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AÇÃO RESCISÓRIA1

1. NATUREZA JURÍDICA

A ação rescisória tem natureza jurídica de ação, sendo uma espécie de sucedâneo recursal externo, ou seja, meio de
impugnação de decisão judicial que se desenvolve em processo distinto daquele no qual a decisão impugnada foi
proferida. Além do trânsito em julgado, o art. 966 exige que a decisão a ser impugnada por meio de ação rescisória
seja de mérito. Por isso, a ação rescisória é a ação autônoma de impugnação que busca desconstituir decisões judiciais
que tenham gerado coisa julgada material, daí ser considerada uma excepcional hipótese, legalmente prevista, de
relativização da coisa julgada.

2. CONCEITO DE RESCINDIBILIDADE

Não se deve confundir decisão rescindível com decisão nula, nem tampouco com decisão inexistente. Para ser
desconstituída por meio de ação rescisória, a decisão deve existir juridicamente, pois aquilo que não existe não precisa
ser desconstituído, bastando uma mera declaração da inexistência jurídica. Dessa forma, sentença proferida em
processo juridicamente inexistente (ex: tramitando perante órgão sem jurisdição), ou que tenha vício in procedendo
intrínseco que a torne juridicamente inexistente (ex: ausência de dispositivo), não é objeto de ação rescisória. Por
outro lado, todas as nulidades se convalidam com o trânsito em julgado, não sendo correto dizer que as nulidades
absolutas permitem o ingresso de ação rescisória. Aquilo que antes do trânsito em julgado era considerado uma
nulidade absoluta, após esse momento procedimental pode tornar-se, por vontade da lei, um vício de rescindibilidade,
sendo esse o vício que legitima a ação rescisória. Mesmo as sentenças válidas poderão ser desconstituídas pela ação
rescisória (ex: rescisória com fundamento em documento novo). Portanto, o vício de rescindibilidade não se confunde
com a inexistência jurídica nem com a nulidade absoluta, sendo o resultado de uma opção política legislativa em
prever determinadas situações aptas a afastar a segurança jurídica gerada pela coisa julgada material.

2.1. Conflitos de sentenças transitadas em julgado e ação rescisória

Controvérsia sobre a solução a ser aplicada na hipótese de o segundo processo ser julgado com sentença de mérito
transitada em julgado, à revelia do reconhecimento da coisa julgada do processo anterior. Neste caso, haverá conflito
de coisas julgadas, devendo-se determinar qual deverá prevalecer.

1ª posição: deve prevalecer a primeira coisa julgada. A segunda sentença é inexistente, pois foi proferida numa
demanda em que o autor era carente de ação (por falta de interesse de agir). Além disso, a coisa julgada também é
um pressuposto processual negativo (extrínseco), de forma que a segunda ação foi proposta em afronta esse
pressuposto, o que também conduz à inexistência da segunda sentença. Logo, se a segunda sentença é inexistente,
não há necessidade de ação rescisória, podendo-se obter a declaração de inexistência perante o próprio juízo de
origem, por meio de ação ou objeção, esteja ou não transcorrido o prazo decadência da rescisória. O lesado pode
perfeitamente alegar o vício por meio de ação rescisória (Arruda Alvim, Araken de Assis, Teresa Wambier, Nelson Nery
Jr; Cassio Scarpinella; REsp 1.354.225/RS, Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, 24.02.2015, Info 557).

2ª posição (STJ): deve prevalecer a segunda coisa julgada, enquanto não for desconstituída por ação rescisória,
hipótese em que se restabelece a primeira. Durante o prazo da ação rescisória da segunda prevalece a primeira coisa
julgada, mas, decorrido esse prazo e obtida em ambas a chamada “coisa julgada soberana”, passa a prevalecer a
segunda, de forma que a coisa julgada posterior substitui a anterior. O art. 966, IV, CPC prevê a ação rescisória contra
a decisão que afronta a coisa julgada material, o que demonstra de forma inequívoca que a segunda coisa julgada
existe juridicamente (não se concebe a desconstituição de decisão inexistente), embora seja viciada (Pontes de
Miranda, Vicente Greco Filho, Barbosa Moreira; Dinamarco; Yarshell; Humberto Theodoro Jr; Marinoni, STJ. Corte
Especial. EAREsp 600811/SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 04/12/2019; STJ – AR 3.130, 26.11.2008; REsp
1.524.123/SC, Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, 26.05.2015, Info 565).

3. OBJETO DA RESCISÃO
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Daniel Amorim Assumpção Neves. Manual de Direito Processual Civil. 8ª ed. Salvador: Juspovm, 2016.

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3.1. Decisão de mérito

A decisão de mérito passível de desconstituição pela ação rescisória abrange não só as sentenças, mas também as
decisões interlocutórias, decisão monocrática do relator e o acórdão, desde que seja de mérito e tenha transitado em
julgado. A ação rescisória pode ser parcial, isto é, o autor da ação não precisa necessariamente impugnar todos os
capítulos da decisão rescindenda.

Há decisões de mérito que NÃO SÃO impugnáveis por meio de ação rescisória em razão de vedação legal expressa:

i) acórdão proferido em ADI e ADC (art. 26, Lei 9.868/99);

ii) acórdão proferido em ADPF (art. Art. 12, Lei 9882/99);

iii) decisões proferidas nos Juizados Especiais (art. 59, Lei 9.099/95).

A doutrina majoritária não admite ação rescisória contra decisões proferidas em processo cautelar, com ressalva ao
art. 310 e em processos de jurisdição voluntária, pois nestes casos a inexistência de coisa julgada material afasta o
interesse de agir no ingresso da ação rescisória (José Carlos Barbosa Moreira; Alexandre Câmara). Da mesma forma,
de acordo com o STF, é inadmissível a ação rescisória em situação jurídica na qual a legislação prevê o cabimento de
uma ação diversa. Não cabe ação rescisória para desconstituir decisão judicial transitada em julgado que apenas
homologou acordo celebrado entre pessoa jurídica e o Estado-membro em uma ação judicial na qual se discutiam
créditos tributários de ICMS. É cabível, neste caso, a ação anulatória, nos termos do art. 966, § 4º do CPC. É
inadmissível a ação rescisória em situação jurídica na qual a legislação prevê o cabimento de uma ação diversa. STF.
Plenário. AR 2697 AgR/RS, Rel. Min. Edson Fachin, julgado em 21/3/2019 (Info 934). A decisão judicial homologatória
de acordo entre as partes é impugnável por meio de ação anulatória. A decisão judicial homologatória de acordo entre
as partes é impugnável por meio de ação anulatória (art. 966, § 4º, do CPC/2015; art. 486 do CPC/1973). Não cabe
ação rescisória neste caso. Se a parte propôs ação rescisória, não é possível que o Tribunal receba esta demanda como
ação anulatória aplicando o princípio da fungibilidade. Isso porque só se aplica o princípio da fungibilidade para
recursos (e ação anulatória e a ação rescisória não são recursos). STF. Plenário. AR 2440 AgR/DF, Rel. Min. Ricardo
Lewandowski, julgado em 19/9/2018 (Info 916).

O pedido de rescisão da sentença, em vez do acórdão que a substituiu, não conduz à impossibilidade jurídica do
pedido, constituindo mera irregularidade formal. O autor da ação rescisória pediu a rescisão da sentença. Ocorre que
essa sentença já havia sido confirmada pelo Tribunal de Justiça em sede de apelação. Logo, a ação rescisória deveria
ter pedido a rescisão do acórdão do TJ. Esse vício, contudo, constitui-se em mera irregularidade formal, de modo que
o Tribunal não deverá extinguir a ação rescisória por impossibilidade jurídica do pedido, devendo superar o vício e
enfrentar o mérito. Esse entendimento é reforçado atualmente pela previsão do art. 968, §§ 5º e 6º do CPC/2015. STJ.
3ª Turma. REsp 1569948-AM, Rel. Min. Paulo de Tarso Sanseverino, julgado em 11/12/2018 (Info 639).

De acordo com o STF, a ação rescisória não é sucedânea de embargos de declaração; logo, se a decisão transitada em
julgado incidiu em suposto erro de fato por ter deixado de apreciar pedido de renúncia, não cabe rescisória porque a
parte deveria ter oposto embargos diante da omissão. Não deve ser julgada procedente ação rescisória na qual a
parte alega que a decisão transitada em julgado incidiu em suposto “erro de fato” e que não apreciou petição de
renúncia constante dos autos. Se a decisão incidiu em “erro de fato” porque não apreciou a renúncia, significa que
houve omissão e isso deveria ter sido questionado pela parte por meio de embargos de declaração. Se foi verificada a
ocorrência de omissão, não é possível que a parte deixe de embargar para, após o trânsito em julgado, pleitear a
desconstituição do julgado por meio de ação rescisória. Admitir o contrário poderia constituir precedente no sentido
de que toda omissão poderia ser caracterizada como erro de fato. Vale ressaltar, ainda, que não havia nos autos
procuração com poderes específicos para a desistência do recurso ou a renúncia ao direito em que se funda a ação.
STF. Plenário. AR 2107/SP, rel. orig. Min. Gilmar Mendes, red. p/ o ac. Min. Alexandre de Moraes, julgado em
16/9/2020 (Info 991).

É cabível ação rescisória contra decisão que decreta falência. O ato decisório que decreta a falência possui natureza de
sentença constitutiva, pois sua prolação faz operar a dissolução da sociedade empresária, conduzindo à inauguração
de um regime jurídico específico. STJ. 3ª Turma. REsp 1780442/MG, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 03/12/2019.

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Não é cabível ação rescisória contra decisão do Presidente do STJ proferida em Suspensão de Liminar e de Sentença,
mesmo que transitada em julgado. STJ. Corte Especial. AR 5857-MA, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em
07/08/2019 (Info 654).

3.2. Decisão que não é de mérito

O NCPC inovou ao prever o cabimento de ação rescisória contra duas decisões que não julgam o mérito (art. 966, §2º):

i) decisão terminativa que impede a repropositura da ação, desde que haja a correção do vício que levou à
sentença sem resolução de mérito (art. 486, §1º). Neste caso, a ação rescisória em face de tais decisões
pressupõe a correção do vício2.

ii) decisão terminativa que impede a admissibilidade de recurso (decisão que inadmite recurso)3.

A ação, de mérito ou terminativa, para ser objeto de ação rescisória, deve ter transitado em julgado. Havendo recurso
ainda cabível contra a decisão, não se admite a sua rescisão pela ação rescisória, pois faltaria interesse de agir
(ausência de necessidade) na ação rescisória ingressada neste momento procedimental. Não é necessário que a parte
esgote todos os recursos cabíveis para só então ser cabível a ação rescisória, bastando que no caso concreto o recurso
cabível tenha sido devidamente interposto (Barbosa Moreira; HTJ). Uma sentença pode ser apelada, mas, não o
sendo, transitará em julgado e, sendo de mérito, poderá ser desconstituída pela ação rescisória.

4. HIPÓTESES DE CABIMENTO (VÍCIOS DE RESCINDIBILIDADE)

Art. 966. A decisão de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:

I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;

II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;

III - resultar de dolo ou coação da parte vencedora em detrimento da parte vencida ou, ainda,
de simulação ou colusão entre as partes, a fim de fraudar a lei;

IV - ofender a coisa julgada;

V - violar manifestamente norma jurídica;

VI - for fundada em prova cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou venha a
ser demonstrada na própria ação rescisória;

VII - obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado, prova nova cuja existência
ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento
favorável;

VIII - for fundada em erro de fato verificável do exame dos autos.

4.1. Prevaricação, concussão, corrupção passiva do juiz

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Para Daniel Assumpção Neves, sempre que a correção do vício envolver a modificação de um dos elementos da ação, não caberá a sua repropositura, mas a
propositura de uma nova ação. Nesse caso, ainda que a sentença não seja de mérito, e por tal razão não seja capaz de gerar a coisa julgada material, ela se torna
imutável e indiscutível, sendo apenas neste caso cabível a ação rescisória após o trânsito em julgado.
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Há divergência sobre o conteúdo da decisão impugnada pelo recurso inadmitido. Alguns autores entendem que a decisão deve ser necessariamente de mérito
(Barioni), enquanto outros defendem o cabimento da ação rescisória mesmo se a decisão recorrida pelo recurso inadmitido não tenha decidido o mérito (Marinoni;
Daniel Assumpção).

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A primeira hipótese de cabimento da ação rescisória relaciona-se com a possibilidade de cometimento de três crimes
pelo juiz na condução e solução do processo. Não se exige prévia condenação penal ou mesmo a preexistência de
processo criminal a respeito da conduta do juiz, isto é, o reconhecimento do crime pode ser feito originariamente, e
forma incidental, no juízo cível competente para o julgamento da ação rescisória (Barbosa Moreira; Flávio Yarshell;
Fredie Didier Jr;). Apesar de não ser necessária a solução prévia no âmbito penal, se houver sentença penal transitada
em julgado, deve-se analisar o conteúdo dessa e o seu reflexo na esfera cível. Havendo sentença penal condenatória,
haverá vinculação obrigatória do juízo cível, de forma que numa eventual ação rescisória o fundamento da decisão
será necessariamente a existência do crime. Havendo sentença de absolvição com fundamento na inexistência
material do fato, haverá vinculação do juízo cível, mas, sendo a absolvição amparada em outro motivo (ex: ausência
de provas; prescrição), a decisão penal não vincula o juízo cível.

Na hipótese de concomitância entre ação penal e ação rescisória, é cabível a suspensão da ação rescisória (art. 315).
Tratando-se de decisão colegiada (acórdão), nem sempre a existência de um juiz que pratique um dos crimes permite
o ingresso da ação rescisória, sendo necessário que o voto dado por esse juiz tenha concorrido para unanimidade ou
para a maioria (Barbosa Moreira; Alexandre Câmara, Fredie Didier Jr). Na questão da votação unânime, considera-se a
possível influência do juiz criminoso nos votos proferidos pelos outros integrantes do órgão colegiado. Só não será
cabível a ação rescisória na hipótese de o juiz criminoso proferir voto minoritário, superado pelos votos dos outros
membros do colegiado que não estejam envolvidos na prática do crime.

4.2. Impedimento do juiz e incompetência absoluta

Ainda que não seja desejável um juiz parcial, o NCPC conferiu maior gravidade ao impedimento do juiz. Desta forma, a
suspeição do juiz não enseja ação rescisória. Não é necessária a alegação de impedimento durante a tramitação do
processo originário (Flávio Yarshell; Fredie Didier Jr). De acordo com o STJ, na hipótese de julgamento colegiado, não
há nulidade se o voto do juiz impedido não foi decisivo para o resultado final (EREsp 1.008.792/RJ, Min. Nancy
Andrighi, 2ª Seção, 09.02.2011, Info 462). A doutrina majoritária afirma que somente a competência absoluta do juízo
é pressuposto processual de validade do processo, de forma que a rescindibilidade está limitada a essa espécie de
vício. Como as regras de competência absoluta tutelam interesse público, sua violação gera vício suficiente para
ensejar a propositura de ação rescisória. Uma sentença proferida por juízo incompetente, sendo substituída por
acórdão proferido em apelação julgada por tribunal competente, não enseja a propositura de ação rescisória
(Alexandre Câmara). Em suma, somente é possível a propositura de ação rescisória em relação à incompetência
absoluta, não em relação à incompetência relativa.

A ação rescisória é admissível ainda que o impedimento do juiz ou a incompetência absoluta do juízo tenham sido
arguidas e resolvidas no processo originário.

4.3. Dolo ou coação da parte vencedora e simulação ou colusão entre as partes para fraudar a lei

O dolo ou coação da parte vencedora (também pode ser do representante legal ou advogado) só enseja ação
rescisória quando o dolo ou coação impedir ou dificultar a atuação processual do adversário ou, ainda, quando
influenciar significativamente o juiz, a ponto de afastá-lo da verdade. É exigido um nexo de causalidade entre o dolo e
a coação da parte e o resultado da demanda, limitando-se o cabimento da ação rescisória somente aos casos nos
quais a postura de má-fé da parte tenha sido determinante para o resultado do processo. A colusão entre as partes
está prevista no art. 142, parecendo que tanto a realização de processo simulado como processo com objetivo de
alcançar algo proibido por lei sejam alcançados pelo dispositivo legal. Nesse caso, mesmo de ofício, cabe ao tribunal,
ao julgar procedente a ação rescisória, condenar as partes nas penalidades de litigância de má-fé. Diferente do dolo e
da coação, na colusão e na simulação sempre existirá um acordo prévio entre as partes com o objetivo de fraudar a
lei, de forma que dificilmente a ação rescisória será proposta por alguma delas, sendo o mais comum a propositura se
dar por terceiro prejudicado ou pelo MP como fiscal da ordem jurídica.

4.4. Ofensa à coisa julgada

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Verifica-se o efeito negativo da coisa julgada quando esta é entendida como pressuposto processual negativo,
ensejando a extinção da demanda sem resolução de mérito. Para a geração do efeito negativo exige-se a tríplice
identidade. Não sendo gerado o efeito negativo e verificando-se duas decisões transitadas em julgado em demandas
idênticas, a decisão que transitou mais recentemente pode ser desconstituída por meio de ação rescisória. A
desconstituição depende do teor da segunda decisão, que pode ser conforme ou conflitante com a primeira. Também
há ofensa a coisa julgada quando o efeito positivo da coisa julgada não é respeitado. Havendo solução de relação
jurídica protegida por coisa julgada material, cria-se uma vinculação em outras demandas nas quais a mesma relação
jurídica venha a ser discutida incidentalmente. Nesse caso, a decisão que se busca rescindir será proferida em
demanda diversa daquela que gerou a coisa julgada material ofendida, o que em nada modifica o direito da parte em
vê-la por meio da ação rescisória.

4.5. Violação manifesta de norma jurídica

Tem como fundamento o erro crasso do juízo na aplicação do direito no caso concreto, considerando-se que a decisão
que violar manifestamente norma jurídica deva ser desconstituída. O termo normas é abrangente, mas o STJ não
admite a ação rescisória por ofensa à súmula de direito material e processual; constitucionais e infraconstitucionais e;
nacionais e estrangeiras (AR 4.112/SC, Min. Marco Aurélio Bellizze, 3ª Seção, 28.11.2012, Info 510).

Para parte da doutrina, a amplitude desse entendimento inclui até mesmo os princípios não escritos (Nelson Nery,
Fredie Didier Jr; Luiz Fux; Daniel Assumpção Neves). Enquanto a norma revogada mencionava violação à “lei” a nova
norma prevê violação à “norma jurídica”, reconhecendo que a lei não é a única fonte do Direito que pode ser violada
para ensejar a ação rescisória. Embora a decisão proferida contra jurisprudência ou súmula não possa ser objeto de
ação rescisória, a doutrina entende cabe ação rescisória em relação às súmulas vinculantes.

Não é qualquer violação da lei que admite a propositura de ação rescisória, pois de acordo com a doutrina e
jurisprudência, a violação literal exige que no momento de aplicação da norma por meio de decisão judicial não exista
interpretação controvertida nos tribunais. Portanto, se havia polêmica à época da prolação da decisão, ainda que a
época da ação rescisória o entendimento tenha se pacificado em torno da tese defendida pelo autor dessa ação, não
será possível a desconstituição (REsp 736.650/MT, Min. Antônio Carlos Ferreira, Corte Especial, 20.08.2014, Info 547).
A divergência deve ser real, ou seja, que efetivamente haja quantidade significativa de decisões fundadas em
diferentes interpretações.

Súmula 343, STF: Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a
decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos
tribunais.

Prevalece o entendimento de que a Súmula 343, STF NÃO está mais válida tendo em vista a previsão do art. 966, V,
§5º e 525, §15. Assim, na hipótese de declaração de inconstitucionalidade de lei, mesmo que à época da prolação da
decisão houvesse divergência interpretativa a respeito da constitucionalidade, admite-se a propositura da ação
rescisória se posteriormente a lei que fundamentou a decisão foi declarada inconstitucional pelo STF (Alexandre
Câmara, Fredie Didier Jr4; EREsp 687.903/RS, Min. Ari Pargendler, Corte Especial, 04.11.2009, Info 414). Havendo no
STF mudança posterior de entendimento anteriormente consagrado, não cabe ação rescisória para afastar o antigo
entendimento e fazer valer o posterior.

Segundo o STJ, se o autor da ação rescisória – fundada em violação literal à disposição de lei – afirma que a sentença
rescindenda violou o art. XX da Lei, o Tribunal não pode julgar a rescisória procedente com base na violação do art. YY,
mesmo que se trate de matéria de ordem pública. Na ação rescisória fundada em literal violação de lei, não cabe o
reexame de toda a decisão rescindenda, para verificar se nela haveria outras violações à lei não alegadas pelo
demandante, mesmo que se trate de questão de ordem pública. Quando o autor da rescisória propõe a ação com
fundamento na hipótese de violação literal à disposição de lei - art. 485, V, CPC/1973 (art. 966, V, CPC/2015) – ele tem
o ônus de indicar o(s) dispositivo(s) que foi(foram) violado(s). O Tribunal que julgará a rescisória só irá examinar se
houve violação aos dispositivos indicados, não podendo reexaminar toda a decisão rescindenda, para verificar se nela
haveria outras violações a literal disposição de lei não alegadas pelo demandante, nem mesmo ao argumento de se
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Para DIDIER, há apenas uma hipótese na qual a súmula 343, STF continua aplicável: divergência na interpretação do direito entre tribunais, sem que existisse, ao
tempo da prolação da decisão rescindenda, precedente vinculante do STF/STJ sobre o tema. Neste caso, não há direito à rescisão, pois não se configura a manifesta
violação de norma jurídica. Aplica-se a súmula 343, STF.

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tratar de matéria da ordem pública.” (YARSHELL, Flávio. Ação rescisória: juízos rescindente e rescisório. São Paulo:
Malheiros, 2005, p. 151). Desse modo, na ação rescisória fundada no art. 485, V, CPC/1973 (art. 966, V, CPC/2015), o
juízo rescisdente do Tribunal se encontra vinculado aos dispositivos de lei apontados pelo autor como literalmente
violados, não podendo haver exame de matéria estranha à apontada na inicial, mesmo que o tema possua a natureza
de questão de ordem pública, sob pena de transformar a ação rescisória em um recurso, natureza jurídica que ela não
possui. STJ. 3ª Turma. REsp 1663326-RN, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 11/02/2020 (Info 665).

O REsp interposto contra acórdão em ação rescisória pode atacar diretamente os fundamentos do acórdão
rescindendo, não precisando limitar-se aos pressupostos de admissibilidade da rescisória. Se o recorrente está
alegando que houve violação à literal disposição de lei (violação à norma jurídica), com base no art. 485, V, do
CPC/1973 (art. 966, V, do CPC/2015), o mérito do recurso especial se confunde com os próprios fundamentos para a
propositura da ação rescisória, autorizando o STJ a examinar também o acórdão rescindendo. STJ. Corte Especial.
EREsp 1434604-PR, Rel. Min. Raul Araújo, julgado em 18/08/2021 (Info 705).

De acordo com o STJ, não é cabível propositura de ação rescisória com base em julgados que não sejam de
observância obrigatória, sob pena de se atribuir eficácia vinculante a acórdão que, por lei, não o possui (REsp
1.655.722/SC, Min. Nancy Andrighi, 14.03.2017, 3ª Turma, Info 600).

Cabe ação rescisória contra decisão baseada em enunciado de súmula ou acórdão proferido em julgamento de casos
repetitivos que não tenha considerado a existência de distinção entre a questão discutida no processo e o padrão
decisório que lhe deu fundamento (art. 966, §5º). Como o dispositivo não faz qualquer distinção, a decisão rescindível
pode ser uma sentença transitada em julgado, um acórdão irrecorrido proferido em segundo grau, um acórdão
proferido em segundo grau recorrido por recurso especial ou extraordinário inadmitidos ou mesmo um acórdão de
agravo interno interposto contra essa inadmissão (art. 1.030, §2º). Cabe ao autor, sob pena de inépcia da petição,
demonstrar, fundamentadamente, tratar-se de situação particularizada por hipótese fática distinta ou questão jurídica
não examinada, a impor outra situação jurídica.

Tradicionalmente, o STF entende que se a sentença foi proferida com base na jurisprudência vigente à época e,
posteriormente esse entendimento foi alterado, não se pode dizer que essa decisão impugnada violou norma jurídica.
Desse modo, não caberia ação rescisória em face de acórdão que, à época de sua prolação, estava em conformidade
com a jurisprudência dominante do STF (AR 2199/SC, Min. Gilmar Mendes, Plenário, 23.04.2015, Info 782). No
entanto, há divergência na doutrina sobre a subsistência deste entendimento, tendo em vista o art. 525, §15, CPC. Em
decisão recente, o STF afirmou que se a sentença foi proferida com base na jurisprudência do STF vigente à época e,
posteriormente, esse entendimento foi alterado, não se pode dizer que essa decisão impugnada tenha violado literal
disposição de lei para fins da ação rescisória prevista no art. 485, V, do CPC/1973. Desse modo, não cabe ação
rescisória em face de acórdão que, à época de sua prolação, estava em conformidade com a jurisprudência
predominante do STF. STF. Plenário. AR 2422/DF, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 25/10/2018 (Info 921).

Não é possível utilizar ação declaratória de nulidade (querela nullitatis) contra título executivo judicial fundado em lei
declarada não recepcionada pelo STF em decisão proferida em controle incidental que transitou em julgado após a
constituição definitiva do referido título. A decisão do STF que declara a constitucionalidade ou a inconstitucionalidade
de lei ou ato normativo não produz a automática reforma ou rescisão das sentenças anteriores que tenham adotado
entendimento diferente; para que tal ocorra, será indispensável a interposição do recurso próprio ou, se for o caso, a
propositura da ação rescisória própria, observado o respectivo prazo decadencial de 2 anos. STJ. 2ª Turma. REsp
1237895-ES, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 15/9/2015 (Info 576).

Juiz que não declara, de ofício, prescrição na ação de cobrança não viola literal disposição de lei para fins de ação
rescisória, com base no art. 485, V, CPC/1973. O fato de o magistrado não reconhecer, de ofício, a prescrição não
redunda na ofensa à literalidade do § 5º do art. 219 do CPC/1973, a subsidiar ação rescisória, com fulcro no art. 485,
V, CPC/1973 (art. 966, V, CPC/2015). STJ. 3ª Turma. REsp 1749812-PR, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em
17/09/2019 (Info 656).

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4.6. Prova falsa

A ação rescisória com fundamento em prova falsa não depende de prévio processo criminal para a apuração da
falsidade da prova, admitindo-se que a prova dessa falsidade seja produzida na própria ação rescisória (REsp
885.352/MT, Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 3ª Turma, 07.04.2011, Info 468). Mesmo havendo condenação na
esfera penal, a ação rescisória pode ser julgada improcedente, porque, apesar da vinculação do juízo cível à decisão
penal transitada em julgado, ainda caberá a análise da prova ser fundamento único ou indispensável à sustentação da
decisão impugnada. É pacífico na doutrina que a decisão somente será rescindível na hipótese de prova falsa se esta
for o fundamento principal da decisão, de forma que havendo outros fundamentos aptos a manter a decisão, apesar
da existência de uma prova falsa, não caberá ação rescisória (Eduardo Talamini; Luiz Guilherme Marinoni).

O debate a respeito da falsidade documental – que pode ser material ou ideológica – durante o processo originário, e
mesmo a existência de decisão incidental sobre o tema em tal processo, não impede a propositura de ação rescisória.
Por outro lado, se a parte pedir que a decisão sobre a falsidade documental seja decidida como questão principal (art.
430, paragrafo único), a decisão estará protegida pela coisa julgada material, devendo necessariamente ser respeitada
pelo juízo da ação rescisória (efeito positivo da coisa julgada).

Na vigência do CPC/1973, a confissão era um vício de rescindibilidade previsto no art. 485, VIII, porém não foi assim
previsto no CPC/2015. Se interpretarmos a confissão como espécie de ato de disposição de direito processual, tal vício
pode ser inserido no §4º do art. 966, sendo a via impugnativa adequada a ação anulatória. Parece ser nesse sentido o
art. 393, ao prever que a confissão pode ser anulada se decorreu de erro de fato ou de coação. Sob a égide do
CPC/1973, a forma procedimental para impugnar confissão viciada tinha previsão no art. 352, a depender do trânsito
em julgado: antes, ação anulatória; depois, ação rescisória. No NCPC, aparentemente, será sempre cabível a ação
anulatória5.

4.7. Obtenção de prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe
assegurar pronunciamento favorável

Obtenção de prova cuja existência era ignorada pelo autor da ação rescisória ou de que não pôde fazer uso por motivo
estranho à sua vontade. O documento novo não se confunde com o documento produzido posteriormente, de forma
que o documento já deve existir no momento em que a decisão que se busca desconstituir tiver sido proferida.
Documento que não era conhecido ou de que não se pôde fazer uso é necessariamente documento que já existia
(Barbosa Moreira; Fredie Didier Jr). Portanto, se a prova já existia no momento da propositura da ação originária, mas,
por desídia, não foi juntada aos autos, não será cabível ação rescisória trazendo esta prova como documento novo.
Exceção: é possível ao tribunal, em ação rescisória, analisar documento novo para efeito de configuração de início de
prova material destinado à comprovação do exercício de atividade rural, ainda que esse documento seja preexistente
à propositura da ação em que proferida a decisão rescindenda referente à concessão de aposentadoria rural por idade
– adota-se a solução pro misero (STJ, AR 3.921/SP, Min. Sebastião Reis Júnior, 3ª Seção, 24.04.2013, Info 522).

De acordo com o STJ, somente será cabível ação rescisória com fundamento em documento novo, desde que a prova
se refira a fatos alegados pelo autor na ação originária e o juiz tenha analisado estes fatos no curso do processo em
que se formou a coisa julgada. Assim, não cabe ação rescisória na hipótese em que, além de não existir comprovação
acerca dos fatos que justifiquem a ausência de apresentação do documento em modo e tempo oportunos, este se

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Para Daniel Assumpção Neves, tendo transitado em julgado uma decisão de mérito em processo com fundamento em confissão, não é viável que uma ação anulatória
tenha condições de rescindir a decisão e afastar a coisa julgada material. Ainda que essa realidade tenha sido consagrada no CPC (art. 966, §4º) para as sentenças
homologatórias transitadas em julgado, no caso em análise ter-se-á uma sentença genuína de mérito, por meio da qual o juiz acolherá ou rejeitará o pedido do autor em
aplicação do direito material ao caso concreto. Nesse caso, ainda que todos os indicativos legais presentes no NCPC apontem para o cabimento da ação anulatória, essa
terá condições apenas de anular a confissão, mas nunca de rescindir a decisão transitada em julgado no processo em que tal confissão foi produzida. O que é pior, como
não está mais previsto o cabimento de ação rescisória com fundamento em confissão viciada, a parte não poderia mais rescindir o julgado. Aparentemente não poderia
porque, para resolver o impasse gerado pelo equívoco do legislador, cabe ao intérprete incluir a hipótese ora analisada no inciso VI do art. 966. Ainda que seja evidente a
diferença entre confissão viciada e prova falsa, o esforço hermenêutico é indispensável para que, mesmo sem previsão legal, a regra continue a ser respeitada e aplicada
na praxe forense. Há decisões do STJ que corroboram esse entendimento, alargando o conceito de prova falsa para o laudo pericial incorreto, incompleto ou
inadequado.

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refira a fato que não tenha sido alegado pelas partes e analisado pelo juiz no curso do processo em que se formou a
coisa julgada (REsp 1.293.837/DF, Min. Paulo de Tarso Sanseverino, 02.04.2013, Info 522). Ex: João move ação de
cobrança contra Pedro. Pedro alega unicamente ausência de contrato com o autor. João consegue provar que houve
débito, sendo proferida sentença em seu favor. Posteriormente ao trânsito em julgado, Pedro tem acesso à
documento que prova a quitação do débito, e decide ajuizar ação rescisória alegando que realmente o débito existiu,
porém foi paga conforme a prova de quitação que junta em sua petição. Nesse caso, não será cabível a ação rescisória,
pois o documento se refere a fato não alegado pelo réu (quitação) e que, por isso, não foi analisado pelo juízo no
curso do processo.

Numa interpretação mais restritiva do termo “prova nova”, pode-se defender que o legislador passou a admitir como
fundamento de ação rescisória, além da prova documental, também a prova documentada, ou seja, a prova pericial
ou oral materializada num documento (laudo pericial e termo de audiência). Nesse caso, a prova a fundamentar a
ação rescisória necessariamente já deve ter como amparo material um documento, que será juntado à petição inicial,
não havendo dilação probatória na ação rescisória. Por outro lado, pode-se entender que o termo “prova nova”
permite a ação rescisória com base em prova pericial e testemunhal a ser produzida na própria ação. Nesse caso, não
tendo que ser a “prova nova” pré-constituída, aparentemente o legislador teria criado uma espécie sui generis de
coisa julgada secundum eventum probationis sui generis por duas razões: i) a nova prova poderia modificar o resultado
de procedência ou improcedência do pedido; ii) essa modificação da decisão fundada em prova nova não seria
realizada na ação reproposta, mas por meio de ação rescisória. De acordo com o STJ, quando o inciso VII do art. 966
do CPC/2015 fala que é possível o ajuizamento de ação rescisória com base em “prova nova”, isso abrange também a
prova testemunhal. Quando esse inciso VII fala em prova nova, engloba não apenas a prova documental, mas
qualquer outra espécie de prova, inclusive a prova testemunhal. Assim, no novo ordenamento jurídico processual,
qualquer modalidade de prova, inclusive a testemunhal, é apta a amparar o pedido de desconstituição do julgado
rescindendo na ação rescisória. STJ. 3ª Turma. REsp 1770123-SP, Rel. Min. Ricardo Villas Bôas Cueva, julgado em
26/03/2019 (Info 645).

Em relação à prova pericial, parece adequado o entendimento de que ela só pode ser utilizada como fundamento da
ação rescisória diante da impossibilidade, alheia à vontade da parte, de sua produção durante o processo. Isto é,
apesar de possível, não foi produzida por motivo estranho à vontade da parte.

Mantendo-se o mesmo critério para a prova oral, jamais será cabível ação rescisória com fundamento em depoimento
pessoal, ainda que não realizado no processo de origem, porque essa espécie de prova é sempre materialmente
possível de ser produzida.

Para Daniel Assumpção Neves, quanto à prova testemunhal, cabe ao autor da ação rescisória a comprovação de que
não tinha conhecimento, e nem tinha como ter, da existência da testemunha, razão pela qual a prova não foi
produzida no processo de origem.

Para a prova ser nova ela deve ser obtida pelo autor após o trânsito em julgado da decisão que se busca rescindir (art.
966, VII). Esse dispositivo é criticável, porque o momento adequado para qualificar uma prova como nova é o último
momento em que seria lícita a produção da prova nova no processo originário (Barbosa Moreira, Eduardo Talamini).
Portanto, a prova nova deve ser lida como aquela obtida posteriormente à última oportunidade de utilizar a prova no
processo originário, porque numa demanda em que a sentença tenha sido recorrida por apelação e comprovando-se
que antes de seu julgamento a parte tomou conhecimento da existência do documento ou passou a poder utilizá-lo,
não o juntando aos autos, perderá o direito à ação rescisória. O mesmo se aplica à prova oral e pericial, podendo o
tribunal converter julgamento em diligência para a produção de tais meios de prova. Por outro lado, se esses eventos
ocorrerem em sede de recurso especial ou extraordinário, não será admitida a juntada de documento ou a produção
de prova oral ou pericial, considerando-se a limitação às matérias de direito do efeito devolutivo desses recursos.

Para o cabimento de ação rescisória, a prova nova deve ter a aptidão de, por si só, assegurar um resultado positivo ao
autor da ação rescisória, porque de nada vale a desconstituição da decisão se a prova não tiver força suficiente de
convencimento para que uma eventual nova decisão a ser proferida seja em sentido contrário ao julgamento
rescindido, ainda que disso não resulte uma decisão totalmente favorável ao autor da ação rescisória, bastando que
melhore sua situação anterior.

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Não se deve confundir prova nova com fato novo, ou ainda fato que somente após o trânsito em julgado passa a ser
conhecido pela parte. A prova nova que fundamenta a ação rescisória deve se referir a um fato que tenha sido
alegado na ação originária. Sendo o fato não alegado um fato simples, a coisa julgada não poderá ser afastada com a
sua alegação em razão da eficácia preclusiva da coisa julgada; sendo um fato jurídico, a parte pode ingressar com nova
demanda, já que nesse caso não haverá mais a tríplice identidade (a causa de pedir é diferente).

4.8. Erro de fato

Se verifica o erro de fato quando a decisão rescindenda admite um fato inexistente ou quando considera um fato
inexistente efetivamente ocorrido (art. 966, §1º). O mero equívoco a respeito da qualificação jurídica de um fato não
admite a utilização de ação rescisória. Para a admissão da ação rescisória deve-se atender:

i) erro de fato deve ser fundamento essencial da sentença, ou seja, não fosse o erro de fato, a decisão teria sido
em outro sentido;

ii) a apuração do equívoco factual deve ser realizada com as provas produzidas no processo originário, sendo
vedada a produção de prova na própria ação rescisória;

iii) o fato não pode representar ponto controvertido (questão) no processo originário, ou porque as partes não
alegaram e caberia ao juiz conhecê-los de ofício, ou porque houve confissão de uma parte ou ainda porque a
parte contrária se absteve de impugnar a alegação de fato;

iv) inexistência de pronunciamento judicial a respeito do fato, entendendo-se que a má apreciação de prova
não gera ação rescisória.

5. FUNDAMENTO PARA INVALIDAR SENTENÇA HOMOLOGATÓRIA DE MÉRITO

Os atos de disposição de direitos, praticados pelas partes ou por outros participantes do processo e homologados pelo
juízo, bem como os atos homologatórios praticados no curso da execução, estão sujeitos à anulação (art. 966, §4º). No
caso em que particular e Fazenda Pública firmaram, sem a participação judicial, acordo que tenha sido meramente
homologado por decisão judicial — a qual, por sua vez, apenas extinguiu a relação jurídica processual existente entre
as partes, sem produzir efeitos sobre a relação de direito material existente entre elas —, o prazo decadencial para
anular o ajuste por meio de ação ajuizada pelo particular é de 5 anos, contados da data da celebração da transação, e
não da decisão homologatória. STJ. 2ª Turma. REsp 866197-RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em
18/2/2016 (Info 581).

6. LEGITIMIDADE (art. 967)

6.1. Legitimidade ativa

a) parte no processo ou seu sucessor a título universal ou singular;

b) terceiro juridicamente interessado;

c) MP

É possível que exista no caso concreto mais de um legitimado ativo, sendo possível a formação de um litisconsórcio
facultativo. Parte da doutrina afirma que esse litisconsórcio é unitário (Barbosa Moreira), ao passo que outros autores
entendem que o litisconsórcio será unitário somente para o pedido realizado para julgamento do juízo rescindendo,
porque uma eventual manutenção ou desconstituição da decisão atingirá todos os litisconsortes indistintamente. Já
na hipótese do juízo rescisório, é possível imaginar que no novo julgamento o resultado possa ser diferente para os
litisconsortes ativos (Daniel Assumpção Neves).

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As partes que participaram do processo originário têm legitimidade ativa para propor ação rescisória, incluídos o
autor, réu e terceiros intervenientes, assistente. Pouco importa como se deu a participação desses sujeitos no
processo originário de forma que o réu revel, mesmo não tendo efetivamente participado do processo, tem
legitimidade para a ação rescisória, bem como terceiros intervenientes que tenham se mantido inertes durante o
tramite processual.

A sucessão inter vivos ou causa mortis torna os herdeiros ou sucessores legitimados a propositura da ação rescisória. A
sucessão pode ter decorrido antes ou depois do encerramento do processo originário. Há uma peculiaridade no art.
393, p.ú: na ação rescisória com fundamento em confissão viciada por erro, dolo ou coação, somente o confitente tem
legitimidade para propor a ação rescisória, ficando aos seus herdeiros a legitimidade de continuar a ação rescisória já
iniciada pelo confitente. Os herdeiros só têm legitimidade ativa superveniente.

O terceiro juridicamente interessado é aquele sujeito que mantem com uma ou ambas as partes da demanda uma
relação jurídica que tenha sido afetada com a decisão que se busca rescindir. Poderia ter sido litisconsorte facultativo
ou assistente no processo originário, o que lhe garantiria a legitimidade como parte, mas por não ter participado
continua a ser terceiro. Sendo juridicamente afetado, tem legitimidade para a propositura da ação rescisória.

O MP tem legitimidade nas hipóteses em que não houver sua participação no processo originário, porque nesse caso
tem legitimidade como parte. Há duas hipóteses de legitimidade do MP nessas circunstâncias:

a) quando não tenha sido ouvido como fiscal da lei em processo no qual sua participação era obrigatória;

b) quando a decisão resultar de colusão ou simulação das partes a fim de fraudar a lei.

Parte da doutrina sustenta que o MP, quando participa do processo originário como fiscal da lei, é parte no processo,
mas não é parte na demanda, de forma que só passa a ter legitimidade para a ação rescisória na hipótese de colusão
ou de simulação entre as partes. No entanto, o texto adotou entendimento do STJ, admitindo a legitimidade do MP
sempre que existir interesse público.

Tem legitimidade para propor ação rescisória aquele que não foi ouvido no processo em que lhe era obrigatória a
intervenção (art. 967, IV). Nesse caso, a legitimidade é de um terceiro que deveria ter participado do processo ou ao
menos ter sido ouvido – e que não o integrou. Para parte da doutrina, o dispositivo trata de entes distintos do MP que
deveria ter sido intimados a se manifestar e isso não ocorreu, como é o caso da Comissão de Valores Mobiliários, cuja
intervenção é obrigatória nos processos em que se discutam matéria de sua competência (art. 31, Lei 6.385/76), e do
CADE, cuja intervenção é obrigatória nos processos em que discutam matéria da sua competência (art. 118, Lei
12.529/11) (Medina, Fredie Didier).

6.2. Legitimidade passiva

Ainda que não exista previsão expressa em relação a legitimidade passiva na ação rescisória, para a doutrina e
jurisprudência devem ser réus na ação rescisória todos os sujeitos que figuravam como parte no processo originário e
não estejam propondo ação rescisória. Na hipótese de desconstituição total da decisão, haverá litisconsórcio passivo
necessário, considerando-se que a eventual desconstituição da decisão impugnada afetará todos os sujeitos que
participaram como parte no processo originário. Dessa regra decorre interessante fenômeno: os sujeitos que
participaram do processo originário no mesmo polo da demanda poderão figurar em polos opostos na ação rescisória.
Se a ação rescisória visar a somente um capítulo da decisão que não afete todos os sujeitos processuais (ex: rescisão
do capítulo que decidiu a denunciação da lide), não será necessário que todos os sujeitos do processo originário façam
parte da ação rescisória.

É possível o ajuizamento de ação rescisória para discutir exclusivamente o tema “verba honorária” fixada na decisão.
No entanto, não será cabível a ação rescisória para discutir o valor arbitrado pelo juiz sob a alegação de que ele violou
lei federal, assim como não cabe ação rescisória sob alegação de que o valor dos honorários foi irrisório ou
exorbitante (STJ, REsp 1.217.321/SC, Min. Mauro Campbell Marques, 2ª Turma, 18.12.2012, Info 509). De acordo com

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o STJ, se a ação rescisória buscar desconstituir também o capítulo dos honorários advocatícios, o advogado
beneficiado na primeira demanda deverá estar no polo passivo da ação rescisória. Assim, a ação rescisória, quando
busca desconstituir sentença condenatória que fixou honorários advocatícios sucumbenciais, deve ser proposta não
apenas contra o titular do crédito principal formado em juízo, mas também contra o advogado em favor de quem foi
fixada a verba honorária (REsp 1.651.057/CE, Min. Moura Ribeiro, 3ª Turma, 16.05.2017, Info 605). No entanto, a
mera alegação de que houve erro de julgamento não é apta a justificar a aplicação da teoria da relativização da coisa
julgada com vistas a desconstituir decisão que fixou equivocadamente os honorários advocatícios, ainda que o valor
dos honorários seja excessivo e possa prejudicar os demais credores (REsp 1.163.649/SP, Min. Marco Buzzi, 4ª Turma,
16.09.2014, Info 556).

Se a ação rescisória busca desconstituir também o capítulo dos honorários advocatícios, o advogado beneficiado na
primeira demanda precisa estar no polo passivo da rescisória?

A jurisprudência do STJ tem entendido ser desnecessária a inclusão dos causídicos no polo passivo de demandas
rescisórias, quando os próprios honorários de sucumbência não são o objeto do pedido rescindendo, pois os
advogados não teriam vínculo jurídico com o objeto litigioso, mas apenas interesse reflexo na manutenção do julgado.
STJ. 2ª Turma. AgInt no REsp 1645421/SC, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 22/10/2019. STJ. 2ª Turma. AgInt no
REsp 1845303/RS, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 29/06/2020. O advogado em favor de quem foram
arbitrados honorários sucumbenciais na ação rescindenda é parte ilegítima para figurar no polo passivo da ação
rescisória. STJ. 4ª Turma. AgInt nos EDcl no REsp 1759374/RS, Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira, julgado em
29/10/2019. O advogado não é parte legítima para figurar no polo passivo de ação rescisória ajuizada sob
fundamentos que só alcançam a relação jurídica formada entre as partes da demanda originária. STJ. 3ª Turma. AgInt
no REsp 1717140/RS, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 18/03/2019.

Formado litisconsórcio passivo na ação rescisória, em relação ao pedido rescindendo será unitário, não se admitindo
que se opere a rescisão da decisão para alguns litisconsortes e a sua manutenção para outros. Já em relação ao pedido
rescisório, o litisconsórcio é simples, porque no novo julgamento – do pedido inicial do autor da ação originária – o
resultado poderá ser diferente para os litisconsortes, desde que o litisconsórcio da ação originária tenha sido simples.
Tendo sido unitário o litisconsórcio passivo formado na ação originária, naturalmente que também relativamente ao
pedido rescisório será caso de litisconsórcio da mesma natureza.

Nas hipóteses do art. 178 (hipóteses gerais de intervenção no processo civil), o MP será intimado para intervir como
fiscal da ordem jurídica quando não for parte (art. 967, p.ú).

7. COMPETÊNCIA

A ação rescisória é uma ação de competência originária de tribunal. Não havendo apelação contra a sentença, a
competência será do tribunal de segundo grau competente para o julgamento desse recurso que no caso concreto
não existiu. Também não traz nenhuma complicação a competência na hipótese de o processo originário acabar com
o julgamento da apelação; nesse caso, o próprio tribunal que julgou a apelação será competente para desconstituir o
seu julgamento. A hipótese mais polêmica diz respeito aos processos nos quais há interposição de RE ou REsp. A regra
é de que a competência para a ação rescisória só será dos tribunais superiores no caso de esses recursos terem sido
julgados em seu mérito, de forma que, não sendo admitidos (não recebimento/conhecimento), a competência será do
tribunal de segundo grau, ainda que faticamente o processo tenha chegado até os tribunais superiores (Nelson Nery
Jr).

Súmula 249, STF: É competente o Supremo Tribunal Federal para a ação rescisória, quando,
embora não tendo conhecido do recurso extraordinário, ou havendo negado provimento ao
agravo, tiver apreciado a questão federal controvertida.

A mesma regra da Súmula 249, STF é aplicada pelo STJ na hipótese de recurso especial não conhecido com a matéria
federal apreciada, o que ocorre em regra no caso de ausência de ofensa à norma federal.

A competência da ação rescisória difere da competência da querela nullitatis. De acordo com o STJ, enquanto na ação
rescisória a competência é originária de tribunal, na querela nullitatis a competência é do próprio juízo que proferiu a

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decisão. O NCPC não versa sobre a competência para o julgamento da ação rescisória, mas traz importante novidade
quanto ao tema da incompetência. Em caso de incompetência absoluta do tribunal para julgar a ação rescisória, não
haverá mais a extinção da ação rescisória, como ocorria no CPC/1973, mas sim a remessa dos autos para o tribunal
competente. Imaginando que a mudança de tribunal possa exigir uma adequação da petição, o autor deve ser
intimado para emendar a petição, a fim de adequar o objeto da ação rescisória, quando a decisão apontada como
rescindenda não tiver apreciado o mérito e não se enquadrar na situação prevista no §2º do art. 966, e quando tiver
sido substituída por decisão posterior. Após a emenda da petição, o réu poderá complementar os fundamentos de
defesa, e, em seguida, os autos serão remetidos ao tribunal competente (art. 968, §6º). A regra não será aplicável
quando a incompetência for reconhecida de ofício liminarmente, o que leva à conclusão de que, excepcionalmente,
será admitida a emenda da petição após a citação e apresentação de contestação do réu. Por outro lado, a
complementação da defesa estará limitada ao objeto das mudanças realizadas na petição inicial em respeito ao
princípio da causalidade.

Há uma observação importante se adotarmos o entendimento de que só deve existir uma ação rescisória por
processo. Imagine a hipótese de uma parcela do mérito ser decidida e a decisão transitar em julgado no primeiro grau,
enquanto a outra parcela do mérito é julgada em último grau recursal pelo STJ. Nesse caso, se o vício de
rescindibilidade estiver presente no julgamento parcial a competência para a ação rescisória será do tribunal de
segundo grau, enquanto que estando o vício presente no julgamento pelo STJ a competência será desse tribunal
superior. E caso a parte pretenda alegar vícios das duas decisões? Nesse caso, mesmo para aqueles que defendem a
existência de uma só ação rescisória por processo parece inviável sustentar esse entendimento: mesmo que com
mesmo termo inicial, serão cabíveis duas ações rescisórias em razão dos diferentes órgãos competentes para o
julgamento de cada vício de rescindibilidade alegado pelo autor (Daniel Assumpção).

8. PRAZO

O prazo para ajuizamento de ação rescisória é de 2 anos, contados do trânsito em julgado da última decisão proferida
no processo (art. 975). O trânsito em julgado ocorre no dia imediatamente subsequente ao último dia do prazo para o
recurso em tese cabível. O prazo de 2 anos começa a ser contado do exato dia em que ocorre o trânsito em julgado.
Assim, o termo a quo para o ajuizamento da ação rescisória coincide com a data do trânsito em julgado da decisão
rescindenda, incluindo no computo o dia do começo (STJ, REsp 1.112.864/MG, Min. Laurita Vaz, Corte Especial,
recurso repetitivo, 19.11.2014, Info 553).

O termo inicial do prazo para ajuizamento da ação rescisória, quando há insurgência recursal da parte contra a
inadmissão de seu recurso, dá-se com o trânsito em julgado da última decisão a respeito da controvérsia, salvo
comprovada má-fé. STJ. 3ª Turma. REsp 1887912-GO, Rel. Min. Marco Aurélio Bellizze, julgado em 21/09/2021 (Info
711).

É irrelevante a data em que a parte tomou conhecimento dos fatos que possibilitariam a propositura da ação
rescisória, valendo sempre, para qualquer situação e para qualquer legitimado, inclusive o terceiro juridicamente
prejudicado, o termo inicial do trânsito em julgado. De acordo com o STJ, o trânsito em julgado conta-se da última
decisão proferida no processo, ainda que tal decisão seja de inadmissão do recurso (AgRg no REsp 958.333/RS, Min.
Maria Thereza de Assis Moura, 6ª Turma, 17.12.2007).

Súmula 402, STJ: o prazo decadencial da ação rescisória só se inicia quando não for cabível
qualquer recurso do último pronunciamento judicial.

No caso de intempestividade do recurso, somente em situação de extrema excepcionalidade, na qual a


intempestividade é flagrante e se presume a má-fé do autor em reabrir o prazo para o ingresso da ação rescisória, o
termo inicial não será a última decisão proferida no processo. De acordo com o STJ, a interposição de recurso
intempestivo não tem o condão de interromper a fluência do prazo decadencial para a propositura da ação rescisória,
pois a posterior declaração de intempestividade do recurso só confirma o trânsito em julgado anteriormente ocorrido
(REsp 1.632.691/RS, Min. Herman Benjamin, 2ª Turma, 16.02.2017).

Para o STJ, se a Fazenda Pública participar do processo, o trânsito em julgado e, consequentemente, o termo inicial da
contagem de prazo da ação rescisória, somente ocorre após o esgotamento do prazo em dobro que esta tem para

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recorrer, ainda que o ente público tenha sido vencedor na última decisão proferida na demanda (Ag no AREsp
79.082/SP, Min. Arnaldo Esteves Lima, 05.02.2013, Info 514).

É controvertida a existência de coisa julgada material parcial na hipótese de recurso parcial

1ª posição: há coisa julgada material parcial, tendo em vista a parcela da decisão não recorrida transita em julgado e,
sendo de mérito, produz imediatamente coisa julgada material. Nesse entendimento, o termo inicial da ação rescisória
não é a última decisão proferida no processo, mas o momento em que a parcela da decisão não foi objeto de recurso
(Humberto Theodoro Jr).

2ª posição (STJ): NÃO existe coisa julgada material parcial, havendo apenas um termo inicial para a ação rescisória: a
última decisão proferida no processo. por esse entendimento, mesmo havendo coisa julgada material parcial,
fenômeno inegavelmente possível diante do julgamento antecipado parcial do mérito previsto no art. 356, o termo
inicial da contagem do prazo de 2 anos para a ação rescisória será a última decisão proferida no processo (Cassio
Scarpinella, José Miguel Garcia Medina). Portanto, será cabível apenas uma ação rescisória por processo,
independentemente do trânsito em julgado parcial, com o que se evitaria o tumulto processual decorrente de
inúmeras coisas julgadas em um mesmo processo, com a consequente pluralidade de ações rescisórias REsp
736.650/MT, Min. Antônio Carlos Ferreira, Corte Especial, 20.08.2014, Info 547).

3ª posição (STF): há coisa julgada material parcial, sendo possível apontar para diferentes termos iniciais para a
propositura da ação rescisória, a depender do momento do trânsito em julgado do capítulo não impugnado da decisão
(RE 666.589/DF, Min. Marco Aurélio, 1ª Turma, 03.06.2014).

4ª posição: o art. 975 não prevê um termo inicial da ação rescisória, mas sim seu termo final. Logo, constando o
trânsito em julgado de capítulo da decisão de mérito, a parte poderá imediatamente ingressar com ação rescisória,
tendo como termo final do exercício desse direito o prazo de 2 anos da última decisão proferida no processo (Daniel
Assumpção).

No prazo de 2 anos, a parte NÃO perde o direito à ação rescisória, mas o próprio direito material de desconstituir a
decisão, de forma que o prazo de 2 anos tem natureza decadencial. Não poderia ser outra solução, considerando-se
que ação rescisória tem natureza constitutiva e versa sobre direito potestativo (Barbosa Moreira). Sendo de
decadência, o prazo não se interrompe nem se suspende. Vencido em data na qual não há expediente forense,
recesso, férias ou feriados, caberá à parte interessada ingressar com a ação rescisória no primeiro dia útil subsequente
(art. 975, §1º). De acordo com o STJ, o prazo decadencial de 2 anos só se considerará interrompido quando a relação
processual estiver completa, de forma que a formação de litisconsórcio necessário ulterior só será admitida antes do
vencimento do prazo (REsp 863.890/SC, Min. Nancy Andrighi, 3ª Turma, 17.02.2011, Info 463). Caso o prazo de 2 anos
transcorra sem tal formação, caberá a extinção da ação por decadência (art. 487, II). O prazo de 2 anos não flui em
desfavor de incapazes (art. 208). Nesse caso, o termo inicial do prazo de 2 anos é a perda da condição de incapaz.

Inexistindo homologação judicial do pedido de renúncia, não se pode permitir a abertura do prazo decadencial de dois
anos para propor ação rescisória antes que ocorra a indispensável intimação da parte interessada. Em regra, a
desistência do recurso ou a renúncia ao prazo recursal constituem ato unilateral de vontade do recorrente que
independe da aquiescência da parte contrária e produz efeitos imediatos, ensejando o trânsito em julgado. Desse
modo, a desistência do recurso ou a renúncia ao prazo recursal determinam, em regra, o trânsito em julgado da
decisão impugnada, se não houver recurso pendente de julgamento da outra parte. Contudo, se ainda não houve
homologação judicial, o princípio do contraditório impede que o trânsito em julgado seja reconhecido antes da ciência
da parte contrária. Não se pode permitir a abertura do prazo decadencial de 2 anos da ação rescisória antes que
ocorra a indispensável intimação da parte interessada no fato processual que lhe dá origem. Nesse contexto, deve ser
contado o prazo decadencial da data da intimação da parte contrária, após o pedido de renúncia. STJ. 1ª Turma. REsp
1344716-RS, Rel. Min. Gurgel de Faria, julgado em 05/05/2020 (Info 671).

8.1. Prazos diferenciados

Quando fundada na hipótese prevista no inciso VII, art. 966 (“obtiver o autor, posteriormente ao trânsito em julgado,
prova nova cuja existência ignorava ou de que não pôde fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento

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favorável”), o termo inicial do prazo máximo de 5 anos, contado do trânsito em julgado da última decisão proferida no
processo (art. 975, §2º).

Sendo fundada a ação rescisória em simulação ou colusão das partes, o prazo começa a contar para o terceiro
prejudicado e para o MP, que não interveio no processo, a partir do momento em que tem ciência da simulação ou da
colusão (art. 975, §3º). Nesse caso específico, o legislador não põe limite temporal, considerando que a proteção da lei
e/ou do terceiro prejudicado poderá ocorrer a qualquer tempo, desde que dentro do prazo de 2 anos da ciência da
simulação ou colusão entre as partes. Assim, é admissível a ação rescisória mesmo depois de transcorridos vários anos
da última decisão proferida no processo.

Há também um termo inicial para o prazo da rescisória previsto nos arts. 525, §15, 535, §8º. Sendo a ação rescisória
fundada em inconstitucionalidade da norma que fundamentou a decisão rescindenda, o termo inicial do prazo de 2
anos da rescisória será a decisão proferida pelo STF declarando tal inconstitucionalidade. Novamente se tem um
termo inicial fluido, que dependerá da data da decisão do STF. É mais um caso de admissão de ação rescisória mesmo
depois de transcorridos vários anos da última decisão proferida no processo. De acordo com o STF, a decisão do STF
que declara a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de lei ou ato normativo não produz a automática reforma
ou rescisão das sentenças anteriores que tenham adotado entendimento diferente; para que tal ocorra, será
indispensável a interposição do recurso próprio ou, se for o caso, ação rescisória, observado o prazo decadencial.
Ressalva-se desse entendimento, quanto à indispensabilidade da ação rescisória, a questão relacionada à execução de
efeitos futuros da sentença proferida em caso concreto sobre relações jurídicas de trato continuado (RE 730.462/SP,
Min. Teori Zavascki, 28.05.2015, repercussão geral).

Para o STJ, a coisa julgada não poderá ser desconstituída através de querela nulitatis, mesmo após julgamento do STF
que reconhece a inconstitucionalidade da lei que fundamentou a sentença que se pretende desconstituir, conforme
entendimento exposto no RE 730.462, que concluiu ser cabível apenas a ação rescisória (AgInt nos EREsp 44.901/PR,
Min. Felix Fischer, Corte Especial, 07.12.2016).

Da mesma forma, não é possível utilizar ação declaratória de nulidade (querela nullitatis) contra título executivo
judicial fundado em lei declarada não recepcionada pelo STF em decisão proferida em controle incidental que
transitou em julgado após a constituição definitiva do referido título (STJ, REsp 1.237.895/ES, Min. Og Fernandes, 2ª
Turma, 15.09.2015, Info 576).

9. AÇÃO RESCISÓRIA E CUMPRIMENTO EXECUTIVO DO JULGADO

Em regra, a propositura da ação rescisória não impede o cumprimento da decisão rescindenda, mas é possível, no
caso concreto, o autor da ação rescisória obter tutela provisória para impedir o início ou suspender o andamento do
cumprimento da sentença. No caso de pedido incidental de tutela provisória, o autor poderá elaborá-lo na própria
petição inicial da ação rescisória, sempre que cabível, já que há tutela de evidência que não pode ser concedida
liminarmente, ou por meio de mera petição após a propositura da ação. Também é admissível o pedido antecedente,
seja a pretensão provisória fundada em tutela de urgência ou da evidência.

10. PROCEDIMENTO

No caso do endereçamento, a ação rescisória deve ser endereçada sempre para um tribunal. Eventual equívoco
quanto ao endereçamento, que criará no caso concreto um vício de incompetência absoluta, não enseja a extinção do
processo, devendo o processo ser remetido ao tribunal competente (art. 968, §5º).

Em relação ao pedido, a regra na ação rescisória é a existência de dois juízos:

a) juízo rescindendo (judicium rescindens)  pedido de rescisão do julgado impugnado;

b) juízo rescisório (judicium rescissorium)  pedido de novo julgamento.

Sempre que for necessária a cumulação de pedidos – cumulação sucessiva, na qual o segundo pedido só será
analisado se o primeiro for acolhido -, é indispensável que ambos os pedidos sejam feitos expressamente, não se

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admitindo pedido implícito de novo julgamento. O princípio da instrumentalidade das formas exige do juízo a
determinação de emenda da petição inicial no caso de ausência de pedido de novo julgamento nesses casos, mas é
inegável que um juízo mais formalista possa vir a indeferir liminarmente a petição inicial.

As exceções à necessidade de cumulação de pedidos ficam por conta da ação rescisória com fundamento no art. 966,
II (decisão de mérito proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente), sempre que o órgão que
desconstituir a decisão o fizer exatamente porque reconheça sua incompetência absoluta para proferir o julgamento
impugnado (não teria nenhum sentido desconstituir o julgamento e proferir novo julgamento com o mesmo vício), e
da ação rescisória com fundamento no art. 966, IV (decisão de mérito for fundada em prova cuja falsidade tenha sido
apurada em processo criminal ou venha a ser demonstrada na própria ação rescisória), já que, afastada a decisão que
contraria a coisa julgada, nenhuma outra terá que ser proferida, mantendo-se a decisão originariamente afrontada
pela decisão desconstituída. Nesses casos, não haverá cumulação de pedidos, limitando-se a pretensão do autor ao
pedido de rescisão do julgado (juízo rescindendo).

Em relação ao valor da causa, segundo o STJ, deve-se analisar no caso concreto o valor econômico do bem da vida
perseguido pelo autor da ação rescisória, não existindo vinculação necessária entre o valor da causa do processo
originário e o da ação rescisória. Em decisão recente, o STJ decidiu que o valor da causa nas ações rescisórias deve ser
o mesmo valor atribuído para a ação principal (originária), devidamente atualizado monetariamente. Exceção: é
possível quem mesmo o autor tendo indicado o mesmo valor da ação principal, a parte ré impugne o valor da causa
demonstrando que o benefício econômico pretendido na rescisória está em descompasso com essa fixação (ex:
provando que houve uma excepcional valorização do bem pretendido na ação rescisória). O impugnante deverá
demonstrar, com precisão, o valor correto que entende devido para a ação rescisória, instruindo a inicial da
impugnação com os documentos necessários à comprovação do alegado (PET 9.892/SP, Min. Luis Felipe Salomão, 2ª
Seção, 11.02.2015, Info 556).

Cabe ao autor realizar um depósito no valor de 5% do valor da causa, valor esse que se converterá em multa e será
revertido à parte contrária na hipótese de decisão unânime de inadmissão da ação rescisória ou de improcedência do
pedido (art. 968, II). Como o dispositivo legal aponta para a exigência de decisão unânime, entende-se que, sendo a
decisão monocrática proferida pelo relator, não caberá aplicação da multa ao autor com a perda do valor depositado,
o mesmo ocorrendo na hipótese de decisão colegiada se ao menos um juiz decidir em favor do autor da ação
rescisória. Compreende-se que nesses casos – em especial no segundo – não é adequado se presumir que houve um
abuso no manejo da ação rescisória, o que isentará o autor do pagamento da multa.

O CPC cria um valor máximo de 1.000 salários-mínimos para a caução prévia (art. 968, §2º).

É dispensada do recolhimento prévio a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios, as suas respectivas
autarquias e fundações de direito público, o Ministério Público, a Defensoria Pública e os que tenham obtido o
benefício de gratuidade da justiça (art. 966, §1º).

Na ação rescisória existem ao menos duas peças do processo originário que necessariamente deverão instruir a
petição inicial por meio de cópias. São considerados documentos indispensáveis à propositura da ação rescisória: a)
cópia da decisão que se busca rescindir, até mesmo porque sem essa peça não seria possível ao tribunal analisar a
causa de rescindibilidade; b) cópia da certidão do trânsito em julgado, para que o tribunal possa verificar que o
momento é adequado para a propositura da ação rescisória, tanto no tocante ao termo inicial como ao termo final.

10.1. Reações do juiz diante da petição inicial

O indeferimento ocorre nas hipóteses do art. 330 e quando não for realizado o depósito prévio previsto em lei (art.
968, §3º). De acordo com Daniel Assumpção, a previsão é excessivamente formalista, devendo ser determinada a
emenda da petição inicial, e não o seu indeferimento. O indeferimento pode ocorrer por decisão monocrática do
relator, em aplicação subsidiária do art. 932, III, IV, e V, hipótese em que caberá ao autor recorrer por agravo interno
no prazo de 15 dias. Sendo a decisão colegiada, caberá, no máximo, RE ou REsp. Aplica-se à ação rescisória o
julgamento liminar de improcedência (art. 968, §4º). De acordo com o STJ, nas ações rescisórias julgadas pelo TJ/TRF,
não existe mais a figura do revisor, tendo sido extinto pelo NCPC. No entanto, nas ações rescisórias julgadas pelo STJ,

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existe sim o revisor, mesmo após o advento do NCPC, pois o art. 40, I, Lei 8.038/90 continua em vigor (AR 5.241/DF,
Min. Mauro Campbell Marques, 05.04.2017, Info 603).

10.2. Resposta do réu

O prazo de resposta será determinado pelo juiz no caso concreto entre 15 e 30 dias (art. 970). Aplica-se o prazo em
dobro para a Fazenda Pública (art. 180), assim como para litisconsortes com advogados de escritórios distintos (art.
229). Não é cabível, em contestação, a alegação de incompetência relativa, considerando-se que qualquer vício de
competência será de incompetência absoluta. Nessa contestação será admissível a reconvenção, desde que respeite o
prazo decadencial de 2 anos e que o réu realize o depósito de 5% do valor da causa.

Para a doutrina e jurisprudência, não há a presunção de veracidade dos fatos alegados pelo autor decorrente da
revelia, tendo em vista a especialidade do procedimental da ação rescisória (Barbosa Moreira, Luiz Fux, HTJ).

10.3. Atividade Saneadora

Após o prazo de resposta, com ou sem contestação, observar-se-á o procedimento comum, ou seja, providências
preliminares e julgamento conforme o estado do processo (art. 970). A audiência de conciliação e mediação não tem
incidência na ação rescisória, considerando-se que a desconstituição de decisão de mérito transitada em julgado não
pode ser objeto de transação. Diferente ocorre com a audiência de saneamento prevista no art. 357, §3º, NCPC, que
poderá ocorrer normalmente. Também não se admite a presunção de veracidade dos fatos gerada pela revelia do réu,
o que afasta a possibilidade de julgamento antecipado do mérito com fundamento no art. 355, II. Nem mesmo todas
as extinções previstas nos arts. 485 e 487 são admissíveis na ação rescisória, sendo incabível a extinção em razão de
convenção de arbitragem (as partes não podem optar por desconstituir a coisa julgada material por arbitragem) e por
reconhecimento jurídico do pedido (a disposição do direito nesse caso é ineficaz).

10.4. Fase probatória

Tanto o pedido rescisório quanto o pedido rescindendo podem no caso concreto exigir a produção probatória, que
ocorre de uma só vez. Tratando-se de prova documental, devem ser juntadas na petição e contestação. Em se
tratando de prova oral e/ou pericial, admite-se a delegação da função probatória para o juízo de primeiro grau.
Havendo a necessidade de produção de prova, o relator delegará a função probatória do tribunal para o órgão que
proferiu a decisão rescindenda, que deverá produzir a prova 6. Salvo no caso de prova documental, havendo a
necessidade de colher depoimento pessoal, oitiva de testemunha ou realização de prova pericial, será expedida carta
de ordem para o juízo de primeiro grau, com prazo de 1 a 3 meses para cumprimento, a ser fixado pelo relator no caso
concreto. Apesar de a delegação ser uma mera faculdade do relator, admitindo-se que a prova seja produzida no
próprio tribunal, é mais comum a atuação do juízo de primeiro grau.

10.5. Manifestações finais

Encerrada a instrução probatória, será aberta vista para apresentação de razões finais escritas no prazo de 10 dias. A
ordem é: autor, réu e MP, que sempre participará da ação rescisória como fiscal da ordem jurídica. Após as
manifestações finais ocorre o julgamento da ação rescisória, cujo procedimento verifica-se nos termos dos regimentos
internos dos tribunais superiores e das normas de organização judiciária estaduais e dos regimentos internos dos
tribunais de segundo grau.

10.6. Julgamento

Cabe ao tribunal, em primeiro lugar, a análise da admissibilidade da ação rescisória, o que passa necessariamente pelo
enfrentamento dos pressupostos processuais e das condições da ação. Importante também a análise da causa de
rescindibilidade, realizada à luz da causa de pedir alegada pelo autor. Caso a irresignação do autor da ação rescisória

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Para Daniel Assumpção, não é prudente aplicar a legal no caso de ação rescisória com fundamento no art. 966, I, porque nesse caso o alegado crime praticado pelo
juízo que proferiu a decisão rescindenda o coloca em situação desaconselhável a produzir a prova. Assim, melhor que seja respeitado o foro, mas não o juízo. Por outro
lado, devendo a prova ser produzida em foro distinto daquele em que tramitou o processo cuja decisão de mérito transitada em julgado busca-se rescindir não haverá
necessidade de a carta de ordem ser dirigida ao juízo de origem.

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não esteja fundada nas causas de rescindibilidade previstas no art. 966, não se admite a ação rescisória, com extinção
terminativa. Superada a admissibilidade, passa-se ao julgamento de mérito da ação.

Primero pedido analisado é o de rescisão da decisão impugnada (juízo rescindendo) e somente no caso de
acolhimento desse pedido passará ao julgamento do pedido de novo julgamento (juízo rescisório). Verificada a efetiva
ocorrência da causa de rescindibilidade, o pedido será julgado procedente, estando o tribunal adstrito à causa
indicada pelo autor em sua petição inicial, de forma que, mesmo entendendo pela existência de outra causa de
rescindibilidade, ausente aquela indicada pelo autor na petição, o pedido de rescisão deverá ser rejeitado. Eventuais
equívocos na indicação do inciso do art. 966 são irrelevantes, aplicando o princípio iuria novit curiae.

Rejeitado o pedido de rescisão, o pedido de novo julgamento perderá o objeto (prejudicado), nem ao menos
chegando a ser enfrentado. Acolhido o pedido de rescisão, cuja decisão terá natureza constitutiva negativa com
efeitos ex nunc, o tribunal poderá:

a) encerrar o julgamento quando a decisão do pedido rescindendo esgotar a atividade jurisdicional necessária
ao tribunal, o que se verifica na ação rescisória fundada em ofensa à coisa julgada (art. 966, IV);

b) determinar a remessa para outro órgão em razão da incompetência absoluta do tribunal que julgou a ação
rescisória;

c) realizar um novo julgamento (juízo rescisório), no qual poderá acolher ou rejeitar o pedido formulado pelo
autor no processo originário: havendo rejeição, o capítulo da decisão terá natureza declaratória negativa;
sendo acolhido, terá a natureza do pedido feito no processo originário, podendo ser meramente declaratório,
constitutivo ou condenatório.

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