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EM3 – Hematologia Linfomas

Linfomas
Os linfomas são tumores do sistema imune → tumores de linfócitos (monoclonalidade).

Podem apresentar-se como linfomas ou como leucemias, dependendo da clínica:

• Apresentação linfomatosa → clínica de infiltração e massas ganglionares.

• Apresentação leucémica → há infiltração medular e do sangue periférico; ex:


Leucemia Linfática Crónica ou Leucemia Linfoblástica Aguda.

São tumores relativamente frequentes


(em Portugal estão em 6o ou 7o), mais
frequentes no mundo ocidental.
Constituem 4% de todas as neoplasias
e são, sem dúvida, os mais frequentes
dentro das neoplasias hematológicas.
Desde os anos 70 até ao início de 2000
houve um aumento da incidência dos
linfomas não-Hodgkin, enquanto que a
dos linfomas Hodgkin se manteve
constante. A partir de 2000 atingiu-se
um plateau na curva.

No geral é uma doença mais frequente


no sexo masculino, embora alguns
subtipos prevaleçam na mulher.

A incidência aumenta com a idade; algumas formas, mais raras, aparecem


predominantemente nas crianças – o linfoma de Burkitt é mais frequente na criança, e
algumas formas de linfomas anaplásicos.

Causas

Na maioria dos casos a causa é


desconhecida.

Os agentes infeciosos têm um papel


importante:
• O vírus Epstein-Barr está
ligado ao linfoma de Burkitt
(sobretudo formas endémicas)
e a 40% dos linfomas Hodgkin,
alguns linfomas T.
• O linfoma MALT gástrico é
causado pela Helicobacter
pylori na maioria dos casos.
• O vírus HTLV está associado a linfomas de células T do adulto.

Exposição a toxinas, quimioterapia e radioterapia: por vezes encontram-se linfomas


não-Hodgkin diagnosticados como tumores secundários ao tratamento de linfomas
Hodgkin prévios.

T12 30/11/2022
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Imunodeficiências: > predisposição por exemplo, os doentes HIV têm uma maior
incidência de linfomas.

Os doentes com doenças auto-imunes como Lúpus, Artrite Reumatóide ou Síndrome


de Sjogren têm uma incidência de linfomas maior do que na população geral.
Existem clusters de linfomas familiares: famílias com vários membros com linfomas,
não necessariamente o mesmo tipo de linfoma. Esta incidência familiar é mais óbvia
nalguns tipos como a Leucemia Linfática Crónica.

Classificação

Os linfomas são classificados pela OMS (a


versão mais recente é de 2022). São
entidades muito heterogéneas – podemos
encontrar 80-100 subunidades diferentes.

Os critérios utilizados são os morfológicos


(citologia das células tumorais e arquitetura
do gânglio), os clínicos (comportamento
mais agressivo ou indolente), os
fenotípicos (linfomas B, T, NK; marcadores
de imaturidade ou células maduras), e os
genéticos/moleculares.

Existem dois grandes grupos de linfomas,


diferenciados pelos anatomopatologistas:

• Hodgkin (mais raros – cerca de 13%)

• Não Hodgkin (cerca de 87%) – mais


heterogéneos

Alguns linfomas são muito frequentes:

• Linfoma B difuso de grandes células


(azul) – constitui 30 a 40% dos
linfomas não Hodgkin; forma mais
frequente de linfoma agressivo
• Linfoma folicular (vermelho) – >
comum dos indolentes -> 20 a 25%.
• Leucemia Linfática Crónica – 16%

Alguns linfomas raros: linfoma de Burkitt, linfomas


T (constituem cerca de 5 a 7%, portanto, muito
mais raros que os linfomas B), linfoma do manto
(linfoma agressivo).

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Para perceber a classificação dos linfomas, é necessário saber qual é o padrão normal
dos linfócitos.

Os linfócitos B e T nascem na medula


óssea e amadurecem na medula
óssea, no caso dos B, e no timo, no
caso dos T. Passam por uma série de
alterações morfológicas, fenotípicas e
genéticas. Os linfócitos B rearranjam o
seu recetor de superfície – a
imunoglobulina de superfície – e os
linfócitos T rearranjam o recetor das
células T, e só saem destes órgãos
quando já têm estes recetores
expressos nas suas superfícies.
Vamos ter então células B e T maduras
mas naïve (ainda não foram expostas a
um antigénio).

Um evento oncogénico que atue nas


fases imaturas/mais precoces da
diferenciação vai originar um linfoma
de células imaturas – linfoma
linfoblástico (em Hematologia, “blástico” quer dizer, habitualmente, imaturo).

Um linfócito B maduro, após sair da medula óssea, vai completar a sua maturação e ser
exposto ao antigénio dentro dos órgãos linfoides secundários. Quando entra no gânglio
linfático, passa na zona do manto antes de entrar no centro germinativo do folículo
linfoide, e depois acaba por sair dando origem a linfócitos B memória e plasmócitos
(fase terminal da diferenciação).

Aquilo em que a OMS baseia a sua classificação é no facto de, quando um evento
oncogénico ocorre numa determinada fase da diferenciação, o linfoma vai manter
algumas características fenotípicas e genéticas da célula normal que estava nessa fase
de diferenciação. Exemplos:

• Se o evento oncogénico ocorrer quando o linfócito está na zona do manto,


temos um linfoma de células do manto.
• A maioria dos linfomas não Hodking B tem origem no centro germinativo –
ex. dos linfomas foliculares, linfomas B difusos de grandes células, linfoma
de Burkitt, linfoma de Hodgkin.
• Quando os linfócitos saem do centro germinativo e passam pela zona
marginal do gânglio, pode-se originar um linfoma da zona marginal.
• Na fase de transição para o plasmócito, temos o linfoma linfoplastocítico.

NOTA: Quando temos um plasmócito, uma célula completamente diferenciada e


produtora de imunoglobulinas, já não classificamos como um linfoma – o tumor dos
plasmócitos é o mieloma múltiplo.

A classificação dos linfomas T é diferente porque sabemos menos sobre a sua


diferenciação e porque são mais raros. Classificam-se sobretudo pela forma clínica
que predomina na sua apresentação: nodais ou ganglionares (mais frequentes), extra-
nodais, cutâneos ou leucémicos.

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Importância da classificação:
Olhando para a evolução clínica
dos diferentes subtipos de linfoma,
vemos que, por ex. ter um linfoma
Hodgkin de predomínio linfocitário
nodular significa uma esperança
média de vida igual à da população
em geral; no linfoma de células do
manto, ao fim de 2-3 anos cerca de
50% dos doentes morreram.
Portanto, do ponto de vista do
prognóstico e da informação que
damos ao doente, esta
subclassificação é muito
importante.

Apresentação clínica

Como os linfócitos residem


habitualmente nos gânglios
linfáticos, o mais habitual é a
presença de adenopatias -
localizadas vs generalizadas;
superficiais vs profundas
(estas podem provocar
massas mediastínicas com
sintomatologia torácica,
massas retroperitoneais que
podem comprimir os ureteres,
por ex.).

Alguns linfomas (20-30%) têm uma forma de apresentação inicial extra-ganglionar: mais
comum nos da pele e gástricos. Podem existir linfomas extra-nodais em qualquer
localização – exemplo do SNC no slide, mas a referir também do testículo, do ovário,
do intestino, etc.

Sintomas sistémicos/sintomas B: febre (vespertina normalmente); sudação noturna


(importante, muito abundante); perda de peso (10% nos últimos 6 meses).

Nestas circunstâncias está-se a investigar um quadro de sintomas constitucionais, e


normalmente pede-se uma TC para verificar a existência de adenopatias ou lesões de
órgão, que nos dirigem a marcha diagnóstica conforme o que encontrarmos.

Diagnóstico

O diagnóstico dos linfomas é sempre feito por biópsia. Na maior parte dos casos é a
biópsia ganglionar.

A citologia aspirativa (+ esfregaço e corante) pode ajudar a diferenciar se estamos na


presença de um linfoma ou outra doença, por ex. uma metástase. É utilizada em
situações de urgência, como uma massa a comprimir a via aérea, ou num “linfoma de
sexta à tarde” (quando precisamos de saber rapidamente se temos um linfoma que
precisa de iniciar rapidamente terapêutica, e não há tempo para esperar pela biópsia).

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A citologia dá-nos uma ideia mas


não nos permite ver a morfologia
do gânglio ou a distribuição das
células e classificar o linfoma.

Na biópsia podemos fazer não


só a análise morfológica como
também a análise do fenótipo
(imunohistoquímica ou
citometria de fluxo); a análise
citogenética funcional é pouco
frequente; a hibridação
fluorescente in situ (FISH) usa-
se muitas vezes; as análises
moleculares usam-se por vezes.

Estadiamento

Só depois de termos um diagnóstico por biópsia é que estadiamos a doença –


determinar a extensão da doença.

O sistema de estadiamento utilizado é o de Ann Arbor/Lugano. Neste usa-se o número


de regiões ganglionares envolvidas e a sua localização, estadio:

• 1: 1 região ganglionar
envolvida ou 1 região
extra-nodal;

• 2: várias regiões
ganglionares envolvidas;
pode haver uma região
extra-nodal, desde que
envolvida por
contiguidade; todas
estão do mesmo lado do
diafragma;

• 3: regiões envolvidas
acima e abaixo do
diafragma;

• 4: disseminação hematogénea e atingimento de órgãos que não são linfáticos,


por ex. medula óssea, pulmão, SNC.

Cada um destes estádios subclassificam-se em:

• A: se não tiver sintomas B.

• B: se tiver sintomas B (febre, sudação noturna, perda de peso).

Os procedimentos do estadiamento incluem (a negrito estão os obrigatórios):

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• História clínica e exame objetivo: atenção à orofaringe (o anel de Waldeyer


é constituído por tecido linfoide), fígado, baço, cadeias ganglionares.

• Exames laboratoriais – bioquímicos e hemograma, incluindo LDH, ácido úrico,


beta2 microglobulina.

• Serologias virais

• Exames de imagem para determinar quais as regiões ganglionares


envolvidas: utiliza-se a TC e nos linfomas que fixam a 18F-FDG usa-se também
a PET.

• Biópsia osteomedular: órgão extra-linfático mais frequentemente envolvido


por via hematogénea.

As restantes investigações são dirigidas de acordo com a sintomatologia que o doente


possa apresentar.

Linfoma Não-Hodgkin (LNH) B Difuso Grandes Células

Linfoma frequente
(30-40% dos LNH) e
heterogéneo do ponto
de vista morfológico
(imagem de uma
biópsia ganglionar,
onde se vê uma
distribuição difusa de
linfócitos B grandes),
clínico e biológico.

Em relação à sua
heterogeneidade
clínica, esta refere-se
à presença ou
ausência de alguns

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fatores de prognóstico, que no seu conjunto constituem o Índice Internacional de


Prognóstico (IPI): idade, LDH sérica, performance status, estadio e número de locais
extra-ganglionares envolvidos. De acordo com o número de fatores de mau prognóstico
vamos ter valores de probabilidade de sobrevivência que podem ser de 90% ou de 40-
50%. Apesar disto, cerca de 2/3 destes doentes são curados com o tratamento
convencional.

Caso clínico: Senhora de 57


anos, com sintomatologia
relativamente recente de
cansaço, anorexia, perda de
peso. Notou “altos” na região do
pescoço, axilas e região
inguinal. Ao exame objetivo
apresentava esplenomegália;
nos exames laboratoriais tinha
uma discreta anemia, uma LDH
elevada (existe no citoplasma de
muitos tipos de células, incluindo
os linfócitos, que quando
proliferam rapidamente são
destruídos e libertam esta
enzima para a circulação), beta2
microglobulina elevada (proteína
de superfície em todas as
células nucleadas), ácido úrico elevado (sinal de síntese e destruição de ácidos
nucleicos rápida, e que pode ter consequências na função renal) e creatinina elevada.

Uma destas adenopatias é biopsada e mostra um LNH B Difuso de Grandes Células.


No estadiamento (este linfoma capta na PET) temos fixação em todas as cadeias
ganglionares possíveis – incluindo as cervicais, axilares, mediastínicas,
intraabdominais, inguinais – e temos também fixação no osso. Isto corresponde a um
estadio IV. O performance status era 1 e apresentava apenas 1 localização extra-nodal
envolvida (medula óssea). Isto tudo dá um IPI de 2 – doença de risco intermédio.

Terapêutica: quimioterapia
associada a imunoterapia. A
imunoterapia nos linfomas B é, em
muitos casos, o anticorpo anti-CD20
(CD20 está na superfície destes
linfócitos). Como se vê no gráfico,
demonstrou-se que juntar o anticorpo
anti-CD20 à quimioterapia era muito
vantajoso para a sobrevivência
destes doentes. Contudo, 30-40%
dos doentes morrem nos primeiros 2
anos de doença - são doentes
tipicamente com fatores clínicos de
pior prognóstico, mas sobretudo a
biologia destes casos é diferente.

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Os primeiros dados sobre


a heterogeneidade
biológica desta doença
datam de à cerca de 20
anos - aquilo que se fez foi
extrair o DNA das células
tumorais, convertê-lo em
RNA, hibridá-lo com o
DNA normal, e ver quais
são os genes que são mais
expressos do que os
normais (a vermelho) ou
menos expressos do que
os normais (a verde). O
padrão de hibridação do
subgrupo do centro
germinativo (GC) é
semelhante ao dos
linfócitos normais do
centro germinativo; o
padrão de hibridação do subtipo ABC (subtipo ativado) é semelhante aos linfócitos B
ativados in vitro; o 3o subtipo não é classificado.

Esta subdivisão é importante porque:

1. O prognóstico destes dois subtipos, quando tratados da mesma maneira, é diferente:


o subtipo do centro germinativo tem melhor prognóstico, com 70-80% de
probabilidade de bom controlo da doença, do que o subtipo ABC.
2. Biologicamente, estes 2 subtipos têm origem em células que são muito ligeiramente
diferentes ao longo do processo de diferenciação normal dos linfócitos – o tipo GC
tem origem num linfócito um bocadinho antes da diferenciação terminal, enquanto
que o tipo ABC está mais próximo desta diferenciação terminal.
3. As vias oncogénicas do tipo GC e do tipo ABC são diferentes, e são estas vias que
determinam o comportamento do tumor. O tipo ABC tem uma ativação constitutiva
da via do NF-kB, e frequentemente mutações em elementos génicos de transdução
de sinal que controlam esta via e em elementos que controlam a via da ativação do
recetor de superfície dos linfócitos B (Ig de superfície). Fizeram-se vários ensaios
que testaram fármacos específicos que inibem estas vias em conjunto com a
imunoquimioterapia
convencional. No entanto, a
maioria destes ensaios não
demonstraram melhoria de
prognóstico com esta
terapêutica. (Contudo, nos
últimos dois anos, uma análise
genómica detalhada mostrou
que ainda era possível definir
ainda mais subtipos de LNH B
Difuso de Grandes Células –
eventualmente, poderá ser
possível utilizar fármacos
específicos contra as
alterações identificadas
nestes subtipos)

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Linfoma de Burkitt
Constitui apenas 1% de todos os casos de linfoma do adulto, mas 30% dos das
crianças. Existem 3 formas: 1. Linfoma de Burkitt endémico (em África); 2. Linfoma de
Burkitt esporádico; 3. Linfoma de Burkitt associado à imunossupressão por HIV. Todas
estas formas têm uma associação etiológica com o vírus Epstein-Barr.

Caso clínico: Mulher 34 anos, notou uma massa mamária direita que cresceu
rapidamente; queixava-se de cansaço e cefaleias. Quando foi observada tinha
também uma adenopatia cervical a uma adenopatia axilar contralateral. A avaliação
laboratorial mostrava uma anemia; uma leucocitose, com predomínio de células que a
máquina não é capaz de reconhecer (LUC – Large Undefined Cells), que requerem
um exame morfológico do esfregaço; uma ligeira trombocitopenia. Neste caso havia
também uma disfunção renal com uma hiperuricémia, e uma elevação muito marcada
da LDH – estes dois aspetos são típicos do linfoma de Burkitt.

De todas as neoplasias conhecidas (não só as hematológicas), o linfoma de Burkitt é a


que mais rapidamente prolifera – duplica a sua massa tumoral em cerca de 24h. Estes
doentes constituem, portanto, uma urgência em termos diagnósticos e terapêuticos.
Este é um exemplo de linfoma em que a citologia aspirativa pode ajudar num
diagnóstico urgente.

Quanto a doente do caso chegou, fez-se uma biópsia de um gânglio, uma citologia da
massa mamária e um esfregaço do sangue periférico.

Na biópsia do gânglio, vemos o designado “padrão em céu estrelado” – os pontos


brancos que se assemelham a estrelas correspondem a macrófagos, cujo citoplasma
é mais claro, e que existem em abundância infiltrados no meio dos linfócitos. Numa
maior ampliação, vemos linfócitos de tamanho intermédio e homogéneo, têm apenas
um nucléolo, bastante basófilos. No esfregaço do SP vê-se, no citoplasma dos
linfócitos, vacúolos – isto é uma morfologia muito sugestiva de Burkitt. Outros exames
que ajudam no diagnóstico são:

• Citometria de fluxo: esta senhora tinha uma leucocitose com linfócitos de


tumor, que marcam CD19, são monoclonais (marcam apenas com um tipo de

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cadeias de superfície, as k), marcam com CD10 (marcador frequente em


Burkitt).

• Na biópsia, através de um marcador de superfície da membrana nuclear, que


é o Ki67, vemos que todas as células marcam este marcador – todas as
células estão em proliferação ativa. Um Ki67 de 100% num linfoma, como
neste caso, sugere muito um linfoma de Burkitt.

• Para tirar as dúvidas e confirmar o diagnóstico, o exame final é a


demonstração da alteração citogenética típica desta doença – uma
translocação entre o cromossoma 8 (onde está o gene Myc) para o
cromossoma 14, que leva a que o gene Myc fique constitutivamente ativo, o
que contribui para a taxa de proliferação desta doença.

De referir, por fim, que o linfoma de Burkitt é um linfoma altamente curável.

Linfoma do Manto
É um linfoma francamente mais raro do que o LNH B Difuso de Grandes Células –
cerca de 5-6% dos linfomas. Aparecem habitualmente em homens, por volta dos 70
anos, e em geral em estadios avançados ou muito avançados – estadio IV, muitas
vezes com infiltração extra-nodal (tubo digestivo, anel de Waldeyer também é
frequente). A sobrevivência mediana, apesar de ser melhor hoje, não ultrapassa os 5-
7 anos.

O que caracteriza geneticamente esta doença é a presença de uma translocação


entre o cromossoma 11 e o cromossoma 14 (O cromossoma 14 está muito ligado aos linfomas,
porque é neste cromossoma que está codificada a cadeia pesada das imunoglobulinas). No
cromossoma 11 temos o gene da ciclina D1, uma das proteínas que regula a transição
das células ao longo das várias fases do ciclo celular – um aumento de expressão da
ciclina D1 significa um aumento da taxa de proliferação. O linfoma do Manto é
caracterizado também por múltiplas alterações genéticas adicionais, nomeadamente
nos mecanismos de reparação do DNA. Portanto, é um linfoma com uma grande

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instabilidade genética, onde a taxa de proliferação tem um forte impacto no


prognóstico. Ao contrário dos dois últimos linfomas (LNH B Difuso GC e Burkitt), este é
um linfoma agressivo que nós não sabemos curar – sabemos apenas tratar e
prolongar a sobrevivência dos doentes.

Linfomas indolentes – Linfoma Folicular


Deste grupo, o Linfoma Folicular é o mais frequente. De uma maneira geral, são
linfomas que aparecem em fases mais avançadas da vida, com uma apresentação
ganglionar (90% dos doentes têm adenopatias) e em estadios avançados (só 10-20%
dos casos são estádios I ou II).

Hoje em dia, os doentes com Linfoma Folicular vivem 10-15-20 anos (com a doença, e
morrem da doença). Têm uma evolução recidivante, com remissões e recidivas –
quando os doentes têm sintomas, é possível tratar/controlar a doença e fazer
desaparecer os gânglios, mas a célula-mãe fica lá, dando origem a recidivas. Esta
doença, apesar de indolente, é incurável, tal como são muitos outros Linfomas
indolentes. Apesar de tudo, a evolução clínica dos outros linfomas deste grupo, como
os Linfomas da zona marginal associado às mucosas, é mais favorável que a do LF.

O Linfoma Folicular é constituído por centrócitos e centroblastos que se dispõem de


forma nodular (daí o nome) e tem alguns marcadores fenotípicos característicos.
Infiltram a medula óssea em mais de metade dos doentes, o que é detetável na
biópsia osteo-medular. Em 85% dos casos, caracterizam-se pela presença da
translocação entre o cromossoma 14 e o cromossoma 18 (gene anti-apoptótico BCL2
– aumento da sua expressão leva a inibição da morte celular programada).

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Tratamento:

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• Localizados (I ou II): Radioterapia – há autores que defendem que a RT nos


estádios muito localizados pode ser curativa; alguns estudos têm sugerido associar a
RT a imunoquimioterapia para prolongar a sobrevivência.

• Avançados: estes linfomas não são curáveis, logo, nunca se demonstrou que tratá-
los mais cedo traz qualquer vantagem para a sobrevivência; assim, estes doentes, se
não tiverem sintomas, podem ser mantidos em vigilância inicialmente. Se tiverem
sintomas, têm que ser tratados – Imunoquimioterapia (QT + anti-CD20), ou então
apenas o anti-CD20 nalguns casos de menor massa tumoral. Em casos que recaem
precocemente, sobretudo em doentes jovens, podemos consolidar a segunda resposta
com um transplante autólogo – mesmo isto só cura cerca de 40-50% dos doentes.

Leucemia Linfática Crónica


É um linfoma indolente. Aparece habitualmente em homens em fases mais avançadas
da vida e é mais frequente na raça caucasiana. Manifesta-se ou apenas por alterações
do hemograma (leucocitose e linfocitose, acompanhados ou não de anemia e
trombocitopénia) ou, em estádios mais avançados, por adenopatias ou
organomegálias (esplenomegália ou hepatomegália). Associa-se por vezes a doenças
auto-imunes, como a anemia hemolítica. No esfregaço do SP encontramos
frequentemente um aumento da contagem dos linfócitos cuja morfologia é normal, que
podemos caracterizar por citometria de fluxo – os marcadores típicos da LLC são
detetáveis, como o CD5, CD23, permitem fazer o diagnóstico.

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Alguns fatores prognósticos importantes incluem a idade, o sexo masculino, a Beta2-


microglobulina, mas os fatores mais importantes são os genéticos. Os doentes com as
cadeias pesadas de imunoglobulina não hipermutada têm uma pior evolução clínica, e
aqueles que têm uma mutação da p53 (deleção no cromossoma 17) têm também um
pior prognóstico. Isto é importante na escolha do tratamento.

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Como é um linfoma indolente, só se trata quando a doença é sintomática, e a


estratégia depende da idade, das comorbilidades. Podemos tratar inicialmente com
imunoquimioterapia, mas hoje em dia cada vez mais se usam agentes alternativos à
quimioterapia se a doença for de alto risco genético e em quase todas as recaídas.
Estes agentes inibem a sinalização do recetor dos linfócitos B ou inibem o BCL2
(Venetoclax).

Linfoma MALT
É um linfoma do tecido linfoide associado às mucosas, mais frequentemente gástrico.
Manifesta-se por queixas como azia, dispepsia, enfartamento. Numa endoscopia são
encontradas alterações cuja biópsia mostra as típicas lesões linfoepiteliais, e o
anatomopatologista consegue também encontrar, se estiver presente, o Helicobacter
pylori. É um exemplo de um linfoma que se pode tratar com antibióticos quando está
limitado à mucosa do estômago – erradicando o Hp, conseguimos curar a doença; isto
deixa de ser verdade se o linfoma atingir toda a parede do estômago, gânglios ou
tecido à distância.

Outras localizações relativamente frequentes incluem os anexos oculares, as


glândulas salivares, a glândula tiroideia. Podem ser estimulados por estímulos
inflamatórios ou por outro tipo de infeções (embora exista uma relação menos clara do que

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com o Hp). Caracterizam-se por alterações citogenéticas variadas. (que não é preciso saber)

Linfoma Hodgkin
Tem um pico de incidência entre os 15-30 anos. A incidência das últimas décadas é
relativamente estável.

Tem origem nos linfócitos B do centro germinativo.

Apresentam-se muitas vezes em idades jovens com queixas sistémicas (sintomas B),
relativamente recentes, e muitas vezes com apresentações supra-diafragmáticas, com
adenopatias cervicais e massas mediastínicas (ver Raio-X e TC). As adenopatias
constituem a forma clínica de apresentação em 90% dos casos. Pode originar
síndrome da veia cava superior. Nas mulheres é típico haver cansaço, com diminuição
da tolerância ao esforço. Sintomas B e prurido, também. Um sintoma característico
também é dor nas adenopatias quando bebem álcool.

O diagnóstico é feito por biópsia excisional, em que se pode ver um gânglio com
espessamento da cápsula e com septos que apontam para dentro – forma de
esclerose nodular do LH.

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O padrão analítico caracteriza-se por anemia tipo anemia da doença crónica, por
vezes discretas leucocitoses com neutrofilias e eosinofilias, trombocitose, aumento da
VS, PCR.

O diagnóstico é histológico, com identificação das células de Reed- Sternberg, que o


anatomopatologista reconhece com facilidade e marcam com CD30 e frequentemente
com CD15.

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Tratamos estes doentes, dependendo do estadio:

• Com quimioterapia e radioterapia, nos estadios precoces, sem fatores de mau


prognóstico

• Se tiverem fatores de mau prognóstico designam-se estádios intermédios, e tratam-


se com um pouco mais de ciclos de QT e um pouco mais de dose de RT.

• Os estádios avançados (III e IV) ou alguns estádios II com muitos fatores de mau
prognóstico tratam-se com uma QT mais agressiva.

Porque é que nos estadios avançados prescindimos da RT? Porque a doença já está
avançada, não vale a pena. O Prognóstico já não vai alterar.

O tratamento cura 80-90% dos doentes com LH. Desta forma, neste momento são
mais preocupantes as segundas neoplasias, as doenças cardiovasculares, o
hipotiroidismo, e outras toxicidades a longo prazo, que se procura evitar ajustando a
terapêutica aos fatores de prognóstico e à rapidez de resposta (faz-se uma PET ao fim

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de 2 ciclos de tratamento, para saber se precisamos de continuar a tratar


agressivamente ou se podemos diminuir a intensidade terapêutica).

A referir dois novos agentes que estão a ser usados:

• O anticorpo anti-CD30 ligado a um citostático – monometil auristatina – usado quer


em monoterapia ou associado a QT, e em terapêutica de recidivas, com excelentes
resultados;
• Os anticorpos anti-PD1, que vão quebrar a inibição que as células do LH induzem
nas células T do microambiente, através da ligação do PD1 (células T) com o seu
ligando (células do linfoma), ativando os linfócitos T e permitindo a sua ação destrutiva
das células do linfoma. Isto permite obter, em monoterapia, taxas de resposta
elevadas mas não completas, e pode ser associado com QT (ainda não em 1alinha)
nas recidivas.

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Concluindo:

•Os linfomas são tumores muito heterogéneos.


• Classificam-se por critérios morfológicos, fenotípicos, genéticos e clínicos.
• O diagnóstico é histológico.
• Têm um sistema de estadiamento próprio.
• Cada entidade tem os seus próprios fatores de prognóstico.
• São altamente tratáveis e alguns linfomas agressivos são curáveis.
• Os objetivos do tratamento variam - com os linfomas indolentes, não temos como
objetivo a cura porque não é possível.

• Existem múltiplas terapêuticas dirigidas a vias patogénicas específicas em


desenvolvimento.

T12 30/11/2022

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