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Uma parcela significativa dos professores assume em sua prática pedagógica prescrições do
senso comum que foram cooptadas na sua própria passagem pela escola ou até mesmo
adquiridas pelos colegas de trabalho mais velhos; contudo, essas práticas têm pressupostos
teóricos implícitos. Por outro lado, há profissionais de educação dedicados a um trabalho
docente coerente, profissionais capazes de perceber em sua prática pedagógica o sentido mais
amplo, além de elucidar suas convicções. Há aqueles também que aderem em sua prática à
última tendência de ensino sem maiores reflexões, se essa tal prática trará as respostas que de
fato procuram (LIBÂNEO, 1992). Essas formas de proceder estão intrinsecamente presentes
nas práticas educativas dos profissionais de Geografia como nas demais áreas.
Face a essas constatações iniciais, que elucidam a interface presente e por vezes necessária da
Educação com o campo da Geografia, buscaremos aqui tecer algumas reflexões acerca das
tendências de ensino.
As tendências pedagógicas liberais surgiram por volta do século XIX, sob o pressuposto de
que a escola como instituição de ensino deve ser incumbida de preparar os indivíduos para a
sua alocação na sociedade, cumprindo papéis sociais preestabelecidos. Para tanto, as pessoas
deveriam aprender e adaptar-se aos valores e normas definidos na sociedade de classes, que
seria decorrente do desenvolvimento cultural particular. Dessa forma, tal pedagogia apareceu
como justificativa para a manutenção da sociedade capitalista, por defender a predominância
da liberdade dos interesses particulares na sociedade. Categoricamente, integram-se no grupo
das ditas tendências liberais a tendência “tradicional”, a “renovada progressista”, a “renovada
não diretiva” e a “tecnicista” (LIBÂNEO, 2014, p.23).
As tendências liberais não têm relação alguma com espaço aberto e democrático. O liberal é
dizente da lógica liberalista, instigada pela atual sociedade capitalista, que sustenta a ideia da
formação de indivíduos para atender os anseios dessa sociedade com uma visão restrita sobre
as diferenças de classe, sobre o espaço geográfico do qual fazem parte.
A tendência liberal tradicional, também conhecida como “conservadora”, tem uma pedagogia
centralizada no ensino autoritário na relação professor-aluno. O professor aparece como
detentor do conhecimento e o discente como uma mera “tábula rasa”. Além disso, o discente é
educado para atingir sua plena realização pelo seu próprio mérito. Nessa tendência, tanto os
conteúdos trabalhados em sala de aula quanto os procedimentos didácticos e a relação
professor-aluno não se assemelham em nada com o espaço de vivência do estudante,
tampouco com a realidade social vigente. A tendência liberal tradicional, “acentua o ensino
humanístico, de cultura geral, no qual o aluno é educado para atingir, pelo próprio esforço,
sua plena realização como pessoa.” (LIBÂNEO, 2014, p. 22).
A tendência liberal renovada apresenta, entre nós, em duas versões: a renovada progressivista
e a renovada não-diretiva. Para Libâneo, a tendência liberal renovada concebe “a
educação como um processo interno, não externo; ela parte da necessidades e interesses
individuais necessários para a adaptação ao meio.” (2014, p.23). A renovada não-direta está
“orientada para os objetivos de autorrealização e para as relações interpessoais.”
(LIBÂNEO, 2014, p.23).
A tendência liberal renovada progressista dá ênfase, de igual modo, ao sentido da cultura com
o desenvolvimento das aptidões particulares dos indivíduos, embora pareça mais significante
para o ensino da Geografia dedicar-se a transformar a escola em agente activo, a favor da
adaptação de si para as necessidades do meio do qual faz parte. Essa tendência propõe um
ensino pautado na auto-educação, isto é, o estudante como sujeito do próprio conhecimento, a
experiência directa com o meio pela actividade, em que ele é estimulado a solucionar
situações-problema por meio de atitudes concretas.
A tendência liberal tecnicista, como o próprio nome já explicita, subordina a educação e, por
sua vez, o modo de ensinar Geografia, à sociedade, pelo fato de sua pedagogia estar voltada à
preparação de “recursos humanos”, ou seja, mão de obra. Tal tendência é voltada às demandas
da sociedade industrial e tecnológica. No contexto das práticas pedagógicas em Geografia, tal
modo de ensinar foi centralizado em transmitir comportamentos éticos, práticas sociais e
habilidades consideradas básicas para a manutenção dessa sociedade. A Geografia novamente
aparece como disciplina decorativa, observando o mesmo desinteresse por parte dos discentes
que havia na Pedagogia tradicional, uma vez que os alunos não fariam nenhum proveito dela
no seu dia a dia. De fato, o que se observa nessa tendência é um refinamento de toda a
Pedagogia tradicional, metodologia que passou a ser rompida somente por volta do final da
década de 1970 e começo da de 1980.
Essa tendência, como pressupõe SAVIANI (2012, p. 89), “corrente pedagógica”, possui
conteúdos culturais universais que são encadeados pela própria humanidade face à realidade
social vigente. O estudante passa a ser visto como um agente activo na discussão e o
professor, um elo com o saber sistematizado.
O professor expõe todo o conteúdo, cabendo aos alunos escutá-lo passivamente. Estes
realizam exercícios de repetição e memorização daquilo que foi transmitido. O silêncio e
a atenção são requisitos para o professor transmitir os conteúdos (LIBÂNEO, 2014).
Portanto, a geografia, [...] no percurso formativo da Educação Básica, pode contribuir para
que o desenvolvimento das noções de orientação com a alfabetização cartográfica, de
observação, descrição, análise, interpretação e representação espacial se desenvolvam nas
crianças, jovens, adultos e idosos para a compreensão das dinâmicas físico-naturais e
humanosociais e suas inter-relações. (PCSC, 2014, p.144)
Considerações finais
Diante do exposto, compreende-se que as tendências elencadas distintas formas em que é
compreendido o processo de ensino-aprendizagem – são as norteadoras das práticas
pedagógicas. Com base na acepção da própria finalidade do ensino de Geografia, acredita-se
que ela deve ser voltada para a formação do pensamento crítico transformador do sujeito-
estudante. Com isso, ainda que se admitam algumas críticas, as pedagogias da
problematização mostram-se mais satisfatórias à prática educativa em Geografia.
VESENTINI, J. W. Para uma geografia crítica na escola. 3ª ed. São Paulo: Ática, 2008.
Publicado em 13 de Abril de 2023