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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2023.0000488537

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1009948-27.2021.8.26.0320, da Comarca de Limeira, em que são apelantes LUCAS
KOJI TAMURA (MENOR(ES) REPRESENTADO(S)), RENATA APARECIDA
ABREU NEVES TAMURA (REPRESENTANDO MENOR(ES)), LAURA ABREU
TAMURA e SIMONE TAMURA SANTOS, é apelada MARISA ANTUNES
LINCOLN DE GODOY MORONI.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 7ª Câmara de Direito


Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram
provimento ao recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra
este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores PASTORELO


KFOURI (Presidente sem voto), LIA PORTO E JOSÉ RUBENS QUEIROZ
GOMES.

São Paulo, 15 de junho de 2023.

FERNANDO REVERENDO VIDAL AKAOUI


Relator(a)
Assinatura Eletrônica
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Apelação Cível nº 1009948-27.2021.8.26.0320


Relator: FERNANDO REVERENDO VIDAL AKAOUI
Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado
Comarca: Limeira / 3ª Vara Cível
Juiz(a): Graziela da Silva Nery Rocha
Apelante(s): Lucas Koji Tamura (menor impúbere), Renata Aparecida Abreu
Neves Tamura, Laura Abreu Tamura e Simone Tamura Santos
Apelado(s): Marisa Antunes Lincoln de Godoy Moroni

Voto nº 1536

APELAÇÃO CÍVEL Embargos de terceiro


Penhora sobre imóvel registrado em nome da esposa do
executado, para saldar dívida oriunda de pessoa jurídica
do qual é sócio Casamento sob o regime de separação
de bens mediante escritura pública de pacto antenupcial
e registrada na matrícula do imóvel Propriedade
exclusiva da embargante, adquirida com recursos
próprios Incomunicabilidade de bens Penhora que
deve ser levantada Sentença mantida RECURSO
DESPROVIDO.

Vistos.

Trata-se de recurso de apelação interposto contra a sentença


proferida às p. 101/105, nos autos da ação de embargos de terceiro, proposta por
MARISA ANTUNES LINCOLN DE GODOY MORONI em face de LUCAS
KOJI TAMURA (menor impúbere), RENATA APARECIDA ABREU NEVES
TAMURA, LAURA ABREU TAMURA e SIMONE TAMURA SANTOS, que
julgou o pedido procedente para determinar o levantamento da penhora sobre o
imóvel descrito na petição inicial.

Recorrem os embargados (p. 101/105 e 106/110). Em preliminar,


argumentam que a ação não deveria ter prosseguido, porque ausente pagamento das
custas iniciais, pois o deferimento da gratuidade de justiça dependia de comprovação.
Também argumentam cerceamento de defesa, pois os pedidos foram julgados
antecipadamente, sem a oitiva de prova oral “frente ao que se disse na defesa

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aduzindo situação documental que visa fraudar credores, como é o caso em apreço”.
No mérito, argumenta que ficou comprovado nos autos que a embargante-apelada
não tinha capacidade financeira de pagar as parcelas do financiamento do imóvel,
assim como que o casal (embargante e esposo-executado) laborava em conjunto
como sócios informais na empresa condenada na ação principal.

Recurso tempestivo, sem preparo em razão da gratuidade de justiça.


Contrarrazões às p. 118/121.

Parecer da d. Procuradoria de Justiça Bandeirante às p. 131/135,


opinando pelo desprovimento do recurso.

É o relatório.

O recurso não comporta provimento.

Esclareço que os embargados interpuseram duas apelações em


conjunto (p. 101/105 e 106/110), todavia, a segunda, protocolada a tempo, teve
finalidade apenas de corrigir erro material referente à indicação do número do
processo.

No mais, a sentença merece ser mantida por seus próprios


fundamentos, nos termos do art. 252 do Regimento Interno deste E. Tribunal de
Justiça, o qual permite que “Nos recursos em geral, o relator poderá limitar-se a
ratificar os fundamentos da decisão recorrida, quando, suficientemente motivada,
houver de mantê-la, apreciando, se houver, os demais argumentos recursais capazes
de, em tese, infirmar a conclusão adotada no julgamento”.

A medida possui aceitação pacífica pelo C. Superior Tribunal de


Justiça, que assenta a “viabilidade de o órgão julgador adotar ou ratificar o juízo de
valor firmado na sentença, inclusive transcrevendo-a no acórdão, sem que tal
medida encerre omissão ou ausência de fundamentação no decisum” (REsp n.º
662.272/RS, 2ª T., Rel. Min. João Otávio Noronha, j. 04.09.2007; REsp n.º
491.963/ES, 2ª T., Rel. Min. Castro Meira, j. 21.11.2005 entre vários outros).

Não prospera a alegação de indeferimento da petição inicial por não


recolhimento das custas iniciais. A embargante foi agraciada com os benefícios da

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gratuidade de justiça por decisão de p. 58, sendo a decisão mantida na sentença


prolatada, após o contraditório.

Os documentos que visaram demonstrar a hipossuficiência


econômica da embargante estão anexados às p. 11/14. Não fosse o bastante,
“presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por
pessoa natural”, devendo o juiz indeferir a benesse apenas quando “houver nos
autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão”
(art. 99, §§ 2º e 3º, do CPC).

Também não há se falar em cerceamento de defesa pela não oitiva


de testemunha e depoimento pessoal da parte contrária. Nos termos do art. 370 do
Código de Processo Civil, “caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte,
determinar as provas necessárias ao julgamento do mérito”.

No mesmo sentido o Colendo Superior Tribunal de Justiça prevê


que “cabe ao juiz decidir sobre os elementos necessários à formação de seu
entendimento, pois, como destinatário da prova, é livre para determinar as provas
necessárias ou indeferir as inúteis ou protelatórias, motivadamente” (AgInt no
AREsp n. 2.287.668/SP, relator Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, julgado
em 22/5/2023, DJe de 25/5/2023).

O art. 443, incs. I e II, do Código de Processo Civil dispõem que “o


juiz indeferirá a inquirição de testemunhas sobre fatos (...) já provados por
documento ou confissão da parte” ou “que só por documento ou por exame pericial
puderem ser provados”.

A controvérsia cinge sobre a penhora que recaiu na propriedade


imóvel da embargante, casada com o executado da ação principal desde junho de
2010 sob o regime de separação de bens (p. 15), mediante de pacto antenupcial (p.
16/18). Esse fato está devidamente destacado no R.03 da matrícula do imóvel (p.
46/47), tendo, portanto, eficácia erga omnes (art. 1.657, CC).

O contrato de financiamento imobiliário foi realizado com a Caixa


Econômica Federal em 26 de setembro de 2014 (p. 19/45), enquanto os fatos que
ensejaram a ação principal nº 1012565-33.2016.8.26.0320 ocorreram apenas em 14
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de julho de 2016.

O item “B.1” do contrato de financiamento demonstra que o imóvel


penhorado foi adquirido exclusivamente pela apelada e com recursos próprios do
FGTS. Por seu turno, vislumbra-se no item “A” que a renda do financiamento era
composta exclusivamente pela apelada, que à época comprovou auferir renda mensal
de R$ 1.802,02, suficiente para quitar a parcela inicial de R$ 410,54 (vide item C.9
do contrato), atualmente em torno de R$ 370,00 (p. 49). O comprovante de
pagamento à p. 50 demonstra que a parcela do financiamento é suportada pela
apelada, não havendo razões para interpretar de modo diverso.

Como se vê, no caso específico destes autos, os fatos e direitos


somente pode ser analisados mediante prova documental, inclusive sobre a pessoa
que recai o pagamento das parcelas do financiamento ou seja, se há ou não
contribuição do esposo , razão pela qual é desnecessária a oitiva de prova
testemunhal e até mesmo depoimento pessoal da embargante.

No mérito, melhor sorte não atende aos apelantes.

A dívida oriunda de pessoa jurídica do qual o esposo da apelada


seja sócio, com extensão da responsabilidade indenizatória para este, não faz incidir a
responsabilidade solidária daquela, máxime porque não se trata de hipótese inserida
no art. 1.643 do Código Civil.

Sendo o regime de casamento o da separação absoluta de bens, o


imóvel adquirido exclusivamente por um dos cônjuges é considerado como
propriedade particular, portanto, incomunicável ao outro cônjuge. “Cada um é titular
de seu próprio patrimônio, quer tenha sido adquirido antes ou na constância do
casamento” (Manual de Direito das Famílias. Maria Berenice Dias. Editora
JusPodivm, 2022, p. 697).

A citada doutrinadora ainda leciona que “o patrimônio passado,


presente e futuro não se comunica, nem durante o casamento e tampouco quando de
sua dissolução. Cada um conserva, com exclusividade, o domínio, a posse e a
administração de seus próprios bens (CC 1.647). É de cada qual a responsabilidade
pelas dívidas anteriores e posteriores ao casamento” (idem, p. 727).
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Ainda que o esposo da apelada resida com ela no mesmo imóvel e


contribua com as despesas comuns do convívio familiar (alimentos, contas de luz e
água e etc), trata-se de obrigação imposta aos cônjuges pelo art. 1.688 do Código
Civil. Em outras palavras, a simples contribuição daquele com as despesas comuns
da família não o faz proprietário do imóvel adquirido pela apelante com recursos
próprios.

A penhora deve ser levantada, haja vista que a apelada não integra
o polo passivo da execução. No mesmo sentido:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDATO.


EMBARGOS DE TERCEIRO. PENHORA SOBRE
IMÓVEL DE PROPRIEDADE DA EX-ESPOSA DO
EXECUTADO. REGIME DE CASAMENTO.
SEPARAÇÃO TOTAL DE BENS. Interposição contra
decisão que indeferiu o pedido de suspensão da constrição
sobre imóvel indicado em execução movida contra o ex-
cônjuge da terceira embargante. Bem de titularidade
exclusiva da agravante. Elementos que evidenciam a
probabilidade do direito invocado pela demandante e a
verossimilhança das alegações. Preenchimento dos
pressupostos que autorizam o provimento antecipatório, nos
termos do artigo 300, do CPC. Decisão agravada reformada.
RECURSO PROVIDO (TJSP; AI
2155053-71.2022.8.26.0000; 27ª Câmara de Direito Privado.
Rel. Des. Alfredo Attié; j. em 27/07/2022).

Embargos de terceiro. Pedido de afastamento da penhora


realizada sobre 50% do imóvel de propriedade exclusiva da
esposa do devedor. Casamento sob o regime da separação
legal de bens. Declaração de que o imóvel em questão ostenta
a proteção concedida ao bem de família. Sentença.
Procedência. Apelação. Inaplicabilidade da súmula 377 do
STF. Presunção de que o imóvel foi adquirido pelo esforço
comum do casal que somente se aplica em relação aos
cônjuges em caso de eventual divórcio. Credor que tem o
ônus de comprovar que a aquisição do imóvel decorreu,
também, de recursos de seu devedor. Mera alegação
acerca de provável esforço comum que não é o suficiente
para permitir a constrição no bem imóvel em questão.
Bem de família que é matéria de ordem pública e, portanto,
não sujeita a preclusão. Inteligência do art. 5º, 'caput' da Lei
8.009/90. A impenhorabilidade atinge o imóvel utilizado para
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fim de moradia. Precedente do STJ. Sentença mantida.


Recurso desprovido (TJSP; Apelação
1001001-66.2018.8.26.0262; 21ª Câmara de Direito Privado.
Rel. Des. Virgilio de Oliveira Junior; j. em 16/08/2019).

Ante o exposto, pelo meu voto, NEGO PROVIMENTO ao


recurso, nos termos da fundamentação. Majoro os honorários advocatícios para 15%
(quinze por cento), nos termos do § 11, art. 85 do estatuto processual civil.

FERNANDO REVERENDO VIDAL AKAOUI


RELATOR

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