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Tontura e vertigem
Adelson Guaraci Jantsch
Lucas Vega M. V. Ferreira
Guilherme Vazquez Izolani
Aspectos-chave
► Tontura é um sintoma comum e inespecífico que congrega quatro
padrões sindrômicos distintos: vertigem, pré-síncope, desequilíbrio e
hiperventilação.
► O tipo mais frequente de vertigem é a paroxística posicional benigna
(VPPB), que deve ser tratada com a manobra de Epley.
► Quadros de pré-síncope devem ser investigados cuidadosamente, e
um exame clínico cardiológico deve ser realizado no consultório.
► Tontura é uma queixa muito suscetível à polifarmácia e, por sua vez, a
consequências desagradáveis relacionadas a ela, como
parkinsonismo induzido por medicações quando se prescrevem
antivertiginosos.
► Exames de imagem de crânio não serão muito úteis durante a
investigação, caso não haja nenhum sinal ou sintoma neurológico.
Exames laboratoriais geralmente são desnecessários.
► A diferenciação entre os três padrões sindrômicos não é simples de
ser feita, sendo necessário encontrar pistas durante a investigação,
como, por exemplo, fatores desencadeantes e o tempo de duração
do sintoma.
Caso clínico
Fátima está com tontura há 3 dias e veio consultar com seu médico
de família por este motivo. Ela refere sensação de tontura
acompanhada de mal-estar agudo, como se “de repente, parece que
tudo sai do lugar”, com alívio completo em poucos segundos. Está
preocupada com a possibilidade de ser algo grave, afinal está com
50 anos e os primeiros sinais da menopausa já estão aparecendo.
Mostra-se preocupada com a sensação de que seu corpo está
“envelhecendo”. Quando você pergunta qual é a preocupação dela
com relação à tontura, ela responde: “Estou preocupada com a
velhice, doutor. Não quero ficar que nem a minha mãe, que tem uma
tontura que não passa nunca e que só alivia com aquele remédio
para tontura que ela toma faz anos. Tudo bem que ela já tem 75
anos, mas fica se escorando nas paredes dentro de casa e não
consegue mais caminhar direito. Andar na rua, nem pensar! Pensei
em tomar o remédio que ela usa, mas fiquei com medo e resolvi
consultar. Doutor, preciso de um remédio, se não vou acabar como
a minha mãe e isso eu não quero de jeito nenhum”.
Do que se trata
Sintoma muito comum na população geral, a queixa de tontura pode ocorrer em
23% das pessoas ao longo da vida,1 sendo que, a cada ano, 7% das pessoas
apresentarão algum episódio de tontura, com uma prevalência que aumenta
diretamente em função da idade.2 Como vários problemas de saúde podem ser
descritos pelo paciente como tontura, ou “tonteira”, os primeiros passos da
consulta devem ser bem cuidadosos para se encontrar em qual padrão clínico se
encaixa essa tontura.
Tradicionalmente, as tonturas são divididas em quatro padrões distintos:
vertigem, síncope/pré-síncope, desequilíbrio e hiperventilação.
Como a descrição do sintoma geralmente é muito vaga, a investigação do
problema inicia-se no seu reconhecimento, muitas vezes relatado pela pessoa
como “tontura”, “tonteira”, “zonzeira”, “sensação de que vou cair”, ou até
mesmo “um mal-estar”. Dentro do modelo explanatório biomédico, o termo
“Tontura” conforma um quadro sindrômico dentro do qual alguns padrões
distintos podem ser bem delimitados.
Vertigem
Por ser um sintoma cuja causa está relacionada ao sistema nervoso central
(SNC), é comum que pacientes e médicos fiquem preocupados com a
possibilidade de causas graves. A grande maioria dos casos é de etiologia
benigna e autolimitada, não necessitando de grandes investigações.
Vestibulopatias de origem central são muito menos comuns do que as
periféricas e geralmente se apresentam com outros sintomas neurológicos
associados. Além disso, apresentam sintomas com uma duração maior durante a
crise. Apesar de toda a dificuldade que estudos epidemiológicos apresentam para
aferir precisamente a incidência de cada tipo de vertigem, há um consenso entre
os estudos de que as três causas mais comuns de vertigem são a VPPB (42%), a
neurite vestibular (40%) e a doença de Ménière (10%), que, juntas, são
responsáveis por mais de 90% das causas de vertigem.4
Neurite vestibular
Menos frequente do que a VPPB, a neurite vestibular é o segundo tipo mais
frequente de vertigem, sendo responsável por 3 a 9% dos casos de tontura
persistente. Não se sabe qual é a causa da neurite vestibular, mas
fisiopatologicamente se trata de uma inflamação do nervo vestibular que não
apresenta perda auditiva. Casos em que tanto o nervo vestibular quanto o
labirinto estejam comprometidos podem cursar com comprometimento da
audição e zumbidos, sendo definidos como labirintite. Algumas teorias falam em
possível reativação do vírus herpes simples tipo 1 (HSV-1), de infecções virais,
da oclusão vascular ou de mecanismos autoimunes.5 Trata-se de um quadro de
vertigem espontânea e prolongada, podendo durar algumas semanas, na qual as
crises são intensas e duradouras, diferente dos poucos segundos observados na
VPPB. As crises de vertigem e seus sintomas associados costumam ser mais
pronunciados na primeira semana da doença, ocorrendo resolução completa do
quadro dentro do prazo de 6 semanas. Deve-se suspeitar de neurite vestibular em
pacientes que apresentem vertigem associada a desequilíbrio com tendência de
queda sempre para o mesmo lado (lado acometido), nistagmo horizonto-torsional
espontâneo e sem comprometimento auditivo.6 Geralmente, são casos em que o
paciente se encontrará doente, com muitos sintomas autonômicos associados,
como náuseas, vômitos, mal-estar e sudorese.
Síndrome de Ménière
É uma condição rara com crises espontâneas e recorrentes de vertigem e perda
auditiva (em geral, frequências baixas), sensação de plenitude na orelha
acometida e zumbido, sintomas que não necessariamente estão presentes ao
mesmo tempo no paciente. Tanto as causas quanto a fisiopatologia da doença são
incertas, o que dificulta o tratamento. Apesar de ser uma condição rara e por se
tratar de uma vertigem recorrente, estima-se que uma equipe de saúde da família
com 4.000 pacientes possa ter entre quatro e oito pacientes com esta doença. As
crises costumam ser fortes e com duração de 20 minutos. Em longo prazo, os
pacientes costumam ter alívio das crises agudas de vertigem, persistindo com a
perda auditiva e com uma sensação vaga de desequilíbrio.7
Para obter o diagnóstico, é necessário que o paciente apresente crises de
vertigem com duração ao redor de 20 minutos, perda auditiva de baixa
frequência, flutuação dos sintomas de aura (plenitude, perda auditiva, zumbido)
e exclusão das principais causas de vertigem (VPPB e neurite vestibular).
Contudo, por ser uma doença incomum e com quadro bastante indefinido, a
avaliação do otorrinolaringologista pode ser útil para elucidar sua causa.8
Cinetose
É uma vertigem benigna, com história bem delimitada pela exposição ao fator
desencadeante, que é a hiperestimulação do sistema vestibular, ocasionada, em
geral, por movimentação em viagens de carro, avião ou barco. É um problema
comumente autodiagnosticado pelo paciente e que deve ser reconhecido pelo
médico de família, para, primeiramente, excluir outras possíveis causas do
problema e orientar o paciente quanto aos cuidados em situações futuras.
Vestibulopatias centrais
● Enxaqueca – (migrânea vestibular): uma porção considerável de pacientes
com migrânea e aura (~30%) experimentam sintomas de vertigem durante
as crises. Tais sintomas podem tanto aparecer na fase da aura quanto
persistir durante a fase da cefaleia, concomitantemente. As crises de
vertigem variam de minutos a horas e, em geral, se associam a outros
sintomas prodrômicos (foto e fonofobia). Quando o problema se encontra
ainda na fase diagnóstica, deve-se afastar a possibilidade de vertigens com
duração prolongada, como neurite vestibular ou síndrome de Ménière.
● Insuficiência vertebrobasilar: condição que leva a um quadro de vertigem
de padrão central e é uma das causas mais lembradas por médicos como
causa de vertigem. Contudo, é um problema raro e relacionado de forma
direta à doença aterosclerótica. Costuma ser mais comum em homens
idosos, porém a sua prevalência estimada é de 1 caso para cada 100.000
habitantes. O papel do médico de família é muito importante na
identificação desses casos. A apresentação clínica mais comum dos
pacientes com insuficiência vertebrobasilar é diminuição do nível de
consciência, hemiparesia ou quadriplegia assimétrica e sintomas
pseudobulbares, como disartria, disfagia e disfonia. Vertigem estará
presente apenas nos casos em que a oclusão aconteça no segmento
proximal da artéria. Pacientes com insuficiência vertebrobasilar levantarão
a suspeita de acidente vascular cerebral (AVC) ou ataque isquêmico
transitório (AIT) e, com vertigem ou não, deverão ser prontamente
reconhecidos e referenciados ao serviço de referência, a fim de se tentar
trombólise para desobstruir a artéria comprometida.
Pré-síncope
Esta parte do capítulo não tem o objetivo de orientar o médico de família no
manejo das síncopes, mas pretende ajudá-lo no raciocínio diagnóstico,
lembrando dos principais aspectos que não devem ser esquecidos durante a
investigação (ver Cap. 101, Síncope e desmaio).
Síncope é definida como a perda abrupta, completa e temporária da
consciência, associada à impossibilidade de manter o tônus postural (queda),
com remissão rápida e espontânea. Não deve ter sintomas clínicos associados
com outras causas de perda da consciência, como convulsão e trauma
craniencefálico (TCE). Pré-síncope, também chamada lipotímia, refere-se aos
sintomas que precedem a síncope, como sensação de cabeça vazia, desequilíbrio
e alterações visuais (visão tunelizada, visão escurecendo) e variáveis graus de
alteração de consciência, porém sem a sua completa perda. Síncopes, assim
como tonturas no geral, são problemas que geram preocupação quanto a causas
graves e a risco de morte.
A síncope vasovagal é a mais comum de todas e geralmente relacionada,
mesmo pelo paciente, a fatores estressores desencadeantes, como calor
excessivo, dor e momentos de ansiedade (p. ex., ao realizar um procedimento
médico). Em casos em que a história não esteja tão clara, pode ser o principal
diagnóstico de exclusão, após investigadas outras causas de síncope.
A hipotensão ortostática é também uma causa comum e está relacionada à
queda brusca da pressão arterial (PA) ao levantar da posição deitada ou sentada e
pode ser causada por uma combinação de fatores, como idade avançada, calor
excessivo, desidratação, neuropatia autonômica, períodos prolongados deitado e
medicamentos diversos (Quadro 225.1).
Padrão Critério
Causa sindrômico Fisiopatologia diagnóstico
Desequilíbrio
Neuropatia Menor resposta Redução de
periférica tátil ao andar leva sensação nas
a pessoa a não extremidades
perceber quando
o pé toca o chão,
levando ao
desequilíbrio e a
quedas
Fonte: Adaptado de Post e Dickerson.9
O que fazer
O raciocínio clínico empregado na avaliação da queixa de tontura deve seguir
primeiramente um raciocínio fisiológico. Somado a isto, considerar quais as
causas mais comuns, qual o tempo de duração dos sintomas e quais fatores
desencadeantes das crises são informações fundamentais para a definição do
diagnóstico. O primeiro desafio é classificar o sintoma do paciente dentro de um
dos grupos sindrômicos já descritos, e, a partir daí, o raciocínio diagnóstico fica
mais claro, assim como a definição do tipo de exame físico. O segundo desafio é
identificar quais pessoas se apresentam com uma causa benigna de tontura e
quais têm sinais de alerta para condições mais graves.
Anamnese
É essencial detalhar junto ao paciente qual é o sintoma e os seus fatores
desencadeantes, sempre guiando sua anamnese em direção às hipóteses mais
prováveis:
Muitas vezes, uma anamnese simples e bem feita pode dispensar outros
recursos. Um estudo japonês encontrou que, em pacientes com vertigem, a
duração do quadro menor do que 15 segundos e a vertigem desencadeada por
mudança de decúbito lateral na cama eram fortes preditores de VPPB.14 Uma
pessoa com vertigem apresenta a probabilidade pré-teste de 40% para VPPB.
Caso este paciente apresente as duas características simultaneamente, a razão de
verossimilhança positiva destes dos sinais de 6,815,9–11 leva a uma probabilidade
pós-teste para VPPB para mais de 80%, valor suficiente para dispensar exames
confirmatórios e levar o paciente ao tratamento. Para aqueles casos de vertigem
que não preencham os dois critérios, deve-se então proceder à manobra de Dix-
Halpike.
Para os pacientes com tontura do padrão de desequilíbrio, um acrônimo
simples de ser lembrado – I HATE FALLING – é proposto por Barros15 para
orientar a investigação clínica, a fim de que ela seja focada nos fatores mais
comumente relacionados ao risco de quedas que são possíveis de serem
modificados. Os fatores citados e a letra correspondente do acrônimo são
descritos no Quadro 225.3.
Exame físico
O exame físico é valioso na avaliação da queixa de tontura. Deve-se fazer um
exame neurológico sumário, buscando déficits focais que indiquem
vestibulopatia central.
Nistagmo
Em pacientes que apresentem nistagmo ao exame, a direção do nistagmo pode
ajudar a compreender qual canal semicircular está acometido. Nistagmos
torsionais que apontam para cima são os mais comuns (85%), pois estão
relacionados ao canal semicircular posterior, sendo aqueles no sentido horário
provocados pelo canal esquerdo, e os anti-horários, pelo canal direito à
localização. Nistagmos horizontais e torsionais que apontam para baixo são
incomuns e correspondem ao acometimento dos nistagmos com o canal
semicircular anterior e semicircular horizontal, respectivamente (Quadro
225.4).16
HINTS
HINTS é um acrônimo que designa três manobras de exame físico (Head
Impulse, Nystagmus, Test of Skew/Teste de impulsão da cabeça, nistagmo e
desvio de skew). Essas três manobras simples podem ser usadas para diferenciar
uma vertigem periférica, em geral neurite vestibular, de uma causa central em
pessoa com vertigem. Em um estudo prospectivo,18 com 101 pacientes de alto
risco para AVC com sintomas de vertigem, os autores encontraram que a
presença de um teste de impulsão normal (indicando sistema periférico íntegro),
nistagmo que mudava de direção ou o desvio de skew teve sensibilidade de
100% e especificidade de 96% para AVC, sendo uma manobra mais sensível do
que a ressonância magnética (RM) precoce nesses casos. Por isso, um desses
exames alterados deve levar o médico a referenciar a pessoa ao pronto-socorro,
ao passo que uma manobra HINTS totalmente normal tranquiliza o médico.
Deve-se levar em conta a confiança e a habilidade do médico em realizar tais
exames. Diversos vídeos estão disponíveis no youtube ao se buscar HINTS +
Vertigo.
Dix-Hallpike
Tradicionalmente, a manobra de Dix-Hallpike tem sido empregada como exame
definitivo para a VPPB. Contudo, apenas 75% dos pacientes com VPPB terão o
exame resultando positivo. A manobra apresenta valor preditivo positivo (VPP)
de 83% e valor preditivo negativo (VPN) de 52 % para o diagnóstico de
VPPB.19
Dessa forma, a maioria dos casos de VPPB pode ser facilmente diagnosticada
a partir da anamnese, sem necessidade de confirmação por meio da manobra de
Dix-Hallpike. Para aqueles casos de vertigem que não preencham os dois
critérios anteriores, deve-se então proceder à manobra de Dix-Hallpike.
A manobra é simples de ser realizada em qualquer consultório, não exigindo
habilidade avançada. Os passos necessários para a sua correta realização são:
Apesar de ser uma manobra fácil de ser realizada, alguns equívocos comuns
acontecem, principalmente no posicionamento da cabeça do paciente. Tome
cuidado com pacientes idosos com limitação da coluna cervical. Com esses
pacientes, pode ser útil a presença de um auxiliar no consultório durante a
manobra, para garantir mais conforto ao paciente e mais precisão à manobra.
Outro equívoco é acreditar que é necessário que o paciente apresente nistagmo
para que a manobra seja positiva. Não há nenhuma necessidade de que isso
aconteça, e o desencadeamento de sintomas é o suficiente para tornar o teste
positivo.14
Avaliação de quedas e desequilíbrio
Avaliar o risco de quedas em idosos ainda é um desafio. Testes largamente
difundidos, como o Get Up-and-Go, apesar de serem de fácil realização dentro
do consultório, não conseguiram mostrar um poder de discriminação entre ter
ocorrido queda ou não, para justificar sua aplicação no consultório como exame
de rastreamento isolado.20 Apesar disso, seu uso pode ser indicado para
pacientes idosos com algum comprometimento de marcha e equilíbrio, uma vez
que o teste é mais sensível nessa população do que em populações sadias,21
Assim, a melhor avaliação possível que se pode ter atualmente para estimar o
risco de queda em pacientes idosos é a Avaliação Multifatorial para Risco de
Quedas.
Pré-síncope
Se a pessoa apresentar tontura de pré-síncope, deve-se focar o exame no sistema
cardiovascular, procurando dados que indiquem doença mais grave, como
valvopatias e insuficiência cardíaca (IC) descompensada. Também é necessário
aferir a PA e a frequência cardíaca (FC).
Hipotensão postural
Na suspeita clínica de hipotensão postural, deve-se fazer a prova da hipotensão
postural. Para esse exame, deve-se colocar o paciente em decúbito dorsal por
pelo menos 5 minutos, e aferir sua PA. Depois, o paciente deve ficar em pé por
três minutos, e sua PA deve novamente ser aferida. Caso aconteça: 1. queda da
PAS > 20 mmHg; 2. queda da PAD > 10 mmHg; ou PAS < 90 mmHg, o exame é
considerado positivo. Apesar da sua sensibilidade não ser muito boa, é um
exame bastante específico para confirmar hipotensão ortostática.22
Síndrome da hiperventilação
Uma prova diagnóstica bastante simples de ser realizada durante a consulta e que
não exige nenhum equipamento é testar a reprodução dos sintomas por meio da
respiração forçada. O examinador deve respirar profunda e rapidamente com a
pessoa, sem parar. Se o paciente começar a sentir os mesmos sintomas relatados,
o teste pode ser considerado positivo. Geralmente, os sintomas aparecem em
menos de 1 minuto e o retorno à respiração regular, ou realizar quatro a cinco
respirações completas em um saco plástico podem elevar a pCO2 aos valores
normais e resolver os sintomas. Em geral, situações de sofrimento psíquico e
transtornos mentais podem ser a origem da hiperventilação, o que faz com que
seu diagnóstico não seja a solução do problema, mas sim traga a necessidade de
se investigar mais profundamente o que está acontecendo com o paciente.
Exames complementares
Raramente, exames complementares serão necessários na avaliação da tontura.
Para alguns pacientes com síncope/pré-síncope, pode-se solicitar um
eletrocardiograma (ECG), ou, dependendo do risco do paciente, mais exames
complementares (ver Cap. 101, Síncope e desmaio). Exames laboratoriais são de
pouco valor. Exames de imagem só devem ser solicitados na suspeita de
vertigem de causa central, rara no contexto da atenção primária à saúde (APS). A
audiometria pode ser útil em pacientes com queixa de perda auditiva.
A Figura 225.1 apresenta um fluxograma acerca do paciente com tontura.
▲ Figura 225.1
Fluxograma de paciente com tontura.
VPPB, vertigem paroxística posicional benigna; DCV, doença cardiovascular; PA, pressão
arterial; TCE, traumatismo craniencefálico.
Fonte: Adaptada de Post e Dickerson.9
Conduta proposta
Caso você ainda tenha dúvidas sobre como realizar a manobra, vídeos
explicativos podem ser encontrados facilmente no youtube. Buscando tanto em
português (manobra de Epley) quanto em inglês (Epley maneuver), vários vídeos
explicativos e de boa qualidade estarão disponíveis.
Em uma revisão sistemática de 11 pequenos ensaios clínicos de baixa
qualidade, a manobra de Epley foi avaliada como a terapêutica mais efetiva para
o tratamento da VPPB, sem efeitos adversos ao pacientes, além do desconforto
no momento da sua realização.26 A proporção de pacientes que apresentam
alívio completo dos sintomas varia de 66 a 89%, sendo que alguns pacientes
podem ainda persistir com os sintomas por alguns dias. Além disso, é importante
lembrar-se de que, apesar da manobra ser efetiva, há uma taxa de recorrência da
doença da ordem de 36%. Se isso acontecer, você poderá realizar o mesmo
procedimento no paciente, sem nenhuma restrição.25 Algumas recomendações
costumam ser dadas aos pacientes, como evitar estender a cabeça (olhar para
cima) durante 3 dias, ou realizar movimentos bruscos, mas essas medidas
carecem de evidências. Alguns profissionais utilizam também a manobra de
Semont, por considerá-la uma alternativa mais simples do que a manobra de
Epley e com eficácia semelhante.27
Reabilitação vestibular
A reabilitação vestibular, envolvendo exercícios em grupo com dificuldade
gradualmente aumentada na forma de desafios de equilíbrio e de coordenação
motora, tem sido eficaz nos casos de neurite vestibular. Apesar de estudos não
diferenciarem os pacientes clinicamente – pacientes com VPPB, doença de
Ménière e neurite vestibular avaliados em conjunto –, há alívio da sensação de
tontura nesses pacientes.28
Orientações
Em casos de cinetose, podem ser orientadas medidas adaptativas, como a
diminuição do estímulo visual por meio da fixação da visão em um ponto imóvel
ou fechando os olhos, diminuindo, com isso, a quantidade de informações
conflitantes no SNC.
Apesar de não haver evidências de que dieta hipossódica seja benéfica para
pessoas com doença de Ménière, é comum que esta prescrição seja feita, assim
como os diuréticos, que também apresentam seus efeitos colaterais inerentes.
O diagnóstico de síndrome de hiperventilação traz a necessidade de se
investigar mais profundamente o que está acontecendo com o paciente. Nesse
momento, retomar perguntas abertas, explorar ideias e preocupações do paciente
e aspectos psicológicos, familiares e ocupacionais será o melhor caminho para
avaliá-lo.9
Tratamento farmacológico
Em momentos de crise, podem ser usados medicamentos sedativos, com o
intuito de aliviar os sintomas, porém alguns cuidados devem ser tomados.
Medicamentos para supressão dos vômitos e antivertiginosos, como
benzodiazepínicos, anticolinérgicos (escopolamina) e anti-histamínicos
(cinarizina, flunarizina, dimenidrinato e prometazina), não devem ser dados por
um período maior do que 3 dias, para evitar prejuízos à compensação central,
importante para a resolução do quadro. Dos medicamentos para alívio dos
sintomas, a ondansetrona, apesar de mais cara, mostrou-se superior à
metoclopramida quanto ao tempo de recuperação do paciente e quanto à duração
do tempo de internação.29
O uso de corticoide, via oral (VO), apresenta evidências inconsistentes e
baseadas em estudos de baixa qualidade de que tenha algum benefício para a
neurite vestibular. A revisão da Cochrane sobre o tema mostrou haver uma
vantagem discreta em favor dos corticoides durante o primeiro mês, mas com
efeito não sustentado em prazos maiores.30 Da mesma forma, antivirais, como
aciclovir e valaciclovir, tampouco se mostraram efetivos, seja isolados ou em
combinação com corticoides VO.31
Para cinetose, o dimenidrinato é uma opção segura e eficaz, inclusive para
crianças,32 bem como a clorfeniramina.33
A betaistina, na dose de 16 mg, em três doses diárias, consegue reduzir a
frequência e a severidade das crises de alguns pacientes com doença de Ménière,
sendo usada como profilaxia.7
O tratamento da migrânea vestibular procura seguir as recomendações para o
tratamento das migrâneas com aura clássica (Cap. 224, Cefaleia e enxaqueca).
Evitar o uso excessivo de antivertiginosos parece ser a melhor conduta.34
Orientações para pacientes com pré-síncope podem ser encontradas no Cap. 101,
Síncope e desmaio.
A revisão sistemática35 mais extensa sobre medidas preventivas para
minimizar quedas em idosos foi realizada em 2012 e revisada em 2015, somando
159 ensaios clínicos e 79.193 participantes, mostrando que a prática de
exercícios físicos com abordagem de múltiplos componentes (coordenação,
flexibilidade, equilíbrio, força, Tai Chi Chuan, entre outros) reduz de forma
significativa a taxa de quedas, o seu risco e as fraturas decorrentes de quedas em
idosos não hospitalizados, seja quando realizados em grupo ou em planos de
exercício domiciliar.
Também há fortes evidências de que intervenções para segurança do paciente
no domicílio são efetivas para a redução da ocorrência de quedas e do seu risco,
sendo essas intervenções aparentemente mais efetivas quando feitas com a
participação de um terapeuta ocupacional.35
É importante notar que tais mudanças na conformação e na mobília do
domicílio devem ser estimuladas não apenas para minimizar o risco de acidentes,
mas também para melhor adaptação do idoso à sua casa, como, por exemplo,
instalação de corrimão e barras de apoio, fixação de tapetes no chão ou sua
retirada, uso de cadeiras ou bancos dentro do chuveiro. Intervenções
multifatoriais e suspensão gradual de medicações psicotrópicas se mostraram
efetivas para redução da ocorrência de quedas.36 Não há evidências consistentes
de que a suplementação de vitamina D leve à redução da ocorrência ou do risco
de quedas.35
A polifarmácia é um capítulo importante no tratamento do paciente idoso. Um
ensaio clínico controlado prospectivo com perda significativa de seguimento
realizado com médicos da APS na Austrália avaliou o efeito de um programa de
prescrição racional de medicamentos em idosos sobre a qualidade de vida e
quedas. Dos 659 pacientes que concluíram o estudo, aqueles que tiveram
redução da prescrição de anti-inflamatórios não esteroides (AINEs), de
diuréticos e de benzodiazepínicos tiveram menor taxa de quedas (OR = 0,61, IC
95% 0,41-0,91), menos lesões decorrentes de queda (OR = 0,56; IC 95% 0,32-
0,96) e menos lesões graves que requeriam intervenção médica (OR = 0,46; IC
95% 0,30-0,60) do que aqueles no grupo-controle após 12 meses de
acompanhamento.37
Intervenções sobre déficit visual, principalmente catarata, são ainda pouco
estudadas (Tabela 225.1). Em um ensaio clínico britânico38 voltado para a
análise de custo-efetividade, pesquisou-se o efeito da cirurgia para correção de
catarata sobre o risco de queda em 306 participantes. O estudo apontou que a
correção cirúrgica de catarata realizada em ambos os olhos entre o período de 4
semanas reduziu mais o risco de queda do que a cirurgia em apenas um olho,
com intervalo maior do que 1 ano para a segunda cirurgia. Contudo, em outro
estudo,39 o risco de queda foi reduzido após a primeira cirurgia, mas não após a
segunda.
Redução do risco
Redução da taxa de de quedas
Intervenção quedas (IC 95%) (IC 95%)
► Anti-histamínicos ► Anticolinérgico
● Cinarizina ● Hioscina (escopolamina)
● Flunarizina ► Bloqueador de canal de cálcio
● Prometazina ● Nimodipina
● Meclizina ► Benzodiazepínicos
● Dimenidrinato ● Diazepam
► Antidopaminérgicos ● Clonazepam
● Metoclorpramida ● Lorazepam
● Clorpromazina
Dicas
Quando referenciar
A decisão de referenciar ou não dependerá da confiança do médico de família e
comunidade com as causas de tontura. Como visto, a maior parte do processo
diagnóstico e início do tratamento pode ser realizado no contexto da APS. Em
geral, pacientes com tontura e perda auditiva devem ser referenciados ao
otorrinolaringologista para avaliação e iniciar tratamento para doença de
Ménière, por ser a doença mais incomum, com quadro, às vezes, sem uma
definição clara.
Na suspeita de causa central de tontura, como AVC, deve-se referenciar o
paciente ao serviço de emergência.43