
• A moral utilitarista reconhece ao ser humano a faculdade de sacrificar o seu bem
próprio pelo bem dos outros. No entanto, recusa-se a admitir que qualquer sacrifício
tenha um valor próprio, desvalorizando as intenções do agente. Pelo contrário, um
sacrifício só deixa de ser inútil ou “desperdiçado” se priorizar um Bem Maior. Este
pensamento defende, pois, a imparcialidade e o altruísmo (desconsideração de
familiares, amigos ou da felicidade pessoal face ao alcance do prazer pela maioria): o
utilitarismo exige a cada um que, entre a sua felicidade e a dos outros, seja um
espetador tão estritamente imparcial como desinteressado e benevolente. Ao mesmo
tempo, não é equitativo, ao implicar a renúncia da minoria.
• A educação envolve a possibilidade de interesses particulares e, simultaneamente,
constitui uma demanda pelo Bem comum. Uma conduta educada/apropriada não deve
ser tanto levada a cabo por se esperar alcançar uma felicidade pessoal, mas por se
querer contribuir para uma felicidade comunitária. De facto, o meu interesse pessoal
deve estar, tanto quanto possível, em harmonia com o interesse da comunidade, de
forma a que se crie uma associação indissolúvel entre a minha própria felicidade e o
bem de todos.
Objeções a Stuart Mill
• Põe em causa os direitos individuais e legitima a instrumentalização dos indivíduos;
• O problema no cálculo da utilidade (os prazeres e dores são variáveis, logo o seu cálculo pode diferir
de indivíduo para indivíduo);
• O problema da previsão das consequências (probabilidade);
• A imparcialidade e o altruísmo desconsideram familiares ou amigos e a felicidade pessoal..

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