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Serviço de Obstetrícia

Departamento de Obstetrícia, Ginecologia e Medicina da Reprodução


Centro Hospitalar Lisboa Norte – Hospital de Santa Maria
(protocolo elaborado por Sara Rodrigues Pereira, Susana Santo – Março 2018)

LACERAÇÕES PERINEAIS

INTRODUÇÃO
As lacerações perineais pós-parto vaginal são classificadas em 4 graus:
Grau I - laceração da mucosa vaginal e/ou da pele do períneo
Grau II - laceração que envolve os músculos perineais mas não o esfíncter anal
Grau III - laceração do esfíncter anal
IIIa - rotura < 50% do esfíncter anal externo
IIIb - rotura > 50% do esfíncter anal externo
IIIc - lesão do esfíncter anal externo e interno
Grau IV - laceração de grau III associada a lesão da mucosa anal
As lacerações perineais de grau III e IV têm uma incidência em Portugal de 0,6% e podem associar-se à ocorrência de
incontinência para fezes e gases, fístula recto-vaginal, dor perineal e disfunção sexual. São fatores de risco para a
ocorrência deste tipo de lacerações: nuliparidade, raça asiática, parto instrumental, variedades posteriores,
episiotomia mediana, antecedentes de laceração grau III/IV, macrossomia e analgesia locorregional.
A avaliação sistemática da integridade do esfíncter anal faz parte dos cuidados de rotina após o parto (ver protocolo
específico). Perante a suspeita de laceração do esfíncter anal, deve ser realizada uma observação cuidadosa, na
presença de um especialista, com iluminação adequada, após limpeza e desinfeção com iodopovidona, sob analgesia
apropriada, a fim de classificar o tipo de laceração existente. Deve identificar-se o vértice da laceração e verificar a
integridade dos dois esfíncteres anais. O esfíncter anal interno (músculo liso) tem coloração rosa claro; o esfíncter
anal externo (músculo estriado) é vermelho escuro e geralmente encontra-se em contração tónica, pelo que os topos
estão retraídos podendo ser mais difícil a sua identificação.

REPARAÇÃO DE LACERAÇÕES
 Grau I: Suturar apenas se houver hemorragia ativa ou desalinhamento do tecido com repercussões na anatomia
vaginal/ pele. Utilizar poliglactina (Vicryl rapid®) 2/0 em pontos separados ou sutura contínua.
 Grau II: Sutura contínua da mucosa vaginal com poliglactina (Vicryl rapid®) 2/0, iniciando-se 1 cm atrás do vértice
e terminando a nível da fúrcula. Sutura dos planos musculares com pontos separados ou sutura contínua com
poliglactina (Vicryl rapid®) 0 ou 2/0, evitando tração excessiva. Sutura intradérmica da pele ou com pontos
separados com poliglactina (Vicryl rapid®) 2/0. Se a laceração estiver na proximidade ou envolver o meato uretral, a
puérpera deve ser algaliada durante 24h a fim de evitar uma possível retenção urinária aguda devida ao edema.
Grau III: Administrar Cefoxitina 1g EV dose única. Se alergia à penicilina - clindamicina 900mg EV dose única.
Solicitar caixa de sutura de lacerações perineais de grau III/IV. Colocar o retrator de Weislander. Reparar
separadamente as lesões dos esfíncteres anais interno e externo, após identificação dos topos com pinças de Allis:
Esfíncter anal interno: sutura topo a topo, com pontos em U, utilizando polidioxanona (PDS®) ou poliglactina
(Vicryl®) 2/0 ou 3/0.
Esfíncter anal externo: sutura com sobreposição de bordos, com pontos em U, geralmente num total de 4
pontos, utilizando polidioxanona (PDS®) ou poliglactina (Vicryl®) 2/0 ou 3/0 (Figura). Em alternativa, sutura
topo a topo com pontos em U. As lacerações parciais do esfíncter anal externo devem ser corrigidas com suturas
topo a topo e não com sobreposição de topos, para não criar maior tensão no segmento suturado.
Cortar os fios curtos para evitar que os mesmos entrem em contacto com a pele. Proceder ao toque rectal para
confirmar se a laceração ficou corretamente suturada.

Sutura do esfíncter anal externo com sobreposição de topos


Grau IV: Sutura contínua da submucosa com poliglactina (Vicryl®) 3/0 ou 4/0
(Figura). Proceder como especificado anteriormente na reparação de lacerações de
grau III.

CUIDADOS NO PUERPÉRIO NAS LACERAÇÕES DE GRAU III e IV (para além dos cuidados de rotina)
 Dieta rica em fibras
 Gelo local durante 10-15 min, 6 aplicações/dia durante 48 horas e depois em SOS.
 Paracetamol 1000 mg PO de 8/8h, alternando com Ibuprofeno 400 mg PO de 8/8h.
 Lactulose 3 saquetas PO/dia, 30 min antes do pequeno-almoço, almoço e jantar, até as fezes ficarem moles, depois
passar a 1-2 saquetas PO/dia.
 Alta quando estiver assintomática, com trânsito intestinal restabelecido e fezes moles. Manter Lactulose 1-2
saquetas PO/dia, 30 min antes das refeições, durante 15 dias. Orientação para consulta de Uroginecologia 3 meses
após o parto.

Bibliografia:
1. ACOG. (2016). Practice Bulletin No. 165: Prevention and management of obstetric lacerations at vaginal delivery
2. RCOG (2015). Guidelines No. 29: The management of third and fourth-degree perineal tears.
3. Buppasiri P1, Lumbiganon P, Thinkhamrop J, Thinkhamrop B. (2014). Antibiotic prophylaxis for third- and fourth-degree perineal tear during
vaginal birth. Cochrane Database Syst Rev. (10):CD005125.
4. SOGC clinical practice guideline. (2015). Obstetrical Anal Sphincter Injuries (OASIS): Prevention, Recognition, and Repair.
5. Ayres-de-Campos, D, Cruz J, Medeiros-Borges C, Costa-Santos C, Vicente L. Lowered national cesarean section rates after a concerted action. Acta
Obstet Gynecol Scand 2015;94:391-8.

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